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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE FACULDADE DE DIREITO JULIA ASTORGA DE SOUZA A FLEXIBILIZAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE NITERÓI 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE DIREITO

JULIA ASTORGA DE SOUZA

A FLEXIBILIZAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE

NITERÓI

2016

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JULIA ASTORGA DE SOUZA

A FLEXIBILIZAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Graduação em Direito, como requisito parcial para conclusão do curso.

Orientador:

Prof. Lincoln Antônio de Castro

Niterói

2016

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Universidade Federal Fluminense Superintendência de Documentação

Biblioteca da Faculdade de Direito

S729

Souza, Julia Astorga de

A flexibilização do nexo de causalidade / Julia Astorga de Souza. – Niterói, 2016.

62 f.

TCC (Curso de Graduação em Direito ) – Universidade Federal Fluminense, 2016.

1. Direito civil. 2. Responsabilidade civil. 4. Flexibilização. 5. Nexo de causalidade I. Universidade Federal Fluminense. Faculdade de Direito, Instituição responsável II. Título.

CDD 342. 151

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JULIA ASTORGA DE SOUZA

A FLEXIBILIZAÇÃO DO NEXO DE CAUSALIDADE

Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Graduação em Direito, como requisito parcial para conclusão do curso.

Aprovado em ____/____/____.

BANCA EXAMINADORA

PROF. Lincoln Antônio de Castro– ORIENTADOR

Universidade Federal Fluminense

PROF. FERNANDA PONTES PIMENTEL

Universidade Federal Fluminense

LEILA ANGÊLICA DE OLIVEIRA CASTRO

NITERÓI

2016

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Dedico este trabalho a todos que eu amo e que

me inspiram. Obrigada por todo o carinho e

compreensão.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, meus tios, minha vó e minha irmã e ao Arthur por todo

o apoio que me deram para galgar essa jornada chamada graduação, sempre me

inspirando a buscar o melhor de mim e nunca me deixando desanimar pelos obstáculos

que a vida traz. Obrigada por sempre acreditarem em mim, muitas vezes mais do que eu

mesma.

Agradeço aos meus amigos antigos tão amados, que sempre se fizeram

presentes, não importando a distância, as omissões, os meses sem voltar para casa, a

falta de tempo, a fala estressada, as conversas com sabor de saudade e aquele

sentimento de que na verdade, nada mudou. Obrigada por todas as risadas, por todos os

abraços e por todas as palavras de sinceridade, sempre.

Agradeço aos amigos que a faculdade me trouxe, minha família de Niterói, que

estiveram presentes em inúmeros momentos essenciais da minha vida. Com vocês

passei pelas mais diversas experiências, algumas um tanto quanto loucas e

desesperadoras – obrigada UFF -, outras de enorme reflexão e aprendizado. Muito

obrigada por me acolher e me fazer sentir tão em casa como eu me sinto quando estou

com vocês.

Aos meus ilustres mestres, em especial ao meu orientador, por ensinar e

compartilhar suas experiências, vivências e enorme dedicação, me deixando cada dia

mais apaixonada pelo Direito e pela busca da justiça.

Agradeço, por fim, a todas as pessoas que de alguma forma contribuíram para que

esta etapa da minha vida se concretizasse.

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“Ás vezes tudo se ilumina de uma intensa

realidade

E é como se agora este pobre, este único, este

efêmero instante do mundo

Estivesse pintado numa tela, sempre...”

- Mário Quintana

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RESUMO

O presente trabalho almeja, em um primeiro momento, delinear os aspectos gerais acerca

da Responsabilidade Civil, passando por todo o processo de criação e introdução no

direito brasileiro, sistematizando seus fundamentos, pressupostos e excludentes, para,

após essa análise, aprofundar o estudo sobre o nexo de causalidade. O escopo desta

monografia também abarca algumas considerações acerca da importância da

flexibilização do nexo de causalidade, demonstrando seus motivos e as diversas formais

em que é aplicada. Nesse sentido, é abordado a importância do instituto, que tem como

objetivo maior assegurar a vítima o ressarcimento e o amparo pelo dano sofrido.

Realizou-se um estudo bibliográfico de diversos autores que são referência sobre a

responsabilidade civil, o nexo de causalidade e as mudanças destes institutos frente a

necessidade atual de reparação.

Palavras-chave: Responsabilidade Civil. Nexo de Causalidade. Flexibilização. Excludentes de Responsabilidade.

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ABSTRACT

This paper has, as a preliminary goal, to outline the general aspects about the civil liability,

going through the entire process of creation and introduction in Brazilian law,

systematizing its foundations, assumptions and exclusive to, after this analysis,

deepening the study about the causation. The scope of this paper also includes pointing

out some considerations about the importance the flexibility of the causation,

demonstrating their motives and the various forms it is applied. Therefore, it is vital to

acknowledge the importance of the institute whose main purpose is to ensure the victim's

compensation and support for damage. We conducted a bibliographic study of several

authors who are references about the civil liability, the causation and the changes of this

institution forwards the current need of repair.

Keywords: Civil Liability. Causation. Flexibility. Exclusion of Liability.

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SUMÁRIO

Introdução .......................................................................................................... 11

1 – A Responsabilidade Civil .......................................................................................... 13

1.1 - Direito Subjetivo, Dever e Ato Ilícito ............................................................. 13

1.2 - A Evolução da Responsabilidade Civil ......................................................... 18

1.3 - Ato Ilícito ...................................................................................................... 26

1.4 - Elementos ou Pressupostos ........................................................................ 27

1.5 - O Nexo de Causalidade ............................................................................... 29

1.6 - Excludentes de Responsabilidade ............................................................... 35

2 – A Flexibilização do Nexo Causal ............................................................................... 36

2.1 - A importância do nexo de causalidade nas ações de responsabilidade ...... 36

2.2 - A problemática da Flexibilização .................................................................. 37

2.3 - As Excludentes de Responsabilidade e o Fortuito Interno .......................... 39

2.4 - Teoria da Causalidade Alternativa ............................................................... 43

3 – Análise Jurisprudencial ............................................................................................. 48

3.1 - O caso do “escorrega” ................................................................................ 48

3.2 - RESP Nº 291.384 - RJ ................................................................................ 51

3.3 - Objetos lançados da janela de edifícios ..................................................... 54

3.4 - Causalidade Alternativa ............................................................................. 55

Conclusão .......................................................................................................... 59

Referências ........................................................................................................ 61

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Introdução

O presente trabalho possui como objetivo primordial discorrer sobre um tema que

tem despertado o interesse crescente dos aplicadores e acadêmicos do direito, posto que

a responsabilidade civil é uma temática que se faz muito presente no cotidiano moderno.

A opção pelo tema da flexibilização do nexo de causalidade nasceu através de uma

constatação acerca da aplicação prática do instituto.

Considera-se que a flexibilização do nexo causal não é tratada com a devida

atenção pela maioria dos doutrinadores brasileiros, visto que são poucos os autores que

aprofundam o tema e, quando o fazem, dedicam a ele obras específicas como

monografias e artigos. Assim, a flexibilização do nexo de causalidade é, na maioria das

vezes, abordada de uma forma simplista e demasiadamente resumida nos manuais, o

que acaba esvaziando a importância da discussão ao redor do tema.

Observa-se que a doutrina não estabelece critérios objetivos para a aplicação do

instituto, o que acaba resultando nas mais diferentes decisões, quando observada a

aplicação do tema. O presente trabalho espera, humildemente, oferecer uma contribuição

para a organização e sistematização do estudo da responsabilidade civil, e em especial

do nexo de causalidade, concentrando informações e conceitos chaves a respeito de tal

instituto e de sua flexibilização.

Para tanto, no capítulo I é abordada a Responsabilidade Civil de um modo geral,

analisando, primeiramente, sua relação com o direito subjetivo, dever e ato ilícito. Após,

será realizada uma retrospectiva da evolução histórica da responsabilidade civil, tanto na

perspectiva global como seu surgimento especificamente no direito brasileiro, passando

então para a conceituação e definição legal de ato ilícito, instituto de enorme importância

para o tema. Se verificará então, os elementos ou pressupostos tradicionais da

responsabilidade civil, com enfoque central no nexo de causalidade e, por fim, suas

excludentes de responsabilidade.

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Em seguida, no capítulo II, entrará no tema da flexibilização do nexo de

causalidade em si, analisando sua importância nas ações de responsabilidade, expondo

a problemática decorrente de tal fenômeno. Nesse capítulo também vai ser estudado a

teoria da causalidade alternativa, de importância vital para este estudo.

Em seguida, será utilizado uma breve análise jurisprudencial para abordar alguns

exemplos de como o tema é tratado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

Com essa seleção de julgados paradigmáticos, espera-se contribuir para o melhor

entendimento sobre a matéria, demonstrando, de forma prática, a importância desse

fenômeno.

Ao fim, o estudo caminha para conclusões acerca não só dos benefícios, mas

também dos possíveis riscos advindos da aplicação descoordenada desse fenômeno de

flexibilização. E é justamente para contornar essas possíveis problemáticas que esse

trabalho monográfico se propõem a lançar novas luzes sobre antigos dogmas da doutrina

clássica da responsabilidade civil, demonstrando que a análise de seus elementos não

pode ser uma aferição fria e estanque.

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1 – A Responsabilidade Civil

1.1 - Direito Subjetivo, Dever e Ato ilícito

Como se sabe, a tradição jurídica acerca da conceituação de direito

subjetivo é a de relacionar o mesmo com a antiga distinção entre facultas agendi e norma

agendi, institutos do direito romano. Distinção essa que é construída no sentido de o

direito objetivo ser o complexo de normas jurídicas que regem o comportamento humano

e o direito subjetivo, por sua vez, a faculdade que cada um possui de agir conforme as

normas impostas.

Ilustrando esse pensamento, temos as lições de Miguel Reale no seguinte

sentido:

O mérito do antigo ensinamento em termos de facultas agendi e norma agendi, apesar de suas reconhecidas deficiências, consiste em apresentar o direito objetivo e o subjetivo de maneira complementar, um impensável sem o outro. A palavra faculdade não é, porém, sinônimo de direito subjetivo, mas designa as modalidades de seu exercício, como se dá, por exemplo, quando dizemos que o titular do direito subjetivo de propriedade tem faculdade de dispor de seu bem, de alugá-lo, doá-lo, legá-lo, etc. Faculdade, sem sentido estrito, é, pois, uma forma de exercício do direito subjetivo (REALE, 2000, p. 252).

Ainda sobre o direito subjetivo, o professor do Largo de São Francisco

explica a relação existente entre esse instituto e o da pretensão:

Direito subjetivo, no sentido específico e próprio deste termo, só existe quando a situação subjetiva implica a possibilidade de uma pretensão, unida à exigibilidade de uma prestação ou de um ato de outrem. O núcleo do conceito de direito subjetivo é a pretensão (Anspruch), q qual pressupõe que sejam correspectivos aquilo que é pretendido por um sujeito e aquilo que é devido pelo outro (tal como se dá nos contratos) ou que pelo menos entre a

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pretensão do titular do direito subjetivo e o comportamento exigido de outrem haja certa proporcionalidade compatível com a regra de direito aplicável à espécie.

Desse modo, a pretensão é o elemento conectivo entre o modelo normativo e a experiência concreta, mesmo porque a norma, exatamente por ser um modelo destinado à realidade social, não difere desta a não ser por um grau de abstração, na medida em que ela foi instaurada à vista da realidade mesma, como expressão objetiva do que nela deve ser declarado obrigatório (REALE, 2000, p. 262).

Seguindo a exposição, destacamos, ainda, que a antiga máxima do Direito

Romano, neminem laedere, simboliza o dever geral de não prejudicar ninguém, e se

encontra positivada no artigo 186 do Código Civil brasileiro.

Os deveres jurídicos, então, são condutas externas impostas pelo

ordenamento jurídico que visam assegurar o bem-estar da convivência social. Essa é a

razão para que, ao impor tais deveres, o Direito Positivo crie obrigações.

