A funcionalidade da biblioteca no contexto escolar – resgatando o prazer da leitura na escola

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Relato de experiência - Eixo Temático III Educação A FUNCIONALIDADE DA BIBLIOTECA NO CONTEXTO ESCOLAR RESGATANDO O PRAZER DA LEITURA NA ESCOLA Marilia Fabiana Pires Mendonça Universidade Federal do Rio Grande do Norte [email protected] Vanessa Maria da Silva Clemente Universidade Federal do Rio Grande do Norte [email protected] Este trabalho é um recorte do Projeto Ecologia da Leitura, desenvolvido no curso de Pedagogia da UFRN e tem como objetivo investigar o funcionamento da biblioteca como lugar de formação leitora e as práticas docentes referentes à leitura de literatura. A pesquisa foi realizada em uma escola de Natal-RN e se constitui em: observação dos espaços dedicados à leitura; encontro de formação com os professores; implementação de uma sessão de leitura; realização de entrevistas. Como referencial teórico optou-se por Amarilha (2009), Garcia (1989), Leal (2002). Verificou-se como resultado o não aproveitamento dos espaços destinados a leitura, devido a falta de motivação e não utilização do acervo. Para que as atividades desenvolvidas na biblioteca obtenham resultados, é preciso que este espaço esteja articulado com a sala de aula. Palavras-chave: Literatura Infantil; biblioteca; formação do leitor. Introdução Este trabalho é um recorte do Projeto Ecologia da Leitura, desenvolvido na disciplina Literatura Infantil I, no curso de Pedagogia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e tem como objetivo investigar o funcionamento da biblioteca como lugar de formação do leitor e o desenvolvimento de práticas docentes referentes à leitura literária promovidas pela escola. A relevância dessa pesquisa está na possibilidade de resgatar o papel da biblioteca como espaço destinado a formação leitora e também de oferecer aos docentes subsídios teórico-metodológicos para o trabalho com o texto literário de qualidade. O lócus da pesquisa foi uma escola da rede estadual do Município de Natal/RN, situada no Bairro Soledade I, zona administrativa norte da cidade, onde foram escolhidas duas turmas do 3º ano do ensino fundamental.

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Relato de experiência - Eixo Temático III – Educação

A FUNCIONALIDADE DA BIBLIOTECA NO CONTEXTO ESCOLAR –

RESGATANDO O PRAZER DA LEITURA NA ESCOLA

Marilia Fabiana Pires Mendonça

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – [email protected]

Vanessa Maria da Silva Clemente

Universidade Federal do Rio Grande do Norte – [email protected]

Este trabalho é um recorte do Projeto Ecologia da Leitura, desenvolvido no curso de

Pedagogia da UFRN e tem como objetivo investigar o funcionamento da biblioteca

como lugar de formação leitora e as práticas docentes referentes à leitura de literatura.

A pesquisa foi realizada em uma escola de Natal-RN e se constitui em: observação dos

espaços dedicados à leitura; encontro de formação com os professores; implementação

de uma sessão de leitura; realização de entrevistas. Como referencial teórico optou-se

por Amarilha (2009), Garcia (1989), Leal (2002). Verificou-se como resultado o não

aproveitamento dos espaços destinados a leitura, devido a falta de motivação e não

utilização do acervo. Para que as atividades desenvolvidas na biblioteca obtenham

resultados, é preciso que este espaço esteja articulado com a sala de aula.

Palavras-chave: Literatura Infantil; biblioteca; formação do leitor.

Introdução

Este trabalho é um recorte do Projeto Ecologia da Leitura, desenvolvido na

disciplina Literatura Infantil I, no curso de Pedagogia da Universidade Federal do Rio

Grande do Norte e tem como objetivo investigar o funcionamento da biblioteca como

lugar de formação do leitor e o desenvolvimento de práticas docentes referentes à leitura

literária promovidas pela escola. A relevância dessa pesquisa está na possibilidade de

resgatar o papel da biblioteca como espaço destinado a formação leitora e também de

oferecer aos docentes subsídios teórico-metodológicos para o trabalho com o texto

literário de qualidade.

