A ergonomia e a gestão da segurança do trabalho

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XII SIMPEP – Bauru, SP, Brasil, 07 a 09 de novembro de 2005 A ergonomia e a gestão da segurança do trabalho Samuel Potma Garcias Gonçalves (CEFET-PR) [email protected] Prof. Dr. Antônio Augusto de Paula Xavier (CEFET-PR) [email protected] Prof. Dr. Luis Maurício Martins de Rezende (CEFET-PR) [email protected] Resumo O artigo trata da gestão da segurança do trabalho em empresas. A análise ergonômica do trabalho é apontada como caminho para melhorias neste campo. O objetivo é levantar a situação atual da segurança do trabalho e buscar soluções para serem implantadas. Foi feita uma pesquisa documental nos laudos do Instituto de Criminalística de Ponta Grossa-PR. Foram disponibilizados 25 laudos para a pesquisa. Desses, foram escolhidos 10 laudos como amostra de análise. Concluiu-se que para melhorar as condições de segurança nas empresas, deve-se, como primeiro passo, atuar sobre maquinários e operadores para cumprir as Normas Regulamentadoras (NRs) e, como medida complementar, aplicar uma Análise Ergonômica do Trabalho nas empresas para levantar itens não alcançados pelas NRs . Palavras-chave: Ergonomia; Segurança do trabalho; Acidentes. 1. Introdução A ergonomia é a adaptação do trabalho ao homem e, para isso, aplica teorias, princípios, dados e métodos a projetos que visam melhorar o bem-estar humano e a performance global dos sistemas. A Ferramenta da ergonomia é a Análise Ergonômica do Trabalho que acontece para solucionar exigências de melhorias nas condições de trabalho (saúde e segurança) e melhorias na eficácia econômica do sistema produtivo (produtividade). A gestão de segurança do trabalho aplica metodologias e técnicas apropriadas às possíveis causas de acidentes de trabalho, objetivando a prevenção de suas ocorrências. O objetivo do artigo é levantar a situação atual da segurança do trabalho nas empresas brasileiras e buscar soluções que signifiquem condições de melhorias. 2. A ergonomia A ergonomia pode ser definida de forma simplificada como a adaptação do trabalho ao homem. O trabalho, nesta definição, tem uma acepção bastante ampla. Segundo Iida (2002), abrange não só máquinas e equipamentos utilizados, mas também toda a situação em que ocorre o relacionamento entre o homem e o seu trabalho. O objetivo da ergonomia é a situação de trabalho. Ela está focada na atividade de trabalho das pessoas. A ergonomia faz uma análise das situações reais de trabalho, constatando uma discrepância nunca anulada entre o previsto (a norma, o regulamento e a prescrição) e o real (o efetivamente realizado). A atividade, o real do trabalho, permite revelar, de um lado, as disfunções constantes, as panes, os erros de previsão, de projeto e, de outro lado, o esforço dos trabalhadores para gerir essa variabilidade, no mais das vezes, empreendida num quadro temporal e espacial rígido. A finalidade da ergonomia, segundo Petzhold e Vidal (2003), é “a transformação para melhorar o contexto onde a execução desta atividade ocorre e, finalmente, a própria atividade.” Petzhold e Vidal (2003) afirmam que a ergonomia (ou Fatores Humanos) trata da compreensão das interações entre os seres humanos e outros elementos de um sistema. É a

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XII SIMPEP – Bauru, SP, Brasil, 07 a 09 de novembro de 2005

A ergonomia e a gestão da segurança do trabalho

Samuel Potma Garcias Gonçalves (CEFET-PR) [email protected]. Dr. Antônio Augusto de Paula Xavier (CEFET-PR)[email protected]. Dr. Luis Maurício Martins de Rezende (CEFET-PR) [email protected]

ResumoO artigo trata da gestão da segurança do trabalho em empresas. A análise ergonômica dotrabalho é apontada como caminho para melhorias neste campo. O objetivo é levantar asituação atual da segurança do trabalho e buscar soluções para serem implantadas. Foi feitauma pesquisa documental nos laudos do Instituto de Criminalística de Ponta Grossa-PR.Foram disponibilizados 25 laudos para a pesquisa. Desses, foram escolhidos 10 laudos comoamostra de análise. Concluiu-se que para melhorar as condições de segurança nas empresas,deve-se, como primeiro passo, atuar sobre maquinários e operadores para cumprir asNormas Regulamentadoras (NRs) e, como medida complementar, aplicar uma AnáliseErgonômica do Trabalho nas empresas para levantar itens não alcançados pelas NRs .Palavras-chave: Ergonomia; Segurança do trabalho; Acidentes.

