A Historia Do Curriculo

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1 Unidade A Historicidade do Currículo Objetivos: Conhecer a história e o conceito do currículo escolar .

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Unidade

A Historicidade do Currículo

Objetivos: Conhecer a história e o conceito do

currículo escolar .

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1- A HISTORICIDADE DO CURRÍCULO

A Nova Sociologia da Educação constitui-se na primeira corrente

sociológica voltada para a problematização do currículo. O segmento dessa

abordagem teórica ocorreu no início da década de 1970, com a publicação do

livro Knowledge and control: new diretions for the sociology of education (1971)

por Michael Yong. A nova sociologia da educação pôs em discussão todos os

pressupostos do currículo questionando suas determinações sociais e suas

relações com a estrutura de poder na sociedade, incidindo o foco de análise

sobre o funcionamento interno das escolas (FORQUIN, 1993).

Esse movimento teve implicações profundas no pensamento curricular

subsidiando inúmeras pesquisas e análises críticas nas décadas posteriores.

Nos Estados Unidos, dois movimentos de reconceptualização do

currículo desenvolveram-se na década de 1970: por um lado, influenciados

pelo pensamento de Paulo freire, autores côo William Pinar e Maxine Greene,

entre outros, buscaram aplicar o enfoque histórico hermenêutico no trabalho do

currículo colocando em evidência a experiência dos alunos e suas

necessidades como centrais para construção do currículo. Dessa maneira foi

dada ênfase ao aluno como sujeito do processo de aprendizagem e recolocada

a comunicação interpessoal no centro dos métodos de ensino. Apesar dessa

abordagem utilizar o pensamento de Paulo Freire, ela não teve tanta influência

no campo do currículo do Brasil.

Uma segunda vertente constituiu-se em torno do pensamento de

Michael Aplle e Henry Giroux, entre outros estudiosos norte americanos. Esse

pensamento, fundamentado filosoficamente no neomarxismo da Escola de

Frankfurt, ancorou-se em três premissas básicas de acordo com Domingues

(1986): O currículo não pode ser separado da totalidade do social, deve ser

historicamente situado e culturalmente determinado; A crise de currículo de

um ato inevitavelmente político que objetiva a emancipação das camadas

populares.

Essa crítica abalou os fundamentos e a hegemonia do paradigma

técnico de currículo colocando em evidência a subordinação histórica do

campo aos princípios de regulação e controle social. Dessa maneira, as

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teorias crítica do currículo de maneira sociológica passaram a escrutinar os

conteúdos de ensino e sua transmissão, desnaturalizando o currículo,

apontando-o como uma construção social e ressaltando as suas relações com

o poder e com a produção de subjetividade (MOREIRA; SILVA, 1995). No final

da década de 1980, configurou-se outra abordagem teórica significativa do

currículo, a abordagem processual ou prática.

1.1- Conceito de Currículo Escolar

Origem do termo currículo

No exame dos termos educativos classe e currículo, David Hamilton

(1989) mostra como a emergência desses termos no século XVI vinculou-se ás

novas concepções de eficiência escolar e social, manifestando transformações

pedagógicas importantes. O termo classe passou a ser utilizado para designar

as subdivisões no interior das escolas.

De acordo com os pensadores da renascença, essas unidades

pedagógicas menores facilitaram a aprendizagem em geral e tornariam os

sistemas de ensino, mas eficiente. Entende-se, porque classe compreendia

uma unidade pedagógica útil para controlar professores e alunos.

Por sua vez, o termo curriculum foi utilizado no ensino superior para

referir-se á coerência estrutural (disciplina) e seqüência interna (ordem) que

deveria conter qualquer curso ou estudos. “um currículo não só deveria ser

seguido, como também, deveria ser incluído“ (HAMILTON, 1989, p. 45). Vemos

assim, um inegável princípio de racionalidade pressuposto no aparecimento do

termo currículo no campo educacional. Esse princípio foi redimensionado no

século XX quando se generalizou o termo na educação acoplada a noções de

controle, padronização, eficiência e administração educacional e social.

O que devemos entender por currículo? Para uma primeira

aproximação do conceito de currículo nos valeremos das preciosas indicações

de José Conteras (1989) para quem o currículo diz respeito ao conjunto das

decisões educativas para a escola. O currículo deve ser entendido como uma

ferramenta conceitual que supõe sempre, de forma explicita ou tácita uma

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resposta ás perguntas; O que ensinar? Como e por quê? Falar em currículo

pressupõe pensar a educação tendo em vista a questão dos conteúdos.

De acordo com Conteras, as concepções curriculares variam em

função dos distintos valores educacionais que lhe dão vida. Currículo diz

respeito às decisões educativas para a escola, acha-se mediado por problemas

institucionais, por conseguinte, reflete sempre as circunstâncias históricas e a

problemas escolares, não se pode realizar abstrações sobre seu

funcionamento real nas classes. Significa dizer que um currículo não nasce

somente para ser realizado, de um modo ou de outro.

As Teorias Tradicionais do Currículo

Em 1918, Bobbitt1 escreveu o livro que iria ser considerado o marco no

estabelecimento do currículo como um campo especializado de estudos: The

curriculum. O livro de Bobbitt é escrito num momento crucial da história da

educação, num momento em que diferentes forças econômicas, políticas e

culturais procuravam moldar os objetivos e as formas da educação de massa

de acordo com suas diferentes e particulares visões. É nesse momento que se

busca responder questões cruciais sobre as finalidades e os contornos da

escolarização de massas. Quais os objetivos de educação escolarizada: formar

o trabalhador especializado ou proporcionar uma educação geral, acadêmica, a

população? O que se deve ensinar: as habilidades básicas de escrever, ler e

conta? As disciplinas acadêmicas humanísticas; as disciplinas científicas; as

habilidades práticas necessárias para as ocupações profissionais? Quais as

fontes principais do conhecimento a ser ensinado: o conhecimento acadêmico;

as disciplinas científicas; os saberes profissionais do mundo ocupacional

adulto? O que se deve estar no centro do ensino: os saberes “objetivos” do

conhecimento organizado ou as percepções e as experiências “subjetivas” das

crianças e dos jovens? Em termos sociais, quais devem ser as finalidades de

educação: ajustar as crianças e os jovens à sociedade tal como ela existe ou

prepará-los transformá-la; a preparação para a economia ou a preparação para

a para democracia?

1. John Franklin Bobbitt – estudioso do currículo, em 1918 lança seu livro The Curriculum

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As respostas de Bobbitt eram claramente conservadoras, embora sua

intervenção buscasse transformar radicalmente o sistema educacional. Bobbitt

propunha que a escola funcionasse da mesma forma que qualquer outra

empresa comercial ou industrial. Tal como uma indústria, Bobbitt queria que o

sistema educacional fosse capaz de especificar precisamente que resultados

pretendia obter, que pudesse estabelecer métodos para obtê-los de forma

precisa e formas de mensuração que permitissem saber com precisão se eles

foram realmente alcançados.

O sistema educacional deveria começar por estabelecer de forma

precisa quais são seus objetivos. Esses objetivos, por sua vez, deveriam se

basear num exame daquelas habilidades necessárias para exercer com

eficiência as ocupações profissionais da vida adulta. O modelo de Bobbitt

estava claramente voltado para a economia. Sua palavra-chave era “eficiência”.

O sistema educacional deveria ser tão eficiente quanto qualquer outra empresa

econômica. Bobbitt queria transferir para a escola o modelo de organização

proposto por Frederick Taylor2. Na proposta de Bobbitt, a educação deveria

funcionar de acordo com os princípios da administração científica propostos por

Taylor.

