A história nas estrelas...A história nas estrelas Naconclusão de muitos clássicos da literatura...

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A história nas estrelas N aconclusão de muitos clássicos da literatura de misté- rio, o detective reúne todas as personagens principais no salão e anuncia os resultados da sua investigação. Na nossa história de detectives, claro que não estamos a investigar um crime, mas um acto de criação, e o mistério é muito mais com- plexo. Tal como foi sugerido no capítulo anterior, a solução deste mistério pode não se limitar a uma simples conclusão e pode necessitar do trabalho de muitos detectives - não ape- nas do de um intrépido investigador - para ficar resolvido. Será que, mesmo nessa altura, irá poder ser resolvido por com- pleto? Haverá coisas no cosmos que simplesmente não se pode co- nhecer? Será que alguma vez iremos poder saber porque é que o universo começou a existir quando o fez? O motivo é, mui- tas vezes, o mais difícil de perceber. Apesar de tudo o que po- demos ou não deduzir no final sobre o porquê do universo, chegámos a uma minúscula fracção de segundo da compreen- são do como, e isso pode ser suficiente para nos permitir de- clarar o caso como encerrado por agora - ou, pelo menos, não completamente por resolver. Mais importante, contudo, é o facto de aquilo que inferirmos da nossa investigação nos ir fazer ver o mundo e a nós próprios de uma forma radical- mente diferente. Que mensagem para nós se encontra dispersa pelo uni- verso? Que palavras são gatafunhadas pelas estrelas nos qua- dros de ardósia da noite escura? Verificamos que a primeira

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A história nas estrelas

Naconclusão de muitos clássicos da literatura de misté-rio, o detective reúne todas as personagens principais no

salão e anuncia os resultados da sua investigação. Na nossahistória de detectives, claro que não estamos a investigar umcrime, mas um acto de criação, e o mistério é muito mais com-plexo. Tal como foi sugerido no capítulo anterior, a soluçãodeste mistério pode não se limitar a uma simples conclusão epode necessitar do trabalho de muitos detectives - não ape-nas do de um intrépido investigador - para ficar resolvido.Será que, mesmo nessa altura, irá poder ser resolvido por com-pleto?

Haverá coisas no cosmos que simplesmente não se pode co-nhecer? Será que alguma vez iremos poder saber porque é queo universo começou a existir quando o fez? O motivo é, mui-tas vezes, o mais difícil de perceber. Apesar de tudo o que po-demos ou não deduzir no final sobre o porquê do universo,chegámos a uma minúscula fracção de segundo da compreen-são do como, e isso pode ser suficiente para nos permitir de-clarar o caso como encerrado por agora - ou, pelo menos,não completamente por resolver. Mais importante, contudo, éo facto de aquilo que inferirmos da nossa investigação nos irfazer ver o mundo e a nós próprios de uma forma radical-mente diferente.

Que mensagem para nós se encontra dispersa pelo uni-verso? Que palavras são gatafunhadas pelas estrelas nos qua-dros de ardósia da noite escura? Verificamos que a primeira

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mensagem da biografia do universo é a sua unicidade, porqueaparentemente todos provimos de uma única fonte. Podemosseguir os vestígios das raízes na nossa árvore genealógica atéao início do universo, há 13,7 mil milhões de anos. Nessa al-tura, claro, não havia sinais de vida, mas o potencial da vidaestava no esquema do universo, tal como o esquema de umaárvore está contido na sua semente.

Hoje em dia, quer sejamos negros, brancos, castanhos ouamarelos, ou hindus, cristãos, muçulmanos, budistas ou ju-deus, pertencemos todos à mesma família. Somos todos pa-rentes ligados desde o nosso nascimento ao Sol, às estrelas,aos planetas, às luas e ao próprio universo inteiro. Não exis-tem diferenças fundamentais entre nós. Se nos lembrarmos quepartilhamos a mesma origem, todas as linhas divisórias se des-vanecerão. Esta mensagem de unicidade foi forjada na bola defogo do universo. Deveria fornecer-nos grande inspiração paraavançarmos e esquecermos todas as nossas diferenças.

Comecei este livro lembrando-me de ter acreditado, hámuito, muito tempo, que existia uma história escrita nas es-trelas. Uma história na qual, de alguma forma, mesmo umrapaz pobre e isolado como eu desempenhava o papel de umpríncipe. Na altura não sabia que Albert Einstein, o maiorcientista do século passado, já tinha dito que cada um de nósé o centro do universo. Este facto pode confundir quem estejahabituado a pensar no universo como um grande globo oucomo uma bolha a crescer cada vez mais. Uma esfera tem umcentro, certo? Bem, o universo é uma espécie de esfera especialcujo centro está em todo o lado. Assim, quer moremos numacidade fervilhante, como Nova Iorque ou Paris, ou numa pe-quena aldeia poeirenta em nenhures, podemos dizer honesta-mente que vivemos no centro do cosmos.

