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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA LINHA DE PESQUISA: PLANEJAMENTO, FORMAÇÃO E AVALIAÇÃO EM SAÚDE MIRIAM FIGUEIRA REIS A HOMEOPATIA E A INTEGRALIDADE DO CUIDADO DE INDIVÍDUOS PORTADORES DE HEPATITE C CRÔNICA NITERÓI ABRIL DE 2013

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA

LINHA DE PESQUISA: PLANEJAMENTO, FORMAÇÃO E AVALIAÇÃO EM

SAÚDE

MIRIAM FIGUEIRA REIS

A HOMEOPATIA E A INTEGRALIDADE DO CUIDADO DE INDIVÍDUOS

PORTADORES DE HEPATITE C CRÔNICA

NITERÓI

ABRIL DE 2013

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MIRIAM FIGUEIRA REIS

A HOMEOPATIA E A INTEGRALIDADE DO CUIDADO DE INDIVÍDUOS

PORTADORES DE HEPATITE C CRÔNICA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Saúde Coletiva do Instituto de

Saúde da Comunidade da Universidade Federal

Fluminense como requisito parcial para

obtenção do grau de mestre em saúde coletiva.

Orientador: Profª. Drª. Maria Inês Nogueira

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R375

Reis, Miriam Figueira

A homeopatia e a integralidade do

cuidado de indivíduos portadores de

hepatite C crônica / Miriam Figueira

Reis. – Niterói : [s.n.], 2013.

142 f.

Orientador:Maria Inês Nogueira.

Dissertação(Mestrado em Saúde Coletiva) – Universidade

Federal Fluminense, Faculdade de Medicina, 2013.

1. Hepatite C crônica. 2. Homeopatia.

I. Titulo.

CDD

616.3623

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Ao Prof. Romeu Carillo Jr .

e Participantes do Gênesis

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AGRADECIMENTOS

À Clarissa Reis do Valle, minha filha, obrigada por compartilhar amor, luz, alegria e

esperança, cotidianamente.

Aos meus amados pais Paulo Roberto e Arésia Maria Reis, dos quais internalizei

valores que norteiam minhas ações. Marília e Mariana Reis, minhas queridas irmã e sobrinha,

que trazem os ventos do planalto e brincam com nossa “cidade empilhada”.

Ao Prof. Romeu Carillo Jr. por sua dedicação ao estudo da Homeopatia e

generosidade ao nos brindar com suas descobertas.

Aos participantes do Gênesis, por sua ousadia em buscar a cura para o sofrimento.

Agradeço especialmente a Maria Cândida Gouveia Pita, Osmar Meirelles e Maria

Emília Marinho, pela fortaleza e solidariedade constantes, incentivando e oferecendo suporte

aos parceiros de caminhada, entre os quais me incluo.

Aos demais integrantes da Associação Brasileira de Reciclagem e Assistência em

Homeopatia (ABRAH) especialmente a Domingos José Vaz do Cabo, parceiro da pesquisa

anterior, ponto de partida para o presente estudo e Ana Marta de Sousa Cavalcanti cujo

entusiasmo trouxe o convênio com a Universidade.

A Cláudia Mullé, Elizabete Ecard, Paulo Henrique Novaes, Jurema Mello e Rita

Castellar, obrigada.

À Martha Freire amiga sempre presente nos momentos de alegria, dificuldades e

decisões, obrigada pelo ombro amigo e por clarear o melhor caminho.

À Anna Alice Mendes pela humanidade, desprendimento, generosidade com que

sempre me acolheu, trazendo o essencial ao primeiro plano.

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Aos Professores do Mestrado que me fizeram observar o cotidiano através do

estranhamento necessário para compreendê-lo e aos colegas pela vivência dos trabalhos em

equipe.

Aos Integrantes das Comissões Examinadoras de Qualificação e Defesa dessa

Dissertação, Profs. Kenneth Camargo Jr., Walcymar Estrêla, Anna Alice Mendes e Maria

Martha de Luna Freire cujas preciosas contribuições me ajudaram a encontrar o foco e o tom

para o desenvolvimento desse estudo.

E igualmente gratidão à Maria Inês Nogueira cujo zelo, disciplina e arte, ajudaram a

traduzir essa experiência em comunicação escrita. Sem você não teria sido possível.

Obrigada!

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MIRIAM FIGUEIRA REIS

A HOMEOPATIA E A INTEGRALIDADE DO CUIDADO DE INDIVÍDUOS

PORTADORES DE HEPATITE C CRÔNICA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva do Instituto

de Saúde da Comunidade da Universidade Federal Fluminense como requisito parcial para

obtenção do grau de mestre em saúde coletiva.

Aprovada em 29 de abril de 2013.

COMISSÃO EXAMINADORA

____________________________________________ PROFª. DRª. MARIA INÊS NOGUEIRA

Universidade Federal Fluminense

_____________________________________________ PROFª DRª WALCYMAR LEONEL ESTRÊLA

Secretaria Municipal de Saúde / JF

____________________________________________ PROFª DRª ANNA ALICE MENDES

Universidade Federal Fluminense

____________________________________________ PROFª DRª MARIA MARTHA DE LUNA FREIRE

Universidade Federal Fluminense

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RESUMO

No ano de 2011 cerca de 200 milhões de pessoas no mundo foram diagnosticadas como portadoras de Hepatite C Crônica, que é a principal causa de cirrose hepática no Brasil. Em 2008, a coordenação do Grupo Gênesis de Niterói, ONG de Apoio aos Portadores de Hepatite, solicitou atendimento para os seus integrantes à Associação Brasileira de Reciclagem e Assistência em Homeopatia (ABRAH), com funcionamento ambulatorial no Hospital Universitário Antonio Pedro. Esses indivíduos apresentavam contraindicação ao tratamento oferecido pelo Serviço de Hepatologia do HUAP devido aos efeitos colaterais dos medicamentos e por não terem atingido critérios de cura ao final da terapêutica. Assim, a partir da pesquisa “Avaliação do Tratamento Homeopático em Pacientes Portadores de Hepatite C”, delineou-se o presente estudo qualitativo com análise dos relatos contidos nos prontuários de indivíduos que participaram da mesma durante os primeiros quatorze meses de atendimento. Dentre os referenciais teóricos utilizados neste estudo, destacamos a categoria Racionalidade Médica, elaborada por Luz, os estudos de Carillo Jr. sobre a Homeopatia, e as discussões propostas pela área da Saúde Coletiva sobre Cuidado e Integralidade. Os objetivos principais que nortearam a condução dessa pesquisa foram os seguintes: estabelecer paralelos entre a racionalidade médica homeopática e o conceito de Integralidade; dimensionar os aspectos subjetivos presentes na abordagem homeopática; discutir o tratamento do indivíduo portador de Hepatite C Crônica pela Homeopatia Sistêmica através do critério de suscetibilidade como determinante da cronicidade. Sob a ótica das quatro categorias analíticas utilizadas – adesão, resgate da subjetividade, autonomia e mudança de dinâmica vital – verificamos que o tratamento homeopático foi efetivo para a maioria dos indivíduos participantes dessa pesquisa. Concluímos, então, que esse estudo trouxe à tona as potencialidades e as especificidades proporcionadas pela Homeopatia Sistêmica para o cuidado e o alívio do sofrimento das pessoas portadoras de Hepatite C Crônica.

Palavras-chave: Homeopatia. Integralidade. Cuidado. Hepatite C.

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ABSTRACT

In the year of 2011, about 200 million people worldwide were diagnosed as carriers of the Chronic Type C Hepatitis virus, which is the main cause of hepatic cirrhosis in Brazil. In 2008, the management of the Grupo Gênesis, in Niterói, a Hepatitis Carriers Aid NGO, asked the Associação Brasileira de Reciclagem e Assistência em Homeopatia (ABRAH), that functions within the capacities of the Hospital Universitário Antônio Pedro (HUAP), for treatment of their members. These individuals had contraindication to the therapy offered by the Hepatology Service of the HUAP due to presenting side effects to the medication and not managing to achieve the healing criteria by the end of the treatment. Therefore, starting with the research “Avaliação do Tratamento Homeopático em Pacientes Portadores de Hepatite C”, this qualitative study ‒ an analysis of the accounts contained in the medical records of the individuals who participated in the latter during the first fourteen months of treatment ‒ was outlined. Among the theoretical groundwork used in this study, we emphasize the Medical Rationalities, elaborated by Luz, Carillo Jr.’s studies on Homeopathy and the discussions proposed by the Public Health field concerning Care and Integrality. The main points that guided the conduction of this research were the following: to establish parallels between the homeopathic medical rationalities and the concept of Integrality; to observe the subjective aspects existing in the homeopathic approach; to discuss the treatment of Chronic Type C Hepatitis patients using the Systemic Homeopathy method through susceptibility criteria as a chronicity determinative. From the standpoint of the four analytical categories used ‒ adhesion, to recover of subjectivity, autonomy and change of the vital dynamics ‒ it was verified that the homeopathic therapy was effective for the majority of the individuals participating in the research. Therefore, we conclude that this study brought up the possibilities and the specificities provided by the Systemic Homeopathy for the care and relief of the suffering of those who carry the Chronic Type C Hepatitis.

Key words: Homeopathy. Integrality. Care. Type C Hepatitis

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 10 2 RACIONALIDADE CIENTÍFICA MODERNA E BIOMEDICINA....................... 12 3 HAHNEMANN, A HOMEOPATIA e CONTRIBUIÇÕES DE CARILLO JR..... 22

4 HOMEOPATIA E INTEGRALIDADE....................................................................... 37 5 ABORDAGENS DA HEPATITE C CRÔNICA.......................................................... 47 6 JUSTIFICATIVA ........................................................................................................... 63

7 OBJETIVOS .................................................................................................................. 67

8 METODOLOGIA ........................................................................................................ 68

9 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS........................................ 72

10 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 130

REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 133

ANEXO I ...................................................................................................................... 138

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1 INTRODUÇÃO

A discussão sobre o cuidado clínico aos sujeitos que sofrem está subordinada ao

paradigma que norteia a compreensão sobre o processo saúde – doença. Assim quando se

considera que a doença se restringe às lesões orgânicas – concretas - os sintomas subjetivos e

os sintomas indefinidos tornam-se apartados do campo de atuação médica.

No entanto a expectativa do indivíduo sofredor é de que ele seja acolhido,

compreendido, contemplado em suas necessidades, e tenha sua saúde restabelecida pela ajuda

do profissional que o recebe (TESSER; LUZ, 2008)

Balint (1984) argumenta que a relação médico-paciente é integrante da terapêutica

ministrada ao indivíduo. Madel Luz (1996) afirma que “...em qualquer sistema médico,

independentemente de sua racionalidade, grande parte de sua eficácia está condicionada ao

desempenho do terapeuta”. Dessa maneira a relação médico-paciente deveria ser

instrumentalizada por uma tecnologia que fornecesse ao médico subsídios para que o mesmo

lide com a dimensão dialógica desse encontro, dentro de um contexto diagnóstico e

terapêutico.

Nogueira (2010) argumenta que as medicinas vitalistas favorecem o resgate da

subjetividade na prática clínica. De acordo com Luz (2005), a Homeopatia tem na relação

médico-paciente um elemento fundamental da terapêutica.

