À flor da pele - FINAL · fatores que contribuem ativamente para travar o crescimento da maior...

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À Flor da Pele

PUCCI ROMANO

À Flor da Pele

Tradução de:José J. C. Serra

Pergaminho

NOVINHA EM FOLHA

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Nascidos de camisa

Em Itália, para definir uma pessoa bafejada pela sorte é cos-tume dizer -se que «nasceu de camisa». A origem desta expressão é curiosa e, para a descobrirmos, temos de ir até à Idade Média, quando as parteiras ajudavam as mães a parirem. De facto, acon-tecia muito raramente – e continua a acontecer nos dias de hoje – que o recém -nascido viesse ao mundo envolvido numa espécie de película gorda branca, o vernix caseosa (daí a ideia de «camisa»), que se forma no último período da gravidez para proteger o embrião e evitar que se enrugue no contacto com o líquido amniótico. Geralmente, esta película rompe -se durante o parto, mas por vezes fica intacta até ao trabalho de parto e ajuda o bebé a deslizar mais facilmente para fora do corpo materno. Do recém--nascido que tiver muito vérnix diz -se que é mais afortunado e, segundo crenças antigas, o mais protegido pelos deuses.

Esta simpática expressão italiana esclarece de imediato a importância do órgão «pele» ainda antes do nascimento! A aten-ção que a pele dos bebés merece, porém, é especial por muitos outros motivos.

Como todos os órgãos, também a pele cresce, muda e se reorganiza ao longo do tempo.

Nos mais pequenos, a pele é fina, com 1/5 da espessura da pele dos adultos, não desempenhando ainda ao melhor nível todas as suas funções: não consegue defender -se bem das agressões externas (incluindo os agentes atmosféricos), não tem um sistema

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imunitário definido e as suas glândulas sebáceas ainda não tra-balham em pleno ritmo, tornando a pele decididamente seca. Vejamos, de seguida, ao pormenor as principais diferenças entre a pele de um bebé e a de um adulto analisando cada um dos parâmetros cutâneos.

O sebo, a água e o suor

O sebo, produzido pelas glândulas sebáceas, que se desenvol-vem no sexto mês de vida intrauterina, é responsável inicialmente pela formação do vernix caseosa que protege o recém -nascido. Depois do nascimento, por estimulação das hormonas maternas, as glândulas sebáceas mantêm -se sobremaneira ativas até aos três meses de vida da criança, durante os quais a quantidade de gor-duras cutâneas superficiais produzida é quase igual à do adulto. Depois, porém, esta produção reduz -se notavelmente, para voltar a apresentar -se durante a adolescência, quando, por influência das hormonas sexuais, que começam a ser produzidas em quan-tidades relevantes, a secreção sebácea aumenta significativa-mente. Começam, nesse momento, os sofrimentos da jovem Derme (como veremos mais adiante)…

A quantidade de água na pele do bebé é decididamente mais elevada do que na pele do adulto. Os dados científicos revelam--nos que a água, contida na parte mais profunda da epiderme e da derme, e que tem a característica de não conseguir «abando-nar» a pele por evaporação, é igual a 74,5% do peso no recém--nascido, decresce para 69,4% no bebé e chega aos 64% no adulto. Esta percentagem não tem nada que ver com a água pre-sente na camada córnea superficial, no suor, nem com a quota de NMF (Natural Moisturizing Factor, ou seja, o fator natural de hidratação) presente no filme hidrolipídico – a película protetora composta precisamente por água, sebo, detritos celulares e alguns fatores ainda não bem identificados. É por este motivo que a pele do recém -nascido é macia e sedosa, em contraste com a pele murcha e flácida do idoso.

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O suor, por fim, é uma solução aquosa na qual se encontram dissolvidas muitas substâncias de natureza química. É produzido pelas glândulas sudoríparas, que são estruturalmente diferentes das sebáceas. Formam -se por volta da vigésima oitava semana de gestação e, apesar de presentes na pele do recém -nascido, serão precisos cerca de dois anos para que sejam corretamente ativadas. De facto, no recém -nascido, o sistema de termorregulação ainda não está bem estruturado. A adaptação ao frio ou ao calor são operações que exigem muito esforço: a sudação desempenha um papel importantíssimo neste processo. Antes de mais, permite baixar a temperatura do corpo, fenómeno indispensável nos casos de febre elevada ou de exposição a altas temperaturas externas. A evaporação do suor da superfície cutânea, com efeito, permite eliminar da pele uma pequena quantidade de calor, redu-zindo a temperatura corporal. Este limitado funcionamento das glândulas sudoríparas é a razão por que para uma criança de idade inferior aos dois anos de idade existe um maior perigo de «sobreaquecimento» do que para um adulto.

