A história secreta da REDE GLOBO - Daniel Herz

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    Daniel Heiz

    A histria secreta da Rede Globo"SIM EU SOU O PODER"

    Roberto Marinho

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    Para Walter, meu pai, que ensinou,

    A ser rigoroso com a verdade.Para Fernando, meu filho, presena de vida que faz renascer.

    AGRADECIMENTOS

    A Jane, companheira de vida, presente em todos os momentos.

    Aos colegas e companheiros Adelmo Genro Filho, Carlos Muller e Maria HelenaHermosilla de Los Angeles, que ajudaram a encontrar caminhos.

    Ao colega e companheiro, Csar Valente, sempre pronto para fazer as coisasacontecerem.Ao professor Homero Simon, pela decisiva ajuda para desvendar os problemas daradiodifuso e pelo exemplo de integridade e disposio de luta por um Brasilmelhor.Ao companheiro e editor Tau Golin, cuja insistncia amiga levou publicao destetrabalho.Aos meus alunos e companheiros do Curso de Comunicao da UniversidadeFederal de Santa Catarina, pela convivncia que anima para o trabalho.

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    As empresas jornalsticas sofreram, mais talvez do que quaisquer outras, certasinjunes, como depresses polticas, acontecimentos militares. Os prognsticosque estamos fazendo na TV Globo dependem muito da normalidade, datranqilidade da vida brasileira. Esses planos podem ser profundamente alterados,se houver um imprevisto qualquer ou advir uma situao que no esteja dentro dos

    esquemas traados, como se v nas operaes de guerra "".(Palavras de Roberto Marinho, diretor-presidente das organizaes Globo, em 20 deabril de 1966, depondo na Comisso Parlamentar de Inqurito que investigou asligaes entre da Rede Globo e o Grupo Time-Life).E esta uma guerra - no uma guerra quente, mas um episdio da guerra fria.Entretanto, se perdemos neste episdio, o Brasil deixar de ser um pasindependente para virar uma colnia, um protetorado. 12 muito mais fcil, muitomais cmodo e muito mais barato, no exigem derramamento de sangue, controlar aopinio pblica atravs dos seus rgos de divulgao, do que construir basesmilitares ou financiar tropas de ocupao"".(Palavras de Joo Calmon, diretor dos Dirios Associados),(Deputado federal e presidente da Associao Brasileira das Emissoras de Rdio eTeleviso, em 13 de abril de 1966, depondo na Comisso Parlamentar de Inquritoque investigou as ligaes entre da Rede Globo e o Grupo Time-Life).

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    Todas as oportunidades de lanar lenha na fogueira das contradies devem seraproveitadas. Mas preciso reconhecer que, num sentido global aproveitando otrocadilho - o que predomina o que transparece na Rede Globo, a ideologia dasclasses dominantes. hora de lutar para que da Rede Globo seja apercebida sem ingenuidade, sem o

    respeito do senso-comum."O povo no bobo, abaixo a Rede Globo", diz um refro que se torna cada vezmais freqente em manifestaes de rua, em assemblias de sindicatos, emcomcios. Mas a anlise crtica da Rede Globo tem que sair do terreno da suspeita,da mera desconfiana de que h interesse em "fazer o povo de bobo". A populaotem que ser armada de referncias slidas, tem que ser municiada das certezas do"por que" a Rede Globo deve vir "abaixo". A origem deste livro uma dissertao demestrado 4 que abordou o problema da introduo de tecnologias de comunicaono Brasil, apresentada em 1983 Universidade de Braslia (UNB). A histria daimplantao da Rede Globo ocupou a metade dessa dissertao e aqui est sendopublicada com poucas alteraes. Essa dissertao recusou a mera formalidadeacadmica para afirmar-se tambm como uma reportagem jornalstica. Na anlisedo processo histrico que envolveu a implantao da Rede Globo, procuramos fazeruma ampla caracterizao das foras sociais que controlam os meios eletrnicos decomunicao de massa no Brasil A comear pelas diretrizes da poltica oficial deradiodifuso 5- rdio e televiso - que garante o predomnio das empresas privado-comerciais. Desde 1964, graas a essa poltica, a radiodifuso e a imprensapassaram a ser fortemente oligopolizadas, especialmente devido modernadinmica de produo que foi imposta pela Rede Globo.No se pode abordar o desenvolvimento dos meios de comunicao de massa noBrasil, a partir da dcada de 60, sem tocar na Rede Globo. Essa Rede, a partir dadcada de 70, passou a absorver mais de 40%da totalidade das verbas disponveisno Pas e desse modo condicionou todo o desenvolvimento dos meios decomunicao de massa.Conclumos que a importncia da Rede Globo - desde 1961, quando comeou a serimplantada com a interveno do capital estrangeiro - no s subdimensionadacomo tambm pouco conhecida. impressionante a indulgncia, a displicncia e airresponsabilidade com que a imprensa - quase sem exceo - e tambm muitospesquisadores tratam do processo de implantao da Rede Globo. Conclumos queuma exposio detalhada desse processo fundamental no s para um melhorentendimento do importante papel que da Rede Globo desempenha atualmente,mas tambm para entendermos a presso pela implantao de novas tecnologias decomunicao que est se verificando hoje no Brasil. Da Rede Globo abriu uma faseacelerada de modernizao dos sistemas de comunicao de massa, inaugurouprticas empresariais compatveis com essa modernizao e inspirou polticas

    oficiais que amparam as pretenses privado-comerciais dessas empresas H muitaanlise sobre como as empresas.A comunicao de massa se define como uma forma de comunicao social emque participam massas de pessoas. Se aplicarmos anlise desta forma decomunicao as posies tericas e metodolgicas adquiridas com relao comunicao social, de comunicao mediam os interesses do Estado e das classesdominantes. Neste trabalho, estamos insistindo num outro aspecto: como o Estado,gerindo recursos pblicos como o espectro de freqncias de rdio e canais deteleviso, media os interesses dos donos dos meios de produo, na rea de

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    comunicao. Nosso trabalho procura evidenciar como o Estado instrumentalizadopelos interesses capitalistas predominantes na radiodifuso.

    NOTA DE RODAP:Ficava na emissora, em contato direto com a alta direo e Lago praticamente dormia na sala de computao deO Globo. Eram l que as distores aconteciam. O mtodo correto de se computar as eleies no Rio oseguinte: injetam-se dois votos da capital, um voto do interior e um voto da periferia. Essa mecnica permite aformao de um universo correto. Em 1982, como hoje, o processo de alimentao dos computadores eradistorcido. Injetava-se, digamos, dois votos do interior, onde Moreira tinha sabida maioria, nenhum voto daBaixada e um da capital. No posso dizer, embora intussemos todos, de quem partiam as ordens para que setrabalhasse assim. Ao Lago foi dito que havia problemas estruturais. O Sistema havia sido mal montado.Tratava-se, enfim, de uma questo de incompetncia. A desculpa logo se ver esfarrapada. Se h algumacoisa competente no Brasil, esta , reconhea-se, o Globo e a TV Globo. Roberto Marinho sabe fazer o quequer.Na emissora, eu e os jornalistas que convoquei para me auxiliarem - Mnica Labarth, Cludio Nogueira,Johnson dos Santos, Renato Kloss.Profissionais corretos foram ficando assustados. Primeiro, sim, com a incompetncia. E depois, com asevidncias. De todo lado estourava denncias de fraudes eleitorais. Comeamos a cobrir. Era a brecha do jornalismo. Mas nada pde ir ao ar. Ordens de cima proibiram que noticissemos as fraudes. Lembro-me bem deque houve um caso de roubo de urnas em Bangu que no pde ir ao ar. Tornou-se intil, desgastante, cobrir. Asproibies, como evidentes, eram obedecidas. In: CABRAL, Luis Carlos. Op. cit.3 O jornalista Lus CarlosCabral, que denunciou publicamente a manipulao de informaes pela da Rede Globo nas eleies de 1982,relata uma interessante passagem que mostra a angstia do jornalista diante do dono do veculo: "Nunca conteiessa histria. Achava que seria trair uma confiana que o Dr. Roberto Marinho depositou, em determinada horada minha vida, em mim. Bobagem. Comecei a achar que deveria cont-la no dia em que Borjalo, esta figurafantstica, disse que passaria a colaborar em 'O Nacional' no dia que deixssemos de atacar o Dr. Roberto."_No vou cuspir no prato em que comi, comentou. E eu, ali calado, como que acusado, descobri:"_Eu jamaiscomi deste prato. S o alimentei. In: CABRAL. Lus Carlos, op. cit. 4 HERZ, Daniel. A introduo de novas tecnologias decomunicao no Brasil: Tentativas de implantao do servio de cabodifuso, um estudo de caso. Braslia, Unb. 1983.751p.

    Procuramos, por isso, examinar com detalhe o perodo de implantao da RedeGlobo, que situamos entre 1961 e 1968 e que abre uma nova fase de renovaotecnolgica dos meios de comunicao de massa no Brasil Essa anlise procuraexplicar como da Rede Globo chegou ao que atualmente.No final da dcada de 70, iniciou um irresistvel desenvolvimento dos meiostecnolgicos com as aplicaes da microeletrnica. O contexto poltico daimplantao de novas tecnologias de comunicao torna-se ento muito conturbadoat chegarmos a 1987, num momento crtico para o desenvolvimento dos sistemasde comunicao: o Estado est violentamente pressionado para institucionalizar asnovas tecnologias sob o controle absoluto dos interesses privado-comerciais, mas - o que procuramos demonstrar- ainda h condies para se reverter estatendncia, face natureza singular dos novos recursos tecnolgicos e face scontradies que atravessam o Governo e os grupos econmicos dominantes. Estetrabalho pretende, por isso tudo, antes de ser uma anlise exaustiva, oferecer umacontribuio terica e poltica, dentro dos seus limites, para anlises que levaro ao, frente a um processo histrico irresolvido. A documentao referente implantao da Rede Globo, face inexistncia de registros factuais expressivos na

    literatura corrente 7 foram detalhados ao mximo os registros desses fatos soescassos e, nas fontes bsicas, so confusos e os fatos esto dispersosfragmentados, pouco compreensveis. Apesar disso, preciso ressaltar que osdocumentos que permitem revelar a histria da Rede Globo, embora sejam"secretos" para a maioria da populao, so acessveis. possvel reconstituir ahistria da Rede Globo sem revelaes ou descobertas bombsticas A histria daRede Globo pode ser delineada com base em documentos oficiais e com asinformaes jornalsticas disponveis. O que faz secreta a histria da Rede Globo ,por um lado a desorganizao das informaes disponveis e, por outro lado, a falta

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    de determinao para integr-las e dar-lhes o destino poltico necessrio atravs dadenncia pblica.

    NOTA DE RODAP:

    5 O termo Radiodifuso, tal como o utilizamos nesse trabalho, empregado no seu sentido tcnico mais geral,abrangendo tanto o rdio com o a televiso.6 Cabem ressaltar que a natureza coletiva dos processos de comunicao viabilizados pelas tecnologias,especialmente as eletrnicas, entendida no presente trabalho como um "processo de massa". Por issousamos repetidas vezes a expresso comunicao de massa' , que aqui tem sentido descritivo e se refere natureza coletiva do processo de comunicao que envolve as massas. Essa expresso no esconde o carterde classe de utilizao dos meios de comunicao. "Como propriedade e instrumentos de classes determinadas,os meios de comunicao de massas tm carter de classe. Esse carter se manifesta, sobretudo fato de que aclasse que possui os meios de produo da comunicao determina tambm seu contedo ideolgico".(In:ROMANO, Vicente. Estudio preliminar. In: BINSKY, Lothar Critica de la Comunica cl6n de massas. Madrid.Ediciones de la Torre. 1982. p. 16).Teremos como resultado, entre outras coisas, pelo menos as seguintes demandas:- Devemos analisar a comunicao de massa sob uma perspectiva histrico-concreta. No basta a definioabstrata de seus elementos mais simples. Isto significa tambm que devemos analisar a comunicao de massaem sua determinao histrico-concreta dentro do sistema monopolista de Estado. - Devemos descobrir de queforma influi o modo de produo capitalista na comunicao de massa. - Devemos estudar as relaesespeciais dos atores da comunicao entre si, como relaes mediadas por sua posio na praxis social, assimcomo a determinao dessas relaes pelas condies sociais. (In: BINSKY Lothar op cit. P.65).7 Algumas excees so: ALMEIDA FILHO, Hamilton et ali. O pio do povo: o sonho e a realidade. SoPaulo, Smbolo-Extra. 1976.CAPARELLI, Srgio. Televiso e capitalismo. Porto Alegre, LPM. 1982.

