A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

89

Transcript of A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

Page 1: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)
Page 2: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

A ESPADA E A PENA

Page 3: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

A Editora Nobel tem como objetivo publicar obras com qualidade editorial e gráfica,consistência de informações, confiabilidade de tradução, clareza de texto, impressão,acabamento e papel adequados.Para que você, nosso leitor, possa expressar suas sugestões, dúvidas, críticas e eventuaisreclamações, a Nobel mantém aberto um canal de comunicação.

Entre em contato com:CENTRAL NOBEL DE ATENDIMENTO AO CONSUMIDORFone: (11) 3933-2800 — Fax: (11) 3931-3988End.: Rua da Balsa, 559 — São Paulo — CEP 02910-000Internet: www.livrarianobel.com.br

Page 4: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

A ESPADA E A PENAComo atingir o desenvolvimento humano:

pelo Racional e o Intuitivopelo Yin e o Yang

Mauro Monteiro de Andrade

Page 5: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

© 1999 Mauro Monteiro de Andrade

Direitos desta edição reservados à

Livraria Nobel S.A.Rua da Balsa, 559 – 02910-000 – São Paulo, SP

Fone: (11) 3933-2800 – Fax: (11) 3931-3988

e-mail: [email protected]

Coordenação editorial: Clemente Raphael Mahl

Revisão: Maria José de Deus

Produção gráfica: Mirian Cunha

Capa: Alexandre Segrégio

Composição: Polis

Impressão: Paym Gráfica e Editora Ltda.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Andrade, Mauro Monteiro de

A espada e a pena / Mauro Monteiro de Andrade. – São Paulo : Nobel, 1999.

Bibliografia.

ISBN 85-213-1070-6

1. Comportamento organizacional 2. Desenvolvimento profissional 3. Mudança

organizacional I. Título.

98-1023 CDD-658.3124

Índice para catálogo sistemático:

1. Desenvolvimento pessoal : Mudança organizacional :

Administração de empresas 658.3124

É PROIBIDA A REPRODUÇÃO

Nenhuma parte desta obra poderá ser reproduzida, copiada, transcrita ou transmitida por

meios eletrônicos ou gravações, sem a permissão, por escrito, do editor. Os infratores serão

punidos pela Lei no 9.610/98.

Impresso no Brasil/Printed in Brazil

Page 6: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

5

Já havia lido o manuscrito quando o autor me convidou a escre-ver o prefácio. Hesitei, sugerindo-lhe que a tarefa ficaria melhorse executada por um erudito nesta complexa área – a do desenvol-vimento pessoal e do autoconhecimento, área, aliás, em que não háprojetos acabados e na qual os meios-tons são a regra mais que aexceção. E acrescentei, até timidamente: “a menos que você queiraum depoimento do coração”. Ao que o autor retrucou: “Mas é issomesmo que eu gostaria”. E é o que terão a seguir.

Mauro Monteiro de Andrade eu o conheço “desde o outro car-naval”, ou, mais precisamente, há quarenta e dois anos, quando,com muito entusiasmo, começamos nosso Curso de EngenhariaMecânica e Elétrica na Escola de Engenharia da Universidade deMinas Gerais. Nossa turma foi a última que iniciou os estudos noantigo prédio da Avenida Santos Dumont e logo inaugurou a novasede da Escola, o Edifício Arthur Guimarães. Naquela época as dis-ciplinas tinham a duração de um ano e as turmas se mantinhampraticamente como um bloco até a formatura. Nesses cinco anosas amizades se consolidavam. No nosso caso, uma grande afinidadelogo se manifestou, através de interesses em comum, pelo cinema,pela música, o poker, os vinhos, sem falar na forte inclinação pelasciências aplicadas. Uma vez diplomados, fomos ambos contratadoscomo professores assistentes da EEUFMG e nosso convívio acadê-mico continuou ainda por vários anos.

Prefácio

Page 7: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

6

Mauro, entretanto, sempre foi um espírito inquieto e criativo.Mais tarde ligou-se ao recém-criado Instituto Politécnico da Univer-sidade Católica de Minas Gerais e, a seguir, foi trabalhar na inicia-tiva privada, destacando-se, em todas estas atividades, pela compe-tência profissional e dedicação ao seu trabalho. Mais recentemente,já com larga experiência gerencial, tornou-se consultor da Funda-ção Christiano Ottoni na área de Gestão pela Qualidade Total. Atu-almente atua na mesma área como consultor da Fundação de De-senvolvimento Gerencial.

Ao longo de toda esta trajetória, sua mente inquieta não lhe per-mitiu limitar-se à atividade profissional. Sempre tentou perseguiralgo mais, na área de desenvolvimento pessoal, participando degrupos de teatro, estudos de cinema, yoga, psicanálise, meditação,filosofia oriental, chegando até ao envolvimento com o movimen-to sindical. Sem falar nas incursões pela agricultura e na fabricaçãode vinhos (já tomei ótimos vinhos de laranja e bons licores de suafabricação caseira).

É esta mente inquieta e dinâmica que agora prepara este ensaioem que procura harmonizar a espada e a pena, o racional e o intui-tivo, o masculino e o feminino. A meu ver, o fez com rara habilida-de e leveza.

Belo Horizonte, abril de 1999

Carlos Bottrel Coutinho

Page 8: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

7

São tantas as pessoas das quais, ao longo da vida, recebi a orien-tação que me permitiu escrever este livro, que, sob pena de come-ter injustiça por omissão, não posso agradecer-lhes, nominalmen-te, a colaboração. Tenho a certeza de que, aquelas que lerem o texto,terão facilidade em se reconhecer nele, que nada mais é do que oregistro de um aprendizado comum.

Quero abrir uma única exceção. Em um dia qualquer, no iníciodos anos 60, meu irmão, Márcio, me apareceu com um livro e medisse, mais ou menos o seguinte: Descobri este livro, li e estou fa-zendo práticas que ele recomenda. Estou me dando muito bem, eacho que você também precisa disto. O livro era A Libertação pelaYoga, de Caio Miranda e sua leitura me abriu uma estrada até en-tão insuspeitada. Minha relação com meu único irmão inverte umaregra comum: aqui, o mais velho está sempre aprendendo com omais novo.

Agradecimentos

Page 9: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

8

Page 10: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

9

Sumário

Introdução 11

1. Civilização em um ponto de ruptura 15

2. Fontes de conhecimento 23

3. É difícil ser original 33

4. Investigação do essencial 41

5. Apegos 51

6. Ação 61

7. Onde entram as Organizações 69

8. Conclusão 74

Anexo I Uma experiência na empresaKollis Pampilli 75

Anexo II A Visão do futuro 83

Bibliografia 87

Page 11: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

10

Page 12: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

11

A partir do momento em que os seres humanos se organizaramem cidades e estabeleceram padrões para sua coexistência, a huma-nidade vem desenvolvendo um progresso contínuo em todas asáreas. Certamente a evolução existiu desde que surgiram os primei-ros espécimes de humanos, entretanto, o estabelecimento de núcleosé geralmente aceito como marco do que chamamos de Civilização.Assim, os meios disponíveis para que os seres humanos mantives-sem a espécie sofreram um desenvolvimento permanente, e conti-nuam a se desenvolver. A questão que se coloca, no presente, é ada adaptação dos seres humanos à velocidade de desenvolvimentodesses meios. Quase até o final do século XIX essa velocidade erasuficientemente lenta para que o ciclo de vida de uma pessoa seprocessasse dentro de condições razoavelmente previsíveis. Excetopor guerras ou catástrofes naturais era possível antever com umacerta segurança as principais condições que afetariam a caminhadaao longo de uma vida. Nesse contexto, eram eficazes e se manti-nham naturalmente os padrões estabelecidos para a atividade fabril,o comércio, o trabalho e a remuneração, a educação e a vida fami-liar, entre outros. No século XX, principalmente a partir da déca-da de 60, a transformação dos meios está se processando a umavelocidade muito elevada, ainda mais fortemente acentuada na dé-cada de 90. Com isso, os padrões que regem as atividades huma-nas não podem mais ser revistos na baixa velocidade em que o eramanteriormente. É preciso que sejam revistos ou substituídos em uma

Introdução

Page 13: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

12

velocidade proporcional a velocidade detransformação dos meios, o que é percebidopelas lideranças das organizações humanas.Inovação, criatividade, empowerment, em-presas aprendizes, são expressões correntesno dia-a-dia.

As atuais tendências da Administraçãopropõem que as pessoas desenvolvam e apli-quem permanentemente novos conhecimen-tos em seu trabalho. Observa-se, porém, que

as pessoas, normalmente, estão condicionadas a proceder de ma-neira diversa. A regra é não fazer diferente, ter medo de inovar ede arriscar, e principalmente, não pensar diferente do já consagra-do, ou se o fizer, não explicitá-lo. Todo o ambiente é favorável aque a massa de indivíduos se mantenha estritamente dentro dospadrões vigentes. Alguns que, corajosamente, se afastam disso e fa-zem sucesso são a própria confirmação da regra. Para a maioria,entretanto, essa coragem desaparece após alguns insucessos quecomeçam já na infância. Exceções a vestuário, artes e algumas ati-vidades correlatas, as pessoas são sistematicamente desencorajadasde questionar, e o questionamento é a única forma de acompanhara velocidade das transformações. Possivelmente, esta é a principalrazão pela qual prateleiras e auditórios fervilham com propostas demudança, desenvolvimento e gestão criativa. É um fervilhar quereúne autores de alto nível acadêmico e pessoas ligadas a movimen-tos religiosos e filosóficos. Parece bastante claro que as pessoas sen-tem necessidade de uma ruptura, de uma maneira diferente de per-ceber, de gerar idéias e de superar os próprios desafios pessoais.

Trabalhando como consultor, tenho observado uma tendência ge-neralizada de utilização de formatos novos para dizer a mesma coisaantiga. As pessoas recebem novas ferramentas e as utilizam, sem re-flexão, para continuar a agir da mesma forma como agiam antes.Também se observa que a maioria das pessoas que assim age, o fazcom a melhor intenção, acreditando sinceramente que a mudançado frasco altera a qualidade do perfume. Partindo dessasconstatações, foram desenvolvidas algumas reflexões e propostas

As atuais tendências daAdministraçãopropõem que aspessoas desenvolvame apliquem perma-nentemente novosconhecimentos emseu trabalho.

Page 14: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

13

que podem ajudar as pessoas a romper com este tipo de postura.Não se trata de nada revolucionário, e nem de um projeto acabado,já que a questão é muito ampla. O que se propõe é que as pessoastrabalhem na construção do próprio rompimento das limitaçõesassinaladas. Os textos que se seguem levantam alguns pontos dereflexão, e trazem observações e práticas baseadas em vivência pes-soal que podem vir a contribuir para as próprias reflexões do lei-tor. Quero lhe pedir compreensão para a forma com que escrevieste livro. Embora tenha me esforçado, não consegui redigir minhasidéias de forma impessoal. Está tudo escrito de forma mais ou me-nos emocional, até mesmo autobiográfica. Procurei colocar citaçõesde fontes de aprendizado com as quais tive contato, para que vocêpossa ter acesso a elas e fazer seu próprio aprendizado. Não encon-tro outra forma de ser veraz em um texto que trata de desenvolvi-mento pessoal. Gostaria muito que os leitores apresentassem crí-ticas e comentários para avançarmos nesta questão de rompimento,vital para os dias de hoje.

Page 15: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

15

Civilização em um ponto de ruptura

1

A virada do século XX para o XXI está sendo caracterizada poruma grande instabilidade na vida diária. Surgem novos equipamen-tos e facilidades a todo o instante, as organizações sofrem transfor-mações rápidas, empresas antes consideradas modelares desapare-cem, outras tornam-se gigantescas em poucos anos de vida. Isto tudoafeta profundamente as pessoas, não só em função da instabilidadede emprego e geração de renda pessoal, como também de rápidasmodificações nos padrões culturais. Um exemplo dramático dessasmodificações é o fato de uma guerra, atividade intrinsecamentehorrorosa, ter sido transformada em um show de televisão, com omundo todo assistindo à destruição e morte on line. Entre os váriosaspectos que nos trouxeram a turbulência atual, um dos mais rele-vantes é a disponibilidade de comunicação entre os seres humanos.Como isto não foi sempre assim, é interessante uma reflexão sobre odesenvolvimento da comunicação e seus impactos sobre as pessoas.

A civilização ocidental se desenvolveu ao longo demilênios dentro de um modelo que privilegia a

racionalidade e por decorrência a padronização. Essemodelo trouxe o extraordinário desenvolvimento

de nossos dias. Sua fase mais recente, contudo, estácriando uma verdadeira volatilização dos meios de

sobrevivência de pessoas, organizações e,ultimamente, até mesmo de nações. Hoje, tem-se um

ambiente de transformações muito rápidas,e o modelo que se necessita, neste momento,

é de ruptura com o modelo milenarque vinha dando certo.

Page 16: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

16

O Desenvolvimento da Comunicação

É possível acompanhar o desenvolvimentoda Civilização tomando como guia a evoluçãoda Comunicação. Os seres humanos come-çaram a se fixar em cidades e a estabelecermeios de comunicação fora do ambiente tribalhá cerca de 8.000 anos. Dessa época até apro-ximadamente o século XVI, a evolução dosmeios de comunicação foi lenta e limitada.Uma das principais características desse pe-ríodo é a comunicação marcadamente oral, fi-

cando a comunicação escrita limitada a um número ínfimo de pes-soas. Não se deve pensar que, pelo fato de terem produzido algumasobras-primas da literatura, as cidades gregas eram habitadas por pes-soas letradas. A esmagadora maioria dos habitantes era constituídade analfabetos, e o mesmo se aplica a Roma. O domínio da escritaem todo o período mencionado era reservado a uma pequena eliteque incluía políticos, chefes militares, funcionários do governo e sa-cerdotes. O modelo administrativo denominado de taylorista, emque uns poucos desenvolvem o Conhecimento e a maioria executao trabalho é muito anterior a Taylor. Outra característica importantedaquele período é que, verbal ou escrita, a comunicação exigia otransporte físico de uma pessoa, de um documento, ou de ambos.Com a inserção e divulgação da Imprensa, a comunicação dá umsalto em termos de eficiência. A facilidade de impressão provocouum surto de alfabetização e de comunicação escrita, muito emboraa maioria da população permanecesse analfabeta. Apesar disso, au-menta muito a possibilidade de transmissão de conhecimento coma utilização da escrita, permanecendo a necessidade física de trans-porte de textos e de pessoas para se estabelecer comunicação. Compequena defasagem da divulgação da Imprensa, os europeus avan-çaram muito em termos de navegação, e assim, na altura do séculoXVI ocidental já existia um sistema de comunicação global. Tinha-se a difusão da comunicação escrita, e as Grandes Navegações esta-beleceram laços Ocidente – Oriente permanentes, além de incorpo-

O domínio da escritaem todo o períodomencionado erareservado a umapequena elite queincluía políticos,chefes, miliares,funcionários dogoverno e sacerdotes.

Page 17: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

17

rarem as Américas. O transporte terrestre, en-tretanto, continuava no estágio medieval, sen-do realizado por meio de animais ou veículosde tração animal, e, é claro, a pé. Naquela épo-ca e ainda no decorrer dos séculos imediata-mente seguintes a utilização de fontes de ener-gia era muito limitada, o que também impediagrandes modificações nos métodos de produ-ção. Trabalhava-se tanto no campo como nascidades, de maneira artesanal. Seja para trans-

porte, seja para a realização de trabalho em geral a humanidade, atéentão, só tinha dominado a utilização da energia da água e do ven-to através de rodas d’água, turbinas, velas e máquinas primitivas. So-mente com o desenvolvimento da máquina a vapor e sua aplicaçãoa partir do século XVIII, houve um grande avanço nos transportese também nas formas de trabalho. O transporte terrestre sofre umsalto com a criação das ferrovias e o transporte aquático pode serefetuado através de barcos mais eficientes. Grande parte do traba-lho passa a ser executada por máquinas a vapor. Esta ampla utili-zação da energia térmica foi um dos maiores saltos da História. Mui-to justamente o período que se segue é denominado de RevoluçãoIndustrial. A Comunicação, nosso guia nesta reflexão, sofreu umimpacto considerável em suas características de velocidade eabrangência. Basta pensar na diferença de volume transportado ede velocidade entre uma diligência e um trem de ferro. Observa-seque a humanidade gastou alguns milênios para sair do estágio desimples aproveitamento das energia humana eanimal até um nível de aproveitamento signi-ficativo das máquinas. Isto aconteceu quandoa energia térmica passou a ser utilizada comoutros fins que não os de simples cozimentoou de calefação. O próximo grande passo naevolução da comunicação e do trabalho huma-no levou cerca de 200 anos. O domínio da uti-lização da energia elétrica só se concretizou nofinal do século XIX. Deve-se observar que

Grande parte dotrabalho passa a serexecutada pormáquinas a vapor. Estaampla utilização daenergia térmica foi umdos maiores saltos daHistória. Muitojustamente o períodoque se segue édenominado deRevolução Industrial.

Seja para transporte,seja para a realizaçãode trabalho em gerala humanidade, atéentão, só tinhadominado a utilizaçãoda energia da água edo vento através derodas d’água,turbinas, velas emáquinas primitivas.

