A greve dos ônibus em Salvador - cpvsp.org.br · *)ç(r (f) Ano II — N0 11 —Junho e Julho de...

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*)ç(r (f) Ano II N 0 11 —Junho e Julho de 1990 Salvador/Bahia —Jornal Popular Mensal A greve dos ônibus em Salvador Na luta pela liberdade Este mês foi um mês de greves. Por que? Simples- mente os trabalhadores sentiram que em todo este Plano Collor a única coisa que era para valer era o tremendo arrocho salarial. Inflação zero? Nem um mês existiu. Agora, arrocho salarial, aumento zero dos salários, es- se funcionou. Os trabalhadores reagiram. Reagiram com a greve. Uma das greves afetou bastante a população: a greve dos motoristas, tro- cadores e despachantes dos ônibus. Vamos esclarecer bem as responsabilidades por esta greve tão prolonga- da. Em primeiro lugar: os trabalhadores ganharam no Tri- bunal Regional do Trabalho - o Tribunal considerou justo o aumento de 164%, para compensar a inflação dos últimos meses. Esse aumento deveria ser pago até o dia 5 de junho. Não foi pago e os trabalhadores en- traram em greve. Durante a greve os trabalhadores sempre procuraram negociar. Apresentaram várias propostas. Uma das propostas visava o parcelamento do aumento durante três meses, maio, junho e julho. Os patrões permane- ceram sempre na maior intransigência. O único que aceitavam era dar 20% a título de adiantamento. Diante da intransigência dos patrões, diante dos problemas. que a greve causava à população, os trabalhadores fizeram uma outra proposta, agora ao Governo: colocariam os ônibus para funcionar, mas o povo entraria pela frente, sem pagar. 0 Governo entretanto preferiu ficar do lado dos patrões. Colocou a polícia na rua, criou um clima de tensão na cidade toda, bateu, ameaçou, prendeu. Os problemas enfrentados pela população não foram portanto de responsabilidade dos trabalhadores. Estes defenderam, sempre com muita consciência, o direito legítimo de greve e a recomposição de seus sa- lários. Os problemas enfrentados pela população são devi- dos única e exclusivamente à intransigência dos patrões e à parcialidade e à truclência do Gover- no. FETAG com nova diretoria Os sindicatos combativos e progressistas consegui- ram, no mês de junho, ganhar a diretoria da FETAG. A antiga diretoria, peiega, que sempre procurou a aliança cum os governos, não quer reconhecer a elei- ção. Primeiro tentou adiar o congresso. Agora alega que a chapa de oposição não estava legal. Em uma palavra: a antiga diretoria procura apelar. Com a nova FETAG a luta dos trabalhadores rurais um importante passo à frente: maiores responsabilida- des - maiores possibilidades. Agora você poderá ser JORNALISTA POPULAR DO OGUNHÊ! Para isso é necessário: escrever uma carta para o Jornal OGUNHÊ dizendo que deseja ser jornalista popular. End.: Rua Gregório de Matos, 51 - 22 andar. Pelourinho - Salvador-Ba. enviar duas fotos 3x3. enviar também uma declaração de uma entidade popular de base (associação, sindicato, grupo de mães, grupo de jovens, grupo de teatro, etc.) dizendo que você participa do trabalho comunitário. fazendo isso você receberá uma carteira de jornalista popular do OGUNHÊ, precisará mandar as notícias das coisas que acontecem no seu bairro ou no seu sindicato ou no seu grupo, e todo mês poderá participar de uma reunião para discutir a linha e os rumos do OGUNHÉT^ CNBB diz que é justa a greve A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em documento lançado do Dia do Trabalho deste ano, logo após a realização da sua 28 § Assembléia Geral, considerou como justas as greves como forma de reivindicação dos trabalhadores. No documento a CNBB "apoia e encoraja os trabalhadores a que continuem, através de suas legítimas organizações, insistindo na suspensão das demissões de trabalhadores e na manutenção dos empregos, e no reajuste dos salários, sobretudo para a classe de baixa renda". Segundo o vice-presidente interino da CNBB, dom Jaime Chemello, "não se pode negar que a greve pela manutenção do emprego é jus- ta". E continua dos Jaime: "Se as demissões não param, é válido que o trabalhador faça greve numa tentativa de garantir o seu traba- lho". o presidente interino da CNBB, dom Paulo Pontes, declarou: "A greve é um direito sagra- do". Prêmio Machado de Xangô: Ganhou o prêmio este mês o trabalha- dor brasileiro que, com várias greves corajosas e bem organizadas, mostrou a toda a sociedade várias coisas: 1) que não está disposto a agüentar arrocho salarial mais uma vez, como se fosse o salário o responsável pela inflação; 2) que os patrões e os governos estão do mesmo lado, e junto com eles as televisões e os jornais também, procurando difamar, desmobilizar e reprimir a luta dos trabalhadores: 3) que a organização dos trabalhdores pode vencer. (des) Prêmio Lágrima de Crocodilo Este mês o (des) Prêmio vai para Sebastião Lazaroni que fala demais nas vitórias, se esconde nas derrotas, in- venta esquemas que servem para amarrar a criativida- de do jogador brasileiro; entretanto, não foi à-toa que ele foi escolhido técnico da seleção brasileira: ele faz tudo o que querem os cartolas do futebol, isto é, monta uma se- leção que tem um objetivo - valorizar um ou outro jo- gador, para vendê-los depois para o estrangeiro, dando lucro aos clubes. Vade retro, Lazaroni! Você atrapalha o Brasil!

