A Expressão e Educação Musical e Dramática No Ensino Fundamental
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A Expressão e Educação Musical e Dramática no Ensino Fundamental
Introdução
É com o corpo que as crianças exploram, aprendem e reagem aos estímulos do meio envolvente. São os
sentidos que recolhem o material com o qual se constroem as imagens mentais – não só visuais, mas também
tácteis, auditivas,... – necessárias à construção dos conceitos.
A educação do corpo, do gesto, da audição, da voz e da visão desenvolve nas crianças o campo das
possibilidades de interpretar o mundo, de exprimir o pensamento, de criar.
Este trabalho, embora contenha algumas limitações, procurará dar uma imagem da importância que a
Expressão e Educação Musical e Dramática tem no desenvolvimento afetivo, social e intelectual das crianças,
na medida em que lhes dá a possibilidade de interpretar o mundo, de estruturar e exprimir o seu pensamento, de
criar, de desenvolver o seu equilíbrio emocional, de formar o seu caráter e de afirmar a sua própria identidade.
A Expressão e Educação Musical
O gosto pela música é natural nas crianças. Elas gostam de cantar e de ouvir música, como gostam de
ouvir o ruído da água que corre da nascente ou o canto de uma ave. A música é uma linguagem universal,
completa, porque é puramente intuitiva, e talvez o modo de expressão por excelência da espontaneidade. Igor
Stravinsky afirmava: “Considero a música, pela sua essência, impotente para exprimir o que quer que seja: um
sentimento, uma atitude, um estado psicológico, um fenômeno natural”. “Expressão de coisa nenhuma, sem
dúvida, se não de uma emoção estética que é tudo, e que o criador transmite e partilha com o ouvinte. Que a
mensagem seja desprovida de conteúdo preciso, o que conta é a transmissão de uma experiência vivida, de uma
realidade inefável, a comunhão espiritual que daí resulta e o florescimento pessoal que ela favorece”. (Gloton &
Clero, 1976, p.177).
De acordo com a opinião dos autores acima referidos, o que realmente é importante é que a música
transmite “uma experiência vivida, uma realidade inefável, a comunhão espiritual que daí resulta e o
florescimento pessoal que ela favorece”.
Não podemos ignorar a importância da música na formação do homem, porque ela faz parte da essência
do ser humano. Goethe escreveu: “Quem não ama a música, não merece o nome de homem, quem gosta dela é
metade de homem, quem a pratica é um homem completo...”. Apesar de considerarmos que há algum exagero
nas afirmações de Goethe, as suas palavras mostram claramente a importância que a música tinha para ele. O
que nós podemos afirmar é que o homem, através da música, pode exprimir os seus sentimentos e libertar
muitas vezes emoções que o oprimem adquirindo uma estabilidade que é importante para a afirmação da sua
própria identidade, na sociedade em que está inserido.
A educação musical deve começar na família e tem que ter continuidade na escola. A escola deve
ensinar as crianças a cantarem bem, a amarem o canto e dar-lhes a possibilidade de distinguirem a boa música
da má. A música é como uma segunda língua que permite exprimir os sentimentos, na medida em que há
canções tristes e alegres.
O poder educativo da música traduz-se pelo apuramento do gosto musical, o que implica uma afinação
rigorosa, uma boa pronúncia e um ritmo certo. No entanto a criança para interiorizar estes conhecimentos deve
ter no seu professor um modelo a imitar e, para que isso aconteça, ele deve ter os conhecimentos necessários, na
área da Expressão e Educação Musical.
As canções populares características do nosso folclore dão à criança a noção de que existiu um passado,
o nosso passado que não podemos ignorar, porque ele contribui para a nossa própria identidade. Conhecendo
outras melodias igualmente populares e tradicionais de outros países, a criança apercebe-se de que existem
outras culturas diferentes da nossa que é importante conhecer e esse conhecimento despertará nela a simpatia
por seres humanos que não conhece e provavelmente nunca virá a conhecer, o que não impede de ter por eles
simpatia e solidariedade.
A existência de um aparelho de som na escola permite ao professor escolher boas músicas, porque não
só desenvolve o gosto musical das crianças como permite criar um ambiente propício à boa disposição dos
alunos, quando realizam os seus trabalhos.
As cirandas, a dança, a ginástica rítmica, fazem parte da Educação Musical e são importantes, porque
desenvolvem sentimentos coletivos e o autocontrole, disciplinam movimentos do corpo, os gestos e as atitudes
e contribuem para uma harmonia corporal e afetiva.
O professor tem que atender à singularidade musical de cada criança, dando-lhe oportunidade de
desenvolver, à sua maneira, as suas propostas e os seus projetos, sem, contudo, esquecer que é professor e como
tal deve ter propostas e projetos para os seus alunos de modo que a música contribua para a sua formação
afetiva, social e intelectual.
Voz, corpo e instrumentos formam um todo, sendo a criança solicitada a utilizá-los de forma integrada,
harmoniosa e criativa.