Page 18: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

18

nessa época já não tem tanta nitidez o desenvolvimento da Civiliza-ção no Ocidente em separado do Oriente. No final do século XIX,com os grandes impérios alcançando a extensão do planeta, e comas facilidades de transporte e comunicação existentes, o intercâm-bio Ocidente-Oriente torna-se forte. Em conseqüência os avançosdo conhecimento podem atingir, quase simultaneamente, todos ospovos. Este é um ponto importante para reflexão. É a primeira vezna História em que o mundo inteiro pode participar do mesmo pro-

cesso de desenvolvimento. Até o século XVI,as civilizações do leste asiático, assim comoas civilizações americanas se desenvolviam demaneira quase independente. Historicamen-te sempre houve um intercâmbio entre os po-vos do Mediterrâneo, do Oriente Médio e daEuropa. Os povos do Leste Asiático tinhamum mínimo de intercâmbio comercial comestes, e as Américas eram praticamente isola-das. No final do século XIX a situação é com-

pletamente diferente e o grande avanço tecnológico do século XXtem a participação de todos, apesar da permanência de fundas di-ferenças culturais, principalmente entre o bloco influenciado pelacultura do Leste Asiático e o bloco influenciado pela cultura me-diterrâneo-européia. Este é um fator importante a ser considera-do na evolução da Civilização. A partir do final do século XIX, odesenvolvimento de motores de combustão interna derivados di-retamente das máquinas a vapor e a disponibilidade de energia elé-trica aceleram, definitivamente, duas grandes linhas de desenvol-vimento da Comunicação. Em primeiro lugar a criação de meiosde transporte tão velozes quanto os automóveis e os aviões. De ou-tro lado, o estabelecimento e a difusão de formas de comunicaçãoa distância permitindo que as pessoas se comuniquem sem neces-sidade de deslocamento físico, fato inédito na História. Paralela-mente, a facilidade de manejo da energia elétrica permitiu que otrabalho humano fosse substituído por máquinas distribuídas portoda parte.

É engraçado, tente imaginar que máquinas poderiam ter existi-

Até o século XVI, ascivilizações do lesteasiático, assim comoas civilizaçõesamericanas sedesenvolviam demaneira quaseindependente.

Page 19: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

19

do na antiga casa de sua bisavó. Agora, olhe para sua casa ou para acasa de sua avó, nos dias de hoje.

A Revolução do Silício

Na década de 60, a maior parte do trabalho mecânico podia serexecutado por máquinas e a comunicação a distância estava sendolargamente utilizada. Ocorre nessa época a chamada revolução dosilício. Inicialmente permitindo o aprimoramento de controles au-tomáticos, da computação e dos meios de transmissão de voz e ima-gem. Em 1961, a turma de formandos em engenharia mecânica eelétrica da EEUMG foi ao Rio de Janeiro para conhecer um “cére-bro eletrônico”, instalado na PUC, o primeiro do Brasil, talvez. Eraum computador a válvulas que ocupava uma grande área com arcondicionado, e que era operado por cientistas. Para que não se penseque o Brasil estava tão atrasado, pelo menos um desses cientistas,David Cohen, foi a seguir, contratado pelo Massachusetts Instituteof Technology (MIT), e tornou-se um importante pesquisador da-quela instituição, que na época estava na vanguarda do desenvolvi-mento da informática nos EUA. Pois bem, o nosso cérebro eletrôni-co tinha menos capacidade operacional do que uma calculadorasimples de hoje. A utilização do silício é para os dias de hoje tão es-petacular como o foi a máquina a vapor em sua época. Logo a se-guir ao diodo de silício, vem o avanço na pesquisa espacial, a dissemi-nação do uso de computadores e a efetiva automação do trabalho.Pela primeira vez na História uma parte pequena, porém significa-tiva, de trabalho intelectual deixa de ser exe-cutada exclusivamente por seres humanos. Aevolução desse processo de substituição nostraz ao ponto em que grande parte do traba-lho anteriormente executado por humanospassa a ser executado por conjuntos de máqui-nas. Na outra grande linha, iniciada com as pri-meiras e precárias comunicações a distância,chega-se, nos anos 90, à rede mundial de co-

A utilização do

silício é para os

dias de hoje tão

espetacular como

o foi a máquina a

vapor em sua

época.

Page 20: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

20

municação. Não é mais necessário deslocar-senada, fisicamente, para comunicar uma parce-la significativa de conhecimento. Também nãoserá necessário o deslocamento pessoal para serealizar uma parte do trabalho humano. A Hu-manidade despendeu cerca de 6000 anos paradisseminar a comunicação escrita, 300 anospara obter formas eficientes de deslocamentoterrestre, mais 100 para as primeiras comuni-cações a distância, 60 para a efetiva dissemi-

nação destas, 30 para a rede mundial de comunicação. A velocida-de da transformação e a abertura de possibilidades foram tão grandesque quase todos continuamos a utilizar procedimentos que agorase mostram desnecessários. A maioria das pessoas ainda não se aper-cebeu de que muitos dos antigos padrões de relações humanas tor-naram-se obsoletos. O impacto disto tudo no comércio, na educa-ção, na difusão de conhecimento, no trabalho do dia a dia, serádevastador em um futuro que já está a porta. Cabe a indagação: coma formação recebida e com os valores que foram cultivados durantemilênios de civilização, está a sociedade preparada para esta formi-dável mudança? Parece que a resposta é não. Há necessidade de umapostura inteiramente nova, e as reações baseadas em uma formaçãoanterior costumam ser ineficazes. Com esse condicionante, tentati-vas de formulação de novos sistemas, rapidamente se mostram poucoadequadas, quando não totalmente inadequadas. Alguns autores as-sumiram a tarefa de analisar o fim de tudo: fim dos bancos, fim dovarejo, fim do emprego, fim do dinheiro, fim da História. Respei-tando as opiniões abalisadas emitidas por esses autores, será que oprocesso de evolução, visivelmente contínuo, pode ter um fim? Oequívoco de fim da História é muito bem ilustrado por Toynbee emA Civilização Posta à Prova1. A situação relatada refere-se a um ci-dadão londrino assistindo a uma parada militar em 1897. Naquelaépoca a Inglaterra detinha um Império terrestre, dominava os ma-

1 TOYNBEE, Arnold. A Civilização Posta à Prova – em Estudos de História Contempo-rânea, trad. Brenno Silveira e Luiz de Sena, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1961.

A velocidade datransformação e aabertura depossibilidades foramtão grandes quequase todoscontinuamosa utilizar proce-dimentos que agorase mostramdesnecessários.

Page 21: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

21

res, as ameaças militares tinham sido contro-ladas, enfim o projeto estava pronto e conso-lidado. Voltando a 1947, época em que o tex-to de Toynbee foi escrito, o país convivia comracionamento, o lema do governo era exportor die, o império, já decadente estava em viasde desaparecimento. Cinqüenta anos foramprazo suficiente para se constatar a fragilida-de de estruturas supostamente permanentesdesenvolvidas pelos seres humanos.

O Ponto de Ruptura

Em seu livro Ponto de Ruptura e Transformação2, George Land eBeth Jarman apresentam um modelo muito interessante para o estu-do da evolução de organizações e da própria Civilização. Em umaprimeira fase o sistema funciona com pouco conhecimento dos me-canismos que o impulsionam. No caso da Civilização, nessa fase tem-se a predominância da observação incompleta, não há a percepçãodo papel da ação humana, as transformações e resultados obtidos sãosistematicamente atribuídos a agentes externos mágicos. A Fase I doprocesso da Civilização iria até cerca de 6000 a.C. Na segunda fase,a humanidade melhora a percepção dos mecanismos da natureza,percebe os resultados da ação humana, e começa a atuar intensamenteno processo evolutivo. Esta fase se caracteriza pela organização dassociedades, pela definição de códigos e normas, pela padronização.Esta é a fase que temos vivido até agora, quando já entramos em umaterceira fase do processo evolutivo da Civilização, em que a padro-nização, que foi um fator de eficácia no desenvolvimento anterior,passa a ser um fator limitante. Na terceira fase torna-se aguda a ne-cessidade de trabalhar com a diversidade e com a diferença, já que oque definirá a sobrevivência de organizações e pessoas é a capacidade

2 LAND, George e JARMAN, Beth. Ponto de Ruptura e Transformação – trad. AdailUbirajara Cabral, São Paulo, Cultrix, 1994.

Cinqüenta anosforam prazosuficiente para seconstatar a fragili-dade de estruturassupostamentepermanentesdesenvolvidas pelosseres humanos.

Page 22: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

22

de inovar. Esta é em linhas gerais, a interpre-tação da idéia dos autores, cuja leitura é reco-mendada para o entendimento da aparente-mente confusa fase em que vive a humanidade.A turbulência pode ser, em parte, atribuída aofato de que procedimentos que foram válidose impulsionadores em uma fase anterior pas-saram a ser ineficazes. Nesses momentos, quan-do percebem a inadequação de um modelo masnão sabem para onde ir, um comportamento

típico das pessoas é a tentativa de “volta ao passado”. No atual mo-mento da Civilização isto pode ser percebido pela onda de aparentereligiosidade e misticismo que hoje se verifica no mundo inteiro.Procurando interpretar dentro do modelo analisado por George Lande Beth Jarman, pode-se dizer que, sentindo que a fase II da Civiliza-ção está em esgotamento, e não sabendo como se comportar em umafase III, muitas pessoas fazem suas tentativas de voltar a fase I. O quecaracterizou aquela fase foi que na mente das pessoas, as coisas acon-teciam porque fatores externos, normalmente inexplicáveis e má-gicos, atuavam para que elas acontecessem. A agricultura seria pro-dutiva porque cultos de fertilidade atraíam a ajuda das divindades eassim por diante. Na fase II os seres humanos passam a compreen-der que a agricultura é produtiva porque eles dominam mais e maisos seus mecanismos. A questão atual parece se concentrar, nesse fato:com a evolução, alguns seres humanos começam a dominar todo oconhecimento dos processos de produção. Com isso e com a uti-lização maciça da energia disponível, poucas pessoas que detêmconhecimento produzem o que antes demandava um número elevadode pessoas. Isto leva à exclusão social de uma enorme parcela dosseres humanos. Os critérios que permitiram o grande desenvol-vimento verificado na fase II estão esgotados em termos de possibi-lidades para o conjunto dos seres humanos. A continuidade de suaaplicação só agravará mais ainda a exclusão e suas conseqüências.Estamos em um ponto de ruptura. É preciso explorar todas as pos-sibilidades, anteriormente não utilizadas, de adquirir, divulgar eaplicar conhecimento.

Nesses momentos,quando percebem ainadequação de ummodelo mas nãosabem para ondeir, um comporta-mento típico daspessoas é atentativa de “voltaao passado”.

Page 23: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

23

Fontes de conhecimento2

O conhecimento está em toda a parte.Basta saber procurá-lo. Se você o procurausando apenas um caminho, você estará

limitando o conhecimento que é capazde adquirir. Pior do que isto, você limita

sua capacidade de observar.

“Quando o discípulo está pronto, o mestre aparece”.

Este aforisma, de origem hindu, vale uma boa reflexão. Ao lon-go da vida surgem diversas situações e nelas é que se encontra a orien-tação para o aprendizado, formal ou infor-mal. Se a pessoa está apta e aberta parareceber conhecimento surgirá alguma situa-ção que permitirá que o conhecimento sejarecebido. E vice-versa se a pessoa não estáapta, ela passará ao lado da fonte, sempercebê-lo. O ideal seria estar sempre emestado de prontidão para perceber. NoOriente existem diversas escolas e práticaspara desenvolver este estado de prontidão.No Ocidente existe uma cultura que privi-

No Oriente

existem

diversas escolas

e práticas para

desenvolver este

estado de

prontidão.

Page 24: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

24

legia a parte racional do ser humano enormalmente é por aí que se adquire co-nhecimento. Para absorver o conhecimen-to necessário para acompanhar as transfor-mações da sociedade, deve-se trabalhartambém com a parte não-racional. Sem istoos mestres estarão por aí e você não os per-ceberá. A expressão “não-racional” está uti-lizada, neste texto, como aquilo que não éobtido por uma seqüência lógica de racio-cínio. Por exemplo, uma efetiva brainstorm

trabalha com o não-racional. Tenta-se atingir aquilo que foi perce-bido e registrado instintivamente e que não brotaria em um racio-cínio lógico. Os chamados insights também nos chegam de formanão-racional. Qualquer que seja o procedimento adotado paraprovocá-los, os insights somente irão ocorrer quando se levantamos bloqueios da lógica.

São inúmeras as fontes disponíveis para a obtenção de conheci-mento e muitas vezes não são utilizadas. Até mesmo atividades delazer podem ser fontes de aprendizado. Futebol e outros esportescoletivos podem trazer muito conhecimento sobre trabalho em gru-po e percepção de oportunidades. Os atletas individuais são exem-plos definitivos de comportamento para superação de obstáculos.Você percebe que eles não lutam contra os obstáculos. Eles traba-lham com persistência e técnica para que osobstáculos deixem de sê-lo. E criam esco-la. Quase todas as vezes em que um recor-de é batido por um atleta, outros atletas che-gam ao mesmo resultado dentro de algumtempo. É admirável uma figura comoSerguei Bubka. Era reconhecidamente omelhor, detentor de todos os recordes e, noentanto, sucessivamente se propunha e ba-tia seus próprios recordes. Este é um exem-plo de situação que ilustra o conceito de

Os atletas

individuais são

exemplos

definitivos de

comportamento

para superação de

obstáculos.

O enorme potencialde conhecimentocontido em fontes nãoconvencionaiscostuma ser literal-mente ignorado,principalmente porpessoas que têm umaexcelente formaçãoacadêmica.

Page 25: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

25

mestre, como aqui mencionado. O enormepotencial de conhecimento contido em fon-tes não convencionais costuma ser literal-mente ignorado, principalmente por pes-soas que têm uma excelente formaçãoacadêmica. Se este for o seu caso, pense emcomo você pode crescer em conhecimentose somar novas fontes às fontes que já do-mina. Já muitas pessoas que não tiveramintensa formação acadêmica, ou até mesmosão de baixa escolaridade exploram bem asfontes alternativas. Para explorar quaisquer fontes, alternativas ounão, é necessário abrir-se ao questionamento e à indagação.

Esbarrando com os mestres[um pouco de autobiografia]

Tive uma excelente oportunidade, quando fui aluno do 3o anocolegial. O professor de Filosofia, para mim verdadeiro mestre nosentido deste texto, foi Arthur Versiani Veloso. Foi a primeira pes-soa, de que me lembro, que me fez aguçar a atitude crítica. Para istoele usava um método muito simples. Suas aulas forçavam a partici-pação dos alunos na discussão de situações da vida diária. Muitas

pessoas não entendiam isto e diziam queo Prof. Veloso “não dava aula”. Naquelaépoca toda a imprensa dedicava grandeespaço à chamada Alta Costura, como ain-da o faz hoje. Veloso propôs a seguintediscussão: Jacques Fath, costureiro famo-so, é um artista? Produz beleza? O que ébelo? As aulas eram nesse nível, em geral.Nada de encher alunos o tempo todo cominformações históricas, referências e ou-tras. O resultado é que saí do curso do

Suas aulas

forçavam

a participação

dos alunos na

discussão de

situações da vida

diária.

Já muitas pessoas

que não tiveram

intensa formação

acadêmica, ou até

mesmo são de baixa

escolaridade

exploram bem as

fontes alternativas.

Page 26: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

26

Prof. Veloso cheio de dúvidas, e conse-qüentemente de possibilidades, acadêmicase alternativas. Por exemplo, até aqueleencontro com Veloso, o Cinema era paramim uma simples fonte de entretenimen-to. Uma de suas aulas consistiu em nosacompanhar ao cinema, para vermos o fil-me Orfeu [Jean Cocteau], para depois de-batermos a mensagem do filme. Em outrasocasiões recomendou assistirmos a algumfilme para depois fazermos o debate. Esta

maneira de explorar o conhecimento disponível no Cinema é umadas alternativas de que dispomos. Tome-se como exemplo, um dosfilmes da época, “Os Sete Samurais”1. Um dos protagonistas é umguerreiro, o melhor de todos, que, entretanto, dedica seu tempo livrepara aperfeiçoar-se na arte da espada. Além da mensagem evidente,que provocou uma reflexão forte em pessoas da época, existe umfato que é hoje mais claro. Há uma interpretação de que o persona-gem teria sido inspirado por Miyamoto Musashi2, este uma figurade carne e osso, guerreiro legendário. Atualmente Musashi é respei-tado no Japão, e no Ocidente está se tornando conhecido, a partirde citações por autores respeitados, principalmente na área da ad-

ministração. Em sua época não era bemassim. Isto porque era um samurai ambu-lante, guerreiro sem senhor, o que naque-le tempo era quase vergonhoso. Quandoassumiu a função de mestre de esgrima docastelo do clã Hosokawa não era tratadocomo um vassalo, mas como um convida-do, por deferência do senhor do castelo.Mas isto foi próximo ao fim de sua vida, eMusashi já tinha demonstrado o seu valor.

1 KUROSAWA, Akira. Os Sete Samurais [filme] –, vídeo da Tocantins Filmes.2 MUSASHI, Miyamoto. Gorin-No-Sho, O Livro dos Cinco Elementos, trad. José Yamashiro.

Cultura Editores Associados, 1992.

Uma de suas aulasconsistiu em nosacompanhar aocinema, paravermos o filmeOrfeu [ JeanCocteau ], paradepois debatermosa mensagem dofilme.

Atualmente Musashié respeitado noJapão, e no Ocidenteestá se tornandoconhecido, a partirde citações porautores respeitados,principalmentena área daadministração.

Page 27: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

27

Além da independência, Musashi tinhaoutras características que o tornam ummestre, mesmo quando o encontramos sé-culos depois. Enquanto para os outros sa-murais a espada curta era um simples sím-bolo de status, Musashi desenvolveu umatécnica de lutar com as duas espadas. Tam-bém lutou com pedaços de pau à guisa deespadas de madeira, vencendo sempre. Nofim da vida retirou-se para uma gruta den-tro da propriedade do clã, e ali completouo cumprimento da regra da espada e da pena. Dedicou-se à medita-ção apoiado por monges do mosteiro vizinho, vinculado à escolaSoto Zen. Aplicou-se às artes da caligrafia, pintura, poesia, e escre-veu seu livro, Gorin-No-Sho. Musashi encarna o ideal da melhoriacontínua da pessoa e é uma fonte de inspiração. Sendo o melhor detodos naquilo que fazia, continuava a se aperfeiçoar, e humildementese comportava como um aprendiz em outros campos do conheci-mento humano. A pena e a espada. Aí está uma referência básica paraa auto-reflexão. Mas mestres também aparecem sob formas maissimples e em pessoas sem tanta notabilidade. Um dos melhores pe-ríodos de minha vida foram os anos em que trabalhei no antigoInstituto Politécnico da Universidade Católica. Liderados pelo Prof.Mário Werneck, estávamos trabalhando para implantar uma escolacom uma proposta inovadora. Tínhamos, então, grande entusias-mo na construção daquela nova escola.Construção aqui diz tudo. As tarefas com-preendiam não só a parte didática comotambém reformas de prédios do antigoSeminário de Belo Horizonte, instalação delaboratórios, aquisições de equipamentos,e mais importante do que isto, uma con-cepção muito aberta para uma escola deformação técnica. Havia o Centro de In-tegração da Vida Acadêmica, coordenadopor Hely Nazirê, e encarregado de pro-

Sendo o melhor detodos naquilo quefazia, continuava ase aperfeiçoar, ehumildemente secomportava comoum aprendiz emoutros campos doconhecimentohumano.