    Optamos por um mtodo de exposio que esperamos ser adequado para areintegrao dos fatos e do processo histrico. Basta olhar as notas de rodap destelivro para avaliar que, sobre um nmero relativamente limitado de fontes, fez-se umgrande esforo para ordenar, cruzar e relacionar informaes que, esperamos, tenhachegado a um resultado satisfatrio.Na Parte II, fazemos uma breve sntese do desenvolvimento histrico daradiodifuso no Brasil. Esse projeto, por si s, poderia justificar uma volumosa obra.

    Mas nosso objetivo foi modesto: optamos por reduzir ao mximo essa sntese,valendo-nos das interpretaes do perodo histrico que j esto praticamenteincorporadas ao senso comum das cincias sociais no Brasil. Trata-se de umasntese curta e densa, que prope um quadro explicativo para os fatos mais recentesque sero examinados em detalhe.Como no nos movia a inteno de polemizar sobre a histria do Brasil, corremos orisco de tomar vrios pressupostos e referir apenas as fontes mais evidentes, parano estender em demasia um captulo que tem objetivos limitados.Destacamos tambm que esse livro no pretende abranger toda a histria da RedeGlobo. Concentramos nossa anlise no perodo mais obscuro, que vai de,entendermos que a investigao desse perodo esclarece aspectos essenciais de"como" foi implantada da Rede Globo e qual a "finalidade" de sua implantao. Eessas so respostas imprescindveis para a correta compreenso, no s do papelhistrico da Rede Globo como tambm do atual estado da radiodifuso brasileira.Para vincularmos mais intensamente o perodo analisado com a atual conjuntura,apresentamos neste primeiro captulo um rpido painel ilustrativo da situao daRede Globo e da radiodifuso com o advento da chamada Nova Repblica.Iniciamos este painel com a caracterizao do peso atual da Rede Globo e seupapel nas articulaes que levaram Nova Repblica protagonizada com destaquepor Tancredo Neves. Mais adiante, examinamos o significado da indicao, comoprimeiro ministro das Comunicaes da Nova Repblica, do empresrio AntnioCarlos Magalhes. E, na ltima parte, procuramos demonstrar o total

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    comprometimento da radiodifuso brasileira com os grupos polticos e econmicospredominantes durante as duas dcadas de ditadura militar. Finalmente, caberessaltar que a tcnica de exposio adotada, com a incluso no texto de citaesextensas - ao invs de uma simples caracterizao conceitual dos fatos - corre orisco de resultar tediosa, mas, como j dissemos, corresponde preocupao de

    documentar solidamente um processo que ainda pouco divulgado. Se esta basedocumental tiver alguma. Utilidade na luta pela democratizao dos sistemas decomunicao no Brasil pelo avano dos setores populares em busca do seucontrole, ento teremos alcanado nosso maior objetivo.A Rede Globo o centro de um imprio que abrange mais de quarenta empresasatuando em diversos ramos da economia. S a Rede Globo - que inclui seteemissoras totalmente de sua propriedade, seis emissoras de propriedade parcial e36 emissoras afiladas - tem uma receita anual estimada em US$ 500 milhes e umvalor patrimonial em US$ 1 bilho8. Com seus 12 mil funcionrios - 1500 dos quaisdedicados produo de quase trs horas dirias de fico - a Rede Globo produzcerca de 80% dos seus prprios programas, sendo a quarta maior rede privada deteleviso do mundo, s atrs das trs gigantes norte-americanas (CBS, NCB eABC)9.Na rea da comunicao de massa, alm dos ramos de televiso, as OrganizaesGlobo envolvem pelo menos 18 emissoras de rdio AM e FM, o segundo maiordirio do pas, duas editoras de revistas e livros, produtora de vdeo, distribuidora defitas videocassete, trs gravadoras, produtoras de servios para publicidade, entreoutras empresas 10.O grupo econmico encabeado por Roberto Marinho inclui ainda empresasenvolvidas em diversos outros ramos: indstria de bicicletas, indstria eletrnica,indstria de telecomunicaes, negcios imobilirios, agricultura e pecuria -destacando-se fazendas na Amaznia -, minerao, distribuidoras de ttulos evalores, entre outras atividades econmicas 11. A Rede Globo absorve dois terosdas verbas publicitrias distribudas televiso e tem urna audincia potencial de 80milhes de telespectadores, abrangendo 98%do territrio nacional. S o JornalNacional, noticirio das 20 horas tem uma audincia de mais de 50 milhes detelespectadores.Admitindo que a expanso na rea de televiso no mercado interno "quase no mais possvel"12, como afirma Roberto Irineu, filho de Roberto Marinho e vice-presidente da empresa, a Rede Globo est se voltando para o mercado externo. Em1986 a receita com exportao foi estimada em cerca de US $ 15 milhes' 3. Essareceita, ainda pode ser considerada pequena, e no revela o alcance da estratgiada Rede Globo para conquistar o mercado externo. Por enquanto, da Rede Globoprocura marcar presena no maior nmero possvel de pases: na sede do imprio, junto ao Jardim Botnico, no Rio de Janeiro, h uma foto mostrando um globo

    terrestre com a inscrio "168 pases", ao lado, sob um logotipo da Rede Globo, houtra inscrio que indica "128 pases" l4A penetrao da Rede Globo no mercado externo comeou a ser expressiva com anovela "Bem Amado", em 1977, exportada para Portugal e, dublada em espanhol,para alguns pases da Amrica Latina. Nesse ano, a receita de exportao foi deUS $300 mil. "Hoje da Rede Globo detm quase 20%dos programas de televisonos pases latino-americanos e em Portugal"15 conforme explica Marina Feital,gerente de Administrao e Vendas da Diviso Internacional, responsvel pelasnegociaes com a Amrica Latina, Estados Unidos, Portugal e Angola:

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    "Para entrar e ganhar este mercado tivemos de enfrentar a Televisa (televisomexicana), que produz 26 horas dirias de programas em espanhol de nvel menoselaborado que os nossos. Ainda assim, conseguimos vender nossos programas,mesmo novelas, sobretudo - adicionando os custos da dublagem - 50%abaixo dospreos da Televisa. Como? Usando o que chamei de 'estratgia da droga': voc

    praticamente d, espera o sucesso e depois vende pelo melhor preo. Igual ao quese l nos jornais que fazem com a cocana" 16A Rede Globo preferiu no insistir, nessa fase, no mercado norte-americano, queexige enormes investimentos, l marcando presena apenas atravs de emissorasde lngua latina. Os maiores investimentos da Rede Globo esto sendo canalizadospara a Europa, um mercado que Roberto Irineu reconhece ser "sem regras fixas"17e onde se verifica uma expanso dos sistemas privados em detrimento dos estatais.Na Frana, por exemplo, o mercado ainda considerado pequeno e gira em tornode US$ 250 milhes por ano. Na Itlia, outro exemplo, que j dispe de televisoprivada h dez anos, movimenta-se cerca de US$ 1 bilho anuais18.Foi justamente na Itlia que da Rede Globo iniciou a invaso da Europa, adquirindoem 1985 a TV Monte Carlo. Foi um negcio de oportunidade, apadrinhado pelosdemocrata-cristos, que bancaram a venda para atingir o gigante da comunicaoitaliana Berlusconi, tido como ligado aos socialistas:"A RAI estatal vendeu a TV Monte Carlo aos brasileiros e ainda participa dela com 10%.Da Rede Globo dever constituir contrapeso diante do amigo do socialismoBerlusconi (...) que cresceu graas sua amizade com o 'Premier' socialista BetinoCraxi.19A estratgia da Rede Globo na Itlia ambiciosa. "Em trs anos, da Rede Globopretende ter conquistado 10%do mercado italiano a partir de Monte Carlo. Por umconvnio com trs emissoras locais e pela construo de 36 estaes deretransmisso, os brasileiros j teceram a sua rede em torno da rea que vai dolimite dos Alpes at a ponta da Siclia. Durante o campeonato mundial de futebol,21,8%dos italianos acompanharam a bola via Rede Globo. A concorrnciarespondeu com sabotagem atravs de interferncias e por meio de advogados. Jem novembro (de 1985), o gigante de comunicao italiana Berlusconi chamou daRede Globo perante a justia, como fim de conseguir seu fechamento. 'E umabomba atmica, com que se pretende destruir-nos', queixa-se Dionsio Poli, o vice-presidente para a Europa"20.Para conquistar o mercado europeu da Rede Globo j tem uma estratgia delineada,como revelou o filho de Roberto Marinho revista alem Derspiegel:Nos prximos cinco anos, haver um boom na Europa, profetiza Roberto IrineuMarinho. O chefe-jnior da Rede Globo j dispe de uma estratgia para assegurarpara si uma boa parte do negcio. Em primeiro lugar, se negociar em tomo dacompra da emissora francesa de Monte Cano. Na Repblica Federal da Alemanha

    so travados os primeiros contatos - possivelmente tambm seremos 'presenteados'algum dia com os programas da Rede Globo. Antes de tudo, os brasileirospretendem produzir programas na Europa, em ingls, pois s ento tero acesso aomercado dos Estados Unidos.S dois ou trs nomes grandes dominaro, dentro de alguns anos, o mercadoprivado de TV na Europa, diz o herdeiro de Marinho, Irineu. 'Um deles serBerlusconi, outro talvez RTL-Luxemburgo... ' Da Rede Globo quer participar de umdesses grupos, at editoras alems entram em cogitao como parceiros. Nempretendemos que da Rede Globo tenha maioria diante desses parceiros', assegura

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    Roberto Irineu, 'a participao com 80% na TV Monte Carlo puro acaso'. A histriada Rede Globo parece seguir, porm, outra meta:Engolir, o que possvel engolir21.

    NOTA DE RODAP:COSTA, Alcir Henrique; SIMES, Inim Ferreira; KEHL, Maria Rita. Ur2 pas no ar - Histria da TV Brasileira em3 canais So Paulo, Brasiliense, 198.8 GLOBO. 'Times' destacam sucesso da TV Globo e direo de Roberto Marinho. Rio,L3jan. 1987. P.5.ISTO O fazedor de reis. So Paulo, n. 416. 12 dez. 1984, p.22.9 BIZINUVER, Ana Lcia. Status. Globo for export. So Paulo.jan. 1985. P.47.10 DER SPIEGEL. Schucken was man Schulucken kaan. Hamburg, n. 38. 15 set.1986. p.25 3. (Traduo de Arthur Kanitz).11 DER SPIEGEL, op. Cit. E Globo. 'Times destaca...29 DER SPIEGEL, op. cit. p. 259.13 BIZINOVER, op. cit p.5O.14 DER SPIEGEL, op. cit. p. 253.15 BIZINOVER, op. cit. P.4816 Ibidem.17 DER SPIEGEL, op. cit. P. 259.18 Ibidem.