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Ano II — N0 11 —Junho e Julho de 1990 — Salvador/Bahia —Jornal Popular Mensal

A greve dos ônibus em Salvador

Na luta pela liberdade

Este mês foi um mês de greves. Por que? Simples- mente os trabalhadores sentiram que em todo este Plano Collor a única coisa que era para valer era o tremendo arrocho salarial.

Inflação zero? Nem um mês existiu.

Agora, arrocho salarial, aumento zero dos salários, es- se funcionou. Os trabalhadores reagiram. Reagiram com a greve.

Uma das greves afetou bastante a população: a greve dos motoristas, tro- cadores e despachantes dos ônibus. Vamos esclarecer bem as responsabilidades por esta greve tão prolonga- da.

Em primeiro lugar: os trabalhadores ganharam no Tri- bunal Regional do Trabalho - o Tribunal considerou justo o aumento de 164%, para compensar a inflação dos últimos meses. Esse aumento deveria ser pago até o dia 5 de junho. Não foi pago e os trabalhadores en- traram em greve.

Durante a greve os trabalhadores sempre procuraram negociar. Apresentaram várias propostas. Uma das propostas visava o parcelamento do aumento durante

três meses, maio, junho e julho. Os patrões permane- ceram sempre na maior intransigência. O único que aceitavam era dar 20% a título de adiantamento.

Diante da intransigência dos patrões, diante dos problemas. que a greve causava à população, os trabalhadores fizeram uma outra proposta, agora

ao Governo: colocariam os ônibus para funcionar, mas o povo entraria pela frente, sem pagar.

0 Governo entretanto preferiu ficar do lado dos patrões. Colocou a polícia na rua, criou um clima de tensão na cidade toda, bateu, ameaçou, prendeu.

Os problemas enfrentados pela população não foram portanto de responsabilidade dos trabalhadores. Estes defenderam, sempre com muita consciência, o direito legítimo de greve e a recomposição de seus sa- lários.

Os problemas enfrentados pela população são devi- dos única e exclusivamente à intransigência dos patrões e à parcialidade e à truclência do Gover- no.

FETAG com nova diretoria

Os sindicatos combativos e progressistas consegui- ram, no mês de junho, ganhar a diretoria da FETAG.

A antiga diretoria, peiega, que sempre procurou a aliança cum os governos, não quer reconhecer a elei- ção. Primeiro tentou adiar o congresso. Agora alega que a chapa de oposição não estava legal. Em uma palavra: a antiga diretoria procura apelar.

Com a nova FETAG a luta dos trabalhadores rurais dá um importante passo à frente: maiores responsabilida- des - maiores possibilidades.