1. IntroduçãoA ergonomia é a adaptação do trabalho ao homem e, para isso, aplica teorias, princípios,dados e métodos a projetos que visam melhorar o bem-estar humano e a performance globaldos sistemas.

A Ferramenta da ergonomia é a Análise Ergonômica do Trabalho que acontece parasolucionar exigências de melhorias nas condições de trabalho (saúde e segurança) e melhoriasna eficácia econômica do sistema produtivo (produtividade).

A gestão de segurança do trabalho aplica metodologias e técnicas apropriadas às possíveiscausas de acidentes de trabalho, objetivando a prevenção de suas ocorrências.

O objetivo do artigo é levantar a situação atual da segurança do trabalho nas empresasbrasileiras e buscar soluções que signifiquem condições de melhorias.

2. A ergonomiaA ergonomia pode ser definida de forma simplificada como a adaptação do trabalho aohomem. O trabalho, nesta definição, tem uma acepção bastante ampla. Segundo Iida (2002),abrange não só máquinas e equipamentos utilizados, mas também toda a situação em queocorre o relacionamento entre o homem e o seu trabalho.

O objetivo da ergonomia é a situação de trabalho. Ela está focada na atividade de trabalho daspessoas. A ergonomia faz uma análise das situações reais de trabalho, constatando umadiscrepância nunca anulada entre o previsto (a norma, o regulamento e a prescrição) e o real (oefetivamente realizado). A atividade, o real do trabalho, permite revelar, de um lado, asdisfunções constantes, as panes, os erros de previsão, de projeto e, de outro lado, o esforço dostrabalhadores para gerir essa variabilidade, no mais das vezes, empreendida num quadrotemporal e espacial rígido.

A finalidade da ergonomia, segundo Petzhold e Vidal (2003), é “a transformação paramelhorar o contexto onde a execução desta atividade ocorre e, finalmente, a própriaatividade.”

Petzhold e Vidal (2003) afirmam que a ergonomia (ou Fatores Humanos) trata dacompreensão das interações entre os seres humanos e outros elementos de um sistema. É a

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profissão que aplica teorias, princípios, dados e métodos, a projetos que visam otimizar obem-estar humano e a performance global dos sistemas.

A ferramenta principal da Ergonomia é a Análise Ergonômica do Trabalho (AET). O pontoinicial de uma AET é a demanda que reflete um problema. O ergonomista é o profissional quebusca esclarecer esta demanda para propor medidas de intervenção, a fim de que o problemaseja resolvido ou, pelo menos, minimizado. A intervenção ergonômica, na concepção dossistemas de produção, conforme Santos et. al. (1997), em geral, acontece para solucionar duasexigências: “a melhoria das condições de trabalho (critério de saúde) e a melhoria da eficáciaeconômica do sistema produtivo (critério de produtividade)”. Para Montmollin (1990), essasduas exigências estão interligadas e melhorar as condições de trabalho poderá significar,igualmente, uma melhora na produção.

Formulada a demanda, o ergonomista deve conhecer as possibilidades e limites de suaintervenção (FIALHO e SANTOS, 1997). Para isso, deve, na seqüência, estudar os aspectostécnicos, econômicos, sociais e organizacionais da empresa. É necessário levar em conta aidade, o tempo de serviço na profissão, o grau de escolaridade dos envolvidos. Deve-seconhecer a tecnologia que os trabalhadores operam e considerar os fatores econômicos quedelimitarão, em partes, as soluções que serão propostas.

Na verdade, numa situação ideal, segundo Iida (2002), a ergonomia devia ser aplicada desdeas etapas iniciais do projeto de instalação de um ambiente do trabalho. Deveriam ser levadosem conta o ser humano e seus componentes. As suas características e restrições, bem comodas máquinas, deveriam se ajustar mutuamente uns aos outros. Para Kroemer e Grandjean(2005), o trabalho deveria, ainda, considerar o potencial, as inclinações da pessoa, e oferecertreinamento, pois assim, elas apresentariam melhor desempenho. Esta intervenção desde ocomeço é chamada de ergonomia de projeto, a outra, que visa resolver problemas e, como omundo do trabalho está muito longe do ideal, chama-se ergonomia corretiva e é a maisaplicada.