Mas mestres

também

aparecem sob

formas mais

simples e em

pessoas sem tanta

notabilidade.

Page 28: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

28

mover atividades extracurriculares, o que re-sultava em um permanente movimento cul-tural com cursos de cinema, montagens tea-trais, audições de música, e é claro, esportes.Integração, enfim. Nesse ambiente havia umpequeno grupo, que mantinha uma perma-nente discussão de temas que iam do avançoda astrofísica com o projeto Apolo até a Pa-rapsicologia, científica ou não. Também sediscutia alguma eletrotécnica nesse grupo.

Todos os componentes do grupo eram bons técnicos, possuiam ex-periência prática, eram professores, mas o que pegava fogo nas dis-cussões eram os assuntos “alternativos”.Um dia, apareceu um livro, “ Um Buracono Fundo do Mar”. Esse livro tratava deum projeto para se fazer uma perfuraçãoque atingisse o magma terrestre, e que foradesenvolvido por uma “Sociedade Ameri-cana de Miscelânea”. O mais interessantede tudo era a natureza da Sociedade: umlugar em que diversos especialistas em vá-rios ramos do conhecimento se reuniampara tomar uísque e conversar livrementesobre projetos malucos. Assim, p.ex., um geólogo que seria inter-nado se falasse profissionalmente sobre um projeto como o do pró-

prio título, podia soltar sua imaginação nasreuniões da Sociedade, juntamente comgente que não era da área. O livro era doinício dos anos 60, e naquela ocasião elesjá tinham testado um projeto para rebocargrandes blocos de gelo para locais sem águapotável. Em outra ocasião nosso grupo dis-cutia exatamente a inovação. Depois deuma demonstração mais ou menos gráfica,José Augusto concluiu que se para evoluirvocê se basear apenas naquilo que já é co-

Nesse ambiente haviaum pequeno grupo,que mantinha umapermanente discussãode temas que iam doavanço da astrofísicacom o projeto Apoloaté a Parapsicologia,científica ou não.

O mais interessantede tudo era anatureza da Socieda-de: um lugar em quediversos especialistasem vários ramos doconhecimento sereuniam para tomaruísque e conversarlivremente sobreprojetos malucos.

Em outra ocasião

nosso grupo discutia

exatamente a

inovação. Depois de

uma demonstração

mais ou menos

gráfica

Page 29: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

29

nhecido e aplicar o método científico, estareferência traz uma grande amarração e oprocesso é muito lento. Para avançar e ino-var seria preciso vivenciar o desconhecido.Após esta conclusão, tarde da noite, fomospara casa dormir e no dia seguinte nos ma-triculamos no treinamento de um respeita-do instrutor de Yoga, prof. Georg Kritikós.Este passo trouxe muitos desdobramentosposteriores.

Mestres em toda a parte

Em uma de suas palestras, Amyr Klinkafirmou, enfaticamente, que o sucesso dobarco Paratii, se deveu ao fato de que ele,Amyr, e os outros construtores não eram es-pecialistas naquele tipo de barco. Isto pare-ce contraditório mas não é difícil esclareceresse ponto. Como a experiência a ser reali-zada era inédita, era preciso buscar soluçõesoriginais. E aqui entra o conhecimento, queestá por aí, mas para ser encontrado deve ser

buscado sem bloqueios. Normalmente, oespecialista está preso em sua própriacompetência. Quase trinta anos depois, amesma digressão do José Augusto naquelanoite, e o mesmo tipo de proposta de expe-rimentação do desconhecido. Nesse pon-to os orientais levam uma grande vantagemsobre nós. Existem escolas cuja única pro-posta é ajudar as pessoas a descobrirem oconhecimento por si mesmas. Um mestreZen nunca dá resposta conclusiva a uma

Isto parececontraditório mas nãoé difícil esclarecer esseponto. Como aexperiência a serrealizada era inédita,era preciso buscarsoluções originais. Eaqui entra o conheci-mento, que está por aí,mas para ser encontra-do deve ser buscadosem bloqueios.

Para avançar einovar seria precisovivenciar o desconhe-cido. Após estaconclusão, tarde danoite, fomos para casadormir e no diaseguinte nos matricu-lamos no treinamentode um respeitadoinstrutor de Yoga

Existem escolas

cuja única

proposta é

ajudar as

pessoas a

descobrirem o

conhecimento

por si mesmas.

Page 30: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

30

pergunta relativa a conceitos do treinamento. Às vezes não dá res-posta. Mas não é preciso ir para o Oriente para desenvolver espí-rito crítico. Essa era a proposta de Veloso. A mesma lição tambémpode ser aprendida em treinamentos técnicos. Em seu curso deConfiabilidade de Sistemas, nos anos 70 e já com facilidades

computacionais, o prof. Celso Camargo de-fendia que, sendo a formação dos engenhei-ros predominantemente determinista erapreciso que os engenheiros de sistemas de-senvolvessem raciocínio probabilístico. Ou-tro mestre, outra proposta de rompimen-to. E este é o ponto-chave neste texto. Seas pessoas se posicionam com abertura,com vontade de ver e ouvir, os mestres es-tão aí sob forma de filmes, gente, livros, pa-lestras e Sociedades estranhas.

Abertura para o Conhecimento

A abertura para outras formas de pensar, é indispensável no ca-minho rumo à Excelência. Até recentemente existiam uma culturatípica do Ocidente, cuja forma de pensar é quase que totalmenteracional, e uma cultura típica do Leste Asiático, que não privilegia-

va tão fortemente o elemento racional.Conseqüentemente, existiam diferentesmaneiras de observação e percepção da rea-lidade. Com a grande participação não sódos japoneses mas também de outros po-vos do Oriente na economia do mundo,fortaleceu-se o intercâmbio Oeste-Leste, apartir da Segunda Guerra Mundial. Poroutro lado as facilidades de comunicaçãocriadas a partir da década de 60 têm per-mitido que povos do mundo inteiro re-

Outro mestre,

outra proposta

de rompimento.

E este é o ponto-

chave neste

texto.

Com a grandeparticipação não sódos japoneses mastambém de outrospovos do Oriente naeconomia do mundo,fortaleceu-se ointercâmbio Oeste-Leste, a partir daSegunda GuerraMundial.

Page 31: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

31

3 ISHIKAWA, Kaoru. QC Circle Koryo – QC Circle Headquarters, JUSE, 1980.

cebam grande massa de informações re-lativas a outros povos. Há muitos pensa-dores ocidentais trabalhando em desen-volvimento de formas de percepção quecontemplem o racional e o não-racional.Esse movimento tomou forte impulso, apartir dos anos 50, principalmente na Ca-lifórnia, onde passaram a se reunir e pro-duzir trabalhos alguns dos pensadores maisoriginais de nossa época. Também o movi-mento de assimilação de práticas típicas doLeste asiático, ali tem uma grande concentração. Importantes cien-tistas e pesquisadores americanos e europeus trabalham com o Esalen

Institute, instituição dedicada ao desenvol-vimento de propostas inovadoras da abor-dagem do conhecimento. Um importanteautor japonês, Kaoru Ishikawa3 reconheceuseu engano em pensar que determinadaspráticas não poderiam ser aplicadas por po-vos que não utilizam a escrita ideográficachinesa. No caso, a escrita fornece elemen-tos para se analisar a forma de pensar. A le-tra B mais a letra A formam BA. Só e exa-tamente isto. Um

ideograma sugere interpretação. As dife-renças culturais existentes podem tê-lo le-vado a isto, mas como o próprio Ishikawaafirma, na mesma obra, os seres humanossão iguais em sua essência. A forma comoos seres humanos absorvem conhecimentoé que pode ser diferente. Os processoseducacionais podem levar a maior utiliza-ção do caminho racional ou do intuitivo,

Há muitospensadoresocidentaistrabalhando emdesenvolvimentode formas depercepção quecontemplem oracional e o não-racional.

os seres humanos

são iguais em sua

essência. A forma

como os seres

humanos absor-

vem conhecimento

é que pode ser

diferente.

Importantes cientis-tas e pesquisadoresamericanos eeuropeus trabalhamcom o EsalenInstitute, instituiçãodedicada ao desenvol-vimento de propostasinovadoras daabordagem doconhecimento.

Page 32: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

32

mas todas as pessoas possuem ambas aspossibilidades e elas devem ser usadas paraa absorção do conhecimento. Para isto épreciso levantar alguns bloqueios, tendocomo suporte a atitude de abertura paraa diferença. Esta abertura é que permitiráque as pessoas avancem além de simplesaspectos formais de novos métodos degerenciamento. A observação mostra quehá uma grande tendência de se ater a es-ses aspectos formais, ignorando o essen-

cial e se prendendo ao acessório. A causa provável é a crença,extremamente danosa, de que a simples repetição da informaçãoequivale ao Conhecimento.

Os processoseducacionais podemlevar a maior utiliza-ção do caminhoracional ou dointuitivo, mas todasas pessoas possuemambas as possibilidadese elas devem ser usadaspara a absorção doconhecimento.

Page 33: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

33

É difícil ser original3

A profundidade de observação, indispensável na aquisição de co-nhecimento, é muito limitada por uma postura de não-originalida-de, ou de exclusão da diferença. É fácil constatar que para ser aceitapela sociedade, a pessoa deve assumir, de criança a ancião, padrõesde comportamento estabelecidos por estamesma sociedade. Se assim não fosse, a so-ciedade seria caótica. Parece que a questãoé o limite para esta padronização. O que severifica é que a criatividade natural dos se-res humanos é fortemente inibida por pa-drões repassados por pais, educadores, che-fes, autoridades. Com a melhor dasintenções os pais, desde cedo começam acortar tudo o que não é considerado “nor-mal”. O processo continua com maior am-

Existe nas organizações a consciênciade que a sobrevivência exige rápida

adaptação às mudanças velozesdo ambiente externo. Há também o

reconhecimento de que as pessoas têm queser essencialmente criativas. O processotradicional de formação dessas pessoas,

entretanto, favorece o modelo decomportamento padronizado e pouco

criativo que deu certo no passado. O impassedeve ser rompido pela própria organização.

O que se verifica éque a criatividadenatural dos sereshumanos éfortemente inibidapor padrõesrepassados porpais, educadores,chefes, autoridades.

Page 34: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

34

plitude nas escolas. Além do ensino tradicional, hoje a formação dapessoa implica ginástica, esporte, informática, uma ou mais línguasestrangeiras, enfim várias atividades. Tudo pronto, esquematizado,sem espaço para se inventar. A formação básica é muito rígida e no3o grau, onde deveria haver maior flexibilidade, também a rigidezestá presente. Por outro lado, se o aluno obedecer a padrões consa-

grados de titulação ele, quase que certamen-te fará sucesso. É interessante notar comosurgem algumas reações ameaçadoras quan-do se tenta fazer com que as pessoas sejammais investigativas em cursos técnicos de 3o

grau. Com o processo de formação implan-tado dessa maneira, o ser humano comumvai percebendo rejeição toda vez que tentaexplicitar alguma diferença, e a partir daípassa a ter não só comportamentos comoatitudes padronizadas. O processo edu-

cativo global, pais, educadores, sociedade, conseguiu padronizar osujeito, e aí ele está pronto para atuar nas empresas. Apesar do dis-curso de criatividade, participação, inovação, o que mais se vê nasorganizações ainda é a gestão baseada em especialização e autoridade.Dados muito interessantes e esclarecedores são apresentados porGeorge Land e Beth Jarman no livro Pontode Ruptura e Transformação1: “Um dos au-tores aplicou oito testes de pensamento cri-ativo divergente a 1600 crianças, nos primei-ros dias do programa Headstart. Aplicamosos mesmos testes a essas mesmas crianças vá-rios anos depois. Os primeiros tinham sidoaplicados quando elas estavam na faixa dos3 a 5 anos. Noventa e oito por cento delasalcançaram a categoria de “gênios”. Cincoanos depois sòmente 32% alcançaram a

1 George LAND e Beth JARMAN. Ponto de Ruptura e Transformação – tradução AdailUbirajara Cabral, São Paulo, Cultrix, 1994.

É interessante notarcomo surgem algumasreações ameaçadorasquando se tenta fazercom que as pessoassejam maisinvestigativasem cursos técnicosde 3o grau.

Apesar do discursode criatividade,participação,inovação, o quemais se vê nasorganizações aindaé a gestão baseadaem especialização eautoridade.

Page 35: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

35

mesma marca. Uma terceira aplicação, passados mais cinco anos, ob-teve apenas 10%. Aplicados a uma amostra aleatória de adultos commais de vinte e cinco anos de idade, os testes revelaram meros 2% de“gênios”. O que acontece? Sabemos ao menos que o cérebro não de-saparece. Qualquer um pode adivinhar a resposta” [obra citada, pag145]. A cultura determinista, excludente, que permeia, atualmente,o comportamento da Sociedade Humana, termina por bloquear aoriginalidade do indivíduo.

Mudanças nos métodos de administração

É possível notar como modernos métodos de administração quedeveriam desenvolver a aceitação da diferença, acabam sendo ma-nipulados para se tornarem, na prática, instrumentos de exclusão.A necessidade de padronização, que é um requisito óbvio para aprevisibilidade de produtos acaba reforçando a cultura deterministadas organizações. Em salas de aula e em diversas outras situações,tenho encontrado, freqüentemente, pessoas que querem de toda for-ma a coisa pronta, formatada e sem muita discussão. Não é de seestranhar, quando se está no início de um processo de mudança erompimento com as práticas usuais do gerenciamento. Mas a mes-ma observação se aplica a pessoas de organizações que já se encon-tram há mais tempo nesse processo. É notória e muito urgente anecessidade de se trabalhar esse condicio-namento, se se pretende ter pessoas criati-vas atuando dentro das organizações. Aspessoas, e não são poucas, que se sentemincomodadas pelo bloqueio a sua criativi-dade natural, costumam liberá-la fora dotrabalho e tornam-se, então, magníficos jar-dineiros, cozinheiros, músicos ou poetas,amadores. A maioria, entretanto, não temessa válvula de escape, e a grande massa depessoas detesta o trabalho. Criatividade se

A necessidade depadronização, que éum requisito óbviopara aprevisibilidade deprodutos acabareforçando a culturadeterminista dasorganizações.

Page 36: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

36

liga à percepção e à aceitação da diferen-ça. Diferença existe no momento em que éconstatada e não como referência. A par-tir do momento em que se começa a seg-mentar, de maneira lógica, as diferenças,volta-se ao determinismo. Há tempos foiexibido um filme publicitário muitoilustrativo disto. No filme um rapaz, boni-to, vestindo uma determinada marca deroupas, rasga acidentalmente o bolso dacalça, ao chegar a uma festa. Sucessivamen-

te, os demais presentes, todos jovens e bonitos, deliberadamente, pas-sam a, rasgar os bolsos de suas calças. Em Competindo pelo Futu-ro2 os profesores Hamel e Prahalad contam uma experiência em quemacacos são condicionados por seus próprios pares a não subir emum mastro para apanhar bananas. No caso, os primeiros macacosforam castigados com uma ducha forte de água gelada quando ten-taram apanhar as bananas. Posteriormente, nenhum macaco rece-beu qualquer castigo, porém, transmitiu o condicionamento aos de-mais. Os autores enfatizam que não estão sugerindo que pessoassejam macacos, mas que procedimentos consagrados em uma orga-nização sobrevivem mais que o contexto em que foram estabeleci-dos. Isto é fatal quando se necessita de inovação na atividadegerencial. Chega a ser desanimador que a maioria das pessoas quei-ra, no dia-a-dia, e a todo momento apenas repetir soluções que jáviram antes. Ainda mais desanimador é constatar que grande partedas pessoas que aderiram, com toda a disposição, ao movimento pelaQualidade, também quer formulários e soluções prontas. Por outrolado tudo o que foi apontado antes só pode levar a isto. Caberia aosgerentes atuarem como educadores de seus subordinados, principal-mente para ativar neles a criatividade adormecida. Mas o gerentetambém teve a mesma formação e pode estar preso a padrões. Exis-tem organizações inteiras que assim funcionam, e vêm dando certo.

2 Gary HAMEL e C. K. PRAHALAD. Competindo pelo Futuro – Tradução Outras Pala-vras, Rio de Janeiro, Campus, 1995.

Criatividade seliga à percepçãoe à aceitação dadiferença.Diferença existeno momento emque é constatadae não comoreferência.

Page 37: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

37

O futuro dessas organizações, porém, é incerto se o rompimento comesse tipo de postura de não-questionamento de padrões não começarpela alta administração, e isto já vem ocorrendo em algumas delas.