Esta escassa sudação contribui para enfraquecer a pele da criança, tornando -a mais vulnerável a infeções como a impeti-gem, uma dermatite típica da infância muito contagiosa, provo-cada por germes banais (estreptococos, estafilococos áureos).

De facto, além de ter uma ação antimicrobiana, o suor é também uma solução utilizada pelo organismo para eliminar

substâncias potencialmente prejudiciais.

Outra virtude extraordinária do suor é a de produzir, durante a exposição solar, ácido urocânico, uma substância que, junta-mente com outros mecanismos de defesa cutâneos (aumento da produção de queratina e formação de melanina), ajuda a proteger a pele das radiações ultravioletas e favorece um bronzeado nor-mal e salutar. Dado que, porém, nas crianças de idade inferior aos dois anos de idade a sudação é escassa, é bom não as expor demasiado ao sol.

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A acidez e o microbioma cutâneo

A acidez é uma condição fisiológica típica da pele. É medida por um indicador químico que se serve da escala numérica do pH: o pH neutro corresponde ao valor 7, de 0 a 7 o pH é ácido, de 7 a 14 o pH é alcalino (salino).Os valores de pH da pele saudável de uma criança estão compreendidos entre 4,2 e 5,6. E este dado desmente uma reivindicação do marketing: a do sabão «neutro». Pelo contrário, o objetivo desejável é o de não contrastar a acidez fisiológica da pele com produtos cosméticos errados.

A acidez do pH cutâneo tem uma função específica: manter vivos as bactérias e os micro -organismos que habitam na pele,

o microbioma cutâneo.

O microbioma cutâneo é o conjunto de minúsculos habitantes que povoam a cútis, os quais desempenham funções úteis, como opor -se ao desenvolvimento excessivo – que pode transformar -se em infeção – de hóspedes desagradáveis (bactérias e fungos) potencialmente perigosos. Tudo em perfeita sinergia com um pH fisiologicamente ácido e com a justa quantidade de sebo e suor, fatores que contribuem ativamente para travar o crescimento da maior parte dos «germes ocasionais». Tal como o microbioma intestinal, também o microbioma cutâneo é, frequentemente, palco de lutas: a tipologia e o número de bactérias e fungos que a pele habitualmente alberga modificam -se com a idade, com as condições de vida e em conformidade com as diferentes zonas do corpo que estes micro -organismos vão colonizar.

Não é necessário limpar a pele de um bebé com substâncias antisséticas e antibacterianas que podem modificá -la e empobrecê--la, tornando -a mais vulnerável; não é preciso usar produtos excessivamente «desengordurantes», e este é um princípio válido para a limpeza em geral, que se torna um imperativo para a pele dos mais pequenos, já tão pobre no seu filme hidrolipídico, mas que precisamente por isso tem sempre bom cheiro, não tem

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imperfeições e nos dá um prazer imenso quando a tocamos e enchemos de bei jinhos. A propósito dos recém -nascidos, sempre me questionei sobre aonde é que eles se sujariam tanto para precisarem do famoso «banho diário»… É opinião comum que o banho faz muito bem, que relaxa a criança e lhe permite dor-mir melhor. Mas será realmente assim? A verdade é que, quando se lava um recém -nascido, o medo de fazer alguma coisa mal é enorme: algumas mães usam o lavatório, pois o espaço pequeno reduz a probabilidade de o bebé escorregar das mãos. Mas, entre-tanto, o bebé grita, cora a chorar até ficar roxo (mas o banho não era para relaxar?) e a mamã inquieta -se pois a sua inexpe-riência assusta -a. E vai daí, puxa de sabonetes e champôs (mas atenção aos olhos!) e avança com a esponja até, por fim, o esfre-gar à pressa com a toalha. Mas por acaso este bebé trabalha nalguma mina para precisar de um banho diário? Como se não bastasse, deve sublinhar -se que o aumento da humidade da pele pode favorecer fenómenos de irritação e vermelhidão por causa do desenvolvimento exagerado de micro -organismos que se mul-tiplicam em número relevante. O mesmo é válido para a zona das fraldas, por causa do microclima quente -húmido que favo-rece a proliferação de micróbios.

