A Emergência da SIDA

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A E M E R G Ê N C I A D A S I D A UNICEF/93-1229/Andrew COMENTÁRIO: CONSEQUÊNCIAS PARA AS 16

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A emergência da SIDAPor Janat Mukwaya

O avanço dos medicamentos antiretrovirais nospaíses industrializados criou em muitas pessoas aideia de que o pior da epidemia da SIDA tinha passa-do. Nada podia estar mais afastado da realidade nospaíses em desenvolvimento onde a epidemia, voraz esilenciosa, está a anular os progressos históricosconseguidos em termos de saúde pública e os esforçosde desenvolvimento económico dos últimos 20 anos.

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Passaram-se duas décadas– para nós uma geração –desde que os primeirosrumores surgiram, vindosdas remotas povoações

vizinhas do Lago Vitória, falando deuma doença estranha que consumiaas suas vítimas até ficarem pele e osso.

Desde então, como uma autênticadebulhadora, a SIDA avançou pelanossa fértil terra, com uma força im-piedosa, atingindo jovens, pessoascultas, tanta da nossa gente no augeda sua vida produtiva: 1,8 milhões deugandeses morreram, 1,7 milhões decrianças perderam a mãe ou ambos ospais devido à SIDA, à medida que aepidemia ia alastrando. Hoje em dia, oUganda distingue-se infelizmentepor ter a maior população órfã domundo.

A nossa história repete-se portodo o continente africano. Dos14 milhões de pessoas que morre-ram de SIDA em todo o mundo, maisde 11 milhões eram africanos, umquarto das quais crianças. Só no últi-mo ano, morreram em África 2 mi-lhões de homens, mulheres e crian-ças. Chorámos os nossos mortos àrazão de 5 500 por dia.

Nenhum de nós poderia ter imagi-nado a capacidade devastadora dovírus da imuno-deficiência humana(VIH). Mas alguns factos são nestemomento claros. Jovens – especial-mente mulheres – são as primeirasvítimas desta epidemia. Mais de7 000 jovens de ambos os sexos emtodo o mundo são diariamente infec-tados, o mesmo acontecendo com1 600 crianças de menos de 15 anos.

Um silêncio mortalO silêncio e o estigma que rodeiam

esta doença estão a favorecer a suapropagação – e a alimentar uma into-lerância extremamente grave a quedevemos resistir com todas as nossasforças. Em Dezembro de 1998, GuguDlamini, uma voluntária de umaorganização sual africana dedicada àSIDA anunciou que era seropositivadurante uma sessão realizada emJohannesbourg, na esperança de des-fazer algumas ideias pré-concebidascontra as pessoas infectadas. Onzedias mais tarde, Gugu foi morta àpancada por vizinhos que a acusavamde ter trazido a vergonha para acomunidade.

A violência popular contra estacorajosa mulher foi um acto brutal depreconceito e intolerância. Mas, foitambém uma chamada de atençãopremonitória dos cidadãos maisvulneráveis dos nossos países em des-envolvimento – as mulheres e ascrianças – que vêem frequentementenegados os seus direitos à educação, aoportunidades económicas e a cuida-dos de saúde adequados. Eles são si-lenciados pela ignorância e pelomedo, e vencidos pela sua incapaci-dade de resistir aos perigos queenfrentam.

Vejamos, por exemplo, as nossasmulheres, que educam as nossascrianças e produzem os nossos ali-mentos. A sua dependência económi-ca e social dos maridos é tão grandeque não lhes podem recusar as exi-gências, mesmo que receiem que elestenham contraído o VIH com outrosparceiros sexuais.

As mulheres também evitam recor-rer a serviços médicos e de aconse-lhamento vitais, e raramente se atre-vem a fazer o teste do VIH, de talforma temem que os seus maridoslhes batam e as expulsem para umacomunidade onde serão ainda maisvotadas ao abandono.

Se as mulheres adultas estão limi-tadas pelo seu baixo estatuto social eauto-estima, como é que as filhasadolescentes podem resistir aos assé-dios sexuais de homens mais velhos eàs pressões da comunidade para secasarem, apesar da potencial expo-sição ao VIH? As adolescentes naÁfrica sub-sariana têm seis vezesmais probabilidades de ser infecta-das do que os rapazes da mesma ida-de. Existe uma crença, terrível e co-mum a várias nações africanas, deque um homem infectado com VIHpode curar-se tendo relações sexuaiscom uma virgem, aumentando assima incidência nas raparigas maisnovas.

Infância perdidaInfelizmente, são as crianças que

carregam o fardo mais pesado da epi-demia. Em todo o mundo, mais de8 milhões de crianças tiveram quecrescer sem as suas mães. Cerca de90% dos órfãos de SIDA vivem naÁfrica sub-sariana.

Perder um ou ambos os pais porcausa da SIDA significa ter pela frenteuma infância com sofrimento e peri-gosa. O sofrimento começa com a dore o trauma de ver morrer os pais.Desde muito cedo são vítimas de pre-conceitos e da negligência dos quedeles se ocupam e da própria comuni-dade. Todas as disposições da Con-venção sobre os Direitos da Criançasão violadas, desde o seu direito àeducação, saúde e desenvolvimento,até à protecção contra a exploração eabusos.

A experiência diz-nos que os órfãostêm taxas de má nutrição, atraso decrescimento e analfabetismo alar-mantes. Muitas vezes é a própriacomunidade que os afasta, com receiode que também eles sejam portadoresdo vírus fatal. Os familiares que osacolhem apoderam-se geralmente dasua parca herança, e a legislação localoferece muito poucos recursos a estascrianças sós.

E, pior do que tudo, como os inqué-ritos realizados no Uganda demons-traram, as crianças cujos pais morre-ram têm muitas vezes que fazertrabalhos mais pesados e são tratadasmais severamente do que os filhos dasfamílias de acolhimento. Vão menos àescola e estão mais sujeitas a depres-sões. Um dos nossos projectos de des-envolvimento distrital relata que “ascrianças órfãs estão a ser abusadassexualmente, forçadas a casar, negli-genciadas e … sujeitas a várias formasde abuso.”

