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    A FUNÇÃO SOCIAL DA ESCOLA NA EDUCAÇÃO DE J OVENS E ADULTOS

    ESCOLA: PRA QUÊ TE QUEREM?

    Fernanda Maria da Silva¹Marina Andretta Barbosa ²

    Xavier Uytdenbroek ³

    RESUMO

    Este artigo tem por principal objetivo analisar a função social que cumpre aescola para a Educação de Jovens e Adultos (EJA), a partir da comparação dalegislação educacional vigente e a prática vivenciada por educadores eeducandos. A investigação desenvolveu-se numa abordagem qualitativa a partir da análise das propostas educacionais na legislação brasileira seguida de umapesquisa de campo na qual foram utilizados como procedimentos metodológicosobservações e entrevistas com alunos e professores de duas escolas daPrefeitura Municipal do Recife. Com os resultados obtidos encontramos algunsavanços históricos significativos, tais como direitos garantidos por lei e odesenvolvimento de programas muito importantes como o Brasil Alfabetizado, mas

    que ainda não permitem atingir, de fato, a função que se almeja para a Educaçãode Jovens e Adultos.

    Palavras chave: Educação de Jovens e Adultos, Função Social, perspectivas

    educacionais na EJA.

    1 Concluinte de Pedagogia – Centro de Educação - UFPE – [email protected] 

    2 Concluinte de Pedagogia – Centro de Educação -UFPE– [email protected] 

    3 Professor Assistente do Departamento de Fundamentos Sócio-Filosóficos da Educação- Centro

    de Educação –[email protected]

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    INTRODUÇÃO:

     Através da análise de documentos como Lei 9394/96 (LDB/96), Parâmetros

    Curriculares Nacionais (PCNs), o Plano Nacional de Educação 2001 e a

    Constituição Federal de 1988, no que dizem respeito à Educação de Jovens e

     Adultos (EJA) podemos compreender que, oficialmente, a função social qual a

    EJA se propõe a cumprir é a de preparar jovens e adultos, através de

    oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do

    alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, possibilitar aos

    educandos aquisição de conhecimentos e habilidades necessários ao exercício dacidadania, preparação para o mundo do trabalho e participação crítica na vida

    política. Na prática concordamos quando orientam que:

     A educação de jovens e adultos, visando a transformaçãonecessária, com o objetivo de cumprir de maneira satisfatória sua funçãode preparar jovens e adultos para o exercício da cidadania e para omundo do trabalho, necessita de mudanças significativas. (PCNs)

    Essas mudanças, sob o nosso ponto de vista em sua maioria ainda por se

    concretizarem, foram norteadas pelos valores apresentados na Conferência

    Internacional de Hamburgo, na Lei 9394/96, no Parecer CEB 11/00, que

    estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e

     Adultos e na Deliberação 08/00 CEB.

    Na prática vivenciada por nós, através da pesquisa de campo observamos

    que o propósito destinado a EJA continua cumprindo uma função paliativa, que na

    maioria das vezes abrange apenas os processos de alfabetização do educando,

    ao contrário do que orienta o PNE 2001, que faz referência não só a alfabetizaçãomas também aos aspectos de formação do educando enquanto cidadão:

     A alfabetização dessa população seja entendida como no sentido amplode domínio dos instrumentos básicos da cultura letrada, das operaçõesmatemáticas elementares, da evolução histórica da sociedade humana,da diversidade do espaço físico e político mundial e da constituição dasociedade brasileira. Envolve ainda a formação do cidadão responsável econsciente de seus direitos e deveres.

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    Tal definição do Plano Nacional de Educação 2001, que define como

    individuo alfabetizado aquele que domina as habilidades citadas acima, mostra-

    nos uma distorção grave entre os propósitos teóricos e práticos da EJA.

    Observamos que o público que freqüenta as salas de EJA tem muita vontade de

    aprender, alguns demonstram uma verdadeira sede por conhecimentos novos,

    reconhece a importância da educação para a formação do individuo, a importância

    da cultura letrada, entre outras coisas. Porém na prática, tais fatores não são

    suficientes para a efetivação da função social que a EJA se propõe a cumprir. Na

    prática esta função passa por oportunidades educacionais apropriadas,

    consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida ede trabalho. Porém a realidade vivenciada pelo alunado não parece ser tão levada

    em consideração como prevê a legislação.

     Apesar da melhoria nos índices, nas questões de acesso á EJA os

    problemas são muito mais complexos. Não basta estar na escola, é preciso ter 

    garantidos os direitos de acesso e permanência, condições dignas de estudo e

    ensino, práticas docentes que incentivem a reflexão e a formação cidadã, através

    de conteúdos significativos para este público. É preciso que os sujeitos tenham

    plena consciência sobre que papel desempenha a escola em suas vidas, até

    mesmo sobre a real serventia deste modelo de escola perante suas demandas

    sociais, para que possam ter clareza sobre o que os traz novamente ou pela

    primeira vez à escola.

    São muitos os aspectos que podemos enumerar como motivadores da

    realização deste trabalho. Apenas conhecer mais sobre a EJA nos pareceu

    superficial diante da importância com que precisa ser considerada esta parte da

    Educação Básica. Quisemos analisar qual a função social da escola na Educaçãode Jovens e Adultos, perante a dicotomia teoria-prática, identificando os

    propósitos da educação para este público na literatura oficial e comparando-os

    com a vivência escolar de educadores e educandos. O que as Leis determinam é

    de certa forma fácil descobrir, através da verificação das propostas oficiais.

     Analisamos tais proposições, comparando-as com a vivência escolar de

    educadores e educandos, para sabermos como se aproximam, se determinam

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    modelos que são seguidos ou não e até que ponto. Muito importante também para

    nós foi considerar as expectativas que educadores e educandos depositam na

    Educação de Jovens e Adultos. A legislação propõe muito mais do que os alunos

    esperam e cumpre muito menos do que estes mesmos alunos têm direito.

    Quisemos também analisar, no campo escolhido, se a educação contribui

    com o processo de transformação da consciência, no sentido da criticidade do

    educando, enquanto ser social e histórico. Na tentativa de iIdentificar em que

    aspectos a escola pode ser considerada um espaço capaz de gerar práticas

    sociais que contribuam para tal transformação. Para tanto foi preciso adentrar em

    questões como autonomia, emancipação dos sujeitos, seu senso crítico e suasperspectivas perante a realidade.

