A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos...

20
23 constituído por metano, é não só o principal combus- tível gasoso como também matéria-prima para uma va- riedade de produtos, por exemplo metanol e amoníaco. A sua utilização é, no entanto, dificultada por vários factores, alguns de carácter económico: as principais reservas de gás natural estão afastadas dos locais com tecnologia para o transformar, o que enca- rece bastante os produtos finais. O problema é agra- vado pelo facto de o custo do transporte de gás natural ser várias vezes superior ao trans- porte de um combustível líquido com valor energético equivalente e de este acréscimo do custo aumen- tar muito com a distância a percor- rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades há necessida- de de o comprimir a pressões ele- vadas, o que implica um consumo de energia (logo, de dinheiro); por outro lado, o transporte de gases a altas pressões exige a utilização de recipientes adequados para supor- tar essas pressões. Seria assim van- tajoso arranjar um método simples e barato de converter o metano nu- ma outra substância, de preferência líquida à temperatura ambiente, an- tes do transporte para o destino final. A conversão do metano, assun- to que será tratado mais adiante, é, de facto, uma quetão muito impor- tante nos nossos dias e também um bom exemplo para se introduzirem al- guns conceitos elementares na lin- guagem dos químicos, mas nem sempre bem compreendidos. A reacção de combustão do metano princípio do menor esforço e a lei da máxima desorganização são as expressões populares das duas primeiras leis da Termodinâmica, sin- tetizadas pela equação 1. O sentido da “seta do tem- po” que determina a evolução das coisas (a energia de Gibbs, G ), é definido por um balanço entre o esforço (a entalpia, H ) e a desordem (o produto da temperatu- ra absoluta, T, pela entropia, S ): uma situação estável corresponde a um mínimo de esforço ( H ) e a um máximo de desordem (S). G = H - TS (1) De entre as vastas aplicações da equação 1 (Einstein, nas suas Notas Autobiográficas, afirmou que as duas leis da Termodinâmica clássi- ca são, de todas as leis físicas, as mais universais), interessa-nos de- senvolver algumas que se relacio- nam com a Química. E a Química preocupa-se com as moléculas e as suas transformações – as reacções químicas. Em que medida a equação 1 nos pode ajudar a compreender e a prevêr a estrutura de um dado conjunto de átomos, a sua estabili- dade e a sua reactividade, é um dos objectivos deste artigo. A discussão será complementada pela descrição sumária de algumas das técnicas que modernamente se usam em es- tudos experimentais na área da energética de moléculas. A Conversão do Metano, Einstein e Entalpias de Formação O gás natural, essencialmente A disposição espacial dos átomos de uma estrutura molecular, a quebra e a formação de ligações químicas, dando origem a novas substâncias, são os dois temas centrais da Química. Nada é mais básico para a compreensão da arquitectura e da reactividade moleculares que a energia das moléculas. A ENERGIA DAS MOLÉCULAS J. A. MARTINHO SIMÕES O Licenciado e doutorado em Engenharia Quími- ca e agregado em Química pelo Instituto Supe- rior Técnico, José Artur Martinho Simões é Professor Catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Foi Visiting Asso- ciate do California Institute of Technology e Vi- siting Research Officer no National Research Council of Canada. A sua actividade científica desenvolve-se na área da energética das molé- culas, em especial as que contêm metais de tran- sição e, mais recentemente, as espécies transientes. Autor de dezenas de artigos em re- vistas internacionais, é “Expert Analyst” da pu- blicação CHEMTRACTS - Inorganic Chemistry e membro do Editorial Advisory Board da sé- rie Structure Energetics and Reactivity in Che- mistry . É Secretário-Geral da Sociedade Portuguesa de Química.

Transcript of A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos...

Page 1: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

23

constituído por metano, é não só o principal combus-tível gasoso como também matéria-prima para uma va-riedade de produtos, por exemplo metanol eamoníaco. A sua utilização é, no entanto, dificultadapor vários factores, alguns de carácter económico: asprincipais reservas de gás natural estão afastadas doslocais com tecnologia para o transformar, o que enca-rece bastante os produtos finais. O problema é agra-vado pelo facto de o custo do transporte de gás natural

ser várias vezes superior ao trans-porte de um combustível líquidocom valor energético equivalente ede este acréscimo do custo aumen-tar muito com a distância a percor-rer. Essa diferença de custos temvárias origens. Por exemplo, paraque o gás seja transportado emgrandes quantidades há necessida-de de o comprimir a pressões ele-vadas, o que implica um consumode energia (logo, de dinheiro); poroutro lado, o transporte de gases aaltas pressões exige a utilização derecipientes adequados para supor-tar essas pressões. Seria assim van-tajoso arranjar um método simplese barato de converter o metano nu-ma outra substância, de preferêncialíquida à temperatura ambiente, an-tes do transporte para o destinofinal.

A conversão do metano, assun-to que será tratado mais adiante, é,de facto, uma quetão muito impor-tante nos nossos dias e também umbom exemplo para se introduzirem al-guns conceitos elementares na lin-guagem dos químicos, mas nemsempre bem compreendidos. Areacção de combustão do metano

princípio do menor esforço e a lei da máximadesorganização são as expressões popularesdas duas primeiras leis da Termodinâmica, sin-

tetizadas pela equação 1. O sentido da “seta do tem-po” que determina a evolução das coisas (a energia deGibbs, G ), é definido por um balanço entre o esforço(a entalpia, H ) e a desordem (o produto da temperatu-ra absoluta, T, pela entropia, S ): uma situação estávelcorresponde a um mínimo de esforço (H ) e aum máximo de desordem (S).

G = H - TS (1)

De entre as vastas aplicações daequação 1 (Einstein, nas suas NotasAutobiográficas, afirmou que as duas leis da Termodinâmica clássi- ca são, de todas as leis físicas, as mais universais), interessa-nos de- senvolver algumas que se relacio- nam com a Química. E a Química preocupa-se com as moléculas e as suas transformações – as reacções químicas. Em que medida a equação 1 nos pode ajudar a compreender e a prevêr a estrutura de um dado conjunto de átomos, a sua estabili- dade e a sua reactividade, é um dos objectivos deste artigo. A discussão será complementada pela descrição sumária de algumas das técnicas que modernamente se usam em es- tudos experimentais na área da energética de moléculas.

A Conversão do Metano, Einstein e Entalpias

de Formação

O gás natural, essencialmente

A disposição espacial dos átomos de uma estrutura molecular, a quebra e a formaçãode ligações químicas, dando origem a novas substâncias, são os dois temas centrais da

Química. Nada é mais básico para a compreensão da arquitectura e da reactividademoleculares que a energia das moléculas.

A ENERGIA DAS MOLÉCULAS

J. A. MARTINHO SIMÕES

O

Licenciado e doutorado em Engenharia Quími- ca e agregado em Química pelo Instituto Supe- rior Técnico, José Artur Martinho Simões é Professor Catedrático da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. Foi Visiting Asso- ciate do California Institute of Technology e Vi- siting Research Officer no National Research Council of Canada. A sua actividade científicadesenvolve-se na área da energética das molé-culas, em especial as que contêm metais de tran-sição e, mais recentemente, as espéciestransientes. Autor de dezenas de artigos em re- vistas internacionais, é “Expert Analyst” da pu- blicação CHEMTRACTS - Inorganic Chemistrye membro do Editorial Advisory Board da sé- rie Structure Energetics and Reactivity in Che- mistry . É Secretário-Geral da Sociedade Portuguesa de Química.

Page 2: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

24

(equação 2; “g” e “ ” designam gás e l íquido, res-pectivamente) é uma reacção praticamente total, istoé todo o metano é consumido por reacção com o oxi-génio. Na linguagem termodinâmica (equação 3), istosignifica que a soma das energias de Gibbs dos produ-tos da combustão, uma mole de dióxido de carbonoe duas moles de água, é bastante menor que a somadas energias de Gibbs dos reagentes, uma mole de me-tano e duas de oxigénio.

Recorrendo à equação 1, a equação 3 pode ser es-crita em termos das entalpias e das entropias de pro-dutos e reagentes, ou, de forma mais abreviada, emtermos das variações (∆) da entalpia e da entropia pa-ra a reacção 2:

CH4(g) + 2O2(g) → CO2(g) + 2H2O( ) (2)

G (CO2) + 2G (H2O) - G (CH4) - 2G (O2) = ∆G << 0 (3)

∆G = [H (CO2) + 2H (H2O) - H (CH4) - 2H (O2)] - T [S (CO2)

+ 2S (H2O) - S (CH4) - 2S (O2)] = ∆H - T∆S << 0 (4)

É oportuno referir que a análise anterior pressupõeque a reacção de combustão do metano ocorre a pres-são e a temperatura constantes. Se ela se desse numrecipiente fechado, com um volume constante, a lin-guagem utilizada incluiria as variações da energia deHelmholtz, ∆A, e da energia interna, ∆U (A = U - TS;∆A = ∆U - T ∆S, a temperatura constante). A Termodi-nâmica elementar ensina-nos que a variação de ental-pia, ∆H, pode ser identificada com o calor libertadoou absorvido no processo a pressão constante, enquan-to que ∆U equivale ao calor libertado ou absorvido sea reacção ocorrer a volume constante. As duas ener-gias são facilmente relacionáveis, mas os químicos pre-ferem falar em termos de entalpia, uma vez quenormalmente lidam com processos que decorrem apressão constante.

A variação da entalpia (ou, simplesmente, entalpia)para muitas reacções químicas é, em módulo, bastan-te maior que a variação do termo entrópico. Por ou-tras palavras, o peso da contribuição de T ∆S para ovalor de ∆G é frequentemente desprezável face ao va-lor de ∆H. Por exemplo, na caso da reacção 2 a 298K, T ∆S = - 72,4 kJ/mol, comparado com ∆H= - 890,7kJ/mol. Embora nem sempre assim seja (o peso do ter-mo T ∆S pode ser maior que o de ∆H ), centraremos anossa atenção no aspecto energético das moléculas, es-quecendo a sua entropia. Quase no final do artigo, ve-remos um exemplo em que o termo T ∆S não édesprezável.

A entalpia de combustão do metano podedeterminar-se no laboratório com o auxílio de um ca-lorímetro de combustão. Este método experimental,que normalmente se baseia na medida da elevação detemperatura provocada pela reacção completa de uma

Caixa 1 - Unidades

As unidades de energia, temperatura e pressão noSistema Internacional são respectivamente o joule(símbolo J), o kelvin (K) e o pascal (Pa). 1000 calo-rias equivalem a 4 184 J, sendo uma caloria a quan-tidade de calor necessária para elevar de 1 kelvin (oude um grau celsius) a temperatura de 1 grama de águainicialmente a 15°C. Por exemplo, a combustão dometano liberta uma enorme quantidade de energia,890,7 kJ/mol, ou seja 55 519 joules por grama docombustível – é uma reacção muito exotérmica .Por outras palavras, a combustão de uma mole(6,022 x 1023 moléculas, ou 16 gramas) de metanoé suficiente para aquecer cerca de três litros de água de0 a 70°C.

A equivalência entre a escala absoluta de tempe-ratura e a que usamos no dia-a-dia é dada pela rela-ção: (temperatura em K) = (temperatura em°C) + 273,15. A temperatura ambiente, 25°C, equi-vale, portanto, a 298,15 K.