Na gestão de segurança do trabalho, para Santos et al (1997), quando acontece um incidentegrave, é frequente atribuir ao ser humano o “erro” ocorrido, na medida em que alguém deveriafazer diferente algo que foi feito. Porém “esta situação condicional não permite avançar naanálise do incidente”. Se erros foram cometidos, afirma o autor, eles foram devidos àconcepção dos dispositivos técnicos e à organização do trabalho e é preciso prevenir aocorrência de novos incidentes.

O erro humano, segundo Decker (2003), é um julgamento feito depois que o fato acontecepara achar culpados pelo acidente. O erro humano, todavia, pode também ser visto como umefeito ao invés de uma causa de problemas graves dentro de sistemas.

Segundo Montmollim (1990), a apresentação tão simples de erro humano, já não é aceita, hojeem dia, em ergonomia, a análise do trabalho e, em particular a dos acidentes, leva a isolar oerro do seu contexto específico e da sua história. Ainda, segundo Dekker (2003), a perspectivamais recente é chamada de “nova visão” em ergonomia, atualmente. O apoio para a novavisão é extraído de pesquisas recentes sobre acidentes como fenômenos emergentes semcausas claras, onde desvios se tornaram um padrão de operações normais geralmente aceitos.Almeida e Baumecker (2004) mostram claramente a defasagem entre a velha e a nova visão,apresentando as idéias do Professor Sidney Decker no livro “The Field Guide to human errorinvestigations”, onde o autor afirma que é possível fazer uma análise retrospectiva de umasituação de acidente. A tabela 1 apresenta a velha e a nova visão da ergonomia sobre o errohumano.

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A velha visão A nova visão- O erro humano é a causa de acidentes. -O erro humano é sintoma de problemas

profundos do sistema.-Para explicar falhas os investigadores devemprocurar falhas

-Não tente saber em as pessoas estavam erradaspara explicar falhas.

-Você deve encontrar falhas de avaliações, decisõeserradas e julgamentos inadequados das pessoas.

-Procure saber como as avaliações e ações daspessoas faziam sentido para elas na hora em queocorreram, dadas as circunstâncias que ascercavam.

Fonte: ALMEIDA & BAUMECKER (2004) apud DEKKER (2003)

Tabela 1 – As duas visões do “erro humano”

Além disso, as organizações revelam desordens em seus interiores não importando se elasestão predispostas a um acidente ou não. Quando se fala em erros humanos, geralmente isto serefere a uma desatenção ou negligência do trabalhador. Para que essa desatenção ounegligência resulte em acidente, houve uma série de decisões que criaram as condições paraque isto acontecesse. Se essas decisões tivessem sido diferentes, essa mesma desatenção ounegligência poderia não ter resultado em acidente. A abordagem do erro humano tem sofridomudanças na medida em que se compreende melhor o comportamento do homem.Atualmente, existem dados que permitem analisá-lo melhor, para se prever o desempenhofuturo de sistemas onde haja a participação humana. O erro humano na visão da ergonomia,está relacionado às anormalidades ergonômicas no ambiente de trabalho. Essas anormalidadesé que levam à ocorrência do que conhecemos por erros humanos. (ALMEIDA eBAUMECKER, 2004).

A ergonomia pode ser aplicada na gestão integrada de qualidade, meio-ambiente e segurançado trabalho. Na gestão de segurança do trabalho, de que trata este artigo, atuará na interfacehomem-ambiente de trabalho, para a saúde e segurança dos trabalhadores evitando doenças eacidentes ou diminuindo suas conseqüências.

3. A gestão de segurança do trabalhoA segurança do trabalho estuda, através de metodologias e técnicas apropriadas, as possíveiscausas de acidentes do trabalho, objetivando a prevenção de suas ocorrências. Para isso,segundo Pacheco Jr (2000), deve realizar o planejamento e controle das condições de trabalhoexistentes na empresa, através da identificação, avaliação e eliminação dos riscos existentesno local de trabalho.

O organismo de âmbito mundial que tem a incumbência de legislar sobre proteção ao trabalhoé a Organização Internacional do Trabalho (OIT), vinculada à Organização das Nações Unidas(ONU). O Brasil participa da OIT, sendo um de seus membros fundadores em 1919.

No Brasil a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) reuniu em um só diploma legal toda alegislação trabalhista em 1943. O “marco zero” na prevenção de acidentes do trabalho emnosso país é o Decreto-lei nº 7.036 de 10 de novembro de 1944, que instituiu aobrigatoriedade de criar a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA).

A Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho(FUNDACENTRO) é uma entidade governamental vinculada ao Ministério do Trabalho eEmprego (MTE) e é considerada a maior entidade brasileira de pesquisa na área de prevençãode acidentes do trabalho. A segurança do trabalho é regulada principalmente pelas NormasRegulamentadoras (NRs) aprovadas pela portaria nº 3.214, de 8 de junho de 1978, do MTE.Existem ainda uma infinidade de Leis e Decretos que tem por objetivo atender os requisitospara tratar a questão de segurança e higiene do trabalho.

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A gestão de segurança do trabalho, de acordo com Araújo e Meira (2001), vem sendo tratadacom mais seriedade pelas organizações a partir do advento da busca da certificação daqualidade pela série ISO 9000 a partir de 1994. As empresas estão descobrindo que ossistemas de gestão de qualidade podem servir também de base para o tratamento eficaz dequestões relativas à segurança e saúde do trabalho.

Foram criadas ainda as normas internacionais BS 8800 (Guide to occupational health andsafety management systems), em 1996 e a OHSAS 18001 (Ocupational Health and SafetyAssessment Series) em 1999, especificamente para a Gestão de Saúde e Segurança doTrabalho.

A gestão de segurança do trabalho, portanto, dispõe de farta normalização para atingir os seusobjetivos, no entanto, do confronto entre o prescrito e o real, revela-se uma situação difícil deser controlada em nosso país.

4. A realidade da segurança do trabalho no BrasilOs dados de acidentes de trabalho de 2002, revelaram a ocorrência de 410.502 acidentes dotrabalho, deixando 15.029 trabalhadores incapacitados permanentemente e 2.898 óbitos(www.fundacentro.gov.br). Esses dados mostraram que o Brasil está com uma taxa demortalidade por AT acima da média dos países da América Latina que ficou em 13,5/100.000,perdendo para os países da Ásia – 23/100.000 e da África 21/100.000, segundo a OIT.

Buscando descobrir os “porquês” dessa realidade, muitos pesquisadores empreenderamesforços de pesquisa e chegaram as seguintes conclusões:

O empresariado brasileiro trata as normas como exigência legal e acabam apenas cumprindoos requisitos mínimos para evitar problemas com a fiscalização e a justiça do trabalho(TOMAZ e OLIVEIRA, 2001).

Existe uma difusão de idéias no Brasil, segundo Vilela (2003), de que em última instância, oculpado por um acidente de trabalho é o próprio acidentado. Afirma ainda que essaconsciência culposa de caráter perverso é induzida em campanhas promovidas pelos órgãosoficiais e entidades empresariais da área e com sérias repercussões nas ações preventivas porparte dos trabalhadores. No bojo dessa consciência culposa, “mesmo no caso de acidentes detrabalho onde a responsabilidade da empresa é evidente, os acidentados assumem para si essaresponsabilidade, inclusive a de trabalhar em uma máquina quebrada ou sem dispositivos deproteção.”

Para Vilela (2003), no Brasil predomina a visão reducionista e preconceituosa de que osacidentes do trabalho têm como causa a falha humana chamada de “ato inseguro” ou comocausa uma falha de material denominada de “condição insegura”. Esta visão simplista assumestatus de “teoria hegemônica de causalidade dos acidentes” e está ultrapassada há décadas empaíses desenvolvidos, mas continua prevalecendo na grande maioria das empresas brasileiras.

Sobre a gestão de segurança do trabalho em nosso país, Peeters et al.(2003), afirmam que osistema brasileiro é baseado na proteção. Para o autor, “proteger significa etimologicamenteisolar do mal; portanto proteger o trabalhador significa resguardá-lo do mal veiculado peloprocesso técnico”, o que resulta em prejuízo se compararmos com um modelo ideal baseadona prevenção.

O discurso por parte dos trabalhadores e empregadores é voltado para a importância dasegurança, porém, a prática mostra o contrário. A formatação das atividades de segurança dotrabalho nas organizações é normalmente legalista e/ou fatalista. São legalistas porque sepreocupam apenas com questões normativas e fatalistas porque a preocupação com o todo,

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quando ocorre, é motivado por um acidente de trabalho ou um distúrbio de produção grave,repentino e com conseqüências imprevisíveis.