A proteção contra os raios ultravioleta

São os melanócitos, células especializadas na produção da melanina, que garantem a proteção contra os raios UV. A mela-nina atua sobre a pele como filtro solar natural, absorvendo uma parte dos raios ultravioleta prejudiciais e impedindo -os de chegar às células internas. Na criança, os melanócitos são ainda imatu-ros e, consequentemente, a capacidade de produzirem melanina é reduzida.

Se as defesas fisiológicas que impedem os raios ultravioleta de danificarem as células cutâneas não estiverem

perfeitamente estruturadas, a exposição solar pode tornar -se

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um fator de risco muito elevado, em especial entre o nascimento e os três anos de idade.

Pessoalmente sou fã da luz solar, não gosto de atitudes extre-madas e de limitações externas, mas em relação aos mais peque-nos é indispensável dar informações corretas e específicas a respeito do tema.

Atualmente, sabemos com toda a certeza que, se uma criança ficar queimada na sequência da exposição solar, será depois um adulto com mais risco de desenvolver um grave tumor da pele, o melanoma. E não há creme protetor suficientemente resistente à exposição solar! O melhor filtro solar para uma criança é o bom senso dos pais. Até aos dois anos, pelo menos, é absoluta-mente desaconselhada a exposição ao sol tão apreciada pela maior parte das pessoas: praia, chapéu de sol, balde e pá devem ser substituídos por outros programas de férias. Muitas vezes, na praia, dou por mim a observar mães com recém -nascidos a dormitarem nus debaixo de um chapéu de sol ou besuntados de cremes pastosos que, além da composição duvidosa, interferem também com a sudação. Em muitos casos, a permanência destas crianças na praia prolonga -se até ao fim do dia! Com igual fre-quência, não consigo resistir e aproximo -me destas mães, apresento -me e tento explicar -lhes que não estão a fazer o melhor pelos seus bebés… Certamente que a boa -fé e a falta de conhe-cimentos sobre o tema intervêm em defesa das mães e é por isso que a medicina já não pode prescindir de uma boa capacidade de comunicação.

Que o sol faz bem é inegável. Na primeira infância, a síntese de vitamina D, que se desenrola através da mediação dos raios ultra-violetas, assegura um bom crescimento do bebé e salvaguarda -o de uma patologia que, felizmente, está erradicada: o raquitismo, esse terrível fantasma do imediato pós -guerra, que surgiu em concomitância com as adversidades e as privações alimentares. Eu própria me lembro de, no verão, com os meus irmãos, ter de me expor ao sol, mesmo correndo o risco de me queimar! A minha mãe besuntava -nos com azeite e, ainda que ficássemos demasiado

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vermelhos, punha -nos a fritar debaixo da luz solar. Que tor-mento! «Fiquem ao sol, caso contrário não crescem!», dizia, em continuação, a minha mãe. Mas, para assegurar uma síntese equilibrada de vitamina D, é suficiente expor à luz solar poucas zonas do corpo: mãos, pernas e pés ao sol garantem já uma pro-dução satisfatória. Portanto, no verão, mas também no inverno, um passeio de uma hora ao ar livre, nas horas mais adequadas, é suficiente para alcançar o objetivo. Estas premissas são funda-mentais para compreender como gerir a pele de um bebé.

Cosmética para bebés

A cosmética para bebés é um setor que fatura cerca de oitenta milhões de euros por ano só em Itália, uma indústria ativa, um mercado que envolve todas as faixas da população. Há para todos os gostos: produtos destinados às farmácias, às perfumarias, às grandes lojas. E a tendência de consumo está em claro cresci-mento. Basta ver os dados publicados por estudos do setor para perceber que está em plena fermentação e que a procura aumenta de ano para ano.