Os deveres jurídicos, como um todo, podem ser classificados tanto em

positivos ou negativos, como em absolutos ou relativos. Os primeiros, os deveres

positivos, são aqueles que determinam obrigações de dar, fazer, ou pagar quantia. A lei,

nesses casos, está determinando uma atuação comissiva. Os deveres negativos, por sua

vez, são aqueles que impõem condutas omissivas, como a obrigação de não fazer.

Ainda, temos os deveres absolutos, aqueles dotados de uma abrangência

subjetiva ampla, com o poder de atingir a todos, e, por fim, os relativos, destinados a

pessoas ou coletividades específicas, determinadas.

Nesse sentido, temos que a violação de qualquer dever jurídico configura

ato ilícito, o qual, por sua natureza, quase sempre tem o condão de gerar dano a outrem,

o que por sua vez criará um novo dever jurídico: o de reparar o dano.

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O Direito tem como um dos seus objetivos basilares o de amparar os atos

lícitos, o que, por via de consequência, o faz disciplinar também os atos ilícitos, dada a

necessidade de reprimi-los. É esse o raciocínio que inspira o dever de reparação dos

danos causados.

Sobre o ato ilícito, claros são os ensinamentos de Caio Mário:

(...) Sempre que alguém falta ao dever que é adstrito, comete um ilícito, e como os deveres, qualquer que seja sua causa imediata, na realidade são sempre impostos pelos preceitos jurídicos, o ato ilícito importa na violação do ordenamento jurídico. Comete-se comissivamente quando orienta sua ação num determinado sentido, que é contraveniente à lei; pratica-o por omissão, quando se abstém de atuar, se devera fazê-lo, e na sua inércia transgride um dever predeterminado. Procede por negligência se deixa de tomar os cuidados necessários a evitar um dano; age por imprudência ao abandonar as cautelas normais que deveria observar; atua por imperícia quando descumpre as regras a serem observadas na disciplina de qualquer arte ou ofício.

Como categoria abstrata, o ato ilícito reúne, na sua etiologia, certos requisitos que podem ser sucintamente definidos: a) uma conduta, que se configura na realização intencional ou meramente previsível de um resultado exterior (Enneccerus); b) a violação do ordenamento jurídico, caracterizada na contraposição do comportamento à determinação de uma norma (Enneccerus); c) a imputabilidade, ou seja, a atribuição do resultado antijurídico à consciência do agente; d) a penetetração da conduta na esfera jurídica alheia, pois, enquanto permanecer inócua, desmerece a atenção do direito (PEREIRA, 2004, p. 654).

Nesse diapasão, temos ainda, segundo as lições de Sérgio Cavalieri Filho,

que a ilicitude reporta-se à conduta do agente, e não ao dano que dela provenha, que é

o seu efeito. Sendo lícita a conduta, em princípio não haverá o que indenizar, ainda que

danosa a outrem (CAVALIERI FILHO, 2012). Ressalvamos, nesse momento, que

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existem, contudo, alguns casos de responsabilidade por atos lícitos, mas estes são

exceções que apenas confirmam a regra, motivo pelo qual não serão objeto do presente

estudo.

Isto posto, podemos afirmar, até o momento, que quando um dever

originário (primário) é violado, surge um direito sucessivo (secundário) com o objetivo de

recompor o dano causado, caracterizando então a responsabilidade civil. Qualquer

conduta, seja comissiva ou omissiva, que cause prejuízo a outrem por violar algum dever

jurídico primário será fonte de responsabilidade civil.

Atente-se que, ao procurar o responsável pela recomposição do dano

causado, é preciso observar a quem a lei imputou a obrigação violada, pois, como

exposto até aqui, não há o que se falar em responsabilidade sem violação de dever

jurídico preexistente.

Via de regra, é indispensável, portanto, para a caracterização da

responsabilidade civil, a ilicitude de um ato, ou seja, a violação de um dever jurídico

preexistente.

O dever de indenizar é uma obrigação, expressa no artigo 927 do Código

Civil: “Aquele que, por ato ilícito (artigos 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado

a repará-lo. Parágrafo único: Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente

de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente

desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de

outrem”.

A natureza jurídica do dever de indenizar, como podemos observar, é de

uma obrigação ex lege, pois decorre da lei, e sucessiva, visto que se origina de uma

violação a um dever originário.

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Destacamos, assim, que a responsabilidade possui íntima relação com a

noção de desvio de conduta, acarretando sempre em um encargo, uma obrigação com o

objetivo de ressarcir o dano causado, o dever de indenizar.

Sobre a indenização, temos que ela é a aplicação da sanção civil por

violação a um dever jurídico, e possui natureza reparatória, ou seja, tem como objetivo a

restituição do status quo ante. De acordo com o jurista Daniel Pizzaro, o princípio que

impera neste campo é o da restitutio in integrum, ou seja, tanto quanto possível, repõe-

se a vítima à situação anterior à lesão. Isso é possível através de uma indenização fixada

em proporção ao dano.

Diz ainda o referido jurista que, indenizar pela metade é responsabilizar a

vítima pelo resto. A relação de proporcionalidade entre indenização e dano, então, é um

aspecto imprescindível da responsabilidade, pois um dos fundamentos desta é a quebra

do equilíbrio econômico-jurídico provocado pelo dano.

Avançando, destacamos que a reponsabilidade civil pode ser contratual ou

extracontratual. Se diz contratual a responsabilidade decorrente de uma relação jurídica

obrigacional, qual seja, um contrato. Nesse caso, o dever de indenizar decorre de um

ilícito contratual (ou relativo), ou mais comumente, inadimplemento. Já a

responsabilidade civil extracontratual, decorre da violação de um preceito geral de Direito,

conhecida também como ilícito aquiliano ou absoluto.

De acordo com a Caio Mário: “Se se trata de dever oriundo de contrato, diz-

se que há culpa contratual. Em caso contrário, chama-se de culpa extracontratual ou

aquiliana, nome este último preso à tradição romana, eis que naquele direito o dever de

reparar o dano por fato culposo não contratual decorria da lei aquília – a lege Aquilia”

(PEREIRA, 2004, p.658).

Finalizando a questão, Mister destacar, a título de informação, que até o

advento do Código de Defesa do Consumidor, era adotada, no Brasil, somente a teoria

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dualista, dita clássica, que pregava justamente essa dicotomia rígida entre a

responsabilidade contratual e a extracontratual, e ao mesmo tempo aplicava alguns

artigos nos dois casos. Com a promulgação do CDC, essa distinção clássica foi superada

no tocante à responsabilidade do fornecedor de produtos e serviços, pois todas as vítimas

de acidente de consumo foram equiparadas a consumidores, por força do artigo 17 do

diploma consumerista.

1.2 - A Evolução da Responsabilidade Civil

Os primeiros indícios do instituto da responsabilidade civil como noção de

compensar alguém por um prejuízo causado, são encontrados na Lei de Talião,

caracterizando-se pela a exata reciprocidade do crime e da pena, ou seja, se pagava o

mal com o mal. Esse tipo de compensação chancelava uma espécie de vingança privada

que não possuía limites estabelecidos, prevalecendo a máxima “olho por olho, dente por

dente”, contida no Código de Hamurábi, datado de aproximadamente 1780 a.C.

Aproximadamente no século XIII a.C., podemos perceber uma guinada nesse

pensamento arcaico. A ideia de vingança particular começou a ser rechaçada, dando

início a um processo de regulamentação da ideia de indenização. Já por volta de 450

a.C., surgiram o Alcorão e o livro de Deuteronômio, que continham alguns contornos mais

desenvolvidos da responsabilidade civil.

Todavia, foi somente no século III a.C., com a Lex Aquilia, quando o ente estatal

passou a intervir nas disputas privadas, que passou-se a imputar valores aos danos

causados, evitando que a vítima a sucumbisse a vingança privada, e ao invés disso,

aceitasse a solução imposta pelo Estado.

A Lex Aquilia, da época de Justiniano, é considerada o marco histórico

fundamental da responsabilidade civil, pois foi a partir de sua edição que os titulares de

bens que sofressem algum tipo de dano passaram a ter o direito de receber um

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pagamento do causador do dano, como forma de penalidade, com o objetivo de recompor

o dano causado. É a certidão de nascimento da responsabilidade extracontratual, pois a

ideia era justamente a de que o autor do dano deveria ser punido, havendo ou não uma

obrigação preexistente.

Tendo em mente a breve explanação histórica narrada até aqui, é possível afirmar

que, a partir da constatação de que o fundamento da responsabilidade era a ruptura no

equilíbrio patrimonial decorrente do dano sofrido, foram os franceses os responsáveis por

aprimorar as teorias romanas acerca da responsabilidade civil, normatizando seus

princípios gerais.

Não obstante o relatado acima, para um conhecimento pleno responsabilidade civil

contemporânea existente no Brasil, é preciso também ter em mente as mudanças da

responsabilidade civil em relação ao Estado.

Sobre essa modalidade de responsabilização, a primeira teoria adota foi a Teoria

da Irresponsabilidade, na qual vigorava o princípio da irresponsabilidade do Estado,

baseando-se na teoria do direito divino dos reis, de Bossuet. Tal teoria era usada para

justificar o poder absoluto dos monarcas, impedindo que alguém tentasse responsabilizá-

los por seus atos.

Para melhor entendimento sobre a teoria do direito divino dos reis, nos valemos

das palavras de Odete Medauar, que nos ensinam que “Várias concepções justificavam

tal isenção, dentre as quais: o monarca ou o Estado não erram; o Estado atua para

atender ao interesse de todos e não pode ser responsabilizado por isso; a soberania do

Estado, poder incontrastável, impede seja reconhecida sua responsabilidade perante o

indivíduo” (MEDAUAR, 2001, p. 429).

Ainda no período Absolutista, contudo, já era admitida a responsabilidade

pecuniária pessoal dos agentes da Administração, pois, consoante Sérgio Cavalieri Filho,

entendia-se que o Estado e seus funcionários seriam sujeitos diferentes, visto que estes

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últimos, mesmo agindo fora dos limites de seus poderes, ou abusando deles, não

obrigariam, com seus atos, a Administração (CAVALIERI FILHO, 2003). Com isso, a

vítima do dano teria a prerrogativa de demandar apenas contra o funcionário estatal, e

nunca contra o próprio Estado. Sob essa perspectiva, era muito comum a vítima não ser

compensada pelo dano sofrido, pois muitas vezes o agente não possuía condições

econômicas suficientes para o ressarcimento, impossibilitando o pagamento da

indenização.

Em um segundo momento, verificou-se a mudança da teoria da irresponsabilidade

para uma concepção civilista da responsabilidade estatal, fundada na culpa do

funcionário e nos princípios da responsabilidade por fato de terceiro (patrão, preponente,

mandante e representante), ainda conforme Cavalieri Filho (CAVALIERI FILHO, 2003).

Mais tarde, com a Revolução Industrial do século XVIII, foram criados e

reconhecidos uma série de direitos dos indivíduos frente ao Estado, abrindo caminho

para uma nova perspectiva de responsabilização.

Outrossim, temos que no final do século XIX surge a figura do Estado empresário,

em que passou a ser reconhecida a separação dos atos de império e dos atos de gestão.

O Estado ainda não poderia ser responsabilizados pelos atos de império, todavia, poderia

ser responsabilizado pelos atos de gestão, pois neles atuaria como um particular. Neste

caso, o Estado seria obrigado a reparar os danos causados no desempenho de suas

funções, desde que presente a culpa do agente que praticou a conduta.

O Código Civil brasileiro de 1916, em seu artigo 15 previa a responsabilização do

Estado nos seguintes termos:

Art. 15: As pessoas jurídicas de Direito Público são civilmente responsáveis por atos dos seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrário ao Direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra os causadores do dano.

