A ESTÓRIA DE BHÁRATA (Português)

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  • 7/29/2019 A ESTRIA DE BHRATA (Portugus)

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    A ESTRIA DE BHRATA1Do rmad Bhgavatam

    Bhrata, o filho do sbio rei Rsabha, era um poderoso monarca. Ele era topoderoso que esta terra, que tinha sido conhecida at ento por Ajanbha, daqui emdiante passou a chamar-se de Bhratavarsa, devido ao seu nome.

    Bhrata governou seus sditos como um gentil pai que queria de corao obem de todos seus filhos. Ele trabalhou incessantemente para o benefcio de todos,com nenhum pensamento de ganho pessoal; por menor que fosse a tarefa, ele aexecutava como um servio ao Senhor. Cada ato tornou-se assim um ato de devoo,purificando seu corao, libertando-o das paixes e finalmente unindo suaconscincia com a do Supremo Brahman.

    Em sua velhice o rei Bhrata dividiu seu reino entre seus cinco filhos e retirou-

    se para a floresta para meditar em Deus, esperando assim cortar as amarras doKarma que o prendiam vida. Ele sabia que todos os seus deveres e seu trabalhoeram apenas uma preparao para o momento quando todas as correntes queprendiam sua alma matria fossem cortadas para sempre.

    Nas margens do rio Gandak, na floresta dos Himlayas, ele prprio construiuuma pequena cabana de folhagem, e l, meditando constantemente sobre o Deus deAmor, que reside nas almas de todos os homens, encontrou a paz interior pela qualse esforou toda sua vida.

    A cada manh ele oferecia a adorao com a seguinte orao:Meditemos sobre a Suprema Luz. Dela todo o universo surgiu. Ela existe no

    corao de todos, e a Ela tudo retornar. Ela a inteligncia em todos os seres. Ela o guia de toda a inteligncia. Nela tomamos refgio.Assim dias, meses e anos se passaram.2 Ento um dia uma cora veio beber

    gua perto do lugar onde o sbio rei estava meditando. No mesmo momento, a umapequena distncia, um leo rugiu. A cora ficou to aterrorizada que no parou parasatisfazer sua sede, mas saltou subitamente para cruzar o rio. Como ela estavaprenha, este extremo esforo e medo sbito fizeram com que ela desse a luz a umpequeno filhote e em seguida instantaneamente caiu morta. O filhote caiu na gua eestava sendo arrastado pela corrente quando foi visto por Bhrata. Instantaneamenteo rei se levantou de sua meditao e resgatou o animal recm-nascido da gua. Ele o

    levou cabana, acendeu uma fogueira e com cuidado e ateno trouxe-o de volta avida. Ento o carinhoso rei colocou o gamo sob sua proteo, alimentando-o comfrutas e grama fresca. Ele se desenvolveu sob o cuidado paternal do retiradomonarca e se tornou um belo gamo. Ento ele, cuja mente tinha sido forte osuficiente para quebrar seu apego de toda sua vida ao poder, posio e famlia,tornou-se apegado ao gamo que tinha salvado do riacho. E enquanto ele ficava maise mais apegado ao gamo, menos ele podia se concentrar no Senhor. Quando o gamosaa para se alimentar na floresta e demorava em retornar, o sbio rei ficava

    1 Traduo do captulo III da parte V (pg. 100) do livro Srimad Bhagavatam, The Wisdom of God,

    traduzido e editado por Swami Prabhavananda.2 Deste ponto at o final do captulo a traduo de Swami Vivekananda, levemente revisada (notado editor).

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    preocupado e ansioso. Ele pensava: Talvez meu pequeno tenha sido atacado poralgum tigre ou talvez algum outro perigo tenha cado sobre ele, seno por quedemora tanto em retornar?