As unidades de pressão no Sistema Internacionalsão as menos conhecidas do não iniciado: a pressãoatmosférica normal equivale a 101 325 Pa ou1,01325 bar (1 bar = 105 newton por metro quadra-do). Assim, para a maioria dos efeitos práticos, po-demos identificar 1 atm com 1 bar.

Caixa 2 - Calorimetria

Muitos dos calorímetros actuais são do tipo iso-peribol, ou seja, o recipiente fechado onde a reac-ção ocorre, seja ela de combustão ou qualquer outra,está mergulhado num banho onde a temperatura(normalmente 25°C) é mantida tão constante quan-to possível (± 0,001°C). A quantidade de calor liber-tada ou absorvida (reacções exotérmicas ouendotérmicas, respectivamente) é determinada me-dindo a variação de temperatura no recipiente, pro-vocada pela reacção. Para se conhecer a constantede proporcionalidade entre a quantidade de calor ea variação de temperatura, o calorímetro tem que serpreviamente calibrado, o que normalmente se faz re-correndo ao efeito Joule (a passagem de correnteeléctrica através de uma resistência liberta calor) ouutilizando uma reacção cuja variação de entalpia se-ja bem conhecida. Na calorimetria de combustãomais tradicional, o recipiente é construído para su-portar uma pressão elevada de oxigénio (cerca de 30bar). A ignição da substância a “queimar” faz-se porpassagem de corrente num filamento eléctrico. É im-portante garantir que a combustão seja completa elimpa. Por exemplo, deve procurar-se que a combus-tão de um hidrocarboneto produza apenas água edióxido de carbono e não deixe resíduos de carbo-no. Para tal, ensaiam-se as melhores condições ex-perimentais, inclusive, se necessário, misturando-se aamostra com uma outra substância que auxilie acombustão. Em muitos casos é extremamente difí-cil conseguir combustões completas. Houve mesmoalguém que afirmou que o controle da reacção decombustão é mais uma arte que uma ciência.

Page 3: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

25

Fig. 1 – Diagrama de uma bomba de combustão rotativa. (1) Cadi-nho (onde a amostra é colocada); (2) corpo da bomba; (3) cabeçada bomba; (4) válvula para a entrada de oxigénio; (5) válvula parasaída de gás (permite a análise dos gases formados na combustão);(6) eléctrodo (para a ignição da amostra); (7) anel de vedação emborracha; (8) sistema de rolamentos e rodas dentadas para rotaçãoda bomba. Esta operação, realizada após a combustão, e que permi-te a lavagem das paredes com um líquido, é essencial para o estudode muitas substâncias. A dimensão típica das amostras utilizadas nabomba da figura é da ordem de grandeza de 1 grama.

substância com o oxigénio, já no século passado e des-de então tem sido utilizado pelos químicos para ava-liar o conteúdo energético de muitas moléculas(Figuras 1 e 2). No entanto, como ficou bem expressopela equação 4, a medida proporcionada pelo calorí-metro é uma diferença entre as entalpias dos produ-tos e dos reagentes e não o valor absoluto da entalpiada molécula que é objecto de estudo.

Em princípio, não seria difícil conhecerem-se os va-lores absolutos dos conteúdos energéticos (ou entál-picos) das moléculas: bastaria determinar rigorosa-mente as massas molares e aplicar a equação de Eins-tein E = mc2. O problema está, contudo, no rigor comque é possível determinar essas massas molares. Con-sideremos novamente a combustão do metano, que li-berta 890,7 kJ/mol. De acordo com a equação deEinstein, isto significa que a soma das massas molaresdos produtos é apenas cerca de 10-11 kg menor que asoma das massas molares dos reagentes. Esta exacti-dão é, por enquanto, inatingível: nos casos mais favo-ráveis, como o hidrogénio, a massa atómica molar éconhecida com um rigor inferior a 10-8 kg. Para quais-quer efeitos práticos, continua portanto válida a lei daconservação da massa de Lavoisier (numa reacção quí-mica a soma das massas dos reagentes é igual à somadas massas dos produtos).

A expressão de Einstein não é pois muito útil aosquímicos que se preocupam com a energética das mo-léculas. Na falta de alternativa para se determinaremvalores absolutos para as energias (ou entalpias), hou-ve que escolher uma escala relativa para essas gran-dezas. Um paralelo da vida corrente é a altitude de umlugar, definida em relação ao nível médio das águasdo mar, e as alturas dos degraus de uma escada.

Fig. 2 – Fotografia de uma micro-bomba de combustão. Este calorímetro, instalado num laboratório do IST, permite medir as entalpias decombustão de amostras com massas de cerca de 10-15 mg, o que possibilita investigar a energética de compostos que não se encontram dispo-níveis em grandes quantidades. Foi o caso do piracileno e, também, do C60 ambos referidos no texto.

Page 4: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

26

Ninguém com um mínimo de senso vai definir a alti-tude dos vários degraus, mas sim as alturas de cada umdeles, estabelecidas em relação ao solo ou à cota dodegrau anterior. É um pouco assim com as entalpiasdas moléculas: elas são arbitrariamente estabelecidasrelativamente às entalpias das moléculas dos seus ele-mentos constituintes, nos seus estados de referência,isto é os estados mais estáveis, à pressão de 1 bar e auma dada temperatura. Em geral, usa-se para esta tem-peratura 298,l5 K (25o C). Por exemplo, toma-se a en-talpia do metano igual à entalpia da reacção 5, umavez que os estados mais estáveis do hidrogénio e docarbono, naquelas condições (1 bar e 298,15 K), sãorespectivamente o gasoso e o sólido (grafite).

Desta descrição, um pouco maçadora mas neces-sária para os não iniciados no domínio da energéticadas moléculas, podem extrair-se duas conclusões im-portantes: (1) uma entalpia de formação é o conteúdoenergético de uma molécula (ou de uma mole), relati-vo às moléculas dos seus elementos constituintes;(2) a entalpia de qualquer reacção química pode ser cal-culada desde que sejam conhecidas as entalpias de for-mação de todos os reagentes e produtos (Σ indica umasoma):

C(grafite) + 2H2(g) → CH4(g) (5)

C(grafite) + 2H2(g) + 2O2(g) → CO2(g) + 2H2O( ) (8)

∆H(8) = ∆f Hom(CO2,g) + 2∆f H

om(H2O, )

- ∆f Hom(C,grafite) - 2∆f H

om(H2,g) - 2∆f H

om(O2,g)

= ∆f Hom(CO2,g) + 2∆f H

om(H2O, ) (9)

Uma vez que a entalpia desta reacção se refere àformação do metano a partir dos seus elementos cons-tituintes, chama-se-lhe entalpia de formação do me-tano. E, uma vez que ela foi definida nas condiçõespadrão referidas acima, acrescenta-se-lhe a palavrapadrão.

As entalpias de formação padrão (ou, mais abre-viadamente, entalpias de formação), embora não te-nham significado físico, reflectem pois o conteúdoentálpico das moléculas, relativamente aos seus ele-mentos constituintes, cujas entalpias de formação pa-drão se tomam arbitrariamente iguais a zero. Podemrepresentar-se pelo símbolo ∆Ho

f , ou, mais moderna-mente, por ∆f Ho

m (onde “o” indica o estado padrão e“m” significa que se trata de uma grandeza definidapara uma mole da substância em causa).

Não é fácil determinar experimentalmente a ental-pia da reacção 5. Assim, a entalpia de formação do me-tano não é directamente acessível. No entanto, oproblema pode ser resolvido recorrendo à medida la-boratorial das entalpias das reacções 6 e 7, respectiva-mente a combustão do hidrogénio e da grafite. Essasentalpias não são mais que as entalpias de formaçãoda água e do dióxido de carbono.

Obtém-se ∆ f Hom(H2O, ) = -285,83 ± 0,04 e

∆ f Hom(CO2 ,g) = -393,51 ± 0,13 kJ/mol (o valor que

se segue ao ‘‘±” indica a incerteza do resultado expe-rimental). É agora simples calcular o valor da entalpiade formação do metano, igual à entalpia da reacção5. Primeiro soma-se duas vezes a entalpia da reacção6 [ou 2∆f H

om (H2O, )] com a entalpia da reacção 7 [ou

∆f Hom (CO2, g)], o que equivale à entalpia da reacção

8. Finalmente, subtrai-se deste resultado o valor ex-perimental da entalpia de combustão do metano (reac-ção 2). Chega-se à entalpia da reacção 5, ou seja∆f H

om (CH4,g) = -74,4 ± 0,4 kJ/mol. Esta metodologia

vem resumida nas equações 9 e 10.

H2(g) + 1/2 O2(g) → H2O( ) (6)

C(grafite) + O2(g) → CO2(g) (7)

∆H(2) = ∆f Hom(CO2,g) + 2∆f H

om(H2O, ) - ∆f H

om(CH4,g)

- 2∆f Hom(O2,g) = ∆H(8) - ∆f H

om(CH4,g) (10)

∆Hreacção = Σ∆f Hom(produtos) - Σ∆f H

om(reagentes) (11)

A importância prática da segunda conclusão é enor-me. Dado o número virtualmente infinito de reacçõesquímicas possíveis, seria estulto pensar-se na viabili-dade de determinar experimentalmente a variação deentalpia para todas elas... O acesso a uma base de da-dos de entalpias de formação de moléculas diminuiconsideravelmente o problema, uma vez que esses va-lores permitem calcular a entalpia de muitas reacçõesque não foram objecto de estudo no laboratório. Mes-mo assim, embora a variedade de moléculas existen-tes seja obviamente muito inferior à de reacções, éimpossível conhecerem-se experimentalmente as en-talpias de formação de todas! Daí a necessidade de sedesenvolverem métodos de previsão para valores deentalpias de formação que são desconhecidos. Em bre-ve voltaremos a este assunto.

Regressemos agora ao problema da utilização in-dustrial do metano. Como se disse, haveria imenso in-teresse em transformar este gás num produto líquidoà temperatura ambiente, menos dispendioso de trans-portar até aos locais onde existe tecnologia para pos-teriores transformações. Um produto adequado seria,por exemplo, o metanol, CH3OH, normalmente pro-duzido através do chamado “gás de síntese’’ (monó-xido de carbono e hidrogénio), o qual é por sua vezobtido por gaseificação do carvão em presença de va-por de água e oxigénio. Poder-se-ia, para tal, imaginara reacção

A entalpia de formação do metanol no estado

CH4(g) + 1/2 O2(g) → CH3OH( ) (12)

Page 5: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

27

líquido é conhecida (- 239,1 ± 0,3 kJ/mol), o que, jun-tamente com a entalpia de formação do metano(- 74,4 ± 0,4 kJ/mol), permite calcular a entalpia dareacção 12 : - 164,7 kJ/mol. Sendo um processo mui-to exotérmico (∆H muito menor que zero, ou seja areacção liberta calor), a variação de energia de Gibbsvai ser também bastante negativa (embora neste casoT∆S= - 48,3 kJ/mol a 298 K seja significativo), logopode prevêr-se que praticamente todo o metano vaiser convertido em metanol. Infelizmente, não é assim:o metano prefere reagir com o oxigénio de acordo coma equação 2, a qual é, como podemos ver, 726 kJ/molmais exotérmica. Por outras palavras, o metano reagede forma a que os produtos da reacção tenham o me-nor conteúdo energético possível.