Agora você poderá ser JORNALISTA POPULAR DO OGUNHÊ! Para isso é necessário:

• escrever uma carta para o Jornal OGUNHÊ dizendo que deseja ser jornalista popular. End.: Rua Gregório de Matos, 51 - 22 andar. Pelourinho - Salvador-Ba. • enviar duas fotos 3x3. • enviar também uma declaração de uma entidade popular de base (associação,

sindicato, grupo de mães, grupo de jovens, grupo de teatro, etc.) dizendo que você participa do trabalho comunitário. • fazendo isso você receberá uma carteira de jornalista popular do OGUNHÊ, precisará mandar as notícias das coisas que acontecem no seu bairro ou no seu sindicato ou no seu grupo, e todo mês poderá participar de uma reunião para discutir a linha e os rumos do OGUNHÉT^

CNBB diz que é justa a greve

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em documento lançado do Dia do Trabalho deste ano, logo após a realização da sua 28§ Assembléia Geral, considerou como justas as greves como forma de reivindicação dos trabalhadores.

No documento a CNBB "apoia e encoraja os trabalhadores a que continuem, através de suas legítimas organizações, insistindo na suspensão das demissões de trabalhadores e na manutenção dos empregos, e no reajuste dos salários, sobretudo para a classe de baixa renda".

Segundo o vice-presidente interino da CNBB, dom Jaime Chemello, "não se pode negar que a greve pela manutenção do emprego é jus- ta". E continua dos Jaime: "Se as demissões não param, é válido que o trabalhador faça greve numa tentativa de garantir o seu traba- lho".

Já o presidente interino da CNBB, dom Paulo Pontes, declarou: "A greve é um direito sagra- do".

Prêmio Machado de Xangô:

Ganhou o prêmio este mês o trabalha- dor brasileiro que, com várias greves

corajosas e bem organizadas, mostrou a toda a sociedade várias coisas: 1) que não está disposto a agüentar arrocho salarial mais

uma vez, como se fosse o salário o responsável pela inflação;

2) que os patrões e os governos estão do mesmo lado, e junto com eles as televisões e os jornais também, procurando difamar, desmobilizar e reprimir a luta dos trabalhadores:

3) que a organização dos trabalhdores pode vencer.

(des) Prêmio

Lágrima de

Crocodilo

Este mês o (des) Prêmio vai para Sebastião Lazaroni que fala demais nas vitórias, se esconde nas derrotas, in- venta esquemas que só servem para amarrar a criativida- de do jogador brasileiro; entretanto, não foi à-toa que ele foi escolhido técnico da seleção brasileira: ele faz tudo o que querem os cartolas do futebol, isto é, monta uma se- leção que só tem um objetivo - valorizar um ou outro jo- gador, para vendê-los depois para o estrangeiro, dando lucro aos clubes. Vade retro, Lazaroni! Você só atrapalha o Brasil!

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2 OGUNHE

O PELOURINHO É NOSSO VISITE 0 PELO ANTES QUE SE ACABE. Este deveria ser o Título da Coluna assinada pelo colaborador JOÃO CARLOS SOUTO do Jornal A Tarde, no dia 15 de abril, no Caderno de Lazer e Informação.

Tenho estado muito preocupado com as sucessivas caminhadas negativas pro- movidas por pessoas que não têm o perfeito conhecimento do que representa o Centro Histórico de Salvador, maior conjunto arquitetônico barroco da Améri- ca Latina, Patrimônio da Humanidade.

Às vezes, tenho denunciado que parece existir um esquema para transformar essa coisa linda, nosso Centro Histórico, num amontoado de ruínas, e, no 'uturo, construírem arranha-céus, come prevê, de certa forma, a famigerada Lei da Contrapartida. Ultimamente, existe uma verdadeira febre de descaracterização

dos casarões, onde pessoas que se di- zem defensoras deste Centro Histórico participam de maneira direta da destrui- ção, não só descaracterizando, mas até demolindo coisas lindas e construindo verdadeiros monstrengos. Mas, se como isso não bastasse, o Sr. João Carlos Souto escreveu a infeliz coluna "Faltou Dizer...", que aponta algumas coisas com as quais concordo, mas não consi- go entender como é que se propõe a ex- pulsão desta comunidade, que de certa forma tem colaborado para que nosso Centro Histórico ainda exista. O colunista classifica a comunidade do Pelourinho como "uma comunidade de meretrizes, travestis, gigolôs, turistas de mochilas, artesãos de duvidosa qualidade, insetos e rameiras sem classe".

Pede, inclusive, a expulsão da comuni- dade do Centro Histórico, esquecendo-se de que, há mais de 400 anos, o Centro

Histórico tem vocação residencial e não podemos transformar isso aqui sim- plesmente numa área comercial.