Por todo o continente, as raparigassão especialmente vulneráveis. Pe-rante informações sobre um aumento

Sua Excelência Janat Mukwaya é Ministro para as Questôes da Igualdade, do Trabalhoe Desenvolvimento Social do Uganda.

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acentuado dos abusos sexuais noZimbabué, por exemplo, o governocriou um serviço hospitalar específicopara atender as vítimas deste com-portamento inconcebível.

No meu próprio país, uma mulher de60 anos, Honodinta Nakayima, tomaconta de 42 netos, entre os 13 anos ealguns meses de idade, depois de setedos seus filhos terem morrido.

A teia das gerações

Durante muito tempo era vulgardescrever a epidemia da SIDA emÁfrica como “misteriosa” e “invisí-vel”, mas a realidade é bem diferente.Todos nós partilhámos o sofrimentode irmãos, irmãs, e colegas de escolaque morreram da doença. Há cadeirasvazias às nossas mesas, secretáriasvazias nos nossos escritórios. Mas aperda de amigos ou familiares é ape-nas a primeira ruptura na teia dasgerações que, em tempos, protegia anossa sociedade.

Quando a SIDA atinge o ganha-pãoda casa, deixa de haver um salário e oresto da família afunda-se na pobre-za, gastando os seus já magros recur-sos a tratar um familiar doente. Osestudos que fizemos demonstram quequando morre o pai, a viúva e os filhosmais velhos têm que trabalhar maisduas a quatro horas por dia. Especial-mente as raparigas podem ser força-das a deixar a escola para ajudar emcasa ou trabalhar nos campos.

Além disso, o vírus mortal rara-mente pára num membro da família.Os maridos infectam as mulheres;cerca de um terço dos recém-nasci-dos, por seu turno, são contaminadospelas mães. Uma vez mais, amordaça-das pelo silêncio e oprimidas peloestigma que rodeia a doença, as mu-lheres sem sintomas de SIDA desco-brem muitas vezes que estão infecta-das quando é diagnosticado o VIH aoseu bébé.

Vejamos a experiência dramáticade uma mulher, a quem chamareiAssumpta Mboya, que vive junto aoVale do Grande Rift, em Nairobi.Uma das suas gémeas de 22 mesesadoeceu, e o médico descobriu que acriança era VIH positivo. Poucodepois o bebé morreu, seguido domarido. Nesse momento Assumptafez também o teste e confirmou osseus mais profundos receios. Resis-tiu a fazer o teste à filha gémea quejá tem 8 anos, embora viva aterradacom a possibilidade da criançaestar também infectada e na angústiado que lhe possa acontecer se elamorrer primeiro. Famílias comoesta estão a desintegrar-se por todo onosso continente, ameaçando aspróprias fundações da nossa socie-dade.

Uma apelo à prevenção

A tragédia humana do nosso conti-nente, causada pelo VIH/SIDA, é pro-fundamente agravada por uma crisede segurança social. Muitos são os queficam sem tratamento contra a SIDA eas complicações a que dá origem por-que os medicamentos antiretrovirais –que têm mantido os doentes dos paísesindustrializados vivos e saudáveis –custam milhares de dólares por ano, oque os torna apenas num sonho para amaioria das pessoas em África. Sãourgentemente necessários recursosmaciços para nos ajudar a tratar osinfectados, a cuidar dos órfãos, e pre-venir a disseminação da doença.

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O famoso artista do teatro de marionetas Suyadi faz uma representação para crianças num atelier apoiado pela UNICEF na Indonésia.Os participantes exploraram diversas formas de utilização das marionetas para transmitir à crianças mensagens sobre a SIDA e sobrequestões relacionadas com as mulheres, a paz e a exploração sexual.

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Dezenas de milhares de órfãos sãosimplesmente abandonados à suasorte, como acontece com as 90 000crianças da Zâmbia que vivem nasruas. Dezenas de milhares vivem comdificuldades em lares chefiados poruma criança mais velha. Os jornaisdão conta do destino de rapariguin-has como Kugu Sengane, no NatalKwazulu (África do Sul), que tinhasomente 11 anos quando se viu obri-gada a tomar contas de ambos os paisdurante os seus últimos dias de vida.Enquanto agonizavam, Kugu tinhaque os lavar e alimentar, ao mesmotempo que se ocupava do irmão maisnovo. Não é vida para uma criança.

Cerca de metade das pessoas que seocupam de órfãos em diversas regiõesde África são avós idosas, como EnnieGambushe, que vive na mesma rua deKugu Sengane. Com 64 anos de idade,Ennie sofre tanto de artrite crónicaque até tem dificuldade em se manterde pé. Todavia, depois das suas duasfilhas terem morrido de SIDA, ficousozinha a cuidar dos 15 netos, todoscom menos de 12 anos.

Da África do Sul até à ÁfricaCentral e de Leste, estas cenas de-monstram bem o impacto catastróficoque a SIDA tem tido nas nossas famí-lias e comunidades, deixando as nos-sas avós com uma responsabilidadeenorme e esgotante. “Raparigas jo-vens – as nossas crianças, os nossosnetos, estão a morrer antes de nós” dizElizabeth Chipepa, uma mulherzambiana de 79 anos, que herdou trêsbisnetos pequeninos quando a netamorreu de SIDA. “Pode ouvir outrasmulheres da minha idade dizer omesmo, eu perdi os meus três filhos;o primeiro deixou três crianças, osegundo deixou seis…”

Só no último ano,morreram em África2 milhões de homens,mulheres e crianças.Chorámos os nossosmortos à razão de5 500 por dia.

São urgentementenecessários recursosmaciços para nosajudar a tratar osinfectados, a cuidardos órfãos, e prevenira disseminação dadoença.