O conhecimento das entalpias de formação de rea-gentes e produtos permite-nos pois prevêr qual ouquais as reacções que vão dominar um dado proces-so: em princípio serão as mais exotérmicas. Em casosmais difíceis de decidir (por exemplo, valores de ∆Hsemelhantes) é necessário ter em conta a contribuiçãode T∆S. Estes termos são aliás essenciais se se preten-de determinar o rendimento de cada reacção, ou sejaa percentagem de reagente que se transforma em de-terminados produtos, a qual se relaciona de forma sim-ples com ∆G . Este assunto, embora obviamenteimportante, não será explorado no presente artigo.

Convém ainda referir que, embora a conversão dometano não possa concretizar-se eficazmente por me-ra reacção do gás com oxigénio, ela é possível atravésde esquemas reaccionais bem diferentes, mediante ouso de catalisadores1 e de oxidantes suaves. Este é,aliás, um assunto fascinante, e constitui um dos tópi-cos de investigação mais “quentes” da química dehoje.

Adivinhas, AdivinhasFundamentadas e Estimativas

Uma das características mais notáveis da língua in-glesa é a sua capacidade para, de forma sintética, tra-duzir rigorosamente uma ideia complexa. É o caso daexpressão “educated guess”, que aqui foi traduzida por“adivinha fundamentada”, mas que – como quasesempre acontece nas línguas latinas – requer uma ex-plicação adicional. Embora possa ter significados maissofisticados, uma adivinha é simplesmente uma pre-visão sem qualquer base que a sustente (“wild guess”).Pelo contrário, uma adivinha fundamentada baseia-sena intuição e na experiência adquirida, embora as li-gações com o facto a adivinhar possam ser tão ténuesque dificilmente sejam explicadas. Em Ciência, as adi-vinhas fundamentadas têm um papel crucial, uma vez queultrapassam a mera aplicação dos modelos e dosresultados conhecidos e permitem descobrir o que érealmente novo.

Seria interessante continuar a discussão anterior,mas não é esse o nosso objectivo. Ela só foi invocadapara salientar um terceiro grau de adivinhação – a es-timativa – que é, como vimos atrás, muito importan-te no domínio da energética das moléculas, uma vezque nos permite prevêr com rigor as entalpias de for-mação de muitas moléculas que não foram objecto deestudo laboratorial. Quando se fala em estimativa ouem previsão, pensa-se imediatamente num método oumodelo que nos permita calcular, tanto quanto possí-vel de forma simples, os valores daquelas grandezas.

As entalpias de formação de muitas moléculas po-dem, felizmente, ser estimadas através de vários mé-todos. A descrição destes modelos seria fastidiosa ebastaria dizer que existem, não fora a sua aplicação naanálise de um problema extremamente interessante: arelação entre a energia e a estrutura das moléculas.

1 – Ver o artigo Catálise e Catalisadores, de A. Romão Dias no núme-ro 3 do Colóquio-Ciências.

Fig. 3 – Entalpias de formação de vários alcanos, representadas emfunção do número de átomos de carbono da cadeia. Os desvios àlinearidade (metano e alcanos de cadeia ramificada) são explicadosno texto.

A Figura 3 mostra-nos uma representação das entalpiasde formação de alguns hidrocarbonetos saturados (al-canos) em função do número de átomos de carbono.Pode observar-se que os valores para as moléculas decadeia linear de átomos de carbono.

caem, de forma perfeita, numa recta, enquanto que osde cadeia ramificada, como o isobutano,

têm entalpias de formação inferiores às que se preve-riam com base na recta e no respectivo número de áto-mos de carbono. Isto significa que a existência decadeias ramificadas confere uma estabilidade adicio-nal às moléculas. Por exemplo, as entalpias de forma-

CH3 CH2... ...CH2 CH3

CH3 CH CH3

CH3

Page 6: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

28

ção do butano linear e ramificado indicam-nos que aentalpia da reacção 13 (isomerização na fase gasosa)é igual a - 8,6 kJ/mol.

mais fortes (ou mais energéticas) que as secundárias.Nada mais fácil: a recta da Figura 3 foi construída combase nos alcanos lineares – logo envolvendo apenasligações C-C, C-H primárias e C-H secundárias. Porexemplo, para o etano (CH3CH3) e para o propano(CH3CH2CH3) é fácil ver que:

Qual é a origem desta estabilização do isobutanoem relação ao seu análogo de cadeia linear? Atenden-do a que ambas as moléculas têm o mesmo número deátomos de carbono e de hidrogénio, a resposta só po-de ser que o conjunto das ligações químicas no isobu-tano é mais estável que no butano. Mas uma ligaçãoquímica estável é uma ligação forte, ou seja, é neces-sário gastar muita energia (ou entalpia) para quebrá--la. Assim, por outras palavras, a soma das entalpiasde ligação no isobutano terá que ser 8,6 kJ/mol maiorque no butano. Para avançarmos um pouco mais, te-mos que definir quais os tipos de ligações presentesnuma e noutra molécula. Cada átomo de carbono numhidrocarboneto saturado, de fórmula geral Cn H2n+2,tem sempre quatro ligações simples; se três dessas li-gações se fazem com átomos de hidrogénio, o átomode carbono diz-se primário; se duas são com átomosde hidrogénio (logo, as outras duas com átomos de car-bono), o átomo de carbono em causa é secundário;se o átomo de carbono está ligado a um único átomode hidrogénio (e três de carbono), chama-se terciário;finalmente, chama-se quaternário a um átomo de car-bono ligado a quatro outros átomos de carbono. Nobutano temos seis ligações C-H primárias (dois gruposCH3), quatro ligações C-H secundárias (dois gruposCH2) e três ligações C-C. O isobutano é constituídopor nove ligações C-H primárias, uma ligação C-H ter-ciária e três ligações C-C. Assim, a entalpia que tería-mos de gastar para quebrar todas as ligações em cadauma das moléculas (a chamada entalpia de atomiza-ção, ∆Hatom) poderá ser calculada pelas equações 14 e15, onde o símbolo E representa a entalpia das liga-ções e os índices “p”, “s” e “t” indicam se a ligaçãoC-H é primária, secundária ou terciária.

CH3 CH2 CH2 CH3 → CH3 CH CH3

(13)CH3

∆Hatom(butano) = 6E(C-H)p + 4E(C-H)s + 3E(C-C) (14)

∆Hatom(isobutano) = 9E(C-H)p + E(C-H)t + 3E(C-C) (15)

Se admitirmos, em primeira aproximação, que asentalpias das ligações C-C são constantes, concluímosque a origem da estabilização do isobutano, 8,6 kJ/mol,é essencialmente devida ao maior número de ligaçõesC-H primárias:

8.6 kJ/mol = ∆Hatom(isobutano) - ∆Hatom(butano)

= 3E(C-H)p - 4E(C-H)s + E(C-H)t (16)

Para continuarmos esta espécie de jogo, temos deconfirmar se, de facto, as ligações C-H primárias são

∆Hatom(propano) - ∆Hatom(etano)

= 2E(C-H)s + E(C-C) (17)

obtendo-se idêntico resultado para os pares (propano,butano), (butano, pentano), (pentano, hexano), etc.Ora as entalpias de atomização são grandezas facilmen-te calculáveis através das entalpias de formação do al-cano respectivo e dos seus átomos constituintes na fasegasosa, por exemplo,

C2H6(g) → 2C(g) + 6H(g) (18)

É assim possível, utilizando valores experimentaisde entalpias de formação de alcanos lineares e ramifi-cados, construir um sistema de equações que conduzaos valores de E(C-H)p, E(C-H)s, E(C-H)t, e E(C-C). Osresultados confirmam a conclusão extraída sobre a cau-sa da maior estabilidade do isobutano face ao seu isó-mero linear: E (C-H)p = 410,8 kJ/mol, E (C-H)s = 407,0kJ/mol, E (C-H)t = 403,9 kJ/mol e E (C-C) = 357,6kJ/mol. Notemos, finalmente, que o metano, CH4 ,também se situa abaixo da recta da Figura 3. A estabi-lização extra do metano reflecte-se no valor deE(C-H) = 415,8 kJ/mol, superior a E(C-H)p.

A discussão anterior foi deliberadamente detalha-da porque é necessário compreender bem as regras dojogo para o poder criticar. E o jogo é, como vimos,tão simples como útil: apenas com base nos quatro pa-râmetros definidos, as três entalpias de ligação C-H ea entalpia de ligação C-C, podemos prevêr as entalpiasde atomização (logo, as entalpias de formação) de to-dos os alcanos! Conseguimos também explicar porqueé que alcanos ramificados são mais estáveis que os seusisómeros lineares (são indicados mais dois casos na Fi-gura 3). O que convém salientar é que os parâmetrosa que chamámos entalpias de ligação têm um signifi-cado físico difícil de compreender: o processo de que-bra simultânea de todas as ligações de uma moléculaé meramente conceptual e, como veremos adiante, nãoé lícito identificar um desses parâmetros com a verda-deira entalpia de ligação química, ou seja com a ental-pia gasta para quebrar uma só ligação. Com o objectivode evitar confusões, chamar-lhes-emos, a partir de ago-ra, termos de entalpia de ligação ou simplesmente ter-mos de ligação.

A utilidade dos termos de entalpias de ligação, umconceito proposto nos anos 50 por um químico cana-

∆H(18) = ∆Hatom(etano) = 2∆f Hom(C,g) + 6∆f H

om(H,g)

- ∆f Hom(C2H6,g) (19)

Page 7: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

29

diano, Keith Laidler, não se restringe, evidentemen-te, aos alcanos. Aplica-se, em princípio, a quaisquermoléculas. É apenas necessário que sejam conhecidossuficientes valores experimentais de entalpias de for-mação para que se possam calcular os termos de en-talpia de ligação adequados. É o caso, por exemplo,dos álcoois (Figura 4), onde, para além dos termos de-finidos para os alcanos, há que ter em conta E(C-O)e E(O-H).

tensão. Nos alcanos não cíclicos, as quatro ligações quí-micas centradas em cada átomo de carbono têm umageometria tetraédrica, ou seja fazem ângulos de cercade 109o entre si. Esta situação ideal (que correspondeao que os químicos chamam uma hibridação sp3) es-tá longe de verificar-se no ciclopropano, onde os ân-gulos entre duas ligagões C-C são apenas de 60o. Assim,aquela enorme destabilização (110 kJ/mol) podia serantecipada.

Será igualmente previsível que as tensões nas liga-ções do ciclobutano, C4H8, e no ciclopentano, C5H10,moléculas que têm a configuração de um quadrado ede um pentágono regular, respectivamente,

Fig. 4 – Uma representação semelhante à da Figura 3: entalpias deformação de álcoois alquílicos em função do número de átomos decarbono da cadeia. Os quadrados negros indicam cadeias lineares.

Existem outras possibilidades, ou outros métodos,para se estimarem, com rigor, entalpias de formaçãode moléculas orgânicas, mas o que descrevemos é su-ficiente para o nosso objectivo imediato: continuar arelacionar a estrutura e a energética de algumas mo-léculas.

Energética e Estrutura:Tensão das Ligações Químicas.