    19 Ibidem.20 Ibidem

    A base desse imprio que espalha sua influncia por todo o planeta, continua sendoa Rede Globo, com seus 70 a 80%de audincia. Boa parte da fora poltica eeconmica da Rede Globo vem do contato que tem, diariamente, com mais de 50milhes de brasileiros, atravs do Jornal Nacional, cuja produo fiscalizadadiariamente por Roberto Marinho, como conta o jornalista Alain Riding, do 'New YorkTimes':Todos os dias da semana, s 19h55min, pelo menos 50 milhes de brasileiros

    espalhados por este imenso territrio, incluindo um homem de 82 anos de idade -elegantemente vestido, com um telefone ao seu lado - assistem s notcias diriasescolhidas, interpretadas e transmitidas pela TV Globo, a maior rede de televiso doPas."Como nico proprietrio da Rede, o homem ao telefone, Roberto Marinho, assisteao noticirio com especial ateno. Aps os 30 minutos de transmisso, o SenhorMarinho, invariavelmente, telefona para a redao e faz comentrios, sugestes ecrticas"22." 'Ns fornecemos todas as informaes necessrias, mas nossas opinies so deuma maneira ou de outra, dependentes do meu carter, das minhas convices e domeu patriotismo. Eu assumo a responsabilidade sobre todas as coisas que conduzo',disse Roberto Marinho"23. E so mais de 50 milhes de brasileiros que, diariamente,

    depende do crivo (do "carter", das "convices", do "patriotismo") do"Doutor"Roberto Marinho.Nessa reportagem, o "Times" destaca que, "com ndices de audincia entre 70 e80%, a TV Globo hoje, claramente, um centro-chave de poder"':Eu uso esse poder', confessou o empresrio ao jornal norte-americano, 'mas semprede maneira patritica, _tentai'4p corrigir as coisas, procurando caminhos para o pase seus estados. Ns gostaramos de ter poder suficiente para consertar tudo o queno funciona no Brasil. A isso dedicamos todas as nossas foras24. significativo,e assustador, que o homem mais poderoso do pas admita que dedique "todas assuas foras" para manter e ampliar esse poder.

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    NOTA DE RODAP:21 Ibidem.22 evidente que, apesar de ser excelente reprter, o correspondente Alain Riding deixou-se levar pelaspalavras do empresrio. Na verdade, 'nunca' o empresrio telefona para a redao logo aps o noticirio,mesmo porque assim que o 'Jornal Nacional' acaba, a redao se esvazia rapidamente. Vo todos reunir-se emoutro andar do prdio. O que o Senhor Marinho costuma fazer ligar para alguns de seus ajudantes deconfiana mais imediata - Armando Nogueira ou Alice Maria, por exemplo, que dirigem o departamento de jornalismo.- Para comentrios que muito raramente so elogiosos.In: NEPOMUCENO, Eric. O Nacional. E o Dr. Roberto falou. Rio, n. 1. 15-21 jan.1987. P.9.23 GLOBO. 'Times 'destaca... Op. cit

    Como exemplo desse exerccio de poder, o "Times" cita o antagonismo de RobertoMarinho como governador do Rio, Leonel Brizola:Num determinado momento, eu me convenci de que o Sr. Leonel Brizola era ummau governador, afirmou o empresrio. 'Ele transformou a CidadeMaravilhosa num ptio de mendigos e marginais. Passei a considerar o Brizola

    perigoso e lutei, realmente usei todas as minhas possibilidades para derrot-lo naseleies.Alain Riding diz, no texto, que o empresrio de fala mansa no v nada de malnessa interveno, que em diferentes ocasies incluiu a promoo ou o ataque apolticos ou assuntos."'Usar o poder para perturbar um pas, para destruir seus costumes, algo ruim',analisa o empresrio. 'Mas usar o poder para impulsar coisas, como eu fao, algobom. Eu no acredito que isso v ocupar muito as atenes da Constituinte"'25.O poder da Rede Globo, administrado por Roberto Marinho, usadoindiscriminadamente, de acordo com seus mais privados e imediatos interessespolticos e econmicos, como analisa a revista Senhor:"As Organizaes Globo continuam fazendo, hoje, o que fazem, com brevesinterrupes, h 61 anos, desde que o jovem Marinho herdou prematuramente o jornal de seu pai - isto , manter-se prximo do poder. Faz isso mesmo correndoriscos (.)".

    NOTA DE RODAP:24 NEPOMUCENO, op. cit.25 "O empresrio Roberto Marinho certamente no contou ao jornalista Alain Riding que, na da Rede Globo,houve um determinado dia - l por setembro de 1983 - em que se mandou suprimir a palavra "somozista" dosnoticirios, quando se fizesse referncias aos somozistas. E que no se pode dizer 'regime militar do generalPinochet', deve-se dizer 'governo militar do presidente Pinochet'. E que em poltica nacional, as regras so muitomais restritas. Durante muitos meses, at mesmo nos telejornais locais, o governador Brizola no podiaaparecer. Depois, podia aparecer, mas no podia falar. Ou seja, ficava o governador do Estado mastigando no arenquanto um dos locutores contava o que ele tinha dito: 'Depois. o governador declarou.., sobre esse assunto,disse o governador...' E o governador l. mudo, abrindo aboca feito peixe".

    In: Ibidem.

    (.)A esta altura, fica difcil saber quem deve mais favores a quem, se Sarney RedeGlobo, ou se a Rede Globo ao Presidente da Repblica. Deve haver, de qualquermodo, um fundo de sinceridade na defesa do Cruzado, a defesa que faria o pai deseu rebento desviado. A ponte avanada da Rede Globo no Festival Cruzado 1instalou-se, com duas semanas de antecedncia, no hotel Carlton, em Braslia, deonde se descortina sintomaticamente a Esplanada dos Ministrios. Ali Jorge Serpa,amigo do peito do comandante, ex-jornalista, ex-diretor financeiro da Mammesmann,

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    preparou a propaganda pela TV. O homem da Rede Globo ficou sabendo dosigilosssimo choque heterodoxo com dias de antecedncia em relao, porexemplo, ao principal articulador poltico do governo, o ministro Marco Maciel."A conexo poltica-negcios no nasceu no Brasil, no de hoje e no vem a seruma estrada pela qual s trafeguem as Organizaes Globo. Mas, no caso do Dr.

    Roberto Marinho, a conexo d certo h dcadas, e no ocasional o fato de que 'ogeneral civil das comunicaes' - bajulao de um de seus subordinados, o colunistaIbrahim Sued - tenha deslanchado seu poderio sob a ditadura militar. (...) A repblicafardada se foi, veio a nova, pelas mos de Tancredo Neves, mas o Dr. Robertomanteve-se na crista dos acontecimentos fundamentais da Nao."(...) Pode-se alegar que, ao informar que a Petrobrs est prestes a achar um poomirabolante na Amaznia, os noticiosos do jornalista Roberto Marinho ajudam apropiciar ganhos especulativos para a Distribuidora Roma, de ttulos e valores, daqual o empresrio Roberto Marinho dono. Vale ouro a informao, sobretudo nummercado financeiro onde "quem tem caixa faz a festa", como comenta um corretorpaulista. O Dr. Roberto tem informao e tem caixa. Se existe algum melindre entreo papel pblico de quem noticia e o lucro privado de quem especula, esse melindreno , com certeza, um problema para o Dr. Roberto.(...) Da parte do general civil das comunicaes, a folha corrida insinua umavocao monopolstica e pe em dvida seu credo pretensamente democrtico. Os22 anos da Rede Globo, sua mais formidvel obra, so uma histria de virtuosismotcnico, sucesso comercial e m f poltica. O homem que insiste em se dizer jornalista expurgou de seus jornais impressos e televisivos, fatos que oincomodavam e personagens por quem no nutria simpatias, reescrevendo asnotcias como se fosse possvel reescrever a realidade (...).Os jornais que o Dr. Roberto pe no ar ou bota venda desconheceram acampanha das diretas at o penltimo comcio, quando milhes de pessoas jtinham sado s ruas (a primeira manifestao em So Paulo), dia 25 de janeiro de1984, foi noticiada como 'festa de aniversrio da cidade') e quando as multides jtinham at um estribilho para saudar a omisso da Rede Globo."(...) Nos anos da ditadura, os jornais do Dr. Roberto chamavam Mdici dedemocrata, negavam a tortura e expurgavam dom Paulo Arns e dom HlderCmara. Nos tempos da Nova Repblica, o chefo, pessoalmente, desce aoDepartamento de Pessoal com a demisso dos funcionrios graduados que haviamaderido greve geral do dia 12 de dezembro (de 1986) - ante a oposio meioconstrangida de outros diretores"26."Sim eu uso o poder"27, admitiram publicamente o presidente das OrganizaesGlobo nos primeiros dias de 1987, ano em que ele - associado com o banqueiroAmador Aguiar, dono do maior banco privado nacional pretende passar a controlartelecomunicaes via satlite no Brasil28. No cenrio da Nova Repblica, parece

    no haver, de parte do dono da Rede Globo, mais limites para a sede de poder e oapetite por vantagens e favores. A existncia da Rede Globo parece seguir umaregra to simples, quanto aterradora, como observou a revista alem Der Spiegel:"engolir, tudo o que possvel engolir"29. A origem deste desmesurado poder deRoberto Marinho, obtido atravs da sua Rede Globo, o objeto deste livro. E omodo pelo qual este poder exercido o que veremos nas prximas pginas destecaptulo.

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    NA REVISO DA ESTRATGIA, MARINHO CERCA TANCREDO.

    Uma das decisivas manifestaes do empresrio Roberto Marinho diante do quadroda sucesso do general Figueiredo ocorreu no incio de 1984, como revela a revistaIsto Logo depois do ano novo, num telefonema protocolar ao amigo de quarenta

    anos, embaixador Luiz Gonzaga do Nascimento e Silva, que serve, em Paris hcinco anos, o Dr. Roberto contou, com voz determinada como nos anos 60, quandoapoiou Jnio Quadros ou conspirou para derrubar o governo presidencialista deJoo Goulart, que iria 'apoiar Aureliano Chaves, mesmo sabendo dos riscos sobreos meus interesses30. Roberto Marinho no fazia essa confisso a um estranho.Luiz Gonzaga do Nascimento e Silva era um confidente perfeitamente integrado trajetria poltica e empresarial de Marinha Figura extremamente ativa no movimentoque conduziu o golpe de 1964, Nascimento e Silva foi um destacado militante doInstituto de PesquisasEconmicas e Sociais (IPES) que, na preparao do golpe, funcionaram como umverdadeiro partido poltico dos empresrios nacionais e multinacionais, reunindotambm parlamentares, militares e intelectuais. Luiz Gonzaga do Nascimento e Silva- ministro e colaborador assduo dos governos ps-64 - foi tambm o advogado querepresentou os interesses de Roberto Marinho na assinatura dos contratos entre asorganizaes Globo e p grupo norte-americano Time-Life, estabelecendo um vnculoinconstitucional que iniciou em 1961 e assegurou da Rede Globo o impulsofinanceiro, tcnico e administrativo para alcanar o poderio que tem hoje.O esgotamento do regime militar levou a que os outros conservadores queparticiparam do Golpe de 64 se reaglutinassem em busca de uma "sada civilizada",procurando alternativas para a sucesso do general Figueiredo.Perseguiam um processo de conciliao, temendo que o continusmo puro e simpleslevasse as contradies a um ponto de ruptura. A conversa entre Roberto Marinho eNascimento e Silva revelava o nome escolhido para deflagrar a conciliao:Aureliano Chaves.A evoluo do quadro poltico com o crescimento da campanha das Diretas-J3' e aafirmao do radicalismo continusta de setores das Foras Armadas, do PDS e doempresariado, exigiu uma reviso de estratgia. A concluso de que no era maispossvel enfrentar a mquina do continusmo radical fez com que os setoresconservadores que pregavam a conciliao passassem a apoiar as Diretas-J. Foineste momento que a Rede Globo evoluiu, subitamente, do silncio completo a umagrande cobertura do movimento das Diretas. Essa mudana no comportamento daRede Globo, portanto, no pode ser creditada apenas ao crescimento avassaladordo movimento das Diretas ou mesmo ao apedrejamento de viaturas da emissora evaias de populares a reprteres em servio, como passou a ocorrer capacidade daRede Globo para enfrentar os movimentos populares, alis, j fora amplamente

    comprovada na cobertura militante - evidentemente a favor das grandes empresas -que sempre deu aos movimentos operrios do ABC paulista. E tambm quando daRede Globo teve um papel decisivo na montagem do quadro nacional de fraudeeleitoral em 1982.No se pode precisar exatamente a estratgia das foras conservadoras quebuscavam a conciliao. Mas, com certeza, as eleies diretas seriam umaalternativa diante do confronto com o continusmo radical, sintetizado pelo ex-governador de So Paulo, Paulo Salim Maluf, que tinha como maior instrumento deluta a manipulao do Colgio Eleitoral. Por outro lado, o apoio s Diretas tambm