Educação para a abertura

O rompimento dos bloqueios que impedem a abertura para a ino-vação, em quaisquer níveis da organização, envolverá um processoeducativo. Como qualquer outro, também este só pode ter início sealguém, de moto próprio, perceber a necessidade do desenvolvimentopessoal da gerência para que esta possa assumir o papel de agente detransformação. O conceito de desenvolvi-mento pessoal aplica-se a pessoa em si, masé preciso um método de educação para queeste desenvolvimento se torne realidade. Osmétodos para gerenciamento são indispen-sáveis à organização em si, e produzemexcelentes resultados. A idéia é que, paradesenvolver pensamento criativo é indis-pensável que a pessoa desbloqueie limita-ções, como as que foram apontadas ante-riormente. Este é um trabalho interior,consigo mesmo. A repetição de práticas pa-dronizadas é uma reação externa, ou como uma vez disse meu ami-go Mário Porto, comportamento é a ponta do iceberg. Muitos au-tores têm usado a imagem do iceberg e de sua ponta. A história éconhecida: as pessoas percebem a ponta do iceberg, tomam-na comoo próprio iceberg e passam a agir com base nessa imagem. Normal-mente o resultado é que as ações são ineficazes, pois não se conse-gue controlar o iceberg e termina-se por naufragar devido à inevitá-vel colisão. Programas de mudança, métodos de gestão, tudo aquiloque é novo deveria ser tratado como um iceberg. Paralelamente à ado-ção de novos comportamentos, isto é, ações, que são a ponta doiceberg, é preciso o entendimento do que está subjacente, isto é, asforças ou intenções que movem aquelas ações.

Os métodos para

gerenciamento são

indispensáveis à

organização em si,

e produzem

excelentes

resultados.

Page 38: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

38

Ações e intenções

Em palestra realizada em São Paulo, emjulho de 1992, o Dalai Lama, líder políticoe religioso do Tibet e ganhador do PrêmioNobel da Paz, propôs uma interessante re-flexão sobre as causas do sofrimento, colo-cando a ignorância como causa essencial.Além das formas visíveis de ignorância, háuma forma que nos afeta profundamente eque comumente não é tratada como tal. Estaforma é o desconhecimento das intençõesque movem uma ação. Assim, uma ação é

boa se as intenções que a originam são conhecidas e existe uma per-feita correlação entre intenção e ação. Aparentemente é sempre assim.Na prática, observa-se que não é. Na maneira padronizada de traba-lhar a que venho me referindo, na execução de algo apenas porque jáse viu em algum lugar, não existe a menor avaliação da correlação ação– intenção. Existem muitos planos de ação ineficazes por falta da ob-servância desta correlação, e muita aplicação de ferramentas que nãosurte nenhum efeito. É necessário um questionamento paciente a cadavez que se elaborar uma proposta de ação, para se verificar se o prin-cípio ação – intenção está sendo obedecido. Como existem correla-ções vagas, a bem dizer entre todas as coisas, sempre haverá alguémentendendo que a ação está sendo adequada. Se na organização nãoexistir disponibilidade de orientadores para realizar o paciente questio-namento acima referido, os resultados desejados certamente não se-rão alcançados. Esses orientadores são os agentes da transformação eprecisam ser formados. Como a formação que recebemos privilegiaações padronizadas, sem conhecimento de intenções ou objetivos, so-mente com um rompimento, em que as pessoas se coloquem em po-sição de questionamento é que se conseguirão as inovações necessá-rias. A simples modificação de alguns comportamentos, formuláriose desenhos não representa efetiva mudança. Há inúmeros exemplos,espalhados dentre organizações que estão adotando programas deQualidade em que apenas a forma de apresentação mudou. São as mes-

Dalai Lama, líderpolítico e religiosodo Tibet e ganhadordo Prêmio Nobel daPaz, propôs umainteressantereflexão sobre ascausas do sofrimen-to, colocando aignorância comocausa essencial.

Page 39: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

39

mas antigas situações apresentadas com gráficos, formulários esoftware diferentes. Ficou-se preso apenas à forma de linguagem.

Ação concreta para o rompimento

Permanece a questão de como se fará o rompimento. Existem pro-postas de várias naturezas para “mudar pessoas”, “viver novosparadigmas”, e mudança de “cultura empresarial”. Sem discutir avalidade desta ou daquela, sou inteiramente cético quanto a proces-sos rápidos e acabados de transformação e mudança de pessoas eorganizações. Há todo um enraizamento em práticas e atitudes queimpede que transformações conscientes sejam rápidas, e não será umtrabalho de fim de semana que vai conseguir eliminar essas raízes.Tenho uma experiência muito interessante em um treinamento dessetipo. Aplicou-se um teste, a partir do qual as pessoas presentes fo-ram classificadas como gerentes autoritários ou cooperativos. Os tra-balhos prosseguiram e algum tempo depois o instrutor aplicou ou-tro teste e novamente as pessoas foram classificadas. No primeiroteste uma pequena parte dos presentes foi classificada como coope-rativa. No segundo teste todos foram classificados como autoritá-rios. Inquirido a respeito, o instrutor esclareceu que o primeiro tes-te simulava situação de normalidade na área do gerente e o segundoteste simulava situação de emergência. Creio que é possível concluirque aqueles que tinham avançado para o modelo cooperativo, quan-do em condições normais, ao se sentirempressionados retornavam ao modelo vigen-te que era definitivamente autoritário na-quela época. O treinamento foi válido paracriar consciência desse aspecto do compor-tamento, entre aqueles gerentes. Após otreinamento, nada aconteceu com relaçãoa posturas gerenciais na organização. Ob-servando outras situações similares em ou-tras organizações, pode-se chegar a umaconclusão semelhante. Daí o ceticismo

Creio que é possívelconcluir que aqueles quetinham avançado para omodelo cooperativo,quando em condiçõesnormais, ao se sentirempressionadosretornavam ao modelovigente que era definiti-vamente autoritárionaquela época.

Page 40: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

40

quanto a resultados de treinamentos rápidos como solução para de-senvolvimento pessoal. Quase todos esses treinamentos têm um im-pacto grande sobre as pessoas, porém, esse impacto fica muito nocampo do imediato. Realmente coisas do tipo ficar o dia inteiroamarrado a outras pessoas são excelentes para chamar a atenção paraa necessidade de cooperação. Porém, fora daquela situação especí-fica, será que as pessoas, instantaneamente se tornam mais coope-

rativas? A validade de treinamentos de im-pacto é indiscutível, mas, além daí é precisoum trabalho longo e paciente em cima daatitude, isto é, do corpo do iceberg. Comoisto não é o comum, pouco se consegue emtermos de mudança efetiva, de rompimen-to. Assim o resultado do treinamento deimpacto se perde ao longo do tempo, paraa maioria das pessoas. Aí aparece outro tipode treinamento de impacto com outra sus-tentação teórica e também não dá resulta-

dos no longo prazo, e o ciclo vai se repetindo. Sou de opinião quetodos dariam resultado se o treinamento de conscientização fosseapenas o começo de um processo. Qualquer processo de educaçãoé muito demorado, e é nisto que se precisa investir. Um dos patriar-cas da Qualidade, W.E. Deming formulou 14 Princípios da Admi-nistração3, que têm sido a base de inúmeras experiências bem-suce-didas em organizações de todo o mundo. Na aplicação dos 14Princípios, Deming enfatiza, várias vezes, a necessidade de treina-mento e desenvolvimento do pessoal da organização. Particularmen-te notável é o primeiro princípio: “Crie constância de propósitos paraa melhoria do produto e do serviço”, com todas as suas evidentes im-plicações de educação e treinamento. A persistência parece ser umadas principais virtudes da liderança.

3 DEMING, W. Edwards. Qualidade: A revolução da Administração – Tradução Clave Co-municações e Recursos Humanos SC, Rio de Janeiro, Saraiva, 1990.

A validade de treinamen-tos de impacto éindiscutível, mas, alémdaí é preciso umtrabalho longo e pacienteem cima da atitude, istoé, do corpo do iceberg.Como isto não é ocomum, pouco seconsegue em termos demudança efetiva, derompimento.

Page 41: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

41

Muito da dificuldade para utilizar novas ferramentas e métodosse deve à falta de hábito de investigar o essencial. Assim, pessoaspassam a usar modelos e formulários de maneira mecânica, sem per-ceber que esses são apenas veículos de linguagem. Não se percebeque não é o diagrama ou o software que resolve os problemas masque diagrama e software são usados para or-ganizar a informação e facilitar a comunicação.A investigação correta e a análise consistente deações é que permitirão resolver problemas.Como o hábito de investigar o essencial não écomum, alguns se perdem em formas e deta-lhes e conduzem mal suas investigações e aná-lises. A procura da essencialidade e o hábito deraciocinar com o essencial tem grande efeitona descoberta de causas encobertas. A abertura

Investigação do essencial4

As capacidades de observaçãoe de questionamento estão ligadas

à identificação do essencial. O ambientede alienação pessoal encontrado em

muita parte é alimentado pela incapacidade dequestionar. Se a pessoa não tem clareza do

essencial, tudo será aceito desde que correspondaa algum padrão. É possível desenvolvera percepção do essencial, e isto deve ser

trabalhado de forma individual.

A procura daessencialidade e ohábito de racioci-nar com o essencialtem grande efeitona descoberta decausas encobertas.

Page 42: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

42

da mente para a inovação também é muitobeneficiada pelo hábito de procurar a es-sencialidade das coisas. Não se trata de eli-minar o supérfluo, mas de reconhecê-locomo tal. Na medida em que se foca o es-sencial, torna-se mais fácil o reconhecimentodas necessidades das pessoas, base de todaa moderna gestão. Via de conseqüência, aidentificação das necessidades das pessoasdeveria ser a base da educação. Grande partedos processos educativos conhecidos baseia-

se na visão de que o cliente é uma sociedade, que espera um indiví-duo preparado conforme padrões dela própria. Sem entrar na ques-tão indivíduo x sociedade, observa-se que esse modelo, adequado àfase de desenvolvimento da civilização via padronização, deixa desê-lo em uma fase em que o essencial para a própria sobrevivênciada civilização é a existência de indivíduos com grande liberdade deusar a criatividade. Em qualquer das hipóteses parece não haver in-vestigação suficiente das verdadeiras necessidades do cliente. A fal-ta de respostas para esta questão leva a educação a ser conduzidapor políticos e professores dentro de uma visão acadêmica, consis-tente com o sucesso do passado, o que chega a ser conflitante coma necessidade da sociedade de hoje. Paralelamente, de vez em quandovêem-se na mídia exemplos de pessoas que estão educando criançascom bons resultados, sem boas salas de aula, sem recursos audio-visuais, porém, usando efetiva interaçãoalunos – professor. Este é o tipo de assun-to que ocupa muitos educadores e ao queparece começa a avançar. Não é objetivodeste texto discutir a educação, e sim co-locar à reflexão do leitor a questão da bus-ca da essencialidade, de uma maneira sim-ples. Como quase tudo no ser humano, ohábito de buscar a essencialidade pode serdesenvolvido. É uma proposta de várias es-colas filosóficas e religiosas e está presente

Grande parte dosprocessos educativosconhecidos baseia-sena visão de que ocliente é umasociedade, queespera um indivíduopreparadoconforme padrõesdela própria.

Não é objetivo deste

texto discutir a

educação, e sim

colocar à reflexão

do leitor a questão

da busca da

essencialidade, de

uma maneira

simples.

Page 43: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

43

na maioria das disciplinas monásticas, orien-tais e ocidentais. Não é preciso ser monge,porém, para desenvolver o hábito de inves-tigar o essencial. Um bom exemplo, prá-tico, de como é possível buscar o essencialsem estar filiado a escolas ou grupos, foidado, ainda no século passado por HenryThoreau. Quando tinha 28 anos de idade,Thoreau realizou uma extraordinária ex-periência. Nascido de uma família de clas-se média em Massachusetts, estudou emHarvard, trabalhou como professor e conferencista, sendo um ho-mem típico da primeira metade do século XIX. Sua experiência foiiniciada em 1845. Construiu ele mesmo uma pequena casa às mar-gens do lago Walden, e ali, durante dois anos, sobreviveu com oproduto do próprio trabalho manual. O que há de extraordinárionisso? O fato de que Thoreau era um trabalhador intelectual, bemformado, sem necessidade de realizar tal tarefa para sobreviver. Ele

estava procurando alguma outra coisa. Eestava mesmo. Sua experiência lhe permi-tiu uma reflexão de grande profundidadesobre relações essenciais da pessoa com oambiente e com a sociedade. Após concluirsua experiência, Thoreau escreveu o livroWalden ou A Vida nos Bosques1, em quefaz reflexões sobre o afastamento da socie-dade em relação ao essencial. No texto,Thoreau faz, inclusive, uma análise finan-ceira da manutenção mínima, e um para-

lelo do custo dessa mesma manutenção nos padrões sociais vigen-tes à época. Thoreau também escreveu outros textos, e ficouesquecido durante quase um século, para ser redescoberto em me-ados do século XX, pelo movimento da contracultura. A partir dos

1 THOREAU, Henry D. Walden ou A Vida nos Bosques – Trad. Astrid Cabral, Global Edi-tora, 1987.

Ele estava procuran-do alguma outracoisa. E estavamesmo. Sua experiên-cia lhe permitiu umareflexão de grandeprofundidade sobrerelações essenciais dapessoa com oambiente e com asociedade.

Não é preciso

ser monge,

porém,

para

desenvolver

o hábito de

investigar o

essencial.

Page 44: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

44

anos 60, Walden voltou a ser muito lido. Recentemente o filme So-ciedade dos Poetas Mortos2, que tem muito a ver com desenvolvi-mento de observação e criatividade, faz uma citação de Thoreauquando este justifica sua experiência no lago: “Fui para os bosquesporque pretendia viver deliberadamente, defrontar-me apenas com osfatos essenciais da vida, e ver se podia aprender o que tinha a meensinar, em vez de descobrir à hora da morte que não tinha vivido.Não desejava viver o que não era vida, a vida sendo tão maravilhosa,nem desejava praticar a resignação, a menos que fosse de todo neces-

sária. Queria viver em profundidadee sugar toda a medula da vida, vivertão vigorosa e espartanamente aponto de pôr em debandada tudo oque não fosse vida, deixando o espa-ço limpo e raso; encurralá-la numbeco sem saída, reduzindo-a a seuselementos mais primários, e, se estase revelasse mesquinha, adentrar-meentão em sua total e genuína mesqui-nhez e proclamá-la ao mundo, e sefosse sublime, sabê-lo por experiên-cia, e ser capaz de explicar tudo issona próxima digressão.” [obra citada,pag 92]. A história do filme gira em

torno de um professor que é admitido em uma escolaultraconservadora. Lá, o professor incentiva os alunos a viverem suaspróprias experiências e a realizarem suas próprias observações. Hátoda uma trama, que deve ser vista no cinema, e é muito sintomáti-co que um filme com esse tema, lançado sem maior promoção, te-nha sido um dos maiores sucessos de bilheteria em algumas cidadesbrasileiras na época de sua exibição. É visível que há uma necessi-dade reprimida de realização de vivência pessoal, e ao que pareceas respostas não estão sendo dadas pelos meios tradicionais. Mas

Queria viver em profundidade esugar toda a medula da vida,viver tão vigorosa eespartanamente a ponto de pôrem debandada tudo o que nãofosse vida, deixando o espaçolimpo e raso; encurralá-la numbeco sem saída, reduzindo-a aseus elementos mais primários, e,se esta se revelasse mesquinha,adentrar-me então em sua total egenuína mesquinhez e proclamá-la ao mundo, e se fosse sublime,sabê-lo por experiência, e sercapaz de explicar tudo isso napróxima digressão.

2 WEIR, Peter. Sociedade dos Poetas Mortos (filme) – vídeo distribuído pela Abril Vídeo.

Page 45: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

45

também não é preciso se tornar um eremi-ta temporário como Thoreau, e é possível,sem maiores dificuldades a realização de al-gumas experiências de cuidar concretamen-te da própria manutenção. Parece que umadas quebras características no atual estágioda civilização, é a divisão entre trabalho in-telectual e trabalho físico. A conseqüênciafinal disso é a especialização do trabalho,característica dos atuais sistemas produti-vos. A realidade tende a se tornar virtual,como se a informação sobre o fato [intelectual] fosse o próprio fato[físico]. Nos exemplos citados neste texto, pessoas, a maioria delas,lêem o livro ou assistem ao filme, e acham que vivenciaram aquilo.Há tempos uma revista publicou uma observação de um professoramericano, em que ele dizia, que assim como a leitura de livrosespecializados sobre emagrecimento não substitui a execução do re-gime de emagrecimento, também a leitura de livros de Administra-ção não substitui a ação do administrador. Vemos diariamente de-

zenas de palestras, seminários,convenções e correlatos, em queuma pessoa fala, muitas pessoas ou-vem, saem dali como se aquela in-formação fosse sua própria realida-de, e depois passam a repeti-la.Onde entrou a vivência? Não gosta-ria que alguém saisse a repetir coi-sas que estou falando, apenas por-que gostou da idéia. Se este textolevar alguém a realizar algumavivência, até para contestá-lo, aí en-tão estaremos atingindo um objeti-vo real. Até porque o essencial para

um ser humano não é exatamente o essencial para o outro. Contam-se aos milhares as histórias de artistas, que chegam ao limite da so-brevivência física para poderem se dedicar à sua arte. Deve-se, en-

Parece que umadas quebrascaracterísticasno atual estágioda civilização,é a divisão entretrabalhointelectual etrabalho físico.

Vemos diariamentedezenas de palestras,seminários, convençõese correlatos, em queuma pessoa fala,muitas pessoas ouvem,saem dali como seaquela informaçãofosse sua própriarealidade, e depoispassam a repeti-la.