    Alguns anos se passaram deste modo. Ento um dia, sabendo que a morteestava prxima, o sbio rei deitou-se para morrer. Mas sua mente ao invs depermanecer fixa no Ser, estava pensando sobre o gamo; e enquanto seus olhosestavam fixos na face triste do seu gamo bem-amado, sua alma deixou o corpo.Como resultado disto, em seu prximo nascimento ele nasceu como um gamo. Masnenhum Karma se perde e todas as grandes e boas aes feitas por ele como um rei esbio deram frutos. Este gamo nasceu jtismara. Ele se lembrava de seu nascimentoanterior, apesar de privado da fala e vivendo em um corpo animal. Ele sempre seafastava de seus companheiros e era instintivamente atrado e pastava prximo seremitas onde adoraes eram oferecidas e onde os Upanishads eram ensinados.

    Aps o costumeiro tempo de vida dos gamos ter passado, ele morreu, e

    nasceu em seguida como o filho mais novo de um rico Brahmin. Nesta vida eletambm se lembrava de seu passado e mesmo na infncia estava determinado a nomais se prender ao que bom ou mau da vida. Enquanto crescia, se tornava forte esaudvel, mas no falava nenhuma palavra. Ele vivia como algum de raciocniofraco e preguioso, por medo de envolver-se nos assuntos mundanos. Seuspensamentos estavam sempre no Infinito e ele vivia apenas para esgotar seuPrrabdha-karma. Com o passar do tempo seu pai morreu e os outros filhosdividiram a propriedade apenas entre eles. Pensando que o filho mais novo eramudo e estpido e que no servia para nada, eles pegaram sua parte. Sua caridadepor ele se estendia apenas ao ponto de dar comida suficiente para viver. As esposas

    dos irmos eram frequentemente muito duras com ele, obrigando-o a fazer todo otrabalho duro, e se ele fosse incapaz em algum momento de fazer o que elas exigiam,elas o tratavam sem nenhuma simpatia. Mas ele no demonstrava medo ou tristeza,nem falava uma palavra. Quando elas o perseguiam demais ele saa da casa e sesentava sob uma rvore, permanecendo hora aps hora, at que a raiva delasamainava e ento ele quietamente retornava a casa novamente.

    Um dia quando as esposas de seus irmos o trataram com mais dureza do quede costume, Bhrata saiu da casa, sentou-se sob a sombra de uma rvore edescansou. Neste momento aconteceu que o rei Rahgana estava passando por ali,carregado em um palanquim sobre os ombros de carregadores. Um dos carregadores

    subitamente adoeceu e os atendentes do rei procuravam por um homem parasubstitu-lo. Eles viram Bhrata sentado sob uma rvore e vendo que era forte,perguntaram se poderia tomar o lugar do homem doente.

    Bhrata no respondeu e por isso os serventes do rei o pegaram e colocaram osuporte do palanquim sobre seus ombros. Sem falar uma palavra, Bhrata andava

    junto com os outros carregadores. Logo em seguida o rei reclamou que o palanquimestava sendo carregado aos solavancos e olhando para fora se dirigiu ao novocarregador, dizendo: Seu estpido, descanse um pouco; se teus ombros doem,descanse um pouco. Ento Bhrata, descendo o palanquim abriu seus lbios pelaprimeira vez nesta vida e falou:

    A quem tu, rei, chamas de estpido? A quem tu pedes para descer opalanquim? A quem tu chamas de cansado? A quem te diriges como tu? Se o que

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    queres dizer, rei, pela palavra tu, esta massa de carne, ela composta da mesmamatria que a tua; inconsciente e no sabe o que cansao, no sabe o que dor. Sequeres dizer que a mente, ela mesma que a tua, ela universal. Mas se pelapalavra tu significas algo que est alm disso, ento o Ser, a Realidade em mim,que a mesma em ti; o nico no universo. Queres dizer ento, rei, que o Ser podecansar-se, pode machucar-se? Eu no queria, rei este corpo no queria - pisar nospobres vermes que rastejam pelo caminho e por isso eu tentava evit-los e istoprovocava os solavancos no palanquim. Mas o Ser jamais se cansa, jamais seenfraquece, jamais segurou o palanquim, pois onipotente e onipresente.