Bem antes de Bobbitt, Dewey3 tinha escrito, em 1920, um livro que

tinha a palavra “currículo” no título, The child and the curriculum. Neste livro,

Dewey estava muito mais preocupado com a construção da democracia que

com o funcionamento da economia. Também em contraste com Bobbitt, ele

achava importante levar em consideração, no planejamento curricular, os

interesses e as experiências das crianças e jovens. Para Dewey, a educação

não era tanto uma preparação para a vida ocupacional adulta, como um local

de vivência e prática experiências das crianças e jovens. Para Dewey, a

educação não era tanto uma preparação para a vida ocupacional adulta, como

um local de vivência e prática direta de princípios democráticos. A influência de

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2. Frederick Winslow Taylor - foi um engenheiro norte-americano que introduziu o conceito da chamada Administração Científica, revolucionando todo o sistema produtivo no começo do século XX e criando a base sobre a qual se desenvolveu a atual Teoria Geral da Administração. 3. John Dewey é, certamente, um dos mais influentes pensadores na área da educação contemporânea. Esse destacado filósofo, psicólogo e pedagogo, nascido nos Estados Unidos, posicionou-se a favor do conceito de Escola Ativa, na qual o aluno tinha que ter iniciativa, originalidade e agir de forma cooperativa.

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Dewey, entretanto, não iria se refletir da mesma forma que a de Bobbitt na

formação do currículo como campo de estudo.

A atração e influência de Bobbitt devem-se provavelmente ao fato de

que sua proposta parecia permitir a educação tornar-se científica. Não havia

por que discutir abstratamente as finalidades últimas da educação: elas

estavam dadas pela própria vida ocupacional adulta. Tudo o que era preciso

fazer era pesquisar e mapear quais eram as habilidades necessárias para as

diversas ocupações.

Na perspectiva de Bobbitt, a questão do currículo se transforma numa

questão de organização. O currículo é simplesmente uma mecânica. A

atividade supostamente científica do especialista em currículo não passa de

uma atividade burocrática. Não é por acaso que o conceito central, nessa

perspectiva, é “desenvolvimento curricular”, um conceito que iria dominar a

literatura estadunidense sobre currículo até os anos 80. Numa perspectiva que

considera que as finalidades da educação estão dadas pelas exigências

profissionais da vida adulta, o currículo se resume a uma questão de

desenvolvimento, a uma questão técnica.

O modelo de currículo de Bobbitt iria encontrar sua consolidação

definitiva num livro de Ralph Tyler publicado em 1949. O paradigma

estabelecido por Tyler iria dominar o campo do currículo nos Estados Unidos,

com influência em diversos países, incluindo o Brasil, pelas próximas quatro

décadas. Com o livro de Tyler, os estudos sobre currículo se tornam

decididamente estabelecidos em torno da idéia de organização e

desenvolvimento. Apesar de admitir a filosofia e a sociedade como possíveis

fontes de objetivos para o currículo, o paradigma formulado por Tyler centra-se

em questões de organização e desenvolvimento. Tal como no modelo de

Bobbitt, o currículo é, aqui, essencialmente, uma questão técnica.

A organização e o desenvolvimento do currículo devem buscar

responder, de acordo com Tyler, quatro questões básicas: “1. Que objetivos

educacionais deve a escola procurar atingir? 2. Que experiências educacionais

podem ser oferecidas e que tenham probabilidade de alcançar esses

propósitos?; 3. Como organizar eficientemente essas experiências

educacionais?; 4. Como podemos ter certeza que esses objetivos estão sendo

alcançados?”. As quatro perguntas de Tyler correspondem à divisão tradicional

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da atividade educacional: “currículo” (1), “ensino e instrução” (2 e 3) e

“avaliação” (4). Em termos estritos, pois, apenas a primeira questão diz

respeito a “currículo”. É precisamente a esta questão que Tyler dedica a maior

parte de seu livro. Tyler identifica três fontes nas quais se devem buscar os

objetivos da educação, afirmando que cada uma delas deve ser igualmente

levada em consideração:

1- estudos sobre os próprios aprendizes;

2- estudos sobre a vida contemporânea fora da educação;

3- sugestões dos especialistas das diferentes disciplinas. Aqui, Tyler

expande o modelo de Bobbitt, ao incluir duas fontes que não eram

contempladas por Bobbitt: a psicologia e as disciplinas acadêmicas.

Tyler insiste na afirmação de que os objetivos devem ser claramente

definidos e estabelecidos. Os objetivos devem ser formulados em termos de

comportamento explícito. Essa orientação comportamentalista iria se

radicalizar, álias, nos anos 60, com o revigoramento de uma tendência

fortemente tecnicista na educação estadunidense, representada, sobretudo,

por um livro de Robert Mager.

É interessante observar que tanto os modelos mais tecnocráticos,

como os de Bobbitt e Tyler, quanto os modelos mais progressistas de currículo,

como o de Dewer, que emergiram no inicio do século XX, nos Estados Unidos,

constituíam, de certa forma, uma reação ao currículo clássico, humanista, que

havia dominado a educação secundária desde sua institucionalização.

Cada um dos modelos curriculares contemporâneos, o tecnocrático e o

progressista, atacam o modelo humanista por um flanco. O tecnocrático

destacava a abstração e suposta inutilidade – para a vida moderna e para as

atividades laborais – das habilidades e conhecimentos cultivados pelo currículo

clássico. O latim e o grego – e suas respectivas literaturas – pouco serviam

como preparação para o trabalho da vida profissional contemporânea. Não se

aceitava, aqui, nem mesmo os argumentos que no século XIX que tinham sido

desenvolvidos pela perspectiva do “exercício mental”, segundo a qual a

aprendizagem de matérias como o latim, por exemplo, servia para exercitar os

“músculos mentais”, de uma forma que podia se aplicar a outros conteúdos.

O modelo progressista, sobretudo aquele “centrado na criança”,

atacava o currículo clássico por seu distanciamento dos interesses e das

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experiências das crianças e dos jovens. Por estar centrado nas matérias

clássicas, o currículo humanista simplesmente desconsiderava a psicologia

infantil. Ambas as contestações só puderam surgir, obviamente, no contexto da

ampliação da escolarização de massas, sobretudo da escolarização secundaria

que era foco do currículo clássico humanista. O currículo clássico só pôde

sobreviver no contexto de uma escolarização secundária e acesso restrito à

classe dominante. A democratização da escolarização secundária significou

também o fim do currículo humanista clássico.

Na década de 1960, surgiram teorias educacionais baseadas em

experiências. São as chamadas “teorias críticas do currículo”, cujos

pressupostos questionaram arranjos sociais e educacionais vigentes,

responsabilizando-os pelas desigualdades e injustiças sociais. Intentavam

desenvolver um conceito que permitisse compreender o que o currículo “faz”.

Em 1970, Louis Althesser, influenciado por ideais marxistas, argumentou que a

continuidade da sociedade capitalista depende da reprodução de seus

componentes econômicos e ideológicos, cuja sustentação se dá através de

mecanismos e instituições encarregadas de garantir o status quo sem

contestação. Assim, a produção e disseminação da ideologia são feitas pelos

aparelhos do Estado, entre os quais se situa a escola, constituindo-se o mais

importante, porque atinge a população por um período prolongado. A escola

atua ideologicamente através do seu currículo, que divulgam crenças explícitas

sobre a desejabilidade das estruturas sociais.

Além disso, discrimina, pois inclina as pessoas das classes

subordinadas à submissão e à obediência, enquanto as das dominantes

aprendem a controlar e a comandar. Essa diferenciação é garantida pelos

instrumentos seletivos, que excluem os alunos pobres antes de chegarem a

níveis onde se aprendem as habilidades dos dominantes. Para Althesser, a

escola contribui para a reprodução da sociedade capitalista ao transmitir

através das disciplinas, as ideologias que levam o indivíduo a ver os arranjos

sociais existentes como bons e desejáveis.

Entretanto, caberia aos norte-americanos, Samuel Bowles e Herbert

Gints, estabelecer a conexão entre a escola e produção. Eles enfatizaram a

aprendizagem através das relações sociais escolares, das atitudes para se

qualificar como um trabalhador subordinado ou como de alto nível das

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ocupações profissionais. Para os autores, o funcionamento escolar contribui

para esse processo, pois espelha as relações sociais trabalhistas. Assim, as

escolas dirigidas aos trabalhadores subordinados tendem privilegiar relações

nas quais os estudantes aprendem a receber ordens e obedecer.

Em contraste, as instituições dirigidas àqueles dos altos escalões

tendem favorecer relações que os alunos têm atitudes de comando e

autonomia. Assim, através desse processo bidirecional, a educação contribui

para a reprodução das relações sociais da sociedade capitalista, garantindo

que num movimento de retorno, o local de trabalho receba aquele tipo de

trabalhador de que necessita. Já, para Pierre Bourdieu e Jean-Claude

Passerom, a dinâmica da representação social centra-se no de processo de

reprodução cultural.