Se a Homeopatia Sistêmica atende aos requisitos da proposta de cuidado integral do

indivíduo portador de hepatite C crônica é a principal questão que o presente estudo buscou

responder. A abordagem dessa questão se deu através da discussão sobre a integralidade do

cuidado oferecido pela Homeopatia.

Para tanto, este estudo se propõe a analisar os discursos de indivíduos que

participaram de uma pesquisa anterior “Tratamento Homeopático de Portadores de Hepatite C

Crônica” (2009) através das categorias “adesão ao tratamento”, “resgate da subjetividade”,

“autonomia”, “mudança de dinâmica vital”. A história dessa pesquisa, campo para o estudo

atual, é brevemente relatada a seguir.

Em novembro de 2008 o Sr. Osmar Meirelles, com a anuência da Sra. Maria Cândida

Gouveia Pita coordenadora do Grupo Gênesis – Organização Não Governamental (ONG) de

apoio aos portadores do Vírus da Hepatite C (VHC) – solicitou atendimento homeopático

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aos coordenadores do ambulatório da Associação Brasileira de Reciclagem e Assistência em

Homeopatia (ABRAH) no Hospital Universitário Antonio Pedro (HUAP) para integrantes da

ONG que apresentavam contra-indicação à continuidade do tratamento oferecido pelo

Serviço de Hepatologia do HUAP, fosse por efeitos colaterais dos medicamentos ou por não

terem atingido critérios de cura ao final da terapêutica.

A ABRAH, cujo presidente é o Dr. Romeu Carillo Jr1., acolheu o pedido, e os

atendimentos foram iniciados através dos médicos Míriam Figueira Reis2– autora do presente

estudo – e Domingos José Vaz do Cabo3, supervisionados pelos Drs. Romeu Carillo Jr e

Maria Solange Gosik4 tendo como supervisora de análise dos dados coletados a Dra. Anna

Alice Mendes Schroeder5

Os referidos atendimentos, com a concordância da chefe do Serviço de Hepatologia do

Hospital Universitário Antonio Pedro, Dra. Eliane Bordallo, foram sistematizados sob a forma

de um projeto de pesquisa. Esse foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em

dezembro de 2009 e teve como objetivo a avaliação dos efeitos do tratamento homeopático

em indivíduos com hepatite C crônica na parceria da ABRAH com o Hospital Universitário

Antonio Pedro e a Universidade Federal Fluminense (HUAP/UFF), através da Profa. Anna

Alice Mendes Schroeder do Departamento de Saúde e Sociedade. Nos resultados preliminares

correspondentes aos primeiros 14 meses dessa pesquisa já se pode verificar melhoria clínica

observada através de sinais, sintomas e dosagens laboratoriais de enzimas hepáticas, conforme

descrição no capítulo sete.

Para o desenvolvimento do tema dessa dissertação, no capítulo dois discutiremos a

Racionalidade Científica Moderna e a Biomedicina; no capítulo três Hahnemann,

Homeopatia e contribuições de Carillo Jr. à Homeopatia, denominada Homeopatia Sistêmica;

no capítulo quatro, a Homeopatia e a Integralidade; no cinco discutiremos a epidemiologia da

Hepatite C Crônica e a avaliação do tratamento de um grupo de portadores da doença pela

1 Presidente da ABRAH, Mestre em Morfologia Aplicada pela Universidade da Cidade de São Paulo, especialista em Homeopatia e Ortopedia; coordenador e orientador dos cursos de Formação de Especialistas em Homeopatia e Pós Graduação em Homeopatia Contemporânea do HSPM-SP, Chefe da Clínica de Homeopatia do Hospital do Servidor Público Municipal de São Paulo. 2 Médica Homeopata, professora do Curso de Formação e Atualização de Especialistas em Homeopatia da ABRAH, mestranda no Programa de Pós Graduação em Saúde Coletiva da UFF . 3 Médico Homeopata e Pediatra, professor do Curso de Formação e Atualização de Especialistas em Homeopatia da ABRAH, mestrando da Saúde Coletiva da Ensp/ Fiocruz. 4 Médica Especialista em Homeopatia e Pediatria, Coordenadora Geral dos Cursos de Formação e Atualização de Especialistas em Homeopatia da ABRAH. 5 Professora Adjunta do Departamento de Saúde e Sociedade da UFF, doutora em Saúde Coletiva, Médica Homeopata.

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Homeopatia Sistêmica, com ênfase na redução da suscetibilidade biopsíquica desses

indivíduos às ações deletérias do Vírus da Hepatite C. No capítulo seis, justifica-se o presente

estudo pela necessidade de se instrumentalizar o médico para uma abordagem resolutiva

durante o acolhimento das necessidades do indivíduo que o procura em seus sofrimentos,

ampliando sua capacidade diagnóstica-terapêutica na arte do encontro.

O capítulo sete pontua como objetivo geral discutir a potencialidade da Homeopatia no

tratamento dos indivíduos portadores de Hepatite C Crônica com enfoque no cuidado integral

desses sujeitos, tendo como objetivos específicos o estabelecimento de paralelos entre o

conceito de Integralidade e a abordagem da Homeopatia Sistêmica; dimensionar os aspectos

subjetivos presentes na abordagem homeopática e, finalmente, demonstrar o raciocínio

terapêutico homeopático, centrado no tratamento da suscetibilidade individual ao

desenvolvimento da Hepatite C Crônica.

O capítulo oito discorre sobre a metodologia qualitativa utilizada, com “análise de

conteúdo” (BARDIN, 1979 apud GOMES, 2009) dos discursos contidos nos prontuários dos

participantes da pesquisa que embasou o presente estudo e que deram sua permissão para a

realização do mesmo. No capítulo nove encontram-se a apresentação e discussão dos

resultados. O capítulo dez contém as considerações finais.

Seguem-se as referências utilizadas e o anexo.

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2 RACIONALIDADE CIENTÍFICA MODERNA E BIOMEDICINA

2.1 A RACIONALIDADE CIENTÍFICA MODERNA

Madel Luz (1987) considerou como marco inicial da racionalidade científica moderna

o período do Renascimento, século XVI, quando o indivíduo foi considerado como “força

criativa independente” em oposição aos conceitos e costumes da Idade Média. Durante esse

período, a teologia e as instituições católicas impediam o pensamento, a criação e ações

humanas. Persistiam contudo no Renascimento, conceitos medievalistas de busca da

harmonia, sendo a “inteligência divina” a promotora da ordenação cósmica (LUZ, 1987).

Com a metodologia científica6, o experimentalismo foi instituído como norma de

validação do “real” e “verdadeiro” a partir da observação objetiva dos fenômenos naturais

dentro de condições controladas (LUZ, 1987) 7. No entanto, “...dificilmente as observações de

laboratório podem ser transpostas diretamente para situações reais, uma vez que um

laboratório é algo bastante diverso de um ambiente ‘normal’ (CAMARGO JR., 2003 p. 74).

A natureza passou a ser percebida como “coisa” externa ao homem o qual seria seu

proprietário e representada como um conjunto de máquinas. Assim supunha-se que a natureza

seria subjugada, pois suas leis de funcionamento seriam expostas pela Razão, possibilitando

seu controle. As “evidências empíricas” e “significados racionais” eram encaixados “uns nos

outros, [...] como quebra-cabeças” (LUZ, 1987).

Descartes (1596-1650) considerou o dogma da razão como única produtora de

conhecimento (LUZ, 1987, p. 43), tornando tudo o que não pertencesse ao racional - artes,

política, moral, imaginação, fé, sentimentos, sentidos, paixões, vontade - fonte impura para o

conhecimento. Cores, cheiros, não sendo concretos, mensuráveis, não poderiam ser

6 “Supõe-se no racionalismo que as teorias e os conceitos são o fruto da correta aplicação da razão ao objeto,

ratificados (ou retificados) por experiências controladas, num circuito metódico de intuição (ou percepção) intelectual – dedução – observação, que funciona como um mecanismo perfeitamente regulado” (LUZ, 1987, p. 45).

7 O conhecimento produzido em condições controladas no laboratório são transferidos ainda hoje, “sem tradução” , para o cotidiano das pessoas (CAMARGO JR. , 2003).

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analisados, sendo então descartados. Desse modo a ciência se pautou na razão depurada dos

sentidos, dos sentimentos ou seja, na “razão des-subjetivada” (LUZ, 1987).

De acordo com Luz, as implicações desse “imaginário científico” para a medicina

foram profundas. As rupturas dualistas matéria-espírito; objeto-sujeito; qualidade-quantidade;

natureza-homem; corpo-alma; sentidos-razão; organismo-mente; paixões-vontade, levaram à

“fragmentação do sujeito”, originando “objetividades discursivas especializadas” – as

disciplinas científicas - que são sistemas de produção de verdades sem possibilidade de

síntese teórica entre elas (LUZ, 1987).

Construiu-se um sistema classificatório para os males específicos que poderiam

danificar ou destruir a “máquina”, símbolo do corpo visto como “obra de engenharia em

movimento” (LUZ, 1987).

Assim, a observação, a descrição e classificação e a busca de ‘causas eficientes’ (explicação em termos de antecedente-consequente) das doenças no corpo humano constituem o objeto fundamental de conhecimento da medicina moderna. Por outro lado, o conhecimento anatomo-patológico dos órgãos, tecidos e sistemas componentes do organismo humano, enquanto sedes das doenças, é também objeto de conhecimento, na medida em que é neste organismo que trabalham as doenças e o conhecimento que sobre elas se constrói (LUZ, 1987, p. 101).

A medicina se instaurará com um discurso sobre objetividades com “as categorias:

doença, entidade mórbida, corpo, organismo, fato patológico, lesão, sintoma”. A doença e o

corpo seriam os temas científicos. Vida, saúde e cura deixam de ser tematizáveis, definindo-se

a saúde como eliminação da doença do corpo do indivíduo. A medicina tornou-se a ciência

das doenças (LUZ, 1987).

De forma similar, Camargo Jr. (2003) discorre sobre a construção da “teoria das

doenças”:

A “teoria das doenças” torna-se o eixo principal da “teoria da medicina”.[...] O saber médico é um saber sobre a doença, não sobre o homem, o qual só interessa ao médico, enquanto terreno onde a doença evolui [...] ... a construção das doenças como categorias teve de ser feita excluindo-se os indivíduos acometidos; tal exclusão repete-se a cada instante na elaboração do diagnóstico das pessoas que buscam auxílio médico (CAMARGO JR., 2003 p.79- 80).

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Assim a vida presente no homem doente tornou-se “fonte de confusão e des-

conhecimento”, apesar da medicina ter como “campo de objetivações o viver e o sofrer

humanos” (LUZ, 1987).

Nos séculos XVII e XVIII as epidemias de peste, guerras, alcoolismo, prostituição,

doenças venéreas, fome, miséria, execuções do Santo Ofício deram à sociedade a imagem de

degenerescência - fonte de doença moral e física. Esse quadro levou ao desenvolvimento de

um “pacto social” em que as teorias sociais preconizam instituições perfeitas como

necessárias para direcionar o “como ser”, com modelos higienistas moralizadores, dando

origem à “Polícia Médica” (LUZ, 1987).