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    constitua um fator de barganha para uma conciliao que deveria se processaratravs do canal seguro do prprio Colgio Eleitoral.A emenda Dante de Oliveira, que reinstituiria as eleies diretas, foi derrotada. Mastudo estava correndo dentro do previsto. A luta pelas Diretas e a luta pelaconciliao eram controladas por relgios diferentes. A luta pelas Diretas, aps a

    derrota de Dante de Oliveira, foi imediatamente abandonada pelas forasconservadoras.As Diretas-J tinham, para essas foras, um valor apenas simblico, ainda queimportantssimo para a legitimao da conciliao que entrava em seu momentodecisivo. Embora houvesse tempo e condies institucionais para continuar a lutapelas Diretas, a partir da derrota da emenda Dante de Oliveira, gerou-se aimpresso pblica de que a conciliao teria inevitavelmente de processar-seatravs do canal estvel do Colgio Eleitoral.Por isso tudo, o nome do situacionista dissidente, Aureliano Chaves, passou a serimprprio para sintetizar a conciliao, Era preciso um nome que atrasse asoposies para a raia, repudiada nacionalmente, do Colgio Eleitoral. Nessecontexto, no foi difcil fazer a conciliao pender para o lado 'de Tancredo Neves, justamente o grande lder do Partido Popular -(o PP criado no incio do governoFigueiredo para ser uma alternativa de transio civil e sem rupturas para asucesso). O PP, que praticamente se apossou do PMDB no processo de fuso dosdois partidos e que foi o grande vitorioso - embora j extinto - nas eleies de 82,finalmente cumpriu o seu maior destino. Consciente disso, na prpria campanha dasDiretas, Tancredo Neves emitia mensagens cifradas para os articuladores daconciliao, lembrando sempre (muitas vezes enfrentando vaias) que havia "tempocerto" para essa luta.A montagem da conciliao teve de enfrentar uma lgica bvia: se era possvelaglutinar foras para vencer no Colgio Eleitoral, tambm, era possvel reunir foraspara desmanchar o Colgio. Para enfrentar essa lgica, politicamente inconveniente,foi preciso deflagrar no pas o temor da vitria do continusmo radical no Colgio.Os meios de comunicao contriburam decisivamente para injetar na populao omedo de que a conciliao no se processaria seno atravs do Colgio Eleitoral. OColgio foi ento definitivamente legitimado. E legitimar o Colgio significavalegitima o nome de Tancredo Neves para conduzir a conciliao.A aproximao entre Tancredo Neves e Roberto Marinho era imprescindvel nessequadro, pois a conciliao deveria ser convenientemente veiculada nos meios decomunicao. O dois, segundo revela a revista Isto , "se aproximaramdefinitivamente em maro passado (1984), quando Tancredo jantou no casaro deMarinho, no Cosme Velho, um dos pontos nobres do Rio. A iniciativa foi do Dr.Roberto e o tema da longa conversa foi resoluo do anfitrio de apoiar aalternncia mesmo que o candidato fosse o convidado, no caso de um eventual

    esvaziamento da candidatura do vice Aureliano Chaves"32. A candidatura deAureliano, naquela oportunidade, j era tida como invivel.A aliana "democrtica" entre Tancredo e Roberto Marinho no foi isenta detenses, tendo o empresrio promovido evidentes demonstraes de fora. Essatenso, como revela a mesma reportagem de Isto , foi detectada na noite de 18de outubro (de 1984) por alguns viajantes tancredistas numa caravana de 105poderosos empresrios, o Dr. Roberto entre eles, que foram passar trs dias naregio de Carajs, num programa de reconhecimento organizado pela companhiaVaie do Rio Doce e pelo presidente do Grupo Bradesco, Antnio Carlos de AlmeidaBraga.

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    NOTA DE RODAP:26 SENHOR. O atacado do Globo. So Paulo. N. 306. 27 jan. 1987. P.44-S.27 O ESTADO DE SO PAULO. "Globo" e o poder, nos EUA. So Paulo. Op. cit.1987. P. 9.28 SENHOR. O atacado do Senhor Globo. Op. cit. P.45. E CHACEL, Cristina. Jornal doBrasil. Engenheiro teme Embratel privatizada. Rio, l8jan. 1987. P. 31.29 DERSPIEGEL, op. cit. p 259.30 ISTO .O Fazedor de Reis op. cit. P.19.31 A campanha das Diretas-J defendia a imediata realizao de eleies diretas para a presidncia darepblica, o que seria constitucionalmente permitido com a aprovao da emenda apresentada pelo deputadoDante de Oliveira(PMDB-MT).32 ISTO . O Fazedor de Reis. Op. cit. -p. 2O.

    Desde a partida do Rio, viu-se que Marinho estava chateado. Com muito tato,Mrcio Fortes, herdeiro e principal executivo da construtora Joo Fortes, conversoue desconversou, ajudado pelo tambm tancredista Srgio Quintella, do GrupoMontreal, at que na noite seguinte, uma sexta-feira, descobriram que o Dr. Robertoestava determinado a romper com o candidato das oposies - e j tinha mesmoescrito o editorial definitivo para ser publicado na segunda-feira seguinte.

    O motivo era a confraternizao de Tancredo com um desafeto do Dr. Roberto - queadicionalmente inidneo (o nome qualificado por Isto 12 como 'inidneo' o do jornalista Hlio Fernandes)33. O telefone no parou de tocar entre o Par, Braslia eRio, at que o candidato concordou em se apresentar e dar explicaes, em plenodomingo, to logo o grupo pousou de volta no Rio. O editorial foi cancelado e aAliana Democrtica sobreviveu ao abalo, mas o Dr. Roberto tambm cristalizou suadisposio para ficar ao largo do situacionismo34.Desfrutando de um poder capaz de fazer o presidente Tancredo Neves justificarseus passos polticos e mesmo suas relaes pessoais - sob a ameaa de lanarcontra ele toda a fora das organizaes Globo - no difcil entender como RobertoMarinho fechou o cerco sobre Tancredo assegurando, inclusive, que o Ministro dasComunicaes fosse pessoa de sua confiana. E nem causa estranheza que, no diade sua eleio pelo Colgio Eleitoral, tenha sido com o empresrio Roberto Marinhoque Tancredo almoou festivamente.

    ANTNIO CARLOS MAGALHES:UM ALIADO IMPRESCINDVEL

    Aliaras oposies histricas e o setor conservador em torno da candidaturaTancredo Neves atravs do Colgio Eleitoral exigiu muito esforo. No h dvida,porm de que o maior esforo desse trabalho de conciliao foi orientado paraganhar os conservadores: atrair os dissidentes e neutralizar o continusmoradical35. Muito cedo, no PDS, surgiu a certeza de que a indicao de Paulo Malufpara a disputa no Colgio era inevitvel. Logo ficou claro que o outro nome do PDS,o do Ministro do Interior Mrio Andreazza, tido como candidato do GeneralFigueiredo, no teria chance na disputa com Maluf. Desde o comeo de 1983, umdos "andreazzistas" mais expressivos. Antnio Carlos Magalhes, j mantinhaentendimentos com Tancredo Neves. No dia 14 de junho de 1984, Tancredoencontrou-se com Andreazza, sob o patrocnio de Magalhes, como revela a revistaVeja:

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    "Logo que chegaram ao apartamento 801 do Edifcio Golden State, entre os postosdois e trs (Avenida Atlntica, Rio de Janeiro), Andreazza e Antnio Carlos foramconduzidos por Tancredo at a varanda de sempre e, reanimados apenas porxcaras de caf, mergulharam numa conversa que durou at as duas da madrugada.Andreazza foi claro. Figueiredo, disse, no o estava apoiando em sua campanha. Se

    ele pudesse anunciar ao presidente que teria, no Colgio Eleitoral, os votoscontrolados por Tancredo no PMDB, talvez conseguisse tir-lo de sua apatia.Tancredo podia ajudar? O ento governador (de Minas Gerais) disse que sim - certode que Andreazza no tinha mais chances e que, ao apoi-lo, estava adquirindo odireito de cobrar, mais tarde, a mesma simpatia (a reunio ocorreu na madrugada dodia 15 de junho de 1984).""A certo momento Andreazza levantou-se para ir ao banheiro. Rapidamente,Tancredo sussurrou para Antnio Carlos: 'Precisamos conversar sozinhos? ' Podeser?". Podia. A conversa com Andreazza encerrou-se cordialmente e, dias depois,Tancredo e Antnio Carlos voltaram a encontrar-se - pela manh e sempre noEdifcio Golden State.Se o Maluf ganhar a conveno do PDS, a Bahia me apia? - indagou TancredoNeves.- Sim - devolveu Antnio Carlos na hora - Mas s se o Maluf ganhar. Se derAndreazza na conveno, vou com ele at o fim."- Ento eu vou comear a pensar srio em renunciar ao governo do Estado -encerrou Tancredo"36.A costura desse acordo com Andreazza e Magalhes rendeu a Tancredo, aps avitria de Maluf na conveno do PDS, o discreto apoio do primeiro e a militnciaengajada do segundo. O jornalista Villas-Bas Corra conta a evoluo desteacordo, logo aps a derrota de Andreazza na conveno doPDS:No dia seguinte ( conveno do PDS), 12 de agosto, a festiva Conveno doPMDB, no embalo da vitria j desenhada, consagraram a chapa Tancredo Neves -Jos Sarney. E nesta mesma noite, s 22 horas, o candidato Tancredo Nevesesteve discretamente na casa do Embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima, ondeAntnio Carlos se hospeda em Braslia A conversa foi aberta e conclusiva. AntnioCarlos jogou na mesa o seu cacife poltico que liquidava a fatura. Entendido com oGovernador Joo Durval, da Bahia, controlava 15 dos 25 deputados do PDS baiano.Mais quatro estavam comprometidos com a Frente Liberal.A conversa no acabou a. Antnio Carlos recordou o sabido, desfilando os seusproblemas estaduais. A Bahia ou perdidamente a favor ou encarniadamente hostil sua liderana. Ele necessitava de uma posio federal at para sair do Estado eno entrar em atrito com o seu aliado Governador. hora era de efuso propcia.Colou na amabilidade bem administrada de Tancredo:

    "Voc ser, no meu Governo, ministro do que quiser"37.Lutando por fora do processo de conciliao, os setores engajados no continusmoradical chegaram a patrocinar um clima de golpe militar- de sustentao duvidosa -mas que tambm se mostrava muito til para legitimar e robustecer as manobrasconciliatrias. Esse contexto levou a que mesmo os setores que se apresentavamcomo progressistas afirmassem a necessidade e a inevitabilidade da conciliao.A "questo militar" gerada pelo continusmo radical levou Tancredo Neves a buscaruma base de apoio nas Foras Armadas, alargando cada vez mais as concesses.