É através da divulgação dos saberes acadêmicos que a reprodução

mais ampla da sociedade fica garantida e, tendo valor social, faz com que o

sujeito obtenha vantagens materiais se constituem como capital cultural. O

domínio simbólico atua através de um mecanismo no qual depende de dois

processos, a imposição e a ocultação, que juntos, definem a cultura dominante

como arbitrária, mas com poder idealizado. Esse mecanismo foi denominado

como dupla violência no processo de dominação cultural. Além disso, a escola

também exclui. Seu currículo baseia-se no saber dominante, que é transmitido

através de um código lingüístico oculto.

As crianças favorecidas, acostumadas com ele em seu ambiente

familiar, saem-se bem e continuam seus estudos em níveis superiores. Já,

aquelas que provem de um meio, cuja vivência não as acostumou a esse

código são excluídas. Logo, o capital cultural dominante fortalece-se e,

conseqüentemente, completa-se o ciclo da reprodução cultural, mantendo-se o

status das classes, garantindo o processo de reprodução social.

Finalmente, se inicia a crítica neomarxista à ideologia do currículo.

Para Michael Apple, a dinâmica da sociedade capitalista é o resultado da

dominação daqueles que detêm o controle da propriedade dos recursos

materiais sobre aqueles que possuem apenas sua força de trabalho. Essa

característica de organização econômica influencia as outras esferas sociais.

Para ele, essa ligação entre as estruturas econômicas e sociais mais amplas

com a educação e a cultura acontece no campo curricular.

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Devido a essa preocupação, o estudioso recorre ao conceito de

hegemonia, cujo campo social é um local contestado, onde os grupos

dominantes recorrem a um esforço de convencimento ideológico para manter

sua dominação econômica que se transforma em hegemonia cultural, atingindo

o ápice quando se transforma em senso comum. Analisa, também, a estrutura

curricular, pois sua seleção é o resultado de um processo que reflete os

interesses particulares das classes dominantes. Sua preocupação central é

como certos conhecimentos são considerados legítimos, em detrimento dos

ilegítimos. O sociólogo analisou dois aspectos do currículo: a do oculto,

focando nas relações sociais escolares no processo de reprodução social e na

maneira de transmissão do conteúdo; e, a do conteúdo, que enfatiza o currículo

oficial.

Logo, a escola é a principal produtora do conhecimento técnico que se

relaciona diretamente com a estrutura e o funcionamento da sociedade

capitalista por se tratar de um saber relevante para a economia e para a

produção que se dá nos níveis superiores do sistema educacional. Porém, o

ponto máximo da crítica appleana é a relação entre currículo e poder, ou seja,

a conexão entre a estrutura econômica e a reprodução dos recursos

simbólicos.

Ao enfatizar o conceito de hegemonia, alerta para o fato de que as

pessoas devem estar convencidas da desejabilidade e legitimidade dos

arranjos sociais existentes, mas não somente por imposição ou domínio, mas

também por resistência e oposição. Logo, o currículo seria um campo de

resistência. Assim, para Apple, o currículo não pode ser compreendido e

transformado se não for feito um questionamento sobre suas conexões com o

poder.

Portanto, o currículo é uma questão de poder, porque privilegia o tipo

de conhecimento, destacam uma identidade tida como a ideal e tenta garantir o

consenso e a hegemonia.

1.2- A história das disciplinas escolares

Segundo Chervel (1990), a prática escolar fornece informações sobre

a produção do conhecimento que não são encontradas no nível de sua

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produção dentro da ciência ou em outras instâncias da sociedade. Essa

constatação fez com que seus estudos se dirigissem para a investigação da

história das disciplinas escolares que lida com fontes primárias, como, por

exemplo, os manuais didáticos e os cadernos escolares, com milhões de

páginas escritas que, segundo ele, podem revelar uma história ainda não

relatada, nem analisada. A palavra disciplina, tal como se conhece hoje, é uma

criação recente. Na França, por exemplo, só é registrada após a Primeira

Guerra Mundial, mas guarda a idéia de sua origem: disciplinar, ordenar,

controlar. A disciplina escolar seria resultado da passagem dos saberes da

sociedade por um filtro específico, a tal ponto que, após algum tempo, ela pode

não mais guardar relação com o saber de origem. Para Chervel (1990), a

disciplina é o preço que a sociedade paga à cultura para passá-la de uma

geração à outra. Fica claro, portanto, que o referencial epistemológico desse

campo de investigação sustenta que as disciplinas escolares não são reflexo,

vulgarização ou adaptação pura e simples das ciências de referência.

À medida que a história de uma disciplina se desenrola, sofre

transformações no seu interior, as quais dificultam a análise de sua relação

com a sociedade, dando a impressão de que só os seus fatores internos, ou

aqueles relacionados com a sua ciência de referência, foram responsáveis pela

sua história. Encontrar os pontos principais desse processo, considerando as

forças e os interesses sociais em jogo na história de determinadas disciplinas,

pode lançar mais luz sobre seus conteúdos e suas práticas com o objetivo de,

se necessário, modificá-los para atender a novas necessidades, em vez de

reproduzi-los como se fossem neutros e independentes.

Mais especificamente, é preciso analisar a constituição de uma

disciplina escolar como “produto e processo que impõem significado às práticas

humanas” (Menegazzo, 2001), isto é, como cultura. Nesse sentido, é preciso

incorporar a essa discussão não apenas um número cada vez maior e

diversificado de disciplinas, mas, principalmente, ampliar a discussão dessas

histórias, incorporando a discussão sobre a cultura que as produziu e é produto

delas.

Torna-se necessário, por exemplo, analisar o processo que levou à

introdução e à posterior eliminação da disciplina língua latina dos currículos

escolares, depois de ter sido considerada uma disciplina-chave na formação

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das mentes; o processo de substituição da história das disciplinas escolares à

história da cultura escolar.

Chervel (1990) propõe algumas questões como ponto de partida para

essa análise: Qual a concepção e conhecimento daquela sociedade (delimitar:

uma cidade, um grupo social)? Qual a sua concepção de diferenças culturais?

Isto é, quem é o outro que precisa ser educado? Qual a sua concepção de

professor? Isto é, quem eram, como eram contratados e formados e o que se

exigia dos professores? Quem era excluído/ incluído por essa cultura? Que

instrumentos eram indicados para o professor? Como eles eram usados? As

respostas a essas questões, mesmo sendo a base para o trabalho empírico

sobre a história das disciplinas escolares, precisam ser analisadas como

processos e produtos das práticas escolares, isto é, da cultura escolar. Faria

Filho (1996), ao descrever a história da educação da cidade de Belo Horizonte,

afirma que, no início de sua história, a cultura escolar era igual à cultura da

população.

Com a criação dos grupos escolares, em substituição às escolas

isoladas, criou-se não apenas um lugar físico diferente, mas, principalmente,

um novo lugar simbólico, capaz de operar uma mudança de sensibilidade,

linguagem, comportamentos, costumes, e mesmo de projetos e perspectivas

sociais, a começar pelas crianças. No grupo escolar, agora um lócus, a escola

deixou o espaço privado para entrar no público, espaço de construção da

cultura escolar.

As pesquisas sobre a história da educação pública no Brasil vêm

revelando que a escola (física e simbolicamente) foi consolidando-se como o

lugar mais apropriado para a formação das novas gerações. Nela foi sendo

construída uma cultura escolar distante da cultura de parcelas da população

que se pretendia modificar através das crianças: uma cultura escolar que não

se articula em torno do conhecimento, mas da possibilidade de criar uma

instituição ordenadora da vida social (Faria Filho, 1996). Foi principalmente

durante as três primeiras décadas do século XX que este processo ficou mais

claro nas escolas brasileiras.