Page 46: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

46

tão, realizar experiências de busca do essen-cial, de forma individualizada? Acreditoque sim. É de grande valia para o trabalha-dor intelectual executar alguma forma detrabalho físico. Mas esta proposta não con-sidera esporte como trabalho físico. Não éisto. A idéia é que a pessoa que obtém suamanutenção através do exercício intelectu-al também exercite o físico em alguma coisarelacionada a esta manutenção. Uma pro-posta dessas está baseada na concepção de

que a capacidade de observar a coisa real fica limitada quando apessoa só trabalha com informações. Asoportunidades são muitas. Hoje, estão dis-poníveis lugares em comunidades e atémesmo clínicas que aplicam a terapia dotrabalho manual, ligado a atividades de so-brevivência material e não a atividadeslúdicas. Por exemplo, para se comer é pre-ciso trabalhar na cozinha ou na horta. Po-rém, é preciso uma certa atenção para nãose frustrarem expectativas. Muitos dos lu-gares que oferecem esse tipo de opção sãocentros de propagação e de proselitismo, e isto pode ser insuportá-vel para quem está apenas investindo em seu próprio desenvolvimen-

to. No extremo oposto há lugares em quea liberdade de opção é tão ampla, tão a cri-tério da pessoa, que um iniciante nessa prá-tica pode se perder. Entretanto, a partir davontade de fazer é possível esse tipo de te-rapia, até em sua própria casa. Manter suacasa rigorosamente limpa, com todos osobjetos guardados em seus devidos lugaresdurante um período sem empregada do-méstica, seria um bom exemplo. Coisasdesse tipo, nesse nível de simplicidade são

É de grande

valia para o

trabalhador

intelectual

executar

alguma forma

de trabalho físico.

Hoje, estão disponí-veis lugares emcomunidades e atémesmo clínicas queaplicam a terapia dotrabalho manual,ligado a atividadesde sobrevivênciamaterial e não aatividades lúdicas.

No extremo opostohá lugares em quea liberdade deopção é tão ampla,tão a critério dapessoa, que uminiciante nessaprática pode seperder.

Page 47: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

47

uma maneira de avançar na percepção daessencialidade. Em um exemplo mais oumenos radical, se você começar a engraxartodos os seus sapatos e a passar os amassa-dos de sua roupa, você pode começar aquestionar a necessidade de ter tanta coi-sa. Esse tipo de questionamento está natrajetória de melhoramento contínuo dapessoa. Fala-se muito em melhoramentocontínuo das organizações. Em minha opi-nião também se deve falar em melhoramen-to contínuo das pessoas. Não de forma puramente exortativa, comoé comum, mas com métodos apropriados, da mesma forma que exis-

tem métodos para a melhoria contínua dasorganizações. Métodos específicos paragente. As organizações vão melhorar con-tinuamente, se as pessoas que ali trabalhamtambém melhorarem continuamente. Pes-soas que não se propõem melhoramentocontínuo vão ter bloqueios na aquisição eno uso de novos conhecimentos. Vontadede melhorar, de fazer as coisas certas e cadavez melhor, todos têm. Métodos para me-lhorar é que são pouco conhecidos ou apli-cados. Normalmente tenta-se atuar sobre

a vontade das pessoas através da exortação.Nunca dará certo para uma grande, na ver-dade, para a maior parcela dos seres huma-nos. A vontade sozinha não é suficiente. Épreciso ação somada à vontade. Ações demelhoria, de qualquer natureza, pedemmétodos, sob pena de se provocar umagrande dispersão de esforços. Na atual fasedas organizações é urgente a melhoria dacapacidade de observar. Ao contrário doque parece pensar a maioria, capacidade de

A vontade

sozinha não é

suficiente. É

preciso ação

somada à

vontade.

Fala-se muito emmelhoramentocontínuo dasorganizações. Emminha opiniãotambém se devefalar em melhora-mento contínuo daspessoas.

As organizações

vão melhorar

continuamente,

se as pessoas

que ali traba-

lham também

melhorarem

continuamente.

Page 48: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

48

observação não é qualidade inata. Ela podeser desenvolvida através de treinamento, enão há necessidade de treinamentos com-plexos. Nesse ponto é preciso, efetivamen-te, aprender com o Leste Asiático. São fol-clóricos os casos de sagacidade dos chinesese outros povos daquele lado do mundo. Areação ocidental mais comum às artes plás-ticas, principalmente à pintura daqueles po-vos, é um forte indicativo da capacidade deobservação deles. Para a maioria de nós

aqueles quadros são singelos e sem nuances, enquanto para eles háuma elevada carga de sutileza que nos passa completamente desper-cebida. A percepção de sutilezas está ligada à profundidade de ob-servação, e nada indica que isto não possa ser desenvolvido por umprocesso educativo. Ações rápidas e imediatas dificilmente condu-zem a aprofundamento. O mesmo acontece com treinamentos, te-rapias e outras atividades que visam ao de-senvolvimento humano. Tem surgido namídia ofertas de cursos que se propõem aensinar coisas como a arte floral japonesaem um fim de semana. Em sua origem umtreinamento em arte floral é conduzido porum mestre e leva anos. Uma experiênciamuito interessante de treinamento de oci-dentais em artes tradicionais japonesas foivivida pelo casal Herrigel nos anos 20. Oprof. Eugen Herrigel lecionou cerca de 6anos na Universidade de Tohoku. Como forma de vivenciar o Zen,praticou tiro com arco sob orientação de um mestre, enquanto suaesposa Gusty se dedicou a treinamento em arte floral. Mais tarde,na Alemanha, Gusty escreveu O Zen na Arte da Cerimônia das Flo-res3. O livro vai fundo nos conceitos da arte floral e, principalmen-

3 HERRIGEL, Gusty L. O Zen na Arte da Cerimônia das Flores – Trad. Alayde Mutzenbecher,São Paulo, Pensamento, 1991.

Tem surgido na mídiaofertas de cursos que sepropõem a ensinarcoisas como a artefloral japonesa em umfim de semana. Em suaorigem um treinamentoem arte floral éconduzido por ummestre e leva anos.

Ao contrário do queparece pensar amaioria, capacidadede observação não équalidade inata. Elapode ser desenvolvidaatravés de treinamen-to, e não há necessi-dade de treinamentoscomplexos.

Page 49: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

49

te, na atitude do praticante. O prof. Eugen,por sua vez, publicou A Arte Cavalheiresca doArqueiro Zen4. Este livro, escrito por um oci-dental, doutor em filosofia por Heidelberg,e que vivenciou uma experiência direta derealidade, é uma obra essencial. Mas sabe-seque somente alguns podem se dedicar a trei-namento dessa natureza. Logo não é um ca-minho geral. O aspecto importante de tudoisto é que para as pessoas treinadas, a obser-vação é simplesmente observação, enquanto uma característica co-mum de pessoas atrela observação e análise. Quase sempre isto pro-voca reação emocional e bloqueio. A observação simples não é difícilde treinar, desde que se aloque tempo para isto. A pressa, a “afliçãode acabar” são limitantes da boa observação. Pessoas apressadas cor-rendo pelas peças de museus e igrejas barrocas não podem observar

quase nada. Nesse ponto nada diferencia ocomportamento típico de turistas, sejamocidentais ou japoneses. A efetiva observa-ção é substituída pela contabilização do nú-mero de lugares percorridos ou de fotogra-fias realizadas. A questão toda estácertamente na educação. Uma vez que sedecida alocar tempo para observar, sempressa de se chegar a algum resultado, bas-ta observar simplesmente. Olhar a árvoresem dissecar seu formato, seu porte, suacor, mais ou menos isto, é uma recomen-

dação de Krishnamurti. Ouvir música sem análises, associações e bus-ca de “recordações”, ouvir simplesmente. Quando adolescente, euficava muito impressionado, em concertos promovidos pela Cultu-ra Artística, com pessoas que levavam partituras e acompanhavamos executantes. Muito mais tarde, concluí que essas pessoas trans-

O aspecto importantede tudo isto é quepara as pessoastreinadas, a observa-ção é simplesmenteobservação, enquantouma característicacomum de pessoasatrela observação eanálise.

4 HERRIGEL, Eugen. A Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen – Trad. J. C. Ismael, Pensa-mento São Paulo, 1983.

Pessoas apressa-

das correndo

pelas peças de

museus e igrejas

barrocas não

podem observar

quase nada.

Page 50: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

50

formavam uma comunicação direta emuma comunicação por meio de raciocínioe perdiam o melhor da música, aquele mo-mento criado entre executante e ouvinte,e que é levado às últimas conseqüênciaspelos aficionados de jazz. É possível melho-rar a observação sem recorrer a paisagens,museus, monumentos. Em certa ocasião omonge Tokuda foi perguntado por nossogrupo como deveríamos fazer para prati-car Zen em nossa vida diária. “Prestem

atenção nas pequenas coisas que fazem durante o dia. Quando es-covar os dentes, como segura a escova, onde ela toca, como é o mo-vimento”, foi a resposta. Cozinha é considerado um lugar de gran-de desenvolvimento pessoal em um mosteiro. Realmente a variedadede pequenas coisas que podem ser atentamente observadas no atode cozinhar é muito grande. Outra coisa muito fácil de fazer é mu-dar seu ponto habitual de observação.Como diz Alan Watts5, observar o nascerdo sol olhando para o poente, e o pôr dosol olhando para o nascente. Tudo isto émuito simples, não exige investimento anão ser em persistência. Considere o quan-to você pode melhorar sua capacidade deobservação, no dia-a-dia, mas tome o cui-dado de também trabalhar com as mãos.Entretanto, considere que digitação é umuso muito “intelectual” das mãos, porquesua atenção na verdade está na tela. A primeira condição para re-solver problemas, você sabe, é fazer uma boa observação. Apressa-do, com a atenção presa a supérfluos, classificando, qualificando,excluindo, você se desvia dessa boa observação e, pior, confundeforma com conteúdo. Pense nisto.

5 WATTS, Alan. Em Meu Próprio Caminho – Trad. Marcello Borges, São Paulo, Siciliano,1992.

“Prestem atenção naspequenas coisas quefazem durante o dia.Quando escovar osdentes, como segura aescova, onde ela toca,como é o movimento”

Considere oquanto você podemelhorar suacapacidade deobservação, nodia-a-dia, mastome o cuidado detambém trabalharcom as mãos.

Page 51: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

51

Na origem do não-rompimento é preciso considerar o apego.Parece que o principal apego manifestado pelas pessoas é o apegoao sucesso. Como sucesso normalmente é definido externamente aelas, esse tipo de apego, além de facilitar a manipulação de pessoas,também as impede de trabalhar na investi-gação do essencial. Exatamente por ser de-finido externamente, o sucesso tem deter-minantes comuns. Um deles é que não teráinsucesso quem proceder de maneira previ-sível, dentro de parâmetros definidos poralgum árbitro ou árbitros do sucesso. Ou-tro determinante é que o sucesso foi alcan-çado por quem ganhou muito dinheiro.Dentro das organizações a remuneração dapessoa cresce à medida em que ela é promo-

Apegos5

Praticamente todos os bloqueios aorompimento se encontram em algumaforma de apego. A identificação dessesapegos é um passo importante para o

trabalho de melhoria da capacidadepessoal de observação.

Exatamente por serdefinido externamen-te, o sucesso temdeterminantescomuns. Um deles éque não terá insucessoquem proceder demaneira previsível,dentro de parâmetrosdefinidos por algumárbitro ou árbitros dosucesso.

Page 52: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

52

vida. Os parâmetros para a promoção sãodefinidos externamente à pessoa, como sesabe. A famosa “resistência à mudança” nãoestaria relacionada a isto? Como “em timeque está ganhando não se mexe”, é maisprovável garantir o sucesso com a manuten-ção de alguma coisa que vinha dando cer-to. Principalmente se a manutenção impli-ca o não-questionamento de orientações edeterminações superiores. Uma propostainovadora pode não dar certo, e aí o su-

cesso pessoal pode ficar comprometido. Mesmo em organizações quese propõem como de vanguarda e inovadoras, pessoas que questio-nam e propõem novas formas estão mais sujeitas a riscos. Nem sem-pre é possível propor inovações que venham a ser aceitas pelos su-periores. É natural o apego da maioria das pessoas a todas as formasde defesa que não as comprometam com mudanças. Sou de opiniãoque “resistência”, “não cooperação” e outros comportamentos des-se tipo devem merecer o mesmo tratamento que se dá aos proble-mas de produção, com observação, análise, plano de ação, como ébem conhecido.

Sofisticação

A sofisticação é uma das formas de ape-go mais utilizadas, ao que parece. Parte-sedo princípio de que se é sofisticado é bom.A falta de meios sofisticados à disposiçãode uma pessoa pode ser uma boa maneirade se defender, e não procurar as causas demaus resultados. Quando trabalhei com pro-jetos de instalações de alta tensão, era co-mum encontrar no meio profissional pessoasque faziam sucesso por defender a aquisição,

É natural oapego damaioria daspessoas a todasas formas dedefesa que nãoas comprome-tam commudanças.

A sofisticação é

uma das formas de

apego mais

utilizadas, ao que

parece. Parte-se do

princípio de que se

é sofisticado é

bom.

Page 53: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

53

normalmente no exterior, da última novidadetecnológica apresentada recentemente aomundo. Também se defendia arduamente anecessidade de treinar o pessoal em tudo oque houvesse de mais moderno, não impor-tando a realidade local. A conseqüência eco-nômica dessa postura era tremenda. Será quehoje isto está sendo melhor conduzido? En-quanto se pensar que o sucesso pessoal ficacomprometido com a simplicidade, essas si-

tuações tendem a permanecer. Para grande satisfação de fornece-dores, e insatisfação do Banco Central. Uma situação anedótica re-lativa a isto ocorria nos anos 60 e um pouco até nos anos 70, comprodutos japoneses. Esses, normalmente, eram de excelente aparên-cia, baixa qualidade intrínseca e baixo preço. Podia-se, por exem-plo, comprar por um preço aparentemente justo uma câmara foto-gráfica japonesa, cuja velocidade de abertura atingiria 1/1000. Nãose sabe em que situação seria necessário usar 1/1000 por um ama-dor. Os fotógrafos profissionais da época continuavam a usar câ-maras européias. Em decorrência não se sabe se aquela câmera ti-nha mesmo a velocidade especificada, mas seus compradoresapontavam isto como uma de suas grandes vantagens. Esse apego àsofisticação compromete demais a aplicação dos métodos e ferra-mentas de solução de problemas e melhoria de gestão. Em uma de-terminada situação, um gerente tinha um resultado ruim, muito vi-sível com ajuda de um gráfico simples, mas não tomava as açõescorretas para resolvê- lo. Como parecia acre-ditar em sofisticação como solução em simesma, fez um curso mais avançado, e con-tinuou a ter o mesmo mau resultado, agoracom uma apresentação mais complexa gra-ficamente. Continuava sem um plano de açãoefetivo. O apego à sofisticação não fica res-trito, como se vê, apenas a equipamentos.Está por toda parte e, em minha opinião, pre-judica demais a melhoria do gerenciamento

Enquanto se

pensar que o

sucesso pessoal

fica comprometido

com a simplici-

dade, essas

situações tendem

a permanecer.

O apego à sofistica-ção não ficarestrito, como se vê,apenas a equipa-mentos. Está portoda parte e, emminha opinião,prejudica demais amelhoria dogerenciamento dodia-a-dia.

Page 54: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

54

do dia-a-dia. Apela-se desnecessariamentepara soluções gráficas complexas, e ferra-mentas inadequadas, porque o aspecto ex-terno dos trabalhos fica mais moderno. Seisto apenas acrescentasse algum custo noprocesso, mas pelo menos chegasse às solu-ções desejadas, ter-se-ia um mal menor. Masnão é este o caso. Além de acrescentar cus-to desnecessário, comumente não se chegaaos resultados desejados, ficando-se apenas

na bonita forma de apresentação. Esse tipo de apego está vincula-do a um outro tipo, que é o apego a rituais. Parece haver uma cren-ça, mais generalizada do que se pensa, de que a execução de umritual, por si só, resolveria alguma coisa. Isto é característico daprimeira fase da Civilização, quando se acreditava que as coisasaconteciam por razões inexplicaveis, mágicas. Talvez o apego a ri-tuais indique que a pessoa permanece com a crença daquela fase.Na certa indica uma crença de se obter resultados sem precisar fa-zer esforço. Não importa qual seja a razão, com isto não se faz ob-servação sistemática e aprofundada, não se analisa, não se age cor-retamente e não se resolve nenhum problema. Outra vez a históriado iceberg. Repetir ritual é ater-se à forma visível, a ponta doiceberg. É fundamental conhecer o corpo do iceberg, que é o por-que ou o conteúdo do ritual. De outra forma este ficará vazio, enão produzirá resultado.

Palavras

Outro mecanismo de defesa muito difundido é o apego a pala-vras. É como se tudo estivesse esclarecido, pronunciada uma palavraou expressão. Assim quando não se quer mudar nada, mudam-seas palavras e passa-se a discutir seu significado. Este é um ponto no-tável em nosso País. – “Fiz assim, porque isto é controle. Controlesignifica... – Sim mas qual é a idéia? O que se pretende atingir? Tal-

Parece haveruma crença, maisgeneralizada doque se pensa, deque a execuçãode um ritual, porsi só, resolveriaalguma coisa.

Page 55: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

55

vez a palavra controle com este significadoque você apontou não seja a mais adequada.Vamos discutir a idéia?. – Não, no livro estáescrito controle, e é isto que o autor quis di-zer, e controle significa, etc...” Algumas vezesperde-se a paciência e a elegância nesse tipode diálogo, que é relativamente freqüente. Sepalavras e expressões fossem estáticas, talvezestivéssemos falando latim clássico até hoje.Ou quem sabe uma língua ainda mais remo-ta. No Seminário de Gerenciamento pelas Diretrizes, realizado emBelo Horizonte, pelo sr. Yoshio Shima, em 1993, a certa altura osr. Shima perdeu a paciência com as discussões de significado depalavras, que vinham se sucedendo entre os presentes. Fez um co-mentário sobre esse comportamento, que observara nos diasanteriores em empresas que tinha visitado, e qualificou-o como coisatípica do Brasil. Finalmente, tomou um diagrama de causa e efei-to, apontou para uma causa, e fulminou: “A partir de agora o nomedisso aqui é A”. Parece que este nosso mal não é incurável, e tro-car o nome e trabalhar com a idéia pode ajudar a solucionar essemal. Neste ponto o prof. Vicente Falconi nos dá um exemplo demestre, quando em suas publicações define o significado de pala-vras como método, estratégia e outras. Apesar disso, mesmo ex-plicando que esta é a maneira em que podemos trabalhar produti-vamente, ainda se encontra, principalmente em salas de aula,pessoas que querem reabrir a discussão semântica. Considero esteapego a palavras um dos piores, só superado em malefício pelo ape-go a classificações.

