A Escolha Do Conjuge

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A escolha do cônjuge

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Este texto pretende ensinar os aspectos essenciais à vida

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  • A escolhado cnjuge

  • A634e Anton, Iara L. Camaratta A escolha do cnjuge: um entendimento sistmico e

    psicodinmico / Iara L. Camaratta Anton. 2. ed. rev. ampl. Porto Alegre : Artmed, 2012.

    448 p. ; 23 cm.

    ISBN 978-85-65852-01-2

    1. Psicologia. 2. Psicologia familiar. I. Ttulo.

    CDU 159-027.553

    Catalogao na publicao: Ana Paula M. Magnus CRB 10/2052

  • Iara L. Camaratta antonPsicloga. Especialista em Psicologia Clnica (PUCRS).

    Especialista em Psicoterapia de Orientao Psicanaltica (PUCRS).Formao em Terapia de Casal e de Famlia (DOMUS).

    Formao em Psicanlise da Vincularidade (Instituto Contemporneo).

    2012

    2a ediorevista e ampliada

    A escolhado cnjuge

    UM EnTEnDIMEnTO SISTMICO E PSICODInMICO

  • Reservados todos os direitos de publicao ARTMED EDITORA LTDA., uma empresa do GRUPO A EDUCAO S.A.Av. Jernimo de Ornelas, 670 Santana90040-340 Porto Alegre RSFone (51) 3027-7000 Fax (51) 3027-7070

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    Artmed Editora Ltda., 2012

    Capa: Paola Manica

    Preparao de originais: Rafael Padilha Ferreira

    Coordenadora editorial: Mnica Ballejo Canto

    Gerente editorial: Letcia Bispo de Lima

    Editorao eletrnica: Formato Artes Grficas

  • Dizer sim a um amor de verdade dizer sim liberdade e alegria de viver.

    Ao meu parceiro de viagem, dedico A Escolha do Cnjuge

    com ternura, com saudade,e na certeza de que valeu!...

    Penso que tudo aquilo que tem vida, beleza e valor torna-se mais vivo, belo e precioso se puder ser

    compartilhado. Por isso, ou para isso, decidi escrever.

  • Li com muita ateno e prazer essa segunda edio revista e ampliada do livro de Iara C. Anton. Unicamente como ilustrao, vou mencionar e enumerar algumas das inmeras colocaes da autora, especialmente as que tangem psicanlise atual: 1) as motivaes inconscientes na escolha do cnjuge; 2) a importncia dos vnculos (amor, dio, conhecimento e reconhecimento), prin cipalmente os vnculos primitivos, desde a condio de beb; 3) a justa importncia que o livro empresta ao fenmeno da comunicao, em suas mltiplas facetas; 4) a normalidade e patologia do sentimento de amor; o importantssimo papel do narcisismo; 5) as mltiplas e polimorfas faces da sexualidade; 6) a construo da famlia, papis, posies e funes de cada membro de cada famlia; 7) novos tempos e perspectivas em relao aos idosos; 8) os porqus e os comos dos casamentos desfeitos; 9) as descobertas mais recentes das neurocincias; 10) as distintas modalidades das psicoterapias de casal e de famlia. Fao questo de louvar com nfase o fato de que a autora Iara acompanha as suas consideraes tericas, tcnicas, prticas e indagatrias, com excelentes vinhetas clnicas.

    Por fim, expresso o meu sentimento de ter gostado muitssimo deste livro, onde aprendi bastante, e me sinto muito vontade de recomend-lo a todos que tm interesse nas vicissitudes que acontecem em praticamente todos casais e famlias, para que leiam e estudem atentamente este excelente livro.

    David E. ZimermanMdico psiquiatra. Membro efetivo e psicanalista didata da

    Sociedade Psicanaltica de Porto Alegre (SPPA). Psicoterapeuta de grupo.