Mais de 100 entidades giram em torno do Centro Histórico, mais de 3000 famí- lias exigem o respeito de serem tratadas como cidadãos. E o que é preciso é que se tenha conscência do que está escrito na Bíblia, no Gênesis 7, Versículo 13: Que então disse Deus a Noé, "darei ca- bo de toda carne da face da Terra por- que a Terra está cheia da violência dos homens". Mas esta violência de que fala a Bíblia, em nenhum momento é locali- zada senão na face da Terra e nunca es- pecificamente no Pelourinho.

É preciso que façamos um grande muti- rão para salvar nosso Centro Histórico, maior conjunto arquitetônico da América Latina habitado por pessoas que gaham em média um a dois salários mínimos.

outros são biscateiros, mas que mere- cem todo respeito da sociedade.

No fundo, no ftindo, o que faltou dizer o Sr. João Carlos é que a sua visão é uma visão capitalista e elitista, e o Centro Histórico não pode ser visto daquela maneira.

Vamos acreditar na luta pela revitaliza- ção, tomando consciência de que a ta- refa de conservar é bem mais árdua do que a tarefa de construir.

CLARINDO SILVA Coordenador do Projeto Cultural Cantina

da Lua Assessor do Instituto do Patrimônio

Artístico e Cultural, defensor da Revitalização do Centro Histórico de

Salvado"-

FUTEBOL Copa do Mundo de 1990

No dia em que fomos entregar este número do Jornal OGUNHê na gráfica, os jogos da Copa do Mundo ainda estavam sendo realizados. Não sabemos ainda, por- tanto, como vai se comportar a Seleção Brasileira.

Mas e preciso falar alguma coisa sobre esta Copa do Mundo.

0 brasileiro gosta de futebol, vibra com cada jogo, com cada gol, com cada vitória da Seleção Brasileira.

Isso é bom, é saudável, não há nenhum problema nisso.

Já as classes dominantes, os governos, procuram aproveitar as vitórias da Seleção Brasileira, para aparecer, para fingir que eles foram os autores destas vitórias.

Ora, o povo não é besta. Ele sabe bem que quem ga- ha jogo não é cartola, nenhum burguês, nenhum go- verno nem governante. Ao contrário: o que fazem os governos para apoiar o esporte no Brasil? Como estão os estádios esportivos? Estão todos aos pedaços, largados de lado. Como está a prática de educação fí- sica nas escolas? Quase não existe. Como está o apoio ao esporte amador? Está a zero.

Na hora de fazer alguma coisa pelo futebol e pelo es- porte, os govemos desaparecem. Eles só aparecem na hora das vitórias.

(JÜMIE:

Mas não enganam o povo.

O povo sabe que tudo que o povo gosta procura ser utilizado de maneira distorcida pelas classes domi- nanrtes. Não é só com o futebol.

A mesma coisa não acontece com a Festa de São João? De uma maneira mais geral, não acontece a mesma coisa com a religiosidade popular? Os bur- gueses são ambiciosos e egoístas, mas hipocrita- mente procuram fingir que são multo religiosos, na tentativa de enganar o povo.

Mas não enganam o povo. O povo não é besta.

Se o Brasil for campeão do mundo o povo brasileiro ficará contente. Mas toda esta alegria será um alento a mais para que o povo enfrente os problemas do dia- a-dia, problemas que podem ser resolvidos, com um povo organizado e consciente, com um governo po- pular, com um governo que não esteja aí para servir aos capitalistas, mas para representar e defender os interesses do povo.

NOTÍCIAS DE CAETITÉ Meio Ambiente

A minha cidade está sendo vitima da exploração de um minério perigoso e radioativo: o urânio.

O município possui grande quantidade de urânio, que será explorado, causando assim grandes prejuízos não só à comunidade caetiteense, como a toda a humanidade.

Sabemos que o urânio é usado para a fabricação de bombas atômicas, e partículas de urânio acumuladas no corpo, ou muitas radiações recebidas, podem pro- vocar diversos tipos de câncer, problemas no fígado, e que as crianças podem nascer com defeitos. Sem contar a destruição do meio ambiente.

Será que vale a pena arriscar a vida de milhares <Je pessoas para retirar o urânio que é fonte de morte, de destruição, de dor?