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    Essa tenso foi finalmente dissipada no dia 20 de novembro de 1984, com a reuniodo Alto Comando do Exrcito que decidiu o afastamento do general Newton Cruz doComando Militar do Planalto, uma das figuras centrais das articulaes golpistas38.A resoluo da "questo militar", entretanto, comeou a ser definida um pouco antes,no confronto de Antnio Carlos Magalhes com o ministro da Aeronutica, Dlio

    Jardim de Mattos. O general Figueiredo estava desesperado com a migrao dos"andreazzistas" derrotados na conveno do PDS. No dia 4 de setembro, comorevela a revista Veja, ocorreu a inaugurao das novas instalaes do AeroportoDois de Julho, em Salvador, quando o ministro Dlio Jardim de Mattos teve a idiafatdica de, agredir Antnio Carlos em sua casa, e no dia de seu aniversrio. Otorpedo que levou de volta acabou de vez com a candidatura Maluf e com qualquerautoridade que o governo ainda pretendesse ter sobre a sucesso.Desde a vspera, Antnio Carlos sabia que Dlio vinha a Salvador para fazer umdiscurso duro contra os dissidentes do PDS, e ficou prevenido. Ele soube, tambm,que, no jato que conduzia a comitiva de Braslia a Salvador, Dlio mostrara doistextos de seu discurso a Figueiredo - e o presidente escolheu o mais duro. Sejacomo for, ele estava decidido: iria responder aos ataques na hora, e no mesmo tom.Dlio iniciou sua catilinria s 10h l5min da manh, reprovando os traidores. s 1lhl0min uma cpia do discurso, levada de carro do aeroporto at o apartamento deAntnio Carlos no bairro da Graa por um emissrio previamente destacado para amisso, aportava s mos do ex-governador. s 12h30mn ele pediu licena aosamigos que lotavam o seu apartamento para cumpriment-lo pelo aniversrio,trancou-se em seu escritrio e, em quinze minutos, escreveu mo e num jato ssua resposta a Dlio. A frase central, repetida depois brutalmente na 1V (e comespecial destaque na Rede Globo), ficaria como uma marca feita a ferro nasucesso:-Traidor ele, que apia um corrupto.'Pela primeira vez em vinte anos, algum falava neste tom a um ministro militar.Todo o medo de 'vetos militares' candidatura Tancredo evaporou-se, e outrosdissidentes encheram-se de coragem para agir. A cortina final acabava de baixarsobre a candidatura Paulo Maluf 39.Magalhes, assim, teve atuao destacada para atrair os dissidentes do PDS para acandidatura de Tancredo no Colgio Eleitoral. O ex-governador da Bahia, elevado condio de heri nacional pelo fulminante ataque a Maluf, passou a ser figura desustentao da prpria Aliana Democrtica. Na eleio do presidente da CmaraFederal, por exemplo, a situao complicou-se para Tancredo quando o deputadoAlencar Furtado resolveu levar frente sua candidatura, enfrentando UllissesGuimares. Nesse episdio, em que Ulisses venceu por uma estreita margem devotos, Magalhes novamente deu importante contribuio. Para enfrentar os votosdo PDS malufista e de muitos pedetistas, petistas e peemedebistas, Magalhes

    mobilizou os votos dos dissidentes do PDS com seu velho estilo: solicitaes,presses e at mesmo ameaas.Tancredo saberia demonstrar seu reconhecimento. Na poca da disputa dapresidncia da Cmara, em maro de 1985, diante de um documento assinado por180 parlamentares do PMDB que defendiam a indicao do deputado Freitas Nobrepara o Ministrio das Comunicaes e que se posicionavam contra Antnio CarlosMagalhes, Tancredo arrematou uma pergunta embaraosa:" Quantos desses votam em Ulisses?"40.

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    Para driblar constrangimentos desse tipo, Tancredo omitiu a composio do seuMinistrio at s vsperas da sua posse. Mesmo assim, as presses por um ououtro nome persistiam. No dia 6 de maro de 1985, Tancredo recebeu o senadorSevero Gomes (PMDB-SP), os Deputados Odion Salmria (PMDBSC) e CristinaTavares (PMDB-PE) e representantes dos setores de comunicao e informtica.

    Estes entregaram a Tancredo documentos com reivindicaes de medidas para area da comunicao.Nessa reunio, especialmente os dois deputados, Salmria e Cristina, expressarama Tancredo a inconformidade com a possibilidade de Antnio Carlos Magalhesocupar o Ministrio das Comunicaes e tambm com a ameaa de permanncia nocargo do secretrio geral deste ministrio, Rmulo Villar Furtado. Salmria chegou adizer que "aquelas indicaes comprometiam no s o Ministrio dasComunicaes, mas o governo como um todo".Em resposta a essa argumentao, Tancredo s dissimulou. "O ministro no estescolhido" - repetiu vrias vezes - "Antnio Carlos Magalhes ser ministro, mas nonecessariamente das comunicaes". Mas Tancredo se traiu e deixou transparecerque o seu ministro das Comunicaes seria algum inacessvel aos participantes dareunio. Em dado momento, Tancredo comprometeu-se a ser "interlocutor" dasreivindicaes que ali estavam sendo apresentadas "fosse qual fosse o ministro".Para os presentes, soou estranha esta afirmativa. Por isso, foi perguntado aTancredo: "o senhor, interlocutor?". E Tancredo confirmou o sentido da sua frase,gracejando: "Por qu? Vocs acham que h algum mais indicado que eu?". No finaldo encontro, para vrios dos participantes, apesar das negativas de Tancredo, aescolha de Magalhes j estava assegurada41.Alm desta reunio, registraram-se inmeras manifestaes contra Antnio CarlosMagalhes. A assessoria de Tancredo chegou a comentar que na maioria dasaudincias concedidas por Tancredo, nos dias que antecederam o anncio doMinistrio, foi levantado o "caso Magalhes".Trs dias antes da apresentao oficial dos integrantes do novo ministrio, apesarda solicitao expressa de Tancredo para que os convidados no se manifestassempublicamente, Antnio Carlos Magalhes - como se estivesse tentando tranqilizaros reduzidos, mas poderosos setores que o apoiavam - concederam entrevistas imprensa praticamente assumindo o Ministrio das Comunicaes Essasentrevistas, evidentemente, ganharam grande destaque, especialmente nos veculosdas organizaes Globo.O anncio do ministrio Tancredo, no dia 12/3/85, por isso, no surpreendeu.O que surpreendeu, nessa fase de transio de governo, foi a manuteno dosecretrio geral do Ministrio das Comunicaes, Rmulo Vilar Furtado. Paradiversos interlocutores, Tancredo Neves garantiu que Furtado no permaneceria nocargo pela terceira gesto consecutiva. Furtado iniciou como secretrio geral do

    ministro comandante Euclides Quandt de Oliveira, no governo Geisel.Posteriormente, as grandes empresas de radiodifuso e da rea detelecomunicaes tentaram faz-lo ministro das Comunicaes, no governoFigueiredo. Tentaram, mas no conseguiram derrubar o veto de certos setores dasForas Armadas que pesava sobre Furtado42. Ele foi mantido na Secretaria Geral,atuando como "ministro de fato" das Comunicaes. Rmulo Vilar Furtado est portrs de algumas das piores coisas ocorridas no Ministrio das Comunicaes nesselargo perodo em que vem atuando como secretrio geral. Nos ltimos meses dogoverno Figueiredo, por exemplo, Furtado comandou a partir do Ministrio dasComunicaes-articulado com o senador Roberto Campos (PPDS-MT) - uma luta

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    contra a poltica desenvolvida pelo prprio governo, atravs da Secretaria Especialde Informtica (SEI).Essa luta prosseguiu no governo Sarney, sendo as posies de Furtado hojeapoiadas publicamente por Antnio Carlos Magalhes.No governo Figueiredo, enquanto Furtado organizava a reao antinacionalista no

    Ministrio das Comunicaes, sua esposa, a deputada 'malufista' Rita Furtado (PDS-RO) cumpria na Cmara dos Deputados o mesmo papel que o senador RobertoCampos desempenhava no Senado. Derrotados, pelo menos parcialmente, na lutapela ampliao da presena dos interesses internacionais no setor de informtica evendo seu candidato (Paulo Salim Maluf) perder as chances no Colgio Eleitoral, osFurtado mudaram rapidamente de ttica: Rita Furtado surpreendeu seus colegas"malufistas" ao votar em Tancredo Neves.Quando se avolumaram as reaes indicao de Antnio Carlos Magalhes para oMinistrio das Comunicaes, surgiu o nome do deputado Freitas Nobre,apresentado por setores do PMDB. Diante da crescente polarizao entreMagalhes e Freitas Nobre, o presidente das organizaes Globo, Roberto Marinho,fez uma exigncia a Tancredo: podia at rediscutir o nome do ministro, mas RmuloVillar Furtado deveria permanecer na Secretaria Geral43. A presso de RobertoMarinho teve sucesso. No dia 19/3/85, com Tancredo agonizando, Antnio CarlosMagalhes confirmou publicamente a manuteno provisria de Furtado naSecretaria Geral.As reaes permanncia de Furtado provocaram um inicio de crise no PMDB.Essa situao fez com que o vice-presidente em exerccio, Jos Sarney, noquisesse comprometer-se com a confirmao de Furtado na Secretaria Geral,preferindo deixar essa responsabilidade para Tancredo Neves, quando ele serestabelecesse da doena e assumisse a Presidncia. Sarney, numa atitude quesurpreendeu os setores do prprio governo, negou-se, no dia 19/3/85, a assinar umasrie de despachos do ministro Antnio Carlos Magalhes, das Comunicaes.Sarney argumentou "que s poderia faz-lo depois de consultar o presidente eleito,Tancredo Neves" 44. Fontes do prprio Ministrio das Comunicaes, na poca,garantiram que entre esses atos estava a nomeao de Rmulo Vilar Furtado para aSecretaria Geral, na sua terceira gesto consecutiva. A demora na recuperao dopresidente, entretanto, fez com que Magalhes atropelasse compromissos firmadospor Tancredo junto ao PMDB e, acelerasse a confirmao definitiva de Vilar Furtadona Secretaria Geral do Ministrio das Comunicaes.Assim mesmo, com a importncia adquirida por Magalhes na composio daAliana Democrtica, no foi fcil para Tancredo acomod-lo no seu Ministrio,enfrentando intensa resistncia do PMDB. O preo pago por Tancredo pararecompensar Magalhes foi muito alto. Custou no s a hostilidade aberta desetores do PMDB, mas tambm outros dois Ministrios, essa preciosa e escassa

    moeda para remunerar as transaes polticas pr e ps - eleitorais. Graas aMagalhes, a Bahia acabou ficando com trs Ministrios, como explica o jornalistaVillas-Bas Corra:"O PMDB do ex-Governador Roberto Santos reclamou, no podia ficar de fora emdiscriminao desmoralizante, e ganhou o Ministrio da Sade para o DeputadoCarlos Sant Anna. Foi vez de o PMDB tradicional protestar, botando a boca nomundo. Miados sim, mas negcios parte. A oposio baiana para valer, comcarteira assinada, tradio de luta, o velho PMDB de muitas campanhas e muitasderrotas. E ganhou o Ministrio da Previdncia Social para Waldir Pires. (...) Antnio