A anatomia e a patologia tornaram-se as bases da clínica moderna e o modelo

explicativo do adoecer seguiu a metáfora da invasão, de guerra, com penetração e

interiorização do mal no organismo e transmissão do agente patológico. Para se vencer essa

guerra, os remédios passaram a ser testados nos doentes e utilizados ( LUZ, 1987).

Conforme Canguilhem (CANGUILHEM apud LUZ, 1987, p. 111) teríamos duas

concepções de medicina: “organicista, localizante, mecanicista”, que ainda hoje mantém-se

hegemônica e a “concepção naturista, na maioria das vezes vitalista”, dinâmica, considerada

como metafísica.

A concepção naturista - vitalista, tem o seguinte pressuposto: quando as forças vitais

do homem estão em equilíbrio ou harmonia, temos a saúde; e quando estão em desequilíbrio,

demonstrado por sinais e sintomas, temos o adoecimento, cujas manifestações significariam

um esforço do organismo “em busca de um novo ponto de equilíbrio”. Assim a definição de

saúde atenderia “a critérios positivos de normalidade”, principalmente nas correntes vitalistas

e naturistas da segunda metade do século XVIII (LUZ, 1987).

Sendo assim, conforme sugere Luz (1987), o postulado ontológico da vida e da saúde

como equilíbrio das forças vitais, fica sem espaço na racionalidade médica moderna, que pode

ser definida como uma “disciplina da Doença”.

Mais uma vez, segundo Luz (1987) no século XIX, “evolucionismo, mecanicismo e

organicismo” serão os traços constitutivos da racionalidade moderna. Esse é o século da

industrialização, da grande revolução científica dos laboratórios (LUZ, 1987).

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Camargo Jr. (2003) pondera que além das raízes históricas que nos ajudarão a entender

a medicina de hoje, deve-se avaliar o próprio ato médico em seus três aspectos principais: a

busca pela atenção médica, a prática médica e o saber que a informa (CAMARGO JR., 2003).

Esses aspectos serão melhor avaliados na próxima seção.

2.2 A BIOMEDICINA

Boa parte dos equívocos da medicina ocidental prende-se precisamente ao fato de ter se deixado dominar pela miragem da técnica onipotente, pondo de lado tudo o que, por ser subjetivo, mutável, complexo, infinitamente variável não é científico – precisamente os atributos que talvez melhor caracterizem nossa humanidade (CAMARGO JR., 2003, p. 53).

... ao se reduzir completamente a experiência do sofrimento ao domínio biológico, [...] (se exclui) precisamente tal sofrimento, origem do pedido do cuidado por quem sofre, como lembra Blank (1985) (CAMARGO JR., 2003, p. 33).

Blank (1985:11) enfatiza que “o ponto de partida da medicina, tanto historicamente

quanto a cada nova consulta, é o SOFRIMENTO8, o que determina como dever ético

primordial a atenção à terapêutica, para “aliviar sempre, curar quando for possível”

(CAMARGO JR., 2003, p. 33,67,78).

Há, no entanto, no círculo de produção do saber médico, a “objetividade” como

fundamento, considerando-se a lesão como equivalente à doença. Para que a doença seja

caracterizada de forma precisa e estudada em suas manifestações e causalidade, a

epidemiologia é agregada à clínica, mas a epidemiologia também prioriza o biológico e

permanecem os conceitos da mecânica clássica, ou seja, o caráter generalizante (não se

ocupando de casos individualizáveis), mecanicista e analítico (CAMARGO JR., 2003).

A crítica a esse modelo de construção do conhecimento médico se torna ainda mais

contundente, quando se acessa o estudo “A Medicina entre a Ciência e o Cuidado: uma leitura

de revistas de medicina (1990-2009)”, de autoria de Schroeder (2010), que pesquisou

publicações em revistas médicas no período de 1990 a 2009, com intuito de compreender a

8 Grifo do autor

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insatisfação do médico com o distanciamento entre sua prática e a imagem idealizada de

“médico sacerdote” e “médico cientista”, decorrente de contradições entre o conhecimento

disponível para que ele efetue seu trabalho e o que se exige para a prática médica

humanizada, de cuidado ao indivíduo doente.

Então, o conhecimento hegemônico acerca do processo saúde-doença, que busca a

objetividade e cientificidade, determinando “o caráter generalizante (não se ocupando de

casos individualizáveis), mecanicista e analítico”(CAMARGO JR, 2003), estrutura o que

Ludwig Fleck denominou “estilo de pensamento”9 do coletivo biomédico, no qual o saber

“de ponta” desenvolvido em seus diversos núcleos de especializações, dificulta ao terapeuta

corresponder às expectativas do doente que “espera ser ele mesmo o objeto da atenção do

curador” (TESSER e LUZ, 2006). Soma-se a isso o fato de que “o encaminhamento a uma

infinidade de especialistas dilui a relação (médico-paciente)”, levando à “relação instituição

médica – doença, em que a subjetividade de ambos os pólos – médico e paciente – é negada”

(CLAVREUL apud CAMARGO JR., 2003) o que reafirma o distanciamento entre o cuidador

e o indivíduo que sofre.

Camargo Jr. (2003) faz a distinção entre a experiência da doença para o paciente e o

olhar médico sobre a doença:

Para o paciente, a experiência da doença (sofrimento)10 é um fato concreto,

incapacitante de uma forma que transcende sua capacidade de auto cuidado,

tornando necessária a intervenção do especialista. Para o médico, o sofrimento é

irrelevante, e o paciente fonte de distorções (CAMARGO JR., 2003 p. 78).

O alento à procura por soluções para essa dicotomia estabelecida na medicina

moderna, entre seus aspectos constitutivos de saber teórico versus a capacidade de atender à

demanda dos indivíduos que sofrem, foi o encontrado no próprio discurso da biomedicina por

Camargo Jr. (2003): ela se auto-define nos livros de referência adotados nas escolas médicas,

9 “ ‘Estilo de pensamento’: instância cognitiva, psicológica e sociológica a orientar e restringir o pensamento e as percepções, as práticas e as teorias, as indagações e as respostas dos membros de um coletivo que o compartilham” (TESSER E LUZ, 2006, p. 196).

10Grifos do autor.

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além de artigos, como sendo “ciência e arte”, demonstrando que o discurso biomédico admite

que a ciência não seja tudo (CAMARGO JR. , 2003).

Camargo Jr. (2003) ao estudar o campo teórico da biomedicina, conclui que ela utiliza

como referencial único de verdade a Ciência, considerando-se a si mesma como a

“verdadeira” medicina.

O Ocidente industrializado tem na ciência seu referencial último de verdade. A descrição científica define o real; segue-se portanto que a ‘verdadeira’ medicina é necessariamente científica (CAMARGO JR., 2003 p. 17).

Segundo Luz (1987), na racionalidade moderna apenas o caminho (método científico)

a ser trilhado na construção das verdades deve ser perene 11, o que a leva a questionar o

processo de produção de “enunciados de verdade”, na ciência:

A racionalidade científica moderna seria um “regime específico de produção de enunciados de verdade que variam, se alteram, se desmentem uns aos outros sucessivamente, se substituindo, se superando, no qual as regras da produção são mais importantes, [...] que sua ‘veracidade’ enquanto tal” (LUZ, 1987, p. 36).

De acordo com a autora citada, a “mutabilidade das verdades” possibilitaria a

“produção permanente de novas verdades” que levariam à impressão de progresso da nova

racionalidade”, “o que define a racionalidade moderna como científica” (LUZ, 1987).

Consequentemente, como afirma Camargo Jr. (2003): “no imaginário social médico,

‘novo’ é necessariamente melhor”. Desse modo, os médicos sentem-se compelidos a “...

11

[...] a doença como categoria reificada, representa um tipo ideal (no sentido weberiano do termo), portanto genérico. O paciente é, por definição, INDIVÍDUO, e por isso sujeito a uma variabilidade infinita. Assim, enquanto o saber médico discursa sobre o coletivo, atua concretamente sobre o individual. A lacuna entre esses dois universos é preenchida pela experiência, o que implica de antemão a exclusão do método” (CAMARGO JR. , 2003 p. 79).

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19

manter(em)-se atualizados sobre os últimos desenvolvimentos do conhecimento médico”

(CAMARGO JR., 2003, p. 161).

Com a enorme quantidade de informação nova disponível, proveniente de variadas

fontes, o critério de seleção da informação torna-se imprescindível. Novamente, o método

científico é trocado pela intuição e experiência do médico sobre o que buscar, em que

informações confiar e o que valorizar nos textos, no escasso período de tempo permitido pela

carga horária intensa de trabalho (CAMARGO JR. 2003).

Provavelmente o método utilizado pelos médicos é o “reconhecimento de padrões”

(SACKETT et al, 1991, apud CAMARGO JR. 2003, p.175), similar ao método utilizado ao

estabelecerem o diagnóstico do doente, quando eles rapidamente selecionam certos

elementos, reconstruindo-os numa Gestalt (CAMARGO JR. 2003). A sensação de que o

conhecimento nunca é suficiente, persiste entre os médicos que atuam conforme a

biomedicina. Entretanto, questionamentos trazidos por Camargo Jr. sobre se há de fato tantas

inovações ou se o que existe seria uma estratégia de marketing determinada pelo mercado por

razões econômicas, levaram-no a considerar que a produção e difusão do conhecimento

médico é um problema de saúde pública (CAMARGO JR. 2003).

Na polêmica discussão sobre medicina e ciência, Camargo Jr.(2003) cita Canguillem

(1982:185)

Ora, a clínica não é uma ciência e jamais o será, mesmo que utilize meios cuja

eficácia seja cada vez mais garantida cientificamente. A clínica é inseparável da

terapêutica e a terapêutica é uma técnica de instauração ou de restauração do

normal, cujo fim escapou à jurisdição do saber objetivo, pois é a satisfação

subjetiva de saber que uma norma está instaurada” (Canguillem, 1982:185)12.

Camargo Jr (2003) conclui que aspectos fundamentais da eficácia terapêutica serão

excluídos, se houver subordinação da terapêutica aos valores da ciência e argumenta que a

terapêutica eficaz, depende tanto da “eficácia material”, na qual se inclui a medicação, quanto

da “eficácia simbólica” que será abordada a seguir.

12 Grifo do autor.

Page 21: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

20

A “eficácia simbólica” se refere ao poder terapêutico dos símbolos culturais,

compartilhados por terapeutas e seus clientes durante a consulta: a roupa branca, olhares,

gestos, perguntas, têm um profundo significado simbólico e possibilitam o uso de doses

menores de medicamentos, reduzem efeitos colaterais, e garantem a adesão dos pacientes ao

tratamento proposto (CAMARGO JR. , 2003).

Segundo Balint (1984) a relação médico-paciente é integrante da terapêutica

ministrada ao paciente. O autor chega a afirmar que “o remédio mais usado em medicina é o

próprio médico”.

Igualmente, Madel Luz (1996) afirma que “...em qualquer sistema médico,

independentemente de sua racionalidade, grande parte de sua eficácia está condicionada ao

desempenho do terapeuta”.