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Os esforços de prevenção carecemtambém da ajuda internacional, nãosó para estancar a corrente que alastraem direcção ao sul para o Malawi,Zâmbia, Zimbabué, Botswana eÁfrica do Sul, mas também para im-pedir o seu avanço na Ásia, onde7 milhões de pessoas estão já infecta-das. A Índia alberga 4 milhões de pes-soas com VIH e os padrões de trans-missão mostram que não há tempo aperder.

Na cidade indiana de Chennai (an-teriormente Madras), a taxa de infec-ção pelo VIH dos condutores decamiões quadruplicou de 1995 a 1996,como aconteceu com a expansão daSIDA nos condutores de mercadoriasafricanos que atravessavam as estra-das de Nairobi até Lusaka. Tambémna Índia os estudos sobre mulheresgrávidas na cidade costeira de Pondi-cherry revelam que 4 % estão infecta-das com VIH. Aproximadamente umterço dos seus bebés vão apanhar ovírus.

Sabemos que o empenhamento po-lítico aberto e determinado dos gover-nos no combate à doença é um factorcrucial para o sucesso das campanhasde prevenção, para desfazer o silêncioque rodeia o vírus e proibir qualquertipo de discriminação. Por detrás doescudo de silêncio, o estigma e a ver-gonha associados à SIDA só contri-buem para que a epidemia alastre. EmÁfrica, nove em cada dez pessoas por-tadoras do VIH não sabem que estãoinfectadas, e os que sabem raramenteinformam os seus familiares, e menos

ainda os seus parceiros sexuais. Mui-tos jornais africanos não fazem qual-quer menção à SIDA nas suas notíciassobre mortes.

Aqui no Uganda, quando o Presi-dente Yoweri Museveni tomou posseem 1986 reconheceu a gravidade dadoença e as suas consequências alongo prazo. Rapidamente estabele-ceu uma comissão nacional para aprevenção da SIDA, que lançou umacampanha de educação intensiva ba-seada em mensagens fortes por formaa atrair os nossos jovens. Entre outrascoisas, encorajava a distribuição depreservativos, o teste voluntário doVIH, aconselhamento e serviços deapoio. E, mais importante de tudo,estimulava o debate público franco eaberto.

Com o slogan “Fidelidade, abs-tinência e preservativos” as campan-has de prevenção da SIDA tiveram re-sultados rápidos. Muitos jovens ugan-deses estão a adiar as suas primeirasexperiências sexuais, a limitar o núme-ro de parceiros e a usar preservativos.A taxa de novas infecções desceu acen-tuadamente desde o ano negro de1987, quando tivemos 239 000 novoscasos de VIH/SIDA. Em 1997 este nú-mero tinha baixado mais de três quar-tos, para os 57 000. Estamos particular-

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mente encorajados com a descida de40% de prevalência do VIH nas grávi-das em zonas urbanas – um indicadorimportante para seguir na pista da dis-seminação da doença.

Mas não estamos sozinhos. Bemlonge daqui, na Ásia Oriental e Meri-dional, responsáveis governamentaise animadores comunitários da Tailân-dia tiveram igualmente sucesso comas suas campanhas agressivas de pre-venção da SIDA. Alertados pelascatastróficas perdas em África, osresponsáveis da Tailândia atacaram asua epidemia de VIH num estádiomais primário e as mensagens quedifundiram visaram especialmentea população jovem. Em resultadodisso, no norte da Tailândia, o nú-mero de homens de 21 anos que fre-quentavam prostituição caiu parametade em quatro anos. O uso dopreservativo aumentou cerca de50%, e o número de casos de infec-ções conhecidas neste períodobaixou para 1/3.

Um terceiro país, o Senegal, tam-bém conseguiu refrear o alastramentodo vírus com um agressivo programade educação dirigido ao público jo-vem. Entre as mulheres e homens demenos de 25 anos, o uso do preserva-tivo com parceiros “não regulares”

Mais de 7 milhões de crianças na África sub-sariana ficaram órfãos devido à SIDA, porque a mãe ou ambos os pais sucumbiram àdoença. Grande número destas crianças, como este rapaz na Zâmbia, ficaram a cargo dos avós, mas dezenas de milhares de criançaszambianas estão entregues a si próprias, muitas delas vivendo nas ruas.

Daqui a algunsanos, quando osnossos bisnetosolharem para trás,será que vãoaperceber-se de que osdirigentes do mundose esquivaram às suasresponsabilidades nocombate ao flageloque mais jovensmata?Não podemos deixarque isso aconteça.

subiu acentuadamente de 5% em 1990para 60% em 1997.

Estes programas podem ser somenteo primeiro passo, mas provam o pon-to de vista defendido pelo Dr. PeterPiot, Director Executivo do Programadas Nações Unidas para o VIH/SIDA

(UNAIDS), de que os esforços de pre-venção “não requerem novas desco-bertas tecnológicas, mas sobretudonovos avanços na vontade política”.

Estes esforços devem ser orientadospara os mais vulneráveis – jovens, mul-heres e crianças. E devem garantir fir-memente os seus direitos à educação,saúde, nível de vida económico – à vidaem si mesma – de forma a que, munidasde conhecimentos e independência, asnossas populações possam, acima detudo, evitar a infecção pelo VIH.

Daqui a alguns anos, quando osnossos bisnetos olharem para trás,para o crepúsculo deste século, seráque vão aperceber-se de que os diri-gentes do mundo se esquivaram àssuas responsabilidades no combateao flagelo que mais jovens mata?