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    Carlos mirou um ministrio, acertou em trs. (...) Trs ministros, o mesmo que oPartido da Frente Liberal. Antnio Carlos e o PFL empataram" 45.Mas por que o Ministrio das Comunicaes? Tancredo prometera "qualquer"Ministrio. Teria o das Comunicaes simplesmente sobrado para Magalhes? Hquem garanta que no. Para estes, o Ministrio das Comunicaes foi

    criteriosamente selecionado por Magalhes, depois de descartadas as duasprioridades de qualquer poltico profissional "ministerivel": a prioridade um, semdvida, era o Ministrio do Interior, que seria enfraquecido com as fragmentaesque sofreria; e a prioridade dois seria o Ministrio das Minas e Energias, com suasricas estatais (Petrobrs, Eletrobrs, Vale do Rio Doce, etc.), mas este j estavadestinado como prmio de consolao para o "ex-presidencivel" Aureliano Chaves.Villas-Bas Corra defende essa tese e explica porque Magalhes teria entoescolhido o Ministrio das Comunicaes.Pousa agora, calculadamente, no campo que escolheu entre as alternativaspossveis. Um ministrio que tem os seus inegveis encantos, especialmentesensveis a um poltico. No h por todo o pas um lugarejo por mais pobre eescondido que seja que no tenha a sua agncia de correio e telgrafo, o postotelefnico, onde no se oua rdio e que no se faa a cabea com as novelascoloridas da televiso.E tudo isso arrumado: as comunicaes assinalam um dos raros xitos indiscutveisdos vinte anos de governos militares. Regado com verbas razoveis, manipulandorecursos prprios. Instigando a utilizao esperta em reas de instantneo apelopopular, como na projetada utilizao do sistema de comunicao nacional para quefuncione como um regulador de preos de gneros de primeira necessidade.Podendo ser til ou indispensvel s emissoras de rdio e televiso, fazendo omnimo que e no embaraar o caminho por onde transite os legtimos interesses decada um 46.A escolha de Magalhes para o Ministrio das Comunicaes deriva deste quadropoliticamente complexo. Por um lado, um conservador com o passado deMagalhes, empresrio da rea de comunicao, surgiu como um nome confivel -talvez o nico que despontasse to "naturalmente" - e credenciado para receber oapoio militante de Roberto Marinho. Por outro lado, as razes para a escolha deMagalhes tambm devem ser buscadas na natureza do processo da conciliao,nas condies inerentes s coligaes que levaram Tancredo Neves ao poder. Ofuturo iria mostrar que Magalhes, o imprescindvel aliado de Tancredo, era mesmoo melhor nome para representar os interesses de Roberto Marinho no Ministrio dasComunicaes. o que veremos a seguir.

    NOTA DE RODAP:33 CASTRO, Tarso de. Folha de So Paulo. Isto imprensa? So Paulo. 10 dez. 1984.p.24.34 ISTO .O Fazedor de Reis. Op. cit. P.19-2O.35 No final do governo Figueiredo explicitou-se claramente uma articulao poltica de membros das ForasArmadas, empresrios e burocratas estatais, que aqui definimos como "continusmo radical". Essa articulaodefendia a continuidade dos militares na Presidncia da Repblica. Uma de suas vertentes advogava amanuteno do general Figueiredo. Outra vertente exigia a posse de um militar "mais duro". O continusmoradical era o continusmo num sentido estrito, e seria a manuteno do regime sem concesses significativas noplano poltico. Na verdade, sem esse sentido estrito de continusmo, tambm a candidatura Maluf poderia serconsiderada como uma alternativa de continuidade do regime, de manuteno da hegemonia poltica dosprincipais grupos que sustentavam o regime militar. E tambm a candidatura Tancredo-Sarncy representava, doponto de vista dos interesses de classes predominantes no Brasil, uma continuidade, embora envolvendo umaruptura "democratizante" no plano poltico.36 VEJA. O Torpedo baiano. So Paulo, n. 854. 1 Jan. l985. pk38.

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    37 CORREA, Villas-Bas. Jornal do Brasil. Antnio Carlos Magalhes ou a arte da perfeita baldeao. Rio deJaneiro. LOMAR. 1985. Caderno Especial p. 1.38 VEJA. Cem dias de medo. So Paulo, n.854. L6jan. 1985. p.40-45.39 VEJA. O torpedo baiano, op. cit. P.3940 Relatado por participantes da reunio.41 Relatado por participantes da reunio.42 Informao prestada pelo general Octvio Costaem entrevista concedida ao autor.43 Informao confirmada por fonte intimamente ligada a Tancredo Neves.44 Conforme telegramas das agncias Estado, Globo e JB.45 CORREA, Villas-Boas. op. cit.46 Ibidem.

    MARINHO E MAGALHES: BONS NEGCIOS.

    A presena de Antnio Carlos Magalhes no Ministrio das Comunicaes amplioua influncia de Roberto Marinho. Um dos episdios exemplares dessa nova fase derelacionamento entre da Rede Globo e o Ministrio das Comunicaes foi atransferncia do controle acionrio da NEC do Brasil (NDB) do empresrio MrioGarnero para Roberto Marinho, consumada em outubro de 1986.Instalada no pas h 20 anos, a NEC do Brasil - subsidiara da Nippon ElectricCompary - passou por uma significativa reformulao em 1981, coma aimplementao da poltica industrial definida pelo Ministrio das Comunicaes parao setor. Essa poltica refletia a instalao, em 1979, da Secretaria Especial dainformtica (SEI), responsvel por medidas de proteo das empresas de capitalnacional e estmulo ao desenvolvimento da tecnologia brasileira. Desde osurgimento da SEI, tornara-se incmoda a tolerncia do Ministrio dasComunicaes com o monoplio do capital e da tecnologia estrangeira na indstriade telecomunicaes. Apesar de ser quase totalmente dependente das encomendasdas empresas estatais ligadas ao Ministrio das Comunicaes a indstria de

    telecomunicaes nunca sofreu exigncias como as que passaram a ser feitas pelaSEI indstria de informtica. Ao contrrio, enquanto a SEI reservava seguimentosde mercado exclusivamente para empresas nacionais, o Ministrio dasComunicaes executava poltica inversa, reservando cartorialmente mercado paraempresas estrangeiras. Esse o caso das centrais telefnicas, cuja demanda dasestatais era suprido por um restrito clube formado pelas multinacionais StandardElectric, Simens, Ericsson e NEC.Para fortalecer esta poltica, o Ministrio das Comunicaes promoveu, com adiligente atuao do secretario geral Rmulo Villar Furtado, um processo de"nacionalizao" das empresas estrangeiras atravs da presena de um scio nativoque detivesse 51% do capital com direito a voto. Dissimulando a presena do capitalestrangeiro no setor de telecomunicaes e - o que decisivo - o controle da

    tecnologia, as "nacionalizaes" pretendiam defender estas empresas da poltica, detraos nacionalistas, implementada pela SEI.A entrega 51% do capital votante para scios nacionais evidenciava a preocupaodas indstrias estrangeiras, no s com a manuteno das posies no mercado detelecomunicaes, mas com a necessidade crescente de avanar sobre o mercadoda informtica. Impulsionada pelo acelerado desenvolvimento tecnolgico da ltimadcada, a indstria de telecomunicaes aproxima-se cada vez mais da indstria deinformtica. Seja pela incorporao de componentes e microprocessadoresoriginalmente usados em computadores, que fazem os equipamentos detelecomunicaes cada vez mais "inteligentes", seja pela simples fuso de servios

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    de telecomunicaes e informtica que torna cada vez mais difcil distinguir ossistemas de comunicao dos sistemas de processamento eletrnico de dados. Oscomputadores afirmam-se como centrais de controle de comunicao, verses muitomelhoradas das antigas centrais de telefonia, e os aparelhos de telefonia sesofisticam transformando-se em terminais de computador. Redes de

    telecomunicaes e equipamentos de processamento de dados fundem-se , nummesmo sistema: a telemtica viabilizando servios que h poucos anos pertenciamao terreno da fico cientifica. As "nacionalizaes" promovidas pelo Ministrio dasComunicaes, no inicio da dcada de 80 serviram para "maquiar" a presena docapital estrangeiro na rea e armar as indstrias de telecomunicaes comargumentos para furar o bloqueio da reserva de mercado controlada pela SEI. Ogoverno do general Figueiredo ficou dividido entre as posies do Ministrio dasComunicaes e as da SEI. As contradies explicitaram-se publicamente epersistiram sem soluo na Nova Repblica, com os grupos de interesse firmementeentrincheirados nas duas reas. 47.Foi nesse jogo pesado de disputa de mercado que, em 1981, aproximaram-se oempresrio Mrio Garnero, lder do grupo Brasilinvest e os japoneses da NEC.'Garnero, que trafegava com facilidade nos gabinetes oficiais, tinha influncia; os japoneses, dinheiro48. Conduzida pelo secretrio geral do Ministrio dasComunicaes Rmulo Villar Furtado, a associao de Garnero com os japoneses,que nacionalizou a NEC, foi acertada sem maiores problemas.Os problemas comearam a surgir mais tarde quando se evidenciou para os japoneses o estilo de Garnero que, aproveitando-se da situao, insistia emcontrolar efetivamente a NEC. Ao se tornar scio da NEC do Brasil, com maioria devotos e minoria de aes ordinrias, 53 japoneses ocupavam cargos-chaves degerenciamento.Trs anos depois, no chegaram a 20. Moviam a Garnero no propriamente razesde natureza patritica, mas convenincias, j que, por medida de economia, era bomir reduzindo a importao de tecnologia do Japo 49.A precria harmonia entre Garnero e os scios japoneses, estimulada pelasperspectivas do negcio, durou at maro de 1985 quando numa medida deimpacto, o governo federal decretou a liquidao extrajudicial do Banco Brasilinveste das demais empresas financeiras pertencentes ao grupo. As irregularidadesconstatadas levaram o ento ministro da Fazenda, Francisco Dornelles, a solicitar apriso preventiva de Mrio Garnero.Gamero controlava a sua parte de aes da NEC do Brasil atravs da BrasilinvestInformtica e Telecomunicaes (BIT). Essa empresa no foi atingida, de imediato,pela liquidao dos ramos financeiros do grupo Brasilinvest. Mesmo assim, arepresso s atividades ilcitas de Garnero era o que faltava para os japonesesdecidirem se afastar do scio brasileiro.

    O cerco nipnico buscou espao, primeiro, na Justia. Uma ao cautelar da NECCorporation - o scio japons - tentava assegurar-lhe preventivamente o controle daNEC do Brasil, j que o scio brasileiro se encontraria impedido de exercer, de fato,o controle da companhia. O scio, porm, no era o Dr. Garnero, pessoa fsica, esim a BIT, pessoa jurdica, da qual Garnero era um dos acionistas, mas no o nico.A Justia no acatou a ao, mesmo tendo os japoneses juramentado que ocontrole estrangeiro, contrrio lei, seria temporrio o suficiente para se encontrarum substituto para Gamero.

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    No houve acordo, s eventuais trguas, nas reunies que se sucederamasperamente, de outubro de 1985 aos primeiros meses de 1986, com direitoeventual at a dose duplas de usques s 10 da manh e queixas contra autoridadesfederais que haviam recebido propinas milionrias para resolver o impasse, e notinham resolvido.