Sendo assim, acreditamos que essa relação deveria ser instrumentalizada por uma

tecnologia leve13, capaz de fornecer ao médico subsídios para que ele lide de forma resolutiva

com a dimensão dialógica da terapêutica. No entanto, em trabalho de campo com equipes de

saúde da família, Capozzolo (2006) percebeu profissionais médicos com dificuldades de uma

escuta ampliada voltada ao fortalecimento do sujeito, nos quais se percebe a “formação de

profissionais de saúde sem recursos tecnológicos para a escuta e afirmação dos usuários...”

(CECCIM, CAPOZZOLO, 2006, p. 357).

Agravando-se ainda mais esse quadro, seguem-se os encaminhamentos excessivos a

diversos especialistas.

Então se percebe na biomedicina, uma valorização maior do “projeto científico de

estudo das doenças do que do projeto ético da terapêutica”, demonstrada através das seguintes

considerações de Camargo Jr.(2003, p.132):

- “é digna de nota a inexistência da disciplina terapêutica em várias escolas médicas”;

- há uma solicitação excessiva de exames complementares;

- não há princípios gerais de orientação para as intervenções, que poderão ser várias,

mas na prática apenas a intervenção medicamentosa e cirúrgica são consideradas

terapêutica real;

13 Merhy(2002): dentre as tecnologias envolvidas no trabalho em saúde, as leves se referem às tecnologias de relações – “produtoras de vínculo, autonomização, acolhimento, gestão como forma de governar processos de trabalho”.

Page 22: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

21

- “tudo o que se refere à subjetividade, ao imaginário é posto de lado como não

científico, sendo objeto de farmacologização tão maciça quanto cega – sempre em

nome da ciência”, e consequentemente há uma “propensão iatrogênica intrínseca”.

(CAMARGO JR., 2003, p. 77)

Page 23: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

22

3 HAHNEMANN, HOMEOPATIA E CONTRIBUIÇÕES DE CARILLO JR.

No final do século XVIII e início do XIX, Samuel Hahnemann (1755-1843) funda a

Homeopatia, um sistema médico vitalista. O vitalismo homeopático tendo como pressuposto

teórico o equilíbrio (ou desequilíbrio) da “força vital” do indivíduo, apresentou-se:

... como sistema racional e experimentalista da arte de curar doentes. O indivíduo doente é portanto, o ponto de partida clínico e o objeto epistemológico básico do sistema homeopático. [...] A homeopatia é desta forma, no início do século XIX, um sistema médico centrado na concepção e na observação da vida, através do seu princípio – força vital – manifestado nos seus desequilíbrios – eventos mórbidos” (LUZ, 1987, p. 136-139).

Hahnemann, médico alemão, poliglota14, iniciou seus estudos na segunda metade do

século XVIII. A discussão presente em sua época com a ascensão da racionalidade médica

científica em oposição aos conceitos tanto da época medieval – quando se preconizava que

seria possível a harmonia através da inteligência divina - quanto das “correntes filosóficas

espiritualistas românticas, de origem racionalista” (LUZ, 1987), ampliou a capacidade de

observação e síntese de Hahnemann.

Assim, para formular sua teoria, Hahnemann associou suas observações clínicas ao

conhecimento obtido através de diversas fontes médicas, como textos escritos em vários

idiomas e o conceito vitalista da Faculdade de Medicina de Montpellier15.

No “Organon da Ciência Médica Racional”, publicado por Hahnemann em 1810, e

em sua segunda edição de 1818 (seguiram-se quatro edições), conhecida como “Organon da

Arte de Curar”. Nessa obra, Hahnemann expôs a doutrina homeopática.

Sua obra é composta de 291 parágrafos, com estilo sistemático, ordenado e metódico.

Pustiglione e Carillo Jr. editaram em 1994 sua versão comentada do “Organon” - utilizada no

presente trabalho - que traduziram para o português agregando seus comentários, o que

14Falava e lia alemão, inglês, francês, espanhol, latim, árabe, grego, hebreu, caldeu, que lhe possibilitou, no início de sua vida profissional, sobreviver fazendo traduções (ww w.homeopatiaveterinaria.com.br/hahnemann.htm). 15 Faculdade de Medicina de Montpellier : o vitalismo tem sido fortemente associado à medicina setecentista de Montpellier e, particularmente, às idéias de Paul-Joseph Barthez (1734-1806) ( Waisse S, Amaral MTCG, Alfonso-Goldfarb AM, 2011).

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23

possibilitou aos estudantes e médicos homeopatas, uma compreensão maior da obra de

Hahnemann (PUSTIGLIONE, CARILLO JR, 1994).

Os métodos utilizados por Hahnemann para construir sua doutrina foram o

fenomenológico, através da experimentação de substâncias no homem são e sensível, e o

construtivista, através do suporte teórico do vitalismo (CARILLO JR., 1999).

2.3 MÉTODO FENOMENOLÓGICO: EXPERIMENTAÇÃO NO HOMEM SÃO E

SENSÍVEL

Ao traduzir a matéria médica de Cullen e discordar das hipóteses explicativas para a

atuação da China officinalis sobre a malária16, Hahnemann ingeriu o chá produzido com o

córtex do tronco dessa árvore em 1790. Desenvolveu então sintomas similares àquela doença

(KEUSSEYAN, 2010).

Percebeu que se houvesse concordância entre os quadros clínicos de doenças e os

sintomas desenvolvidos por ingestão de substâncias tradicionalmente utilizadas para curá-las,

ele teria descoberto como utilizar na prática a “Lei dos Semelhantes” já descrita por

Hipócrates: Similia similibus curantur (HAHNEMANN, [1810-1921]17 apud CARILLO JR,

PUSTIGLIONE, 1994).

A experimentação de substâncias, um dos traços constitutivos da racionalidade

médica científica, foi utilizada por Hahnemann, mas com grandes diferenças metodológicas.

Ele observou as alterações desenvolvidas nos aspectos físicos e psíquicos - o todo

indissociável do ser humano - quando da utilização de substâncias em si mesmo ou pessoas

voluntárias consideradas saudáveis e depois as utilizou em doentes com sintomas

semelhantes avaliando a seu potencial efeito curativo (HAHNEMANN, [1810-1921] apud

CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994).

16 Cullen atribuía a ação terapêutica da China officinalis sobre a febre intermitente (ou Malária), ao seu estímulo do amargor e adstringência, no estômago. “Hahnemann no rodapé desse capítulo, descreveu a auto-experimentação da China, revelando que, ao tomá-la, apresentara os mesmos sintomas da febre e esta seria a verdadeira razão para a cura”... “A base desse raciocínio vem mais ou menos do ano quatrocentos antes de Cristo, do ‘pai da Medicina’, Hipócrates” (www.abrah.org.br/homeopatia). 17 O Organon foi publicado em 06 edições (1810,1818,1824,1829,1833, 1842=1921) em alemão e utilizadas, juntamente com observações e estudos de outros autores, por Carillo Jr. e Pustiglione para compor a versão traduzida e comentada do Organon utilizada no presente estudo (PUSTIGLIONE; CARILLO JR., 1994, p. 17).

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24

Hahnemann efetivamente foi o primeiro a utilizar essa linha de pesquisa experimental intimamente ligada à prática clínica: os sintomas obtidos experimentalmente eram pesquisados nos doentes para o cumprimento da ‘Lei da semelhança’ e observação de resultados. Esse trabalho representa o estilo hahnemanniano de ciência nos séculos XVIII e XIX, indo da pesquisa observacional para a aplicada. Assim cria sistema integrado retro-alimentado e desta forma exclui e/ou controla variáveis, acerta detalhes teóricos, propõe e adota condutas (CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994, p. 103).

Na Homeopatia teoria e prática curativa são indissociáveis pois o conhecimento é

construído com base na experimentação das substâncias que, por sua vez, se constituem

medicamentos para os indivíduos cujo sofrimento é o retrato dos sintomas observados

durante a experimentação – Lei dos Semelhantes.

A seguir apresentaremos a metodologia homeopática proposta por Hahnemann.

a) Experimentação de substâncias em indivíduos saudáveis

Hahnemann testou substâncias potencialmente medicamentosas (uma por vez) em

pessoas sadias e não em doentes, pois assim haveria a evidência dos sintomas que a

substância poderia desenvolver, sem que viessem mesclados com sintomas da doença

apresentada pelos experimentadores.

Entre 1790 e 1796 experimentou substâncias - enxofre, mercúrio, belladonna,

digitalina, prata, ouro, ferro, cicuta, ipecacuanha e outras drogas - dentro de normas

protocolares pré- estabelecidas, comprovando que diferentes drogas produzem no organismo

sadio manifestações características inerentes a cada uma delas e capazes de identificá-las

(CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994).

a.1 Lei dos Semelhantes

Através da evidência dos sintomas que o indivíduo são e sensível a uma

substância desenvolve durante a experimentação da mesma, demonstra-se na prática clínica a

Lei dos Semelhantes, ou seja, quando essa substância medicamentosa é utilizada por um

Page 26: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

25

indivíduo doente que apresente os mesmos sintomas evidenciados durante a experimentação

da substância, essa o colocaria no processo de cura.

b) Uso de doses infinitesimais e medicamento único

Visto que Hahnemann observava os efeitos das substâncias em pessoas vivas e

saudáveis, ele passou a diluí-las em doses mínimas, ato de um processo chamado

dinamização18 evitando sintomas tóxicos, como também tornando possível a observação

apenas dos efeitos primários da substância, precavendo-se dos efeitos provocados pela reação

do organismo à mesma (efeito secundário) (CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994).

Utilizava um único medicamento em cada experimentação para identificar o conjunto

de sintomas a ele relacionado.

c) Possibilidade de Prevenção de Doenças através da atuação sobre a suscetibilidade

Percebeu que as doses infinitesimais só estimulariam o desenvolvimento de sintomas

(patogenesias) em indivíduos com “sistemas frágeis”, portanto com suscetibilidade à

substância experimentada (CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994).

Assim, demonstrou na prática, que o tratamento deve ser individualizado, pois o

indivíduo doente apresenta-se sensível à ação das drogas em doses mínimas, de acordo com

sua idiossincrasia19 .

E como o experimentador é saudável clinicamente, caso os sintomas se desenvolvam

pelo uso das substâncias, significará a presença de sistemas frágeis não detectados

previamente, cuja instabilidade levaria ao indivíduo doenças, quando do encontro com um

fator desencadeante natural. O uso dessas substâncias traria através da Lei dos Semelhantes o

18Dinamização das substâncias: “Diluição sucessiva de uma parte do soluto (substância medicinal) em 99 partes

de solvente (água e álcool), imprimindo a cada passagem o movimento de 100 sucussões” (Parágrafo 269-271 –

HAHNEMANN [1810-1921] apud CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994, p. 181-188).

19 Hahnemann observou através das experimentações de substâncias, que os indivíduos apresentam diferentes sensibilidades a elas, definindo no parágrafo 117 o que seriam idiossincrasias: “ constituições especiais que se por um lado são sadias por outro possuem a predisposição de apresentarem estado mais ou menos mórbido desencadeado por certas causas que parecem não produzir impressões nem mudanças na maioria dos indivíduos... (p. 27)

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26

reequilíbrio aos sistemas frágeis, promovendo a prevenção de doenças (CARILLO JR,

PUSTIGLIONE, 1994).

d) Observação ampla dos fenômenos

Ao invés da dicotomia que fragmentava o ser humano na dualidade objetividade-

subjetividade, Hahnemann valorizava todos os sintomas desenvolvidos nos experimentadores,

inclusive os relacionados aos sentidos e sentimentos, visto ser o homem uma unidade

(CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994).