    O rei Rahgana, que era orgulhoso de sua erudio, conhecimento e filosofia,desceu do palanquim e prostrou-se aos ps de Bhrata, dizendo: Peo teu perdo, poderoso, eu no sabia que eras um sbio quando pedi que me carregasse. umagrande beno para mim, ter te encontrado. Por favor, me ensine o conhecimento doSer.

    rei, disse Bhrata, conhecer teu Ser o supremo conhecimento. Mas esteconhecimento do Ser no surge em um homem enquanto pensar que pode encontrarfelicidade no mundo transitrio.

    O homem permanece aprisionado por suas prprias aes, boas ou ms,devido identificao do Ser com os trs Gunas Sattva, Rajas e Tamas. O bom oumal se prende apenas mente e jamais ao verdadeiro Ser. A mente como umadjunto para o Ser. O divino Ser aparece como um esprito individual devido suaassociao e identificao com a mente. Da maneira que so as aes boas ou ms que se prendem mente, assim ser o novo nascimento, superior ou inferior. Ohomem desfruta ou sofre de acordo com suas aes. A mente, assim, a causa da

    escravido e tambm a causa da liberao.A mente associada com os Gunas torna-se a causa da escravido esofrimento; mas quando libertada de sua associao traz liberdade e paz.

    O eterno sujeito, a eterna testemunha, o divino Ser intocado porquaisquer aes ou pensamentos. Est alm da mente e dos sentidos. a prpria luz. Deus chamado Nryana, pois Ele reside no corao de todos os seres. Ele Vsudeva, pois Ele o refgio de todos os seres. Ele o governador de Sua prpriaMy e assim mora no corao de todos que criou.

    Os seres humanos do voltas sem cessar na roda do nascimento e morte atque despertem, e controlando suas paixes, libertem-se da escravido de My e

    conheam a verdade sobre o Divino Ser. No h salvao ou liberao at que umhomem liberte-se de sua prpria mente, conhecendo a verdade do Ser como distintoda mente. a mente que causa todas as experincias de sofrimento, iluso, doena,luxria, cobia e raiva. A mente a morada de tudo isto. Subjugue esta mente com aespada do conhecimento que foi afiada pela adorao do Senhor de Amor, o mestrede todos os mestres.

    Existe uma Verdade, uma existncia o prprio conhecimento, a conscinciaunitria, pura, imutvel, alm do sujeito e do objeto. Este conhecimento chamadode Deus o Senhor de Amor.

    Nem pelo mero estudo dos Vedas, nem pela austeridade, nem mesmo pelas

    boas aes, pode-se atingir este conhecimento, mas pela associao com grandesalmas. Quando o corao torna-se puro, tem-se felicidade na meditao sobre o

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    Senhor de Amor. Queimando o pecado da ignorncia no fogo do conhecimento, ohomem realiza sua identidade com Brahman, e alcana o Senhor de Amor, a meta davida.

    Em realidade, este mundo pode ser comparado a uma floresta densa onde oshomens se perderam. Existem assaltantes na floresta os sentidos e as experinciassensrias que nos roubam de nossa prpria herana, a divindade interna. H umamiragem diante de ns; ns a vemos e corremos para satisfazer nossa sede. Existe asede pela felicidade em ns, e corremos para satisfaz-la no mundo objetivo, que to ilusrio como a miragem. s vezes nos lembramos que no h nada desejvel nomundo, mas isto logo esquecemos. Damos voltas e voltas nesta floresta e noencontramos o caminho para sair dela at que algum gentil viajante, alguma grandealma, o revele para ns. Os sbios, autocontrolados, tendo alcanado a liberao parasi mesmos, mostram-nos o caminho para a liberdade.

    rei Rahgana, tu tambm ests perdido na profunda floresta do mundo.

    Abandone todo apego, tenha simpatia por todos os seres, e com a espada doConhecimento, aguada pela adorao, meditao e servio, corte as correntes daignorncia.

    Aps ter Bhrata assim falado, o rei prosternou-se diante dele. Ento sedespediram um do outro. Bhrata continuou a ensinar a Verdade que realizou e o reiretornou ao seu reino para realizar a Verdade que tinha aprendido.