O lócus da pesquisa foi uma escola da rede estadual do Município de Natal/RN,

situada no Bairro Soledade I, zona administrativa norte da cidade, onde foram

escolhidas duas turmas do 3º ano do ensino fundamental.

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A pesquisa partiu da relevância em resgatar a prática da leitura do texto literário

na escola já que é através da leitura que o individuo consegue a sua ascensão social e

questionar o meio em que vive.

Assim, o estudo contribui transformando os espaços da escola em um espaço

vivo e ativo e principalmente resgatando a funcionalidade da biblioteca como espaço de

interação verbal, visual e social.

Para Garcia (1989) uma biblioteca funcional é:

aquela que desempenha uma função específica dentro da

programação e técnicas escolares. Ambiente carregado de

motivações é o local por excelência onde a criança aprende a

gostar de ler, a se auto-expressar, a se educar (GARCIA, 1989,

p. 14)

Seguindo esta reflexão, a pesquisa buscou analisar se os espaços destinados à

leitura na referida escola oferecem esse ambiente prazeroso que objetiva formar jovens

para uma leitura crítica e reflexiva, e se a leitura do texto literário faz parte do projeto

pedagógico da escola.

Eixo estruturador e currículo escolar

Ao longo dos anos, a sociedade vem se defrontando com uma série de mudanças

em todos os aspectos: econômico, político, social, e claro, educacional. À medida que

uma sociedade passa por profundas mudanças, a escola começa a discutir meios de se

reorganizar, de modo a atender às demandas e exigências da nova sociedade que se

impõe.

Uma grande crítica tem sido feita à organização do currículo escolar quanto à

seleção e organização dos conteúdos a serem ensinados. Surgem então novas propostas,

a fim de dinamizar e contextualizar o currículo à realidade e interesses dos alunos.

O Currículo Integrado é uma dessas novas propostas e atende prioritariamente ao

que o aluno deseja aprender, respeitando os interesses e necessidades de cada um, ao

mesmo tempo em que valoriza os conhecimentos prévios e as experiências desses

alunos. O princípio pedagógico que rege este Currículo é a concepção sócio-cultural de

educação, que atribui grande importância à mediação em todo o processo de ensino-

aprendizagem.

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Dentro desse contexto, o eixo estruturador garante que, independentemente dos

conteúdos, haja a articulação do conhecimento a ser produzido e sistematizado. Na

escola, a biblioteca assume um papel integrador muito grande, mas que por vezes é

desconhecido ou ignorado. De acordo com Leal (2002), a biblioteca é um “lugar de

diversidade: múltiplas linguagens, múltiplos sujeitos, múltiplos suportes, múltiplos

textos, múltiplos objetivos [...]”. É o lugar perfeito para estabelecer um conhecimento

diversificado e principalmente desenvolver nos alunos o prazer pela leitura de literatura.

Do ponto de vista metodológico, a biblioteca deveria ser um lugar onde

estratégias são constantemente criadas de modo a conduzir os alunos a um processo

constante de perguntas, sendo lá onde encontrarão as respostas. Dessa forma, a

biblioteca contribui para o desenvolvimento dos alunos, valorizando a leitura de textos

literários e outras leituras.

Mas infelizmente a escola tem se deparado com um problema. Poucos alunos

freqüentam as bibliotecas e tem o desejo ávido de questionar e lá encontrar respostas

para os seus anseios e dúvidas. Poucos alunos têm o gosto pela leitura. Assim sendo,

qual seria uma possível solução à este problema? Devemos tornar a biblioteca um lugar

interessante, que cative a atenção destes alunos. Mas a questão é: como?

A biblioteca é uma instituição que abriga uma perspectiva mais ampla do

homem e de seus avanços, abraça a multiplicidade (diversidade), convive o erudito e o

popular, o clássico e o irreverente e que reconhece a voz das minorias. Além disso, a

biblioteca abriga a nossa memória e abriga a literatura. Segundo Amarilha (2009),

“memória e imaginação são princípios de sustentação da vida”.

Para que este universo seja de conhecimento dos alunos, é importante que se

estabeleça um trabalho sistemático que consista no incentivo à frequencia voluntária e à

pesquisa individual, permitindo o acesso fácil e imediato às fontes de conhecimento,

sendo um ambiente de adequação à pesquisa, ao estudo e à recreação aliados a uma

programação em colaboração com os professores.