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Entretanto, muitas vítimas continuavam não sendo indenizadas, tendo em vista a

dificuldade em se distinguir com precisão os atos de império dos de gestão no caso

concreto e ainda provar a culpa do agente. Esses requisitos para a configuração da

responsabilidade do Estado acabavam por dificultar por demais a reparação do dano à

vítima, não se coadunando com os ideais liberais da época, os ideais do racionalismo

iluminista, que tinham como objetivo a limitação dos poderes do Estado.

Desse modo, foi se consolidando, pouco a pouco, a tese de que o Estado seria

responsável pelos danos causados por seus agentes, salvo nos casos em que provasse

a inexistência de culpa. Surgiu, com base nisso, a teoria da culpa presumida da

Administração, que estabelecia a inversão do ônus da prova, com o objetivo de beneficiar

a vítima.

Hoje em dia, a responsabilidade do Estado por ato de seu agente é melhor

compreendida à luz da Teoria do Órgão, aqui explicada:

(...) o Estado não é representado por seus agentes, mas age através deles e dos órgãos em que atuam. Como pessoa jurídica que é, o Estado não tem vontade nem ação, no sentido de manifestação psicológica e vida anímica própria. Estas, só os seres físicos as possuem. Não podendo agir diretamente, por não ser dotado de individualidade fisiopsíquica, a vontade e a ação do Estado são manifestadas pelos seus agentes, na medida em que se apresentem revestidos desta qualidade e atuem em seus órgãos. Pela teoria do órgão (ou organicista) o Estado é concebido como um organismo vivo, integrado por um conjunto de órgãos que realizam as suas funções. Tal como o ser humano, é dotado de órgãos de comando (políticos) que manifestam a vontade estatal e órgãos de execução (administrativos) que cumprem as ordens dos primeiros. A vontade e as ações desses órgãos, todavia, não são dos agentes humanos que neles atuam, mas sim do próprio Estado (...) (CAVALIERI FILHO, 2003, p. 237).

Com base nesse entendimento, foi desenvolvida a teoria da responsabilidade do

Estado por ato culposo de seu agente. Com isso, surgiu a noção da culpa anônima ou

impessoal. A noção civilista de culpa se mostrou ultrapassada, sendo mais importante a

constatação do dano do que a prova da culpa.

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A jurisprudência francesa, nesse diapasão, criou a noção de “falta de serviço”

(faute du service) ou “culpa do serviço”, que consiste no não funcionamento ou mal

funcionamento do serviço. De acordo com tal noção, bastaria provar a “falta de serviço”

para gerar a responsabilização do Estado pelos danos causados por seus agentes,

independente de culpa.

A falta do serviço implicava o reconhecimento de culpa da Administração. Sobre

isso, José dos Santos Carvalho Filho afirma que:

(...) para que o lesado pudesse exercer seu direito à reparação dos prejuízos, era necessário que comprovasse que o fato danoso se originava do mau funcionamento do serviço e que, em consequência, teria o Estado atuado culposamente. Cabia-lhe, ainda, o ônus de provar o elemento culpa (CARVALHO FILHO, 2004, p. 448).

De acordo com o administrativista Celso Antônio Bandeira de Melo, a correta

tradução da palavra faute é culpa, e não falta, trazendo a ideia de algo objetivo (MELLO,

2004). A tradução feita de forma errônea teria feito com que muitos autores afirmassem

que não havia distinção entre culpa anônima e responsabilidade objetiva.

Com base nos princípios da equidade e da igualdade de ônus e encargos sociais,

foi proclamada a responsabilidade objetiva do Estado, baseada na teoria do risco

administrativo. Tal teoria enuncia que a sociedade deve suportar o prejuízo causado pelo

funcionamento do serviço público, não sendo mais necessário discutir a “falta do serviço”.

Basta a vítima provar o nexo de causalidade entre o ato da Administração, o dano sofrido,

e não ter concorrido com atitude culposa para caracterizar a responsabilidade estatal.

Sobre a base jurídica da responsabilidade objetiva, ensina Bandeira de Mello:

(...) o fundamento da responsabilidade estatal é garantir uma equânime repartição dos ônus provenientes de atos ou efeitos lesivos, evitando que alguns suportem prejuízos ocorridos por ocasião ou por causa de atividades desempenhadas no interesse de todos. De consequente, seu fundamento é o princípio da igualdade, noção básica do Estado de Direito (MELLO, 2004, p. 890).

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Os preceitos que respaldam a concepção da responsabilidade objetiva do Estado,

segundo Odete Medauar, são os próprios sentidos de justiça e equidade – o neminem

laedere e o alterum non laedere -, e também o preceito da igualdade de todos ante os

ônus e encargos da Administração (solidariedade social), em que todos devem

compartilhar do ressarcimento dos danos das atividades do Estado (MEDAUAR, 2001).

Portanto, o surgimento da responsabilidade civil do Estado se deu ante a

necessidade da vítima obter reparação do dano sofrido sem a necessidade de provar a

culpa do agente, pois a culpa se mostrou insuficiente, visto que sua prova nem sempre é

possível por parte da vítima. O dever de indenizar do Estado está pautado na relação de

causalidade entre o dano sofrido e a atividade administrativa.

A teoria do risco administrativo de León Duguit, fundamento da responsabilidade

objetiva do Estado, foi a teoria adotada no nosso sistema, na lição de Marcelo Caetano,

pois:

(...) os riscos acarretados pelas coisas ou atividades perigosas devem ser corridos por quem aproveite os benefícios da existência dessas coisas ou do desenrolar de tais atividades (...). A Administração deve responder pelos riscos resultantes de atividades perigosas ou da existência de coisas perigosas, quando não tenha havido força maior estranha ao funcionamento dos serviços (...) na origem dos danos e não consiga provar que estes foram causados por culpa de quem os sofreu (CAETANO, 1977, p. 544).

Para existir o dever de indenizar do Estado, conforme a teoria majoritária, qual

seja, a do risco administrativo, devem estar presentes: (i) um dano correspondente a

lesão a um direito da vítima; (ii) o responsável pelo dano causado deve ser funcionário

da Administração; e (iii) nexo de causalidade entre o ato do agente e o dano sofrido.

Imperioso apontar, entretanto, que o Estado não possuirá o dever de indenizar se

estiverem presentes uma ou mais hipóteses de excludentes de responsabilidade, quais

sejam: fato exclusivo da vítima; caos fortuito; força maior; e fato exclusivo de terceiro.

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Ainda sobre essa temática, lembramos que existe outra teoria acerca da

responsabilidade objetiva do Estado, que é a Teoria do Risco Integral. Esta consiste em

uma modalidade extremada do risco administrativo, em que o Estado deve indenizar em

qualquer hipótese de dano sofrido por particular, não se aceitando a oposição de

excludentes de responsabilidade.

Entendemos, com base nas lições do mestre Hely Lopes Meirelles, que a adoção

da Teoria do Risco Integral atenta contra a equidade, pelas seguintes razões:

(...) por essa fórmula radical, a Administração ficaria obrigada a indenizar qualquer dano suportado por terceiros, ainda que resultante de culpa ou dolo da vítima. Daí por que foi acoimada de “brutal”, pelas graves conseqüências que haveria de produzir se aplicada na sua inteireza.

Conseqüentemente, ter-se-ia um aumento injustificado das despesas do Estado, erigido a segurador universal, o que poderia mesmo comprometer a qualidade dos serviços prestados à população (MEIRELLES, 2004, p. 627).

Sobre a realidade brasileira, especificamente, podemos afirmar que não existiu a

fase da irresponsabilidade na evolução histórica da responsabilidade civil. A constituição

do Império, de 1824, já consagrava a responsabilização dos empregados públicos pelos

abusos e omissões praticados no exercício de sua função e a responsabilidade solidária

do Estado desde que a culpa fosse provada, e, em 1891, disposição com idêntico teor foi

promulgada na Constituição Republicana.

O artigo 15 do Código Civil de 1916, foi o primeiro dispositivo legal a tratar do

regime jurídico da responsabilidade civil do Estado, deixando uma margem de dúvida

entre os doutrinadores sobre se o artigo consagrava a teoria da culpa – responsabilidade

subjetiva – ou a responsabilidade objetiva da Administração.

A Constituição Federal de 1946, explicitamente, por sua vez, consagrou a

responsabilidade objetiva do Estado, com base no risco administrativo, dispondo em seu

artigo 194 que, in verbis: “As pessoas jurídicas de Direito Público interno são civilmente

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responsáveis pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a

terceiros. Parágrafo único: Caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários

causadores do dano, quando tiver havido culpa destes”.

Neste artigo, observa-se que a culpa como elemento essencial para

caracterização da responsabilidade civil só se vê presente no parágrafo único, ao se

referir ao direito de regresso do Estado contra o agente público.

As Constituições posteriores, de 1967, de 1969 e a vigente de 1988, conservaram

a responsabilidade objetiva do Estado pelo risco administrativo. O artigo 37, § 6º, da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 enuncia que “As pessoas

jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos

responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros,

assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

A Constituição de 1988 também disciplina as hipóteses nas quais a teoria do risco

integral deverá ser aplicada, como é o caso de responsabilização por danos nucleares

(artigo 21, XXXII, d, da Constituição Federal). A utilização dessa teoria, contudo,

configura exceção à regra, só podendo ser aplicada nos casos expressamente previstos

em lei.

Já no tocante à responsabilidade civil entre particulares, correto dizer que até o

advento do Código de Defesa do Consumidor, a regra geral em todos os tipos de relação

jurídica (elencada nos artigos 159 e 1545 do Código Civil de 1916) era a da

responsabilidade subjetiva (com culpa), podendo ser dividida entre responsabilidade

contratual e extracontratual.

Com a entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor, em 1990, em

termos de responsabilidade civil, pereceu a diferenciação entre a responsabilidade

contratual e a extracontratual nas relações de consumo, passando a regra geral a ser a

responsabilidade objetiva para o fornecedor de produtos/serviços dada a sua posição de

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superioridade face ao consumidor. Não obstante, a responsabilidade subjetiva ainda

pode ser encontrada, em algumas exceções disciplinadas no diploma consumerista,

como no caso dos profissionais liberais (artigo 14, § 4º, do CDC).

Salientamos, porém, que quando não existir relação de consumo entre os

envolvidos, a regra a ser aplicada será a da responsabilidade subjetiva, devendo os

particulares, em um relação horizontal, demonstrar a culpa daquele que causou dano a

outrem como regra geral.

1.3 - Ato ilícito

O artigo 186 do Código Civil disciplina a responsabilidade decorrente do ato ilícito

nos seguintes termos: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou

imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral,

comete ato ilícito”.

Sobre o tema, Caio Mário ensina que para o direito civil, o ilícito é um atentado

contra o interesse privado de outrem, e a reparação do dano sofrido é a forma indireta de

restauração do equilíbrio rompido (PEREIRA, 2004).

Ainda conforme os ensinamentos do jurista mineiro, o grande fundamento da

responsabilidade civil é, e sempre foi, encontrado na culpa. Entretanto, percebeu-se a

necessidade de se avançar nesse pensamento para que o objetivo maior da

responsabilidade civil, qual seja, a reparação o dano causado, fosse alcançado:

O fundamento maior da responsabilidade civil está na culpa. É fato comprovado que se mostrou esta insuficiente para cobrir toda a gama dos danos ressarcíveis; mas é fato igualmente comprovado que, na sua grande maioria, os atos lesivos são causados pela conduta antijurídica do agente, por negligência ou por imprudência. Aceitando, embora, que a responsabilidade civil se construiu

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tradicionalmente sobre o conceito de culpa, o jurista moderno convenceu-se de que esta não satisfaz. Deixando à vítima o ônus da prova de que o ofensor procedeu antijuridicamente, a deficiência de meios, a desigualdade de fortuna, a própria organização social acabam por deixar larga cópia de danos descobertos e sem indenização. A evolução da responsabilidade civil gravita em torno da necessidade de socorrer a vítima, o que tem levado a doutrina e a jurisprudência a marchar adiante dos códigos, cujos princípios constritores entravam o desenvolvimento e a aplicação da boa justiça. Foi preciso recorrer a outros meios técnicos, e aceitar, vencendo para isto resistências quotidianas, que em muitos casos o dano é reparável sem o fundamento da culpa (PEREIRA, 2004, p. 518).

d) Elementos ou Pressupostos

Os elementos, ou pressupostos, da Responsabilidade Civil são: (i) a conduta do

agente causador do dano - um comportamento antijurídico, que é o descumprimento de

um dever geral de conduta; (ii) o dano, que podem ser patrimoniais - danos emergentes

ou lucros cessantes - e extrapatrimoniais - como os danos morais e estéticos; (iii) o nexo

causal, representando a relação de causa e efeito entre o comportamento antijurídico do

agente e o dano sofrido pela vítima; e (iv) a culpa, quando se tratar de hipótese de

responsabilidade subjetiva.