Hahnemann valorizou a influência do ambiente sobre a saúde do ser humano, como

suas condições de vida, incluindo alimentação, trabalho, moradia, iatrogenia, condições

sanitárias, socioeconômicas, relações familiares (CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994).

Criou uma classificação de adoecimentos de acordo com seu dinamismo sobre o ser

humano, com abordagens terapêuticas não apenas medicamentosas, mas que incluíam

orientação de hábitos saudáveis para seus pacientes, como exercícios físicos e dieta, além de

preconizar o afastamento das causas desencadeantes sempre que possível (CARILLO JR,

PUSTIGLIONE, 1994).

O método fenomenológico trouxe os princípios da teoria, como a Lei dos Semelhantes,

a Experimentação no Homem São e Sensível, as Doses Infinitesimais e o Medicamento

Único.

A matéria médica homeopática é cumulativa, contendo os registros referentes às

experimentações das substâncias (patogenesias20) - nos dois gêneros, várias idades e

biótipos21 diferentes - relacionando-os com as aferências situacionais em que ocorrem: meio

ambiente, horários de agravamento, fatores socioeconômicos, trabalhistas, relações

familiares (CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994).

Então, poderão ser acrescentados sintomas aos medicamentos menos experimentados,

mas o que já foi registrado se mantém.

20 Patogenesias: sintomas desencadeados quando indivíduos clinicamente saudáveis experimentam substâncias a que são sensíveis. 21 Biotipos carbônico, sulfúrico e fosfórico: estruturas - dinâmicas - com que o indivíduo se apresenta, resultado da interação da matéria que as compõem com as diáteses, com o temperamento ( defesa e plasticidade) e que evidencia a suscetibilidade e resistência do indivíduo ao adoecimento (CARILLO JR., 2000).

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27

Como os padrões de organização22 relativos aos adoecimentos se repetem nas pessoas,

os diagnósticos medicamentosos podem ser feitos ao longo das gerações.

Hahnemann classificou as doenças de acordo com suas características de dinamismo

(falsas ou verdadeiras), subtaneidade ou cronicidade (CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994),

nos parágrafos a seguir.

Parágrafo 72: ... As moléstias a que está sujeito o homem dividem-se em duas categorias. Umas são processos mórbidos súbitos, manifestações das alterações da força vital anormalmente perturbada, que tem a tendência de completar seu curso de modo mais ou menos rápido, mas sempre em um tempo moderado; são as chamadas doenças agudas. Outras são doenças de caráter tal que, com um início insignificante, muitas vezes imperceptível, afetam dinamicamente o organismo vivo, cada uma de seu modo peculiar, fazendo-se desviar pouco a pouco, do estado normal de saúde. Nestas a energia vital automática, chamada força vital, cuja função é preservar a saúde, só opõe no começo e no decorrer do seu curso, resistência imperfeita, inadequada e inútil, sendo por si incapaz de extingui-las, sofrendo impotente seu alastramento, a ponto de ser cada vez mais perturbada até que por fim, o organismo seja destruído. A essas doenças dá-se o nome de crônicas. Provém de um contágio dinâmico por um princípio infeccioso (miasma crônico) (HAHNEMANN, [1810-1921] apud CARILLO JR E PUSTIGLIONE, VERSÃO DO ORGANON: 1994, p. 78 ).

No parágrafo 77, Hahnemann desenvolveu o conceito de doenças crônicas falsas, por

serem devidas a causas evitáveis23.

Parágrafo 77: São impropriamente chamados crônicos, os males contraídos por pessoas que se expõem continuamente a influências nocivas evitáveis...(falsas doenças crônicas) (HAHNEMANN, [1810-1921] apud CARILLO JR E PUSTIGLIONE, VERSÃO DO ORGANON: 1994, p. 82 ).

22 Padrão de Organização: modo como se organizam as informações hereditárias e provenientes de evolução, o que o torna o maior responsável pelas caraterísticas e controle do processo vital, garantindo a individualidade de cada ser. Mas outros padrões de organização interagem com esse padrão geral (CARILLO JR.,2008, p. 60,68,70). De tal forma as estruturas dos órgãos têm padrões que as individualizam, assim como as doenças também apresentam padrões que as identificam. Mas ao se comporem, interagirem, com o padrão de organização próprio do indivíduo, esse padrão de organização geral do organismo do sujeito acometido, lhes determinará variações. 23 Carillo Jr. (2008) reviu essa classificação redefinindo-a como “predominantemente extrínseca de caráter crônico”.

Page 29: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

28

Nos parágrafos seguintes, 78 – 82, Hahnemann descreveu as doenças crônicas

naturais, atribuindo-lhes três origens distintas: miasmas - sífilis, sicose, psora. Seus

seguidores posteriormente, propuseram o tuberculinismo como um quarto miasma.

Hahnemann publicou o “Organon da Arte de Curar” após 20 anos de estudos,

experimentações de substâncias e observações de seus pacientes, o que faz com que os

parágrafos por vezes, mostrem momentos diferentes de sua compreensão sobre o processo

saúde-doença. Ele chamou “miasma” ao princípio infeccioso dinâmico capaz de alterar a

força vital tornando-a doente, pensando inicialmente que o adoecimento ocorria de “fora para

dentro”, conforme o parágrafo 11:

Quando um indivíduo adoece, é somente a força vital (imaterial, ativa por si mesma e presente em todas as partes do organismo) que sofre inicialmente o desvio determinado pela influência dinâmica do agente mórbido hostil à vida ...dando-se a conhecer por manifestações anormais das sensações e funções das partes do corpo acessíveis aos sentidos do observador e do médico (sintomas mórbidos)...” (HAHNEMANN, [1810-1921]apud CARILLO JR E PUSTIGLIONE, 1994, p. 28 ).

Ele mantém a concepção de “miasma” como “agente dinâmico externo capaz de

alterar a força vital” ao explicar as doenças crônicas cuja gênese ele atribui a três miasmas

crônicos distintos.

Parágrafo 78: As verdadeiras doenças crônicas naturais são as oriundas de um miasma crônico. Quando entregues à própria sorte, e não combatidas pelo emprego de remédios específicos, continuam sempre aumentando e piorando [ ...] Não obstante os melhores regimes mentais e físicos... (HAHNEMANN, [1810-1921] apud CARILLO JR E PUSTIGLIONE, VERSÃO DO ORGANON: 1994, p. 83).

Parágrafo 79: Até agora só era conhecida em alguma medida a sífilis, como doença crônica miasmática [...] a sicose (mal condilomatoso) igualmente não erradicável pela força vital sem tratamento medicinal adequado [...] sem sombra de dúvida o é... (HAHNEMANN, [1810-1921] apud CARILLO JR E PUSTIGLIONE, VERSÃO DO ORGANON: 1994, p. 84).

Parágrafo 80: Incomparavelmente maior e mais importante que os dois miasmas crônicos anteriormente mencionados24 é o miasma crônico da psora [...] única causa

24 Miasmas anteriormente mencionados: sífilis e sicose (HAHNEMANN, [1810-1921] apud CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994, parágrafo 79 p. 84)

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29

fundamental real produtora de todas as demais [...] que figuram nas obras sistemáticas de patologia como doenças peculiares e independentes (HAHNEMANN, [1810-1921] apud CARILLO JR E PUSTIGLIONE, versão do ORGANON: 1994, p. 84, 85, 86).

Posteriormente, Hahnemann observou através das experimentações de substâncias,

que os indivíduos apresentam diferentes sensibilidades a elas. Assim ele introduz o conceito

de idiossincrasia.

Parágrafo 116: Os sintomas patogenéticos25, ou são produzidos frequentemente em grande número de indivíduos sãos, ou menos frequentemente em poucas pessoas, ou excepcionalmente em muito poucas (HAHNEMANN, [1810-1921] apud CARILLO JR E PUSTIGLIONE, versão do ORGANON: 1994, p. 107).

Parágrafo 117: A esta última categoria pertencem as chamadas idiossincrasias: constituições especiais que se por uma lado são sadias por outro possuem a predisposição de apresentarem estado mais ou menos mórbido desencadeado por certas causas que parecem não produzir impressões nem mudanças na maioria dos indivíduos... (HAHNEMANN, [1810-1921] apud CARILLO JR E PUSTIGLIONE, versão do ORGANON: 1994, p.107)

Hahnemann também argumenta que não é adequado falar que o paciente tem tal ou

qual doença, visto que cada indivíduo adoece de acordo com sua idiossincrasia. Os males

devem ser tratados “de acordo com a totalidade de sinais do estado individual de cada

paciente” (HAHNEMANN, [1810-1921] parágrafo 81 apud CARILLO JR, PUSTIGLIONE,

1994 p.87). No entanto se houver necessidade de empregar o nome de doenças, para facilitar a

compreensão entre os interlocutores, diz-se que o paciente “tem uma espécie de doença de

São Vito, uma espécie de hidropsia, uma espécie de tifo” [...] “pois não existem doenças de

caráter fixo invariável” (HAHNEMANN, [1810-1921] parágrafo 81 apud CARILLO JR,

PUSTIGLIONE, 1994, p. 87).

2.4 O MÉTODO CONSTRUTIVISTA: O VITALISMO E A HOMEOPATIA

25 Sintomas patogenéticos se desenvolvem durante a experimentação de substâncias por indivíduos sadios sensíveis a elas.

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30

O método construtivista refere-se à construção teórica da Homeopatia por

Hahnemann cujo embasamento foi o vitalismo26 para explicar e interpretar os fenômenos

observados. Para ele, a força vital em equilíbrio promoveria a manutenção e a harmonia das

funções vitais do organismo o que equivaleria à saúde (LUZ, 1987).

Hahnemann utilizou o modelo ternário “corpo - força vital – espírito” - de Barthez

(1734-1806), da Faculdade de Medicina de Montpellier (CARILLO JR., 1994), para explicar

o funcionamento do organismo e da atuação dos medicamentos homeopáticos. Esses agiriam

sobre a força vital que levaria à recuperação da saúde do corpo.

No estado de saúde, a força vital que dinamicamente anima o corpo, reina com poder ilimitado e mantém todas as suas partes em admirável atividade harmônica, nas suas sensações e funções, de maneira que o espírito dotado de razão, que reside em nós pode livremente dispor desse instrumento vivo e são para atender aos mais altos fins de nossa existência (HAHNEMANN, [1810-1921] parágrafo 9 apud PUSTIGLIONE; CARILLO Jr., 1994, p.28 ).

A recuperação do binômio força vital – corpo, permitiria ao espírito “utilizar esse

instrumento livre e são para alcançar os altos fins de sua existência” (HAHNEMANN,

[1810-1921] apud CARILLO JR, PUSTIGLIONE, 1994).

As explicações teóricas da Homeopatia, construídas com base no vitalismo, podem

sofrer modificações devido ao desenvolvimento de vários campos do saber.