Atualmente, o «ritual cosmético» dirigido aos bebés é sobre-maneira articulado e prevê, quase todos os dias: banho, champô, limpeza a cada troca de fraldas, cremes e/ou pomadas protetoras, anti -inflamatórias, impermeabilizantes, pós e/ou talcos de ação absorvente, perfumes, filtros solares de vários géneros. Na rea-lidade, os bebés não precisam de nada disto! Aliás, é absoluta-mente necessário limitar a utilização dos produtos em questão: além de não trazerem benefícios à pele, alguns dos princípios ativos presentes nestes cosméticos são absolutamente prejudi-ciais. A fragilidade, sobretudo imunológica, da pele infantil tor-na -a mais vulnerável às substâncias com que entra em contacto. Por este motivo é fundamental conhecer bem o conteúdo dos produtos dedicados aos bebés, evitando deixar -se influenciar pela publicidade.

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Isto implica saber ler a linguagem INCI (International Nomenclature of Cosmetic Ingredients), ou seja, a lista dos

ingredientes mencionados nas etiquetas.

Para os bebés é ainda mais válido o conceito de ecodermo-compatibilidade (o produto tem de ser eficaz, não prejudicar a pele e respeitar o ambiente), que implica uma série de substâncias a evitar: além daquelas habitualmente postas sob suspeita pela investigação científica (vaselina, silicone, triclosan, etilenoglicol, PEG, EDTA, DEA, TEA) devem ser recordados também os fta-latos (alteram o desenvolvimento do sistema reprodutor mascu-lino) e o formaldeído (substância altamente cancerígena usada na conservação e na desinfeção). Não se trata de alarmismo nem de terrorismo, mas de uma justa tomada de consciência. Lavemos os nossos filhos mas sem cair em radicalismos inúteis: a pele seca fica ainda mais seca, mesmo utilizando o mais delicado gel de banho. No inverno, se a criança não pratica desporto, é suficiente um par de duches semanais, obviamente dedicando uma limpeza diária a algumas partes (rosto, mãos, pés, zonas íntimas).

Um bom gel de banho deve ser constituído à base de óleos ou leites vegetais (arroz, girassol, amêndoas), emulsionáveis na água, sem substâncias petroquímicas e absolutamente sem necessidade de o acompanhar por creme hidratante. (Querendo, podem ser usados os mesmos óleos vegetais, mas «a seco», antes da limpeza). Também não é necessário, nos recém -nascidos, aplicar pomadas ou cremes a cada mudança de fralda, a não ser que exista uma necessidade real por causa de inflamações.

Frequentemente, a irritação das zonas íntimas manifesta -se em concomitância com a dentição, devido à hiperprodução de saliva (a famosa «baba») que antecede o aparecimento dos pri-meiros dentinhos: e isto é uma demonstração de quão estreita é a ligação entre a saúde da microbiota intestinal e a da pele. A saliva produzida em excesso e engolida, com efeito, acidifica as fezes, as quais, ao entrarem em contacto com o rabinho do bebé, expõem -no a irritações e fissuras. Nestes casos, limitar a utilização de cosméticos pode ser suficiente para restabelecer

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a normalidade. Entretanto, pelo mesmo motivo, no intestino perdem -se muitas bactérias «boas» em benefício de outras bac-térias, favorecendo fenómenos de diarreia e de cólicas.

Também no que diz respeito ao champô, podem ser usados produtos de base semelhante ao gel de banho, com pequenas variações do pH para evitar a lacrimação e tornar a tarefa agra-dável e não traumatizante.

Se as crianças forem à piscina, um pouco de óleo vegetal massajado na pele antes da imersão mantê -las -á protegidas da agressão do cloro. Além do mais, a origem vegetal do produto não levantará quaisquer problemas de biodegradabilidade.

Outro produto que é melhor esquecer é o pó de talco: não faz verdadeiramente sentido nenhum espalhar nos bebés um pó que deriva de uma pedra; com efeito, o talco é um mineral (filossili-cato de magnésio) que se extrai de uma pedreira. Certo, é difícil esquecer a nuvem de pó que perfumou e enxugou gerações de bebés, mas é bom saber que o talco é desde 2006 mantido sob controlo: a Agência Internacional para a Investigação do Cancro (IARC) classificou os pós para o corpo à base de talco como possivelmente cancerígenos para os seres humanos. O risco está, provavelmente, ligado à inalação.

A ação absorvente do talco pode ser perfeitamente substituída por pós afins à pele, como aqueles que são à base de amido

de milho ou de arroz.