    EJ A NA HISTÓRIA RECENTE DO BRASIL: SÓ DEPOIS DE 1934....

     A Constituição Federal de 1934 é o primeiro documento que determina

    nacionalmente algo sobre a educação de adultos:   “Art 150 - Compete à

    União: Parágrafo único ... a) ensino primário integral gratuito e de freqüênciaobrigatória extensiva aos adultos;”. Ainda que de forma quase imperceptível é

    onde se estabelece que a educação é gratuita, obrigatória e  extensiva aos adultos,

    para nós, explicitada aqui ainda como uma concessão. Pela primeira vez abre-se

    legalmente a brecha para se falar em Educação de Adultos. E foi realmente depois

    da Revolução de 1930 que a sociedade brasileira deu indícios de considerar a

    importância da educação também para os adultos, por muitas décadas, citados

    apenas como analfabetos.

    Na década de 1940 a União toma iniciativas pouco mais significativas, dando

    margem em seu discurso à educação de todos os adolescentes e adultos. Entre

    1930 e 1945 houve a formação e a consolidação de um governo central, que

    tomaria iniciativas quais trariam repercussões mais notáveis para a educação. A

    partir de 1945, segundo Beisiegel (1974), a UNESCO passou a influir diretamente

    nas políticas educacionais, trazendo contribuições quanto à expansão do ensino,

    da saúde e desenvolvimento social no Brasil.

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    Entre 1950 e 1964 houve espaço e tempo fértil para a disseminação das

    iniciativas educacionais verdadeiras, mais ligadas às necessidades da população,

    principalmente pela grande contribuição do método Paulo Freire, inicialmente

    colocado em prática em 1961, no Movimento de Cultura Popular em Recife e

    depois aceito pelos planos do Governo Federal e levado a outros estados,

    difundido com grande aceitação até ser interrompido pelas medidas tomadas após

    o Golpe Militar de 1964.

    Depois deste período o governo militar instituiu o Movimento Brasileiro de

     Alfabetização (MOBRAL), que se expandiu por todo o país. Embora que de forma

    muito pequena e isolada ainda houvesse iniciativas mais críticas nodesenvolvimento e prática de métodos baseados em Paulo Freire, ligadas a

    sindicatos e instituições religiosas. Nesse período experiências legítimas de

    educação popular e educação de adultos foram mantendo-se sob sigilo, sem

    ampla divulgação até meados da década de 1980, quando, com o fim da ditadura

    militar foram ganhando maior dimensão, até que ocorresse a extinção do

    MOBRAL em 1985.

     A partir de 1985 muitas foram as iniciativas em favor da expansão massiva do

    acesso à educação no Brasil, principalmente no final da década de 1990 em

    diante. Ocorreram iniciativas inéditas na história da educação brasileira, motivadas

    ou até pressionadas por organizações internacionais (UNESCO, Banco Mundial) e

    as metas estabelecidas pelas mesmas. Houve em todo o mundo uma ampliação

    do conceito e prática da alfabetização, no sentido de considerá-la como formação,

    provida de muitos outros aspectos que não apenas a prática da leitura e escrita.

    Um dos princípios mais difundidos para a EJA na Proposta Curricular para

    Educação de Jovens e Adultos do Ministério da Educação – 1998 é   “aincorporação da cultura e da realidade vivencial dos educandos como conteúdo ou

    ponto de partida da prática educativa”. Princípio este que como muitos outros

    ainda não chegou de forma concreta e solidificada ás práticas diárias das salas de

    aula. Quantitativamente a EJA (Educação de Jovens e Adultos, antes chamada

    apenas Educação de Adultos) teve muitos avanços; a facilidade de acesso à

    escola aumentou consideravelmente, há projetos do Governo Federal como Brasil

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    afalbetizado, que começam a levar em consideração as especificidades deste

    público, como a elaboração de material didático próprio e significativo, uma

    metodologia não infantilizada, mas a realidade mostra problemas muito maiores

    do que apenas o acesso à educação. As garantias das condições de permanência

    e da efetivação de uma educação crítica e conscientizadora, talvez precisem de

    mais um século para se efetivar, pois envolvem dimensões muito mais complexas

    que a elaboração de material didático e quantidade de matrículas. Discussões

    sobre a escolarização da população de jovens e adultos não são recentes, pois já

    há mais de meio século as idéias freireanas sobre a mesma ocupam espaço no

    cenário nacional e internacional. As discussões avançaram a ponto de hojecompreendermos na escolarização uma necessidade de formação dos sujeitos,

    embora as práticas educativas estejam caminhando mais lentamente que a

    velocidade das discussões, congressos e produções acadêmicas.

    EDUCAÇÃO DE J OVENS E ADULTOS: DICOTOMIA TEORIA - PRÁTICA

     Ao nos basearmos inicialmente num breve histórico da EJA no Brasil

    conseguimos compreender as origens do fato desta ter um caráter corretivo, de

    ajuste sobre aquilo que a escola regular não fez. Atingindo um público

    economicamente marginalizado a EJA não representa propriamente numa

    sociedade neoliberal uma necessidade econômica e sim uma concessão,

    conseguida com muitas dificuldades. Falta ainda a conscientização de que a EJA

    está incluída na Educação Básica e têm direitos garantidos por lei, mas ignorados

    na prática.

     A partir disso podemos constatar que a EJA (Educação de Jovens e Adultos) durante muito tempo foi vista como uma espécie de compensação, de

    reparação para com o público de adultos ainda não alfabetizados. Possuía mais

    as características de pagamento por uma dívida social que se formou ao longo da

    história para com a camada mais pobre da população. Esta tradição foi alterada

    em nossos códigos legais na medida em que a Educação de Adultos, mediante

    muita reivindicação dos movimentos sociais, foi tornando-se direito de todos.

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    Deslocou-se a idéia de compensação para o campo da reparação e da eqüidade,

    mas equidade relativa. Pois muitos foram e ainda são impedidos de exercer seus

    direitos por fatores como a própria negação do direito à educação, e ainda hoje

    muitos sofrem as conseqüências desta realidade histórica.