Considera-se então que as diferentes abordagens à homeopatia têm em comum a

Matéria Médica e a Lei dos Semelhantes. A diferença entre elas se refere à especificidade da

compreensão vitalista utilizada para explicar o processo saúde-doença, notadamente no que

diz respeito à utilização do conceito de energia vital. Em decorrência disso, as explicações

para o modo de atuação dos medicamentos homeopáticos em sua interação com os

organismos, através da Lei dos Semelhantes, podem ser diferentes, trazendo

consequentemente mudanças no sistema terapêutico (CARILLO JR. 1999).

Nesse estudo utilizaremos conceitos homeopáticos atualizados por Carillo Jr. (2008) e

seus estudos sobre Teoria da Complexidade com os quais formulou novas explicações sobre a

teoria e prática homeopáticas, definidas por ele como “ Homeopatia Sistêmica”.

26 O termo “ vitalismo” é utilizado para embasar teorias variadas: racionalista, metafísica; mesmerismo, teorias animistas, teoria vitalista espontaneísta (LUZ, 1987, p. 136, 137).

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31

3.3 HOMEOPATIA SISTÊMICA: CONTRIBUIÇÕES DE CARILLO JR. À HOMEOPATIA

3.3.1 Classificação das Doenças por Hahnemann, modificada por Carillo Jr.

Carillo Jr. propõe a classificação das doenças não mais como falsas ou verdadeiras,

mas referentes à sua origem predominante: se por causas externas – origem

predominantemente extrínseca de caráter agudo - mecânicas ou indisposições, e de caráter

crônico - profissionais, higienodietéticas, intoxicações, ambientais; as por causas mistas,

surgiriam consequentemente à imaturidade do sistema imunológico do ser humano (fator

intrínseco) para lidar com determinados agentes (fatores extrínsecos), como os presentes nas

epidemias de sarampo, varíola, ou quando há desequilíbrio entre padrões diferentes de

organização: peste, dengue, febre amarela, nas quais os vetores estão em desequilíbrio com o

meio.

As doenças de origem predominantemente intrínseca de caráter agudo seriam

consequentes a sistemas frágeis desequilibrados o suficiente para tornarem-se sistemicamente

dominantes, levando à doença aguda ou caso localizada apresenta-se como “sintoma vicário” 27(HANEMANN,1831 apud PUSTIGLIONE E CARILLO JR., 1994). Para as doenças

predominantemente intrínsecas de caráter crônico, manteve as denominações dadas por

Hahnemann e seus seguidores: psora, sicose, sifilinismo e tuberculinismo, denominando-as

“ diáteses”28.

Carillo Jr. (2000) sintetizou os conceitos referidos por Hahnemann: “miasma”

(princípio infeccioso dinâmico capaz de alterar a força vital tornando-a doente) e

“idiossincrasia” (diferentes sensibilidades às substâncias que os indivíduos apresentam), no

conceito médico de “diátese” (predisposição mórbida a desenvolver sintomas) fortalecendo a

idéia de que a doença crônica é devida à predisposição mórbida do indivíduo para

desenvolver sintomas, de acordo com sua hereditariedade e na interação com o meio

(CARILLO JR., 2000).

27 Sintoma vicário: “afecção localizada é só uma parte da doença geral projetada unidirecionalmente pela força vital” (HAHNEMANN apud PUSTIGLIONE; CARILLO JR., 1994). 28 Diátese: termo utilizado em medicina para predisposição a desenvolver sintomas decorrente de uma doença geral.

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32

Carillo Jr. (2000) explicou a fisiopatologia das diáteses, confirmando as observações

de Hahnemann. Relacionou cada uma das quatro diáteses a um dos tipos de

hipersensibilidade de Gell e Coombs. Segundo Coombs e Gell na sua classificação de 1963,

existem 4 tipos de hipersensibilidades: tipo I – hipersensibilidade imediata, mediada por

anticorpos IgEs (2-30min.) como na asma, eczema e anafilaxia; tipo II - hipersensibilidade

citotóxica mediada por anticorpos citotóxicos IgM e IgG (5-8 horas) como nas transfusões de

sangue; tipo III- hipersensibilidade mediada por imunocomplexos (2-8 horas) como nas

artrites, glomerulonefrites; tipo IV- hipersensibilidade mediada por células (24-72 horas)

como no teste DTH tuberculina.

Assim, para que os agentes externos desencadeiem ou intensifiquem sintomas

crônicos, necessitam ter afinidade com a alteração na saúde, causada pela tendência intrínseca

de adoecimento crônico, que possui um modo reacional dinâmico específico - diátese. Essa

seria a gênese da síndrome de caráter sistêmico e crônico, com forma peculiar de reação do

organismo.

Portanto, Carillo Jr. (2000) argumenta que cada doença crônica, conforme a

classificação biomédica, teria mecanismo fisiopatológico similar a uma das diáteses e estaria

por conseguinte incluída em uma delas (CARILLO JR , 2000). Como exemplos teríamos a

síndrome metabólica e hipersensibilidade I de Gell e Coombs semelhantes à psora;

semelhantes ao sifilinismo exemplificamos hepatites virais, doenças neurológicas, distúrbios

da coagulação com modo reacional determinado por hipersensibilidade II de Gell e Coombs;

tendências hidrogenóides e proliferativas, com infecções crônicas ou subagudas de portas de

entrada, varizes, tumores, colagenoses, hipersensibilidade III de Gell e Coombs, semelhantes

à sicose. O tuberculinismo estudado pelos seguidores de Hahnemann, apresenta-se como

hipersensibilidade IV de Gell e Coombs, tal qual na tuberculose.

Isso significaria que nas doenças crônicas predominantemente intrínsecas, os agentes

externos, como vírus, bactérias, fungos, etc. necessitariam ter afinidade com o modo

reacional do organismo – diátese - para conseguirem nele penetrar, se desenvolver e

desencadear ações deletérias já potencialmente presentes naquele indivíduo, através de sua

hereditariedade, ou intensificar a doença já aparente.

Por esta classificação, a doença não viria de fora, ela seria a interação do que vem de

fora com as tendências internas de adoecimento, que confeririam ao organismo

suscetibilidades, fragilidades. De acordo com a suscetibilidade, um agente externo poderá se

Page 34: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

33

estabelecer ou ser recusado. A menos que as condições do meio sejam tão inóspitas e o

estímulo nocivo tão imenso que vençam a refratariedade natural do organismo, este

desenvolverá uma doença compatível com sua tendência natural.

Os medicamentos homeopáticos para o tratamento de doenças relacionadas à

cronicidade, também estariam associados às diáteses (CARILLO JR., 2000).

A diátese mais importante a ser compreendida nesse trabalho, é o Sifilinismo pois

segundo Carillo Jr (2000), a essa tendência pertencem, dentre outras, as hepatites virais, a

sífilis, cirrose hepática, síndromes neurológicas como Parkinson, Alzheimer, esclerose

múltipla, esclerose lateral amiotrófica, assim como as dependências químicas onde o

alcoolismo não recuperável é patognomônico.

Sua fisiopatologia se deveria à deficiência enzimática do sistema mononuclear

fagocitário para o metabolismo do álcool e derivados como dinitrobenzol, ésteres, aloe

tornando-os toxinas não eliminadas pelo organismo. Como o sistema mononuclear fagocitário

é responsável pelo metabolismo intermediário que nutre o parênquima dos órgãos, as células

parenquimatosas ficariam desnutridas e expostas às toxinas que se acumulariam e gerariam

mecanismos inflamatórios correspondentes à hipersensibilidade tipo II de Gell e Coombs com

consequente necrose nos vários órgãos (CARILLO JR., 2000).

3.3.2 O Processo Vital

De acordo com o parágrafo 9 do Organon, Hahnemann define a “ força vital” como

responsável pela saúde do organismo, quando em equilíbrio e se em desequilíbrio pela

doença, sendo passível de tratamento homeopático.

Carillo Jr. (2008) problematiza o conceito de “força vital” utilizado por Hahnemann,

pois quando este define que uma única força vital corrigiria todos os desequilíbrios do

organismo, colocaria no mesmo grau de importância doenças de gravidades diversas.

Assim, Carillo Jr.(2008) propôs um novo modelo teórico para explicar o processo

saúde-doença, que ele denominou “Processo Vital” composto por oito elementos: consciência,

padrão de organização, autorregulação, autopoiese, cognição, adaptação, processo

dissipativo, estrutura, que interagiriam e se influenciariam de maneira dinâmica e

interdependente e colocariam o organismo em interação com o meio.

Page 35: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

34

“A consciência deteria o conhecimento comum a muitas pessoas, ou a todo o Universo,

do micro ao macrocosmo. Poderia ser definida também como ‘unidade infinita do processo

vital’ ou ‘rede da vida’ ” (CARILLO JR.,2008, p. 114). Cada ser vivo seria uma expressão

desta “ consciência ampla, universal, imanente, atemporal”, e participaria das decisões

tomadas pelo sistema. Na “consciência” estariam imersos todos os seres vivos, o que lhes

permitiria manterem uma ligação constante (CARILLO JR.,2008).

“Autorregulação” seria a capacidade do organismo de manter um equilíbrio dinâmico

de suas instabilidades constantes, traduzido por constantes internas, o que definiria a saúde

(CARILLO JR., 2008). A perda da capacidade de autorregulação do organismo, com

instabilidades não corrigidas, traduzidas como constantes inadequadas para as aferências

situacionais, equivaleria à doença que geraria aniquilamento, deterioração, ou adaptação do

organismo (CARILLO JR., 2008 p. 126, 135).

Carillo Jr., (2008) propõe que o mecanismo de ação da terapêutica homeopática que

utiliza a Lei dos Semelhantes, através da substância de padrão semelhante à doença que se

pretende curar, estimularia o sistema alterado que seria recondicionado em sua

autorregulação, tornando possível ao organismo adaptar-se às aferências situacionais

(CARILL JR, 2008, p.133,135) que se apresentam.

A “adaptação” é a capacidade do sistema de modificar determinadas características a

fim de sobreviver ou para gerar um padrão melhor do que se teria anteriormente, o que

mudaria a noção predominante de que a doença é um mal a ser combatido (CARILLO JR.,

2008, p. 59, 129). O sistema, nesse caso, incorporaria através dela um aprendizado novo –

“cognição” – que lhe permitiria manter-se em equilíbrio, mesmo ao lidar com fatores que

anteriormente seriam causadores de desestabilizações mantidas.

Toda a Dinâmica Vital29 estaria relacionada ao “padrão de organização” tido como

informação determinante do modo reacional dinâmico do organismo. Além disso ele é

29 Dinâmica Vital é uma das 06 dimensões propostas pelo Grupo de Pesquisas do CNPq “Racionalidades Médicas”, originário do campo da Saúde Coletiva no Brasil, desde 1992 liderado por Luz, que estabeleceu que saberes e práticas envolvendo a “Arte de Curar” para serem considerados uma “Racionalidade Médica” deverão ser complexos - estruturados e integrados - e abranger seis dimensões fundamentais: a) cosmologia: equivale aos fundamentos empregados nos discursos das diversas culturas; seria a forma de cada cultura apreender, através da atribuição de sentido e significado, as formas de representar a sua “realidade”; b) doutrina médica: explicativa do que é doença, sua origem ou causa, sua evolução ou cura; c) dinâmica vital: fisiologia; d) morfologia: anatomia; e) sistema de diagnose; f) sistema de intervenção terapêutica (TESSER, LUZ, 2008).