A conduta é o elemento primário de qualquer ato ilícito, e por via de consequência,

da responsabilidade civil. No entendimento de Maria Helena Diniz a conduta pode ser

entendida como:

A ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou licito, voluntario e objetivamente imputável do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado (DINIZ, 2005, p. 43).

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A conduta do agente, para fins de caracterização da responsabilidade, deve ser

revestida de voluntariedade – a consciência da ação – e, via de regra, ser contrária ao

ordenamento jurídico.

A existência de um dano é também elemento essencial para a configuração da

responsabilidade civil, não havendo o que se falar em indenização ou ressarcimento sem

a ocorrência de dano. Consoante ensinamento de Sergio Cavalieri:

O ato ilícito nunca será aquilo que os penalistas chamam de crime de mera conduta; será sempre um delito material, com resultado de dano. Sem dano pode haver responsabilidade penal, mas não há responsabilidade civil. Indenização sem dano importaria enriquecimento ilícito; enriquecimento sem causa para quem a recebesse e pena para quem a pagasse, porquanto o objetivo da indenização, sabemos todos, é reparar o prejuízo sofrido pela vítima, reintegrá-la ao estado em que se encontrava antes da prática do ato ilícito. E, se a vítima não sofreu nenhum prejuízo, a toda evidência, não haverá o que ressarcir. Daí a afirmação, comum a praticamente todos os autores, de que o dano é não somente o fato constitutivo mas, também, determinante do dever de indenizar (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 77).

O nexo de causalidade, por sua vez, diz respeito a relação de causa e efeito entre

a conduta praticada pelo agente e o resultado danoso. É imperioso que o dano sofrido

pela vítima tenha sido causado pela conduta antijurídica do agente, existindo assim uma

indispensável vinculação entre os acontecimentos.

Por fim, temos ainda o elemento culpa, que só será considerado como pressuposto

necessário nas hipóteses de responsabilidade subjetiva. O artigo 186 do Código Civil

dispõe que o ilícito só se caracteriza pelo comportamento culposo. O referido dispositivo,

portanto, trata da culpa latu sensu, abrangendo tanto o dolo como a culpa em sentido

estrito.

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Conquanto no dolo a conduta praticada seja intencional, na culpa stricto sensu a

conduta do agente é voluntária, apesar do resultado não o ser. A culpa em sentido estrito

se dá com a inobservância do dever de cuidado, através de imprudência, negligência ou

imperícia.

Contudo, alertamos que tal distinção, entre dolo e culpa sem sentido estrito, não

possui grande relevância na seara da responsabilidade civil, via de regra, visto que o

objetivo desta é indenizar a vítima, e não punir o agente causador do dano.

1.5 - O Nexo de Causalidade

Se mostra necessário, para o estudo em questão, uma análise mais profunda

sobre o nexo de causalidade. Como já foi dito anteriormente, o nexo de causalidade é a

relação de causa e efeito entre a conduta praticada pelo agente e o dano sofrido pela

vítima. É através do nexo causal que podemos determinar o sujeito causador de

determinado dano.

O nexo de causalidade, enquanto elemento fundamental para configuração da

responsabilidade civil, é exigido em qualquer modalidade de responsabilidade. A

discussão central na responsabilidade civil objetiva, por exemplo, costuma girar em torno

do o nexo causal, já que se faz necessário, para afastar a responsabilidade, provar que

sem a conduta praticada pelo agente, o dano não teria sido produzido.

As hipóteses mais usuais, e mais simples de serem verificadas, se dão quando o

dano decorre de um fato simples, casos em que a relação de causalidade será

estabelecida de maneira direta. Contudo, é perfeitamente possível a ocorrência de casos

de causalidade múltipla, quando várias circunstâncias concorrem para um mesmo evento

danoso, sendo necessário identificar, através dos nexos de causalidade, qual dentre elas

foi a causadora do dano.

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Sobre esse elemento essencial à responsabilidade civil, existem muitas teorias

com o objetivo de explicar o nexo de causalidade, dentre as quais as principais são: da

equivalência dos antecedentes causais; dos danos diretos e imediatos; e a da

causalidade adequada.

A primeira delas, ora analisada, é a teoria da equivalência das condições, ou teoria

da equivalência dos antecedentes causais, pela qual: “Todas as condições de um mesmo

dano se equivalem, consistindo todos os antecedentes que concorreram de alguma

maneira para a sua realização em causas do prejuízo” (PEREIRA, 1999.p. 78). Tal teoria

não faz diferenciação entre as múltiplas condições que contribuíram para a realização do

resultado, considerando que todas elas possuem o mesmo valor. Tal teoria, foi definida

nos seguintes termos por Sergio Cavalieri Filho:

Como o próprio nome já diz, essa teoria não faz distinção entre causa (aquilo de que uma coisa depende quanto à existência) e condição (o que permite à causa produzir seus efeitos positivos ou negativos). Se várias condições concorrem para o mesmo resultado, todas têm o mesmo valor, a mesma relevância, todas se equivalem. Não se indaga se uma delas foi mais ou menos eficaz, mais ou menos adequada. Causa é a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido, sem distinção da maior ou menor relevância que cada uma teve. Por isso, essa teoria é também chamada da conditio sine qua non, ou da equivalência das condições (CAVALIERI FILHO, 2012, p.50-51).

Para determinar se uma condição é ou não causa do dano, utiliza-se um processo

hipotético que consiste em eliminar mentalmente tal condição; desaparecendo o

resultado, é possível afirmar a condição lhe foi a causa. A referida teoria é muito aplicada

no âmbito do direito penal em diversos países, inclusive no Brasil, com alguma mitigação.

As críticas à essa teoria são no sentido de que sua aplicação levaria a uma infinita

regressão do nexo de causalidade, sendo possível, por exemplo, apontar como

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responsáveis por um atropelamento não só o agente que dirigia o veículo, mas também

quem lhe vendeu o automóvel e quem fabricou o veículo.

Em sintonia com as inúmeras críticas ao caráter subjetivo das teorias existentes,

surgiu a teoria do dano (ou causalidade) direta ou imediata – também conhecida como

teoria da interrupção do nexo causal - que, pela definição de Anderson Schreiber,

“considera como causa jurídica apenas o evento que se vincula diretamente ao dano,

sem a interferência de outra condição sucessiva” (SCHREIBER, 2015. p. 60).

Essa teoria tem como base um conceito mais objetivo, tendo como intuito a limitação

da responsabilização apenas para os eventos mais próximos ao dano, combatendo,

desta forma, a responsabilização ilimitada.

A teoria da causalidade imediata foi positivada no ordenamento jurídico brasileiro pelo

Código Civil de 1916, e mais tarde, ratificada no Código Civil de 2002, em eu artigo 403.

Com o decorrer do tempo, a teoria do dano direto e imediato acabou se mostrando

um tanto quanto restritiva, pois sua aplicação em inúmeros casos concretos, nos quais a

causa indireta do prejuízo era totalmente associada a causa direta, acabou se mostrando

prejudicial à reparação do dano.

A razão dessa controvérsia é que, pela definição original da teoria da interrupção do

nexo causal, não seria cabível a responsabilização por dano indireto, o que acabava

criando, com sua aplicação prática, situações de enormes injustiças.

Nesse diapasão, foi desenvolvida a subteoria da necessariedade causal que, segundo

definição de Anderson Schreiber:

Desenvolveu-se, deste modo, no âmbito da própria teoria da causalidade direta e imediata, a chamada subteoria da necessariedade causa, que entende as expressões dano direto e dano imediato de forma substancial, como reveladoras de um liame de necessariedade – e não de simples proximidade –

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entre a causa e o efeito. Haverá sim o dever de reparar, quando o evento danoso for efeito necessário de determinada causa (SCHREIBER, 2015, p. 62).

Podemos observar que, conquanto a subteoria da necessariedade tenha sido

criada com o objetivo de corrigir as inúmeras injustiças que eram causadas nos casos

concretos, ela acabou trazendo uma atmosfera de incerteza ao Judiciário. A definição de

qual causa, dentre as diversas possíveis, seria a necessária para concretização de

determinado dano, é baseada em critérios subjetivos, o que pode ser confirmado pelas

posições cada vez mais divergentes adotadas no âmbito dos tribunais.

Alguns juristas entendem que o ordenamento jurídico brasileiro adotou a teoria dos

danos diretos e imediatos – entre eles destacamos Carlos Roberto Gonçalves, Pablo

Stolze Gagliano, Gustavo Tepedino, Gisela Sampaio da Cruz e Rodolfo Pamplona Filho

-, por interpretação do artigo 403 do Código Civil, in verbis: “Ainda que a inexecução

resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros

cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual”.

Apesar do artigo citado fazer uso do termo “inexecução”, que é próprio da

responsabilidade contratual, existe entendimento consolidado no sentido de que o

dispositivo também seria aplicável à responsabilidade extracontratual. O Supremo

Tribunal Federal também aplica essa teoria, como bem aponta Gustavo Tepedino,

observadas as decisões prolatadas após a Constituição de 1988 (TEPEDINO, 2006).

Em oposição à teoria da equivalência dos antecedentes, foi criada a teoria da

causalidade adequada, que determina tal adequação em função da possibilidade e

probabilidade de um resultado acontecer. Nesse diapasão, quanto maior for a

probabilidade de uma causa gerar um dano, mais adequada será em relação a esse

dano.

A teoria da causalidade adequada faz distinção entre causa e condição e entre os

antecedentes que tiveram maior ou menor relevância para configuração do dano. A

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causa, nessa teoria, será apenas aquela que foi determinante, sendo as demais

desconsideradas. Sergio Cavalieri Filho, sobre a teoria da causalidade adequada,

ensina que:

Essa teoria, elaborada por Von Kries, é a que mais se destaca entre aquelas que individualizam ou qualificam as condições. Causa, para ela, é o antecedente não só necessário mas, também, adequado à produção do resultado. Logo, se várias condições concorreram para determinado resultado, nem todas serão causas, mas somente aquela que for a mais adequada à produção do evento (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 51).

Com isso em mente, podemos afirmar que a teoria da causalidade adequada

apresenta a lógica do razoável, pois não há nenhuma regra teórica para estabelecer,

entre várias condições, qual é a mais adequada. Em uma tentativa de sistematizar a sua

aplicação podemos considerar como causa adequada, de acordo com Sérgio Cavalieri

Filho, aquela que, de acordo com o curso normal das coisas e a experiência comum da

vida, se revelar a mais idônea para gerar o evento (CAVALIERI FILHO, 2012).

Gisela Sampaio Cruz, sobre a teoria da causalidade adequada, afirma que:

Não basta, então, que um fato seja condição de um evento; é preciso que se trate de uma condição tal que, normal ou regularmente, provoque o mesmo resultado. Este é o chamado “juízo de probabilidade”, realizado em abstrato – e não em concreto, considerando os fatos como efetivamente ocorreram -, cujo objetivo é responder se a ação ou omissão do sujeito era, por si só, capaz de provocar normalmente o dano (CRUZ, 2005, p. 65).

Respeitável parte da doutrina também entende que a teoria da causalidade

adequada é a que prevalece na órbita civil, dentre os quais se destacam Sergio Cavalieri

Filho, Caio Mário, Flávio Tartuce e Aguiar Dias. Para eles, só concorre para o resultado

a condição mais adequada a produzi-lo concretamente; nesse caso, haveria o nexo

causal.