Cynara Martins Cotrim Jornalista popular de Caetité

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Papa essa Brasil! Há muitos anos atrás, Nero, imperador que mandou incendiar Roma, quando advertido por seus conselheiros que o povo estava in- satisfeito, falou que era só dar pão e circo para o povo, e o povo esqueceria os proble- mas e insatisfações.

No Brasil de hoje, em que o povo está na mizélia, o futebol e o carnaval que fazem a alegria do povo, sempre é usado pelos go- vernantes e políticos populistas como o cir- co de Nero, para fazer o povo esquecer a dura realidade em que está vivendo, princi- palmente aqueles que nem o páo têm para comer. Junho, dia 16: Brasil 1 x 0 Costa Rica. No mesmo dia o Diário Oficial da União anuncia a colocação em disponibilidade de 10.640 funcionários públicos, pais de família, com certeza arraias miúdas, porque os marajás sempre são apadrinhados, estes ninguém demite. Para essa. Brasil!

Para essa outra: Relatório do Banco Mundial informa que o índice de mortalidade infantil no país é dos mais altos do mundo: no Brasil morrem 63 recém-nascidos em cada grupo de mil; na Colômbia, por exemplo, morrem 32 em cada mil. Brasil 2x0.

Nos países desenvolvidos (Itália, Suécia, Alemanha, entre outros) a participação dos salários na renda nacional é de 70%; no Bra- sil é de pouco mais de 30%. Mais de 50% da renda total do Brasil está concentrada nas mãos de apenas 10% da população; en- quanto isso 41% dos brasileiros vivem numa situação considerada de miséria absoluta. Isso quer dizer, segundo o mesmo Relatório do Banco Mundial, que em campeonato de desigualdade e injustiça social o Brasil só

perde para a Honduras e a Serra Leoa (paí- ses, que, aliás, não estão participando nesta atual Copa do Mundo). Mas com o arrocho salarial, o desemprego e a recessão provo- cados pelo plano do collorido e de Dona mi- zélia, breve seremos os campeões do mun- do. Para mais essa! Brasil 3x0.

Pesquisa publicada na Tribuna da Bahia em 17/06/90, com o título "Miséria Explícita", afirma que 49% da população baiana não consegue poupar um centavo sequer, e 34,8% não tem rendimento nenhum. Papa outra! Brasil 4x0.

A indústria paulista no mês de maio demitiu 47.447 trabalhadores e registrou uma queda no nível de emprego de 2,38% em relação ao mês de abril. É o maior número de de- missões desde abril de 1981, que apontou 46.300 demitidos. Nos primeiros cinco me- ses do ano de 1990 as demissões já chega- ram à metade das demissões de 1981, ano em que houve a mais forte recessão que o país já conheceu. Para mais uma! Brasil 5x0.

Não quero ser chato, nem tirar a euforia dos torcedores; mas ainda tem o campeonato do analfabetismo, da precariedade da educa- ção, do péssimo atendimento de saúde, dos transportes coletivos, da falta de moradia, e outros campeonatos mais.

Vamos torcer na Copa, porém sem esquecer os problemas, sem se deixar manipular pelas redes de televisão e pelos govemantes apro- veitadores das coisas que fazem a alegria do povo.

Normando Batista Santos

3 OGUNHÊ

OS SALÁRIOS estão cada vez mais baixos

«^ r

Toda gente sente isso: cada mês os salários compram menos. Mas sempre é bom ter alguma estatística à máo para comprovar este fato. A participação dos salários na renda nacional vem baixando nos últimos anos:

1970 59% 1980 51% 1990 35%

Por outro lado os lucros, os rendimentos e outros ganhos dos capitalistas vêm crescendo:

1970 41% 1980 49% 1990 65%

Em outras palavras: os ricos estão cada vez mais ricos e os pobres estão cada vez mais pobres.