No caso específico da educação, o livro de Romanelli (1983), história

da educação brasileira, parece ter contribuído para a consolidação da

percepção de 1930 como marco divisório de um período caótico para um

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período de organização, uma vez que sua coletânea de leis da educação,

gestadas ou produzidas na década de 1930, foi organizada a partir dessa

hipótese. Uma análise histórica mais profunda levá-nos a concluir com Decca

(1988) que 1930 começou, no mínimo, em 1928, isto é, ao escrever a história a

partir do silêncio dos vencidos, o autor mostra como os processos que

culminaram com o período conhecido como pós-revolução de 1930 apresentam

raízes nas lutas travadas na década anterior. A busca da origem de algumas

das disciplinas escolares já estudadas no Brasil chegou sempre aos anos de

1930 como marco importante. Quer como momento de consolidação, como

foi o caso da geografia, que “encontra nesse contexto histórico (anos de 1930)

o palco ideal para se desenvolver cientificamente e se consolidar enquanto

disciplina escolar” (Barros, 2000, p. 10), da didática que aparece nos currículos

em meados da década, e da disciplina canto orfeônico, uma das disciplinas

estratégicas do Estado Novo; quer como momento de profundas inflexões,

como na história da disciplina moral e cívica, exatamente por ter sido excluída

dos currículos escolares nesse período (Josgrilbert, 1998). Ou como período de

gestação de experiências que se consolidariam na década seguinte, como

aconteceu com a disciplina prática de ensino, antes ministrada na forma de

exercícios práticos, e que só foi caracterizar-se como disciplina escolar, com

conteúdo, professor e horário definidos, com a Lei Orgânica do Ensino Normal,

em 1946 (Rauber, 1999).

Se no final do século XIX a construção da ordem e a salvação das

almas não exigiam dos professores nada que eles já não soubessem de berço,

dispensando cursos de formação, provas sobre como ensinar ou a disciplina

didática (Pessanha, 2000), na década de 1930 pelo menos partes da

sociedade parece ter assumido a posição de que era preciso dar uma resposta

convincente, ordenadora, ao movimento renovador dos anos de 1920, durante

os quais a direção do desenvolvimento no Brasil apresentou algumas

possibilidades que provocavam temor nas “elites” (Lanni, 1989).

A promulgação de leis, decretos e outros instrumentos legais com o

objetivo de organizar a educação no Brasil; a inclusão de algumas disciplinas

estratégicas como canto orfeônico e a direção que se procurou dar a outras

disciplinas parecem ter sido uma tentativa de ordenação e outra de colocar em

prática a inserção da escola no processo de ajustamento dos indivíduos à

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sociedade, isto é, na direção que o movimento vitorioso em 1930 havia

escolhido.

Afirmar que a escola da época foi o reflexo dessas tentativas de

ordenação e inculcação, e que a introdução da didática nos cursos de

formação de professores, exatamente na década de 1930, tivesse sido a

resposta das elites a esse temor, seria negar a especificidade dos processos

sociais que se desenrolam na escola e a própria existência de uma cultura

escolar.

A reconstituição da história da disciplina geografia como tal disciplina

também adquiriu uma função estratégica durante o Governo Vargas na

divulgação e na consolidação de sua política nacionalista, quando a geografia,

dentro e fora da escola, atinge seu momento de maior peso e influência junto

ao Estado e à sociedade brasileira.

Sem pretender esgotar as possibilidades de análise que a história

dessas disciplinas oferece, e considerando os riscos de reducionismo dessas

análises, percebe-se em suas histórias traços de uma sociedade que tinha a

ordem e a disciplina como valores, pelo menos entre as frações de classe que

a dirigiam.

Valores a serem preservados e cultivados tanto na formação dos professores

quanto nas disciplinas escolares.

Provavelmente para se contrapor à “desordem” e à “anarquia” dos anos

loucos, dos anos de 1920, quando foi possível o surgimento de movimentos

anarquistas, comunistas e modernistas, cabia agora “oficializar”, “normalizar”,

“rotinizar”, ou reprimir sumariamente, para que nada saísse dos trilhos, para

usar uma metáfora bem cara à época: a de que a sociedade devia “entrar nos

trilhos” do progresso como as locomotivas (Candido, 1964).

A análise sistematizada dos resultados das pesquisas sobre a história

das disciplinas escolares, realizadas durante os dez anos de existência do

grupo, conduziu à conclusão de que o estudo da história das disciplinas

escolares estaria limitado caso se restringisse apenas aos processos ocorridos

internamente em cada disciplina. À medida que se aprofundava a análise das

histórias das disciplinas escolares pesquisadas, a “noção de cultura escolar” foi

possibilitando articular essas histórias, e a história da cultura escolar tornou-se

o objeto de pesquisa do grupo.

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1.3- As tendências curriculares no Brasil

Um primeiro ensaio de sistematização das questões curriculares surgiu

no Brasil, no inicio do século XX, no contexto das reformas do ensino

realizadas em vários Estados, contando com a atuação de importantes

participantes do movimento renovador da educação - Escola Nova -, como

Anísio Teixeira, Mario Casasanta, Fernando de Azevedo, Carneiro Leão, entre

outros (MOREIRA, 1990). Portanto, pode-se dizer que o campo do currículo no

Brasil nasceu na efervescência da Escolanovismo. No entanto, esse campo de

estudos consolidou-se no Brasil a partir da criação Instituto Nacional de Estudo

e Pesquisa Educacionais (Inep), em 1938.

A publicação da Revista Brasileira de Estudo Pedagógicos, a partir de

1944, tornou-se um dos principais veículos de difusão do pensamento

curricular emergente no país. Na década de 1950, o Inep publicou o primeiro

livro brasileiro sobre currículo. Intitulado Introdução ao estudo da Escola

Primaria (1955), de João Roberto Moreira. Além de publicações, o Inep

empreendeu outras iniciativas na área do currículo como a promoção de cursos

e o incentivo a estudos específicos sobre os termos nos Centros Regionais de

Pesquisas Educacionais, criado a partir de 1955.

As Divisões de Treinamento do Magistério, ligadas a esses centros,

ofereceram cursos sobre planejamento curricular e organizaram escolas

experimentais, contribuindo para a ampliação do debate sobre currículo no

Brasil. Outra influência significativa foi à atuação do Programa de Assistência

Brasileiro – Americana de Ensino Elementar (PABAEE) que implantou um

programa especial de Currículo e Supervisão responsável pela promoção de

cursos sobre currículo e assistência técnica em questões curriculares.

Na década de 1960, além da influência do PABAEE, o

desenvolvimento do campo do currículo no país foi marcado pela introdução

das disciplinas currículos e programas nos cursos de Pedagogia, após a

Reforma Universitária (Lei 5.540/ 1968). Desde então, instalou-se no interior

das faculdades e universidades brasileiras tornando-se campo de ensino e

pesquisa.

A influência Norte-Americana foi marcante em todo desenvolvimento do

campo do currículo no Brasil. Na década de 1970, foram traduzidos vários

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livros de autores americanos sobre o tema, entre eles destacam-se a tradução

do livro de Tyler, Princípios Básicos de Currículos e Ensino, em 1974, que

obteve uma enorme aceitação entre os educadores brasileiros. Além disso, a

reforma do ensino de 1º grau (Lei 5.692/1971) utilizou amplamente o

pensamento curricular norte-americano em voga na época. Foram criadas

comissões de currículo que passaram a adotar a orientação curricular proposta

pó Tyler utilizando textos de pedagogas brasileiras que se fundamentaram

nesse autor como, por exemplo, Dalita Sperb, Mariana Couto e Lady Lina

Traldi.

Já os anos 80 do século XX, viram florescer no Brasil o pensamento

crítico sobre o currículo de natureza sociológica. Foram traduzidas no início da

década de 1980 dois livros que influenciaram profundamente as propostas de

reestruturação curricular no país nesse período: Ideologia e Currículo, Michael

Aplle (1982) e Pedagogia Radical de Henry Giroux (1983).

Esses autores influenciaram o pensamento curricular desenvolvido nos

cursos de Pedagogia e nos programas de Pós-graduação em educação, os

quais estavam se consolidando nessa época.

A consolidação do campo ocorreu de forma definitiva no país, na

década de 1990, destacando-se a produção dos programas de Pós-graduação

na área, os trabalhos apresentados no GT- Currículo da Associação Nacional

de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação - Anped, a publicação de

inúmeros livros e periódicos, a realização de reuniões cientificas.