  • preciso abrir todas as portas que fecham o corao. Quebrar barreiras construdas ao longo do tempo, Por amores do passado que foram em vo [...] preciso ver o outro com os olhos da alma e se deixar cativar! preciso renunciar ao que no agrada ao seu amor... Para que se moldem um ao outro como se molda uma escultura,[...]... quando voc estiver vivendo no clmax dessa paixo, Que sinta que essa foi a melhor de suas escolhas! Que foi seu grande desafio... e o passo mais acertado De todos os caminhos de sua vida trilhados!

    Para viver um grande amorCarlos Drummond de Andrade

    Cantado pelos poetas de todos os tempos em verso, prosa e melodias, o amor apresenta-se como um tema universal e transversal s culturas e tempos. Redefinido e reescrito nos tempos contemporneos da modernidade lquida res saltada por Bauman, o encontro de um par amoroso com o qual se possa viver um grande amor continua sendo um desejo e, muitas vezes, um sonho. Assim, falar so bre a formao dos vnculos amorosos, nos desafios de sua construo e ma nuteno apresenta-se como uma pro posta relevante, instigadora e convidativa.

    Quando se trata da escolha de um par amoroso, o nome Iara Camaratta Anton uma referncia. Tecendo os fios entre conceitos psicodinmicos e um en-tendimento sistmico de maneira esttica e harmoniosa, nesta nova edio de A escolha do cnjuge um entendimento sistmico e psicodinmico, Iara oferece ao leitor uma obra convidativa para alm das barreiras conceituais de abordagens par-ticulares. Revisitando sua prpria obra, Iara estende os limites de sua publi cao original para incluir novos captulos considerando os desafios da contem pora-neidade. Assim, essa edio ampliada considera a diversidade de vnculos e relaes que vivemos nos tempos atuais, obviamente definindo novos contratos conjugais com clusulas especficas e outrora inusuais. Um destaque importante desta obra que Iara, alm de dialogar para alm das barreiras disciplinares, traz para seu texto anos de experincia clnica, o que lhe permite um trnsito instigador entre teoria e prtica no territrio da contemporaneidade. Terapeutas que acom panham casais, estudantes e interessados no tema vo encontrar neste livro pos sibilidades de am-pliar seus entendimentos e refletir sobre esse tema. Afinal, como diz o poeta, em meio a tantos dissabores, A vida a arte do encontro. Se esse um de seus in-teresses, certamente vai apreciar esta leitura.

    Marilene GrandessoTerapeuta de famlias, casais, indivduos e comunidades

    INTERFACI Instituto de Terapia: Famlia, Casal e IndivduoNUFAC Ncleo de Famlia e Comunidade da PUC-SP

  • Apresentao 2a edio ....................................................................... 13 Iara L. Camaratta Anton

    Parte IIntroduo

    1 Escolha do cnjuge: motivaes inconscientes .............................. 182 Primeiros vnculos: a matriz fundamental ........................................ 213 O casamento .................................................................................... 284 O inconsciente .................................................................................. 545 Contribuies da teoria geral dos sistemas ..................................... 676 Contribuies oriundas da ciberntica ............................................ 857 Contribuies oriundas da teoria das comunicaes ..................... 1008 Sobre um determinado contrato secreto ...................................... 110

    Parte IIA famlia e a psicologia do desenvolvimento

    9 Funcionalidade e disfuncionalidade nas relaes amorosas ......... 12410 Primeiros vnculos ........................................................................... 137

    Sumrio

  • 11 Agressividade e inveja ..................................................................... 16512 Sentimentos de culpa, ressentimentos e controles ........................ 18413 Os complexos .................................................................................. 204

    Parte IIIA dinmica do amor

    14 O amor ............................................................................................. 23415 A efemeridade no amor ................................................................... 26416 Fixao materna: a escolha impossvel .......................................... 27617 A carncia bsica do amor .............................................................. 28618 A orientao narcisista .................................................................... 29119 Orientao sexual: novos horizontes .............................................. 30620 O idoso: novos tempos e novas perspectivas ................................ 32221 Sexualidade ..................................................................................... 33822 Casamentos desfeitos ..................................................................... 411

    Referncias ............................................................................................. 435