Desta forma, a biblioteca pode constar de coleções de livros, CD’s (de canções e

histórias); DVD’s (filmes, histórias, canções, entrevistas, depoimentos, curiosidades);

acervo de fotografias; recortes; jogos e brinquedos. Isso porque o uso de audiovisuais

dinamiza a biblioteca, atraindo os alunos que não sentem tanto interesse pelos livros.

Quanto à organização deste espaço, é imprescindível que haja orientação de pesquisa

aos educandos e uma pessoa capacitada que motive o aluno a pesquisar.

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Como afirma Leal (2002),

fazer da biblioteca o eixo estruturador do currículo requer, para além de reunir disciplinas e projetos, reunir pessoas, seres humanos em

dialogia e, nesse sentido, não pode ser desculpa para o

desenvolvimento de um trabalho dessa natureza a quantidade de acervo. O que conta é a qualidade do que temos e a qualidade da

criatividade, da identidade daqueles que se dispõem a fazer do espaço

escolar um espaço de vida (LEAL, 2002, p. 329).

São necessários à escola e ao ambiente da biblioteca, profissionais

comprometidos com o uso deste espaço de maneira adequada, e este certamente não é

um trabalho simples, mas que exige conhecimento, criatividade, motivação e força de

vontade.

Ecologia do espaço de leitura na escola

A escola escolhida para a pesquisa foi a Escola Estadual Rômulo Wanderley,

que se encontra localizada na Rua Paratinga, Bairro Soledade I.

As observações dos espaços destinados à leitura na escola constituíram na

primeira etapa prática do trabalho. Esta etapa teve o objetivo de levantar as condições

oferecidas pela escola em relação aos espaços e às atividades de leitura do texto

literário, bem como conhecer as implicações entre o ambiente e as práticas pedagógicas

relativas à leitura e aos fundamentos teórico-práticos necessários para favorecer a

formação do leitor.

Os espaços observados na escola correspondem a todos destinados à leitura, da

sala de vídeo à biblioteca. O primeiro contato do grupo com este espaço ocorreu no dia

04 de junho de 2009 às 14h00min e terminou às 15h30min.

A princípio, foi percebido que a sala de vídeo também funciona como biblioteca.

A sala é ampla e conta com a presença de uma televisão, aparelho de DVD, aparelho de

som, quatro prateleiras de livros, e muitas cadeiras dispostas em filas organizadas de

forma tradicional, todas de frente para a televisão. Nas prateleiras havia poucos livros

disponíveis para pesquisas dos alunos. O acervo contava com livros variados:

paradidáticos; livros de literatura com autores como Machado de Assis, Érico

Veríssimo, José de Alencar, Rubem Fonseca, Monteiro Lobato, além de enciclopédias e

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de coleções como: coleção “A Vida dos Grandes Pensadores” e o “Tratado de Ciências

Pedagógicas” e uma coleção de livros de História Geral e do Brasil; livros de poemas,

com autores como Carlos Drummond de Andrade e Vinícius de Moraes; literatura

infanto-juvenil; livros didáticos de todas as disciplinas do ensino fundamental; livros de

filosofia e sociologia.

A responsável pela sala é uma ex-professora de História, que por motivos de

doença, se ausentou das atividades em sala de aula e foi encaminhada pelo Estado para

ser responsável por este ambiente. De acordo com a mesma, antes de assumir a sala de

vídeo, o Estado, através do DIRED (Diretoria Regional de Educação), a encaminhou

para um curso de formação, para que ela obtivesse conhecimentos de biblioteconomia.

Logo em seguida foi observada a sala de leitura, que funciona em uma sala

vizinha à sala de vídeo. Nessa sala encontrava-se um grande acervo, praticamente todo

de literatura infantil, expostos em prateleiras que circuncidam a sala. Ao centro, há uma

grande mesa e diversas cadeiras, para a realização do ato da leitura. Além dos livros de

literatura, havia muitas revistas em quadrinhos da Turma da Mônica e da Disney,

muitos fantoches, jogos educativos e dicionários. Algo que chamou a atenção nesta sala

foi a presença de um Baú da Leitura. De acordo com bibliotecária, este Baú percorre

todas as salas pelo menos uma vez por semana levando alguns livros para que as

crianças possam escolher e ler na sala de aula.