O professor deve criar nas crianças o gosto pela música, através das suas canções preferidas e da
dramatização das suas histórias preferidas.
A Expressão e Educação Dramática
Ao referirmo-nos à Expressão e Educação Dramática, temos que afirmar que esta área de expressão não
se pode confundir com o teatro, na medida em que o jogo dramático não se baseia num texto prévio que
embaraça muitas vezes a criança ou nalguns casos a paralisa. O jogo dramático é um exercício da criança para a
própria criança e esse mesmo jogo esgota-se ao ser realizado.
Para confirmarmos o que referimos, vamos transcrever algumas palavras de Marie Dienesch, citada no
livro “A Criança e a Expressão Dramática”, (1974, p.24): “Partindo de uma ação e não de um texto, a criança
não corre o risco de cair nesta confusão fundamental: as palavras já não tomam para ela o lugar da ação, pois
esta é apreendida antes da utilização de qualquer forma verbal. Além disso, levada a criar o seu próprio texto,
quando se chega ao momento em que as palavras satisfazem uma necessidade interior, e só então, ela
experimenta a verdadeira natureza da linguagem dramática, em que tudo o que possa ser indicado por um meio
diferente da palavra não deve ser dito, e em que a palavra assume o seu valor insubstituível e soberano a fim de
ser o ponto final de uma evolução interior, já contida na vida física do autor”.
Atualmente, o jogo dramático foi banido de algumas escolas, onde a festa de fim de ano é substituída
por um passeio, por uma exposição de trabalhos dos alunos. No entanto, este tem que tomar o seu verdadeiro
lugar na educação da criança.
A dramatização livre e espontânea dos contos de fadas e dos contos tradicionais desenvolve na criança a
criatividade e tornam-na mais comunicativa desenvolvendo, assim, a sua socialização. É através do imaginário,
do maravilhoso, que a criança cresce afetivamente, ultrapassando, muitas vezes, traumatismos que uma
educação repressiva ajudou a criar.
Freud afirmava que os processos de transformação do trabalho subjacente ao conto são análogos aos do
trabalho do sonho: dramatização, deslocamento, dissociação e representação por símbolos.
Também Carl Jung referia que os contos são um material discreto para as projeções necessárias a uma
individualização correta. Igualmente Gaston Bachelard considerou o maravilhoso como a matéria prima da
imaginação: “É como a grelha mais rigorosa para a análise do real ao aperceber-se que a razão científica recorta
as suas verdades na ordem dos sonhos e da consciência poética”.
O conto é um espaço de mediação entre o consciente e o inconsciente, entre o eu e o mundo.
A afirmação de L. Pereira é igualmente elucidativa: “O conto maravilhoso... respeita a interação entre o
homem e o cósmico para a formação de imagens, tendo em conta a homologia do psíquico, do cósmico, do
social e do biológico, organizadas numa significação integrada. O conto ajuda o docente a encontrar o núcleo
gerador da interdisciplinaridade. A sua compreensão leva-o à descoberta dos segredos da pedagogia: à
motivação do espaço interdisciplinar”.
“O conto é um universalismo que denota a persistência de qualquer coisa de primordial, de irrefreado e
de comum à totalidade dos homens”.(José Gomes Ferreira). Muito antes, já Teófilo Braga fazia a apologia do
conto, no entanto as pretensões pedagógicas desnaturaram-no e ele perdeu a sua poesia espontânea, a sua
singeleza popular e a sua beleza tradicional. A função ancestral do conto é por o vulgo a sonhar. A civilização
destruiu muita dessa função.
A mensagem do conto de fadas é determinante na educação das crianças, mas também dos jovens. Essa
mensagem, porventura a mais importante, é a de que a luta contra as dificuldades da vida é inevitável, mas se o
homem se empenhar, com coragem e determinação, acabará por sair vencedor de todos os obstáculos. Desta
maneira a mensagem não é moral, mas somente a de encarar a vida com confiança, com possibilidade de vencer
as dificuldades que a todos se colocam. “A nossa herança cultural encontra expressão nos contos de fadas e
através deles é comunicado às crianças”.(Bruno Betteheim).
A Expressão e Educação Musical e Dramática
O professor pode associar a Expressão Dramática à Expressão Musical, porque as duas áreas se
completam, e como são muito importantes na educação das crianças, o professor deve desenvolver as mais
variadas competências, nas áreas referidas:
. Compreender gestos, sons, ritmos e escrita musical.
. Conhecer músicas e diferentes instrumentos.
. Ser capaz de produzir e / ou criar sons.
. Compreender jogos de comunicação verbal e não verbal.
. Ser capaz de produzir e/ou criar personagens, histórias ou jogos de imaginação.
. Dominar progressivamente a expressividade do corpo e da voz.
Vamos exemplificar, seguidamente como é que a Expressão e a Educação Musical e Dramática podem e
devem ser dadas em conjunto, formando um todo imprescindível à formação da criança.
1. Movimento:
a) As crianças estão sentadas em círculo. O professor chama um aluno e diz-lhe que imite um
animal só com mímica. Os restantes tentam adivinhar que animal é.