Consideremos a molécula do ciclopropano, forma-da por três grupos CH2 ligados segundo um triânguloequilátero:

A entalpia de formação desta molécula na fase ga-sosa é 53,3 ± 0,6 kJ/mol. O número não nos diz mui-to, mas se o utilizarmos para calcular a entalpia deatomização, 3 405 kJ/mol, podemos comparar este va-lor com o que poderíamos prevêr com base nos ter-mos de entalpia de ligação 6E(C-H)s + 3E(C-C) obtidosacima, ou seja 3 515 kJ/mol. A diferença, 110 kJ/mol,traduz a destabilização do ciclopropano face a uma mo-lécula imaginária, contendo o mesmo número de liga-ções C-C e C-H, mas onde estas não estivessem sob

sejam inferiores à do ciclopropano. De facto assim é.As entalpias de formação destas duas moléculas,28,4 ± 0,6 kJ/mol e - 76,4 ± 0,8 kJ/mol, juntamentecom os termos E (C-C) e E (C-H)s, conduzem a destabi-lizações de 104 kJ/mol e 18 kJ/mol. O pequeno valorno caso do ciclopentano reflecte o facto de os ângu-los entre as suas ligações C-C serem de 108o, logo jábastante próximos dos verificados nos alcanos não--cíclicos.

Se o ciclohexano, um hexágono regular, fosse pla-no, os ângulos entre as ligações C-C seriam de 120o

e assim esperar-se-ia uma maior destabilização que nocaso do ciclopentano. No entanto, a entalpia de for-mação do C6H12, - 123,4 ± 0,8 kJ/mol, conduz-nos auma entalpia de atomização que é coincidente com asoma 6E(C-C) + 12E(C-H)s, ou seja, a uma total ausên-cia de tensão nas ligações. Este resultado é consisten-te com a geometria real da molécula, que não é planamas antes adopta configurações onde as quatro liga-ções centradas em cada carbono formam ângulos te-traédricos. As duas possibilidades, “barco” e“cadeira”, são as seguintes (os átomos de hidrogénionão serão representados de agora em diante):

Todos os exemplos anteriores são conhecidos dequalquer iniciado em Química. Mas recordá-los nãodeixa de ser um exercício interessante, até porque nospermite abordar casos de moléculas menos clássicase com geometrias interessantes. O biciclobutano,

Page 8: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

30

C4H6, e o espiropentano, C5H8, ambas definindo doistriângulos,

Os exercícios anteriores são suficientes para ilus-trar a relação entre a geometria das ligações químicase a sua energética. O conhecimento detalhado das re-gras do jogo permite-nos, por exemplo, estimar o con-teúdo energético de moléculas cujas entalpias deformação não foram determinadas experimentalmen-te. Um exemplo, apenas: é previsível que o (1, 1, 1) -- propelano, C5H6,

têm entalpias de formação na fase gasosa iguais a 217,2e 185,1 kJ/mol. Um exercício idêntico aos anterioresconduz a destabilizações semelhantes em ambos os ca-sos: 266 e 259 kJ/mol, respectivamente. No entanto,estes valores são mais do dobro do resultado obtidopara o ciclopropano (110 kJ/mol), formado por um sótriângulo! Outro caso curioso é o do prismano, C6H6,um isómero do benzeno, assim chamado porque temuma forma prismática, e um dos raros hidrocarbone-tos não substituídos que é explosivo quando puro:

A sua entalpia de formação, estimada em 534 kJ/mol,conduz a uma destabilização de 568 kJ/mol (!), supe-rior em cerca de 36 kJ/mol à destabilização de dois ci-clopropanos e três ciclobutanos. Finalmente, o cubano(em forma de cubo), C8H8,

cuja entalpia de formação é de 622 kJ/mol, tem umaentalpia de destabilização de 667 kJ/mol, aproximada-mente 43 kJ/mol maior que a destabilização de seis ci-clobutanos. Ao contrário do prismano, o cubano nãoé explosivo. À primeira vista este resultado parece im-compatível com a maior destabilização do cubano. Noentanto, é preciso não esquecermos que a destabiliza-ção reflecte-se nas ligações químicas entre os átomose que, quanto maior for o número destas ligações, mais“distribuído” se torna o excesso de entalpia. É por is-so que muitas vezes se prefere falar em destabilizaçãopor ligação ou mesmo em destabilização por átomode carbono. Para o prismano a destabilização por li-gação é igual a 568/9 = 63 kJ/mol, enquanto que no ca-so do cubano ela é igual a 667/12 = 56 kJ/mol.

uma molécula cuja geometria lembra uma hélice (“pro-peller”), tenha uma entalpia de destabilização por li-gação pelo menos igual à do biciclobutano (266/5 = 53kJ/mol), ou seja, as suas sete ligações corresponderãoa uma entalpia de destabilização de 7 x 266/5 = 372kJ/mol. Só nos resta repetir o processo utilizado nosexercícios acima, mas agora em sentido inverso, parachegarmos a um valor mínimo da entalpia de forma-ção do propelano na fase gasosa: 318 kJ/mol.

Existem outros métodos, alguns um pouco mais so-fisticados que o que temos vindo a descrever, para ava-liar a destabilização das moléculas devida a geometriasdesfavoráveis. Não há contudo modo totalmente se-guro de prevêr se uma dada molécula é suficientementeestável para poder ser sintetizada e isolada. É óbvio queuma molécula com uma grande destabilização por li-gação será provavelmente muito instável, mas é neces-sário não esquecer que a reacção de decomposiçãodessa molécula, originando produtos energeticamen-te mais favoráveis, pode ser inibida por uma grandebarreira de activação2. Será o caso da decomposiçãodo propelano, cuja elevada entalpia de destabilizaçãolevou inclusive à previsão de que não se conseguiriaisolar esta molécula. Não só tal foi possível, em 1982,como se constatou a sua razoável “estabilidade”!

Energética e Estrutura: Aromaticidade

Se o conhecimento dos termos de entalpia de liga-ção nos pode antecipar a destabilização de uma molé-cula relativamente a uma dada referência (ligações

∆Hatom(propelano) = 7E(C-C) + 6E(C-H)s - 372 =

4573 kJ/mol = 5∆f Hom(C,g) + 6∆f H

om(H,g)

- ∆f Hom(propelano, g) (20)

2 – Ver o artigo Reacções Químicas, de Sebastião J. Formosinho, nonúmero 5 do Colóquio-Ciências. Ver também a Caixa 4 do presenteartigo.

Page 9: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

31

químicas não sujeitas a tensões), pode pensar-se quea situação inversa, ou seja, a avaliação da estabiliza-ção também será possível. E, de facto, assim é. A aro-maticidade das moléculas (ver Caixa 3) pode seraferida através de um método semelhante ao descri-to. A única diferença é que agora a entalpia de forma-ção calculada com os termos de ligação vai ser superiorao valor experimental, isto é a molécula tem um con-teúdo entálpico menor (é mais estável) que o espera-do. O caso clássico é o do benzeno, C6H6 , umamolécula plana cujas ligações não estão sujeitas a ten-são, uma vez que formam entre si ângulos de 120°(exactamente o valor exigido por hibridações sp2). Seo anel benzénico tivesse a estrutura

Ora se a molécula de benzeno tivesse a geometria dohipotético ciclo-hexatrieno, seria de esperar que a suaentalpia de hidrogenação fosse exactamente três ve-zes maior (três ligações duplas) que a do ciclo-hexeno(uma ligação dupla), ou seja -355,2 kJ/mol. Mas a hi-drogenação do benzeno só liberta 206,0 kJ/mol, o quesignifica que a molécula é cerca de 149 kJ/mol maisestável do que seria de esperar. Está encontrada a ener-gia de ressonância do benzeno, pelo menos em primei-ra aproximação.

A estimativa da aromaticidade de moléculas é umassunto fascinante, mas torna-se complicado, em es-pecial quando as moléculas são estabilizadas por res-sonância mas simultaneamente são destabilizadasdevido à existência de tensões nas ligações. Por exem-plo, não é trivial calcular (e individualizar) o efeito daaromaticidade e da destabilização (esta devida aos anéisde cinco membros) na molécula do piracileno, C14H8,

observar-se-ia que os comprimentos das três ligaçõesC-C seriam maiores que os das três ligações C=C. Aexperiência mostra-nos, todavia, que as seis ligaçõessão idênticas, e a Química Teórica fornece-nos uma ex-plicação detalhada desta observação. A entalpia de res-sonância do benzeno, que mede o grau dearomaticidade da molécula, pode ser estimada com-parando a sua entalpia de formação, ∆f H

om(C6H6,g) =

82,6 kJ/mol, com a entalpia de formação da moléculahipotética do ciclo-hexatrieno representada acima. Masque termos de ligação vamos utilizar? Para além deE(C-C) e E(C-H), que já definimos, será necessário co-nhecer mais termos: por exemplo, um corresponden-te a uma ligação dupla carbono-carbono, E (C=C), ooutro que reflicta a ligação entre um carbono de umaligação dupla e hidrogénio, E(Cd-H). Embora esses va-lores existam, obtidos, tais como os que vimos ante-riormente, com base no conhecimento experimentalde entalpias de formação de muitas moléculas, no ca-so presente não são necessários. A solução mais sim-ples para avaliar a entalpia de ressonância do benzenoconsiste em comparar a sua entalpia de hidrogenaçãocom a entalpia de hidrogenação do ciclo-hexeno,C6H10. Como se vê na reacção 21, em ambos oscasos o produto é a molecula de ciclohexano eas respectivas entalpias de reacção, -206,0 e -118,4kJ/mol, calculam-se facilmente através dos valoresexperimentais das entalpias de formação,∆ f H

om(C6H6,g) = 82,6, ∆ f H

om(C6H10,g) = -5,0 e

∆f Hom(C6H12,g) = -123,4 kJ/mol.

com base no valor experimental da sua entalpia de for-mação, determinado recentemente com o micro--calorimetro de combustão da Figura 2. Mais compli-cado ainda, será avaliar os mesmos efeitos numa espé-cie de “poli-piracileno” - o célebre buckminsterful-lereno ou futeboleno, C60.

Não vamos desenvolver mais este assunto tão vas-to. O que se disse é suficiente para ilustrar um dos mé-todos favoritos para estimar a ressonância de moléculas

Page 10: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

32

orgânicas – a determinação de entalpias de hidroge-nação – e, talvez, para estimular a consulta de arti-gos onde o problema seja tratado em maiorprofundidade (ver sugestões de leitura).