    O scio japons continuou plantando espinhos no caminho do scio brasileiro,escorado, j ento, na defeco voluntria de dois dos quatro diretores nomeadospor. Garnero, numa diretoria de sete, e na ajuda involuntria da repercussopblica do affair Brasillnvest 50.Com o passar do tempo, os japoneses aumentaram a presso sobre Garnero.Atravs do advogado Ethevaldo Alves da Silva, dono das Faculdades MetropolitanasUnidas (FMU) e da Rdio Capital de So Paulo, foi tentada a extenso da"liquidao extrajudicial do grupo Brasilinvest ao at ento tronco dastelecomunicaes, a BIT"51. Ethevaldo Alves da Silva -'foi, na verdade, quemcomprou as CDBs do credor Jamil Zeitune, bem depois da liquidao extrajudicial,para poder entrar na briga. Depois do pedido de falncia, veio o pedido de arrestodos bens. Garnero estava acuado 52..Garnero estava vendido, mas tinha um preo, e no era esse preo exatamente omesmo que os japoneses da NEC insinuavam lhe pagar: isto , nada.A pretexto de emprstimos contrados pelo Brasilinvest junto companhia e acobranas pendentes, achavam os japoneses bastante razovel que Garnero sassepela porta da NEC com os bolsos vazios. Os planos de Garnero eram outros. Haviainteressados no negcio, e ele queria presidir o acerto. O Banco Nacional, aprincpio, fez um aceno, para logo desaparecer. Com Matias Machline, comandantedo Grupo Sharp, chegou-se a fechar o negcio em abril do ano passado (1986),numa reunio definitiva, onde at o cheque foi assinado. A reunio terminou tarde danoite, no escritrio de Machline, mas na manh seguinte ele surpreendentementerecuou O que se diz que Machline, um dos amigos mais ntimos de Sarney, noquis pr em risco esta amizade, aps receber um telefonema dissuasrio do Palciodo Planalto. A Moddata, grupo carioca da rea de informtica se apresentaria emseguida, mas, assim como veio, foi-se: subitamente.O telefonema persuasivo do Palcio do Planalto pode pertencer lenda, no realidade, mas o fato que, em abril de 1986, o destino da sociedade comercialchamada.NEC do Brasil emaranhava-se num enredo mais complexo. Deixava o reduto da Ruado Paraso, em So Paulo, para se esparramar em outros territrios, cujos vrticespassariam a ser a Rua Irineu Marinho, no Rio, e a Esplanada dos Ministrios, emBraslia. Desponta no horizonte o nome Roberto Marinho. (..j Marinho homem do jornalismo e das comunicaes, mas parece que andava meio distrado do assunto.Quem lhe chamou a ateno para a NEC foi Rmulo Vilar Furtado, secretrio geral

    do Ministrio das Comunicaes h 13 anos.

    NOTA DE RODAP:47 Alguns meses aps o surto de "nacionalizao", quando a Secretaria Especial de informtica (SEI) davaprimeiros passos, comeou a acirrar-se a luta pela Poltica de Informtica e essas empresas "nacionalizadas"passaram a reivindicar seu ingresso no mercado reservado s indstrias nacionais. Por sua condio, essasindstrias de telecomunicaes estavam impedidas de entrar no mercado de informtica por no estar sobcontrole nacional a tecnologia utilizada. Iniciou ento um intenso debate sobre o conceito de empresa nacionalque colocou em confronto direto com o Ministrio das Comunicaes, aliado s grandes empresas estrangeirase a Secretaria Especial de Informtica.

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    Nesse quadro, em abril de 1983, o empresrio Mrio Garnero envolveu-se num rumoroso acontecimento aoprecipitar, como presidente em exerccio da Confederao Nacional da Indstria, a divulgao pela Federaodas Indstrias do Estado de So Paulo (FIESP), de um documento que atacava frontalmente a poltica deinformtica que vinha sendo conduzida pela SEI. Esse documento formalizou o conflito de interessesnacionalistas e multinacionais em relao poltica de informtica no Brasil. Alm do destacado papel em defesados interesses multinacionais, a atuao de Mrio Garnero em conjunto com a equipe entreguista do Ministriodas Comunicaes pode ser acompanhada no processo de instalao do projeto Videotexto, em So Paulo, queiniciou a partir de uma proposta do grupo Brasilinvest. Por muitos meses, o projeto Videotexto fui dirigido por umservio especial de consultoria do grupo Brasilinvest, at que esses vnculos foram oficialmente extintos com odesligamento do "consultor" Luis Carlos Moraes Rego, do Brasilinvest que passou a apresentar-se comoconsultor independente permanecendo at hoje na direo do Vdeo texto paulista.O interesse do Brasilinvest no Videotexto comeou justamente depois que o governo Figueiredo recuou dainteno de implantar por decreto o Servio de TV por Cabos Ou Cabodifuso em 1979. A tentativa deimplantao da TV por Cabos outra manobra conduzida por Rmulo Villar Furtado, Secretrio dasComunicaes. Furtado desde 1974 coordenou a elaborao de uma legislao que visava garantir o monoplioda IV por Cabos por algumas grandes empresas da rea da comunicao (com destaque para da Rede Globo),contando com a tecnologia das indstrias multinacionais de telecomunicaes. Atravs das redes de IV porCabos esses grupos da rea da comunicao, associados s multinacionais de telecomunicaes, pretendiamcontrolar o desenvolvimento da telemtica (fundindo-os)50 Idem, p. 42.51 Ibide48 SENHOR. O atacado do Senhor Globo. op. cit p.41.49 lbidem.(Servios de telecomunicaes e informtica) no Brasil. Com os servios de IV por Cabos implantados, seria umambiente propcio internacionalizao da indstria de informtica. Esse projeto foi sustado graas mobilizao de Universidades, entidades de profissionais e de pesquisadores da rea. Diante das dennciasdessas manobras, o governo preferiu recuar em 1975 no governo Geisel e em 1979 no governo Figueiredo. (orelato completo das tentativas de implantao da IV por Cabos do Brasil pode ser encontrado in: HERZ, Daniel,op. cit.) Recentemente, em outubro de 1986 o Secretrio Geral do Ministrio das Comunicaes comeou apressionar em favor da implantao da IV por Cabos. Voltando a atuar como porta-voz dos interesses dosgrupos econmicos interessados na implantao do servio. (In: ZERO HORA. TV a cabo: sistema pode serimplantado em breve no Pas. Porto Alegre. 5 out. 1986.)Mas no apenas no Ministrio das Comunicaes localizam-se os entreguistas. Outra figura de destaque, noincio do governo Sarney foi do empresrio e publicitrio.52 AFINAL. Uma novela baiana. So Paulo, 4.125. 20 jan. l987. P. 73.

    "Os olhos e ouvidos do Dr. Roberto so potentes como sua emissora de TV e, assimcomo ela, dispem de estratgica localizao. De resto, isso faz parte do negcio."O interesse do Dr. Marinho pela NEC passa a coincidir, porm, com a circunstnciade a Rede Globo ter voltado carga, com entusiasmo, na questo do"colarinhobranco", e o ministro Antnio Carlos Magalhes, das Comunicaes, ter ganhadomuito espao nos jornais de vdeo e de papel do Dr. Roberto, sempre fazendocomentrios a respeito da reputao do Dr. Mrio Garnero."(...) De repente, Garnero, que sonhava em ver a luz no fundo do tnel, estavaenredado num cipoal de coisas erradas. Os japoneses pareciamsurpreendentemente confiantes, nas conversas. Os bancos, mais renitentes do quenunca em conceder crditos ou descontos de duplicatas (negcios acertados eramdesfeitos, horas depois, por efeito de misteriosas conversaes telefnicas). Os japoneses, com vocao para o 'harakiri, botavam lenha na fogueira do quanto pior,melhor. Suspenderam todos os investimentos. De Tquio, veio a estiletada: asimportaes feitas pelo Brasil teriam de ser feitas, doravante vista, ainda quehouvesse cartas de crdito, licenas da Cacex, etc. Na prtica, significava: a NEC doBrasil passaria a funcionar a meio vapor (ainda assim, o faturamento de 86 chegouaos US$60 milhes, e a previso para 87 de dobrar)" 53.Sentindo a presso aumentar Garnero - que tinha na NEC a parte mais slida deseu patrimnio, quase integralmente comprometido pela liquidao extrajudicial -resolver jogar tudo para recuperar o controle da NEC. E comeou voltando presidncia do Conselho de Administrao da empresa, de onde se afastara desde

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    a liquidao do Brasilinvest. Esse esforo provocou uma irada e violenta reao doministro Antnio Carlos Magalhes, como registra a imprensa:

    NOTA DE RODAP:Mauro Salles, ento Ministro para Assuntos Extraordinrios. Mauro Salles, que tambm participou daimplantao da Rede Globo, adquiriu destaque internacional ao ser um dos responsveis pelo pool de agnciaspublicitrias que divulgou internacionalmente o milagre brasileiro (expresso esta que foi cunhada nessacampanha publicitria) durante o governo Mdici. Em 1984, quando trabalhava na assessoria do candidatoTancredo Neves, Mauro Salles voltou a ser notcia ao surgir como scio minoritrio da multinacional japonesaSony, defendendo seu ingresso na rea da SUFRAMA, obtendo.os benefcios da Zona Franca de Manaus. Mauro Salles dirigiu bem-sucedido "lobby" que conseguiu furar obloqueio, graas a manobras escandalosas, e instalar-se em Manaus passando a competir, com uma srie devantagens, com as empresas nacionais que l se encontram. Nessa luta para introduzir a Sony em Manaus,Salles contou com a solcita colaborao do Secretrio Geral do Ministrio das Comunicaes, Rmulo VilarFurtado. Com o estouro do grupo Brasilinvest, a estrela de Salles ofuscou-se. Mauro Salles era53 SENHOR. O atacado do Globo. op. cit. p.42-43.

    No ltimo dia 11 (de abril de 1986), numa reunio do conselho de administrao daNEC, Garnero afastou Renato Ishikawa, representante do scio japons, da diretoria

    financeira da empresa, substituindo-o por Arnaldo de Alencar Lima, homem de suaconfiana. No dia 24, ele completou o lance ao destituir da presidncia do conselhode administrao o coronel Herv Pedrosa e indicar a si mesmo para o cargo. Amudana foi formalizada numa assemblia geral dos acionistas que contou com apresena de Garnero e de mais trs diretores a ele ligados. A fulminante operaodo empresrio provocou a imediata reao do ministro das comunicaes, AntnioCarlos Magalhes, a cujo ministrio est subordinado as estatais que alimentam asencomendas das indstrias de telecomunicaes no pas. Magalhes levou o casoao presidente Jos Sarney e foi autorizado a estudar com sua assessoria jurdica ocancelamento das encomendas que o governo mantm junto NEC, no valor de100 milhes de dlares.'Eu mudo de nome, mas no dou um tosto de dinheiro pblico a esse malfeitor',

    argumenta Magalhes.O novo passo tumultuado de Garnero est entregue, assim como vrios de seusoutros negcios, Justia. A NEC do Japo recorreu l3 Vara Cvel de So Pauloe conseguiu uma liminar que suspendeu provisoriamente as decises promovidaspor Garnero. A Brasilinvest Informtica e Telecomunicaes - atravs da qualGarnero detm 17% do capital da NEC, mas 5l% das aes com direito a voto -contestou a liminar e teve sucesso. Ele se diz 'vitima de uma manobra' com oobjetivo de for-lo a entregar o controle da NEC aos japoneses.O ministro Antnio Carlos Magalhes, porm, no se abala na sua deciso decancelar as encomendas. No est claro se, do ponto de vista legal, o governo teriadireito a fazer um cancelamento. A tese do ministro que, com a volta de Garnero, aempresa havia se tornado inidnea, modificando assim uma condio essencial docontrato. 'No discuto a deciso judicial, mas no serei o primeiro a alforriar umapessoa nacionalmente conhecida como inidnea, diz Magalhes 54.O ministro das Comunicaes cumpriu suas ameaas. A partir da no s asempresas do sistema Telebrs no fizeram novas contrataes NEC - um dos trsfornecedores de centrais CPAS e responsvel por 80% dos equipamentos da redede microondas da Embratel - como deixaram de pagar as parcelas vencidas decontratos j assinados, inclusive na entrega de equipamentos.

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    NOTA DE RODAP:Membro do Conselho de Administrao do Brasilinvest e, com a liquidao pelo Banco Central, teve seus benspostos em indisponibilidade. (A revista SENHOR publicou diversas reportagens sobre o assunto em 1984 e1985).54 VEJA. Golpe branco. So Paulo. 7 maio 1986. p. 131.