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Os artigos 944 – “A indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único:

Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz

reduzir, equitativamente, a indenização” - e 945 do Código Civil: “Se a vítima tiver

concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se

em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano” embasariam a

teoria da causalidade adequada, juntamente com o Enunciado n. 47 do CJF/STJ, da I

Jornada de Direito Civil, que dispõe que “o art. 945 do novo Código Civil, que não

encontra correspondente no Código Civil de 1916, não exclui a aplicação da teoria da

causalidade adequada”.

Ainda sobre o tema, discorre Sergio Cavalieri Filho:

Em conclusão, por causa direta, imediata, necessária ou adequada deve-se entender como sendo aquela que revela um liame de necessariedade entre a causa e o efeito e não de simples proximidade temporal ou espacial. Próxima ou remota, imediata ou mediata, a causa será adequada quando o evento danoso for efeito necessário de determinado acontecimento. O exame do nexo causal limita-se a verificar se a atividade desenvolvida pelo agente vincula-se de algum modo – próximo, direto, necessário, adequado ou eficiente – ao dano (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 55).

As críticas feitas à teoria da causalidade adequada são no sentido de conferir ao

julgador ampla liberdade no exame da adequação da causa, e ainda, confundir

causalidade com culpa – pois a ausência de culpa nem sempre exclui o dever de

indenizar.

Ainda sobre a teoria da causalidade adequada, destacamos:

Decerto, se, por um lado, a Teoria da Equivalência dos Antecedentes Causais não dá margem para que o juiz aprecie bem os fatos; por outro, a Teoria da Causalidade Adequada depende muito do arbítrio do julgador para ser aplicada em concreto. Mas o fato é que quase todas as teorias dependem, por assim

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dizer, de um certo arbítrio do magistrado. Seja como for, apesar das críticas, a Teoria da Causalidade Adequada tem prevalecido em vários ordenamentos e é, também, uma das teorias mais invocadas no Brasil, onde doutrina e jurisprudência se dividem entre esta e a Teoria do Dano Direto e Imediato, exposta no final deste capítulo (CRUZ, 2005, p. 83-85).

A responsabilidade objetiva traz a necessidade de uma maior atenção no exame

do nexo de causalidade, pois sua interrupção é o único meio possível de excluir o dever

de indenizar; a questão central nas ações de responsabilidade civil passou a ser o nexo

causal.

1.6 - Excludentes de Responsabilidade

Os excludentes de responsabilidade são responsáveis por afastar a configuração

da responsabilidade civil no caso concreto, se caracterizando por romperem o nexo

causal, atacando um dos elementos basilares da responsabilidade. As possíveis

hipóteses de excludentes são: (i) o caso fortuito; (ii) a força maior; (iii) o fato exclusivo

da vítima ou o fato exclusivo de terceiro.

A não responsabilização por motivo de caso fortuito ou força maior está

consagrada no artigo 393 do Código Civil, in verbis: “O devedor não responde pelos

prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver

por eles responsabilizado”.

O parágrafo único do referido dispositivo, na sequência, ao versar sobre o caso

fortuito e a força maior praticamente os define como sinônimos: “O caso fortuito ou de

força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não eram possíveis evitar ou

impedir”. A maior parte da doutrina, no entanto, entende pela diferenciação dos

institutos, sendo o caso fortuito caracterizado quando estivermos diante de um evento

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imprevisível e inevitável, enquanto a força maior diria respeito ao evento previsível, mas

inevitável – como é o caso dos fatos da natureza.

Há casos, outrossim, que a responsabilidade não se configura pelo fato de a

própria vítima ter dado causa ao dano sofrido. Essa é a hipótese de culpa exclusiva da

vítima, que possui o condão de extinguir ou interromper o nexo de causalidade entre o

dano e seu aparente causador.

O último caso de excludente de responsabilidade apontado diz respeito ao fato

exclusivo de terceiro, no qual um terceiro – pessoa qualquer, além da vítima e o

responsável – é quem dá causa ao dano. A sua ocorrência também tem o poder de

afastar o nexo de causalidade entre o aparente causador do dano e a vítima.

2 - A Flexibilização do Nexo Causal

2.1 - A importância do nexo de causalidade nas ações de responsabilidade

Diante daquilo que já foi exposto até o presente momento, nos valemos das lições

do civilista fluminense Anderson Schreiber, que ao tratar da relação entre o nexo causal

e o dever de reparação, dispõe:

O dever de reparar um dano depende da existência de nexo causal entre certa conduta e o resultado danoso. O nexo causal, ou relação de causalidade, vem usualmente definido como o vínculo que se estabelece entre dois eventos, de modo que um represente consequência de outro (SCHREIBER, 2015, p. 55).

Destarte, o nexo de causalidade, como afirma Caio Mário, consiste no mais

delicado dos elementos da responsabilidade civil e o mais difícil de ser determinado

(PEREIRA, 1999).

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Sobre o tema, mister destacar a diferenciação entre dois tipos de nexo de

causalidade: o natural e o jurídico. O primeiro se diferencia do segundo na medida em

que nem tudo que, no mundo dos fatos, é considerado a causa de um evento, o será

considerado, juridicamente, como causa. A definição jurídica de causa é mais restritiva,

pois se assim não o fosse, existira um exagero da responsabilização civil.

Podemos afirmar, outrossim, que com a vinda da responsabilidade objetiva, o nexo

causal acabou ganhando enorme importância, e um papel central, nas ações de

responsabilidade. O foco das discussões foi deslocado da prova ou não de culpa para a

noção de nexo de causalidade e a sua existência no caso concreto.

2.2 - A Problemática da Flexibilização

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário número

130.764-1 do Paraná, decidiu pela aplicação da teoria da causalidade direta e imediata,

ao declarar inexistente o nexo de causalidade entre a fuga de um preso e um assalto

realizado meses depois após o fato.

Contudo, a posição adotada pelo STF no referido julgado, não se mostrou

suficiente para impedir que os tribunais locais se utilizem das outras teorias aqui

mencionadas, como é o exemplo do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, que nos

Embargos infringentes 51321.200-1, julgado no dia 15.08.2001, afirmou que a teoria

adotada no Brasil é a da equivalência das condições, e não a da causalidade direta e

imediata.

Infelizmente, é possível notar, em diversas decisões, uma confusão terminológica

com os nomes das teorias. Tal constatação serve para mostrar a falta de uniformização

das decisões em sede de responsabilidade civil. Entende-se que as diferentes

abordagens sobre o nexo de causalidade se dão pela motivação das decisões, para

buscar sempre a melhor solução para o caso concreto, tornando o nexo causal flexível.

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Acontece que nenhuma das teorias existentes, inclusive a da causalidade direta e

imediata, é totalmente satisfatória em todos os casos concretos. Justamente por isso, a

indefinição dos tribunais brasileiros quanto a qual teoria deve ser adotada é algo que, na

prática, tem se mostrado positivo.

Independentemente da teoria utilizada como fundamento da decisão, a

responsabilização e o ressarcimento da vítima deverão ser sempre os objetivos

principais, a permitir a flexibilização do nexo causal.

O rigor que existia em relação a prova da culpa quando só se falava em

responsabilidade subjetiva, não é tão presente em relação ao nexo de causalidade. O

tribunal italiano também adota essa postura - de não se adotar uma única teoria sobre o

nexo de causalidade em suas decisões -, para aplicar a que melhor resolve o caso

concreto, com o objetivo de não realizar injustiças e ressarcir as vítimas pelos danos

sofridos.

É possível observar que, em muitas das vezes, os tribunais inclusive

responsabilizam o agente causador do dano, mesmo comprovada a ausência de nexo de

causalidade, como bem lembra Anderson Schreiber:

Mais que isso, verifica-se, muitas vezes, que, mesmo na absoluta ausência de nexo causal sob a ótica de qualquer das teorias doutrinariamente reconhecidas, as cortes acabam condenando o responsável de modo a não deixar a vítima sem reparação. Interferem aí fatores os mais variados, de cunho político, moral e ideológico do que técnico, e que tornam verdadeiramente imprevisível o resultado de certas demandas. Analisando tal fenômeno, na jurisprudência francesa, Camille Potier se referiu a presunções clandestinas de causalidade, justamente para ressaltar esta atuação criativa dos tribunais à margem de qualquer previsão legislativa que a sustente (SCHREIBER, 2015, p. 66-67).

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Segundo a melhor doutrina, é possível até mesmo se falar em responsabilidade

objetiva agravada, na qual o nexo de causalidade é dispensado, se exigindo somente

que o dano ocorrido possa ser considerado risco próprio da atividade em causa. E, que

em alguns casos, podemos ter o uso de expedientes mais drásticos, como a

desconsideração de uma excludente de causalidade ou a aplicação de teorias que

possuem como objetivo expandir a margem de discricionariedade do juiz sobre a

responsabilidade civil (SCHREIBER, 2015).

2.3 - As Excludentes de Responsabilidade e o Fortuito Interno

O nexo de causalidade pode ser interrompido pelas excludentes de

responsabilidade, que possuem o condão de romper o vínculo de causalidade inicial entre

a atividade do agente e o dano causado. As categorias fundamentais de excludentes são,

como já mencionado anteriormente: (i) o caso fortuito ou força maior; (ii) o fato exclusivo

da vítima; e (iii) o fato de terceiro.

Anderson Schreiber aponta para uma gradual relativização dessas excludentes ao

redor do mundo, como pode ser observado com a criação da teoria do fortuito interno, no

âmbito das relações de consumo, que tem como objetivo evitar a exclusão da

responsabilidade do fornecedor por acontecimentos que, embora imprevisíveis e

irresistíveis, se verificam anteriormente à colocação do produto no mercado

(SCHREIBER, 2015).

Sobre a conceituação de fortuito interno e externo, valiosas são as lições de Sérgio

Cavalieri Filho:

Entende-se por fortuito interno o fato imprevisível e, por isso, inevitável ocorrido no momento da fabricação do produto. Não exclui a responsabilidade do fornecedor, porque faz parte da sua atividade, liga-se aos riscos do empreendimento, submetendo-se à noção geral de

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defeito de concepção do produto ou de formulação do serviço. Vale dizer, se o defeito ocorreu antes da introdução do produto no mercado de consumo não importa saber o motivo que determinou o defeito; o fornecedor é sempre responsável pelas suas consequências, ainda que decorrente de fato imprevisível e inevitável.

O mesmo já não ocorre com o fortuito externo, assim entendido aquele fato que não guarda relação de causalidade com a atividade do fornecedor, absolutamente estranho ao produto ou serviço, via de regra ocorrido em momento posterior ao de sua fabricação ou formulação. Em caso tal nem se pode falar em defeito do produto, o que, a rigor, já estaria abrangido pela primeira excludente examinada – inexistência de defeito (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 198-199).

O fortuito interno, ora analisado, possui ligação direta com o risco da atividade

desenvolvida, e sua alegação tem sido considerada insuficiente para interromper o nexo

causal. Se observa, portanto, que tem se exigido nesses casos, para a caracterização da

responsabilidade no caso concreto, um terceiro pressuposto, além das tradicionais

imprevisibilidade e irresistibilidade, qual seja, a externalidade do caso fortuito.

A jurisprudência brasileira tem entendido que o fortuito interno não interrompe o

nexo de causalidade e, também tem aplicado, em diversos casos, essa noção de fortuito

interno em casos em que tal conceito não se aplica de forma clara, como na condenação

de instituição financeira a ressarcir o cliente por assalto com roubo de bens materiais

mantidos em cofre alugado (TJRJ, Apelação Cível, 2005.001.03378, Des. Carlos

Eduardo Passos, j. 20.04.2005).

Analisando as decisões dos tribunais brasileiros - como a Apelação Cível 2004.