5. Os profissionais da gestão de segurança do trabalhoOs profissionais envolvidos mais diretamente com a segurança do trabalho no Brasil sãoaqueles que compõem o SEESMT - Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e emMedicina do Trabalho: o Engenheiro de Segurança do Trabalho, o Técnico de Segurança doTrabalho, o Médico do Trabalho, o Enfermeiro do Trabalho e o Auxiliar de Enfermagem doTrabalho.

Outros profissionais como o Terapeuta Ocupacional, o Psicólogo, o Fisioterapeuta tambémsão envolvidos, mas não tem uma atuação direta no chão de fábrica por não integrarem oSEESMT.

Peeters et al. (2003), citam que os profissionais de segurança do trabalho são responsáveis,conforme os países ou empresas, pelas seguintes tarefas:-Gestão do orçamento;-Acompanhamento de projetos, obras, recepção de equipamentos;-Introdução de programas de prevenção de acidentes definidos pela empresa;-Elaboração de procedimentos de segurança;-Preparação e gestão de situações de crise;-Análise de acidentes e reconhecimento de doenças profissionais;-Participação em diferentes reuniões;-Contatos com representantes dos vários fornecedores de equipamentos e serviços, órgãosgovernamentais, fiscais do trabalho...-Formação e treinamento dos empregados;-Auditorias.

Peeters et al. (2003), afirmam que o modelo brasileiro se baseia no isolamento do trabalhadordas “fontes acidentárias” e não na eliminação destas fontes. Que em muitas empresas reina afilosofia de “primeiro a produção”. Esta visão limita o gerenciamento de segurança,atribuindo-lhe um papel secundário na organização que se manifestará pelas seguintescaracterísticas:-Pouca atenção é dada em relação aos pequenos e frequentes incidentes no gerenciamento dosriscos, que não são gerenciados, nem utilizados de forma preventiva.-“Cultura da segurança reversa”, em que premia a produção máxima, frequentementeoperando em ambiente degradado. -O governo pauta a sua atuação em uma fiscalização restrita e estática pautada em normastécnicas específicas de máquinas e equipamentos e procedimentos frequentementeincompletos.-Na estrutura organizacional da maioria das empresas, as funções relacionadas à segurança sãoseparadas das de planejamento e controle da produção, havendo, de modo geral uma oposiçãoentre as funções segurança e produção.-Devido à necessidade de redução de custos, a produção é levada a reduzir efetivos, terceirizarsetores, reduzir manutenção de peças de reposição, com conseqüências diretas sobre asegurança.Nas organizações é muito comum a criação de “verdadeiras ilhas” especializadas emsegurança do trabalho designadas pela sigla SEESMT – Serviço Especializado em Engenhariade Segurança e em Medicina do Trabalho. O SEESMT toma para si, ou a organização lhesimpõe, a responsabilidade pela segurança, como se os demais setores produtivos da empresa,não mais precisassem se preocupar com isso.

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6. Materiais e métodoEsta pesquisa foi realizada, buscando no Instituto de Criminalística de Ponta Grossa-PR, casosde acidentes de trabalho com óbitos ocorridos entre 2001 e 2004 e que foram objeto de períciado Instituto. Foram disponibilizados 25 laudos e, desses laudos, foram escolhidos 10 paraevitar a repetição de um mesmo tipo de acidente. Nos casos escolhidos, foi feita umapesquisa documental que, segundo Gil (2002) vale-se de materiais que ainda não receberamum tratamento analítico e, apesar de não responder definitivamente o problema, proporcionamuma melhor visão dele. Nesse intuito, os acidentes foram discutidos segundo a revisão teóricaapresentada.

7. Os casos escolhidosData Acidente Conclusão levantada

08/11/01 Morte de duas pessoas pela inalação de gás letalCO e CO2 em túnel de um silo sem exaustão ouventilação adequadas.

Faltou sistema de ventilação natural ouforçada que impediria a concentração de gasesnocivos e em volumes incompatíveis e letaisao ser humano.

24/07/01 Morte de trabalhador que foi recolocar o papel emuma bobina com o maquinário em movimento. Foiprensado entre as bobina de papel. Segundo oassistente era acostumado a fazer tal procedimentosempre que o papel rompia e tinha 14 ano deserviço na empresa.

A máquina deveria possuir mecanismos queimpedissem esta ação por parte dofuncionário.

14/09/01 Morte do trabalhador que foi pegar uma ripa deuma pilha de MDF. A pilha de MDF precipitou-sesobre o mesmo ocasionando sua morte.