Não podemos deixar que isso acon-teça. Pelo contrário, mostremos quefomos capazes de chegar às mulherese crianças mais ameaçadas pela pan-demia e lhes demos meios para ven-cer esta terrível doença. n

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Uganda 1 100Zâmbia 890Zimbabué 700Malawi 580Togo 400Botsuana 390Burundi 380Costa do Marfim 380Congo 360Tanzânia 360Ruanda 350Rep. Centro-Africana 340Burkina Faso 290Quénia 280Etiópia 250Moçambique 180Serra Leoa 170Libéria 150Congo, Rep. Dem. 140Chade 130Gâmbia 120África do Sul 110Gana 110Namíbia 110Camarões 100Lesoto 100Gabão 90Senegal 90Nigéria 60Mali 50Guiné 40Angola 30Benin 30Níger 30Guiné-Bissau 20Mauritânia 10Madagáscar 2Eritreia sem dadosMaurícias sem dadosSomália sem dados

O impacto devastador da crise da SIDA nas crianças do mundo emdesenvolvimento ainda não é totalmente entendido. O número de órfãos,particularmente em África, constitui nada menos do que uma emergência,

que precisa de uma resposta também de emergência. Enquanto sociedades já de siempobrecidas lutam contra uma calamidade com estas dimensões, os progressosconseguidos com grande esforço em termos de desenvolvimento social– nomeadamente as melhorias na saúde infantil, nutrição e educação – estão a sereliminados.

Magnitude da crisedos órfãos

A perda é um corolário inevitável da doença e damorte, mas os efeitos negativos da SIDA não temparalelo: até agora a doença deixou 8,2 milhões decrianças sem mãe ou sem ambos os pais, na suagrande maioria na África sub-sariana. E, os núme-ros continuam a crescer, esperando-se que atinjamos 13 milhões no ano 2000, dos quais 10,4 milhõesmenores de 15 anos.

Os traumas em termos pessoais são trágicos paraas crianças. O mesmo acontece com as crises dossectores sociais, quando as comunidades e os paísesmais afectados – os mais pobres do mundo – lutampara cuidar dos doentes e de uma geração de órfãos,que atingem dimensões sem precedentes na históriada humanidade.

Na maior parte do mundo industrializado, de ummodo geral apenas 1% da população infantil é órfã.Antes do aparecimento da SIDA, as sociedades nomundo em desenvolvimento absorviam os órfãosem famílias alargadas e nas comunidades, em per-centagens que rondavam os 2% da população infan-til. Neste momento, 11% das crianças ugandesas sãoórfãs devido à SIDA. Na Zâmbia, há 9% de órfãos; noZimbabué, 7%; no Malawi, 6%. Nos países comtaxas de infecção elevadas nas mulheres, o númerosde crianças abandonadas também o são.

E estas perdas não estão a diminuir: em 35 países,a proporção de crianças órfãs duplicou, triplicou ouaté quadruplicou em apenas três anos, de 1994 a1997. Na Ásia, teme-se que por causa da SIDA apopulação órfã venha a triplicar no ano 2000. E nestemomento, segundo a UNAIDS, o número de criançascom progenitores seropositivos é ainda maior doque o número de crianças que já são órfãs, o que éuma perspectiva alarmante para o futuro.

As crianças que perderam a mãe ou ambos os paissão os membros mais vulneráveis da sociedade.Socialmente isolados devido ao estigma da SIDA,têm menos hipóteses de ser imunizados, mais pro-babilidades de sofrerem de má nutrição e analfabe-tismo, e estão mais vulneráveis aos abusos e explo-ração.

Encontrar recursos necessários para ajudar a esta-bilizar a crise e proteger as crianças é uma priori-dade que requer uma acção urgente da comunidadeinternacional.

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ÁFRICA AO SULDO SARA

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Arábia Saudita <1Iémen <1Egipto <1Irão <1Iraque <1Israel <1Jordânia <1Kuwait <1Líbano <1Líbia <1Oman <1Síria <1Tunísia <1Turquia <1Argélia sem dadosEmiratos ÁrabesUnidos sem dados

Marrocos sem dadosSudão sem dados

Nota: <= menos de.

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Afeganistão <1Arménia <1Azerbeijão <1Cazaquistão <1Geórgia <1Quirguizistão <1Tajiquistão <1Turquemenistão <1Usbequistão <1

Tailândia 30Camboja 20Birmânia 8Papua Nova Guiné 6Índia 3Malásia 2Laos 1Nepal 1Nova Zelândia 1Paquistão 1Sri Lanka 1Vietname 1Austrália <1Bangladesh <1Butão <1China <1Coreia (do Norte) <1Coreia (do Sul) <1Filipinas <1Indonésia <1Japão <1Mongólia <1Singapura <1

Haiti 100Honduras 20Jamaica 20Trinidade e Tobago 20Estados Unidos 10Rep. Dominicana 10Panamá 9El Salvador 8Costa Rica 6Guatemala 6Uruguai 4Argentina 2Equador 2México 2Chile 1Colômbia 1Nicarágua 1Paraguai 1Peru 1Venezuela 1Bolívia <1Canadá <1Cuba <1Brasil sem dados

O QUE MOSTRAA TABELA

CLASSIFICATIVA

O número de menoresde 15 anos por

10 000 que perderama mãe ou ambos os

pais devidoà SIDA

Nota: estas estimativas não incluem crianças que perderam somente o pai.

Dados comparáveis sobre o número de crianças órfãs da SIDA não estão disponíveis na maioria dos paísesem desenvolvimento ou em transição, por isso esses países foram excluídos desta tabela classificativa.

Fonte: OMS/UNAIDS; dados do final de 1997.

Países com númerosmais altos *Uganda 1 100 000Etiópia 700 000Tanzânia 520 000Zâmbia 360 000Zimbabué 360 000Nigéria 350 000Quénia 350 000Congo, Rep. Dem. 310 000Malawi 270 000Costa do Marfim 240 000África do Sul 180 000Burkina Faso 150 000Moçambique 150 000Burundi 110 000Índia 110 000

* Crianças com menos de 15 anos queperderam a mãe ou ambos os paisdevido à SIDA, no final de 1997

Fonte: OMS/UNAIDS.