001.31220, do TJRJ, de relatoria do Desembargador Fernando Cabral (julgamento em

1.3.2005), que entendeu haver o fortuito interno na relação entre a empresa de

financiamento que promove abertura de crédito em nome de outrem com utilização de

documentação falsa e, a inscrição do suposto devedor no Serviço de Proteção ao Crédito

-, Anderson Schreiber conclui que:

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Decisões como esta demonstram, à parte outras tantas conclusões merecedoras de análise, que a invocação do fortuito interno não se baseia tanto em uma qualificação cientificamente rígida, porque tormentosa, de um acontecimento como externo ou interno à certa atividade. Nem mesmo a previsibilidade ou ressistibilidade têm desempenhado nesta análise um papel tão decisivo. O juízo acerca da incidência ou não da figura do fortuito interno parece, antes vinculado à lógica do risco e de sua imputação a certo sujeito que desenvolve uma atividade potencialmente lesiva. Daí ser o fortuito interno noção recorrente em relações regidas pela responsabilidade objetiva, mas elemento tecnicamente estranha à seara da responsabilidade subjetiva, onde a simples imprevisibilidade é considerada suficiente para desconfigurar o ilícito (SCHREIBER, 2015, p. 70).

Ainda nessa linha de raciocínio, afirmamos que o fortuito interno não é a única

excludente de responsabilidade que vem sendo relativizada em vistas de assegurar uma

aplicação mais justa da responsabilização, assegurando a vítima o direito de reparação

pelo dano sofrido.

O fato exclusivo da vítima e o fato de terceiro, por muitas vezes, têm sido aplicados

de forma restritiva, mantendo-se assim o nexo de causalidade entre a conduta do agente

responsável e o dano causado. Contudo, nesse tocante é importante distinguir que o fato

exclusivo da vítima não se confunde com a culpa concorrente, situação em que tanto a

vítima quanto o agente concorreram para a realização do dano, sendo a

responsabilização dividida entre os dois.

Destacamos que, em alguns casos, mesmo o comportamento da vítima não sendo

munido de diligência, é possível que esse fato seja incluído no risco do responsável direto

pelo dano, ou imputável a ele. Para ilustrar melhor, vale lembrar do polêmico precedente

decidido pelo Superior Tribunal de Justiça em 2001 (Recurso Especial 287.849 SP, j.

17.4.2001, Rel. Min. Rui Rosado de Aguiar Jr.). O conhecido caso do escorrega, envolvia

um jovem, que viajou com uma turma de amigos para um hotel fazenda em Serra Negra

(São Paulo) e, durante a madrugada, foi até a piscina, subiu no escorrega que ali existia

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e, pulou de cabeça, vindo a descobrir que a piscina não era suficientemente funda,

chocando a cabeça contra o solo, o que resultou em extensos danos à sua saúde.

O senso comum consideraria tal comportamento como fato exclusivo da vítima,

rompendo assim o nexo de causalidade, não configurando então, responsabilidade por

parte do hotel fazenda. Entretanto, o Tribunal de Justiça de São Paulo entendeu de forma

totalmente contrária, decidindo que a responsabilidade pelos danos pertencia

integralmente ao Hotel Fazenda e a agência de turismo que intermediou a compra da

viagem. Em grau de recurso, o Superior Tribunal de Justiça manteve a decisão, apenas

reduzindo parcialmente a responsabilidade tanto do hotel fazenda, como da agência de

turismo, por entender pela existência de concorrência de culpa entre tais agentes e a

vítima.

Para embasar tais decisões, foi considerado que o fato praticado pela vítima

estava dentro de uma margem de previsibilidade e prevenção, o que exclui a

responsabilidade integral da vítima pelo dano gerado. No caso em tela, o fato exclusivo

da vítima foi relativizado com o objetivo de assegurar alguma reparação, levando em

conta a situação fática do país, que muito provavelmente não iria garantir um mínimo

indispensável para o tratamento médico da vítima.

Anderson Schreiber, ainda sobre a flexibilização do nexo de causalidade, discorre

também sobre a teoria da responsabilidade pelo resultado mais grave (thin skull rule ou

egg-shell skull rule), consistente na dispensa da prova da relação causal “no tocante a

um resultado ulterior da conduta do agente, assegurando ao nexo de causalidade uma

elasticidade que nenhuma das teorias usuais comportaria” (SCHREIBER, 2015, p. 72).

De acordo com tal teoria, o agente que pratica a conduta que causou o dano, deve

ser também responsável pelo dano mais grave que vier a ocorrer, ainda que este

resultado mais grave seja resultado de condições particulares da vítima, como condições

de saúde, predisposições patológicas, entre outros. Um exemplo claro de sua aplicação

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é nos casos em que a vítima é hemofílica, e uma lesão leve acaba resultando em sua

morte.

Nenhuma das teorias da causalidade se mostra aplicável para considerar a

responsabilização pelo dano mais grave, decorrente de condição particular da vítima. Em

muitos casos, a fragilidade da vítima já excluiria por si só o nexo de causalidade, e quando

não o fizesse, o resultado mais grave seria derivado dessa condição particular, e não da

conduta do agente.

No direito estrangeiro, tanto em países de common law como nos de civil law, a

adoção do thin skull rule é muito criticada, pois a previsibilidade possui um enorme peso

para a avaliação da responsabilidade, se entendendo que a adoção de tal teoria se

mostraria incongruente; em alguns casos, a previsibilidade do dano seria justamente

requisito para sua reparação (SCHREIBER, 2015).

Portanto, sobre a aplicação da teoria da responsabilidade pelo resultado mais

grave, parte da doutrina defende que:

A teoria da responsabilidade pelo resultado mais grave aparece, neste cenário, como mais um recurso empregado, embora com menor frequência, para a extensão do remédio ressarcitório a domínio que a exigência de demonstração do nexo de causalidade mantinha imunes tanto à responsabilidade subjetiva quanto à reponsabilidade objetiva (SCHREIBER, 2015, p. 74).

2.4 - Teoria da Causalidade Alternativa

Outra forma de se flexibilizar a demonstração do nexo de causalidade é pelo uso

da teoria da causalidade alternativa, que surgiu da controvérsia sobre a abordagem da

causalidade em situações em que não existia possibilidade de identificar com precisão,

dentro de um grupo, quem seria o responsável pelo dano.

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Importante, nesse ponto, distinguir a teoria ora analisada da causalidade

concorrente. Enquanto na primeira, nem todos os participantes do ato contribuíram para

o advento do resultado danoso, na segunda, é possível perceber uma situação onde

houve concorrência entre os participantes para o resultado.

Quando não é possível identificar individualmente o agente causador do dano,

mas sim um grupo de possíveis responsáveis do qual aquele faça parte, nasce a

controvérsia de se é justo não responsabilizar ninguém, deixando a vítima desamparada,

ou responsabilizar o grupo, ressarcindo a vítima. Tal situação é cada vez mais comum,

devido aos novos fenômenos sociais, como espetáculos públicos desportivos, musicais,

manifestações, acidentes de caça, entre outros.

De acordo com o rigor teórico, quando não for possível identificar o agente

causador do dano, a solução seria pela ausência de responsabilização. Entretanto, a

jurisprudência brasileira é rica em decisões contrárias à ideia de irresponsabilidade:

Embora a mesma orientação seja seguida pela doutrina brasileira, os tribunais pátrios, como os de toda parte, comovem-se com a injustiça de tais situações, uma vez que a vítima resta deixada ao desamparo, mesmo sendo certo que o dano lhe foi provocado por, ao menos um dos integrantes do grupo. A jurisprudência passa, assim, a buscar remédios para esta situação paradoxal, valendo-se de recursos mais ou menos intensos à equidade e à justiça.

É neste contexto que vem invocada a teoria da causalidade alternativa, a fim de impor a responsabilidade solidária sobre todo o grupo envolvido na geração do dano, embora, a rigor, apenas um de seus integrantes o tenha provocado. A expressão causalidade alternativa encera, portanto, certa imprecisão linguística: a causalidade é única, embora imprecisável, sendo alternativa, a rigor, a imputação de reponsabilidade aos agentes, justamente pelo fato de não se lograr determinar qual deles, individualmente, produziu o dano (SCHREIBER, 2015, p. 75).

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Sobre esse assunto, disserta Gisela Sampaio da Cruz:

O cerne da questão consiste em saber qual deve ser a resposta do ordenamento jurídico diante da impossibilidade de se provar a autoria singular. A doutrina divide-se: de um lado, estão os autores que defendem a exoneração dos membros do grupo, pois entendem que é preferível a vítima ficar sem indenização do que se condenar quem, ainda que vinculado circunstancialmente ao evento danoso, não tenha causado o prejuízo; de outro, os que, ao contrário, sustentam que todos os membros do grupo devem ser solidariamente responsáveis, sob o fundamento de que não se pode tratar a vítima com mais rigor do que aquele que criou o risco (CRUZ, 2005, p. 269-270).

Gisela Sampaio Cruz continua sustentando que a primeira corrente é totalmente

contra a condenação solidária, por entender que a responsabilidade deve ser sempre

individual e que condenar a todos solidariamente seria o equivalente a transformar

incerteza em verdade, suspeita em culpabilidade. Os defensores de tal corrente

asseveram que à vítima cabe a demonstração do nexo de causalidade e, se não o fizer,

não há dever de indenizar.

Por outro lado, os partidários da segunda corrente possuem como alicerce

justificativo a questão do dano injustamente sofrido pela vítima e o princípio da

solidariedade. Afirmam também, que a condenação solidária nunca será totalmente

descabida, pois se sabe que o causador do dano é um dos integrantes do grupo (CRUZ,

2005).

A teoria da causalidade alternativa é adotada pelo direito alemão para suprir a

lacuna existente nos casos de autoria anônima de um dano, e está positivada no Código

Civil alemão (BGB - 1896), em seu § 830, norma geral que contempla o dano causado

por membro indeterminado na chamada responsabilidade anônima ou coletiva. O direito

alemão expressamente ampara a vítima nos casos em que não é possível individualizar

o agente causador do dano.

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Atualmente, no direito alemão, para que surja a responsabilidade coletiva, é

preciso apenas que a relação entre os membros do grupo identificado não seja ocasional,

ou seja, que exista algum tipo de relacionamento entre eles. Preenchido esse requisito,

já seria possível a aplicação da responsabilização solidária.

Gisela Sampaio Cruz, comenta sobre um caso emblemático ocorrido na

Alemanha, examinado em 1985 por Theo Bodewig, em um artigo sobre o problema da

causalidade alternativa. O alemão analisou a questão dos danos causados por

medicamentos prejudiciais à saúde, como medicamentos prescritos às mulheres grávidas

para prevenir aborto ou má-formação do feto, que ocasionaram graves sequelas na

geração seguinte. Os filhos prejudicados conseguiam provar apenas que suas mães

tomaram o determinado medicamento, mas não tinham como provar de qual laboratório

o remédio ingerido pertencia. Aplicando o § 830, todos os laboratórios que produziam o

determinado medicamento foram responsabilizados. O critério utilizado para distribuir o

prejuízo entre os fabricantes foi o do “grau de possibilidade da causalidade (suposta)”,

ou seja, corresponde mais ou menos, à sua participação no mercado (CRUZ, 2005).

O ordenamento jurídico pátrio, por sua vez, não possui norma geral que regule o

dano causado por membro indeterminado de um grupo. Entretanto, o artigo 938 do

Código Civil brasileiro traz a aplicação da teoria da causalidade alternativa para uma

situação específica, ao disciplinar que “Aquele que habitar prédio, ou parte dele,

responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar

indevido”.

O referido dispositivo, em conjunto com os alicerces teóricos da teoria da

causalidade alternativa, é utilizado para responsabilizar todos os integrantes de uma casa

ou moradores de um prédio por objetos que deles caíram, ou foram lançados, causando

dano a alguém. Antes da aplicação dessa teoria era praticamente impossível a reparação

do dano, pois a vítima tinha que provar de qual unidade autônoma exata caíra o objeto,

ou qual fora o morador da casa que lançou o objeto.