Os capítulos da biografia do cosmos transmitem uma men-sagem semelhante de forma inequívoca. É uma mensagem deautorização de posse: nenhum de nós é insignificante. Podemos

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ser pequenos e ter poderes limitados, mas conseguimos com-preender a nossa história nas estrelas e sabemos que o universonão está completo sem nós. Não se trata de uma fábula nem deuma fantasia romântica, mas de mil facto significativo. Tam-bém sabemos que não somos apenas uma parte inseparável enecessária do universo, mas que o próprio plano do cosmos feztudo para que acabássemos por aparecer.

Por que razão somos tão essenciais? Aqui deparamo-noscom o facto provavelmente mais estranho e maravilhoso detodos, um facto que abordámos no capítulo anterior. O ilus-tre físico John Wheeler disse-o da forma mais eloquente: «É ir-refutável o facto de o observador ser um participante nagénese.» Meditemos um pouco nesta afirmação para poder-mos perceber o quão espantosa ela é. A génese é o começo dotempo, o nascimento do cosmos. O «observador» é construídopela nossa sensibilidade consciente, a faculdade que emprega-mos quando olhamos profundamente e para trás no espaço eno tempo. Estão a começar perceber?

Einstein disse que «o facto mais incompreensível sobre a na-tureza é o de ser compreensível». Estava a referir-se ao facto deo universo, apesar de todos os seus mistérios, se reger por al-gumas leis distintamente fundamentais. Graças à ciência, anossa consciência é capaz de observar estas leis a actuar atra-vés do cosmos. O prémio Nobel Eugene Wigner juntou-se àdiscussão argumentando que existem dois milagres: um é o daexistência das leis infalíveis da natureza, e o outro é o dacapacidade de a mente humana as compreender. Sir Roger Pen-rose, o premiado matemático inglês, também fica desconcer-tado com o facto de o universo se ter desenvolvido obedecendoa leis da natureza que a nossa consciência parece destinada acompreender. Será que a nossa consciência está de facto ligadade forma intrínseca aos planos do universo? Assim sendo, éuma volta, ou um círculo, que está constantemente a voltarpara todos nós, enfatizando sempre a nossa importância.

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Quando olhamos para o céu cheio de estrelas, espero quepossamos dizer: transforma-nos com o teu fogo. Converte-nosem seres totalmente conscientes. Deveríamos escutar a músicada unicidade por entre as incontáveis estrelas e esperar que asua canção se una à nossa para finalmente podermos banir aignorância que gera o preconceito e a guerra no mundo im-previsível dos nossos dias.

Sabemos que existe muito sofrimento no mundo, bemcomo fealdade e decepções quotidianas. Mas podemos erguer--nos acima de tudo isso se nos reconhecermos como uma parteindispensável de todo este universo e tentarmos compreendero nosso parentesco com as estrelas. Não nos podemos esque-cer de que todos somos feitos de poeira estelar. Essa afinidadenunca poderá ser quebrada.

Uma palavra final: se viemos realmente da mesma fonteque fez com que o universo exista, como poderíamos descrevê--la? Do que será feita? De onde terá vindo? A derradeira mis-são é investigar estas perguntas, algo que imagino vá daralgum trabalho. É um trabalho duro, mas asseguro-vos queassim que alguém aceitar o caso, nunca mais terá vontade dedesistir.

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o DETECTIVE DO COSMOS: DESVENDANDO OS MIST~RIOS DO UNIVERSO I MANI BHAUMIK; INTROD. EDGAR MITCHELL ; TRAD.PEDRO COTRIM ; REV. CIENT. MÁXIMO FERREIRA

AUTOR(ES):

EDiÇÃO:

PUBLICAÇÃO:

DESCR. FfSICA:

COLECÇÃO:

NOTAS:

ISBN:

Bhaumik, Mani; Mitchell, Edgar, pret.; Ferreira, Máximo, revisor; Cotrim, Pedro, trad.

1a ed

Lisboa: Gradiva, 2009107 p. [36] p. il. : il. ; 22 cm

[Fora de colecção; 315]

Til. orig.: The cosmic detective

978-989-616-320-4