Energias de Dissociação:Do Hidrogénio à Vitamina E

As técnicas calorimétricas clássicas, como os calo-rímetros de combustão (Figuras 1 e 2), são adequadaspara determinar entalpias de formação de moléculascom tempos de vida longos, ou seja, moléculas cujaestabilidade nos permite manuseá-las durante minutos,horas, ou anos... É assim possível, para muitas delas,determinar entalpias de formação e, como vimos, pre-vêr estas grandezas para muitas outras que não foramobjecto de estudo experimental. Como poderemos co-nhecer a energética de moléculas transientes, ou sejaespécies com tempos de vida por exemplo da ordemdo mili-segundo ou do micro-segundo? Isto pode pa-recer irrelevante, porque, afinal de contas, lidamoscom moléculas estáveis. No entanto, o mecanismo dasreacções químicas, o modo como os reagentes origi-nam os produtos, envolve muitas dessas espécies tran-sientes. Por exemplo, a "simples" reacção de oxidaçãodo metano (reacção 2) não ocorre por mera interac-ção (colisão) entre uma molécula de CH4 e duas mo-léculas de O2: o mecanismo é muito mais complexoe inclui dezenas de passos elementares (colisões reac-tivas entre moléculas) envolvendo uma variedade deespécies transientes. Por outras palavras, o conheci-mento das entalpias de formação do metano, do dió-xido de carbono e da água dá-nos informação sobrea energética inicial e final do processo, mas nada nosdiz sobre a energética do percurso. E esta é obviamenteimportante para os químicos. Ignorá-la seria um pou-co como construir uma estrada entre dois locais semantes se procurar optimizar o traçado. Ora uma dasmaiores utilidades na compreensão detalhada dos me-canismos das reacções químicas é exactamente conse-guir optimizar as condições experimentais em que essasreacções ocorrem e mesmo arranjar percursos alter-nativos com o auxílio de catalisadores.3

Regressemos ao exemplo da combustão do meta-no. A reacção 22 é um dos passos elementares dessacombustão e envolve três radicais livres (moléculascom pelo menos um electrão desemparelhado). Paracalcular a variação de entalpia que lhe está associada(equação 23) é necessário conhecer as entalpias de for-mação daquelas espécies transientes.

3 – Vd, nota 1.

CH4(g) + O�(g) → CH3�(g) + OH�(g) (22)

∆H(22) = ∆f Hom(CH3

�, g) + ∆f Hom(OH�, g)

- ∆f Hom(CH4, g) - ∆f H

om(O�, g) (23)

Caixa 3 - Aromaticidade

Embora o significado químico moderno de aro-maticidade nada tenha a ver com aroma, na origemda palavra está o facto de que muitas das moléculasresponsáveis por sensações olfactivas são (quimica-mente) aromáticas. Já no final do século XIX se ex-plicava a fraca reactividade de moléculas cíclicas,como o benzeno, pela existência de ligações simplese duplas, dispostas alternadamente. Esta alternânciapermite “desenhar” as ligações duplas no lugar dasligações simples (e vice-versa). Tal conferiria,acreditava-se então, uma estabilidade adicional à mo-lécula (logo, tornava-a menos reactiva). O caso dobenzeno é paradigmático: como se refere no texto,todas as ligações carbono-carbono têm comprimen-tos iguais. Se a estrutura da molécula fosse a que semostra (três ligações duplas alternadas com três sim-ples), as ligações C=C, mais fortes que as C–C, se-riam mais curtas. É precisamente devido às duaspossibilidades equivalentes de desenhar as ligaçõesduplas na molécula de benzeno que se utiliza o gra-fismo mostrado por exemplo na equação 21 – a cir-cunferência inscrita no hexágono traduz adeslocalização (a não-localização) das ligações. Des-localização e aromaticidade são, no entanto, doisconceitos distintos. Uma molécula com ligações des-localizadas não é necessariamente aromática. É o ca-so do ciclobutadieno, C4H4, que se pode escrever

Esta molécula, para além de estar destabilizadadevido à sua geometria desfavorável (os ângulos en-tre os átomos de carbono são de 90° e não de 120°),diz-se anti-aromática: a energia de ressonância énula. A energia de ressonância é a diferença entrea energia da molécula hipotética com as ligações lo-calizadas (à esquerda) e a energia da molécula comas ligações deslocalizadas (à direita).

A classificação moderna das moléculas em aro-máticas e anti-aromáticas é devida a Hückel e ape-nas pode ser compreendida com base numadescrição detalhada das ligações químicas (feita como auxílio da Mecânica Quântica). Do ponto de vistaprático, no entanto, essa análise conduz à conclu-são que uma molécula que tenha 4n + 2 electrões π,sendo n um número inteiro, é aromática (como obenzeno), enquanto se tiver 4n electrões π diz-seanti-aromática. Os electrões π (um por cada átomode carbono que tenha uma ligação dupla; 6 no ben-zeno e 4 no ciclobutadieno), são os responsáveis pe-las ligações químicas deslocalizadas, que por isso sechamam também ligações π.

ou

Page 11: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

33

A entalpia de formação do radical hidroxilo, OH�, po-de ser obtida desde que se saiba a entalpia de disso-ciação da ligação O-H da água (ou seja a entalpia dareacção 24), representada por D(HO-H); a entalpia deformação do radical metilo, CH3

�, pode ser calcula-da se se achar a entalpia de dissociação da ligação C-Hdo metano (a entalpia da reacção 26), D(H3C-H); fi-nalmente, a entalpia de formação do radical O� é iguala metade da entalpia de dissociação do O2. Como sevê pelas equações 25 e 27, necessitamos também co-nhecer a entalpia de formação do átomo H�, que sepode obter através da entalpia de dissociação H-H damolécula de hidrogénio.

entre eles - logo é preciso fornecer energia para ven-cer essa repulsão (parte esquerda da curva); por outrolado, para estender e eventualmente quebrar a ligaçãotambém é necessário fornecer energia (parte direita dacurva). O ponto mais estável, correspondendo a umequilíbrio entre atracção e repulsão, acontece parar = re. A Mecânica Quântica ensina-nos que, ao contrá-rio de uma mola, a energia de vibração de uma liga-ção química não pode tomar quaisquer valores, entreV = 0 e V = De. Alguns dos valores da energia permiti-dos estão assinalados na Figura 5 (v = 0, 1, 2,. . .) .Observa-se que a diferença entre as energias de doisníveis consecutivos decresce à medida que a energiaaumenta, de tal modo que no limite da dissociação es-sa diferença é nula. Assim sendo, somando todas as di-ferenças, é fácil calcular De. Para o caso do H2

obtém-se 458 kJ/mol.

O caso conceptualmente mais simples da determi-nação de uma entalpia de dissociação é o de uma mo-lécula diatómica como o H2. Se imaginarmos que aligação entre os dois átomos de hidrogénio vibra co-mo uma mola, podemos pensar na dissociação comocorrespondendo à quebra da mola quando a sua ex-tensão atinge um dado valor. A energia da molécula(ou da mola) é assim função da extensão e esta depen-dência pode ser expressa de uma forma aproximadapor uma equação do tipo da representada na Figura5 - o chamado potencial de Morse:

V é energia potencial do oscilador, De a energia dedissociação espectroscópica (assim chamada porquese determina com base em técnicas espectroscópicas),re a distância entre os dois átomos no ponto mínimoda curva, e a é uma constante que depende da frequên-cia de vibração (número de oscilações por segundo),υ, da energia de dissociação e da massa dos átomos.O facto de a curva da Figura 5 passar por um mínimoé facilmente explicável. Por um lado, se os átomos dehidrogénio são comprimidos um contra o outro, a par-tir de uma certa distância predominará a repulsão

H2O(g) → OH�(g) + H�(g) (24)

∆f Hom(OH�, g) = ∆f H

om(H2O, g) + D(HO-H)

- ∆f Hom(H�, g) (25)

CH4(g) → CH3�(g) + H�(g) (26)

∆f Hom(CH3

�, g) = ∆f Hom(CH4, g) + D(H3C-H)

- ∆f Hom(H�, g) (27)

O2(g) → 2O�(g) (28)

∆f Hom(O�, g) = D(O-O)/2 (29)

H2(g) → 2H�(g) (30)

∆f Hom(H�, g) = D(H-H)/2 (31)

V = De [1 - e -a(r-re)]2 (32)

Fig. 5 – A curva de Morse para o caso do hidrogénio. As linhas ho-rizontais dentro do "fosso" representam as energias de vibração per-mitidas da molécula. São indicadas pelo número quântico devibração, v = 0, 1, 2,... Como se explica no texto, Do é a energiade dissociação do H2 ao zero absoluto.

O método que acabou de se descrever pode ser apli-cado com maior ou menor aproximação, consoante aexpressão que se utilize para representar a energia dosníveis vibracionais. O caso mais simples baseia-se nopotencial de Morse, referido acima, e é conhecido co-mo o método de Birge-Sponer. Para os objectivos dopresente artigo, mais importante que explorar este as-sunto é salientar que o valor da energia de dissocia-ção em que estamos interessados não é nem De nema energia de dissociação química, Do , também indi-cada na Figura 5 e facilmente obtida a partir de De . Do

representa, como se vê, a diferença de energia entreo limite da dissociação e o primeiro nível de energiavibracional. Por outras palavras, como o mínimo deenergia vibracional que as moléculas de hidrogénio po-dem ter é a do nível v = 0, Do (e não De) correspondede facto à energia que é necessário fornecer à molécu-la de H2 para a dissociar. A única questão é que estevalor de Do (432,0 kJ/mol no caso em estudo) se re-fere à temperatura do zero absoluto e não a

Page 12: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

34

298 K, temperatura de referência para o cálculo dasentalpias de reacções. A conversão é porém imediata:basta conhecer as capacidades caloríficas (Cp) do H2 edo H� (calculáveis com grande rigor através dos algo-ritmos da Termodinâmica Estatística) e aplicar a equa-ção 33. Obtém-se D298 = 436,0 kJ/mol.

são dessas moléculas com um feixe de electrões deenergia conhecida. A radiação ou os electrões suficien-temente energéticos desencadeiam o processo esque-matizado na Figura 7. Como se vê, não só se quebraa ligação H3C-H como também se ioniza uma das es-pécies produzidas: é arrancado um electrão ao radicalCH3

�, formando-se o catião CH3+.

Variando a energia da radiação ou do feixe de elec-trões é possível medir a energia mínima capaz de pro-duzir CH3

+. Esta energia mínima chama-se energiade aparecimento do ião em estudo e representa-se porAE (CH3

+). Na Figura 8 mostra-se o aspecto geral deuma curva de aparecimento de um dado ião. Em or-denadas representa-se uma grandeza proporcional àquantidade dos iões que se formam e em abcissas aenergia da radiação ou do feixe de electrões. O valorde AE de um dado ião corresponde aproximadamen-te à abcissa para a qual a intensidade deixa de ser nula(limiar de detecção do ião).

O método espectroscópico de determinação de en-talpias de dissociação, doravante apenas designadaspor D e referidas a 298 K, é mais dificilmente aplicá-vel a moléculas com mais de dois átomos (muitas mo-las a oscilarem simultaneamente perturbam-se umas àsoutras...) e mesmo a moléculas diatómicas para as quaisnão existe informação sobre a energia dos níveis vi-bracionais. Felizmente que temos hoje ao nosso dis-pôr uma variedade de técnicas experimentais para esseobjectivo. Muitas delas são extremamente sofisticadase foram desenvolvidas na última década. Na Figura 6,onde se apresenta uma (tentativa de) sistematização dasmais importantes, é notória a importância da espec-trometria de massa neste campo. É precisamente atra-vés de algumas entre as muitas variantes deste métodoinstrumental que é possível obter as entalpias de for-mação dos radicais CH3

� e OH�, envolvidos na reac-ção 22.