Atualmente, são múltiplas as abordagens teóricas vigentes no campo

do currículo no Brasil, entre eles podemos citar: o enfoque neomarxista, a

abordagem processual ou pratica e a corrente pós-moderna. Entre os autores

estrangeiros destacam-se: Michael Aplle, Henry Giroux, José Gimeno

Sacristan, José Contreras Domingo, Ivor Goodson, Thomas Popkewitz, entre

outros.

Entre os autores nacionais podemos citar: Antonio Flavio Barbosa

Moreira, Tomaz Tadeu Silva, Alfredo José da Veiga - Neto, Lucíola Santos, Ana

Maria Saul, Alice Ribeiro Casemiro Lopes, Maria das Mercês Ferreira Sampaio,

Elizabeth Macedo, entre outros.

▬ A perspectiva teórico-prática do currículo

Page 17: A Historia Do Curriculo

A abordagem processual ou prática do Currículo articula uma reflexão

sobre a prática vinculando-a ao exame das relações entre relação e sociedade.

Essa abordagem elege como foco de análise como o currículo se realiza de

fato. Trata-se, portanto, de uma abordagem teórica complexa pautada numa

visão de conjunto de currículo e do processo educacional em sua relação com

a sociedade. Tal abordagem busca explicar a relação do currículo com o

exterior e do currículo como regulador do interior das instituições escolares.

A perspectiva teórico-prática ressalta os contextos cotidianos do

trabalho docente com o conhecimento e com o processo de ensino e

aprendizagem, contexto curricular completo e problemático. Diz respeito, como

afirma Gimeno (1998) aos micros espaços da ação, as possibilidades da

deliberação dos professores sobre o seu próprio trabalho e a compreensão de

como o currículo se convertem em cultura real para professores e alunos.

Goodson (1997), propõe uma história social do currículo que leve em

consideração o papel histórico dos grupos sociais na definição conflitual a

cerca das disciplinas e programas de ensino desmistificando a idéia de um

currículo neutro a-temporal4 e a-histórico. Trata-se de fato, de desconstruir o

processo de fabricação do currículo mostrando os interesses subjacentes à

configuração dos programas de ensino e aos determinantes sociais e políticos

da seleção do conhecimento escolar. Para tanto, é relevante considerar tanto o

currículo prescrito - as deliberações formais impossíveis estabelecidas pelos

poderes públicos, quanto o estudo das práticas educativas. A propósito, afirma

o autor, “Penso que, hoje em dia, seria uma insensatez ignorar a importância

central do controle e definição do currículo escrito. Num sentido significativo, o

currículo escrito é o testemunho público e visível das racionalidades escolhidas

e da retórica legitimadora das praticas escolares”. (GOODSON, 1997, P. 20).

O currículo prescrito oferece parâmetros importantes para a sala de

aula. Ele possui um significado simbólico e prático. Simbólico porque

determinadas intenções educativas são desse modo, publicamente

comunicada e legitimadas, prático, porque essas convenções escritas

traduzem em distribuição de recursos e benefícios do ponto de vista da

carreira.

4. Atemporal - fora do domínio do tempo; que não se enquadra em tempo algum; que não pertence a um tempo específico.

Page 18: A Historia Do Curriculo

A dimensão prática significa buscar a aproximação do que realmente

ocorre nas salas de aula, aspecto fundamental para se perceber o modo como

o mundo da educação esta estruturado.

Além dessa concepção ampla, a teoria processual do currículo oferece

indicações valiosas para o professor compreender os problemas curriculares.

Por um lado, levando-o a perceber o grau de autonomia e restrição que os

agentes educacionais têm em relação ao currículo. Por outro lado, fornecendo

conceito para pensar a prática em torno do currículo e decidir sobre ela. A esse

respeito, ressalta os problemas curriculares como problemas práticos e por

natureza incerta, devendo ser resolvido por um processo de deliberação.

Visto dessa forma, o currículo deixa de ser um instrumento do trabalho

docente. Algo que o professor percebe como sendo inerente e fundamental em

seu trabalho, algo sobre o qual ele intervém, modela, aperfeiçoa e transforma.

— A apresentação formal do currículo

A abordagem técnico-linear de currículo consagrou um modelo de

apresentação do currículo fundamental ao planejamento compreendendo os

objetivos educacionais, os conteúdos a serem ensinados, a metodologia e a

avaliação. As propostas curriculares formuladas no Brasil, a partir da década

1980, mesmo fundamentando-se em perspectivas críticas, mantiveram alguns

desses elementos atribuindo-lhes novas dimensões e significados.

Destacam-se, especialmente, a apresentação dos fundamentos

teóricos, os critérios de seleção dos conteúdos e a concepção de ensino que

norteia cada um deles. Na mesma direção, são apresentados os objetivos

educacionais a serem alcançados, orientações didáticas incluindo a avaliação,

e último, uma ampla bibliografia. As propostas curriculares assim formuladas

expressam a sua finalidade, isto é, a de se constituírem em um projeto de

cultura a ser complementado nas instituições educativas.

— As políticas do governo federal para o Currículo no Brasil

A centralização do currículo nas mãos do poder público é uma

característica marcante da política curricular no Brasil. A dualidade do sistema

Page 19: A Historia Do Curriculo

de ensino permaneceu na história da educação brasileira durante o século XIX

e boa parte do século XX. Dessa forma, coube aos Estados legislarem sobre o

programa de ensino primário e secundário durante todo esse período.

A reforma do ensino de 1º e 2º graus ocorrida em 1971 - Lei 5.692/71 -

e aponta, nesse sentido, como um divisor de águas. Para Silva e Arelano

(1984), pelo menos em relação à questão curricular, essa lei deu ao problema

um tratamento minucioso que a distingue das legislações anteriores. De fato,

como demonstra as autoras, a lei de diretrizes e bases anterior, Lei 4.024/81,

contemplou a questão curricular superficialmente admitindo experiências

pedagógicas e no ensino secundário, a variedade de currículos de acordo com

as matérias optativas escolhidas pelo estabelecimento de ensino.

A flexibilidade curricular permitida nessa Lei de Diretrizes e bases, de

1961, possibilitou experiências educacionais significativas desenvolvidas no

estado de São Paulo, por exemplo, os grupos escolares-ginásios (GECs),

compreendendo o ensino integrado de oito anos e os ginásios vocacionais, do

tipo pluricurricular, inovações consagradas posteriormente na Lei 5.692/71.

A política curricular instituída pela Reforma Educacional de 1971

coadunou uma nova estrutura curricular para o ensino de 1º e 2º graus, tendo

em vista as finalidades da educação nacional concernentes ao regime político

vigente. A seleção cultural articulou conhecimentos gerais à formação para o

trabalho, caracterizando a terminalidade ao ensino secundário.

A reforma de 1971 fixou um núcleo comum obrigatório em nível

nacional e uma parte diversificada, cujas eram atender as peculiaridades

locais, os planos dos estabelecimentos de ensino e das diferenças individuais

dos alunos. O núcleo comum foi apresentado tendo em vista sua finalidade

pedagógica de instituir um currículo mínimo que se constituísse na base

comum do ensino de 1º grau em todas as escolas do País. Atendia, assim, a

uma preocupação legitima da necessidade de consolidar a escola de 1º grau

que representou, naquele momento histórico, uma profunda modificação na

estrutura do ensino no Brasil, instituindo uma escola única de 8 anos de

duração, obrigatória, unindo duas estruturas tradicionalmente diferente: o

ensino primário e o ensino ginasial (primeiro ciclo do ensino secundário desde

1942).

Nesse sentido, o núcleo comum visava não apenas homogeneizar a

Page 20: A Historia Do Curriculo

cultura escolar, mas, também, amalgamar a escolarização elementar de oito

anos.

Os documentos mais importantes de ordenação do currículo na nova

estrutura escolar implantada em 1971 foram o Parece nº. 853/71 e a resolução

8, de 1/12/1971. O paradigma curricular técnico, adotado na época,

compreendeu uma complexa articulação que envolve de quatro aspectos: A

determinação dos conteúdos realçando as diferenças, semelhanças e

identidades que havia entre o núcleo comum e a parte diversificada; O currículo

pleno com as noções de atividade, áreas de estudo e disciplina; Em relação

ao currículo pleno, o desenvolvimento das idéias de relacionamento,

ordenação, seqüência e a função de cada uma delas para a construção de um

currículo orgânico e flexível; A delimitação da amplitude da educação geral e

formação especial, em torno das quais se desenvolvia toda a nova

escolarização.