Classificações

É um tipo de comportamento definitivamente danoso para aqualidade da observação e da análise. A pessoa classifica a informa-ção que está recebendo, faz uma avaliação baseada em juízo prévio,

Algumas vezes perde-se a paciência e aelegância nesse tipo dediálogo, que érelativamentefreqüente. Se palavrase expressões fossemestáticas, talvezestivéssemos falandolatim clássico até hoje.

Page 56: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

56

desqualifica a informação, e quase sempre oveículo da informação. Este bloqueio é possi-velmente o mais prejudicial ao desenvolvimen-to do ser humano. Uma maneira largamenteutilizada para isto é o uso do sufixo “ismo”. Emlugar de se abrir e refletir sobre a informaçãoou mesmo a própria realidade física que está nasua frente, a pessoa que assim age procura en-contrar alguma explicação para negá-la e um

“ismo” costuma ser muito oportuno nessa ocasião. Normalmente,para essa pessoa, se alguma coisa não está certa, é porque faltaramações de outras pessoas, motivadas pelos “ismos” dessas próprias.As coisas não acontecem porque estarão sendo bloqueadas pelotaylorismo, ou pelo oportunismo, pelo machismo, pelo capitalismo,pelo comunismo ou pelo neoliberalismo de outras pessoas envolvi-das no processo. Isto seria ridículo, se não tivesse resultados, prin-cipalmente econômicos, muito danosos. É um tipo de comportamen-to largamente manifestado quando a pessoa quer que a realidade sejaaquilo que ela criou em sua mente, e nãoaquilo que está disponível à observação.Uma pessoa que está presa à comparti-mentação da vida em uma certa quantidadede “ismos”, como poderá ela observar comclareza o que acontece em seu próprio am-biente? É claro que o sufixo “ismo”, em simesmo, está correto como elemento de lin-guagem. O que não está certo é a mania clas-sificatória, em que um dos recursos é o usodesse sufixo para desqualificar idéias e pessoas. Você que está que-rendo melhorar sua capacidade de observação e de análise, deve fa-zer um esforço. Mesmo que, inicialmente, você classifique algumacoisa em algum dos “ismos” conhecidos, ou até em algum neologis-mo, não deixe de procurar observar o que pode estar sendo trans-mitido por essa idéia antagônica. Esta é uma postura que ajuda a sairdo bloqueio classificatório e a estar preparado para perceber os mes-tres que andam por aí. O uso exacerbado de classificações traz em

Uma pessoa queestá presa àcompartimentaçãoda vida em umacerta quantidade de“ismos”, comopoderá ela observarcom clareza o queacontece em seupróprio ambiente?

A pessoa classifica ainformação que estárecebendo, faz umaavaliação baseadaem juízo prévio,desqualifica ainformação, e quasesempre o veículo dainformação.

Page 57: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

57

si um componente, que é a suposição de que já se sabe tudo sobre ascoisas e não é preciso agregar mais conhecimento a respeito. Esta éuma grande forma de cegueira.

Humildade

Em seminário realizado em Belo Horizonte, em 1991, o sr.Noriaki Kano apresentou sua “Teoria de que é preciso suar”, paraproduzir Qualidade. Em uma das publicações entregues aos parti-cipantes1, o sr. Kano enfatiza: “O inimigo da qualidade é a arrogân-cia”. Esta é uma palavra de forte carga emocional entre nós. No textoo sr. Kano fala de arrogância e falta de humildade. Sinto-me maisconfortável em abordar a questão pela última expressão. Um dos sig-nificados de humildade, conforme o Dicionário Aurélio é: “Virtu-de que nos dá o sentimento de nossa fraqueza”. Concordando coma idéia de Kano, de que para produzir Qualidade é preciso ter hu-mildade, esta virtude é indispensável não só para se produzir obser-vação acurada, como, e principalmente, para agregar novos conhe-cimentos. Esta falta de humildade bloqueou durante muito tempoa absorção de conhecimento de outras culturas pelos colonizadoreseuropeus. Um exemplo clássico é o da postura dos ingleses em rela-

ção à Índia. A superioridade militar entendi-da como superioridade cultural é um verda-deiro desastre, e a História está cheia disso,não só na Ásia como também nas Américas.No caso da Índia, a cultura local era muitomais antiga e refinada do que a dos coloniza-dores, mas não seguiu o caminho da espadae da tecnologia. A partir da arrogância doconquistador, os ingleses passam a ridicula-

Concordando com aidéia de Kano, de quepara produzirQualidade é precisoter humildade, estavirtude é indispensá-vel não só para seproduzir observaçãoacurada, como, eprincipalmente, paraagregar novosconhecimentos.

1 KANO, Noriaki. A Situação em que se Encontram as Atividades Ligadas à Qualidade esua Força Impulsora nos EUA – apresentado no Seminário AOTS Business Managementand TQC, Belo Horizonte, 1991.

Page 58: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

58

rizar a cultura local com histórias inconseqüentes como a da “vacasagrada”. A sobrevivência física de grande parte da população eradependente das vacas, como fonte de alimentação de longo prazo.Não só o leite era importante para a população. A partir do estercoobtinha-se uma fonte de energia, utilizada em fogões. Logo a ma-nutenção de vacas era uma decisão econômica da maior importân-cia, e a sabedoria local mandava que não fossem sacrificadas de ma-neira alguma. Uma das principais figuras da cultura hindu, Krishna,cresceu em uma família de vaqueiros, sendo também chamado deGovinda, que quer dizer vaqueiro. Isto poderia ser interpretadocomo um indicativo da importância da criação de vacas para oshindus. Mas daí a “adorar vacas” vai uma boa distância. Com essetipo de postura sem humildade, perde-se uma boa possibilidade dese adquirir conhecimento. Ainda com relação à cultura hindu, umponto muito interessante é a forma de encarar as transformações nanatureza. Esta obedeceria a três princípios:construtor, conservador,

destruidor. Só é possível renovar, se previamen-te, houver destruição. A manutenção [princípioconservador] não permite a renovação. Quan-do se está procurando inovação, portanto, énecessária a destruição de alguma coisa. Destrui-ção também é uma palavra com carga emocio-nal forte, mas aqui está sendo usada em seusentido estrito. Se você entender bem esta con-cepção, que é intrinsecamente simples, você

poderá aplicá-la à administração de seu negócio e de sua própria vida,com muito menos desgaste emocional. Na tradição hindu os três prin-cípios são identificados com deuses, que são aspectos de Bram ouBrahma, o ser supremo: Ishwara, Vishnu e Shiva2. Deuses? Crendi-ces? Está bloqueada a investigação, por falta de humildade. Outraconcepção da cultura hindu, e que também é aplicável ao trabalhoe ao relacionamento humano, fala agora de pessoas. Esta concep-ção considera três caminhos para o desenvolvimento ou três tipos

2 MIRANDA, Caio. A Libertação pelo Yoga. Rio de Janeiro, Livraria Freitas Bastos, 1963.

Quando se está

procurando

inovação,

portanto, é

necessária a

destruição de

alguma coisa.

Page 59: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

59

de Yoga3. Esta palavra não tem nada a ver com magia e significaunião. Os tipos mencionados são os caminhos da devoção, da ação,e do conhecimento ou sabedoria. As pessoas trazem em si caracte-rísticas, em que um desses tipos de yoga é preponderante. Ora, sevocê observar as pessoas que lidera, e identificar suas característi-cas essenciais, será muito mais fácil lidar com elas. As pessoas se mo-tivam muito mais quando recebem propostas de práticas ligadas asua característica própria, e isto pode ser muito importante nogerenciamento. Isto, porém, não é para ser levado a ferro e fogo,caso em que você estaria compartimentando totalmente uma pes-soa. Madre Teresa de Calcutá era, definitivamente, uma yogue daação e jamais iria se dedicar a uma vida contemplativa dentro de umconvento, o que não impediu que também se dedicasse à oração. Amaioria dos ocidentais é da ação e isto talvez explique porque mé-todos exortativos produzem muita emoção e quase nenhum resul-tado. Porém, é importante observar que assim como todo ser hu-mano traz em si as necessidades básicas estudadas por Maslow,também os três tipos de caminho de realização se apresentam àspessoas. Para uma vida mentalmente saudávelé fundamental que a pessoa tenha como pre-ponderantes em seu trabalho as atividades re-lacionadas a seu caminho próprio. O desenvol-vimento da pessoa, entretanto, implica oexercício de outras atividades, também. A re-gra da espada e da pena, mencionada com re-lação a Musashi, pode ser aplicada aos dias dehoje, de forma não literal. No trabalho den-tro das organizações, em que o agir é funda-mental, as pessoas estão no caminho da espada. Nada impede quetambém pratiquem o uso da pena, que é o uso da emoção e daintrospecção.. Hoje há todas as facilidades para isto, com o nívelatingido pelas comunicações. E é muito importante esta diversifica-

3 Bhagavad Gîtâ. Compilação Roviralta Borel. Trad. Eloisa Ferreira, São Paulo, Ed. Três,1973.

Para uma vidamentalmentesaudável é funda-mental que a pessoatenha como prepon-derantes em seutrabalho as ativida-des relacionadas aseu caminho próprio.

Page 60: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

60

ção de práticas. Ainda com relação à humildade, veja esta história.Há muitos anos, Akiba Schechtman, outro dos mestres que encon-trei na vida, me fez, aparentemente de brincadeira, a seguinte ob-servação: Você não deve tirar férias muito prolongadas. Se você seafasta uma semana, as pessoas não decidem nada, e esperam sua volta,na suposição de que você é imprescindível. Se você sair um mês, elastomarão algumas decisões, pressionadas pela urgência, mas ainda as-sim um pouco desconfortáveis. Se você sair dois meses, as pessoas de-cidirão tudo e perguntarão, mas o que é mesmo que aquele cara faziaaqui? O dr. Akiba, com o enorme conhecimento que tinha, me deuuma boa lição para desenvolver humildade. É evidente que a con-tribuição pessoal não pode ser desprezada, e é o somatório das con-tribuições individuais que faz as organizações se desenvolverem. Mas,pense bem, tem-se muito mais a aprender do que a ensinar, e as idéiasgeniais serão geradas depois de muito suar e aprender com o am-biente externo. Uma das principais contribuições a todo o desen-volvimento da Civilização foi dada por Newton. A menos que ain-da seja adepto da fase mágica da Civilização, você não vai acreditar

que a Lei da Gravitação foi descoberta porquecaiu uma maçã na cabeça de Newton. Pode atéter acontecido o episódio da maçã, como podeser verídico o episódio de Arquimedes na ba-nheira, mas o fato é que esses cientistas esta-vam debruçados no estudo das teorias cujosprincípios formularam. Nesse caso, o ritualcontribui para que se obtenha um insight. Damesma forma, Mozart não recebia músicasprontas, espontaneamente. Seu pai, que tam-

bém era um músico competente, o colocou para estudar música, pra-ticamente desde que começou a andar. A vivência absoluta no am-biente musical permitia a Mozart ter seus verdadeiros insightsmusicais. Todos podem ter insights, não porque são gênios, mas por-que, humildemente, dão o máximo de si para aprender. Voltamos àquestão do mestre e do discípulo. Se você não está pronto para re-ceber, seu mestre nunca aparece.

Voltamos à

questão do mestre

e do discípulo. Se

você não está

pronto para

receber, seu

mestre nunca

aparece.

Page 61: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

61

Dentro de nosso foco, que é observar e analisar melhor, o essen-cial é ter a mente aberta. Isto envolve remoção de alguns bloqueios.Consegue-se bons resultados se a mente trabalha relaxada e atenta.Existe uma ilusão de que atenção provoca tensão. Observe um pra-ticante de artes marciais. Seu nível de atenção é muito alto, mas elenão está tenso. Na verdade, se estiver, será liquidado pelo adversá-rio. Há um relato muito interessante sobre uma experiência feita comdois meditadores Zen. Ambos iniciaram a meditação, ligados a apa-relhos que registram as ondas cerebrais. Quando atingiram o estadode mente calma, foi introduzido um ruído repetitivo no ambiente.Esse ruído era produzido com uma freqüência constante, e inicial-mente ambos os monges acusavam, através de suas ondas cerebraisa percepção do ruído. Após algum tempo, somente o monge maistreinado acusava o ruído, através de uma alteração das ondas cere-brais. O outro monge, iniciante, acostumou-se com o ruído, isto é,

Ação6

O desenvolvimento pessoal é um processoque não termina nunca. Os métodos de

desenvolvimento, então, tem que contem-plar treinamentos e continuidade de ação

da própria pessoa, em um fluxo perma-nente. Não há certificado de conclusão dedesenvolvimento pessoal, nem certificação

de sistemas de desenvolvimento.

Page 62: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

62

sua capacidade de percepção ainda não che-gara ao desenvolvimento alcançado pelomonge mais treinado. Podemos inferir umaquase receita para melhorar a atenção e a per-cepção: relaxamento e meditação. Não sãopráticas únicas, nem excludentes.

Minha conversa, aqui neste ponto, vai setornar definitivamente pessoal, com vocêque já vem trabalhando em seu desenvolvi-mento e encontrou pontos em comum nos

textos anteriores, ou com você que está seguindo outra linha de de-senvolvimento pessoal, mas se interessou pelo que foi dito anterior-mente. A ação individual a ser tomada será definida por sua pró-pria consciência, e a única coisa que eu posso lhe passar sãoinformações a respeito de minha própria vivência. Tenho perseguidoesta forma de adquirir orientação para mim mesmo, de maneira sis-temática. Embora as palavras, sozinhas, comuniquem orientação,o exemplo ainda é o grande mestre. É a velha questão da leitura eda vivência. Muitas pessoas continuam a acreditar que por ter com-preendido intelectualmente alguma proposta, aquilo se tornou re-alidade para ela. Com isto temos muita literatura com propostasnão experimentadas por seus próprios autores. Referências sempresão saudáveis, mas nada substitui a vivência, quando se trata dedesenvolvimento. Se você quer conhecer alguma das artes, porexemplo, não é através de leitura de crítica que você vai conhecê-la. É através do convívio com as manifes-tações dessa arte. Considere que o artistaque quer comunicar alguma coisa, produzpara que as pessoas recebam aquela comu-nicação. Podem até existir artistas que sóquerem se comunicar com a crítica ou compotenciais compradores de suas obras quese deixam conduzir pela crítica. Se não secomunicou com você, em que isto o afe-ta? No mundo do sucesso em que vivemosatualmente, quase tudo tem sido levado

Podem até existirartistas que só queremse comunicar com acrítica ou compotenciais comprado-res de suas obras quese deixam conduzirpela crítica. Se não secomunicou com você,em que isto o afeta?

Podemos inferiruma quase receitapara melhorar aatenção e apercepção:relaxamento emeditação. Nãosão práticasúnicas, nemexcludentes.

Page 63: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

63

para esse lado da aprovação por árbitros daelegância, do bom gosto, do paladar, e, pormais incrível que seja, até do sexo. Se vocêem lugar de vivenciar as coisas por si mes-mo, for se deixar conduzir por esses ár-bitros, é capaz de passar pela vida sem terdesenvolvido seu próprio potencial criativoe humano. Uma orientação básica é indis-pensável para tudo, mas o julgamento deseu gosto não cabe a ninguém. Se você nun-ca bebeu vinho, não dá para começar tentando experimentar tudoo que existe, para tirar suas próprias conclusões. Mas, a continui-dade de sua experiência é somente sua, e se você, depois de umaorientação básica, preferir esta ou aquela variedade, você é que estácerto. Na mesma linha de raciocínío temos artes, vestuário e todasas demais manifestações humanas. Então, a proposta para melho-rar é vivenciar. Enquanto você não fizer isto, terá muitas referên-cias e pouco conhecimento. Portanto, não adianta se fartar de in-formação sobre algum assunto. A partir de uma quantidade deinformação, deve-se ter vivências correlatas, as quais certamenteabrirão o caminho para mais informação, e assim sucessivamente.É uma maneira que costuma ser atribuída a orientais, mas também

é comum do nosso lado do mundo. A dife-rença Oriente-Ocidente, é que lá existemmuitas escolas que sistematizaram o desen-volvimento pessoal pela vivência, e aquiisto quase sempre é proposto por meio depalavras. Esta é uma característica que di-ficulta a prática, mas a partir de um trei-namento básico, qualquer indivíduo podetrabalhar sozinho com técnicas de relaxa-mento e meditação. E, quando for neces-sário os mestres aparecem. Não há nada de

mágico nisto. É puro desenvolvimento da percepção. Esse desen-volvimento também pode ser conseguido com outros tipos de prá-tica. Em minha opinião, uma das mais efetivas, puramente ociden-

A diferença Oriente-Ocidente, é que láexistem muitasescolas que sistema-tizaram o desenvol-vimento pessoal pelavivência, e aqui istoquase sempre éproposto por meiode palavras.

Então, a proposta

para melhorar é

vivenciar.

Enquanto você

não fizer isto,

terá muitas

referências e pouco

conhecimento.