    Indice ....................................................................................................... 443

    x Sumrio

  • interessante observarmos que a passagem do tempo, muito embora nos coloque diante de novas oportunidades e desafios, no muda o ser hu-mano, em sua essncia. Disputas e guerras continuam ocorrendo, tanto en-tre naes, quanto na intimidade de nossos lares. Em contrapartida, tambm permanecem o desejo de amar e ser amado, de conviver com justia, equil-brio, sade, paz e felicidade. Mas o fato que aquilo que ou parece ser inerente ao ser humano tem que se ajustar ao mundo em que vivemos aqui e agora. Sempre foi assim: o meio modela o homem e o homem modela o meio, do qual fazem parte seus semelhantes e tudo o que existe dentro e fora de si mesmo.

    Assim, quando pensamos nas motivaes inconscientes para a escolha do cnjuge, podemos buscar subsdios em contedos que j vm sendo exa-minados de longa data mas no podemos parar por a:

    As crianas, por exemplo, tm encontrado novas realidades, desde as possibilidades de concepo at o estilo de vida e o que delas se espera.

    Os adolescentes j no tropeam nas mesmas barreiras que seus pais e avs sofriam, em relao a vivncias amorosas e sexuais mas en-contram outras, e nisto se inclui algumas mudanas de preconcei-tos, que se escondem atrs da imposio de que no haja preconcei-to algum.

    Em nossos dias, ressurgiu a conscincia de que necessrio o esta-belecimento de limites, em favor do indivduo e da sociedade; no entanto, hierarquias tm sido desconsideradas, a baixa tolerncia a frustraes tem gerado muitos transtornos, e ondas de violncia tm sido observadas dentro dos lares, nas escolas e nas ruas.

    apresentao 2a edio

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    Tem se mostrado cada vez mais desafiador resistir aos apelos de consumo, que acabam por afetar tambm os relacionamentos, que em muitas circunstncias revelam-se efmeros, descartveis e, por tanto, incapazes de superar as frustraes do cotidiano.

    Casamentos formais ou informais so igualmente respeitados, mas o Direito cria novos estatutos, levando em conta fatos da atualidade, tais como unies estveis, ainda que no legalizadas.

    Divrcios so muito melhor aceitos, seguidos ou no por novos en-laces e dando origem a novas configuraes familiares, com suas complexidades e desafios.

    Unies homoafetivas vm conquistando respeito e espao formal na so-ciedade, incluindo nisto a possibilidade de os casais de gays e lsbicas terem seus prprios filhos, sem se esconderem na clandestinidade.

    Ambos os parceiros so responsveis pela rea econmica, e isto acarreta em mudanas na distribuio de funes necessrias ao bom funcionamento da vida familiar, tendo em vista suprir necessi-dades e garantir conforto e segurana para todos.

    Aumentou significativamente a expectativa de tempo de vida, e as pessoas tm podido envelhecer com muito mais sade, vigor e dig-nidade do que antigamente, o que interfere tambm nas possibilida-des amorosas e sexuais dos idosos.

    A psicofarmacologia evoluiu enormemente, contribuindo para sade fsica e mental e oferecendo recursos eficazes tambm para o exer-ccio da sexualidade e para a superao de disfunes nesta rea.

    Existe maior conscientizao a respeito de recursos psicoterpicos, tendo em vista a melhor qualidade de vida e de vnculos, e um n-mero cada vez maior de pessoas tm buscado tratamento, visando superaes de dificuldades emocionais e relacionais.

    Viver bem est relacionado a conviver bem e, contrariando em parte o que se observa em termos de superficialidades e consequen-te efemeridade na esfera do amor, o fato que cresce significativa-mente a busca por psicoterapia de casal, atestando um crescente in-teresse em investir nos vnculos estabelecidos.

    Isto e muito mais vem acontecendo em poucas dcadas. Assim sendo, esta nova edio do A escolha do cnjuge um entendimento sistmico e psico-dinmico, embora conserve a sua essncia, apresenta algumas novidades na diviso e na reescrita de alguns captulos e na redao de novos.