O MOVIMENTO POPULAR e o atual momento político Salvador, Bahia, Brasil. Isto poderia ser apenas o final de endereço de uma carta remetida para o exterior. Poderia, mas não é. Salvador nunca experimentou tan- tos maltrates, tanta sujeira, tanta incompetência administrativa e tan- ta violência como no atual govemo municipal gerenciado pelo Sr. Fer- nando José, onde nem mesmo humildes garis escapam da violên- cia policial e os bairros periféricos estão no mais completo abandono, nunca visto antes. A Bahia está na UTI. A saúde arra- sada, com profissionais sendo des- respeitados, postos e hospitais abandonados, numa situação ver- dadeiramente caótica quer no que diz respeito à assistência, quer no que diz respeito à prevenção. A educação pública chegou ao limite da tolerância. Escolas arrasadas, depredadas, sem recuperação e manutenção. Professores ganhan- do miseravelmente (em todos os níveis) demonstrando claramente que também a educação não é prioritária no atual govemo. No campo, o que parecia impossível está acontecendo: O AUMENTO DA VIOLÊNCIA E DA IMPUNIDA- DE. Explodem centenas de confli- tos sem solução, inclusive nas áreas de Reforma Agrária, onde antigos proprietários, diante da omissão e da conivência do Esta- do, estão usando a força na tenta- tiva de retomada das terras desa- propriadas.

No Brasil, as perdas e o arrocho salarial, a recessão, o autoritarismo e a improvisação tomaram conta do país. Mais uma vez os trabalha- dores e o povo em geral pagam o preço da vaidade e inexperiência

de tecnocratas e vaidosos que só viram o povo de cima dos palan- ques ou pela televisão. O salário mínimo chegou aos índices mais baixos desde a sua criação há mais de 40 anos. Além do confisco da poupança e do dinheiro do po- vo, foram confiscados os pequenos avanços conquistados na Nova Constituição, já desrespeitada inúmeras vezes. A CIDADANIA pela qual tanto se lutou durante to- dos os anos de arbítrio, foi riscada do dicionário do atual govemo fe- deral. Não podia ser pior! E o Movimento Popular e Sindical? Estes finalmente começam a acor- dar depois de dois meses de per- plexidade, quando descobriram que o inimigo já colocou quase todas as cartas na mesa e agora começa a blefar, fazendo um jogo muito pe- rigoso para toda a nação. A mobili- zação popular e descontentamento to geral já são evidentes, apesar da propaganda global e das exibições semanais de vitalidade e perícia. Salvador, Bahia, Brasil. Mais do que uma localização no universo, há uma história que precisa ser resgatada, de um povo que sempre quis ser livre e sempre teve seu processo de avanço cercado por di- tadores e ditaduras.

Não há nenhuma dúvida que os movimentos organizados poderão enfrentar os inimigos de ontem e de hoje, por mais invencíveis que pareçam, pois, o povo organizado é imbatível e, como consagrou Glau- ber Rocha:

"MAIS FORTE SÃO OS PODERES DO POVO".

Paulo Torres Assessor de Organizações

Populares

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4 OGUWE

O povo dos bairros sempre se governou só. Não por querença, mas por precisão.

Não digo isso por dizer, como se fora uma idéia que veio sem mais na minha mente. Digo o que vejo.

Olhe você também no seu redor, repare bem, comprove por si o que eu digo, se verdade ou se mentira.

No resto da cidade, para se construir uma casa, um edifício, precisa de licença da prefeitura. No bairro popular, não. Cada um vai construindo sua casa, segundo suas posses, com o tempo demorado, sem licenciar com ninguém, sem fiscal aparecer para dar ou desdar conforme.

No bairro popular, quem quer, quando pode ou tem tino, jeito, faz venda, uma oficina, salão para unha e cabelo. Não tem nota fiscal, nem imposto. É na base da viração, simplesmente, e com toda a simplicidade.

Na saúde a mesma coisa: tem parteira, tem quem dá injeção, tem a vizinha que conhece os chás e as plantas, cada qual com sua experiência e seu conhecimento, dá remédio, acompanha, resolve, sem muito estudo de livro, mas com uma sabedoria que para medir não tem medida.

Até advogados e juizes nós temos. Surge briga de vizinho, ou de marido com mulher, querela, discussão, vias de fato, confusão; sempre tem um que é chamado, com autoridade para dirimir dúvidas e questões, dar razão a quem de direito.

Tudo isso acontece todo dia, faça sol ou faça chuva.

Tem gente que desconhece, entretanto, ou finge desconhecer, que o bairro popular tem sua própria organização, seus líderes, seus mestres, seus sábios, seus santos, moldura da resistência e da cultura popular.

Os governos, estes, pouco chegam nos bairros. Só aparece lá a polícia, na grossura e no desrespeito, mal exemplo,. quem é que gosta? E, de vez em quando, época de eleição, o político, conservador toda a vida, oportunista, vai lá para prometer e, depois, não fazer.