Eis uma receita de talco «faça -você -mesmo», ecodermocom-patível e perfumado: junte dois paus de canela a uma confeção de amido de arroz e duas ou três gotas de óleo de essência de laranja. Deixe repousar durante três semanas antes de a utilizar para que o amido fique impregnado com o perfume da canela e da laranja.

São de desaprovar também os perfumes, embora a cosmética infantil aposte neles de maneira desenfreada. Antes de mais, recor-demos que os pequenos, graças à escassa produção glandular, têm um cheiro agradabilíssimo do qual se deve usufruir até

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quando for possível; por outro lado, os recém -nascidos são dota-dos de um olfato mais sensível do que o dos adultos e demasiados cheiros podem desorientá -los. À parte, portanto, a inutilidade, a verdadeira contraindicação no uso dos perfumes é que a sua composição os torna altamente irritantes e alergizantes.

Igualmente crítica é a postura em relação às toalhitas humi-dificadas. Trata -se de um conúbio entre substâncias químicas – óleos minerais e falso tecido – que não deveria ser de forma alguma utilizado nos cuidados das crianças, sobretudo nas par-tes íntimas, onde as mucosas são ainda mais delicadas. No mer-cado existem toalhitas à base de produtos ecodermocompatíveis (ler sempre a etiqueta!) e em alternativa pode ser utilizado um lenço de algodão embebido em óleo de azeitona ou de amêndoas.

Prestem atenção também às pastas de dentes, já que as de criança são, amiúde, demasiado ricas em flúor, elemento útil mas que em doses excessivas pode danificar o esmalte dos dentes. O problema é que as farmacêuticas se esforçam por tornar estes produtos agradáveis utilizando edulcorantes e corantes, a que acrescentam conservantes, não necessariamente de uso alimen-tar, com o resultado de que, frequentemente, as crianças ingerem o dentifrício. É, por isso, essencial manter a distinção entre um alimento e um produto para lavar os dentes, ainda que agradável. Na realidade, as pastas de dentes não deveriam ser usadas pelos mais pequenos e há muitas que não são adequadas para crianças abaixo dos seis anos de idade pelo seu alto teor em flúor. O mais importante, em termos de higiene e prevenção, é que as crianças lavem os dentes escovando -os bem com uma escova macia e água morna.

Por fim, a fralda tradicional, composta de materiais plásticos com ação absorvente (todos de derivação petroquímica) e de falso tecido sempre de natureza sintética: não existe nada menos bio-degradável do que uma fralda para recém -nascidos, que só está completamente desfeita após quatrocentos anos! Se pensarmos no quanto a pele é exposta a este tipo de substâncias e às prová-veis interações que chichis e cocós podem favorecer, não há mui-tas razões para ficarmos tranquilos. Estudos científicos revelam

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um claro aumento das dermatites inflamatórias (em particular, da chamada «dermatite da fralda») desde que começaram a ser comercializadas. Mas tal como fomos capazes de aceitar a mudança na utilização dos sacos de plástico dos supermercados, que, por lei, atualmente devem ser biodegradáveis, também existe a possibilidade de substituir o material sintético da fralda por substâncias derivadas do milho, de açúcares ou de extratos de cereais. No interior da fralda pode ser usado algodão e/ou celu-lose, melhor ainda se provierem de produções controladas. O gel sintético, com poder absorvente, pode ser substituído por gel vegetal. Trocando com maior frequência estas fraldas, obtém -se o mesmo desempenho de uma fralda tradicional. Eis um bom exemplo de um produto ecodermocompatível: é amigo da pele, biodegradável e, em caso de incineração, não produz os terríveis derivados da combustão do plástico!

Os princípios ativos bons e o baby make -up

Devemos ter consciência do seguinte: quantas mais coisas diferentes aplicarmos na pele, mais aumentará o risco de intera-ções indesejadas e de problemas. Eis uma lista de substâncias e princípios «ativos» bons, presentes nos produtos para os cuidados da pele das crianças.

1. Ácido 18 beta -glicirretínico (Glycyrrhetinic acid). É extraído das raízes de alcaçuz e é conhecido pelas suas propriedades anti -inflamatórias que recordam as da cortisona. A sua ação lenitiva e refrescante está abundantemente demonstrada em âmbito científico.