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35

também considerado fruto da hereditariedade e da interação constante do ser humano com o

meio que o circunda, composto de “padrões biológicos, sociais, familiares, profissionais,

morais, estéticos, religiosos, ecológicos, o que lhe garante individualidade” (CARILLO JR.,

2008, p. 61). A interação com o meio se dá através do “processo dissipativo”, onde o

organismo receberia inputs, os processaria e poderia gerar produtos para seu próprio

desenvolvimento com assimilação de nutrientes (matéria e energia) e reconstrução através da

“autopoiese” ou para o meio como produto eliminado. Este, por sua vez, servirá de input

para outros sistemas. “Este movimento de relação entre os seres, ou entre as partes de cada

ser, garante a manutenção da vida” (CARILLO JR., 2008 p. 58).

No organismo doente o padrão de organização está susceptível às influências do meio

sem conseguir se autorregular. Essa susceptibilidade se traduziria em fragilidades psico-

orgânicas que dificultariam ou impediriam o caminhar na vida, com autonomia e qualidade.

Ao ser diagnosticado e tratado, há o retorno à saúde e, como definiu Hahnemann, o ser

poderá utilizar “livremente esse instrumento (corpo) vivo e são para atingir os mais altos

fins de sua existência”.

A estrutura está intimamente relacionada ao padrão de organização, permeado pela

consciência. O organismo complexo do ser humano é uma estrutura, composta por sua vez de

várias estruturas diferentes, subordinadas ao padrão de organização do organismo completo

no qual estão inseridas, e que influencia o funcionamento de todas as células. As

particularidades do funcionamento orgânico, diferentes entre pessoas diferentes, são devidas a

padrões de organização diferentes entre pessoas. Uma pessoa longilínea tem seu

funcionamento glandular e psico-orgânico, diferente tanto da brevilínea, quanto da

normolínea. Em homeopatia são denominados biótipos: fosfórico, que tem predominância do

funcionamento da glândula tireóide sobre a suprarrenal; carbônico, predominância do

funcionamento da glândula supra renal sobre a tireóide e sulfúrico, com equilíbrio de

funcionamento entre a tireóide e suprarenal. Consequentemente, a suscetibilidade a

desenvolver determinadas doenças, também difere. (CARILLO JR., 1996, 2008).

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36

Carillo Jr. (2008) propõe para a terapêutica que os medicamentos sejam escolhidos em

conformidade com a classificação de adoecimentos e o elemento do processo vital a ser

tratado: equalizadores – atuariam sobre a lesão de órgãos vitais; circunstanciais –para

intercorrências clínicas; sistêmicos – para retorno ao padrão de organização saudável, de

acordo com a diátese a ser tratada; e diatésicos quando necessários para atuação em sistemas

frágeis pouco evidenciados à avaliação clínica. Os medicamentos tautoterápicos auxiliariam

na neutralização de efeitos colaterais, gerados durante a utilização de medicamentos

convencionais.

Os medicamentos são prescritos como únicos ou em conjunto, para as necessidades

do paciente.

Como o ser humano é um todo indivisível em interação com o meio e como a

discussão sobre a Homeopatia inclui a discussão acerca da terapêutica que interferiria nessa

unidade, é importante discutir o conceito de Integralidade e sua relação com a Homeopatia,

que virá no capítulo a seguir.

Page 38: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

37

4 A HOMEOPATIA E A INTEGRALIDADE

Em busca de definir o conceito de “integralidade”, Mattos (2004, 2011) problematiza

o “atendimento integral” atribuindo-lhe três sentidos:

O primeiro se refere à “boa prática médica”, cujo conceito foi estendido a todos os

profissionais da equipe de saúde. Os profissionais de saúde devem ser capazes de ouvir o

sofrimento que demandou a busca espontânea do atendimento no serviço de saúde pelo

indivíduo, em um encontro intersubjetivo em que através da “prática de conversação” é

diagnosticado o problema emergente, fazendo-se o primeiro atendimento dentro do contexto

da queixa. Com sua resolução segue-se o segundo passo, quando serão diagnosticadas nesse

indivíduo, outras necessidades assistenciais e de prevenção, com as intervenções

correspondentes para melhorar a sua saúde. Então essa atividade de saúde estaria voltada à

assistência e prevenção de agravos tendo como ponto de partida o encontro entre os sujeitos,

caracterizado pela dimensão dialógica.

O segundo sentido da integralidade é o direcionamento da organização das práticas de

saúde e o terceiro se refere à criação de políticas especiais para problemas de saúde que

afligem grupos específicos – crianças, adolescentes, mulheres, idosos, trazendo o contexto da

vivência desses indivíduos para a política a ser implantada (MATTOS, 2004, 2011).

A integralidade assim se realizaria como produto da ação social potencializada por “

tecnologia leve”30 que se refere ao plano individual - relação usuário-profissional de saúde,

onde se constrói a integralidade no ato da atenção individual - e profissional de saúde e seus

pares - plano sistêmico, no qual se garante a integralidade das ações na rede de serviços

(PINHEIRO, 2001 apud FRANCO TB 2006).

Ao discutirem o atendimento integral, autores como Merhy (1997), propõem que o

cuidado seja seu fio condutor. Ele considera que a construção da integralidade se dá a partir

da atenção à saúde, usuário - centrada, através da percepção das necessidades dos usuários

captadas e trabalhadas em uma dimensão individual. Assim segundo ele, se daria a

30

Para a atuação do profissional da saúde há tecnologias de trabalho conforme discutido por Merhy,

1998: dura – que enfatiza a utilização de máquinas e instrumentos, centrada em procedimentos, na qual a

relação fica negligenciada; levedura - refere-se ao conhecimento técnico estruturado; a leve seria relacional e

deveria ser priorizada na produção dos serviços de saúde, segundo Merhy (FRANCO TB, MERHY EE, 2003).

Page 39: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

38

contribuição para seu “caminhar mais autônomo” no seu “modo de andar a vida” (MERHY,

1997, p. 30). Para Merhy é o usuário que dá o significado (missão) do serviço de saúde.

Nesse estudo nos ateremos ao cuidado que se efetiva e se constrói no encontro

intercessor entre os usuários – “pessoas que trazem um sofrimento ou necessidades” - e

outras pessoas - os profissionais, que “dispõem de um conhecimento específico ou de

recursos instrumentais que podem solucionar o problema trazido pelos primeiros (SILVA

JUNIOR, ALVES, ALVES, 2005).

O cuidado é uma ação integral [...](que) resgata o tratar, o respeitar, o acolher e o atender o ser em seu sofrimento. É uma ação integral de relações de pessoas, com efeitos e repercussões de interações positivas entre usuários, instituições e profissionais, que geram uma atitude digna e respeitosa, com responsabilização, vínculo e acolhimento. (PINHEIRO E GUIZARD 2004, in ANDRADE; FRANCO; FERREIRA, 2009, p. 134).

Nogueira (2010) contribui para essa discussão propondo o resgate da subjetividade

como um caminho para o cuidado em saúde.

Hardt (2003) corrobora essa proposta argumentando que “os serviços de saúde

baseiam-se fundamentalmente em trabalho afetivo e prestação de cuidados” (HARDT, 2003)

Assim a relação médico-paciente seria um dos componentes do plano individual da

integralidade, na atenção do médico ao usuário do serviço de saúde que o procura.

Para a compreensão dos aspectos envolvidos na relação médico-paciente trazemos um

conceito desenvolvido por Espinosa31 (1632) - o de “afetamento” de um corpo32 sobre o

outro quando se encontram:

Quando um corpo “encontra” outro corpo, uma idéia, outra idéia, tanto acontece que

as duas relações se compõem para formar um todo mais potente, quanto que um

decompõe o outro e destrói a coesão das suas partes. [...] A ordem das causas é então

uma ordem de composição e de decomposição de relações que afeta infinitamente

toda a natureza. [...] sentimos alegria quando um corpo se encontra com o nosso e

com ele se compõe; inversamente sentimos tristeza quando um corpo ou uma idéia

ameaçam nossa própria coerência (DELEUZE, 2002, p. 25).

31 Espinosa nasceu em 1632 , sendo um filósofo que” queria fazer de si mesmo um homem livre [...] e isso indo até os limites de seus pensamentos, e interligando todos os elementos uns aos outros...” (DELEUZE: Espinosa - Filosofia Prática, 2002 p. 7) 32 “Corpo” pode ser material ou imaterial como idéia, filme, pessoa...(notas de aula de FRANCO, 2011)

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39

Camargo Jr. (2003) enfatiza da eficácia simbólica ao analisar a relação do “sujeito

sofredor” com o médico que o está acolhendo - a relação médico-paciente:

Além da eficácia material [...] as práticas de cura falam de outras formas aos homens de todo o tempo e lugar; para usar a expressão de Lévi-Strauss, todas têm também eficácia simbólica. A partir de crenças, representações e valores compartilhados por pacientes e terapeuta – e pela cultura da qual fazem parte – surgem efeitos ‘mágicos’ – que talvez expliquemos por meio de nossos conhecimentos sobre a psico-fisiologia, a neuroendocrinologia e outros discursos disciplinares [...] Todo o ritual da consulta médica – olhares, gestos, perguntas, a roupa branca – reveste-se de enorme importância simbólica. A crença do paciente – e do médico – nos poderes da medicina são um poderoso aliado em qualquer circunstância. [...] a eficácia simbólica pode ser um poderoso agente terapêutico, quer possibilitando o uso de doses menores, quer reduzindo efeitos colaterais, ou ainda garantindo a adesão dos pacientes ao tratamento proposto (CAMARGO JR., 2003 p.62, 63, 64).

Logo, a “ eficácia simbólica” poderia ser compreendida como “afetamento positivo”

ou “efeito placebo positivo” que potencializa a terapêutica33, assim como o “efeito placebo

negativo”, iatrogenia indesejável mas que pode acontecer independente da vontade do

cuidador (CAMARGO JR., 2003 p. 64).

Portanto, “vínculo, responsabilização e humildade” integram o compromisso

terapêutico presente na arte do encontro que ocorre na relação médico-paciente (CAMARGO

JR., 2003) sendo mobilizados sentimentos, emoções e identificações, que dificultam ou

facilitam a aplicação dos conhecimentos do profissional na percepção das necessidades de

atenção ou interpretação das demandas trazidas pelo usuário (SILVA JUNIOR; ALVES;

ALVES, 2005).

Como respostas para o cuidado integral ao doente, Tesser et al (2008) propõem as

medicinas vitalistas - consideradas alternativas ou complementares ao modelo hegemônico da

biomedicina – por considerarem que nessas, “a integralidade é um alicerce fundador e

organizador do saber, presente na construção da diagnose e da terapêutica”.