O acervo da sala é adequado à leitura, todos de uma boa autoria e bem

conservados. Encontramos muitos livros de autores modernos e clássicos como Jorge

Amado, Sylvia Orthof, Monteiro Lobato, Ana Maria Machado, Hans Christian

Andersen, Lewis Carroll, Clarisse Lispector, Ruth Rocha e Luis Fernando Veríssimo.

De acordo com a bibliotecária, os livros são enviados pelo MEC através do

Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE). Esse programa visa à consolidação de

uma sociedade letrada e alfabetizada através do acervo disponibilizado às bibliotecas.

Assim, o PNBE tem como objetivo:

A democratização do acesso às fontes de informação; o fomento

à leitura e à formação de alunos e professores leitores; e o apoio

à atualização e ao desenvolvimento profissional do professor são

os principais objetivos do Programa Nacional Biblioteca da

Escola – PNBE. Por meio da distribuição de acervos de obras de

literatura, de pesquisa e de referência e outros materiais relativos

ao currículo nas áreas de conhecimento da educação básica, o

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Ministério da Educação apoia o cidadão no exercício da

reflexão, da criatividade e da crítica (BRASIL, 2010).

Além do programa, alguns livros são adquiridos pela própria escola. Uma vez

por ano, a escola recebe um cheque (o valor não foi informado) e com o dinheiro

proveniente deste cheque, durante a Bienal do Livro, são adquiridos novos livros para o

acervo. Quem escolhe esses livros geralmente, são as professoras de português.

Quando questionada sobre a frequencia dos alunos, ela afirmou que é sempre

muito boa. Muitos alunos procuram estes ambientes. Os livros também podem ser

emprestados durante 08 dias, podendo ser renovados depois por mais 08 dias. Os que

são mais emprestados são os de poesias e alguns paradidáticos. Em um livro de

registros, foi visto que no ano de 2008, só no turno vespertino, foram feitos 835

empréstimos.

Apesar de todos os privilégios presentes na escola, percebe-se que a sala de

leitura fica sempre fechada com um cadeado, sendo aberta apenas no dia da observação,

o que mostra o descumprimento com as atividades de leitura que a professora revelou

que existia na escola em uma das conversas no momento do levantamento dos dados.

Dessa maneira a pesquisa continua com o encontro de formação.

Encontro de formação com os professores

Após a visita para a observação dos espaços destinados à prática da leitura na

escola, agendamos o encontro de formação de professores para o dia 09 de junho de

2009 às 13h00. O encontro aconteceu com duas professoras, ambas de turmas do 3°

ano, a vice-diretora e a bibliotecária.

Durante o encontro, que aconteceu na sala de vídeo, apresentou-se um seminário

que tratou de tecer considerações a respeito da funcionalidade da biblioteca no contexto

escolar. À medida que havia o diálogo, as professoras participavam expondo suas

dúvidas e opiniões. Assim, a apresentação foi bem dinâmica e esclarecedora.

Discutiu-se acerca da biblioteca como eixo estruturador do currículo escolar,

sobre a importância da leitura na vida do aluno, sobre métodos e estratégias que os

professores e a bibliotecária poderiam dispor para melhorar o aproveitamento dos

recursos e também sobre a contribuição do texto literário. Nessas discussões buscou-se

resgatar a funcionalidade da biblioteca como também o uso do texto literário na escola.

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Ao final, as professoras envolvidas nesse momento avaliaram como muito

produtiva e bastante interessante a discussão e que teve troca de informações e

aprofundamento das idéias a serem usadas na escola.

O momento da leitura da história

Logo após a etapa de formação com as professoras, passamos para a terceira

parte da realização da nossa pesquisa, a leitura de um texto literário para duas turmas do

3° ano, cujas professoras participaram do momento. As duas turmas eram bem

pequenas, e por este motivo, as professoras solicitaram que os alunos se reunissem na

sala de vídeo para que todos pudessem participar da leitura.