2. Alfa -bisabolol (Bisabolol). É o principal ingrediente ativo extraído da camomila e é um lenitivo eficaz contra a irri-tação e a vermelhidão da pele, além de ter uma ligeira ação desinfetante.

3. Calêndula (Calendula officinalis). O extrato de calêndula provém de uma planta originária do Egipto, é rico em flavo-

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noides, substâncias de amplo poder anti -inflamatório e cicatrizante.

4. Amido. É um pó branco que se extrai do trigo (Triticum vulgare), do arroz (Oryza sativa), do milho (Zea mays) e da batata. O amido de arroz é o mais usado na preparação de produtos cosméticos emolientes e refrescantes, como cremes hidratantes, amaciadores e artigos para o banho. Aplicado na pele, não é absorvido, mas estratifica -se desem penhando a função de protetor cutâneo e atuando como emoliente.

5. Aloé (Aloe barbadensis). É rica em vitamina C e minerais que favorecem a reparação cutânea.

6. Beta -glucano. Deriva da aveia e é um açúcar especial, capaz de ligar grandes quantidades de água e cedê -las à pele, hidratando -a.

7. Óleos vegetais. Os óleos de carité (Butyrospermum parkii), de gérmen de trigo (Triticum vulgare), de borragem (Borago officinalis), de amêndoa doce (Prunus amygdalus dulcis), de nozes -de -macadâmia (Macadamia ternifolia) têm, todos, uma poderosa ação hidratante, emoliente e regeneradora da pele.

É preciso ter bem presentes estas informações e, em simultâ-neo, não descurar outro fenómeno, em claro crescimento: o baby make -up. Abundam na Internet tutoriais do género, ou seja, de crianças que, com ar decidido e profissional, explicam a outras crianças como se aplica a base, qual a cor da sombra que melhor realça os olhos, como aplicar o gloss nos lábios. A maquilhagem para meninas é um negócio em expansão, sob a veste de uma mera brincadeira.

Um estudo recente, porém, divulgou dados muito interessan-tes e, ao mesmo tempo, inquietantes. Só nos Estados Unidos calcula -se que este tipo de cosmética envolva três milhões de meninas e raparigas entre os três e os dezasseis anos. A idade em que as meninas se começam a maquilhar desceu dos treze para os dez -onze anos. Muitas marcas criam verdadeiros estojos de produtos de maquilhagem que são vendidos em lojas de brinquedos;

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uma maneira manhosa e enganadora de contornar as leis relati-vas aos cosméticos já que os produtos em causa são classificados como brinquedos.

As forças da ordem já por várias vezes apreenderam produtos cosméticos destinados às meninas por serem considerados peri-gosos para a saúde (com níveis muito elevados de metais tóxicos como arsénio, chumbo e cádmio e escassa informação sobre os ingredientes ou advertências para os pais). Trata -se, sobretudo, de vernizes, batons e sombras; todos vendidos em lojas de brin-quedos, nas grandes superfícies comerciais, mas também nas bancas das feiras. Nunca como nesta categoria existiu a possibi-lidade real de encontrar aqueles a quem eu gosto de chamar «eco -espertalhões»! É destes últimos meses um estudo científico que assinalou nos Estados Unidos (onde a oferta é, amiúde, agres-siva e sub -reptícia) a presença de diversas marcas que se procla-mam «naturais» (por exemplo, Geo Girl e Luna Star Natural), portanto, não perigosas, mas que de natural pouco têm: é sufi-ciente consultar o INCI para perceber logo!

Vem -me à mente um antigo filme com Anna Magnani, Bellis-sima, em que a pequena protagonista é objeto da mania mórbida da mãe de a impor a todo o custo no mundo do espetáculo. É um filme antigo, mas, infelizmente, atualíssimo: o desejo de mani-pular a imagem e de a tornar absolutamente perfeita começa cada vez mais cedo e, como uma criança não tem consciência destas estratégias, são os adultos quem se deixa seduzir pelo desejo espasmó-dico de aparecer, inclusivamente através dos seus filhos.

Deste modo, programas televisi-vos que têm como protagonistas crianças a cantar, a cozinhar e sabe--se lá que mais, preveem uma prepa-ração prévia antes da transmissão, que no jargão tem um nome bem preciso: «Maquilhagem e cabelei-reiro!»