    Para evitar que a empresa deixasse de pagar seus funcionrios, e o caso da NECenvolvesse outras reas do governo, Antnio Carlos mandou liberar parte dopagamento. E esse procedimento continuou sendo adotado nos meses seguintes.Sofrendo as retaliaes impostas pelo ministro das Comunicaes pelos japonesese por Roberto Marinho, Garnero resistiu pouco tempo. No final de junho teve decomear a negociar com os japoneses e com o dono da Rede Globo. "Da RedeGlobo, em pessoa, s se materializa no final de junho de 1986, na esbelta figura deseu principal executivo da rea financeira, Miguel Pires Gonalves. Miguel avisou aGarnero que ia procur-lo. No dia seguinte na casa do empresrio, no Morumbi,exibiu uma procurao dos japoneses e a certeza de um negcio rpido"56."A soluo foi sacramentada na ltima tera-feira (dia 28 de outubro de 1986)numasute do hotel Maksound, em So Paulo, durante uma reunio das trs partes

    envolvidas - Gamero, Marinho e os s aos japoneses da NEC. O acerto envolve avenda de 5l% do capital votante da NEC, que estava nas mos de Garnero, paraMarinho. Os japoneses conservaram os 49% restantes das aes com direito a voto.Garnero ficou na sociedade apenas com as aes preferenciais - que do direito adividendos, mas no a voto, e, portanto excluem seu detentor da direo daempresa. O negcio se fez a preo de dar gua na boca. Por esse pacote, costuradopelo lado da Rede Globo pelo vice-presidente do grupo Miguel Pires Gonalves -filho do ministro do Exrcito, general Lenidas Pires Gonalves -, Marinho pagou aGarnero o equivalente a menos de 1 milho de dlares. o que valem, hoje, doisbons apartamentos de quatro quartos no Rio de Janeiro ou So Paulo"57."O capitaltotal da empresa ficou assim dividido: Roberto Marinho (38%). Mano Garnero (25%)e NEC japonesa (37%). Ou seja, Garnero fica na Sociedade apenas como aes

    preferenciais-que do direito a dividendos, mas no a votos -, mas amplia suaparticipao no capital total da empresa de 17,5 para 257.."No dia 28 do mesmo ms (outubro de 1986), a Telebrs e suas 30 subsidiriasiniciaram a normalizao dos pagamentos e das encomendas junto NEC do Brasil"58.0 negcio, que custou a Marinho menos de um milho de dlares era 'avaliadopelos japoneses em 360 milhes de dlares, quando a carteira de pedidos da NECno apresentava ociosidade. Vazia, como se encontrava a empresa no tinha valoralgum - at pelo fato de que a sua tecnologia pertence ao scio estrangeiro' 59."Ainda hoje (novembro de 1986), apesar dos percalos que a atingiram, ela (a NEC), por exemplo, a maior fornecedora da Embratel - cujo maior cliente, por sua vez, a prpria TVGLOBO"60.

    NOTA DE RODAP:55 INFORMATICA HOJE. NEC: Garnero e Roberto Marinho scios. Graas ao

    Minicom. So Paulo. N.78. 11 nov. 1986. p.4.56 Idem, p.43.57 VEJA. Linha direta. So Paulo 4.948.5 nov. 1985. p. 123.58 AFINAL. Uma novela baiana. op. cit . p. 73.

    Em janeiro de 1987 Roberto Marinho deu a Antnio Carlos Magalhes umademonstrao pblica de apreo que tinha as feies tpicas de um pagamento dedvida: tirou da TV Aratu, da Bahia, os direitos de retransmisso da Rede Globo no

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    Estado e os concedeu TV Bahia, controlada por parentes e amigos de Magalhes,como veremos - em detalhe - mais adiante.O sucesso da operao levou a imprensa especializada a especular sobre umconvite de Roberto Marinho ao secretrio geral do Ministrio, Rmulo Vilar Furtado,para que este assumisse a presidncia da NEC 61 Mas no h indcios de

    confirmao dessa especulao, pois certamente mais til para os interessespredominantes na rea, inclusive os da Rede Globo, a permanncia de Furtado noseu posto, enquanto l conseguir se manter. Pelo menos enquanto no houver bonsmotivos para "abandonar o barco", depois de mais de treze anos de usufruto docargo de secretrio geral.Como se pode observar nesse episdio, que apenas um exemplo de como seprocessa o exerccio do poder na rea do Ministrio das Comunicaes, RobertoMarinho j auferiu excelentes resultados com a atuao de Antnio CarlosMagalhes: graas ao ministro, hoje Marinho scio de Mrio Garnero que j tevesua priso preventiva solicitada pelo Ministrio da Fazenda e foi taxadopublicamente por autoridades federais de "escroque internacional".As ligaes explcitas entre Roberto Marinho e Antnio Carlos Magalhes so toescandalosas que motivaram, desde o final de 1986, uma proposta, defendida porvrios parlamentares e pelo governador eleito da Bahia, Waldir Pires, da realizaode "uma investigao do Congresso em cima dos negcios especiais que o Dr.Roberto Marinho teria obtido, graas s suas ntimas relaes com o poder" 62.Este um veio que no ter fim - a menos que os senhores congressistas queiramdesafiar o poder da Rede Globo Ainda na semana passada (meados de dezembrode 1986), o ministro Antnio Carlos Magalhes ganhou generosos minutos no 'JornalNacional' para anunciar que o Brasil passa a ser o fornecedor exclusivo de todos osequipamentos de telefonia para o vizinho Suriname. Celebrou-se efusivamente essaconquista nacional. Quem fatura com as vendas, alardeadas pelo ministro, umaempresa chamada Victory: a Victory que mereceu o apoio do ministro AntnioCarlos Magalhes nas negociaes com o Suriname, resultante de umaassociao entre a empresa italiana Victory, Roberto Marinho (Rede Globo) eAmador Aguiar (dono do Bradesco, maior banco privado do Brasil)63. A privatizaode servios da estatal Embratel e o controle do fluxo de trfego nos satlites detelecomunicaes so duas metas j anunciadas pela Victory.

    NOTA DE RODAP59 VEJA. Linha direta. Op.cit.p.123.60 Ibidem.61 INFORMTICAHOJE. Rmulo na NEC? So Paulo. n.78. 11 nov. 1986 p.2.62 SENHOR. Dinamite contra da Rede Globo... op. cit. p. 37.

    Os ltimos registros da imprensa, no fechamento desta edio ampliavam aindamais a lista dos favores trocados entre Magalhes e Marinho:"No faltaro outros bons negcios, na rea, inclusive os que envolvero as futuraslistas telefnicas do Rio e da Bahia, supostamente j apalavradas com um grupoque dispe, em sua direo de dois sobrenomes Marinho - Joo Roberto e RobertoIrineu, ambos os filhos do chefe supremo"64.Os dois alertam que a negociao da estatal com as empresas Promon Engenhariae Victory (esta ltima de origem italiana, representada no Brasil pelo empresrio).

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    (Roberto Marinho e o banqueiro Amador Aguiar),para a explorao de servios decomunicao de dados via satlite reflexo desta poltica de privatizao.(...)""A proposta da Victory Embratel ainda no est clara mas a segunda vez que aempresa investe na empreitada de explorar servios de comunicao de dados viasatlite."

    A primeira, no inicio do ano passado, acabou tendo de ser recusada pela Embratel,tal o volume de crticas e presses recebidas de seu corpo tcnico e de lideranasdo setor de telecomunicaes.E para recusar, a diretoria da estatal alegou justamente a quebra do monoplio,pois o pleito era a permisso para execuo de servios mltiplos destinados paradifuso de informao de interesse pblico de abrangncias nacional', incluindo aimplantao do servio, tanto para as transmisses via satlite quando para atravsde canais secundrios em emissoras de FM".Alm da solicitao para 'aluguel da capacidade necessria no satlite Brasilsat... '.Esses so trechos de carta enviada ao secretrio geral do Ministrio dasComunicaes, em 2 de janeiro de 1986, com papel timbrado da Victory, assinadapor Amador Aguiare Roberto Marinho.Na mesma carta a Victory informa que utilizaria tecnologia da EquatorialComunications Company e da Mutual Broadcasting System.Jorge Bittar e Paulo Eduardo Gomes esto convictos que, renovado o pleito, oprojeto no mudou nada, embora o presidente da Embratel tenha declarado que,desta vez, no fere o monoplio estatal. Para os dois lderes da Embratel, oprojeto, cujo contedo vem sendo mantido sob rigoroso sigilo pela diretoria daestatal, est recebendo uma boa maquiagem.A Victory fez uma proposta completa, pela qual a empresa, que representa comexclusividade a Equatorial, norte-americana, importaria e comercializaria osequipamentos (estaes terrenas e computadores para o controle de transmisso dedados via satlite), e seria a operadora do servio - adverte Bittar.No temos nenhum elemento que caracterize o acordo de agora como diferente dapretenso anterior - completa Paulo Eduardo Gomes.A chave da questo, segundo eles o direito a um determinado fluxo de trfego nosatlite, que poder constar no acordo de operao conjunta, como admitiu opresidenteda Embratel. Jorbe Bittar chama ateno para o fato de que no hdiferena entre ter um fluxo garantido no Brasilsat e o aluguel do satlite.

    RADIODIFUSO BRASILEIRA; HERANA DA DITADURA.

    A legislao que regulamenta as concesses de rdio e televiso, vigentes h vintee dois anos, atribuem ao presidente da Repblica um poder absoluto. A outorga de

    concesses independe de pareceres tcnicos ou qualquer outro de avaliaorelevante: uma deciso pessoal da Presidncia. No governo do general Figueiredoesse arbtrio foi levado ao extremo: foi feito mais de 700 concesses de rdio eteleviso, o que representa mais de 1/3 do total das emissoras existentes desde osurgimento da radiodifuso no Brasil.Somente no perodo que vai do incio do governo Figueiredo at maio de 1984(cerca de dez meses antes do final do mandato) "foram outorgadas 295 rdios AM,299 FMs e 40 emissoras de televiso. O que corresponde, a 23,5, a 56,3 e a 27,3%do total das emissoras existentes no pas" 65 Boa parte dessas concesses foioutorgada por motivos polticos e a empresrios parlamentares ligados ao governo.

  • 8/9/2019 A histria secreta da REDE GLOBO - Daniel Herz

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    Estreando no Ministrio das Comunicaes um estilo que marcou suas passagenspor governos e rgos pblicos, Antnio Carlos Magalhes iniciou muito cedo umaluta implacvel contra seus adversrios polticos. Num lance to ousado quantodemaggico, Magalhes comeou sua gesto acusando o ex-presidente Figueiredode ter desrespeitado procedimentos tcnicos do Ministrio das Comunicaes na

    outorga de concesses de rdio e televiso. Essas concesses foram outorgadasprincipalmente a polticos malufistas e amigos pessoais do general Figueiredo. Paraenfrentar o problema, Magalhes suspendeu todas as concesses realizadas desdeoutubro de 1984 e criou, para revis-las, uma comisso coordenada pelocomprometido secretrio geral, Rmulo Vilar Furtado.

    NOTA DE RODAP:63 A Victory, apoiada pelo secretrio geral do Ministrio das Comunicaes, Rmulo Villar Furtado, estencabeando uma campanha pela privatizao dos servios de telecomunicaes, em particular os prestadospela Embratel. 'A tendncia presente em alguns segmentos do Ministrio das Comunicaes. Em defesa daprivatizao da Embratel, no uma novidade, de acordo com os engenheiros Jorge Bittare Paulo EduardoGonics (respectivamente diretor da Federao Nacional dos Engenheiros e presidente da Associao dosEmpregados da Embratel). Segundo eles, o secretrio geral Rmulo Villar Furtado, que ocu