O texto escolhido para a leitura foi o conto “O Bisavô e a dentadura” de Sylvia

Orthof. Este conto está presente no livro “Quem conta um conto?” juntamente com

outros textos de diversos autores. A escolha do conto foi motivada porque o livro fazia

parte do acervo da sala de leitura da escola e, portanto, os alunos poderiam fazer a

leitura deste e de outros contos posteriormente. Decidido o conto a ser lido, seguiu-se o

momento da leitura.

A narrativa foi lida, observando as entonações das vozes e sotaques das

personagens, fazendo uma leitura envolvente de modo a provocar um maior

envolvimento das crianças com o conto. A pesquisadora adotou a Metodologia da

Andaimagem de Graves & Graves (1995) em que são seguidas duas fases no processo

da mediação: a fase de planejamento e de implementação.

O momento da pré-leitura encontra-se na fase da implementação, constou de

perguntas feitas às crianças sobre os possíveis acontecimentos da história, a partir do

título e das ilustrações presentes na capa. As respostas foram diversas e muitas crianças

participaram. Uma delas nos disse que achava que a dentadura do bisavô iria fugir.

Outra afirmou que a dentadura iria quebrar. Perguntamos também se alguma delas já

conhecia o conto e apenas um menino disse ter conhecimento da história.

Depois deste período, passamos para o momento da leitura da história. As

crianças ficaram bastante quietas durante este momento, prestando bastante atenção a

cada momento e riam bastante nas partes mais engraçadas do texto.

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Ao término da leitura, no momento da pós-leitura, fizemos mais algumas

perguntas às crianças para verificarmos se as hipóteses levantadas antes da leitura se

confirmaram ou não. Algumas crianças disseram imaginar um outro final para a

história, mas que o verdadeiro final foi muito melhor. Outras disseram que se

surpreenderam com o final. Mas todas concordaram que a história tinha sido muito

engraçada e- divertida.

No momento da leitura, as professoras que também estavam presentes se

mostraram bem à vontade com nossa presença e também riram bastante na hora da

leitura. Posteriormente perguntamos se elas já conheciam a história e se conheciam essa

metodologia de leitura e elas disseram que não. Sendo assim, percebe-se pouco domínio

de leitura nas professoras. Logo após a leitura partimos para as entrevistas.

Entrevistas

A entrevista foi realizada com apenas uma das professoras presente no encontro

e no momento da leitura. Das crianças, selecionamos uma amostra de cada turma,

somando ao todo cinco crianças. Os nomes da professora e das crianças foram

substituídos. Seguem abaixo reproduzidos, trechos das entrevistas.

Entrevista 01 - PROFESSORA

Nome: Marta

Série que ensina: 3° ano

Pesquisadora = Há quanto tempo a senhora ensina?

Professora = Ensino há 23 anos, mas passei cinco anos afastada da sala e fiquei nesse tempo

na sala de vídeo aqui na escola mesmo, mas agora o Estado só manda pra cá (sala de vídeo) os professores que são afastados da sala de aula por motivo de saúde.

Pesquisadora = Como a senhora trabalha a leitura em sala de aula?

Professora = Na minha turma, toda segunda o Baú da Leitura vai lá levar livrinhos pras crianças lerem. Aí nesse momento, eu divido a classe em grupos e cada grupo escolhe o livro

que preferir. Depois eles lêem a história e apresentam uma peça pro restante da turma. Eles

adoram fazer isso (as peças), mas se envergonham se eu levo a turma pra apresentar em outra sala ou no pátio mesmo pras outras crianças. Eu até estou pensando em montar um palco lá na

sala pra eles. Também vou comprar um microfone pra quando eles forem apresentar em outras

salas, pra ficar mais alta as vozes deles.

Pesquisadora = Com que frequencia a senhora lê pra eles?

Professora = Eu tento ler sempre, mas às vezes eles têm tarefas atrasadas aí não dá. Mas

sempre leio pra eles sim. Gosto muito de trabalhar historinhas com fundo moral sabe. Adoro as

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fábulas de Monteiro Lobato.

Pesquisadora = A senhora conhece e trabalha com autores mais modernos? Professora = Trabalho sim

Pesquisadora = Pode nos citar algum?