MÉDIO ORIENTEE NORTE DE ÁFRICA

ÁSIA CENTRAL LESTE/SUL DA ÁSIAE PACÍFICO

AMÉRICAS

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Em diversos países africanos fortemente atingidos pela SIDA, não é raro ver criançascom menos de 15 anos como chefes de família. Esta jovem ugandesa, que perdeu os paisdevido à SIDA, toma conta de uma avó cega e dos seus irmãos mais novos.

O impactoda SIDA na vidadas crianças

Uma das mais dramáticas e menosvisíveis consequências do VIH/SIDA éa anulação de progressos arduamenteconseguidos no domínio da sobrevi-vência infantil em diversos países deÁfrica.

No Botsuana, por exemplo, a SIDAserá responsável por 64% das mortesdas crianças de menos de cinco anosaté no ano 2000, anulando muitosdos importantes avanços em termosda saúde infantil que se haviam re-gistado no país. Na África do Sul e noZimbabué as previsões apontampara que a SIDA seja responsável porum aumento de 100% da taxa de mor-talidade infantil. Alguns especialis-tas prevêem aumentos ainda maisacentuados no futuro. Segundoprojecções do Departamento de Esta-tística da População dos EstadosUnidos, no ano 2010 a taxa de morta-lidade das crianças menores de cincoanos será três vezes e meia mais ele-vada do que seria de esperar se aSIDA não existisse, e a mortalidadeinfantil pode duplicar. Em algunspaíses de África os hospitais repor-tam que três em cada quatro camaspediátricas estão ocupadas porcrianças com SIDA.

O impacto da SIDA nas crianças nãose limita às que estão infectados, umavez que nos países mais atingidos, hámilhões sofrem a perda dos pais oudas pessoas que tomam conta delas,correndo por isso maiores riscos emtermos de saúde, alimentação e edu-cação. É visível o agravamento dasconsequências para a nutrição dascrianças que vivem em lares afectadospela SIDA. Um estudo realizado emKagera (Tanzânia) demonstrou que oconsumo alimentar das famílias po-bres diminuía cerca de 15% por alturada morte de um adulto provocadapela SIDA. Esta diminuição tem con-sequências significativas no desen-volvimento da criança. Para além dis-so, o risco de virem a sofrer atrasos decrescimento para as crianças órfãs deSIDA é superior à média; segundo oBanco Mundial, os atrasos de cresci-mento nos órfãos rondam os 50%.

Espera-se uma descida nas taxasde alfabetização em muitos países

dado que as crianças de agregadosfamiliares afectados pela SIDA sãoretiradas da escola quando as famí-lias não podem continuar a pagar asdespesas ou quando as crianças sãonecessárias para ajudar em casa oupara ganhar algum dinheiro. Os ór-fãos que vivem em famílias alarga-das são geralmente os primeiros aser privados da educação. Um estu-do feito na Zâmbia revelou que naszonas urbanas, 32% dos órfãos nãofrequentavam a escola, comparati-vamente com os 48% dos não-ór-fãos.

Muitas das consequências econó-micas da doença continuam difíceisde avaliar; mas não há dúvida que oaumento das despesas de saúde e aperda do rendimento familiar estão aafectar os recursos, sobrecarregandoespecialmente as mulheres e colocan-do as crianças que sobrevivem emsério risco de má nutrição, analfabe-tismo e doença. A SIDA está também adizimar as camadas da populaçãocom mais aptidões e melhor nível deeducação no auge das suas vidas, oque terá consequências no que dizrespeito ao desenvolvimento futuro.Um inquérito recente feito no Malawi,por exemplo, revelou que o nível deinfecção dos professores é superior a30%.

A carga é também enorme para sis-temas de saúde já de si fracos. NoZimbabué, segundo projecções dogoverno, o VIH/SIDA irá absorver 60%do orçamento da saúde no ano 2005.Na maioria dos países em desenvolvi-mento, a doença está a fazer aumentaros custos dos cuidados de saúde e areduzir a sua capacidade, o que se vaireflectir sobretudo nos pobres. Emmuitas comunidades, crianças saudá-veis cujos pais morreram de SIDA cor-rem maiores riscos de morrer dedoenças evitáveis, porque estas ten-dem a ser atribuídas à SIDA e, por isso,não são tratadas. É também evidenteque os órfãos têm menos probabilida-des de ser vacinados e de receber oscuidados de saúde adequados àssuas necessidades do que as outrascrianças.

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Actualmente em maior risco: as jovens adolescentesEm muitos países, os dados apon-

tam para uma taxa de prevalência doVIH mais alta nas raparigas do que nosrapazes adolescentes.

Um estudo recente feito na zonaocidental do Quénia revelou que 25%das raparigas entre os 15 e os 19 anoseram seropositivas, comparando comos 4% de rapazes do mesmo grupoetário. Nas maiores áreas urbanas doBotsuana, mais de 30% das adolescen-tes grávidas estão infectadas, e naÁfrica do Sul, Suazilândia eZimbabué a taxa da infecção é supe-rior a 20% (ver quadro). Levantamen-tos realizados na Zâmbia mostramque a percentagem de incidência nasadolescentes (12%) é quase o triplo dados rapazes.

A prevalência de índices tão altosnas raparigas reflecte a sua vulnera-bilidade biológica à infecção, a suavulnerabilidade social e física nasrelações sexuais e o impacto da dis-criminação entre sexos. As taxasmostram que é urgente fazer muitomais para proteger os direitos dasraparigas e das mulheres. As discre-pâncias das taxas de VIH entre rapa-zes e raparigas indicam ainda que asraparigas estão em maior risco deser infectadas por homens mais vel-hos do que por rapazes da mesmaidade.