O funcionário não observou o contido emplacas de sinalização existentes no local como“Acesso restrito ao pessoal autorizado” e “Usoobrigatório de capacete”.

13/05/03 Morte de duas pessoas que estavam erguendo umatorre metálica. Em dado momento, a torre acabouse desequilibrando e caiu, provocando a morte.

Ocorreu erro na montagem da torre.

22/06/04 Morte de trabalhador provocada pela queda doelevador por rompimento do eixo do carretel.

Falta de manutenção do sistema de elevadores.

21/10/02 Morte de quatro funcionários pelo colapso deestrutura metálica de cobertura que estava sendomontada. As treliças não estavam intertravadas e,um forte vento durante o serviço veio a desabar aestrutura, provocando o acidente.

Montagem sem travamento no momentonecessário tornou as treliças vulneráveis àação do vento.

28/04/04 Eletrocussão em transformadores com morte dotrabalhador.

Trabalhador não observou distâncias corretas,contrariando sinalização.

24/02/03 Morte do trabalhador por soterramento na valetaem que estava escavando. Não estava utilizandode escoramentos previstos em norma para asparedes da valeta.

Falta de escoramento previsto na NR-18 notrabalho de cavar valeta.

17/04/02 Acidente com o tombamento de um trator queestava subindo um aclive muito acentuado. Otrator tombou provocando a morte do trabalhador.

Falta de treinamento para o condutor do trator.

20/08/02 Um trabalhador estava consertando uma coberturade fibro-cimento, quando veio a cair de altura eentrar em óbito em razão disso.

Falta de cumprimento da NR-18

Tabela 2 – Acidentes de trabalho com óbito na região de Ponta Grossa, Pr

8. Discussão dos resultadosOs acidentes fatais aconteceram tanto em empresas sem certificação de qualidade, como emmultinacionais que têm esta certificação implantada, o que revela a necessidade de se estudarmelhor este tipo de problema.

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Verificou-se que cinco acidentes de trabalho aconteceram por condições inseguras dossistemas instalados como, por exemplo, o túnel sem ventilação e o rompimento do eixo docarretel do elevador, como a falta de mecanismos que impediriam recolocar papel commáquinas em movimento.

Outros cinco acidentes ocorreram pela tomada de decisão errada nos sistemas produtivoscomo, por exemplo, a falha na montagem da estrutura metálica. Também a falta deescoramento no trabalho de cavar valetas e, outros ainda, pela falta de treinamento nacondução do trator ou para o trabalho em altura na cobertura do barracão ou, simplesmente,porque o trabalhador não observou determinações em placas de sinalização.

Quando analisados, os acidentes que ocorreram com conseqüências trágicas, confirmam o quefoi levantado na revisão teórica, fortalecendo a idéia de que a situação geral da realidadebrasileira apresenta-se com as seguintes características:-Há prioridade da produção em relação à segurança;-Premia-se a produção máxima, mesmo em ambiente degradado;-As funções relacionadas com a segurança, quando existem, são separadas do planejamento econtrole da produção e, existe até mesmo uma oposição entre as duas;-Devido à necessidade de reduzir custos, a produção é levada a reduzir efetivos, terceirizarsetores, reduzir manutenção de peças de reposição, com conseqüências diretas sobre asegurança;-A segurança é tratada apenas como exigência legal;-Em última instância, o culpado por um acidente de trabalho é sempre o próprio acidentado;-O nosso modelo de gestão da segurança do trabalho é baseado na “proteção” quando deveriaser baseado na “prevenção”;-As atividades dos profissionais do SESMT ficam distantes do chão-de-fábrica, por seenvolverem demais em atividades administrativas;-Não se dá atenção aos relatos de incidentes junto aos trabalhadores para o gerenciamento deriscos, atuando na forma preventiva.

9. ConclusãoNo campo da gestão da segurança do trabalho, em nosso país, há muito que ser feito paraidentificar e eliminar riscos de acidentes.

Atuar nas empresas diretamente sobre os maquinários e no treinamento dos operadores emcumprimento às Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho é o primeiro passopara resolver parte dos problemas, já que as estatísticas mostram a precariedade da situaçãoneste setor.

Como solução complementar, para apresentar medidas com alcance maior, deve-se aplicaruma Análise Ergonômica do Trabalho, nas empresas onde ocorreram acidentes de trabalho,para levantar anormalidades ergonômicas e, trabalhar com ações corretivas, preventivas epreditivas para serem eliminadas as fontes causadores de acidentes.

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