    Vivemos numa uma sociedade que valoriza cada vez mais a educação

    escolar como condição básica para o exercício da cidadania, o acesso ao mundo

    do trabalho e a apropriação e o exercício de um senso crítico que o permita

    exercer plenamente direitos políticos e sociais. Para tanto algumas políticas

    públicas no âmbito educacional vem dando bastante ênfase a ampliação do

    número de vagas no ensino fundamental. Há um aumento significativo na ofertade vagas, mas a média nacional de permanência na escola, para a etapa

    obrigatória (oito anos) fica entre quatro e seis anos. E os oito anos obrigatórios

    acabam por se converter em 11 anos, estendendo a duração do ensino

    fundamental quando os alunos já deveriam estar cursando o ensino médio. O

    resultado desta realidade é a repetência, a reprovação e a evasão escolar 

    mantendo e aprofundando a distorção idade / série e conseqüentemente

    aumentando o número de pessoas que cedo ou tarde voltarão à escola como

    alunos da EJA.

     Ao analisarmos a proposta de documentos oficias para a Educação de

    Jovens e Adultos constatamos que a mesma, teoricamente, deve levar em

    consideração a proposta de formação de um ser critico e capaz de trilhar seus

    próprios caminhos. Para tanto seria necessário que a educação estivesse

    cumprindo o papel de possibilitar aos educandos a aquisição de conhecimentos e

    habilidades necessários ao exercício da cidadania, preparação para o mundo do

    trabalho e para uma participação critica na vida política.Segundo Freire (1980, p.20) “uma educação deve preparar, ao mesmo

    tempo, para um juízo critico das alternativas propostas pela elite, e dar a

    possibilidade de escolher o próprio caminho”.

    Porém na prática vemos uma educação que tem cumprido uma função

    paliativa procurando mais produzir números que apareçam nas estatísticas. Dessa

    forma é deixada em segundo plano uma proposta concreta que venha a

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    efetivamente nortear a Educação de Jovens e Adultos, oferecendo aos sujeitos

    deste processo a possibilidade de se reconhecer como cidadãos e de possuir 

    ferramentas que os permita construir seu senso critico, sua formação como seres

    conscientes do seu papel social. Além de terem a possibilidade de uma

    reconstrução do seu próprio mundo como ponto de partida para a formação de

    uma consciência libertadora.

    Embora tenha evoluído muito em termos de legislação, a educação que cria

    e garante oportunidades ainda atinge a minoria da população. Pessoas que têm a

    oportunidade de concluir o Ensino Fundamental e Médio, ingressar no Ensino

    Superior e simultaneamente à formação escolar ter acesso a uma formaçãocultural ampla não precisam da EJA. Mas ao contrário, pessoas que desde criança

    precisaram parar de estudar para trabalhar em período integral com certeza não

    têm nem a mesma formação nem as mesmas oportunidades. Nesta perspectivas

    percebemos que EJA abarca pessoas que fugiram à “regra” do que a legislação

    propõe para a educação. Mais do que fugirem à regra, ficaram à margem do que

    determinam as leis com relação a direitos para todos.

    Na afirmação inicial de nossa hipótese a educação se propõe a formar para

    a cidadania. Segundo o Dicionário Aurélio Buarque de Holanda Ferreira

    “cidadania é a qualidade ou estado do cidadão”, entende-se por cidadão “o

    indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um estado, ou no desempenho

    de seus deveres para com este”. Se tomarmos por parâmetro esta definição de

    cidadania, nossos alunos de EJA ainda não a atingiram. Devemos compreender 

    cidadania num sentido amplo. Podemos partir de uma definição teórica, mas

    precisamos que o conceito seja vivenciado, que as pessoas o entendam de fato e

    identifiquem-se com tal definição em suas vidas. A Constituição Federal (1988) garante acesso de todos à educação, mas

    devido a desigualdades sociais, a exclusão e aos complexos processos de

    marginalização pelos quais ainda passa grande parte da população é preciso que

    haja outra lei, para garantir que, os que foram excluídos dos direitos “garantidos”

    pela primeira, sejam atendidos pela segunda. É o caso da Lei 9394/96, que prevê

    oportunidades e mais garantias, quando na prática ainda vemos o aluno da EJA

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    indo à escola com o objetivo de responder a demandas sociais, as quais não o

    incluem mais como ser produtivo. Demandas das quais nem ele se dá por conta.

    Seja um aumento no número de vagas promovido pelas políticas educacionais,

    seja a necessidade de melhorar os índices de desenvolvimento da população, ele

    é numericamente incluído, mas ainda não tomou consciência do que o leva até ali,

    do que esperar disso para si e para a sua comunidade. É neste sentido que nos

    questionamos sobre qual a real função social da educação para a EJA. Segundo

    Barroso:

     Atualmente, a função social da escola é residual e não está conseguindocumprir com o seu papel (...). Nesse contexto, se discute as

    possibilidades de estabelecer uma outra relação entre a escola e o local,pois pode dar um novo sentido e significado a essa instituição e contribuir para reinvenção de outra regulação e organização. Esse é o grandedesafio que se coloca, atualmente, para combater a exclusão e asegregação interna e externa dos indivíduos.

    Quando falamos em função social da escola ou da educação escolar,

    entendemos função social como sua razão de ser, pois em Vieira vemos que

    “sempre que a sociedade defronta-se com mudanças significativas em suas bases

    sociais e tecnológicas, novas atribuições passam a ser exigidas à escola”.(VIEIRA

    2002, pág 13). Nossa sociedade já passou e passa por muitas mudanças, por isso

    a importância de questionarmos que função a escola está cumprindo nesta

    sociedade e principalmente se os sujeitos da escola têm noção sobre esta função.