As taxas de infecção pelo VIH dasadolescentes na Ásia são baixas com-paradas com as de África, embora osvalores na Ásia estejam a subir: naÍndia, segundo informações de umserviço clínico pré-natal em Mubai,5% das adolescentes grávidas sãoVIH positivas, duas vezes mais doque em 1994. Adolescentes de gru-pos de risco apresentam taxas de pre-

valência assustadoramente altas: em19 províncias do Camboja, mais de40% das raparigas com menos de19 anos envolvidas no negócio dosexo são VIH positivas. Nas áreas ur-banas da Birmânia, a taxa para omesmo grupo de jovens é de 25%.Contudo, na Tailândia, a intervençãoprecoce teve resultados positivos nadiminuição da prevalência do vírusem todos os grupos de risco, incluin-do nas adolescentes envolvidas nonegócio do sexo.

Os epidemiologistas acham que,como as infecções devem ser recentesna população jovem, um aumento dataxa de infecção neste grupo é sinaldo alastramento da doença. É tam-bém um sinal preocupante de que aeducação e os programas de pre-venção não existem ou não estão aresultar.

Tanto nos países industrializados,como nos países em desenvolvi-mento, as intervenções dirigidas aos

jovens provaram ser o método maiseficaz e o melhor investimento parafazer face ao problema a longo prazo.Segundo o mais amplo estudo sobreeducação sexual para a saúde feito atéhoje, abrangendo um total de 68 paí-ses, a UNAIDS verificou que uma boaeducação ajuda efectivamente a atra-sar a primeira relação sexual e protegeos jovens sexualmente activos doVIH, de outras doenças sexualmentetransmissíveis e da gravidez. Nãoconduz, como muitos receavam, auma iniciação mais precoce ou a umamaior actividade sexual.

Os benefícios da educação foramprovados com maior evidência noUganda, o primeiro país africano comum peso extraordinário de SIDA a res-ponder à crise. Aqui, a maior dimi-nuição na prevalência verificou-senos jovens dos 15 aos 19 anos, comuma descida de 38% em 1991 para7,3% em 1996 em determinadaszonas.

Infecções pelo VIH nos adolescentes da Américado Norte e da Europa em crescimento

Em todo o mundo é cada vez maioro número de adolescentes infectadoscom VIH; metade do total dos 5,8 mi-lhões de novos casos de infecção em1998 ocorreram no grupo dos 15 aos24 anos de idade.

Os adolescentes dos países em des-envolvimento são os mais atingidos,mas o risco para os dos países indus-trializados e em transição está a au-mentar, devido à emergência de umnovo padrão de infecção. Por exem-plo, os jovens dos 13 aos 21 anos re-presentam um quarto dos novoscasos de infecção nos Estados Unidos;no Canadá, o VIH está também a cres-cer numa proporção altíssima entre osadolescentes. Cada vez mais os infec-tados são mulheres jovens.

Na Europa de Leste e na Ásia Cen-tral, o aumento do consumo de drogasintravenosas despoletou um grandeaumento do número de infectados:cerca de 270 000 pessoas vivem agoracom VIH/SIDA, havendo um númerosignificativo de novos casos nos ado-lescentes. A epidemia está mais alas-trada na Ucrânia, onde há 18 000 ado-lescentes infectados com VIH. Até1995, havia em toda a região menos de30 000 casos de VIH/SIDA em adultose crianças.

Dado que o consumo de drogas in-travenosas é um factor de peso para a

disseminação da doença, na Fede-ração Russa – com um número dedrogados que atinge alguns milhões –verificou-se um aumento acentuadode casos. Pensa-se que muitos dos in-fectados são jovens: em São Peters-burgo, por exemplo, 20% dos toxico-dependentes são adolescentes, al-guns com apenas 12 anos.

O estádio actual da doença faz pre-ver um alastramento ainda maior. Asconvulsões sócio-económicas têmsido acompanhadas pelo aumento doconsumo das drogas, por profundasmodificações no comportamentosexual dos jovens e por um acentuadocrescimento das doenças sexual-mente transmissíveis. Na FederaçãoRussa, nos últimos anos o número das

jovens menores de 18 anos quesexualmente activas quadruplicou,situação que se verifica em toda aregião. Em profundo contraste com aEuropa Ocidental, onde 60% dosjovens que entraram na vida sexualactiva usam preservativos, a falta desensibilização traduz-se por compor-tamentos de risco generalizados; naRepública da Moldávia, por exemplo,a taxa é de cerca de 8%.

Até à data, poucos foram os paísesque puseram em prática programasde prevenção do VIH/SIDA numa es-cala relativamente reduzida. AUNICEF apoiou um programa bemsucedido de troca de seringas,nomeadamente um em Odessa, em1997.

Adolescentes em riscoAdolescentes (entre os 15 e os 19 anos) que vivem com VIH/SIDA

Europa OcidentalEspanha 5 400Portugal 3 300França 2 600Itália 2 200Alemanha 1000Reino Unido 600Bélgica 400Grécia 400Suíça 300Países Baixos 100Sub-total 16 300

Europa de LesteUcrânia 18 000Fed. Russa 2 300Polónia 1 100Sub-total 21 400Total dos 13 países da Europa 37 700América do NorteEstados Unidos 17 000Fontes: Hamers e Downs do Centro Europeu deAcompanhamento Epidemiológico da SIDA (CESES),1999; Centros de Controle e Prevenção da Doençados Estados Unidos. Dados de finais de 1997.

As mais vulneráveisTaxas do VIH nas raparigas grávi-das (dos 15 aos 19) assistidas emclínicas pré-natais dos principaiscentros urbanos

* Inclui, também, raparigas fora das princi-pais zonas urbanas

Fonte: OMS/UNAIDS, Departamento de Recen-seamento da População dos Estados Unidos,programas nacionais do SIDA. Dados:1995-98.

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Nascidos com VIHO VIH/SIDA está a dizimar os jo-

vens por toda a África. De um totalmundial de 590 000 crianças infecta-das em 1998 (o maior número de sem-pre) 530 000 eram de África ao sul doSara. A maior parte delas ficaram in-fectadas antes ou na altura do parto,ou durante a amamentação. Em fla-grante contraste, na América doNorte e na Europa Ocidental menosde 1 000 bebés foram infectadas nessemesmo ano.