Não é necessário entrar em detalhes técnicos de ins-trumentação para entender os fundamentos essenciaisda determinação de, por exemplo, ∆f H

om(CH3

�, g), porespectrometria de massa. Se uma molécula de metanoabsorver uma quantidade de energia suficiente,observa-se a quebra de uma (ou mais) das ligaçõesC-H. Essa energia pode ser fornecida por vários méto-dos, mas os mais vulgares consistem na absorção pe-las moléculas de metano de radiação electromagnéticacom um comprimento de onda adequado, ou na coli-

298

D298 = Do +∫ [2Cp (H�, g) - Cp (H2 , g)]dT (33)o

Fig. 7 – Ilustração esquemática da determinação da energia de dis-sociação C-H no metano através da medida da energia de apareci-mento do catião CH3

+ e da energia de ionização adiabática doradical CH3

�.

Fig. 6 – Sistematização de algumas das técnicas utilizadas para o estudo da energética de moléculas e de reacções químicas.

Page 13: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

35

Como se vê na Figura 7, para obter o valor da en-talpia da reacção 26,

D (CH3 -H) = AE (CH3+) - IE (CH3

�) (34)

e daí calcular a entalpia de formação do CH3�, é ain-

da necessário saber a energia envolvida na ionizaçãodeste radical, conhecida como energia de ionizaçãoadiabática e representada por IE (CH3

�). A energia deionização adiabática (a energia mínima para se arran-car um electrão ao radical metilo a zero kelvin) é nor-malmente medida através de uma técnica chamadaespectroscopia do fotoelectrão (“photoelectron spec-troscopy”, PES; ou UV-PES quando a radiação ionizan-te é ultravioleta), a qual se baseia num princípio muito se-melhante ao de uma célula fotoeléctrica.

das foi o favorito para investigar a energética de espé-cies transientes, neutras ou iónicas. Embora continuea ser utilizado, existem hoje outras técnicas que em ge-ral proporcionam valores mais fiáveis de energias dedissociação, em particular no caso de espécies neutras.São vários os problemas associados à medida de ener-gias de aparecimento, estando a discussão deste assun-to fora do âmbito do presente texto. Apenas se refere,como exemplo, uma possível fonte de erro. Os iõesformados por acção do feixe de radiação ou de elec-trões podem ser produzidos não no estado fundamen-tal (estado de mais baixa energia) mas num estadoexcitado. Se assim for, o valor medido para a energiade aparecimento será um majorante do verdadeiro va-lor, uma vez que se gastou mais energia que a necessá-ria para produzir o ião no estado fundamental. Comose vê pela equação 34, o valor obtido para a energiade dissociação será também um majorante.

Entre as técnicas sistematizadas na Figura 6, as decinética em fase gasosa são das mais utilizadas para in-vestigar a energética de radicais. Consideremos um ra-dical alquilo, R�, que pode ser produzido a partir deum alcano, por abstracção de um átomo de hidrogé-nio (o metano dá origem ao metilo, o etano ao etilo,o propano ao propilo, etc). Esta abstracção do átomode hidrogénio é frequentemente feita com o auxílio deum átomo de halogénio, como o iodo:

O procedidento que muito resumidamente acabá-mos de descrever – medida de energias de apareci-mento de iões e de energias de ionização deradicais – ilustra um dos métodos que durante déca-

Fig. 8 – Curva de aparecimento de um ião. A intensidade é pro-porcional à quantidade de iões formados e cresce com a energia dosfotões (ou electrões) do feixe incidente. No entanto, se se aumentarmuito esta energia, a intensidade irá eventualmente diminuir, devi-do ao facto de, nessas condições, a energia ser suficiente para pre-ferencialmente se quebrar mais do que uma ligação C-H no metano(esta parte da curva não é mostrada na figura). O início da detecçãodos iões (parte inicial da curva) marca aproximadamente a energiade aparecimento do ião, a partir do precursor neutro.

O estudo da variação da constante de velocidade (k 35)com a temperatura conduz ao valor da entalpia de ac-tivação da reacção (∆H ≠), a qual permite calcular aentalpia da reacção desde que seja conhecida a ental-pia de activação da reacção inversa de 35 (ver Caixa 4):

k 35

RH(g) + I�(g) → R�(g) + HI(g) (35)

k 36

RH(g) + I�(g) ← R�(g) + HI(g) (36)

∆H (35) = ∆H ≠ (35) - ∆H ≠ (36) (37)

O procedimento descrito, conhecido como méto-do de iodação, foi, desde os anos 60, aplicado à de-terminação das entalpias de formação de muitosradicais. Tinha, no entanto, um ponto fraco: por ra-zões várias, a entalpia de activação da reacção 36 nãoera conhecida, admitindo-se que teria um valor baixo,da ordem de 4-8 kJ/mol. O valor de ∆H (35), e logo oda entalpia de formação de R�, continham assim umaincerteza proveniente daquela estimativa. No entan-to, como havia alguma evidência experimental que ahipótese era razoável, durante muitos anos os valoresdas entalpias de formação de radicais obtidos pelo mé-todo da iodação foram os “oficialmente” aceites pelacomunidade científica. Outros métodos experimentais(Figura 6) iam produzindo, contudo, resultados de∆f H

om(R�, g) discordantes, sistematicamente superio-

res (em cerca de 12 kJ/mol) aos obtidos pela técnicada iodação. A primeira vista esta discrepância é difí-

Page 14: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

36

cil de explicar: se os resultados da iodação estavam er-rados devido à hipótese de atribuir um valor baixo a∆H ≠(36), admitir um valor mais elevado apenas acen-tuaria a diferença (ver equação 37)! A questão só foiresolvida (?) em 1990, quando o grupo de um quími-co americano, David Gutman, demonstrou experimen-talmente que a constante de velocidade da reacção 36diminui com o aumento de temperatura – logo temuma entalpia de activação negativa! Esta hipótese es-tava fora de cogitação porque se admitia que a reac-ção 36 era elementar, implicando um valor positivopara a entalpia de activação. Os valores negativos de∆H ≠(36) encontrados por Gutman para vários radi-cais alquilo não só explicaram a discrepância entre osresultados do método de iodação e os obtidos por ou-tras técnicas, como também indicaram que o mecanis-mo da reacção entre o HI e R� é mais complexo doque se antecipava: não se trata de uma simples colisãoentre duas moléculas.

A saga da energética dos radicais alquilo – um as-sunto extremamente importante dadas as aplicaçõesdeste tipo de dados em processos industriais (porexemplo, relacionados com a combustão de hidrocar-bonetos) – não vai certamente parar por aqui. Paraalém do seu interesse científico e tecnológico, será umbom exemplo de análise para os sociólogos da Ciên-cia. Embora, durante anos e anos, se acumulassem pro-vas de que os valores obtidos com base na hipótese∆H ≠(36) = 4-8 kJ/mol são menores que os valores cor-rectos, a maioria dos químicos preferiu (e alguns ain-da preferem) ignorar essa evidência.

Os estudos energéticos na fase gasosa têm umagrande vantagem sobre os realizados em solução: a in-formação obtida (entalpias de reacção, entalpias de for-mação, entalpias de dissociação) refere-se à “moléculaisolada”, isto é os valores não vêm afectados por ener-gias intermoleculares. Na fase gasosa, a baixas pres-sões, as moléculas estão afastadas umas das outras, onúmero de colisões é pequeno, e portanto são despre-záveis as energias de atracção e de repulsão entre elas(daí a designação “molécula isolada”). O mesmo nãoacontece no estado líquido, onde as moléculas estãomuito mais próximas das suas vizinhas. A entalpia decoesão intermolecular no estado líquido influencia, co-mo seria de esperar, o valor da entalpia de formação.Por exemplo, a entalpia de formação do benzeno nafase gasosa é maior (82,6 kJ/mol) que na fase líquida(49,0 kJ/mol). A diferença, 33,6 kJ/mol, chamada en-talpia de vaporização, reflecte a entalpia das interac-ções das moléculas de benzeno líquido. Por outraspalavras, para obter “moléculas isoladas” a 25o C énecessário fornecer uma entalpia de 33,6 kJ/mol aobenzeno na fase condensada. Como é óbvio, estas in-teracções variam de substância para substância, sen-do mais intensas para moléculas polares e/ou paramoléculas que possam interactuar entre si de algumaforma particular. É o caso da água, cuja estrutura noestado líquido envolve a formação de ligações de

Caixa 4 - Cinética

Para uma breve introdução à Cinética Química,incluindo o significado mais detalhado de grande-zas como constante de velocidade e energia de ac-tivação, veja-se o artigo de Sebastião J. Formosinhono Colóquio-Ciências n.° 5. Como o nome indica,a constante de velocidade de uma reacção reflectea velocidade de transformação dos reagentes em pro-dutos. Uma energia de activação, por outro lado, tra-duz o facto de os reagentes, para se transformaremem produtos, terem que vencer uma dada barreirade energia. Em reacções elementares envolvendo es-pécies neutras, o topo dessa barreira de energia situa--se sempre acima da energia dos reagentes e dosprodutos. É o que se mostra esquematicamente naFigura 9: do “vale” dos reagentes passa-se ao “va-le” dos produtos através de uma montanha. Assim,para que a reacção ocorra é necessário fornecer ener-gia suficiente aos reagentes. Como aumentar a tem-peratura do meio reaccional mais não é que aumentara energia destas moléculas, é previsível que a velo-cidade da reacção (logo, a constante de velocidade)aumente com a temperatura no caso de uma reac-ção elementar. Como se indica na Figura 9, a ental-pia de activação, ∆H ≠(1), é a diferença entre aentalpia de formação da espécie formada no topo dabarreira (o chamado estado de transição ou comple-xo activado, X≠ ) e a soma das entalpias de forma-ção dos reagentes. Portanto, a entalpia da reacçãoé a diferença entre ∆H ≠(1) e a entalpia de activa-ção no sentido inverso, ∆H≠(-1).

Fig. 9 – Diagrama de energia (ou de entalpia) de uma reacçãoelementar, x é a chamada coordenada reaccional e aqui repre-senta o avanço da reacção (os reagentes estão no vale da esquer-da, os produtos à direita). Os restantes símbolos vêm explicadosna Caixa.

EN

TA

LP

IA

X

Page 15: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

37

hidrogénio. A sua entalpia de vaporização, 44,0 kJ/mol,é superior à do benzeno, uma molécular não-polar.

Quando em vez de um líquido constituído por umsó tipo de moléculas (benzeno ou água), temos umasolução, por exemplo uma pequena quantidade de me-tano em benzeno, embora a interacção entre as molé-culas de metano seja diminuta, o mesmo pode nãoacontecer com as interacções entre as moléculas de me-tano e as de benzeno, uma vez que estas últimas estãopresentes em grande número e “rodeiam” as de me-tano. Esta interacção soluto-solvente vai tambémreflectir-se na entalpia de formação dos constituintesda solução. No caso metano-benzeno, a interacção éfraca (as entalpias de formação do metano gasoso e emsolução são parecidas), mas existem muitos exemplospara os quais a entalpia de solvatação (diferença en-tre as entalpias de formação da molécula em soluçãoe na fase gasosa) é enorme.

As considerações nos dois parágrafos anteriores fo-ram feitas apenas com intenção de abordar em segui-da alguns dos métodos que modernamente se utilizampara estudar a energética de espécies transientes emsolução. No entanto, elas permitem também salientara importância que o estudo das forças intermolecula-res tem para a compreensão da energia das moléculas.No presente artigo, restringiu-se a discussão às forçasintramoleculares, ou seja, às forças de ligação quími-ca entre os átomos de uma molécula.