Em realidade, a ordenação legal buscou instituir, pelo menos seus

fundamentos teóricos, uma organização curricular que levasse em conta o

desenvolvimento infantil e a integração dos conteúdos. Entendeu-se dessa

forma, o uso das categorias curriculares, atividades, áreas de estudo e

disciplinas aplicadas ao desenvolvimento das matérias pelo princípio do mais

para o menos amplo e do menos para o mais específico.

Dessa maneira, os conteúdos desenvolvidos em forma de atividades

pressupunham a aprendizagem com base em experiências, situações

concretas. Em forma de áreas de estados compreendia o equilíbrio entre

situações de experiência e conhecimentos sistemáticos e em forma de

disciplina, o conhecimento sistemático propriamente dito.

Outras categorias curriculares como educação geral e formação

especial designavam com precisão as finalidades atribuídas ao ensino de 1º. e

2º. graus. A educação geral destinava-se a transmitir uma base comum de

conhecimentos indispensáveis a todos, tendo em vista a continuidade dos

estudos; a parte especial tinha como objetivo a sondagem de aptidões e a

indicação para o trabalho no 1º grau e a habilitação profissional no 2º grau.

Em relação aos conteúdos, optou-se pela classificação tríplice das

matérias em Comunicação e Expressão, Estudos Sociais e Ciências. Dessas

grandes linhas de matérias foram fixados os conteúdos particulares de cada

Page 21: A Historia Do Curriculo

uma incluindo na “obrigatoriedade atribuída ao núcleo comum” (Resolução 8 do

art. 1º.§ 1º. De 1/12/1071); Língua Portuguesa em Comunicação e Expressão,

Geografia, Historia e Organização Social e Política do Brasil em Estudos

Sociais e Matemática e Ciências Físicas e Biológicas em Ciências. Exigia-se

também, como parte do núcleo comum, Educação Física, Educação Artística,

Educação Moral e Cívica, Programa de Saúde e Ensino Religioso, este

obrigatório para os estabelecimentos oficiais e facultativos para os alunos.

O novo currículo para o ensino de 1º grau estabelecido em 1971 deve

ser analisado considerando as influências sociais, políticas e culturais que

determinaram seleção cultural para o currículo.

Algumas disciplinas novas foram introduzidas e outras se mantiveram,

mas concebidas com outras finalidades e reestruturadas do ponto de vista

epistemológico. No primeiro caso, temos a disciplina Organização Social e

Política Brasileira – O.S.P.B; no segundo entre as disciplinas tradicionalmente

incluídas no currículo, destaca-se Educação Artística e Programa de Saúde. A

Educação Artística, considerada atividade educativa e não propriamente uma

disciplina, alargou a concepção do ensino da arte incluindo as várias

linguagens artísticas: artes plásticas, desenho, teatro, entre outras.

Da mesma forma, programas de saúde substituem a visão higienista

predominante, até então, pela compreensão mais abrangente de saúde e

prevenção.

A finalidade das matérias foi redefinida tendo em vista as atribuídas à

educação nacional, também, por fatores políticos, ideológicos e

epistemológicos. Nesse sentido, foi estabelecido como objetivo das matérias.

Em comunicação e Expressão. O cultivo de linguagens que ensejem ao

aluno o contato coerente com os seus semelhantes e a manifestação

harmônica de sua personalidade dos aspectos físico, psíquico e espiritual,

ressaltando-se a Língua Portuguesa como expressão da cultura brasileira.

Nos Estudos Sociais, o ajustamento crescente do educando ao meio,

cada vez mais amplo e complexo, em que deve apenas viver como conviver,

dando-se ênfase ao conhecimento do Brasil na perspectiva atual do seu

desenvolvimento.

Nas Ciências, o desenvolvimento do pensamento lógico e a vivência do

método científico e de suas aplicações.

Page 22: A Historia Do Curriculo

A organização curricular definida pela Reforma de 1971 vogou por

quase três décadas até ser revogada pela nova Lei de Diretrizes e Bases da

Educação - LDB (Lei 9.394/96), em 1976. Apesar da vigência da lei, varias

reestruturações curriculares ocorreram na década de 1980, implementadas

pela ação dos governos estaduais e de alguns municípios.

▬ A Organização do Trabalho na Escola

A escola é vista como construção coletiva permanente. É essencial a

vinculação com as questões sociais e com os valores democráticos não só do

ponto de vista da seleção e tratamento dos conteúdos, como também da

própria organização escolar.

Para ser uma organização eficaz no cumprimento de propósitos

estabelecidos, a escola deve pautar-se pela autonomia, pelo trabalho coletivo e

pela construção do projeto pedagógico.

▬ A Organização Por Ciclos

A proposta adota a organização do currículo por ciclos, áreas de

conhecimentos e temas transversais a justificativa para a fixação dos ciclos

baseia-se em argumentos de natureza pedagógica. O ciclo propiciaria um

tempo mais flexível para lidar com os diferentes ritmos de aprendizagem dos

alunos. Dispondo de mais tempo, busca evitar as freqüentes rupturas e a

excessiva fragmentação do percurso escolar, assegurando a continuidade do

processo educativo, dentro do ciclo e na passagem de um ciclo ao outro.

▬ As Áreas de Conhecimento

A concepção de área evidencia a natureza dos conteúdos tratados,

definido claramente o corpo de conhecimentos e o objetivo de aprendizagem.

Neste sentido, os parâmetros optaram por considerar a fundamentação das

opções teóricas e metodológicas de cada área possibilitando, ao professor

refletir sobre cada conteúdo.

Page 23: A Historia Do Curriculo

▬ Temas Transversais

Além das áreas, buscaram-se integrar, nos parâmetros, as

problemáticas sociais como temas transversais. As aprendizagens relativas a

esses temas se explicitam na organização dos conteúdos das áreas, mas

discussão e conceitualização e a forma de tratamento que devem receber no

todo da ação educativa escolar está especificada em textos de fundamentação

por tema.

Os objetivos a serem alcançados no ensino das áreas e temas

transversais foram definidos foram em função das capacidades que devem ser

desenvolvidas pelos alunos ao longo da escolaridade. Os objetivos se definem

em termos de capacidades de ordem cognitiva, afetiva, de relação interpessoal

e inserção social, ética estética, tendo em vista uma formação ampla.

▬ Classificação dos Conteúdos

De forma semelhante é indicada no Referencial Curricular Nacional

para Educação Infantil, os conteúdos são abordados no PCN em três grandes

categorias:

Os conteúdos conceituais referem-se á construção ativa das capacidades

intelectuais para operar com símbolos. Idéias, imagens e representações que

permitem organizar a realidade. Veja alguns exemplos

1- Em Ciências Naturais: identificar e compreender as relações entre o solo e

seres vivos nos fenômeno de escoamento da água, erosão e fertilidade dos

solos no ambiente urbano e rural.

2- Em Língua Portuguesa: conhecer e respeitar as diferentes variedades

lingüísticas do português falado.

3- Em História: identificar os diferentes tipos de organizações urbanas.

Destacando suas funções e origem.

4- Em Geografia: caracterizar a paisagem local - suas origens organização, as

manifestações da natureza em seus aspectos biofísicos, as transformações

sofridas no tempo.

5- Em Matemática: reconhecer os números racionais.

Page 24: A Historia Do Curriculo

Conteúdos procedimentos: expressam um saber fazer, que envolve tomada de

decisões e realização de uma serie de ações, de forma ordenada e não-

aleatoria, para atingir uma meta. Veja alguns exemplos.

Em Ciências Naturais: organizar e registrar as informações por intermédio de

desenhos, quadros, esquemas, gráficos, listas, textos e maquetes, de acordo

com as exigências do assunto em estudo, sob orientação do professor.

1 Em Língua Portuguesa: usar os conhecimentos adquiridos por meio da

prática de reflexão sobre a língua para expandir as possibilidades, os

usos e a capacidade de analisar criticas.