Page 64: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

64

tal, é a psicoterapia em suas várias for-mas. Pessoalmente, tenho uma vivênciade alguns meses em Análise Transa-cional, e outra muito mais longa, devários anos em Psicanálise. A experiên-cia em AT através de uma terapia inten-siva, trouxe ganhos notáveis em minhaatividade gerencial. Sem nenhum favor,dá para falar em “antes e depois”. Maistarde ingressei em um grupo de terapiaorientado por um terapeuta da linhapsicanalítica. É um processo longo, pe-

noso, não concluído, mas em que os ganhos justificam a persistên-cia. Da mesma forma, em qualquer dos modelos existentes, aqueleque medita terá que ser persistente para sentir alguma forma demelhoria. Parece que a questão toda se resume à pessoa conse-guir ter acesso seu próprio interior. No modelo típico do Ocidente,palavras e associações provocam o rompimento de barreiras queimpedem esse acesso. No modelo típico do Oriente, procura-se osilêncio da mente, a cessação da palavra. No Zen isto é levado aoextremo da experiência direta da realidade, sem elaboração racio-nal. “Como era o seu rosto antes de seus pais nascerem?”. Este éum dos muitos Koans, adotados principalmente pela escola Rinzai,e que devem ser solucionados pelo candidato a monge. Espero nãoter me excedido na empolgação, e quero voltar à nossa questãocrucial, desenvolvimento das capacidades de observação e de aná-lise. Todas as práticas aqui citadas, contribuem para esse desenvol-vimento. Voltando à empolgação, a moderna tecnologia nos per-mite coisas extraordinárias. Estou, ao mesmo tempo em que digito,ouvindo música mediante CD ROM. Música também é uma prá-tica muito forte para abrir nossa percepção, e estou pensando nolado puramente emocional. Não analise nada enquanto ouve. Qualé, então, a conclusão? Para você que está percebendo afinidades nocaminho para o desenvolvimento pessoal poderiam ser os seguin-tes os passos a serem dados inicialmente:

No modelo típico doOcidente, palavras eassociações provocam orompimento de barreirasque impedem esse acesso.No modelo típico doOriente, procura-se osilêncio da mente, acessação da palavra. NoZen isto é levado aoextremo da experiênciadireta da realidade, semelaboração racional.

Page 65: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

65

Visão Pessoal

Verifique se está clara sua Visão de Futuro pessoal. Nenhum denós vai se desenvolver se não for “puxado” por sua Visão. Faça umexercício de escrever ou refletir sobre sua Visão quantas vezes fornecessário. O Apêndice II apresenta um dos métodos de trabalhara Visão. Questione o que escreveu, até sentir-se racional e emocio-nalmente em harmonia com a sua Visão. Não limite o tempo ne-cessário para este exercício. Gaste todo o tempo que for preciso,dias, meses até. Não comunique sua Visão a ninguém, antes deformulá-la em definitivo. Ela é seu guia e pertence somente a você.

Informação

Tendo clareza de sua Visão, procure melhorar seu nível de in-formação sobre métodos de melhoria contínua de pessoas. Este li-vro fornece algumas pistas e literatura que pode ser consultada.Tome também iniciativas de ouvir palestras de divulgação dessesmétodos. Métodos de treinamento em relaxamento e meditaçãoestão sistematizados e oferecidos através de redes no País. Algunssão referidos ao final deste texto. Procure se informar.

Opção

Concluída a fase de informação, avalie qual das escolas tem maisa ver com sua personalidade e necessidade demomento. Esta questão do momento é funda-mental, você sabe. Não se deve procurar umaprática porque ela seria nosso ideal maior deauto-realização, se não se estiver preparado paraisto. Lembrar sempre que “Quando o discípuloestá pronto, o mestre aparece”. Nunca apareceráse você não perceber a validade e a necessidadedele, naquele momento.

Não se deveprocurar umaprática porqueela seria nossoideal maior deauto-realização,se não se estiverpreparado paraisto.

Page 66: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

66

Passos

Dê o primeiro passo. Comece a praticar sua opção. Não faça pla-nos de longo prazo, nem se preocupe com os passos seguintes. SuaVisão vai lhe indicar o caminho, paulatinamente.

Algumas propostas

O desenvolvimento da pessoa, qualquer queseja o nome que se lhe dê, é um processo indivi-dual. Isto é muito claro, por exemplo, para ver-dadeiros instrutores de Zen, mas não o é para amaioria das escolas que declaram ter o desenvol-vimento humano como proposta. A quase tota-lidade dessas instituições permanece na fase depadronização do processo civilizatório, e propõe-se a nivelar as pessoas. Seus métodos, em conseqüência, são méto-dos apoiados em exortações e rituais coletivos. Somente escolas quepropõem um trabalho do indivíduo consigo mesmo, sem definição deobjetivos padrão a serem alcançados, estão sintonizadas com amelhoria contínua de pessoas. Do que foi até aqui citado, encontra-mos isto no método Zen, na Meditação Transcendental, na própria

Psicanálise. Interessante que todas essas pro-postas têm um momento de início da prática,mas não tem um fim, a não ser por decisãopessoal, isto é, não há cronogramas paramelhoria contínua de pessoas. Musashi pra-ticou até morrer, e é o exemplo típico.

O Treinamento Autógeno, que hoje pare-ce muito esquecido, é um método de relaxa-mento desenvolvido no Ocidente, fácil de serdominado, de resultados fáceis de atestar. Di-

zia-se que foi aplicado no treinamento de astronautas. Treinei o TA,orientado por Francisco Denes Roessler, e o pratiquei com um re-sultado excelente, em uma fase em que tive necessidade de elimi-

O desenvolvi-mento dapessoa,qualquer queseja o nome quese lhe dê, é umprocessoindividual.

Interessante quetodas essas propos-tas têm um momen-to de início daprática, mas nãotem um fim, a nãoser por decisãopessoal, isto é, nãohá cronogramaspara melhoriacontínua de pessoas.

Page 67: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

67

nar dificuldades de saúde. Procurandouma referência recente, mais acessível doque o livro do criador do TA, JohannesSchultz1, encontrei o livro O Treinamen-to Autógeno2, pequeno, objetivo, práti-co. Esta é uma leitura recomendada paraa tomada de contato com o TA. Esse mé-todo exige um período relativamentecurto de treinamento, que pode ser con-duzido em grupo.

Outros métodos de relaxamento, dis-poníveis com facilidade, foram desenvol-vidos a partir da linha do Yoga. Um desses métodos é encontradoem grande parte do País através da rede DeRose, sendo o relaxamentouma atividade comum em práticas de Yoga de qualquer escola.

Um método de desenvolvimento, muito difundido no Ocidente,onde tem se mostrado efetivo, também pela simplicidade, é a Me-ditação Transcendental. Além do método em si, seu divulgador,Maharishi Maheshi Yogi, estabeleceu um projeto educacional mui-to ambicioso, e que está sendo conduzido nos países ocidentais.Assim, existem centros educacionais Maharishi, em que além da

educação tradicional, praticam-se as técnicasda MT. Também há experiências conduzidasem organizações, de toda a natureza. Uma daspublicações relacionadas à prática da MT,Enlightened Management3, cuida especifica-mente, como dizem os autores, GeraldSwanson e Robert Oates, do “upgrade” do sis-tema nervoso e da mente das pessoas de umaorganização. Essa publicação relata “casos” de

aplicação de MT a organizações industriais e de serviços, com re-

1 SCHULTZ, Johannes. O Treinamento Autógeno – Ed. Manole São Paulo, 1991.2 ALBISETTI, Valerio. O Treinamento Autógeno – Trad. Ivo Storniolo, São Paulo, Paulus,

1996.3 SWANSON, Gerald & OATES, Robert. Enlightened Management – Maharishi

International University Press, Iowa, USA, 1989.

Outros métodos derelaxamento, disponíveiscom facilidade, foramdesenvolvidos a partirda linha do Yoga. Umdesses métodos éencontrado em grandeparte do País através darede DeRose, sendo orelaxamento umaatividade comum empráticas de Yoga dequalquer escola.

Também há

experiências

conduzidas

em organiza-

ções, de toda a

natureza.

Page 68: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

68

sultados animadores. Não sei se há casos de aplicação em empre-sas brasileiras. O método da MT é bastante praticado individual-mente no País, e os treinamentos também são realizados em grupo.

Se você encontrar um orientadorconfiável em ZaZen, que é o método demeditação Zen, esta é uma das melhoresopções. A dificuldade é que, embora ummétodo puramente individual, não deveser iniciado sem o acompanhamento deum orientador qualificado.

Sobre as propostas acima, tenho expe-riência pessoal. Existem muitas outraspropostas, principalmente usando traba-lho corporal, área em que não tenhovivência, mas a percepção de resultados

em outras pessoas também recomenda que sejam pesquisadas. Umtrabalho muito interessante, realizado pela empresa Kollis, está re-latado no Apêndice I.

Se você não tem experiência com trabalhos desse tipo, a melhororientação seria começar por um trabalho de relaxamento. Comodisse antes, dê o primeiro passo, que depois você será guiado por simesmo. Entretanto, tenha paciência. Pratique qualquer coisa durantemuitos meses antes de concluir que deveria mudar de prática.

Se você não temexperiência comtrabalhos desse tipo, amelhor orientaçãoseria começar por umtrabalho de relaxa-mento. Como disseantes, dê o primeiropasso, que depois vocêserá guiado por simesmo. Entretanto,tenha paciência.

Page 69: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

69

Ao longo deste livro foram comentados alguns tipos de ações sim-ples, de iniciativa individual, que contribuem para a melhoria contí-nua da pessoa. Para uma organização, estas iniciativas individuais sãoadequadas, mas insuficientes. Em primeiro lugar porque existemmuitos outros tipos de ações a serem toma-das dentro de uma organização visandodesenvolver seu pessoal. Em segundo lugarporque todas as propostas anteriores con-sideram uma iniciativa pessoal e portanto,voluntária. Para fins de melhoria como umtodo, a organização deve assumir, um pla-no que propicie o desenvolvimento de to-das as pessoas que a compõem. Dentro des-se plano deverá existir um projeto queincentive a tomada das ações individuais

Onde entram as organizações7

A ação para o desenvolvimento pessoal éda própria pessoa, entretanto, ela pode

ser estimulada pela organização.

Para fins demelhoria como umtodo, a organizaçãodeve assumir, umplano que propicieo desenvolvimentode todas as pessoasque a compõem.

Page 70: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

70

acima referidas. A direção deve planejar e alocar recursos para esseprojeto. Um primeiro passo é o desenvolvimento de agentes de trans-

formação, que receberão um treinamentoespecífico, permanente, para que possamassumir o papel de orientadores da mudan-ça. Uma organização pode esperar a forma-ção desses agentes para iniciar o projeto demelhoria de seus resultados? A resposta énão. O desenvolvimento de orientadores demudança deve ser realizado paralelamenteà adoção de novos métodos de gestão deprocessos. Em uma organização que se en-contre em uma fase de muitas anomalias nosprocessos existentes, os métodos de me-lhoria de processos apresentam resultados

imediatos. E, não há necessidade de se iniciar as melhorias commétodos muito sofisticados. Na expressão de Ishikawa, pode-se co-meçar as melhorias na organização simplesmente varrendo. Isto sig-nifica eliminar sujeira física, mas também anomalias de processos. Amelhoria contínua de pessoas, que se sentirá cada vez mais necessá-ria na medida em que a varrição se aprofunda, é um processo para-lelo à introdução de novos métodos de gestão. É preciso observar,atentamente, alguns condicionantes no projeto aqui proposto. Uma

observação se refere à maneira de escolherpessoas para serem preparadas como agentesde transformação. Há uma probabilidade deque pessoas da organização já estejam trilhan-do esse caminho, porém não se expõem. Háoutra probabilidade de que outras pessoasqueiram trilhá-lo, porém precisam perceberaceitação. Todos eles se manifestarão, se hou-ver clareza de propósitos da organização, e umprojeto consistente e bem orientado. O recru-tamento desse pessoal deve ser através de

voluntariado. Por exemplo, a maioria das pessoas que voluntariamen-te assumem liderança em processos participativos está na postura de

É preciso

observar,

atentamente,

alguns

condicionantes

no projeto aqui

proposto.

Na expressão deIshikawa, pode-secomeçar asmelhorias naorganizaçãosimplesmentevarrendo. Istosignifica eliminarsujeira física, mastambém anomaliasde processos.

Page 71: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

71

agente de transformação. Se você é um gerente, e um voluntariadoaberto em sua área não é bem recebido, pro-vavelmente as pessoas não querem se expor amostrar um comportamento fora de padrão.Isto pode ser um indicativo de ações pessoaisa serem tomadas pelos gerentes e dirigentesda organização. A melhor gerência é aquelaque em lugar de tentar controlar as pessoas,as observa e lhes fornece orientação. Comodiz Shunryu Suzuki em Mente Zen, Menteprincipiante1: “A melhor forma de controlaras pessoas é encorajá-las a ficarem à vontade.Então elas estarão sob controle no mais amplo sentido. Dar a umaovelha ou vaca um pasto grande é a melhor maneira de tê-las sobcontrole. O mesmo acontece com relação a pessoas; primeiro deixeque façam o que bem entenderem e observe. Esta é a melhor política.Ignorá-las não funciona, é a pior estratégia. Asegunda pior tática é tentar controlá-las. Amelhor de todas é apenas observá-las.” [obracitada, pag. 30]. A tentativa de controlar aspessoas faz com que elas atuem de forma frag-mentada ou conflitante com sua natureza pró-pria. Quando o gerente se posiciona como ob-servador, é possível perceber o modo de açãonatural das pessoas e dar-lhes os “toques” ne-cessários para que seu trabalho seja produti-vo. Esta postura gerencial está em contrastecom a denominada postura taylorista. A revista Exame2 publicou ma-téria de Clemente Nóbrega, em que este, além de um resgate hones-to da importância de Taylor, observa que todos sabem que otaylorismo tem que ser superado, só não sabemos o que colocar emseu lugar. Acredito que a aplicação dos modernos métodos de

1 SUZUKI, Shunryu. Mente Zen, Mente Principiante. Trad. Odete Lara, São Paulo, Pa-las Athena, 1994.

2 EXAME, ano 30, no. 20, 24 /setembro/1997.

A melhor gerência

é aquela que em

lugar de tentar

controlar as

pessoas, as observa

e lhes fornece

orientação.

A tentativa de

controlar as

pessoas faz com

que elas atuem de

forma fragmenta-

da ou conflitante

com sua natureza

própria.

Page 72: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

72

gerenciamento de processos, juntamente com um trabalho demelhoria contínua de pessoas, possa ser uma resposta a esta ques-tão. A mudança de controlador para observador é um dos rompi-mentos mais difíceis que se pode conseguir. Todos somos limitadose todos precisamos diminuir as próprias limitações. Só a experimen-tação levará a isto.

Decidida a adoção de um projeto para a organização, de ondevirá a orientação para o desenvolvimento das pessoas, principal-mente os agentes de transformação? No texto anterior, foram apre-sentadas algumas propostas. Embora seja visível minha ligação coma escola Zen Soto, não me parece viável empresas trabalharem nestalinha. Eventuais praticantes ou interessados potenciais no treina-mento Zen devem ser encorajados a fazê-lo em sua vida pessoal,mas o método em si e a dificuldade de orientação confiável no Bra-sil, não o recomenda para desenvolvimento de grandes grupos.Nesse caso, a facilidade de execução é um imperativo, e assim, pro-postas na linha da Meditação Transcendental, do TreinamentoAutógeno e dos métodos derivados do Yoga são mais adequadas.

Os passos para um trabalho de desenvolvimento pessoal, dentrode uma organização, poderiam ser os seguintes:

Definição da extensão do projeto

É preciso um planejamento mínimo, com ações, prazos, escolhade um coordenador e dimensionamento do quadro de agentes detransformação. Um trabalho desta natureza não pode ficar solto, sobpena de retornar-se ao voluntarismo pleno.

Escolha dos agentes de transformação

Os agentes vão interagir com seus colegas. O pré-requisito é quetenham credibilidade e aceitação por parte destes. Comoincentivadores de atividades voluntárias, devem possuir forte carac-terística de liderança e facilidade de comunicação.

Page 73: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

73

Treinamento inicial dos agentes

O treinamento dos agentes deve começar por técnicas de relaxa-mento, tendo em vista a sua aceitabilidade. Relaxamento é uma ati-vidade muito relacionada ao físico, é agradável, não gera bloqueiospor preconceitos religiosos ou filosóficos.

Extensão do projeto

Uma vez que os agentes estejam treinados em relaxamento, essatécnica deve ser estendida às demais pessoas da organização. Nesseponto, certamente, começarão a aparecer resultados concretos. Nãotenha dúvida de que uma equipe treinada e praticando relaxamen-to conseguirá resultados melhores ao solucionar problemas do queuma equipe tecnicamente equivalente sem aquele treinamento. Esteé um dos aspectos, apenas.

Avanço do processo

Após a extensão do treinamento em relaxamento por toda a or-ganização, deverá ser feito um período de prática e ao final dele umaavaliação de resultados / novas expectativas.

Após essa avaliação, a Direção deve definir um conjunto de ati-vidades que contribua para a melhoria contínua do grupo, respei-tando a diversidade das pessoas. É inviável planejar isto no iníciodo processo e uma proposta padrão que não contemple a diversi-dade estará sujeita a fracasso.

Cronograma para os passos anteriores

Em vista da diversidade cultural de pessoas e organizações, cadacaso deverá ter seu cronograma próprio. Lembre-se que você estálidando com o organismo mais complexo do universo visível, que éo Ser Humano.

Page 74: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

74

As reflexões que você acabou de ler tem como característica es-tarem baseadas em caminhadas e tropeços de uma pessoa, ao longodos anos. O essencial em tudo isso é que cada um que pretendedesenvolver seu potencial humano, deve procurar por suas própriascaminhadas e dar seus tropeços pessoais. Existem e existirão mui-tos pontos em comum entre pessoas, o que as leva a formar grupose a trabalhar em conjunto. Existe a necessidade de observar e res-peitar limites para se possibilitar a convivência entre indivíduos. Masnada disso significa que você deva conduzir sua vida de maneirapadronizada, e é possível que a tentativa disso seja causa de muitodesajuste interno, por sufocar a criatividade natural das pessoas.Alguns grandes rumos já estão definidos por diferentes escolas depensamentos, incluindo as religiões. Veja, entretanto, que a sua vidaserá vivida por você e por ninguém mais. Todos têm necessidade derealizar uma Visão pessoal, diferenciada, trazida dentro de si pró-prios. Práticas absorvidas sem maior reflexão podem entrar em con-flito com essa Visão e serem causa de desajuste e sofrimento. Porisso, quero enfatizar a expressão “podem ser os seguintes”, usadasem orientações anteriores. As definições a respeito das questões tãopessoais abordadas neste livro só podem ser tomadas por você mes-mo. Procure informar-se a respeito de tudo, mas quando decidirsobre a vida, a sabedoria que você traz dentro de si mesmo é quedeve ser consultada. Espero ter de alguma forma auxiliado para quevocê encontre mais facilidade de ter acesso a essa sabedoria.