Como vimos no exemplo metano-benzeno, as en-talpias de solvatação podem ser pequenas. Se assim for,a entalpia de uma dada reacção em solução será mui-to semelhante à entalpia da mesma reacção na fase ga-sosa (isto também pode acontecer se a soma dasentalpias de solvatação dos reagentes for igual à somadas entalpias de solvatação dos produtos). A única ma-neira de, em última análise, confirmar este facto é fa-zer as medidas em ambas as condições e comparar osvalores obtidos... No entanto, a experiência acumula-da ajuda a prevêr, num dado caso, se os valores emsolução e na fase gasosa serão mais ou menos pareci-dos. Mas mesmo que tal não aconteça, isso pode nãoretirar qualquer importância à medida que se faça emsolução. Muitas reacções de interesse ocorrem em so-lução e é em solução que é necessário conhecer a suaenergética. Um exemplo, simultaneamente interessantee relevante, prende-se com o mecanismo de acção dacoenzima B12, cuja molécula se mostra na Figura 10.Embora seja possível estudar aspectos da energéticadesta molécula na fase gasosa (com o auxílio de lasersou através de impacto com átomos de gases raros –técnicas associadas a espectrómetros de massa), é maisútil fazê-lo em solução, sob condições o mais seme-lhantes possível às que se encontram num organismovivo. A coenzima B12 é por vezes impropriamentechamada vitamina B12 , cuja molécula difere da Figu-ra 10 por ter um grupo ciano, C�N, ligado ao átomode cobalto, em vez do grupo adenosílico (o grupo li-gado ao cobalto pela parte superior; ver Figura l0).

Ao contrário da coenzima B12 , a vitamina B12 nãoexiste em sistemas biológicos.

Fig. 10 – Molécula de coenzima B12 . O átomo de cobalto situa-seno centro de um anel macrocíclico (constituído por quatro deriva-dos do pirrol) e está ligado, acima do anel, a um átomo de carbonoda adenosina (constituída pela ligação da desoxiribose com a adeni-na). Abaixo do anel, o cobalto está ligado a uma base (dimetilben-zoimidazol), a qual por sua vez se liga a um grupo ribose e este aum grupo fosfato. Note-se ainda que o fosfato se encontra ligadoa um dos grupos laterais do macrociclo.

Embora o mecanismo de acção da coenzima B12

esteja longe de ser conhecido em detalhe, sabe-se ho-je que o passo inicial que desencadeia todos os pro-cessos bioquímicos em que está envolvida consiste naquebra da ligação cobalto-carbono. Um dos factoresdeterminantes para comprovar este passo mecanísti-co foi precisamente a medida da entalpia daquela li-gação. Apenas uma ligação débil seria consistente coma hipótese de uma cisão fácil. Na última década foramfeitos dezenas de estudos com o objectivo de avaliarD(Co-C), todos eles baseados em medidas da energiade activação da reacção de quebra da ligação e esti-mando um valor para a entalpia de activação do pro-cesso inverso. Os valores obtidos situam-se na gamade 109 a 144 kJ/mol, o que confirma, de facto, a debi-lidade da ligação (comparar, por exemplo, com a en-talpia de dissociação carbono-carbono no etano, 378kJ/mol). Contudo, é preciso não esquecer que a fiabi-lidade daqueles valores pode ser posta em causa pelaestimativa da entalpia de activação da reacção inversa(recordar o caso da iodação, discutido acima).

Seria importante conseguir obter D(Co-C) por ummétodo mais directo, sem aproximações de fiabilidade

Page 16: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

38

desconhecida (embora, segundo se pense, razoáveis).Há casos em que, felizmente, tal é possível. Continuan-do no domínio das vitaminas, o α-tocoferol (αTH), nor-malmente designado por vitamina E (Figura 11), é umdos anti-oxidantes mais importantes dos organismosvivos, evitando a chamada peroxidaçao lipídica dasmembranas celulares. Este fenómeno tem um mecanis-mo complexo que envolve a formação de radicais pe-róxido, ROO�, e alcóxido, RO�, “ancorados” nasmoléculas dos lípidos (um lípido, ou uma gordura, éum éster formado pela reacção de um álcool –normalmente o glicerol – com três moléculas de áci-dos gordos, ou seja ácidos orgânicos de cadeia longa;R representa assim um grupo lipídico). A consequên-cia última da acção destes radicais é a formação de li-gações cruzadas entre cadeias de diferentes moléculasde lípidos. À semelhança do que acontece na vulcani-zação da borracha, onde o enxofre adicionado se ligaa duas cadeias de hidrocarbonetos distintas e assim se ob-tém um material mais rígido, as l igações cruzadasentre as cadeias lipídicas impedem a mobilidade dasmoléculas. Ora esta mobilidade é essencial para asse-gurar uma correcta fluidez da membrana celular. O pa-pel desempenhado pela vitamina E consiste em impedira proliferação daqueles radicais e portanto evitar a for-mação de ligações cruzadas entre os lípidos. Quais osseus mecanismos de acção? Um deles envolve a cedên-cia do átomo de hidrogénio do grupo OH (Figura 11)ao radical peróxido ou alcóxido, formando-se o radi-cal α-tocoferilo, abreviadamente designado por αT�,e gerando-se as espécies pouco reactivas ROOH e ROH:

Mais importante do que provar que, de facto, a li-gação O-H no α-tocoferol é fraca, é estudarem-se osfactores que provocam a sua debilidade. Só assim épossível definir estratégias para sintetizar outras mo-léculas que actuem como anti-oxidantes e possam, porexemplo, ser utilizadas como fármacos. A medida daentalpia daquela ligação, D (αT-H), foi realizada eml988 por dois químicos argentinos, Coronel e Colus-si, através de um método de equilíbrio em solução. Uti-lizando uma das técnicas favoritas dos químicos deradicais livres, a ressonância paramagnética electróni-ca, conseguiram determinar a constante de equilíbriode uma reacção do tipo

Como se discutiu no início do presente artigo, as reac-ções 38 e 39 são favoráveis apenas se as respectivasentalpias forem menores que zero (em ambos os casosos termos entrópicos, T ∆S, são desprezáveis). Ora asentalpias reaccionais são definidas pelas diferençasD (αT-H) - D (ROO-H) e D (αT-H) - D (RO-H), respectiva-mente (gasta-se entalpia na quebra da ligação O-H noα-tocoferol e ganha-se entalpia na formação da liga-cão O-H no peróxido ou no alcóxido). Logo, ∆H(38)ou ∆H(39) são menores que zero se a ligação O-H noα-tocoferol for mais fraca que as dos outros dois com-postos de oxigenio. Por outras palavras, a eficácia da vita-mina E como anti-oxidante está directamente re-lacionada com a debilidade da sua ligação O-H.

ROO� + αTH → ROOH + αT� (38)

RO� + αTH → ROH + αT� (39)

Fig. 11 – α-Tocoferol, ou vitamina E. Os símbolos Me indicam gru-pos metilo (CH3

�).

onde X� é um radical que abstrai o átomo de hidrogé-nio da vitamina E. Em contraste, por exemplo, coma reacção de oxidação do metano (reacção 2), na qual,como vimos, a conversão do metano em dióxido decarbono e água era praticamente total, dada a sua ele-vada exotermicidade, a reacção 40 é pouco exotérmi-ca, de modo que, ao “misturar-se” α TH com X�, nemtodas as moléculas de α-tocoferol serão consumidas.Esperando tempo suficiente, chegar-se-á a uma situa-ção de equilíbrio: as concentrações de reagentes e pro-dutos atingirão valores estacionários. Ora são estasconcentrações que podem ser medidas e relacionadasde forma simples com a constante de equilíbrio K (osímbolo [ ] indica concentração):

αTH + X� → αT� + XH (40)

A constante de equilíbrio relaciona-se, por sua vez,com a variação da energia de Gibbs padrão da reacção,

e esta com a entalpia (equação 4). Como a variação deentropia da reacção 40 é pequena, ∆G é aproximada-mente igual a ∆H (a aproximação seria desnecessáriase se conhecesse a variação de K com a temperatura;a Termodinâmica ensina-nos como relacionar essa va-riação com o valor de ∆H, sem fazer intervir a varia-ção de entropia). Finalmente, atendendo que∆H (40) = D(αT-H) - D(X-H), sendo esta última conhe-cida, pode calcular-se a entalpia de dissociaçãoO-H na vitamina E.

O valor obtido para D (α T-H), 318 kJ/mol, traduz,de facto, uma ligação O-H muito fraca. Compare-se,por exemplo, com a entalpia de dissociação O-Hnum álcool alquílico (metanol, CH3OH, etanol,CH3CH2OH, etc.), cerca de 430 kJ/mol! Qual a razãode tamanha diferença? A primeira suspeita recai no fac-to de a ligação O-H na vitamina E estar ancorada no

K = [αT � ][XH] / ( [αTH][X � ] ) (41)

∆G o = - RT ln K (42)

Page 17: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

39

anel benzénico. Se assim for, a entalpia de dissociaçãoO-H na molécula de fenol, mite através da solução e que vai ser detectada por um

transdutor piezoeléctrico (M) em contacto com acélula.

Tal como uma pedra que se atira a um lago, e asondas formadas se propagam circularmente, com cen-tro no ponto onde a pedra cai, a onda de choque cria-da pela deposição de energia na solução tem origemna compressão repentina das moléculas do solvente.Ora esta onda, formada pela deposição de energia, emnada se distingue de uma onda sonora: o som propaga--se num meio por ciclos de compressão-expansão dasmoléculas desse meio. Assim, utilizando um dispositi-vo que seja sensível a variações de pressão (um micro-fone!), transformando-as em sinais eléctricos, épossível não apenas detectar essas variações como tam-bém medir a sua intensidade. É este o papel do trans-dutor ou detector piezoeléctrico (a palavra significaque o dispositivo transforma energia mecânica -variações de pressão - em energia eléctrica).

será mais próxima da medida para a vitamina E.

Os Gritos das Moléculas

A entalpia de dissociação O-H no fenol é cerca de365 kJ/mol, logo bastante mais próxima da observadana vitamina E. O enfraquecimento da ligação O-H nofenol, relativamente à dos álcoois alquílicos, explica--se facilmente em termos da estabilização por resso-nância do radical C6H5O

�. Idêntica estabilização deveverificar-se também no α-tocoferol. No entanto, é ain-da necessário justificar 47 kJ/mol – tal é a diferençaentre as entalpias de dissociação O-H no fenol e na vi-tamina E. Por outras palavras, a debilidade da ligaçãonesta última molécula não é apenas consequência daestabilização por ressonância do radical αT�.

Uma discussão mais profunda da questão levanta-da no parágrafo anterior está fora do âmbito deste ar-tigo. A debilidade de ligações O-H em moléculascontendo grupos fenóxido permite-nos todavia intro-duzir uma técnica experimental, a calorimetria fotoa-cústica, que pode dar uma contribuição significativa parainvestigar esse e outros problemas semelhantes,os quais, sendo embora de índole académica, têm umimpacto significativo em áreas como as indústrias far-macêutica e alimentar.