O resto do tempo ficamos nós, sós.

Enquanto nós ficamos cuidando de nossa sobrevivência, no sufoco. apenasmente com a ajuda de Deus, ninguém de fora se preocupa, ninguém de fora ajuda, ninguém de fora vem meter o bedelho.

Por que então toda esta celeuma, quiprocó, irritação, quando nós fazemos a escola comunitária?

Quem tem medo da escola comunitária?

Justamente.

Porque a escola comunitária vai mais longe, mais além, é mais que cuidar da nossa pura sobrevivência.

Com a escola comunitária dizemos que o povo, quando quer, pode. Dizemos que nossa escola é melhor do que a deles. Dizemos que nossa escola é a mais pública das escolas públicas.

Com a escola comunitária questionamos: Tudo que é público deve ser estatal? Tudo que é estatal é necessariamente público? Com a escola comunitária mostramos a impossibilidade de mudar o ensino público sem a participação do povo desconsiderando os caminhos abertos pelo povo.

A raiva deles ainda é maior porque na escola pública comunitária nós fazemos tudo aquilo que eles sempre disseram que queriam fazer

mas que nunca conseguiram fazer (democratização das estruturas da escola, participação da comunidade, programas adequados, alunos motivados). E eles nunca conseguiram fazer por incompetência ou por ficarem grudados nos gabinetes.

Tem gente que não suporta ouvir a voz do povo. Tem gente que detesta quando ouve o povo dizer o que quer.

Eles querem o povo mudo para se dizerem eternamente os representantes do povo.

Azar o deles. Eles vão ter que nos aceitar.

Porque tomamos gosto. Não vamos parar de fazer. Nem de falar.

Alhos e Bugalhos Para se conhecer as escolas comunitárias, para aprender com as escolas comunitárias, o primeiro

cuidado a tomar é não confundir a luta das escolas

comunitárias - que pedem, exigem, verbas públicas para a manutenção das escolas - com a pressão in- decente que os empresários da educação exercem

para extorquir verbas públicas para seus objetivos lucrativos. Uma coisa não tem nada a ver com a

outra. Os empresários querem tirar dinheiro público, do povo, para, transformando a educação em mer- cadoria, obter um lucro individual. Já o povo das fa- velas quer de volta o dinheiro que é seu por direito, e

que está sendo mal utilizado, com o objetivo de ex- tender a educação pública e de melhorar a sua qua-

lidade. Os empresários da educação escondem sua ganância pelo lucro fácil atrás da crítica da incapaci-

dade do Estado em oferecer educação a todos. Nos

bairros populares a crítica à incapacidade do Estado

é acompanhada da apresentação de uma alternativa

de educação pública. Alhos são alhos, bugalhos são bugalhos.

Todos aqueles que há anos lutam em defesa do en-

sino público, todos aqueles que há anos lutam pela

defesa das verbas públicas, não podem confundir os

gritos dos empresários com os clamores do povo.

0 povo das escolas comunitárias não quer desviar verbas públicas. E a questão que as escolas comu- nitárias colocam para o Estado não se resume a um problema de verbas. As escolas comunitárias desa- fiam a todos aqueles que querem o progresso da Sociedade com uma outra questão: tudo que é es-

tatal é público? Tudo que é público é necessaria- mente estatal?

Encontro Pedagógico

No último sábado de cada mês todos os meses

encontro pedagógico cada mês um tema diferente cada mês é escolhido o tema do mês seguinte

Horário: 8:00 às 12:00 horas Locai: sede do CECUP Gregório de Matos 51 - a9 andar

Pelourinho/Maciel

Expediente: Jornal OGUNHE Jornal Popular - Editor CECUP - Centro de Educaçáo e Cultura Popular. Con- selho de Redação: Samuel, Normando, Menezes, Luiza, Alda, Omêlia, Lindal- va, Lucivanda, Baginha, Joaquim, Mário, Joáo Jorge, Paulo. Projeto Gráfico: Amilton Santana. Fotos: Adenor Gondim. Diagramaçáo e arte-final: Jorge Eduardo. Fotocomposiçâo e impressão: Gráfica e Editora Arembepe Ltda. Apoio: Brasilienhilfe-Brasiliennachrichten.