Conversar sobre a imitação feita.
b) Falar em outros animais que poderiam ser imitados. Cada criança vai imitar o animal que desejar
(só com mímica).
c) Em círculo, vão transformar-se lentamente em diferentes animais, segundo indicações do
professor. Por exemplo: girafa, elefante, galinha, leão, borboleta, burro, etc.
d) Jogo: o professor distribui por cada aluno um pequeno papel dobrado onde registrou,
previamente, o nome de um animal. O nome de cada animal foi escrito em 2 (3) papéis diferentes. Assim
haverá: 2 (3) macacos; 2 (3) elefantes; 2 (3) caracóis; 2 (3) galinhas; 2 (3) girafas; 2 (3) gatinhos; 2 (3) ratinhos
e 2 (3) burrinhos.
Desenvolvimento: Num primeiro momento procuram transformar-se corporalmente no animal
mencionado no papel, não podendo emitir quaisquer sons. Depois se relacionam uns com os outros, tentando
organizar-se em pares de animais iguais. Quando todos os pares estiverem organizados já é permitida a
utilização de sons dos vários animais relacionando-se uns com os outros aos pares. (O professor vai sugerindo
situações para motivar o relacionamento entre os diferentes pares).
2. Canção: Siricoté
Eram quatro pretinhos
Todos quatro da Guiné
Deitaram a fugir
Cantando o Siricoté.
Siricoté, siricoté,
Eram quatro pretinhos da Guiné.
Logo, logo encontraram
O amigo Chimpanzé
A ele ensinaram
A canção siricoté.
Siricoté, siricoté,
Eram quatro pretinhos da Guiné
Depois veio a girafa
Toda airosa a dançar
Tocava numa garrafa
Pois não sabia cantar.
Siricoté, siricoté,
Eram quatro pretinhos da Guiné
Pouco a pouco a bicharada
Foi chegando à clareira
E com toda a sua graça
Entrando na brincadeira
Siricoté, siricoté,
Eram quatro pretinhos da Guiné
Foi assim que na floresta
Todo o bicho bateu pé
Foram os quatro pretinhos
A cantar Siricoté
Siricoté, siricoté,
Eram quatro pretinhos da Guiné
3. Mímica e Dramatização: Mostrar quatro dedos;
Gesto de fugir com as mãos, bater palmas.
Movimento com o corpo, mãos nas ancas.
Requebrando, seguindo o ritmo da música.
A Interdisciplinaridade
Seguidamente, vamos exemplificar como pode haver interdisciplinaridade entre a Expressão e Educação
Musical e Dramática e as outras áreas curriculares:
Estudo do Meio – trabalho de pesquisa sobre os animais quanto à:
. alimentação
. respiração
. reprodução
Este trabalho será feito em grupo e terá como fontes de consulta: vídeos, visitas de estudo, livros e
enciclopédias.
O professor deve orientar o trabalho, motivando a criança para a recolha de dados.
Língua Portuguesa – Escrita de relatórios sobre o trabalho realizado, sua leitura e explicação por um
dos elementos do grupo.
Escrita de textos sobre os animais preferidos de cada criança.
Os diferentes tipos de frase.
Matemática – situações problemáticas elaboradas e resolvidas por cada grupo.
Consolidação das quatro operações.
Todas estas atividades terão como base os animais.
Expressão e Educação Físico-Motora – Exercícios de lateralidade, equilíbrio e coordenação.
Realização de um jogo: “Coelhinho, Sai da Toca”
Expressão e Educação Visual – Recorte, colagem e pintura de alguns animais.
Desenho livre sobre os animais que existem na comunidade onde está inserida a escola.
Educação Social – Interiorizar o respeito que merecem os animais e os outros seres vivos que existem
na Natureza.
Preservação da Natureza e do patrimônio histórico existente na localidade onde residem.
Respeito pelas diferenças.
Conclusão
A Expressão e Educação Musical e Dramática, assim como as outras áreas de expressão, têm sido
frequentemente tratadas como secundárias na formação da criança ou apenas como momentos de diversão. No
entanto, a prática das atividades expressivas contribui declaradamente para a expressão da personalidade, para a
estruturação do pensamento e para a formação do caráter.
A Expressão e Educação Musical e Dramática desenvolve o domínio das capacidades corporais na
criança e a sua utilização como instrumentos expressivos. Pretende-se alargar a experiência das crianças, de
forma a que possam desenvolver a sua sensibilidade, imaginação e sentido estético.
O prazer e o gosto que as crianças manifestam ao realizar estas atividades levarão, progressivamente, o
professor a proporcionar momentos em que se verbalizem experiências, se combinem e organizem outras
situações de aprendizagem, contribuindo para uma maior interligação das áreas curriculares.
O professor deverá estar atento ao percurso de cada criança, encorajando novas possibilidades e dando
sempre espaço para que as crianças, individualmente ou em grupo, encontrem a sua forma de expressão e,
progressivamente, a consigam utilizar para se comunicar.