     Acima Barroso nos fala sobre reinvenção e um novo sentido a este modelo de

    escola que, segundo ele, não tem cumprido seu papel, que para nós não pode ser 

    outro a não ser formar um cidadão crítico, consciente de seu papel na sociedade e

    ativo, com poder de reflexão e decisão. Espera-se que seja ampla esta função

    social, bastante complexa como em todas as definições que encontramos, mas,ao que pesquisamos, a função social tem-se resumido a alfabetização, a

    processos burocráticos e didáticos de elevação do tempo de permanência da

    população na escola. A visão encontrada não passa ainda pela formação humana

    e do cidadão pensante. Que função social cumpre a escola para a EJA? Nossa

    pesquisa não pretende encontrar a resposta, mesmo porque sob diversos

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    aspectos as respostas são muitas e variam de acordo com a demanda da

    sociedade.

    A ESCOLA E AS PROPOSTAS PEDAGÓGICAS DA EJ A

    O papel da escola ainda está na fase de dar oportunidade de escolarização básica

    aos que não tiveram oportunidade na fase própria. Ainda enfrenta problemas de

    ordem física, espacial, de acomodação dos alunos, de adequação do mobiliário e

    da evasão.

    O levantamento teórico nos mostrou que existe um alto índice de evasãonas turmas de EJA. A reportagem da Revista Nova Escola edição 172 - mai/2004

    nos traz dados do Ministério da Educação, os quais informa que menos de 30%

    dos alunos concluem o curso na EJA. Tal fenômeno ocorre principalmente pelo

    uso de material didático inadequado para a faixa etária, dos conteúdos sem

    significado, nas metodologias infantilizadas aplicadas por professores

    despreparados e em horários de aula que não respeitam a rotina de quem

    trabalha e estuda, enfim, devido ao fato de não se levar em conta às

    particularidades deste público. Esses dados nos permitem afirmar que a prática

    exercida na Educação de Jovens e Adultos não condiz com as propostas

    existentes para a mesma. Como exemplo disso podemos refletir sobre a proposta

    da LDB (Lei n. 9.394/96), que em seu artigo 1º refere-se aos princípios

    norteadores da educação e estimula a criação de propostas alternativas para

    promover a igualdade de condições para o acesso e permanência do aluno no

    processo educativo, a utilização de concepções pedagógicas que valorizem a

    experiência extra-escolar e a vinculação com o trabalho e com as praticas sociais.Tal parecer sugere segundo Pinheiro “propostas pedagógicas concretas e mais

    próximas da realidade” (1999, p.29).

    De acordo com a proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais a

    Educação de Jovens e Adultos deve ser pensada como um modelo pedagógico

    próprio, com o objetivo de criar situações de ensino-aprendizagem adequadas às

    necessidades educacionais de jovens e adultos, englobando as três funções: a

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    reparadora, a equalizadora e a permanente, citadas no Parecer 11/00 da

    CEB/CNE. De acordo com tal parecer, a função reparadora significa a entrada no

    circuito dos direitos civis pela restauração de um direito negado: o direito a uma

    escola de qualidade e o reconhecimento de igualdade de todo e qualquer ser 

    humano. A função equalizadora dará cobertura a trabalhadores e a tantos outros

    segmentos da sociedade possibilitando–lhes a reentrada no sistema educacional.

    Finalmente, a Educação de Jovens e Adultos deve ser vista como uma promessa

    de qualificação de vida para todos, propiciando a atualização de conhecimentos

    por toda a vida. Isto é a função permanente da Educação de Jovens e Adultos,

    não apenas alfabetizar, engrossar índices e estatísticas, mas reconhecer oscidadãos que nela se matriculam e permitir, de fato, que acumulem ferramentas

    para o exercício da cidadania.

    É importante ressaltar que a educação destinada a jovens e adultos por si

    só já apresenta características peculiares. Pelo fato de ser uma modalidade de

    ensino que se destina as pessoas, que pelos mais diversos motivos, entre eles

    condições sociais adversas associadas à falta de políticas de planejamento

    eficazes na esfera escolar, não concluíram a escolaridade básica na “idade

    própria”. Por este mesmo motivo é imprescindível que exista uma prática voltada

    para a realidade do educando, considerado tal ação necessária para que seja

    possível o acesso e permanência dos alunos, assim como o desenvolvimento dos

    propósitos a eles destinados.

    OBJ ETIVO GERAL:

    Como objetivo geral do presente trabalho analisamos a função social daescola na Educação de Jovens e Adultos, perante a dicotomia teoria-prática,

    identificamos os propósitos da educação para este público na literatura oficial e

    fizemos uma comparação com a vivência escolar de educadores e educandos.

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    OBJ ETIVOS ESPECÍFICOS:

    Nos objetivos específicos verificamos, a partir das propostas oficiais, que

    função social a escola se propõe a cumprir na Educação de Jovens e Adultos em

    módulos distintos, analisando tais proposições e comparando-as com a vivência

    de educadores e educandos. Identificacamos, ainda que expectativas educadores

    e educandos depositam na Educação de Jovens e Adultos. E por fim, procuramos

    identificar em que aspectos a escola pode ser considerada um espaço capaz de

    gerar práticas sociais que contribuam para uma transformação das perspectivas

    de seus sujeitos, no sentido de se reconhecerem cada vez mais como sujeitos doprocesso educativo.

    METODOLOGIA DA PESQUISA

    Para melhor compreendermos a realidade que foi abordada, o presente

    trabalho de pesquisa desenvolveu-se através de uma abordagem qualitativa.

    Fizemos visitas a duas escolas da Prefeitura do Recife, situadas no bairrode Setúbal e Boa Viagem, Escola Municipal São Francisco de Assis e Escola

    Municipal Manoel Torres respectivamente. Através de entrevistas e observações

    pudemos investigar e compreender melhor alguns pontos importantes para este

    trabalho. Antes de entrevistarmos alunos e professores observamos alguns dias

    de aula, na intenção de analisarmos suas relações, seu dia-a-dia, que problemas

    e situações vivenciam, pois apenas com as entrevistas poderíamos ter respostas

    diferentes do real. Também através das observações pudemos conhecer maissobre a realidade de vida dos alunos, as dificuldades financeiras, familiares, de

    saúde e exclusão social pelas quais passam e que expectativas depositam na

    educação.