2 Em História: utilizar método de pesquisa e de produção de textos de

conteúdos históricos, aprendendo a ler diferentes registros escritos,

fotográficos, sonoros

3 Em Geografia: saber utilizar a linguagem cartográfica para obter

informações e representar a espacialidade dos fenômenos geográficos.

4 Em Matemática: interpretação de dados apresentados por meio de

tabelas e gráficos para identificação de características previsíveis ou

aleatória de acontecimentos.

Conteúdos atitudinais: referem-se aos valores, as normas e atitudes. A

aprendizagem desses aspectos permeia todo o conhecimento escolar. Alguns

exemplos a seguir.

1 Em Ciências Naturais: valorizar a vida em sua diversidade e a

preservação dos ambientes.

2 Em Língua Portuguesa: valorizar a leitura como fonte de informação.

3 Em História: valorizar o patrimônio sociocultural e respeitar a

diversidade, reconhecendo-a como um direito dos povos e indivíduos e

como um elemento de fortalecimento da democracia.

4 Em Geografia: valorização de formas não-predatorias de exploração,

transformação e uso dos recursos naturais.

5 Em Matemática: confiança em sua possibilidade para propor e resolver

problemas.

Page 25: A Historia Do Curriculo

▬ Considerações dos PCNs sobre a avaliação

A concepção de avaliação dos parâmetros compreende esta atividade

como parte integrante e intrínseca ao processo educacional. Envolve um

conjunto de atuações que tem a função de alimentar, sustentar e orientar a

intervenção pedagógica. A avaliação subsidia o professor com elementos para

uma reflexão contínua sobre a prática. Por isso, ela deve ocorrer

sistematicamente durante todo o processo de ensino e aprendizagem e não

somente após o fechamento de etapas do trabalho, como é habitual.

Propõe também a avaliação diagnóstica e investigativa inicial que

instrumentalizará o professor para que ele possa por em prática o seu

planejamento de forma adequada às característica de seus alunos. Como

orientações para avaliação são indicados os seguintes aspectos: observação

sistemática, analise das produções dos alunos, atividades específicas para a

avaliação.

Ressalta os critérios que deve substituir a emissão de um juízo de

valor sobre o processo de ensino de aprendizagem. A aprovação e reprovação

são vistas como decisão pedagógica que visa a garantir as melhores condições

de aprendizagem para os alunos, requer uma analise dos professores a

respeito das diferentes capacidades do aluno que permitirão o aproveitamento

do ensino na próxima série ou ciclo. Indica, ainda, que a repetência deva ser

um recurso extremo, deva ser estudado caso a caso, no momento que mais se

adequar a cada aluno, para que esteja de fato a serviço da escolaridade.

▬ Currículo e fracasso escolar

De acordo com a definição de Luckesi (1997, p. 33), a avaliação “e um

julgamento de valor sobre manifestação relevante da realidade tendo em vista

uma tomada de decisão”.

Na história da educação brasileira, a avaliação tem sido

sistematicamente utilizada com a função de classificar, selecionar, disciplinar e

punir os alunos. É nessa perspectiva que podemos analisar a relação entre

currículo e a produção do fracasso escolar. Mediante a aplicação de provas,

instrumentos privilégiados na avaliação, os professores “cobram” dos alunos

Page 26: A Historia Do Curriculo

conteúdos trabalhados em classe e verificam as aquisições realizadas. Dessa

maneira, os resultados expressam o currículo realizado indicando a

dissociação entre ensino e aprendizagem, portanto, os graves problemas que

envolvem o processo de transmissão do currículo.

Na medida em que a avaliação produz o fracasso escolar e o legitíma,

atesta os limites do processo de transmissão de conhecimento e a

incapacidade dos professores e das escolas garantirem aos alunos a

aprendizagem dos conteúdos que eles mesmos consideram relevantes.

Sobre essa questão, Gimeno lembra que “a função reguladora da

passagem do aluno pelo sistema escolar é inerente à própria ordenação do

currículo como sistema organizado, e é difícil pensar em outra possibilidade.”

De fato, a avaliação e inerente à organização curricular. Está inscrita na

mesma racionalidade e intencionalidade implícita no currículo.

Ainda de acordo com Gimeno, “os alunos e o próprio professor não

distinguem procedimentos de avaliação realizados com propósitos de

diagnostico de outros com função sancionadora de níveis de aprendizagem

com vistas à promoção do aluno pelo currículo regulado dentro da

regularidade. Embora a educação obrigatória não seja seletiva, a avaliação

realizada dentro dela gradua os alunos, hierarquiza-os, porque assim porque

assim ordena sua progressão.” (p. 312). A avaliação assim concebida é

antidemocrática e excludente.

▬ Avaliação, currículo e sucesso escolar

Desde uma perspectiva político-social, a avaliação de contribuir para

favorecer a democratização da cultura. A avaliação deve ter seu sentido

ampliado, isto é, o de ser uma alavanca do progresso ao aluno, um sistema de

informações para aluno e professores sobre o andamento do processo ensino-

aprendizagem, sobre dificuldades, falhas, necessidade de revisão, reforço etc.

dessa maneira, ela adquire um sentido comparativo do antes e do depois da

ação, da valorização dos avanços, perdendo o caráter de mero instrumento de

seletividade.

Talvez devêssemos nos perguntar qual e o melhor sistema de

avaliação para a promoção de uma escola democrática. Qual é a melhor

Page 27: A Historia Do Curriculo

alternativa política e pedagógica? Que proposta ela da ao velho problema -

Com base nos princípios democráticos e de justiça social, o que mais convêm:

manter a seletividade do sistema público de ensino ou garantir o Ensino

Fundamental para a maioria da população brasileira? Estas são questões

polemicas que merecem um debate permanente entre os professores. Essa

definição que parte da administração pública só se concretiza na escola, na

prática. Por isso, a decisão deve ser tomada pelos professores de forma

refletida e circunstanciada.

Por mais difícil que pareça o conjunto das tarefas, dos desafios do

trabalho docente, não podemos nos esquecer das finalidades fundamentais da

profissão docente - entre elas, o compromisso com a formação de crianças que

necessitam desse trabalho. Isto me faz lembrar uma frase de Walter Benjamin

que diz “a crise, a verdadeira crise, é continuar tudo como esta”.

▬ O currículo como formação

Em primeiro lugar, trata-se de o professor assumir o currículo como a

matéria-prima do seu trabalho e de assumir a responsabilidade em colocá-lo

em ação mantendo o compromisso com a qualidade do ensino. Pois, como

afirma Contreras (1991), ao assumir uma proposta curricular o professor está,

também assumindo uma forma de responder as exigências de seu trabalho, ou

seja, esta tomando decisões sobre o que fazer em classe com os alunos. Este

o que fazer é concernente a um contexto educativo que se apresenta na

maioria das vezes como um conjunto de problemas a serem enfrentados e que

exigem respostas.

No dia a dia de seu trabalho, o professor se defronta com certas

questões como, por exemplo: Que conteúdos selecionar de tal forma que

sejam significativos para os alunos e que tenham valor para eles fora da

escola? Que atividade pode garantir o interesse dos alunos? Que metodologia

adotar? Como lidar com a disciplina e a avaliação de forma menos arbitraria?

Como partir dos conhecimentos prévios dos alunos? Como atuar de forma a

facilitar a construção do conhecimento pelos alunos? Como tornar o ensino e a

aprendizagem eficaz com vistas a promover o sucesso do aluno e não o

fracasso escolar?

Page 28: A Historia Do Curriculo

Verifica-se, assim, a importância de o professor conceber o currículo

como uma ferramenta de trabalho que lhe possibilita lidar com esses e outros

problemas educativos de forma operacional e conceitual. Nessa perspectiva, o

professor pode relacionar-se com as propostas e materiais curriculares de

outra forma, não como uma resposta pronta a ser aplicada ou um repertorio de

atividades a cumprir, mas como um campo de experimentação.

O desenvolvimento do currículo faz parte das competências

profissionais do docente, essa competência exercida de forma individual ou

coletiva resulta em processos de profissionalização distintos. De fato como

ressalta Gimeno (1998), o saber fazer docente é construindo na prática com os

alunos e na troca de experiências com os colegas - mediante, “dicas”

afirmações modelos de atividades e provas, empréstimos de livros e outros

materiais, relatos de experiências bem ou mal-sucedidas entre outros.