A calorimetria fotoacústica é uma técnica que per-mite a medida directa da energética de reacções en-volvendo espécies transientes em solução. Foi pelaprimeira vez aplicada a este tipo de problemas por umcientista americano, Kevin Peters, no início dos anos80. Um diagrama simplificado de um calorímetro fo-toacústico é apresentado na Figura 12. O seu princí-pio de operação é extremamente simples: A célula dequartzo C contém uma solução onde está presente asubstância em estudo. Com o auxílio de um laser4

pulsado, de comprimento de onda adequado, irradia--se a amostra, provocando a quebra de uma dada liga-ção. A energia dos fotões do laser, hv, é no entantosuperior à entalpia de dissociação da ligação em cau-sa, de modo que nem toda essa energia é utilizada pa-ra quebrar a ligação. A energia que sobra é depositadana solução. Este súbito depósito de energia (o laser épulsado e cada pulso tem uma duração de cerca de 10nanosegundos, 10-8 s), sob a forma de calor, provocao aparecimento de uma onda de choque que se trans-

4 – Ver o artigo Os Lasers, de José Salcedo, no número 1 do Colóquio--Ciências

Fig. 12 – Diagrama simplificado de um calorímetro fotoacústico.I – íris; L – lente colimadora; C – célula de quartzo; M - transdutor pie-zoeléctrico; A - pré-amplificador.

O sinal eléctrico detectado pelo microfone é am-plificado e registado num osciloscópio. A sua ampli-tude é proporcional à quantidade de energiadepositada na solução (quanto maior for a pedra, maio-res são as ondas...), pelo que, para calcular a entalpiada ligação em estudo, apenas há que fazer um simplesbalanço: a energia total posta em jogo, hv, é parcial-mente utilizada para quebrar a ligação (D), sendo o queresta depositado sob a forma de calor (∆Hobs ):

hv = D + ∆Hobs (43)

Embora a aplicação prática da calorimetria fotoa-cústica seja um pouco mais complexa do que transpa-rece da descrição anterior, o princípio básico dométodo é tal como se indicou. E foi usando um calorí-metro fotoacústico que um grupo canadiano (Grillere colaboradores) investigou, em 1988, o efeito de gru-pos substituintes no anel benzénico na entalpia de dis-sociação O-H. Verificou-se, por exemplo, que apresença de um grupo butilo terciário, (CH3)3C, emposição oposta à ligação O-H, enfraquece esta ligação

Page 18: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

40

em cerca de 8 kJ/mol, enquanto que se esse grupo foro metóxido, CH3O, a ligação fica 25 kJ/mol mais fra-ca, relativamente à observada no fenol.

moléculas – de dor, pois que se partem ligações. Em-bora a imagem seja boa, está longe de ser correcta:quem grita são as moléculas de solvente, que se vêemapertadas umas contra as outras!

Entalpias de LigaçãoMetal-Hidrogénio e Metal-Carbono:

As Chaves da Catálise

Haverá talvez algum exagero no título deste tópi-co, mas uma dose moderada de “marketing” não é des-cabida em Ciência. E, de facto, a energética de ligaçõesentre metais de transição e grupos orgânicos ou inor-gânicos (designados normalmente por ligandos), de-sempenha um papel muito importante na compreensãodas reacções elementares de que se compõem os ci-clos catalíticos5. Podemos aplicar os critérios descri-tos no início deste artigo para avaliar se uma dadareacção será mais favorável para um metal que paraoutro, e assim tentar definir estratégias de síntese (ede catálise). Como exemplo, regressemos ao proble-ma da activação do metano, a que Derek Barton cha-mou “a busca do Santo Graal dos Químicos”. Quebrara ligação C-H desta molécula, com o auxílio de umcomplexo organometálico, M (assim se chama umamolécula onde o elemento central é um metal, em ge-ral de transição, ligado a pelo menos um átomo de car-bono de um dos ligandos), implica que a energia deGibbs da reacção

Embora estes valores não se apliquem no caso do α--tocoferol, eles ilustram bem a importância do efeitodo substituinte na energética da ligação O-H. Aliás, aaplicação prática do efeito do grupo metóxido não édifícil de encontrar. A molécula

é utilizada para conservar margarinas e outras gordu-ras, evitando o desenvolvimento do desagradável sa-bor a ranço. O seu mecanismo de acção comoanti-oxidante é parecido com o da vitamina E: o hi-drogénio é abstraído por radicais peróxido, evitando--se assim o ataque destes às ligações duplas das cadeiasinsaturadas de carbono das gorduras e dos óleos. Exis-tem muitas outras moléculas usadas como conservan-tes alimentares que se baseiam na debilidade deligações O-H de grupos fenóxido: a salva, o tomilhoe o cravinho da India são alguns exemplos.

A calorimetria fotoacústica, bem como outras téc-nicas mencionadas na Figura 6 , têm dado uma contri-buição importantíssima para o conhecimento daenergética das moléculas. Os exemplos apresentadosserão talvez suficientes para aguçar o apetite do leitorpara se informar sobre outros casos, não menos rele-vantes, como a energética de ligações silício-hidro-génio em silanos, um assunto que poderá ter um im-pacto assinalável na química farmacêutica. Não é pos-sível, no entanto, encerrar este capítulo sem explicara razão do seu título – Os Gritos das Moléculas. Naapresentação do autor deste artigo, antes de um semi-nário, alguém mencionou que um dos tópicos a abor-dar seria uma técnica que permite ouvir os gritos das

M + CH4 → H-M-CH3 (44)

é menor que zero. Neste caso o termo T∆S não é des-prezável: vale cerca de -44 kJ/mol a 298 K. Assim, acondição em termos de entalpia é ∆H < -44 kJ/mol.Por outro lado, atendendo a que

e que D (CH3-H) = 439 kJ/mol, para que se observeaquela condição é necessário que a soma das entalpiasde dissociação D (M-H) + D (M-CH3) exceda a entalpiade dissociação C-H no metano em 483 kJ/mol. Ora asentalpias de dissociação metal-carbono e metal--hidrogénio são ambas substancialmente mais baixasque este valor. Apenas alguns metais têm ligações su-ficientemente fortes para garantir a activação do me-tano ou de outros alcanos. É o caso do irídio, comose demonstrou, por exemplo, pela estabilidade docomplexos.

∆H (44) = D (CH3-H) - D (M-H) - D (M-CH3) (45)

5 – Vd. Nota 1.

Page 19: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

41

um dos primeiros metil-hidretos (o metal está ligadoa um grupo metilo e a um hidrogénio) que se conse-guiu isolar (Graham e colaboradores, 1984).

A energética das ligações metal-ligando num com-plexo organometálico contendo vários ligandos nãodepende exclusivamente do metal. Os outros ligandossão também determinantes para a estabilidade de umadada ligação. Atendendo à grande variedade de me-tais e às infinitas possibilidades de combinação destescom ligandos, pode imaginar-se a dificuldade em cons-truir uma base de dados sobre entalpias de ligaçãometal-ligando, com uma dimensão adequada para per-mitir o desenvolvimento de métodos de estimativa –à semelhança do que, como vimos, se consegue paramoléculas orgânicas. Este é um assunto que seguramen-

te ocupará os químicos durante muitos anos (ver su-gestões de leitura)... Para já, no entanto, os esforçosda maioria dos grupos de investigação que trabalhamnesta área vão mais no sentido de obter informaçãosobre a influência do centro metálico na energética dasprincipais reacções elementares importantes em quí-mica e catálise organometálica (Figura 13).

Epílogo

Como se procurou demonstrar, o conhecimento daenergética das moléculas e das suas ligações químicastem dado uma contribuição extremamente valiosa pa-ra a compreensão da estrutura molecular e da reacti-vidade. O reconhecimento deste facto levou aodesenvolvimento de uma variedade de métodos (Figura6), alguns abordados no presente artigo, outros des-critos nas referências indicadas nas sugestões de leitu-ra. De entre todos os que não foram tratados, umamenção especial aos incluídos no grupo da QuímicaTeórica. Os enormes progressos observados nesta área,na última década, em grande parte devidos à rápidaevolução dos meios de cálculo, fazem prever que, numfuturo não muito distante, será possível obter infor-mação fiável sobre a energética de qualquer ligação quí-mica ou de qualquer molécula. Para já, e pelo menosdurante alguns anos, os métodos experimentais são in-substituíveis, inclusive porque são eles que fornecema informação necessária para poder avaliar a qualida-de dos resultados produzidos num computador.

Fig. 13 – Principais reacções elementares, importantes em química e catálise organometálica. É sobre a energética destas reacções que incidegrande parte do trabalho de investigação actual em termoquímica de compostos organometálicos.

Page 20: A ENERGIA DAS MOLÉCULASjamsimoes/artigos/Coloquio Ciencias.pdf · rer. Essa diferença de custos tem várias origens. Por exemplo, para que o gás seja transportado em grandes quantidades

42

AGRADECIMENTOS

Este artigo reflecte parte da minha actividade científica ao longo de 16 anos, iniciada por sugestão dos Doutores A. Romão Dias e JorgeCalado (IST). Durante esse período tentei manter-me sempre em idade escolar – a única maneira de aproveitar ao máximo os ensinamentosdos excepcionais estudantes de doutoramento com quem tive a sorte de colaborar. Para todos vai o meu reconhecimento. Ao Doutor JorgeCalado agradeço também algumas sugestões que contribuiram para melhorar a qualidade pedagógica do texto.

SUGESTÕES DE LEITURA

A quase totalidade dos conceitos básicos referidos neste artigo en-contram-se explicados de forma pedagógica no livro: P. W. Atkins,Physical Chemistry, 4.a edição, Oxford University Press, Oxford, 1990.

Para aprofundar as relações entre estrutura e energética de moléculasorgânicas recomendam-se as obras da série Molecular Structure andEnergetics, editadas por J. F. Liebman e A. Greenberg (VCH Publishers,New York), em especial os volumes 2, 3 e 6.

A controvérsia sobre as entalpias de formação de radicais foi recente-mente revista num artigo de David Gutman (Accounts of ChemicalResearch, 1992, 23, 375).

Os principais métodos experimentais e teóricos utilizados para estu-dar a energia das moléculas (com ênfase nas espécies organometáli-cas) encontram-se revistos numa publicação recente: Energetics ofOrganometallic Species (editada por J. A. Martinho Simões), KluwerAcademic Publishers, Dordrecht, 1992. Muitas outras referências bi-bliográficas sobre métodos experimentais podem encontrar-se no ar-tigo de revisão Transition Metal-Hydrogen and Metal-Carbon BondStrengths: The Keys to Catalysis, de J. A. Martinho Simões e J. L. Beauchamp(Chemical Reviews, 1990, 90, 629). Este artigo cobre uma área que aquiapenas foi aflorada.

Sobre a activação do metano e outros hidrocarbonetos, recomendam--se dois artigos de divulgação, um de N. D. Parkyns (Chemistry in Bri-tain, 1990, 26, 841) e outro de Jay Labinger (Química - Boletim daSociedade Portuguesa de Química, 1993, n.o 48), bem como a obraSelective Hydrocarbon Activation (editada por J. A. Davies, P. L. Watson,J. F. Liegman e A. Greenberg), VCH Publishers, New York, 1990. Estelivro contém artigos sobre aspectos energéticos da activação de hi-drocarbonetos e também uma discussão detalhada sobre o mecanis-mo de acção da vitamina B12.

Finalmente, sobre um assunto apenas referido no texto (aplicação dosradicais de silício à síntese química), pode ver-se um artigo recentede C. Chatgilialoglu (Accounts of Chemical Research, 1992, 25, 188).