    Ele continua dividido em trs partes. A primeira, Introduo, est voltada para teorias que, de alguma

    forma, lanam as bases para o entendimento de que a escolha do cnjuge, o estilo e a qualidade da vida a dois no so obras do acaso, tendo causas e

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    consequncias e encontrando-se inseridos na histria de cada um dos parcei-ros. Est dividida em oito captulos. O Captulo 1,Escolha do cnjuge: moti-vaes inconscientes, sinaliza paradoxos que se apresentam, quando afir-mamos que foras inconscientes, somadas a foras dos sistemas de pertenci-mento, so decisivas perante nossas possibilidades amorosas. O Captulo 2 passou a ser Primeiros vnculos: a matriz fundamental. Nele procurei con-ceituar e desenvolver mais profundamente o tema vnculos, relacionan-do-o com necessidades bsicas do ser humano nas mais diversas fases de seu desenvolvimento. O Captulo 3, O casamento, traz em sua introduo um pouco de histria e tambm passou a incluir ilustraes clnicas. No Captulo 4, O inconsciente, foram includos alguns comentrios a mais e vinheta cl-nica. No Captulo 5, As contribuies da teoria geral dos sistemas, apresen-ta poucas modificaes e segue focalizando o fenmeno da interdependn-cia humana como constituinte. O Captulo 6, Contribuies oriundas da ci-berntica, traz como novidade algumas contribuies de Nichols e Schwartz. O ttulo do Captulo 7, Contribuies oriundas da teoria das comunicaes, mudou um pouco, e sua redao foi modificada e atualizada. O Captulo 8, Sobre um determinado contrato secreto, segue tomando a histria da criancinha surda, citada no captulo anterior, como ilustrao.

    A segunda parte, A famlia e a psicologia do desenvolvimento, rene cinco captulos que enfocam vnculos, com suas caractersticas e funcionamen-tos. O Captulo 9, Funcionalidade e disfuncionalidade nas relaes amoro-sas, mostra que a seleo de parceiros est, de alguma forma e em algum grau, a servio do sistema, viabilizando a continuao da histria. O Captu-lo 10 enfoca os Primeiros vnculos, inclui vinheta clnica e apresenta o entre-laamento entre as primeiras relaes objetais enquanto bases da memria emocional e da aprendizagem para o amor. O Captulo 11 foi subdividido e nesta edio se chama Agressividade e inveja e o Captulo 12 passou a abri-gar o tema Sentimentos de culpa, ressentimento e controle. Traz algumas reflexes de ordem conceitual e a contribuio de novos autores, diferencian-do culpa e remorso, apontando possveis fantasias de onipotncia em algumas modalidades de sentimentos de culpa, associando-as presena de transgres-ses e a diversos tipos de medo. O Captulo 13 albergou o tema Os comple-xos, aqui considerados como oportunidades evolutivas.

    A terceira parte, A dinmica do amor, encontra-se centrada em te-mas ligados ao amor e sexualidade humana. O Captulo 14 discorre sobre O amor. Trazendo novas contribuies tericas, refere aos quatro vncu-los, propostos por Zimerman, e inclui o conceito de amor tantalizante. O Captulo 15 inteiramente novo, A efemeridade no amor. Traz algumas contribuies de autores da atualidade e relaciona tendncias a fragilidades vinculares a iluses tpicas do amor romntico, baixa tolerncia a frustra-es, a dificuldades em aceitar a alteridade e conviver com diferenas e di-