    Entrevistamos ao todo 20 alunos dos módulos II, III e IV e 4 professores (2

    de cada escola). Quanto ao módulo I fomos informadas de que não pertence mais

    à rede municipal, sendo administrado pelo programa Brasil Alfabetizado do

    Governo Federal. Nas entrevistas direcionadas aos alunos procuramos identificar 

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    por que motivos não estudaram na educação “regular” e principalmente por que

    motivos estão de volta à escola, que importância dão à escolarização (em seu

    caso a EJA), dando ênfase á questão sobre o que esperam, como perspectiva de

    cidadãos, ao terminarem esta fase dos estudos. Ao entrevistarmos os professores

    procuramos obter informações sobre que importância atribuem à EJA, e sobre que

    visão têm sobre seus alunos, que opiniões têm sobre a escola enquanto local

    dinâmico, de transformações.

     Ao observarmos o cotidiano dos educandos, dialogamos e aprendemos

    sobre o contexto social e econômico em que estão inseridos, conhecemos sua

    realidade e analisamos a que tem servido a Educação de Jovens e Adultos. Após a conclusão da coleta de dados, com obtenção do material adquirido

    através das entrevistas e das observações, a sistematização das respostas a

    análise documental foram de grande importância, pois dessa forma foi possível um

    confronto dos dados de realidade obtidos com a teoria.

    ANÁLISE DOS DADOS OBTIDOS

    Realizadas as observações e entrevistas com os alunos das duas escolas e

    professores, percebemos uma linha comum entre várias respostas. Mulheres que

    se casaram muito cedo, pessoas que quando crianças tiveram de abandonar a

    escola para ajudar os pais nas lavouras de cana-de-açúcar ou nos trabalhos

    domésticos e no cuidado com os irmãos menores e que agora encontram a

    chance de estudar de novo ou pela primeira vez.

    Há muita força de vontade e muita persistência em suas atitudes. Passam por dificuldades financeiras, recebem pouco apoio da família, mas demonstram

    interesse em aprender e esperança de se tornarem cidadãos mais “esclarecidos”.

    Esperança de receberem mais reconhecimento, no trabalho, na sociedade em

    geral, mas ainda de forma não crítica, de certa forma ingênua. Na fala da aluna 2

    “se Deus quiser... tenho fé que vai dar certo, vou terminar meu estudo”. Há

    também muita cumplicidade entre eles, por suas situações de vida, se identificam,

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    há muita compreensão e são solidários entre si e têm muito respeito pelas

    professoras. Já são cidadãos, mas no exemplo que acompanhamos na pesquisa

    de campo a cidadania dos alunos limita-se a poder tirar documentos, a se

    matricular numa escola e a voltar a estudar.

     As respostas das entrevistas confirmaram os aspectos observados em sala

    de aula, tais como a redução do conceito de alfabetização, como é definido pelo

    PNE 2001 para práticas de leitura e escrita, tanto por alunos como por 

    professores. Esse entendimento está limitado à busca por uma inclusão como

    forma de sobrevivência não como elemento de transformação da realidade. À

    maioria dos alunos basta “um pouquinho”, o suficiente pra ter um emprego, saber pegar um ônibus, anotar os recados da patroa, reduzindo assim todo o ideal

    teórico a que se propõem os objetivos da EJA, de formar cidadãos, a exemplo:

    “... a pessoa sem estudar, sem aprender a pegar ônibus, sem conhecer dinheiro é muito ruim, vai pra o Bompreço fazer feira não sabe osnúmeros, não sabe o que é dois o que é três, e serviço de carteiraassinada eu não arrumo mais, já trabalhei, mas não arrumo mais, e hojeem dia pra arrumar um serviço pelo menos em casa de família tem queter leitura, porque às vezes a patroa sai ai liga uma pessoa :anota ai umtelefone, anota ai um endereço...” (V. L 53 anos- empregada doméstica).

    Para nós, é em falas como esta que vemos reduzido o papel da educação.

     A função da escola, de acordo com a fala da aluna, está ligada apenas às práticas

    de alfabetização. Não que isso seja sua responsabilidade, mas isso se inicia num

    conjunto de pensamentos e práticas diárias, que reduzem não só a função da

    escola mas também a função do ser humano a trabalhador, ser produtivo no lugar 

    de um ser completo, consciente de seus direitos e deveres e atuante socialmente.

    Percebemos que as perspectivas de futuro com relação à conclusão da

    escolaridade básica apresentam-se bastante limitadas, se tomados por referência

    os conceitos acadêmicos de senso crítico, visão de mundo, criticidade, politização.

    Não se vêem como sujeitos da sua história, colocam-se como fazendo algo pela

    família, pelos patrões, para sobreviver, mas não por si, pela sua emancipação e

    autonomia ou tomada de consciência e transformação do senso comum em

    crítico.

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     Abaixo segue uma sistematização de respostas obtidas nas entrevistas, as

    quais a seguir serão exemplificadas com algumas falas respectivas. O quadro

    exemplifica a motivação que os trouxe de volta à escola, por que motivo não

    estudram na infância, que importância atribuem à educação, à aprendizagem, que

    expectativas têm sobre o que representa a escola em suas vidas e o que

    pretendem fazer no futuro.

    Sujeitos da pesquisa: alunos de EJ A

    Categorias Resultados obtidos

    Motivaçãopara voltar àescola

    Necessidadep/ o dia a dia Necessidade p/trabalho Realizaçãopessoal Outros

    Nº de alunos 2 10 8 2Motivo da

    evasão A própria

    escolaDificuldades

    na famíliaPrecisoutrabalhar 

    Outros

    Nº de alunos 3 6 7 33.Importânciada educação

    Consideramuito

    importante

    Pouco importante Necessária Outros

    Nº de alunos 20 0 0 04.Aprendizado   Consegue

    aprender Não consegue

    aprender  Às vezes Outros

    Nº de alunos 10 0 10 05.Expectativas

    sobre aescolarização

    Temexpectativaspara o futuro

    Não demonstramexpectativas para o

    futuro

    Poucasexpectativas

    Outros

    Nº de alunos 14 4 2 06.Demonstraclareza com

    relação àfunção da

    escola em suavida

    Escolaapenas como

    a parte física

    Escola como ossujeitos que

    compões a escola(alunos, professores

    etc.)