Professora = Gosto muito de Ana Maria Machado... (pensativa)...

Pesquisadora = A senhora incentiva seus alunos a frequentar a biblioteca?

Professora = Incentivo sim... Eu gosto muito de ler sabe, e quero que eles gostem também, então sempre incentivo a leitura e gosto de trabalhar isso com eles. Acho que pra ensinar a

gente tem que amar as crianças, senão não dá certo. Eu amo essas crianças e amo trabalhar com

elas. O tempo que fiquei afastado, eu senti falta sabe. Eles dão trabalho às vezes, mas é coisa de criança mesmo. Se ficasse quieto sempre era porque tava doente. (Risos)

Entrevista 02 - Criança n° 01

Nome: Rubéns Idade: 10 anos

Repetente: Sim

Frequenta a biblioteca? Às vezes

Pesquisadora = Você sabe ler?

Aluno = Sei sim.

Pesquisadora = Você gosta de ler?

Aluno = Gosto. Gosto de ler histórias e desenhar.

Pesquisadora = Sua professora leva vocês para sala de leitura? Aluno = Não.

Pesquisadora = Ela lê ou conta histórias para vocês na sala? Aluno = Lê. Mas só às vezes. Não é sempre não.

Pesquisadora = Na sua casa tem alguém que lê ou conta histórias pra você? Aluno = Não. Minha mãe não sabe ler não.

Pesquisadora = Você gostou da história de hoje?

Aluno = (Rindo) Gostei sim. Foi engraçada!

Pesquisadora = Você achava que a história ia ser do jeitinho que foi, ou imaginava que ia

acontecer alguma outra coisa? Aluno = Eu pensava que o avô ia colocar a dentadura na boca. Mas foi melhor do jeito que

você contou. Ficou engraçado!

Entrevista 03 - Criança n° 02:

Nome: Maria

Idade: 7 anos

Repetente: Não

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Frequenta a biblioteca? Não

Pesquisadora = Porque você não vai à biblioteca? Aluno = Porque a professora não deixa.

Pesquisadora = Mas ela lê ou conta histórias para vocês na sala? Com que frequencia?

Aluno = Lê, mas só de vez em quando.

Pesquisadora = E você gosta de ouvir as histórias?

Aluno = Gosto.

Pesquisadora = E de ler? Você gosta?

Aluno = Gosto. Mas não leio muito não.

Pesquisadora = Por quê?

Aluno = Porque ainda tô aprendendo a ler.

Pesquisadora = Você gostou da história de hoje?

Aluno = Gostei. Foi engraçado!

Pesquisadora = De que parte você mais gostou?

Aluno = Do final, quando o bisavô colocou a dentadura na água.

Pesquisadora = Tem alguém que ler histórias pra você em casa?

Aluno = Não.

Entrevista 04 - Criança n° 03

Nome: Joãozinho

Idade: 9 anos

Repetente: Não Frequenta a biblioteca? Às vezes

Pesquisadora = Você sabe ler? Aluno = Ainda tô aprendendo.

Pesquisadora = Alguém na sua casa conta ou lê historinhas pra você?

Aluno = Minha mãe lê pra mim. Às vezes eu levo uns livrinhos daqui e ela lê pra mim em casa.

Pesquisadora = E você gosta de ouvir as histórias que ela conta? Aluno = Gosto.

Pesquisadora = E aqui na escola? A professora também conta história? Aluno = Conta.

Pesquisadora = Ela leva vocês para sala de leitura? Aluno = Leva não.

Pesquisadora = Você gostou da história de hoje? Que parte você gostou mais? Aluno = Gostei. Mas eu pensei que a dentadura fosse fugir e o bisavô ia atrás dela. Mas do

jeito que foi eu gostei também. Foi até mais engraçado (Rindo).

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Entrevista 05 - Criança n° 04

Nome: Pedro

Idade: 9 anos

Repetente: Não

Frequenta a biblioteca? Às vezes

Pesquisadora = Você sabe ler?

Aluno = Não.

Pesquisadora = Alguém na sua casa conta ou lê historinhas pra você?

Aluno = Minha mãe.