A atuação individualizada tem predominado no exercício do trabalho

de professor. No entanto, práticas de exercícios profissionais de forma coletiva

tendem a proporcionar melhores resultados em relação á profissionalização e

desenvolvimento do currículo. Essa posição e defendida por Gimeno que

apresenta para tal defesa, três tipos de justificativas. Em relação à

concretização das metas do currículo, observa que boa parte dos objetivos

educacionais são abordados por todos os professores; a organização do

currículo em ciclos; a ordenação dos conteúdos em temas, a adoção do

método de projetos. Entre outras propostas, são inovações que exigem o

trabalho coletivo dos professores.

Do ponto de vista social da profissionalização, o professor e impelido a

discutir problemas da organização escolar que afetam diretamente a ele e a

todos os outros professores. A tomada de decisões coletivas e compartilhada

favorece a resolução de problemas profissionais.

A relação escola-comunidade requer projetos educativos elaborados

de forma coletiva proporcionando a participação democrática e o envolvimento

da comunidade escolar.

Professores que já tiveram a oportunidade de vivenciarem

experiências de trabalho em instituições educacionais pautadas pelas relações

democráticas de poder e no incentivo á participação, cooperação e trabalho

integrado desenvolvem competências profissionais enriquecedores e

Page 29: A Historia Do Curriculo

diferenciadas daqueles que não tiveram a mesma oportunidade. Como

observa Gimeno (1998, p. 198 – 199).

O individualismo dos professores, que pode cobrir inseguranças

profissionais, modelos discutíveis e nem sempre confessáveis de relação com

seus alunos, se faz tanto mais impermeável à mudança quanto menos

desenvolvidas estão às estruturas de funcionamento coletivo. A pedra angular

da profissionalização dos professores está em entendê-la de forma coletiva

superando o espaço da aula como lugar predominantemente de exercício da

profissão, e evitando, por outro lado, que o poder do professor sobre os alunos

fique salvaguardado nesse espaço de “intimidade”.

O professor se profissionalizará no desenvolvimento de um currículo e

nas condições em que o realiza. Nesse processo, o professor domina mais

conteúdos com os quais trabalha, adquire mais versatilidade no uso de

determinadas metodologias, de recursos didáticos e instrumento de avaliação.

A experiência docente é, portanto, resultado do desenvolvimento do currículo.

▬ O currículo como campo de experimentação

Essa idéia e desenvolvida por Contreras (1991), que ressalta a

importância dos professores assumirem um currículo não como uma solução

estabelecida, mas sim como espaço no qual se pode buscar e experimentar

soluções. Vejamos a propósito, dois exemplos de inovação curricular

desafiadores, propostos para os professores da educação infantil e das series

iniciais do Ensino fundamental.

Exemplo I. O RCNEI como orientações gerais para o professor trabalhar com

projetos no eixo de Sociedade e Natureza de acordo com o referencial:

A articulação entre as diversas áreas que compõe este eixo é um dos

fatores importantes para a aprendizagem dos conteúdos propostos. A partir de

um projeto sobre animais, por exemplo, o professor pode ampliar o trabalho,

trazendo informações advindas do campo da História e da Geografia.

Inúmeras culturas atribuem a certos animais valores simbólicos

(místicos e religiosos) e existem muitas historias a respeito. A partir de uma

pergunta, como por exemplo, “qual o maior animal existente na terra”, as

crianças, além de exporem suas idéias, poderão pesquisar o que pensam as

Page 30: A Historia Do Curriculo

outras crianças, os adultos da instituição, os familiares etc. As lendas, fábulas e

os contos sobre grandes animais, presentes nos repertórios e memórias

populares, podem se tornar excelentes recursos para confrontos de idéias. Os

conhecimentos científicos entre animais pré-históricos e sobre animais

existentes hoje são informações valiosas para que as crianças possam pensar

sobre o assunto. Ao final, as crianças podem desenhar coletivamente, por

etapas um animal entre aqueles que pensaram a conhecer. Este produto final

e interessante, pois envolve pesquisar medidas, formas de trabalhar para fazer

desenhos grandes, envolve a cooperação de adultos da instituição para ver

onde expor etc. (BRASIL, 1998, v 3. p. 201).

Exemplo 2: Os Parâmetros Curriculares Nacionais - Língua Portuguesa

recomenda a prática de produção de textos cuja finalidade e formar escritores

competentes capazes de produzir textos coerentes e eficazes. No tratamento

didático para programar a pratica continuada de produção de testos na escola

são indicados alguns procedimentos didáticos.

Oferecer textos escritos impressos de boa qualidade, por meio da

leitura (quando os alunos ainda não lêem com independência, isso se torna

possível pelo professor, o que precisa também, ter uma prática continuada e

freqüente). São esses textos que podem se converter em referencias de

escritas para os alunos.

Propor situações de produção de textos, em pequenos grupos, nas

quais os alunos compartilhem as atividades, embora realizando diferentes

tarefas: produzir propriamente, revisar, grafar. Essa e uma estratégia didática

bastante produtiva porque permite que as dificuldades inerentes às exigências

de coordenar muitos aspectos ao mesmo tempo sejam divididas entre os

alunos. Eles podem, momentaneamente, dedicar-se a uma tarefa mais

especifica enquanto outros cuidam das demais. São situações em que o aluno

produz e dita a outro, que escreve, enquanto um terceiro revisa, por exemplo

(BRASIL, 1997, p. 69).

Como o professor pode lidar com essas preposições? Antes de

indispor com a proposta, o professor de Educação Infantil pode tentar

experimentar as indicações do Referencial individualmente ou coletivamente

em sua pratica poderá buscar aperfeiçoamento mediante cursos de atualização

e discutir com outros colegas.

Page 31: A Historia Do Curriculo

Dessa maneira, estará, concretamente, fazendo do currículo um campo

de experimentação e, conseqüentemente, de formação, pois os resultados

desse empreendimento certamente se converterão em desenvolvimento

profissional enriquecedor. O mesmo pode ocorrer com a prática de produção

de textos.

Em nenhuma hipótese estamos afirmando o cumprimento de

prescrições, mas incentivando a experimentação de alternativas curriculares

inovadoras.

E isso que Contreras (1991) quer dizer quando afirma, um currículo

que pretende melhorar a prática educativa e não normalizá-la reflete seu valor

na possibilidade que expressa de constituir-se em matéria de aprendizagem

para o próprio professor experimentando-o em sua prática.

Page 32: A Historia Do Curriculo

RESUMO DA UNIDADE I

Nesta unidade, estudamos diferenciados assuntos abordados sobre a

concepção de currículo, essenciais nesse início de estudos. A história do

currículo tem sido importante na tarefa de questionar a presente ordem

curricular, essa concepção nos ajuda a dimensionar o campo de

problematização a serem enfrentados. Concebido como uma ferramenta

profissional, o currículo deve constituir-se no cenário e numa estratégia para o

professor compreender melhor o seu trabalho e resolver problemas referentes

ao ensino.

PARA SABER MAIS ....

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 35. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,

2003.

GADOTTI, Moacir. Educação e poder: introdução à pedagogia do conflito. 9.

ed. São Paulo: Cortez, 1989.

MOREIRA, Antonio Flávio; SILVA, Tomaz Tadeu da (orgs.). Currículo, Cultura

e Sociedade. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2001.

REFLEXÃO SOBRE A APRENDIZAGEM

Todos nos somos capazes de assimilar e criar. Para termos uma melhor

interação desta unidade, escreva entre 15 a 20 linhas sobre a historicidade de

currículo fazendo uma distinção entre as teorias tradicionais curriculares e sua

integração na atualidade.

SUGESTÕES DE LEITURA

SACRISTÁN, J. Gimeno. O currículo: uma reflexão sobre a prática. ed. Porto

Alegre: Artmed, 2000.

SILVA, Tomaz Tadeu da Silva. Documentos de identidade: uma introdução às

teorias do currículo. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.

Page 33: A Historia Do Curriculo

ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM – unidade I

1) Qual a diferença entre concepção de currículo que você possuía e a

concepção exposta no texto? (com 200 palavras) / (5,0 pts)

2) O que propõe Goodson a respeito da história social do currículo? (5,0 pts)