Conclusão8

Page 75: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

75

A empresa está situada em Birigui – SP, e dedica-se à fabricaçãode calçados infantis femininos. Há cerca de 3 anos iniciou um tra-balho de implantação de Gestão pela Qualidade Total, inicialmenteatravés de Gerenciamento pelas Diretrizes. Posteriormente, foramintroduzidos o Gerenciamento da Rotina Diária e outros projetoscorrelatos.

No ano de 1997 percebendo a necessidade de trabalhar direta-mente o desenvolvimento das pessoas, a Diretoria, com apoio daCoordenação de Qualidade Total iniciou o projeto “Prevenção eManutenção da Saúde através da consciência – atividades corporais”,inicialmente com um grupo piloto de 41 participantes. O projetoestá implantado, os Diretores da organização participam dele, e osresultados do primeiro estágio, medidos por meio de pesquisa comos participantes foram animadores. Em consequência o trabalhocontinua, objetivando também o desenvolvimento de Multiplica-dores, para ser estendido a toda a empresa no segundo semestre de1998.

A seguir apresenta-se a proposta e seus resultados, conforme re-latado pela Coordenadora Elizabete Fonseca.

Uma experiência naempresa Kollis-Pampili

Ianexo

Page 76: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

76

1.0 JUSTIFICATIVA

1.1 Para atender à demanda do mercado de forma eficiente eeficaz, faz-se necessário que as pessoas que estão diretamenteenvolvidas nesse processo, mantenham-se o mais próximopossível do seu estado de saúde física, mental e emocional;

1.2 As pressões originadas no contexto atual da implantação deum novo modelo de gestão, com foco de gerenciamentovoltado à mensuração de resultados, gera situações con-flituosas pessoais que podem ser externadas em forma dedoenças, tais como: problemas circulatórios, pressão arte-rial alterada, stress, depressão, etc.;

1.3 O aumento considerável e gradativo das doenças ocupa-cionais geradas por postura corporal inadequada e movi-mentos repetitivos, acarretando problemas de lombalgias,tendinites e LER (Lesão por Esforço Repetitivo);

1.4 Buscar o equilíbrio físico, mental e emocional das pessoascom uma visão holística do ser humano, dentro do Projetoda Qualidade Total.

PROJETO: “PREVENÇÃO E MANUTENÇÃO DA SAÚDE ATRAVÉS DACONSCIÊNCIA – ATIVIDADES CORPORAIS”

KOLLIS PAMPiLi

Page 77: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

77

2.0 OBJETIVOS:

2.1 Melhorar a qualidade de vida, aumentando o bem-estar ea vitalidade das pessoas, prevenindo doenças e dores, pormeio de práticas corporais;

2.2 Prevenir doenças coronárias, processos inflamatórios e es-tados depressivos;

2.3 Favorecer o relacionamento interpessoal, de forma que aspessoas se sintam participantes do todo e pertencentes a umgrupo seleto;

2.4 Melhorar o desempenho nas atividades, com ganho de pro-dutividade.

KOLLIS PAMPiLi

Page 78: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

78

3.0 CONTEÚDO PROGRAMÁTICO:

3.1 WORKSHOP:Sensibilização das pessoas envolvidas num primeiro contatocom o significado e a importância da prática corporal na pre-venção e manutenção da saúde física, mental e emocional;

3.2 PRÁTICAS CORPORAIS:Exercícios terapêuticos, três vezes por semana, com dura-ção de 30 minutos cada sessão, sob a orientação de umterapeuta corporal;

4.0 PÚBLICO-ALVO:

4.1 Esta prática destina-se a diretores, gerentes, supervisores ecolaboradores em pontos estratégicos.

1ª fase:

Alfredo: Maurício e Regina;Bansi: Valdir, Marco Augusto e Escudeiro;Bete: Sueli e Edson;Cláudio: Braga e Cleber;Enio: Marcos, Vilson, Edval e Chico;Gildo: Bene, Eliete, Mara, Haroldo, Miguel, Marcio, Bonini, Jumar

e Edilberto;José R. ColliMaria Ap. ColliRomeu: Rosangela e Aninha;RonaldoVera Cláudio, Beatriz e Petini;

KOLLIS PAMPiLi

Page 79: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

79

5.0 DURAÇÃO DO TRABALHO NA FASE DE IMPLANTAÇÃO:

• 90 dias para a implantação, sendo:• 1o workshop de 8 horas;• Prática corporal imediatamente após o workshop, tomando-se

parte do dia-a-dia, de maneira disciplinada.

6.0 ACOMPANHAMENTO DO DESENVOLVIMENTO DOTRABALHO:

Visitas semanais à empresa, com duração de 90 minutos, por pro-fissionais especializados, objetivando o acompanhamento das pes-soas envolvidas no projeto, subsidiando com orientações individuais,a verbalização terapêutica do processo corporal, bem como incenti-vando e motivando a prática corporal na qualidade de vida do grupo.

KOLLIS PAMPiLi

Page 80: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

80

7.0 RESULTADOS ESPERADOS

7.1 Os objetivos serão alcançados dentro de um processo gra-dual de trabalho, onde cada praticante, mediante sua dedi-cação, estabelecerá seu ritmo.

Quanto maior a autonomia na prática,maior o resultado

7.2 As práticas corporais têm demonstrado um retorno efetivoe concreto por parte das pessoas que realmente se dispõema um trabalho corporal; para isso é fundamental a discipli-na, ou seja, a regularidade às aulas-treino.O termômetro da eficácia deste trabalho pode ser obervadoatravés de:• melhor desempenho por meio de maior flexibilidade e

adaptabilidade às mudanças;• maior criatividade;• maior harmonia física, mental e emocional;• maior consciência corporal, evitando com isso pré-dis-

posição para doenças, acidentes de trabalho, atitudesconflitivas e absenteísmo;

UM CORPO SAUDÁVEL REFLETEUMA MENTE SAUDÁVEL

KOLLIS PAMPiLi

Page 81: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

81

8.0 CONSIDERAÇÕES FINAIS:

8.1 Serão fornecidos relatórios mensais à diretoria, contendoavaliação do desenvolvimento do trabalho junto ao grupo;

8.2 O acompanhamento semanal por profissionais especiali-zados possibilitará um levantamento de necessidades adicio-nais, a uma nova etapa de sensibilização, através de outroworkshop e demais considerações necessárias;

9.0 ITENS DE CONTROLE PARA AVALIAÇÃODO PROJETO:

• Questionário de pesquisa junto aos praticantes;• Freqüência ambulatorial: – consumo de medicamentos;

– consultas médicas;• Freqüência às aulas-treino “corporal”;• Número de acidentes de trabalho e/ou afastamentos;• Avaliação subjetivas, observando o crescimento individual e

grupal na atuação do dia-a-dia;

KOLLIS PAMPiLi

Page 82: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

82

A verificação realizada ao final de 1997, bastante abrangente,pode ser resumida como se segue:

100% dos participantes querem continuar com o trabalho

100% consideram que a ginástica está sendo importante para sipróprios

100% observaram alguma mudança importante no físico ou nomental

A maior parte dos participantes sugeriu a extensão do projeto aoutras pessoas da organização

Quanto ao comparecimento às aulas, realizadas três vezes porsemana, durante 3 meses, tem-se os seguintes dados;

83% dos participantes compareceram a mais de 70% das aulas

55% dos participantes comparecerem a mais de 90% das aulas

14% dos participantes compareceram a 100% das aulas

Dentre os benefícios apontados pelos participantes, alguns des-taques que falam por si:

“Dormindo melhor”

“Reduzindo praticamente a zero dores lombares”

“Indo para casa mais relaxado, mais suave (família agradece)”

“Recuperação do olfato”

“Estou movimentando o corpo, isso antes não acontecia, era rí-gido”

“Acreditar que sou capaz, apesar de todas as limitações físicas”

Page 83: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

83

A Visão de Futuro é reconhecida como essencial para uma orga-nização caminhar para a excelência. No planejamento empresarialexiste uma etapa de definição da Visão, porém, percebe-se em mui-tos casos que não houve um trabalho aprofundado de busca de umaVisão efetivamente inspiradora. Se considerarmos que Visão é umestado que se pretende concretizar em algum ponto do futuro, a ela-boração da Visão pode ser uma tarefa com-plexa para uma organização. São comunsdefinições de Visão do tipo ‘Ser o melhorem nosso segmento”. Embora audacioso,esse tipo de formulação é óbvio demais epode ser resultado de um trabalho super-ficial, e sem envolvimento dos responsáveispela construção da Visão. O consultor JoelBarker em seu excelente vídeo instrucional“O Poder da Visão”, trata com muita pro-priedade a questão e fornece alguns exem-

A visão do futuroIIanexo

A definição de umaVisão pessoal é tãoimportante quanto adefinição de umaVisão empresarial, enão apenas paraesportistas, artistasou cientistas.

Page 84: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

84

plos impressionantes de Visão bem definida e inspiradora. Um as-pecto muito importante do trabalho de Barker é que ele mostraVisões pessoais. A definição de uma Visão pessoal é tão importantequanto a definição de uma Visão empresarial, e não apenas para es-portistas, artistas ou cientistas. Com grande probabilidade a falta declareza de uma Visão pessoal pode levar a pessoa a ser um simplese enfadado consumidor daquilo que é sugerido pelos meios de comu-nicação. Existem diferentes maneiras de se definir uma Visão pesso-al. É comum que uma Visão seja definida de forma quase espontâ-nea, ou através de “insights”. As pessoas que não são tocadas dessaforma, comumente não explicitam sua Visão pessoal. É importante,então, observar que a Visão pessoal pode ser definida de uma formametódica. Uma dessas formas foi apresentada por Montie Cooke, emum workshop realizado em Salvador, em 1994. Montie Cooke nas-ceu nos Estados Unidos, formou-se em Administração e trabalhouem algumas instituições importantes tais como American Express eMerril Lynch. Em certa altura da vida sentiu a necessidade, comoele próprio definiu, de realizar “o esforço do indivíduo em acessare expressar sua sabedoria interior”. A partir daí realizou um traba-lho de auto-educação, que entre outros, compreendeu treinamen-tos com educadores alternativos como Buckminster Fuller e instru-tores do Nyngma Institute de São Francisco. Montie viveu algunsanos em São Paulo, e por meio de palestras e treinamentos procu-rou difundir suas idéias no Brasil. Atualmente, Montie voltou a vi-ver nos EUA. A partir do trabalho realizado com M. Cooke emSalvador, pode-se estabelecer um roteiro a ser seguido para a cons-trução da Visão pessoal.

Um roteiro para definir sua Visão

1. O desenvolvimento da Visão pessoal é um trabalho individu-al, porém para orientação desse trabalho é possível e conveniente aformação de um grupo.

Page 85: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

85

2. Preparação inicial

Deve ser realizado um exercício de relaxamento por um períodode até 60 minutos. Para pessoas treinadas em relaxamento, não ha-verá dificuldade. Para pessoas não treinadas, sugiro um exercíciosimples como, por exemplo, sentar-se confortavelmente e focar aatenção nos ruídos do ambiente, sem análise e sem retenção.

3. Retiro

Após o relaxamento, que pode ter sido realizado em grupo, cadapessoa deve se dirigir a um local em que não seja perturbada.

4. Reflexão sobre seu propósito de vida

No local escolhido, a pessoa fará uma reflexão sobre os seguin-tes pontos:

– Qual o seu propósito nesta vida?– Como as pessoas podem beneficiar-se ao máximo de você?– Quais são os seus dons naturais e meios naturais de expressão?

Esta reflexão está comentada no Cap. 4 – Seu Futuro, do textoreferente à série CALM [Creating a Life of Meaning] desenvolvidapor M. Cooke. Durante esta prática podem ser feitas anotações pelopraticante, o que, na maior parte dos casos, é útil.

5. Reflexão sobre os pontos fundamentais de sua existência.

Concluída a etapa anterior, deve ser feita uma lista dos nove pon-tos mais importantes para a pessoa, hoje. Por exemplo: a profissão,o casamento, o dinheiro, o poder, o amor, etc. Esse trabalho exigetempo, muita reflexão, e obviamente, muita honestidade consigomesmo.

Page 86: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

86

Concluída a lista dos nove pontos, deverão ser feitas as corre-lações entre eles, um a um. Todas as correlações devem seraprofundadas o máximo possível e tudo deve ser anotado.

6. Definição da Visão

Partindo das reflexões realizadas nos passos 4 e 5, a pessoa de-verá fazer a redação de sua Visão, em um ponto do futuro a serdeterminado, por exemplo, 5 anos à frente.

Este método, aqui descrito em linhas gerais, está inserido em umprocesso de desenvolvimento pessoal mais amplo do que somentea definição de uma Visão.

Nas instruções do texto da série CALM, M. Cooke propõe ori-entar a prática com as seguintes questões:

– Como você gostaria de ser? Qual é sua mensagem às pessoas?

– O que você se visualiza fazendo? O que você gostaria de rea-lizar antes de morrer?

– O que você visualiza ter, para expandir sua capacidade de dar?

Page 87: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

87

ALBISETTI, Valerio – O Treinamento Autógeno. São Paulo, Ed. Paulus, 1996.CAMPOS, Vicente F. – Gerenciamento Pelas Diretrizes (Hoshin-Kanri). Belo Ho-

rizonte, Ed. Fundação Christiano Ottoni, 1996.CAMPOS, Vicente F. Controle de Qualidade Total ( Ao Estilo Japonês ). Belo

Horizonte, Ec. Fundação Christiano Ottoni, 1992.DEMING, W. Edwards – Qualidade a Revolução na Administração. Rio de Ja-

neiro, Ed. Marques Saraiva, 1990.HAMEL, Gary e PRAHALAD, C. K. – Competindo pelo Futuro. Rio de Janeiro,

Ed. Campus, 1995.HERRIGEL, Eugen –A Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen. São Paulo, Ed. Pen-

samento, 1983.HERRIGEL, Gusty L. – O Zen na Arte da Cerimônia das Flores. São Paulo, Ed.

Pensamento, 1991.ISHIKAWA, Kaoru – QC Circle Koryo. QC Circle Headquarters, Tokyo, JUSE,

1980.KANO, Noriaki – A Situação em que se Encontram as Atividades Ligadas à Qua-

lidade e sua Força Impulsora nos EUA. Seminário AOTS, Belo Horizonte,1991.

LAND, George e JARMAN, Beth – Ponto de Ruptura e Transformação. São Pau-lo, Ed. Cultrix, 1994.

MIRANDA, Caio – A Libertação pelo Yoga. Rio de Janeiro, Livraria Freitas Bas-tos, 1963.

MUSASHI, Myamoto – Gorin No Sho, O Livro dos Cinco Elementos. São Paulo,Cultura Editores Associados, 1992.

NÓBREGA, Clemente – In EXAME, no. 20, 24/09/97, São Paulo, Ed. Abril.SCHULTZ, Johannes – O Treinamento Autógeno. São Paulo, Ed. Manole, 1991.

Bibliografia

Page 88: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

88

SWANSON, Gerald & OATES, Robert – Enlightened Management. EUA,Maharishi International University Press, Iowa, 1989.

SUZUKI, Shunryu – Mente Zen, Mente Principiante. São Paulo, Ed. Palas Athena,1994.

THOREAU, Henry D. – Walden ou A Vida nos Bosques. São Paulo, Global Edi-tora, 1987.

TOYNBEE, Arnold – A Civilização Posta a Prova, in Estudos de História Con-temporânea. Rio de Janeiro, Ed. Civilização Brasileira, 1961.

VYASA – Bhagavad Gîtâ [compilação Roviralta Borel]. São Paulo, Ed. Três, 1973.

WATTS, Alan – Em Meu Próprio Caminho. São Paulo, Ed. Siciliano, 1992.

WATSON, Greg – Understanding Hoshin-Kanri, in Hoshin Kanri. – PolicyDeployment for Successful TQM – Yogi Akao, EUA, Productivity Press,Cambridge, MA, 1991.

Page 89: A Espada e a Pena (Mauro Monteiro de Andrade)

Existe um reconhecimento geral da necessidade de inovar

para garantir a sobrevivência de pessoas e organizações humanas.Aí, começam colocações e cobranças para que as pessoas sejamcriativas em suas atividades diárias. Há nisto um conflito básico. Omodelo civilizatório e por conseqüência o modelo educacional quepermitiu o enorme progresso material dos últimos seis séculos ébaseado na racionalidade, padronização e exclusão da diferença peloexercício da autoridade. Nada mais contrário à liberação da criatividadepessoal. A recuperação dessa característica pede a retomada de formasde absorção e desenvolvimento de conhecimento, abandonadas oujamais exercitadas em nossos sistemas educacional e administrativo.Partindo da própria vivência, o autor propõe reflexões e ações para ouso de técnicas alternativas de busca do conhecimento, com ênfase nanecessidade de experimentação pessoal em contraponto à simplesabsorção da informação. A melhoria da percepção do ambiente e aatenção em todas as fontes de conhecimento que estão disponíveis,sem utilização. Práticas simples da vida diária dentro de casa ou doambiente de trabalho e também do trabalho sistemático de auto-conhecimento com o uso de técnicas ocidentais e orientais.

Mauro Monteiro de AndradeMauro Monteiro de AndradeMauro Monteiro de AndradeMauro Monteiro de AndradeMauro Monteiro de Andrade - Engenheiro Mecânico e eletricista pelaEscola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais. Foigerente em organizações privadas e desde1991 é consultor do Projeto Gestão pelaQualidade Total da Fundação ChristianoOttoni. Tem se dedicado a treinamento eprática em Meditação, o que o levou aescrever o presente livro.

Mauro Monteiro de Andrade

A ESPADA E A PENAA ESPADA E A PENAA ESPADA E A PENAA ESPADA E A PENAA ESPADA E A PENAA ESPADA E A PENAA ESPADA E A PENAA ESPADA E A PENAA ESPADA E A PENAA ESPADA E A PENA