Pesquisadora = E você gosta de ouvir as histórias que ela conta?

Aluno = Gosto. Eu gosto das histórias de passarinho que ela conta.

Pesquisadora = E aqui na escola? A professora também conta história?

Aluno = Conta.

Pesquisadora = E você gosta das histórias que ela conta?

Aluno = Gosto também.

Pesquisadora = Ela leva vocês para sala de leitura? Aluno = Não, mas às vezes o Baú da Leitura vai lá na sala da gente pra gente ler os livrinhos.

Mas eu não sei ler, aí os outros meninos que sabem, lêem pra mim.

Pesquisadora = Você gostou da história de hoje? Que parte você gostou mais?

Aluno = Gostei. Eu também gosto de história engraçada assim. Eu gostei daquela parte que o

avô colocou a dentadura no copo da Maroca. (Rindo)

Entrevista 06 - Criança n° 05

Nome: Juliana Idade: 7 anos

Repetente: Não

Frequenta a biblioteca? Às vezes

Pesquisadora = Você sabe ler?

Aluno = Não.

Pesquisadora = Alguém na sua casa conta ou lê historinhas para você?

Aluno = Minha irmã lê pra mim.

Pesquisadora = Ela é mais velha que você? Quantos anos ela tem?

Aluno = Acho que ela tem 11 anos.

Pesquisadora = E você gosta de ouvir as histórias que ela conta?

Aluno = Gosto. Eu adoro historinhas.

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Pesquisadora = E aqui na escola? A professora também conta história?

Aluno = Conta às vezes.

Pesquisadora = Você gostou da história de hoje? Que parte você gostou mais?

Aluno = Eu gostei da parte do filtro e da parte da Maroca.

De acordo com as analises das entrevistas, percebe-se que o que a professora nos

contou nem sempre acontece. Os alunos demonstraram grande interesse pela prática da

leitura, mas essa prática de fato não acontece nos espaços da escola.

Considerações finais

Com o decorrer da observação realizada, verificou-se uma divergência entre as

respostas dos alunos e das professoras no que se refere à prática de leitura em sala de

aula e ao incentivo a ida a biblioteca. Constatou-se a pouca utilização dos espaços de

leitura pelos alunos e apesar da boa organização e acervo não existe um trabalho

concreto que articule biblioteca e sala de aula e favoreça a formação leitora dos

aprendizes.

A leitura em sua forma descontraída e prazerosa é uma atividade que ocupa um

pequeno espaço na vida escolar diária dos alunos. Apesar de estes apresentarem um

grande interesse pela leitura, essa realidade não é uma constante em suas atividades

diárias.

Para construir um país de leitores é preciso inserir a leitura na rotina da escola.

Como vimos em Amarilha (2009), memória e imaginação são princípios de sustentação

da vida. Conduzir às crianças a exercer estas capacidades é dever da escola. Uma boa

articulação entre coordenação pedagógica, professores e bibliotecários pode transformar

as relações entre os alunos e a leitura. Para que as crianças cresçam sendo leitoras,

devemos incentivá-las desde cedo a descobrir as maravilhas que o mundo da leitura

pode oferecer.

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Referências

AMARILHA, Marly. Estão Mortas as Fadas? Literatura infantil e prática pedagógica.

8. Ed. Petrópolis - RJ: Vozes, 2009.

BRASIL. Ministério da Educação. Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE)

- 2010. Disponível em: http://www.fnde.gov.br/index.php/programas-biblioteca-da-

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1989.

GRAVES, Michel F., GRAVES, Bonnie B. The scaffolded reading experience: a

flexible framework for helping students get the most out of text. Reading. v. 29, n. 1, p.

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LEAL, Leiva de Figueiredo Viana. Biblioteca escolar como eixo estruturador do

currículo escolar. In: RÖSING, Tania Mariza Kuchenbecker; Becker, Paulo Ricardo

(Org.). Leitura e animação cultural: repensando a escola e a biblioteca. Passo

Fundo: Ed. Universitária, 2002.

ORTHOF, Sylvia. O bisavô e a dentadura. In: MACHADO, Ana Maria et al. Quem

conta um conto? São Paulo: FTD, 2001. p. 53-59.