A pobreza, e a consequente falta deserviços de saúde, educação e trata-mento têm um peso importante nestaterrível discrepância. Mas talvez ofactor de maior peso seja a falta decontrole que as mulheres têm sobre oseu relacionamento sexual e tambémsobre muitos aspectos da sua saúde.Outro factor de risco é o pesado man-to de vergonha e silêncio que aindapaira sobre os portadores destadoença na maior parte de África.Devido à vergonha ou ao medo de

parecerem ser portadoras da doença,muitas mulheres não se atrevem aproteger-se a si próprias e aos filhos.As raparigas são particularmente vul-neráveis física e socialmente a pres-sões e às forças em jogo (ver “Actual-mente em maior risco: as jovens adoles-centes”, pag. 23).

Nos países industrializados, asmulheres VIH positivas que engravi-dam recebem o medicamento retro-viral zidovudine (ZDV, mais conheci-do por AZT), no mínimo desde as14 semanas de gravidez, e o medica-mento é administrado aos bebés du-rante seis semanas após o nascimen-to – um regime muito dispendioso. Oacesso ao parto por cesariana (ver“Falta de cuidados obstétricos: mães ebebés em risco”, pag. 15) e a amamen-tação artificial reduzem o risco detransmissão mãe-filho. Estes regimesresultam em taxas de transmissão de5%, ou menos, quer em França quernos Estados Unidos. No mundo emdesenvolvimento, 25% a 35% acrianças nascidas de mães VIH positi-vas apanham a infecção durante agravidez, nascimento ou amamen-tação.

Testes com antiretrovirais

Neste momento há, também, algu-mas esperanças no sentido da re-dução da transmissão mãe-filho nomundo em desenvolvimento. No anopassado, experiências realizadas naTailândia com AZT, administradodurante um curto período a grávidascom VIH (desde a 36ª semana de gra-videz até ao parto), traduziu-se poruma diminuição de cerca de 50% doscasos de transmissão. Um estudomais recente revelou que um regimemuito mais curto – com AZT e lami-vudina (3TC), administrados naaltura do parto e durante a semanaseguinte, tanto à mãe como ao filho –reduziu as probabilidades de trans-missão em 37%. Na sequência doestudo feito na Tailândia, a UNAIDS,em parceria com a UNICEF e a OMS,anunciaram o lançamento de umprojecto piloto de dois anos, que vaiatingir 30 000 mulheres em 11 países,e cujo objectivo é reduzir a transmis-são mãe-filho. Está em curso o traba-lho de criação de instalações e deapoio técnico nesses 11 países, ao

mesmo tempo que começou o trata-mento de mães seropositivas na Cos-ta do Marfim e na Tailândia.

Mas, mais importante ainda nocombate ao alastramento do vírus éo acesso a serviços onde as mulherespossam ser informadas, de formaconfidencial, acerca da sua situaçãoem termos do VIH, e ser aconselha-das sobre planeamento familiar esobre a alimentação dos seus filhos.É evidente que a maioria não temacesso a este tipo de teste voluntárioe confidencial ou ao aconselhamen-to, e muitas que são seropositivassão vítimas de discriminação e atémesmo de violência. Por outro lado,muitas mães que sabem ser VIH po-sitivo não têm acesso a substitutosdo leite materno apropriados e se-guros. (ver “VIH e alimentação in-fantil”).

Alarme para a ÁsiaA crise desencadeada em África

há cerca de uma década está actual-mente em vias de evoluir numa es-cala mais vasta. A alta prevalêncianas crianças é um indicador da rápi-da propagação do vírus, e o VIH nas

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Crianças no Centro infantil de Vienpeng em Chang Mai (Tailândia) apoiado pelaUNICEF. Neste centro há crianças seropositivas e órfãos de SIDA.

A E M E R G Ê N C I A D A S I D AR E S U M O D E D A D O S

crianças está a aumentar em paísesque, até muito recentemente, tin-ham uma baixa incidência. Na Índia,por exemplo, 48 000 crianças esta-vam infectadas com VIH no final de1997, o triplo das que eram portado-ras do vírus em 1994. Em três paísesque tinham mantido baixas taxas deprevalência – China, Namíbia eVietname – a taxa de infecção nascrianças quadruplicou entre 1994 e1997.

Aumentos preocupantes de1994 a 1997Países onde o número de crianças quevivem com VIH/SIDA….

Número de crianças(0-14 anos) infectadas

…quadruplicouChina 1 400Namíbia 5 000Vietname 1 100

…triplicouÁfrica do Sul 80 000Birmânia 7 100Camboja 5 400Índia 48 000Malásia 1 400Rep. Dominicana 1 400Suazilândia 2 800

…duplicouAngola 5 200Benin 2 400Botsuana 7 300Djibuti 1 300Lesoto 3 100Moçambique 54 000Nigéria 99 000Paquistão 1 800

Fonte: OMS/UNAIDS.

Nota: os números acima são estimativas de finaisde 1997. Em muitos países, as estimativas de finaisde 1999 podem ser consideravelmente mais altas.

Crianças com SIDAPaíses com números mais elevados decrianças a viver com VIH/SIDA

Número de crianças(0-14 anos) infectadas

Etiópia 140 000Nigéria 99 000África do Sul 80 000Tanzânia 68 000Uganda 67 000Quénia 66 000Zimbabué 57 000Moçambique 54 000Congo, Rep. Dem. 49 000Índia 48 000

Fonte: OMS/UNAIDS; dados de finais de 1997.

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O P R O G R E S S O D A S N A Ç Õ E S 1 9 9 9

Apesar dos progressos, o tratamento da TB abrangemuito poucos

Cerca de um terço dos actuaisdoentes com SIDA morrem, na reali-dade, de tuberculose – o seu fragili-zado sistema imunitário torna-ospresa fácil para esta doença. Propa-gada em larga medida pela epide-mia da SIDA, a tuberculose (TB) estáa aumentar, matando um númeroque se calcula em 12 milhões de pes-soas por ano.