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    vergncias. O Captulo 16 volta atenes Fixao materna: a escolha im-possvel. Mantendo-se fiel edio anterior, avalia o drama de filhos que se vm condenados a funcionarem como extenso de suas prprias mes. O Captulo 17 trata A carncia bsica no amor. Aponta caractersticas do in-divduo com tendncias ao isolamento, enquanto tentativas de soluo para conflitos inconscientes. O Captulo 18, A orientao narcisista tambm per-manece quase que na ntegra e, em seu final, evoca a passagem do Peque- no Prncipe pelo planeta habitado por um sujeito vaidoso. O Captulo 19, Orientao sexual: novos horizontes, inteiramente novo e prope uma reviso de paradigmas, a partir de um breve passeio pela histria da huma-nidade. O Captulo 20, O idoso: novos tempos e novas perspectivas, tam-bm indito, no tendo sido publicado anteriormente. Refere a um mundo que envelhece e questiona as expresses velho ou idoso. O Captulo 21 est centrado na Sexualidade. Mantm boa parte da escrita original, con-ceituando sexualidade, pr-genitalidade e genitalidade. O Captulo 22 exa-mina a questo dos Casamentos desfeitos, preserva e enriquece as contri-buies da edio anterior, considerando razes pelas quais casamentos se desfazem e vnculos so quebrados.

    Este livro foi escrito com muito cuidado e muito amor. Representa a sntese de estudos, da experincia clnica e de longos anos de existncia, que incluram anseios e temores, encontros e desencontros, alegrias e tristezas. Compartilhar o que a vida ensina um prazer muito grande, especialmente quando se faz acompanhar pelo desejo imenso de contribuir em favor de um mundo melhor, dando continuidade a tudo o que a vida j nos proporcio-nou. E com este carinho e esta expectativa que entrego a nova edio do A escolha do cnjuge em suas mos.

    Iara L. Camaratta Anton.

  • Parte IIntroduo

  • A escolha do tema deste livro deve-se a uma observao diria, na prtica clnica: no h parceria que se forme sem uma inteno indivi-dual, profundamente arraigada e de grandes efeitos, ainda que parcial ou total-mente desconhecida para ambos os envolvidos. Somos levados a perceber que o relacionamento ntimo entre as pessoas representa o fechamento de um crculo, cujo traado se iniciou ao ser concebido cada ser humano em questo. A trajetria de um ponto original a um ponto mximo, no qual o sujeito passa a estabelecer novas relaes sumamente estreitas e a produzir seus prprios frutos, longa e marcada por experincias que so, ao mesmo tempo, universais e nicas.

    O estudo do inconsciente coloca-nos diante de um paradoxo, pois mos-tra que o homem no tem o poder de deciso que imagina ter, mas tambm no pode inocentar-se, atribuindo seus sucessos e insucessos a agentes exter-nos. A felicidade de um casamento no obra do acaso, nem se encontra merc de foras do alm. Por outro lado, a adoo de determinadas posturas e as diversas opes feitas ao longo da vida sofrem marcante influncia de fatores internos, fora do alcance da conscincia.

    H elementos de importncia fundamental na vida de uma pessoa, so-bre os quais ela no tem a menor possibilidade de escolha. Ela no pode, por exemplo, escolher seus pais ou sua bagagem gentica. Mas nem por isso lhe cabe considerar-se vtima ou privilegiada pelo destino. Ela estar sempre diante de uma questo bsica: definir-se perante os estmulos que recebe, in-tegrando os de origem externa com os de origem interna. nesse sentido que se pode afirmar que, em larga escala, o homem o autor de sua prpria his-

    Escolha do cnjugemotivaes inconscientes

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    tria. preciso levar em conta, porm, que ele vai se encaminhar de acordo com uma grande bagagem de motivos inconscientes, cuja influncia suma-mente poderosa.

    O uso da liberdade , comumente, muito mais limitado pelo prprio indivduo do que pela realidade, em seu sentido mais amplo. Na medida em que algum no se conhece e no tem adequadamente elaborados os seus conflitos infantis, neurticos, inconscientes, cai facilmente nas armadilhas que armou, tornando-se prisioneiro de si mesmo.

    Um psicoterapeuta observa, em inmeros casos, como os pacientes vo, gradativamente, modificando sua histria, ao se conhecerem melhor e ao travarem melhores relaes consigo mesmos e com seus objetos internos. Pa-rece que se aperfeioa a integrao entre estas duas faces da mente, ou seja, entre emoo e razo. Esta a mola mestra. A relao de um ser humano com outro ser humano e tudo o que ele faz na vida derivam sempre das relaes que estabelece com o prprio self; ou seja, de seus registros pessoais, de suas crenas e dos recursos que desenvolveu, integrando sua bagagem gentica com seus diferentes modelos e nveis de aprendizagem.