    Escola comoum misto do

    ambiente físicoe dos sujeitos

    Outros

    Nº de alunos 3 6 6 5**não define escola no sentido amplo, apenas como alocação física.

     Através da fala abaixo podemos perceber que quando se referem a

    importância da educação os alunos ligam diretamente esta à condição para

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    inserção no mercado de trabalho, não fazendo relação entre a educação e a sua

    formação como cidadãos.

    “ Ah é muito importante estudar, tem gente que diz assim: ah, pra quêestudar? Tem gente que é formado e ta desempregado, mas tem chancené , de conseguir um emprego... é bom você saber, ter um emprego,saber falar um pouquinho né. Às vezes fala um pouco errado porque todomundo erra, mas é bom saber ler um livro, um jornal, qualquer coisa e eusei ler um pouquinho graças a Deus...” (L.S 49 anos, dona de casa)

     A educação é sim encarada como muito importante para todos os alunos,

    mas por motivos ligados a emprego, a oportunidades de trabalho, a tarefas ligadas

    a leitura e escrita do dia-a-dia. Quando falamos na transformação do ser humano

    enquanto ser social-histórico, entendemos que para formação de um ser critico é

    necessária a formação de um ser humano no sentido amplo, não apenas

    escolarizado, mas conscientes de seu papel no mundo, que segundo SOUZA

    compreende seres:

    “... inconclusos, inacabados, ilimitados, infinitos. Vamos nos constituindo,fazendo-nos SERES HUMANOS, através do espaço e do tempo, narelação com os outros seres humanos e com os seres da natureza e dacultura, bem como com o criador. Nesse processo, descobrimo-nos

    inacabados e buscamos o aperfeiçoamento, queremos SER MAISHUMANOS. Adquirimos CONCIÊNCIA. Isso quer dizer que somos seresHISTÓRICO- SOCIAIS”( Souza 2000, pág 55).

     A seguir apresentaremos a sistematização das respostas das entrevistas com

    os professores, onde podemos observar o ponto de vista dos mesmos enquanto

    sujeitos responsáveis por colocar em prática as propostas educacionais

    apresentadas na legislação destinada à educação de jovens e adultos.

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    Sujeitos da pesquisa: Professores de EJ A

    NomeEscola

    Rosa(M Torres)

     J osé(M Torres)

    Margarida(São Fco. Assis)

    Maria(São Fco. Assis)

    Formação   Magistério / *   Graduação emmatemática /

    Pedagogia

    PedagogiaFAFIRE / Pós-

    Graduação UFPE

    Magistério ePedagogia UFPE

     Tempo dedocência

    23 anos / 8 naEJA

    8 anos / 2 na EJA 11 anos / 4 naEJA

    6 anos / 3 na EJA

    Importânciada EJ A

    Inclusão social Resgate dacidadania einclusão nomercado de

    trabalho.

    Restabelece aOportunidade de

    estudar 

    Restabelece aoportunidade de

    estudar 

    Por queensina na

    EJ A

    Necessidade / Acha

    prazeroso

    Opção Necessidade / Porque gostaNecessidade

    Pontospositivos da

    EJ A

    Transformaçãodos alunos

    Possibilita:cidadania /

    trabalho/ inclusão

    Relaçõesinterpessoais.

    Possibilita ainclusão dos

    alunos.Pontos

    negativosda EJ A

    Faltacondiçõesfísicas erecursos.

    Baixa auto-estimados alunos;

    dificuldades deaprendizagem;disparidade de

    faixa etária

    Falta condiçõesfísicas da escola

    e recursosdidáticos.

    Baixa auto-estimados alunos.

    Avaliaçãoda suaprática

    Nem sempre éeficienteporque o

    trabalho éamplo.

    Nem sempre éeficiente devido aheterogeneidade

    da turma.

    Não consideraeficiente, falta

    fazer mais.

    Considera eficienteatravés daavaliação.

    Opiniãosobre

    evasão

    Devido ao fator trabalho

    Baixa auto- estimae dificuldade de

    aprender.

    Problemaspessoais

    (familiares) etrabalho.

    Contexto social emque se inserem,

    trabalho.

    * Concluiu Pedagogia no programa de requalificação de Estado - PE

    Quando questionados a respeito da importância da Educação de Jovens e

     Adultos os professores demonstram entender que a importância da mesma está

    no fato de permitir ao educando um resgate de uma condição que lhes foi negada

    na infância, levando-nos a entender que para eles essa é a principal função da

    EJA. Como vimos em nossa pesquisa documental, o propósito da EJA tem

    peculiaridades de público, de necessidades específicas, possui características

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    distintas da educação infantil. Na fala de uma das professoras vemos a função

    bastante reduzida para a EJA, apenas de correção de uma oportunidade que não

    tiveram antes e não como chance de ampliação do conhecimento e modificação

    de situações e sujeitos:   “A EJ A dá oportunidade para aqueles que não

    freqüentarama escola quando criança...”(professora Maria).

     A peculiaridade da Educação de Jovens e Adultos, para nós, encontra-se

    principalmente no fato de que em tal modalidade é fundamental ordenar os

    processos de aprendizagem a partir das experiências já vivenciadas pelos alunos,

    numa perspectiva completamente contextualizada com o meio em que o educando

    está inserido, para que o aprendizado faça sentido sob seu ponto de vista. Quantoa este assunto a Declaração de Hamburgo nos diz que:

     A Educação de Jovens e Adultos engloba todo processo deaprendizagem, formal ou informal, onde pessoas consideradas adultaspela sociedade desenvolvem suas habilidades, enriquecem seuconhecimento e aperfeiçoam suas qualificações técnicas e profissionaispara satisfação de suas necessidades e da sociedade. (DH, 2000, pág163).

    Percebemos que o aprendizado para o público adulto tem finalidade de

    satisfazer as necessidades do educando e da sociedade e não apenas do

    mercado de trabalho, de forma bastante abrangente como nos diz Souza sobre o

    propósito do aprendizado escolar da EJA:

    “O desenvolvimento de uma compreensão critica dos grandes problemascontemporâneos e das transformações sociais, e a capacidade paraparticipar ativamente do progresso da sociedade numa perspectiva de justiça social e inclui como parte integrante do processo educativo asformas de organização coletiva criadas pelos adultos com vista asolucionar os problemas cotidianos”.