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Entende-se também que a aplicação de tal teoria no ordenamento brasileiro seria

possível através interpretação extensiva de certas normas, como o artigo 942 do Código

Civil, que disciplina que:

Art. 942: Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação. Parágrafo único: São solidariamente responsáveis com os autores os coautores e as pessoas designadas no art. 932.

Sobre a flexibilização do nexo de causalidade, Anderson Schreiber conclui que:

Como se vê, a relativização do nexo causal abrange situações das mais diversas e as justificativas empregadas em tal procedimento mostram-se plurais, variando de acordo com o cenário que se tem em vista. Idêntico é apenas o seu efeito, a erosão do nexo causal como filtro da reparação (SCHREIBER, 2015, p. 78).

Atenta aos desdobramentos da causalidade alternativa, a professora Gisela

Sampaio ressalta que o fato da vítima ter de comprovar que o agente indeterminado

causador do dano pertence realmente a determinado grupo, se trata de uma prova

mínima, necessária para que não ocorra responsabilização ilimitada.

Destarte, a causalidade alternativa só pode ser aplicada quando presentes certas

circunstâncias no caso concreto, quais sejam: (i) o anonimato do dano; (ii) a certeza do

grupo à qual pertence o causador do dano; (iii) o grupo ser caracterizado, e não ocasional;

(iv) ser, no mínimo, um grupo de fato; (v) ser um dano causado por um agente

individualmente, e não pelo grupo como tal; (vi) o grupo não possuir um “chefe”; (vii) as

atividades desenvolvidas pelo grupo serem de risco ou perigosas; e (viii) o verdadeiro

autor do dano permanecer oculto, escondido na atividade grupal (CRUZ, 2005).

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Não podemos olvidar que a responsabilização alcançou, graças a essa ideia de

flexibilização do nexo causal, agentes perpetradores de abusos que, sem tal erosão,

nunca seriam alcançados, e suas injustiças e efeitos negativos continuariam a ocorrer. A

aplicação da causalidade alternativa traz inúmeras vantagens, como não deixar sem

reparação o dano sofrido pela vítima, a diminuição da onerosidade da indenização, dada

a repartição do prejuízo e, o combate a manobras do grupo que vissem impossibilitar a

identificação do autor.

3 – Análise Jurisprudencial

3.1 - O caso do “escorrega”

Um julgado que merece destaque é o famoso caso do escorrega, no qual um

jovem, juntamente com seus amigos, comprou um pacote de viagem, através de uma

agência de turismo, para um hotel em Serra Negra – SP. Chegando ao hotel, por volta

das 22h, esse mesmo jovem fora até a piscina, que não possuía uma iluminação

adequada, e saltou do escorrega. Não ciente da pouca profundidade da água, acabou

chocando sua a cabeça contra o fundo da piscina, o que ocasionou inúmeros danos à

sua saúde.

Em sede de Recurso Especial a demanda foi apreciada pelo Superior Tribunal de

Justiça (RESP 287.849), julgado em 17 de abril de 2001, da relatoria do Ministro Ruy

Rosado de Aguiar. A ementa, na íntegra, aduzia:

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Responsabilidade do fornecedor. Culpa concorrente da vítima. Hotel. Piscina. Agência de viagens. - Responsabilidade do hotel, que não sinaliza convenientemente a profundidade da piscina, de acesso livre aos hóspedes. Art. 14 do CDC. - A culpa concorrente da vítima permite a redução da condenação imposta ao fornecedor. Art. 12, § 2º, III, do CDC. - A agência de viagens responde

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pelo dano pessoal que decorreu do mau serviço do hotel contratado por ela para a hospedagem durante o pacote de turismo. Recursos conhecidos e providos em parte.

Mister, para o pleno entendimento da tese, destacar alguns trechos do voto do

relator (grifo nosso):

Estabeleceu-se, assim, entre as partes, relação de consumo, sendo o autor o consumidor, na forma do art. 2o do CDC e as rés as prestadoras de serviços, na forma do citado código (Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990), que já se encontrava em vigência, quando o autor, nas dependências internas do hotel, veio a sofrer acidente que o impossibilita, segundo laudo do Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo - IMESC - 'de exercer qualquer atividade laborativa e é necessário o auxílio de outras pessoas permanentemente. 'Segundo o perito, faz jus à indenização de 125%, sendo 100% pela invalidez permanente e 25% pelo auxílio que necessita (fl. 239 - 2° volume). Segundo o mesmo laudo (fl. 237) sua locomoção só é possível em cadeira de rodas. Tornou-se tetraplégico aos 21 anos de idade. Ora, entre os direitos básicos do consumidor, estão a proteção à vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços perigosos ou nocivos (art. 6°, I, do CDC) e constitui verdade sabida, tendo em vista a existência de crianças e hóspedes que não sabem nadar, que piscina deve ser considerada como prestação de serviços perigosos, tanto assim que - está retratado nos autos (fls. 163 e 164 - 1o volume) - ela é cercada por mureta e a outra, de água quente, fica no interior de salão, que, na hora do acidente, estava trancado. Prestando depoimento (fl. 371 - 2° volume), o hoteleiro, com todas as letras, disse que a piscina onde o acidente ocorreu, à noite, não é fechada e que a iluminação existente no local é meramente decorativa e tal precariedade de iluminação, pelo óbvio, impede eventual usuário, hóspede do hotel, de ter noção de sua profundidade, notadamente em se considerando a colocação de um escorregador, que, como se sabe, com muita freqüência, é utilizado de forma que o banhista escorregue com a cabeça para baixo e os pés para cima. Isso é verdade

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sabida. A iluminação precária do local também foi noticiada por testemunhas (fl. 459-3° volume). Estamos, então, diante do seguinte quadro. O hotel estava ciente que, pela atuação da co-ré, dois ônibus de excursão chegariam, transportando jovens e, por tal motivo, desprovida a piscina - tida como equipamento perigoso - de rede de proteção, como aquela que aparece no folheto de fl. 26, competia ao hotel exercer maior vigilância, notadamente em se considerando que, momentos antes do acidente, quatro jovens, com a utilização de barcos do hotel, estavam no meio do lago (fl. 430 - 3º volume). Isso foi presenciado pelo sócio do hotel, que tomou ciência, inclusive, que 'um dos rapazes havia caído no lago' (idem). E se não soubesse nadar? Mesmo assim, em demonstração inequívoca de total irresponsabilidade, havendo um sem número de jovens hospedados, não cuidou aquele senhor de redobrar a vigilância, pois a piscina, onde o infausto acontecimento ocorreu, apesar da existência de muro, apresenta livre acesso, conforme pode ser visto da prova oral (fls, 432 verso e 458), sendo que essa informação foi dada por um dos funcionários do hotel, que, dessa forma, conhece bem o local. Ora, nos termos do art. 14 do CDC, o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos e, pelo que vi da prova, exceção feita à menção ao horário de funcionamento das piscinas e outros serviços, não havia qualquer outro aviso alertando para a pouca profundidade da piscina, onde, como se viu, a iluminação era meramente decorativa. O mesmo diploma exime a culpa do prestador de serviços, quando ficar demonstrada a culpa exclusiva do consumidor (art. 14, § 3°, inciso lI) e, pelo que é dado ver da prova, não se pode cuidar de culpa exclusiva do autor. Aliás, mesmo que fosse o caso, nem de culpa concorrente poder-se-ia cogitar, diante da ausência total de comunicação sobre a profundidade da piscina, que tinha seu acesso livre e apresentava iluminação precária.

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Observamos no caso em tela, que o dever de segurança se sobrepôs a todos os

demais acontecimentos, inclusive o próprio fato exclusivo da vítima – de pular de um

escorregador sem observar corretamente a profundidade da piscina, e ainda, de não se

utilizar o escorrega corretamente, e sim para outro fim.

Portanto, claramente flexibilizou-se a presença do excludente de responsabilidade

do fato exclusivo da vítima visando, ao fim, proteger a vítima e assegurar o pagamento

de todos os cuidados e tratamentos necessários à sua saúde, tendo em vista que o autor

do processo acabou ficando tetraplégico devido ao ocorrido e dificilmente conseguiria

bancar todas as despesas advindas do seu tratamento caso não ficasse configurada a

responsabilidade civil dos réus.

3.2 - RESP Nº 291.384 - RJ

Outro julgado que merece destaque é o RESP Nº 291.384 do Rio de Janeiro,

julgado em 15 de maio de 2001, também de relatoria do Ministro Ruy Rosado de Aguiar.

O caso em concreto dizia respeito a uma viagem organizada por uma operadora de

viagens, em que um incêndio causado por terceiros consumiu toda a embarcação,

obrigando os passageiros a se lançarem no mar, sem nenhum tipo de segurança,

inclusive salva-vidas – pois a embarcação não possuía itens de segurança.

Destacamos, para fins didáticos, alguns trechos do julgado:

A responsabilidade do fornecedor de serviços independe da apuração de sua culpa, a teor do art. 14 da Lei 8.078. Trata-se, como se vê neste caso, de responsabilidade objetiva. Basta a prestação de serviço com defeito, para que surja o dever de reparar o dano causado ao consumidor. Não se aplicam à espécie as regras do fretamento marítimo contidas no Código Comercial, com relação ao cliente da Soletur, sendo também inoperantes as cláusulas contratuais que a isentam de quaisquer

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responsabilidades decorrentes da escolha de terceiros, uma vez que a agência se obriga a prestar com eficiência e segurança, que o consumidor dela espera, o serviço contratado, nos exatos termos do art. 14 do CDC, de sorte que são ineficazes quaisquer cláusulas contratuais que isentem o prestador de serviço concernente ao fornecimento do serviço contratado. Valores bem fixados. Apelos rejeitados" (fl. 259). Rejeitados os embargos de declaração opostos pelos autores. Irresignada, a SOLETUR apresentou recurso especial, com base na alínea a do permissivo constitucional, alegando afronta aos arts. 7º, parágrafo único, 14, § 3º, e 25 da Lei nº 8.078?90 (CDC), bem como a disposições do Código Brasileiro de Aeronáutica arts. 222, 246, 256 e seguintes; da Lei nº 7.535?86; da Lei nº 6.505?77; aos arts. 37, § 6º, da CF e 566 e 632 do Código Comercial. Alega que a regra do art. 14, caput, do CDC não é absoluta, prevendo o § 3º do citado diploma legal que o fornecedor de serviços não será responsabilizado quando provar culpa de terceiro, e que tal dispositivo deve ser aplicado em consonância com aqueles outros apontados como violados. Nega sua responsabilidade, inclusive solidária, eis que não concorreu para a causação do dano, não podendo responder solidariamente. Defende a aplicação da teoria da incolumidade ao transporte marítimo, geralmente sob a forma de fretamento, obedecendo às disposições do Código Comercial, não se diferenciando do transporte aéreo, terrestre e ferroviário. Sustenta, por fim, ser excessiva a quantia arbitrada pertinente aos danos morais, fixada em 400 s.m. para cada autor.

(...)

Voltando ao caso dos autos, acredito que a definição da responsabilidade jurídica da CVC TUR decorre de sua situação como agente de viagem contratante de um pacote turístico, com terceiros prestadores de serviço, mas sendo ela a organizadora da viagem e garantidora do bom êxito da sua programação, inclusive no que diz com a incolumidade física dos seus contratantes. Na espécie, foi isso reconhecido no r. acórdão, daí a conseqüência da sua responsabilização. No nosso sistema, tal responsabilidade é solidária entre ela, a organizadora do pacote, e o hotel, prestador do

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serviço de hospedagem. Reconhecida a participação do hotel na causação do resultado, em concorrência com o hóspede, nesse mesmo limite se fixa a responsabilidade da operadora. Haverá dificuldade em estender a responsabilidade da operadora por danos decorrentes da prestação dos serviços contratados de terceiros, quando o fato acontece no âmbito do risco que razoavelmente se espera do serviço. Quando houver falta de segurança do serviço do prestatário, fora da possibilidade de previsão por parte da operadoral de turismo, que se limita a confiar no que normalmente acontece, - nessa situação, à falta de norma expressa que lhe atribua diretamente a responsabilidade total, - esta somente poderia ser reconhecida se a operadora colocou os seus clientes sob risco acima do normalmente esperado (art. 14, § 1°, II, do CDC). A restrição se explica não apenas em razão da necessidade de se dar aplicação ao disposto nesta regra, mas também porque o nosso sistema legal é de reparação integral do dano, diferentemente do previsto nas legislações dos países da União Européia, que permitem, nesses casos, a limitação tarifada da indenização. O sistema que amplia a hipótese de responsabilidade da operadora está conformado com a possibilidade de limitação indenizatória; quando a reparação é integral, razoável que se restrinja a responsabilização apenas aos casos em que "a operadora coloca o cliente sob risco acima do normalmente esperado", cabendo-lhe a prova dessa exoneração.