    O estudo terico e prtico da psicologia demonstra como passado, pre-sente e futuro se entrelaam, como esto permanentemente ligados. Basta um pequeno estmulo significativo e o computador humano entra em ao. No possvel ver, a olho nu, as conexes que ele efetiva. Tem-se apenas o resultado final e, na maior parte das vezes, as pessoas nem se preocupam em avaliar as relaes de causa e efeito. Essas conexes so profundamente examinadas em uma psicanlise e em uma psicoterapia de orientao analtica. Ambas focali-zam o indivduo, sob o prisma de seu mundo interior. As terapias de aborda-gem sistmica, por sua vez, visualizam especialmente as inter-relaes, ou seja, o que se passa entre as pessoas significativamente vinculadas, levando--as a assumirem papis e funes que as influenciam decisivamente em suas escolhas e no desenrolar de suas histrias em comum. Tambm as descobertas mais recentes da psiconeurologia confirmam e enriquecem a compreenso de como funciona o homem, enquanto ser vivo individual e membro de diferen-tes sistemas humanos (famlia, comunidade, etc.). As cincias se unem, dan-do margem a entendimentos cada vez mais amplos e mais profundos, em fa-vor de uma melhor qualidade de vida.

    No presente trabalho, procura-se examinar tais elos entre passado, pre-sente e futuro: entre o adulto e a criana que existe dentro deste adulto, entre homem e mulher; entre razo e emoo. Do incio ao fim, so poucas afirma-tivas radicais, pois a inteno definir as tendncias naturais, as alternativas mais provveis. A psicologia seria impraticvel se ficasse aferrada a princpios

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    rgidos, a esteretipos. Nunca demais lembrar que somos indivduos e, como tal, somos nicos. Embora tenhamos muito em comum, ns somos, no mxi-mo, semelhantes. Por isso se diz que o conhecimento do ser humano em geral fornece as pistas para o conhecimento do ser humano em particular. Por outro lado, a compreenso profunda de seres humanos em particular fundamental para que se construam teorias a respeito do ser humano em geral.

    Este livro , em grande parte, fruto de experincias vividas em relaes teraputicas, bem como de discusses em grupos de estudos e de pais, o que se soma observao de fatos que se sucedem todos os dias. Considero incon-sistente e insatisfatria uma aprendizagem que se restringe absoro terica de pesquisas elaboradas por terceiros. A prtica pessoal e profissional deve valid-las, contrari-las ou enriquec-las. O mesmo princpio se aplica leitu-ra e interpretao dos contedos aqui examinados; sua consistncia e seu valor cientfico no fazem deles verdades finais e um estudioso consciente e crtico poder enriquec-los com seus prprios referenciais, contribuindo para o permanente desenvolvimento da cincia.

    Desejo que a leitura deste livro facilite a compreenso do desenvolvi-mento humano e contribua para a melhora da qualidade de vida das pessoas que nele estiverem procurando algumas informaes bem fundamentadas. Ela no poder substituir, porm, a ao de um tratamento psicanaltico, de uma psicoterapia individual, de casal ou de famlia, pois no tem como, por si s, vencer a ao dos mecanismos de defesa, tornar consciente o inconsciente e favorecer o processo de elaborao. Somos o que somos, e aprendemos a ser. Mudar difcil, tanto pelo modo como estruturamos nossas personalida-des como pelo modo como nos integramos, desde o incio, em uma famlia e em uma sociedade, que tm, e que se empenham em manter, uma estrutura prpria, que as identifica, as mantm e as faz funcionar. No entanto, o simples fato de se parar para refletir e, honestamente, colocar-se em busca de si mes-mo, j se constitui num estmulo e num recurso de grande validade.