    Quando se fala em levar em consideração os interesses do educando, suas

    condições de vida e trabalho, na pratica tais fatores não só não são levados em

    consideração como muitas vezes são assinalados como fatores que dificultam as

    reais possibilidades de desenvolvimento dos alunos sendo apontados inclusive

    como causas da evasão nas turmas de EJA, como afirmam alguns professores.

    Quando questionados a respeito dos altos índices de evasão, o fator trabalho é

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    apontado tanto pelos professores como pelos alunos como um fator que dificulta a

    retomada e continuação dos estudos, como na fala:   “eles trabalham, uma hora

    eles estão aqui, outra hora estão Ipojuca, vai pro interior, vai pra tudo que é

    canto...”(professora Rosa). Mais do que isso, o trabalho é apontado pelos próprios

    alunos como um dos principais fatores pelos quais não concluíram a escolarização

    básica na infância, conforme a seguir:

    “ É porque quando eu morava no interior era difícil escola, não tinhaescola e eu trabalhava assim, nessas coisas: roça, limpando mato, aiquando eu completei onze anos fui logo trabalhar em casa de família, aifaz sete meses que eu sai do emprego, ai votei a estudar de novo”(L.M.S, 49 anos. Dona de casa, aluna do módulo 2) .

     Além do trabalho muitos outros fatores são apontados como causadores da

    evasão nas turmas de EJA, mas estes mesmos fatores deveriam ser colocados

    em discussão e não apontados apenas como fatores culpados. São problemas

    próprios do público de EJA, que têm causas sociais, econômicas, que devem ser 

    debatidas em todos os seus porquês, dialogadas e utilizadas como ponto de

    partida para que os alunos enxerguem-se no mundo, como sujeitos trabalhadores,

    participantes de um contexto atual. É a falta deste debate que se reflete na fala daprofessora: “Além do contexto social em que vivem que na maioria das vezes

    dificulta inclusive o acesso dessas pessoas à escola, quando as mesmas chegam

    à escola não se reconhecem, não se encontram”  (professora Maria). É este

    histórico de vida que deve também habitar os temas das aulas e não apenas os

    conteúdos muitas vezes inadequados dos livros didáticos. Seria muito bom que os

    alunos se reconhecessem nas situações discutidas nos temas, se identificassem,

    se encontrassem, como nas palavras da professora Maria. Tais dificuldades são

    apenas apontadas como dificuldades, não há ainda reflexão sobre a realidade,

    como nos fala outra professora: “Eles passam por muitos problemas. Às vezes

    usam a escola pra escapar um pouco mais a questão é financeira, de violência, do

    cansaço, dos que vem do trabalho, às vezes cochilam...É difícil, principalmente

    pros que têm um emprego pesado” (professora Margarida).

    Quando perguntamos aos alunos sobre sua opinião a respeito dos pontos

    positivos e negativos da escola como um todo, na grande maioria dos casos nos

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    deparamos com respostas que se limitam a destacar apenas os aspectos físicos

    (falta de espaço) como negativos, fato relatado tanto para os alunos como para os

    professores:“De positivo tem uma diretora maravilhosa, os funcionários se importamcom a gente, o clima é bom, eles gostam dos alunos e assim os alunosgostam deles. De ruim eu acho que é muito pequeno, não tem espaçopra lazer das crianças” (M.C., 52 anos, aluna do módulo 4).

    Da mesma forma nos coloca uma das professoras sobre o que concebe de

    positivo e de negativo na escola em que trabalha:

    (...) pontos positivos: é o grupo o respeito e também assim, o trabalho

    executado, a transformação do aluno através de leitura, de debates,aulas extra classe... a gente transforma a visão do aluno com temasatuais. Pontos negativos fica difícil: eu acho o espaço físico, eu acho omais negativo o espaço físico, eu não tenho assim...aqui a gente é muitorespeitada cada um faz o seu trabalho todo mundo é muitocomprometido, eu tenho dificuldade de falar num ponto negativo daescola. Ruim pra mim é o espaço”.

    Diante destas perspectivas apresentadas na maioria das respostas é que

    observamos a reduzida função social que a escola tem cumprido, denotado na

    resposta somente sobre o espaço físico, bem como em respostas sobre o que os

    alunos esperam depois de concluir esta fase dos estudos. Suas perspectivas de

    futuro sobre a sua formação realmente demonstram o conceito reduzido que

    muitas vezes se atribui à função da EJA, ligada somente à alfabetização:  “Eu vou

    escrever melhor, vou conseguir anotar as coisas, hoje quem anota pra mim é o

    meu neto. Algum recado, alguma coisa importante” (I.S., 66 anos, aluna do

    módulo 2). Além das perspectivas de futuro, o motivo que os traz de volta à

    escola, diante da pouca discussão e reflexão entre alunos e professores sobre os

    propósitos da EJA, aparece de forma bastante restrita também. Na pergunta quefizemos sobre os motivos que os traz de volta a escola, muitas das respostas se

    assemelham com a do exemplo abaixo:

    Eu quero aprende mais umas coisas, estudar né, porque a pessoa semestudar sem aprender a pegar ônibus, sem conhecer dinheiro é muitoruim, vai pra o Bompreço fazer feira não sabe os números, não sabe oque é dois o que é três (,,,), às vezes a patroa sai ai liga uma pessoa:anota ai um telefone, anota ai um endereço, quando ela chega eu digo,tudo isso precisa. (V.L. 53 anos, aluna do módulo 3).

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     As práticas perpetuam a idéia de que a escola oferece oportunidade para os

    que nunca a tiveram e agora a tem. A evolução conquistada no acesso à

    escolarização ainda não alcançou igual proporção na conscientização dos alunos

    sobre as causas que os fez não poder estudar antes, não ter antes oportunidades

    merecidas e direitos garantidos e efetivados. Há muita força de vontade em

    adultos que trabalham muito e vão à escola à noite, mas é preciso ampliar a

    percepção, para que não enxerguemos apenas isso, a oportunidade de estudo e

    ponto. A conscientização passa pelo fato de que a exclusão social atinge a escola

    e faz com que a educação fundamental, com seus processos deficientes produza

    um público que irá engrossar o número de matrículas da EJA mais cedo ou maistarde. É isso que a formação de cidadãos evita. A educação para a reflexão e

    ação de sujeitos autônomos, emancipados, conscientes de seu papel na

    sociedade é que irá evitar a repetição de tantos casos de falta de oportunidade de

    estudar, de abandono dos estudos para trabalhar e ajudar no sustento da família,

    como os relatados neste trabalho.