Mas, enquanto os medicamentosque prolongam a vida dos atingidospela SIDA continuam a ser uma reali-dade distante no mundo em desen-volvimento, existe hoje um tratamen-to eficaz e pouco dispendioso para aTB. Uma estratégia designada de Tra-tamento sob Observação Directa, deCurta Duração TODC, recomendadopela OMS, pode curar cerca de 95%dos casos e conter a expansão da TBresistente à medicação e, simultanea-mente, melhorar a qualidade de vidados que já têm SIDA. Como o nomeindica, os doentes que estão a tomardoses adequadas de medicamentospara combater a TB serão acompanha-dos durante todo o tratamento, o queé fundamental para prevenção dostipos de TB resistentes ao tratamento

com diversos medicamentos que sur-giram nos últimos anos.

Contudo, somente 16% dos doentesde TB estão a receber o tratamento re-comendado. Em 12 dos 22 países ondeocorrem 80% dos casos de TB a nível

mundial, a estratégia do TODC abran-ge menos de metade dos afectados.Somente cinco países estão a fazer pro-gressos: Camboja, Peru, Quénia, Tan-zânia e Vietname desenvolveram pro-jectos de TODC por todos o país, com

taxas de sucesso elevadas no que dizrespeito à detecção e tratamento.

No Peru, que já teve um quarto doscasos de TB da América do Sul, o TODCtem obtido sucesso no tratamento de85% dos casos.

O Brasil, em contrapartida, ondeactualmente se verifica o maior núme-ro de casos da América do Sul, não temuma estratégia nacional de TODC. AFederação Russa, a Nigéria e o Ugandaestão a atingir menos de 10% dos casos.A Índia, com uma estimativa de1,8 milhões de casos de TB – 23% dototal mundial – fez alguns progressosnos últimos anos, conseguindo abran-ger quatro vezes mais pessoas em 1998do que em 1997. A China, com mais de1 milhão de casos, criou um programaeficaz com base no TODC, mas que sóatinge metade do país.

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emoy

neCrianças esperam a sua vez para se inscreverem para a vacinação num dos váriosdispensários apoiados pela UNICEF na China.

Calcula-se que, para uma criança filha de mãe seropo-sitiva, as probabilidades de contrair o vírus através doaleitamento materno são de 1 em 7. Cerca de 500 a700 crianças são diariamente infectadas desta forma,mas o mecanismo exacto de transmissão ainda não écompletamente conhecido.

Antes do aparecimento do terrível espectro do VIH/SIDA, o aleitamento materno era considerado a melhorforma de alimentar crianças em praticamente todas ascircunstâncias. Neste momento, dada a possibilidade detransmissão do VIH através do leite materno, a OMS/UNICEF/UNAIDS prepararam em conjunto linhas orien-tadoras sobre alimentação dos bebés de forma a auxiliaros responsáveis políticos e de saúde a enfrentar esterisco e a contribuir para a salvaguarda dos direitos dasmães e dos filhos. O aspecto central destas orientaçõesreside no direito de ser a mãe a tomar a decisão, combase em informações claras e completas, sobre o que émelhor para elas e para os filhos, e na necessidade de serapoiada no caminho que decidir seguir.

Estas orientações advertem para o perigo potencial demisturar leite materno com alimentação artificial. Naverdade, estudos recentes sugerem que esta combi-nação pode ser ainda mais perigosa do que inicialmentese pensava.

Embora se saiba que o leite de uma mãe VIH positivocontém o vírus, um novo estudo indica que o leite

VIH e alimentação infantilmaterno infectado, como único alimento, pode nãocausar risco para a criança (e pode, de facto, fornecer osanticorpos altamente necessários para evitar a trans-missão do VIH ). O estudo sugere que juntar outrosalimentos sólidos ou líquidos com o leite materno nosprimeiros meses de vida pode ser causa de inflamaçõesno intestino do bebé, permitindo que o vírus mortalentre nos tecidos. É urgente que as investigações con-tinuem para se poder confirmar a importância destesdados.

Entretanto, continua a ser crucial evitar a adopçãogeneralizada do aleitamento artificial por mulheres quepodem amamentar com segurança. A melhor forma deo fazer é através de um forte empenhamento dos gover-nos na aplicação do Código Internacional sobre aComercialização dos Substitutos do Leite Materno.

As orientações referidas também insistem na necessi-dade de acesso a aconselhamento sobre o VIH e a testesvoluntários e confidenciais para homens e mulheres. Asmulheres que têm conhecimento do seu estado de in-fecção pelo VIH devem ser aconselhadas sobre os riscosde transmissão da doença aos bebés, e sobre os benefí-cios e riscos das diversas opções de alimentação infantil.

As mulheres que são VIH negativo ou que não conhe-cem o seu estado, deveriam ser informadas sobre osbenefícios da amamentação e sobre a especial importân-cia de evitarem a infecção no futuro.

P R O G R E S S O S E D I S P A R I D A D E S

Resultados do tratamento daTB nos países mais afectadosProgressos significativos: onde maisde metade dos casos de TB estão a sertratados com o programa TODC, comtaxas de sucesso superiores a 70%

CambojaPeruQuéniaTanzâniaVietname

Alguns progressos: onde entre 10% e50% dos casos TB estão a ser tratadoscom o programa TODC, com uma taxa desucesso de mais de 70%

África do SulBangladeshBirmâniaChinaEtiópiaFilipinasÍndiaIndonésiaTailândia

Progressos lentos: onde o programaTODC ou não existe ou é utilizado paratratar menos de 10% dos casos TB

Afeganistão***BrasilCongo, Rep. Dem.***Fed. RussaNigériaPaquistão***UgandaZimbabué***

*** Onde ocorrem 80% dos casos de TB de todo omundo

*** Tratamento Observado Directamente – CurtaDuração

*** Que aplicaram o TODC mas sem dados dis-poníveis

Fonte: OMS.