No caso em questão, foi flexibilizado o fato de terceiro, por prevalência do dever

de segurança e pelo fato da empresa não ter cumprido sua obrigação de observância

aos padrões de segurança, como a disponibilização de coletes salva-vidas. A

embarcação não possuía uma estrutura preparada para esse tipo de acidente e

tampouco uma sinalização adequada para emergências.

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3.3 - Objetos lançados da janela de edifícios

No caso de objetos lançados da janela de um determinado condomínio, quando

não for possível precisar de qual unidade específica ele foi lançado, aplica-se o artigo

938 do atual Código Civil, que disciplina que: “Aquele que habitar prédio, ou parte dele,

responde pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar

indevido”.

Um julgado paradigmático versando sobre essa hipótese é o Recurso Especial

64.682 do Rio de Janeiro, julgado em 10.11.1998, da relatoria do Ministro Bueno de

Souza, cuja ementa é a seguinte:

RESPONSABILIDADE CIVIL. OBJETOS LANÇADOS DA JANELA DE EDIFÍCIOS.A REPARAÇÃO DOS DANOS É RESPONSABILIDADE DO CONDOMÍNIO. A impossibilidade de identificação do exato ponto de onde parte a conduta lesiva, impõe ao condomínio arcar com a responsabilidade reparatória por danos causados à terceiros. Inteligência do art. 1.529, do Código Civil Brasileiro. Recurso não conhecido.1

Quando algum objeto é lançado a partir de residências, escritórios, edifícios, entre

outros, acertando algum transeunte, se mostra muito difícil provar de onde exatamente o

objeto foi lançado, tornando inviável a identificação do autor do dano e, em consequência,

praticamente impossível a condenação à reparação dos danos.

1 STJ - REsp: 64682 RJ 1995/0020731-1, Relator: Ministro BUENO DE SOUZA,

Data de Julgamento: 10/11/1998, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJ

29/03/1999 p. 180

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Destaca-se no voto proferido pelo Ministro Ruy Rosado de Aguiar:

O caso dos autos versa sobre a interessante hipótese em que se sabe que o dano foi causado por um dos ocupantes dos apartamentos que abriam janelas para a rua por onde transitava a vítima, mas não se pôde identificar o seu autor. Nesse caso, ensina o em. Professor e Des. Vasco Della Giustina, autor da primeira monografia sobre o tema no Brasil, “com a admissão da causalidade alternativa, todos os autores possíveis, isto é, os que se encontravam no grupo serão considerados, de forma solidária, responsáveis pelo evento, face à ofensa perpetrada à vítima, por um ou mais deles, ignorado o verdadeiro autor ou autores.” (Responsabilidade Civil dos Grupos, Aide, p. 77).

Essa solução evidencia uma significativa alteração no modo de examinar o tema da responsabilidade civil, deixando de lado o ato ilícito para olhar a existência do dano injusto. “Preocupa-se, fundamentalmente, com a situação da vítima cujo patrimônio ou pessoa sofreu um dano e não há razão que justifique que deva suportar o dano com exclusividade”, como acentuou Julio Alberto Diaz, em trabalho recente (‘Responsabilidade Coletiva’, Del Rey, 1998, p. 82).

A presença do artigo 938 do Código Civil inseriu na legislação e na doutrina

brasileira a teoria da causalidade alternativa, a ser aplicada nos casos em que é possível

identificar um grupo de possíveis responsáveis por um dano, mas não exatamente o seu

responsável individualmente considerado.

3.4 - Causalidade Alternativa

Para finalizar a sucinta análise jurisprudencial da aplicação da flexibilização do

nexo de causalidade, destaca-se o acórdão do Superior Tribunal de Justiça no Resp-

26.975, julgado em 19 de dezembro de 2001, com relatoria do Ministro Aldir Passarinho

Junior, que condenou um grupo de torcida organizada que matou, com pedaços de

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madeira de um moirão, com violência injustificada, um torcedor do time rival. Destacam-

se alguns trechos importantíssimos do referido acórdão:

Diversidade de critérios de apuração da responsabilidade penal e da civil, no atinente à causalidade. 'CAUSALIDADE ALTERNATIVA'. Forma suposta de causalidade, inadmissível para efeitos penais mas suficiente para a fixação da responsabilidade civil. Falta de prova suficiente de haver qualquer dos demandados, individualmente, golpeado a vítima de modo a concorrer efetivamente para causar-lhe a morte, fundamento da absolvição criminal, sem força, entretanto, para afastar a responsabilização civil, a cuja configuração basta a prova de integrarem os réus o grupo participante da briga durante a qual tais golpes foram desferidos. Lições doutrinárias e precedentes pretorianos. PROVA. Demonstração testemunhal suficiente desse pressuposto de participação, ainda que insuficiente para deslindar a exata forma e extensão da cota com que cada qual dos réus concorreu para o resultado lesivo.

(...)

Na jurisdição civil, ao contrário, está se desenvolvendo, cada vez mais, a admissibilidade da chamada causalidade suposta, uma de cujas variantes é a causalidade alternativa, em que nós temos precisamente a ação de um grupo que atua conjuntamente e de uma forma tal que qualquer dos integrantes desse grupo poderia ter causado o dano. E mais, em circunstâncias tais que se o grupo não tivesse atuado como atuou o dano não se haveria produzido. Esse interessantíssimo tema da causalidade alternativa foi objeto de uma tese de mestrado do hoje nosso eminente Colega do Tribunal de Alçada, Dr. Vasco Delia Giustina, intitulado precisamente esse trabalho A Causalidade Alternativa e o Dano'; o autor desse estudo analisa a evolução do tema na doutrina européia, especialmente no Direito Alemão e no Direito Francês, para demonstrar que, modernamente, a tendência é cada vez mais no sentido de admitir-se essa causalidade alternativa. E lembra, inclusive, o ilustre autor da tese, depois publicada com o título 'Responsabilidade Civil dos Grupos' (Rio de Janeiro,

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Aide Editora, 1991), reportando-se principalmente aos trabalhos de Géneviève Viney, na França, e de Clóvis do Couto e Silva, no Brasil, ter essa orientação ampla acolhida nos tribunais, tanto lá como aqui.

(...)

Adoto esse excelente trabalho de análise como razões do meu convencimento de que cada um dos réus, efetivamente, participou da conduta perigosa da qual resultou o ato lesivo o que, segundo a idéia da responsabilidade grupal ou da causalidade alternativa, é o suficiente para a configuração da responsabilidade civil individual de cada um deles. Recapitulando, portanto, encontro motivos para confirmar a sentença. Primeiro, na interpretação restritiva que faço do art. 1.525 do CC e mais, na parcial derrogação desse dispositivo que extraio do seu confronto com as disposições do Código de Processo Penal pertinentes ao mesmo tema; segundo, da idéia de causalidade alternativa como fundamento suficiente da responsabilidade civil e, finalmente, no que diz respeito à matéria de fato, da comprovação que a sentença demonstrou cabalmente de haverem todos os demandados participado do grupo agressor da vítima durante o conflito em que se produziram nesta as lesões que a levaram á morte.

Como podemos observar, não obstante a absolvição na esfera penal, a

causalidade alternativa, no caso em tela, foi aplicada na esfera civil. Isso se dá por não

ser tal instituto aplicável para fins de responsabilização penal, onde se precisa de certeza

de autoria para fins de condenação. Contudo, pode se observar claramente nesse julgado

a importância da causalidade alternativa, para que a vítima, ou sua família, não fiquem

desamparados e suportem o dano sofrido sozinhos.

No caso em análise, foi possível determinar o grupo responsável pela agressão,

seus componentes, mas não quem, individualmente, foi o responsável pela morte. Nesse

caso, a prova se via ainda mais difícil, visto que não é possível ter certeza qual dos

inúmeros golpes sofridos foi aquele que causou a morte do indivíduo.

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Essa flexibilização e abrandamento na prova do nexo de causalidade mostra o

intuito da doutrina e, principalmente, da jurisprudência, em assegurar à vítima alguma

reparação pelo dano sofrido. O referido movimento reflete a ampliação do acesso à

justiça, a crescente conscientização do cidadão frente aos seus direitos e a força do

princípio da solidariedade social.

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Conclusão

Ao longo dessa monografia, objetivou-se ressaltar a importância do fenômeno da

flexibilização do nexo de causalidade, principalmente na aplicação prática, tendo em vista

tornar as decisões judiciais mais justas e satisfatórias.

Mostrou-se necessária tal flexibilização devido à dificuldade de comprovação, por

parte da vítima, de certos pressupostos clássicos da responsabilidade civil, como o

próprio nexo de causalidade, dentro das ações reparatórias.

Em muitos casos, torna-se praticamente impossível para a vítima determinar quem

exatamente praticou o ato que levou à ocorrência do dano sofrido. Surge então a

necessidade de flexibilização de certos pressupostos, a fim de viabilizar e assegurar a

reparação, alcançando o fim maior da teoria da responsabilidade civil.

Para tanto, foi feita uma análise história da Responsabilidade Civil, o seu

surgimento no Direito brasileiro, as alterações sofridas com o decorrer do tempo, seus

pressupostos, suas excludentes e, por fim, do surgimento do instituto da flexibilização,

em principal do nexo de causalidade.

Evidenciou-se que, o surgimento da flexibilização do nexo de causalidade possui

enorme importância doutrinária e, principalmente, jurisprudencial, visto que sua aplicação

prática surge para preencher uma lacuna existente no instituto da reparação civil.

Nesse bojo, é possível afirmar, outrossim, que o fenômeno da flexibilização do

nexo causal se coaduna com o Neopositivismo, pois este último traduz a reaproximação

do Direito com determinados valores morais, como a justiça, ainda que se tenha que

estabelecer determinados critérios minimamente objetivos quanto a abrangência desses

valores.

Por derradeiro, é importante frisar, que a maneira pela qual vem sendo perseguida

essa reparação social possui, outrossim, pontos negativos que merecem ser

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mencionados: (i) a ampla margem de discricionariedade dos julgadores, resultando em

um possível cenário de insegurança jurídica; (ii) o fundamento na desgraça da vítima, e

não em uma possibilidade jurídica de imputação – a chamada vitimização social ou blame

culture –, que, muitas vezes, imputa a responsabilidade de tragédias pessoais a outros

indivíduos; e (iii) a erosão das bases da responsabilidade civil, o que pode levar à uma

exagerada expansão do dano ressarcível.

Isto posto, se faz necessário o aprofundamento do estudo dessa tendência no

âmbito da responsabilidade civil, sem, contudo, esquecer dos possíveis riscos que sua

aplicação possa vir a causar. A pedra de toque de todo intérprete e doutrinador, quando

deparado com situações nas quais a vítima de um ato seja obrigada a suportar sozinha

os danos sofridos, deverá ser sempre a ideia de Justiça na busca pela responsabilização.

Se formos capazes de sistematizar o amplo leque de possibilidades que esse

fenômeno de flexibilização nos disponibiliza, será possível não só contornar problemas

de insegurança jurídica como os apontados anteriormente, como produzir decisões

judicias mais humanas e mais justas.

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SCHREIBER, Anderson, Novos paradigmas da responsabilidade civil: da erosão dos

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