    Particularmente esperávamos mais. A importância que atribuímos a este

    trabalho foi primeiramente clarificar nossa percepção, acerca de que apesar de

    muita produção teórica, muitos congressos até mesmo internacionais, a realidade

    educacional ainda anda décadas atrás. Os propósitos legais são modernos,

    contextualizados e detalhados, mas as práticas ainda acompanham os modelos

    antigos, ainda se reportam a modelos que perpetuam os mesmos problemas, a

    evasão, a falta de compreensão sobre o que estão fazendo lá, dos reais motivos

    que os levou de volta à escola e para fora dela no passado. Do ponto em que se

    está hoje para a transformação das consciências ainda há muito trabalho a fazer,

    muitos mitos e senso comum a derrubar e senso crítico, reflexão e ação autônomaa construir, mas é preciso que seja com os sujeitos, junto com eles, pois a

    situação de atual submissão da consciência é fruto das políticas e teorias do

    “para” eles, “para” o povo e nunca com o povo, com os sujeitos alunos e

    professores.

    Sobre o que esperam da escola? Parece tão pouco: Ler, escrever, ler 

    nomes de ônibus, assinar documentos, tirar carteira de habilitação. E o restante?

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     Ainda não demonstram perspectivas maiores nem a prática tem algo mais

    significativo do que cumprir um programa que não diz muito deles nem pra eles.

    Nós esperávamos que eles esperassem mais da escola, mas percebemos que

    esperam tão pouco talvez porque a escola oferece muito pouco também. Não dá

    espaço a maiores expectativas, não incentiva esperança, criticidade. Já que os

    alunos ainda não são sujeitos o que nos leva a achar que a escola já é escola?

    REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

    http://www.mundodosfilosofos.com.br/vanderlei7.htm

    http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2005/09/329060.shtml

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    BRASIL. Constituição (1934).   Constituição da República Federativa do Brasil.

     Acesso em 11/01/08. Disponível em

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    Brasília, DF: Senado, 1988. Disponível em:

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    BRASIL. Parecer    CEB 11/00 - Dispõe sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais

    para a Educação de Jovens e Adultos. De 10 de maio de 2000.

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    24

    BRASIL. Resolução CNE/CEB 001/00 - Estabelece as Diretrizes Curriculares

    Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos. De 5 de julho de 2000.

    BRASIL. Lei de Diretrizes e bases da Educação: (Lei 9.394/96) e legislação

    correlata / Coordenação André Arruda.- Rio de janeiro: Roma Victor, 2004.

    CHIZZOTTI, Antonio. Pesquisa emCiências Humanas e Sociais. 6. Ed. São

    Paulo. Cortez, 2003.

    COSTA, Lia Parente. Continuidade e descontinuidades das políticas de educação

    básica: o caso de Pernambuco.Editora Universitária da UFPE, Recife-PE,2006.

    FÊNIX Revista Pernambucana de Educação Popular e de Educação de Adultos -

    NUPEP. Recife: Edições Bagaço, nº 0, jan/dez. 2002.

    FREIRE, Paulo. Conscientização- teoria e prática da libertação- uma introdução ao

    pensamento de Paulo Freire. Editora Centauro - São Paulo-SP, 1980.

    FREIRE,Paulo. Pedagogia da Autonomia – Saberes necessários à prática

    educativa. Editora Paz e Terra – São Paulo –SP 1996.

    GENTILI, Pablo. Pedagogia da Exclusão – Crítica ao neoliberalismo em educação.

    4. Ed. Petrópolis. Vozes, 1995.

    MARCONI, Eva M. e LAKATOS, Marina de A.  Fundamentos da Metodologia

    Científica. 6. Ed. São Paulo. Atlas, 2007.

    PINHEIRO, Marlene Emília de Lemos, Salto para o futuro-educação de jovens e

    adultos - Ministério da Educação,SEED, Brasília- DF,1999.

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    SOUZA, João Francisco. A educação escolar, nosso fazer maior, desafia nosso

    saber: Educação de J ovens e Adultos.Recife, NUPEP, Edições Bagaço,2000.

    SOUZA,João Francisco. A educação de jovens e adultos no Brasil e no mundo:

    Edições Bagaço, Recife-PE,2000.

    SOUZA, João Francisco.   Antologia para cadeira de sociologia da educação

    brasileira. Centro de Educação, Recife PE, 2005.

    VIEIRA, Sofia Lerche (org).  Gestão da escola – desafios a enfrentar. Rio deJaneiro, RJ. Biblioteca ANPAE, 2002.

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    APÊNDICES:

    Questionário aplicado aos alunosIniciais__________ 

    Idade___________ 

    Profissão____________ 

    1- O que traz você à escola? (Por qual motivo estuda?)

    2- Por que motivo (s) não estudou regularmente antes? (Na “idade própria”)

    3- Quais os pontos positivos e negativos que você vê na escola?

    4- Você consegue aprender o que o professor (a) ensina? Se não, porque?5- Você acha que estudar é importante? Por que?

    6- O que pretende fazer após concluir essa fase dos estudos?

    Questionário aplicado aos professores:

    Nome fictício:_______________ 

    Formação: _________________ 

    Tempo de docência e na EJA:________________ 

    1. Na sua opinião,qual a importância da EJA?

    2. Como se tornou professor da EJA?

    3. Cite 3 pontos positivos e 3 pontos negativos sobre a situação da escola

    atualmente:

    4. Você planeja suas aulas de que forma?

    5. Você considera sua prática em sala de aula eficiente? Por quê?

    6. A que você atribui o grande índice de evasão nas turmas de EJA?

    7. Qual a maior dificuldade enfrentada para a realização da sua prática

    pedagógica?

    8. Nos descreva algumas características dos seus alunos de EJA.