33 Efeito placebo positivo: quando da utilização de medicamentos, torna possível uso de doses menores, reduzem-se efeitos colaterais e se garante a adesão dos pacientes ao tratamento proposto (CAMARGO JR, 2003, p. 64)

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40

Queiroz (2006) também considera a perspectiva vitalista como essencialmente

integradora, por estar centrada tanto na experiência de vida do paciente como na sensibilidade

do terapeuta em detectar sinais de desequilíbrio nessa experiência.

Nesse sentido, ao discutir Integralidade e Complementaridade entre os saberes das

diversas Racionalidades Médicas, Nogueira (2010) faz um comentário sobre a especificidade

do olhar viabilizado pelas racionalidades médicas vitalistas:

As racionalidades médicas vitalistas, por outro lado, viabilizam a ampliação do olhar

do terapeuta para outras dimensões presentes no adoecimento, com a inclusão da

subjetividade na prática clínica, permitindo assim que o Sujeito possa ser visto. O

resgate da subjetividade pode ser um caminho para a integralidade do cuidado em

saúde (NOGUEIRA, 2010, p. 112).

Ao discutirem as Racionalidades Médicas Vitalistas e a Integralidade, Tesser e Luz

(2008) afirmam que “esse centramento da atenção e ação no sujeito é o mais relevante do

ponto de vista dos doentes”.

Segundo Luz (2005), as categorias de Vida, Saúde e Equilíbrio (ou Harmonia) são

centrais no paradigma de conhecimento e na prática terapêutica das medicinas vitalistas,

incentivando a existência de cidadãos saudáveis, capazes de interagir em harmonia com

outros cidadãos, e de criar para si e para os que lhe são mais próximos um ambiente

harmônico, gerador de saúde. Em princípio tais medicinas tendem a propiciar um

conhecimento maior do indivíduo em relação a si mesmo, de seu corpo e de seu psiquismo,

com uma consequente busca de maior autonomia em face de seu processo de

adoecimento, facilitando um projeto de construção (ou de reconstrução) da própria saúde

(LUZ, 2005).

De acordo com Luz (2005), a Homeopatia tem na relação médico-paciente um

elemento fundamental da terapêutica.

A Homeopatia através da experimentação de substâncias no homem clinicamente

saudável, uma por vez, método que Hahnemann propôs para evidenciar suas potencialidades

como medicamentos, conseguiu evidenciar além da possibilidade de tratamento dos sintomas

orgânicos, o tratamento também dos sintomas psíquicos. Isso significa ser possível tratar o

ser humano como ele é: um todo indivisível.

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41

Assim a Matéria Médica Homeopática contém os registros dos medicamentos

homeopáticos e cada substância que a compõe equivale não apenas à compilação de sinais e

sintomas de relatos de vários experimentadores - que a ingeriram sob condições determinadas

pela metodologia de Hahnemann - como também sinais e sintomas de indivíduos que

obtiveram melhora clínica com ela ou ainda, daqueles que sofreram sua intoxicação.

A matéria médica homeopática considera as patologias como síndromes biopsíquicas,

trazendo a relação dos sintomas que o medicamento homeopático poderia curar. Ao

considerar os sintomas subjetivos como componentes fundamentais dessas síndromes

biopsíquicas, a matéria médica instrumentaliza o terapeuta para a necessária compreensão dos

sintomas subjetivos do indivíduo que sofre, ajudando-o a definir o medicamento que poderia

curá-lo. Desse modo, a incorporação dos sintomas subjetivos do sofredor nessas síndromes

biopsíquicas através do processo diagnóstico estimula o médico homeopata a buscar

compreender a subjetividade do indivíduo durante a relação médico-paciente, ampliando

assim os sentidos do cuidado individual.

Como exemplo, segue um resumo da matéria médica do medicamento Ignatia amara.

4.1 RESUMO DA MATÉRIA MÉDICA DE IGNATIA AMARA

O indivíduo que necessita dessa substância vem à consulta reproduzindo em seu

discurso (em itálico no texto), o que está contido na matéria médica da substância (ALLEN,

1986, p. 66-91)34:

Eu estou negligenciando meu dever, quebrando minha promessa.

Pensa que é um criminoso e chega a ter idéias de suicídio.

Reage aos transtornos com humor ou modo de ser alternante, muito variável,

trocando em um tempo incrivelmente curto da alegria à tristeza, do riso ao pranto.

34 Foram utilizadas também as traduções de sintomas contidos na Matéria Médica de Allen por ANTOLLINI, Jorge Luiz, cedidas em sala de aula do curso de Homeopatia do Instituto Hahenemanniano do Brasil, em [1997?].

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42

O remédio das grandes contradições perceptíveis através tanto de sintomas físicos

quanto mentais:

Ri por fatos tristes ou mágoas. Ri espasmodicamente, até de coisas sérias ou tristes

ou passa facilmente do riso ao pranto e vice versa. Chora involuntariamente, por seus

próprios problemas ou pelos que afligem aos demais, ainda que não os conheça.

Extremadamente irritável por contradição. Indecisão e inconstância. Remói. Mágoa

silenciosa, não demonstrada; sensação de vazío ou debilidade no epigástrio que

melhora com una respiração profunda ou com suspiros; fome nervosa que não se

acalma comendo”. As partes muito inflamadas, vermelhas, quentes, são indolores

(Kent); hemorróidas melhoram caminhando; a garganta dolorida melhora se deglute

principalmente sólidos; o vazio no estômago não melhora comendo; a tosse está pior

quanto mais tosse; tem desejos sexuais com impotência; tem sede durante calafrio e

sem sede durante a febre; face hiperemiada durante o calafrio; a face muda de cor

enquanto descansa, tem a sensação de um tampão na garganta que sobe quando não

deglute; vomita tudo exceto coisas indigestas; prolapso retal pior quando as fezes são

moles; constipação intestinal com fezes moles; dor de dente que melhora comendo.

Fezes amarelas, esbranquiçadas, moles mas difíceis de evacuar. Pele: suor com frio.

Sistema Nervoso: estados histéricos, bolo histérico; respiração suspirosa, com

desejos de inspirar profundamente. Espasmos na garganta; agrava bebendo e

melhora deglutindo sólidos; paralisias, desmaios com convulsões; sobressaltos

musculares isolados nos membros ao dormir. Convulsões: por susto, por castigo, por

excitação; alternando com opressão no peito; com gritos e risos; Hipoacusia-

excepto para la voz humana y zumbidos acentuados por una preocupación.

É um dos principais medicamentos para a susceptibilidade a transtornos de origem

emocional - especialmente mágoas - percebidas como sendo recentes, mesmo tendo ocorrido

há longo tempo atrás, o indivíduo pode senti-las “como se houvessem ocorrido hoje”;

"pessoas mental e fisicamente esgotadas por mortificação" .

O indivíduo que necessita de Ignatia amara, piora por: amor não correspondido; perda

recente do ser amado; mortificações; contradições; antecipação de acontecimentos;

situações constrangedoras; susto (se assusta facilmente); más noticias; castigos ou

repreensões em crianças; conversação; pelo consolo que leva a irritabilidade e aumento da

intensidade do choro. Alimentícios: café, doces, álcool; durante e depois de alimentação.

Tem aversões: a alimentos quentes, a comidas e bebidas, ao leite, à carne, ao vinho, ao

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43

conhaque, ao tabaco, ao fumo que lhe provoca soluço, náuseas, suor e cólica; ao calor; ar

livre. Piora por odores e perfumes fortes; correntes de ar livre; pela manhã; ao aquecer-se.

Melhora por: trocas de posição; deitando-se sobre o lado dolorido - pela forte compressão;

ruídos nos ouvidos melhoram pela música.

Tem desejos: solidão e às vezes companhia; deseja algo e não sabe o quê; desejo de

várias coisas, mas quando se lhes oferece não as quer mais; alimentícios: ácidos, alimentos

indigestos, queijo, pão de centeio, comidas frias.

É hipersensível a: dor e tato, ar livre, conversação, ruídos.

Outros sintomas:

Ira: com ansiedade, susto, pena silenciosa; suprirnida o reprimida. Ele não pode se expressar

falando, escrevendo ou qualquer coisa tão rapidamente como quisesse; então ocorre um

comportamento ansioso, ele comete erros quando fala e escreve. Faz tudo desajeitadamente e

necessita ser corrigido. (Her 7, Allen 40 apud Antolini). Está melhor mentalmente quando está

ocupada; é muito ativa , industriosa.

Cognição:

Compreensão difícil, embotamento mental, esforço mental é cansativo. Imagina que não

pode prosseguir, não pode andar. Sonhos à noite cheios de decepção, expectativas de

esforços fracassados. (Hahnemann apud Antolini). Sonhos com reflexões e deliberações.

Sonhou ter sido enterrado vivo.

Memória:

Grande fraqueza de memória. Esquece tudo, exceto os sonhos.

Exprimiriam cura:

Tranquilo, amável, de percepção rápida.

Disposição delicada com consciência muito clara.

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44

Com esse exemplo tornar-se-ia perceptível o potencial da Homeopatia para o

acolhimento e compreensão do indivíduo em sua totalidade.

4.2 A HOMEOPATIA COMO ESTRATÉGIA POLÍTICA DE ATENÇÃO INTEGRAL À

SAÚDE

Movimentos mundiais surgidos na década de 60 contra a medicalização da sociedade e

a inacessibilidade de grandes massas populacionais aos serviços médicos por seus altos custos

levaram à Conferência Internacional sobre a Atenção Primária à Saúde, em Alma-Ata

(Casaquistão) em 1978. Novas políticas de saúde foram propostas nas quais reafirmou-se “ser

a saúde um dos direitos fundamentais do homem, sob a responsabilidade política dos

governos (...) com determinação intersetorial” (ESCOREL, NASCIMENTO, EDLER, p. 64)

Os esforços reformadores levaram a que em 1988 se conquistasse no Brasil com o

artigo 196 da nova Constituição, o direito de toda a população – universal – de acesso à saúde

gratuita, integral e de qualidade (SAIPPA-OLIVEIRA, FERNANDEZ, KOIFFMAN, 2010 in

PINHEIRO, SILVA JR.,2010).

O crescimento das “medicinas alternativas” verificou-se tanto em países

desenvolvidos como periféricos, principalmente a partir da segunda metade dos anos 70,

intensificando-se na década de 80 (LUZ, 2005), pois a biomedicina tendo tido bastante

sucesso nas doenças infectocontagiosas, mostrou-se insuficiente tanto para o tratamento das

doenças crônicas, como para fazer com que o sujeito enfermo se sinta verdadeiramente

acolhido e cuidado em seus variados mal-estares (LUZ, 1997; NOGUEIRA, 2009). Haveria

na biomedicina, a ênfase no diagnóstico em detrimento da terapêutica, o que produziria uma

“investigação cada vez mais sofisticada de patologias”, “esquecendo-se que além de ser um

saber científico é uma arte de curar sujeitos doentes” (LUZ, 2005).

As medicinas vitalistas, dentre elas a Homeopatia – considerada pelo Conselho

Federal de Medicina do Brasil como Especialidade Médica desde 04/06/1980 (quatro de

junho de hum mil novecentos e oitenta), - despontam como respostas possíveis para o cuidado

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45

integral ao doente que busca o Sistema Único de Saúde (SUS) pois “...nas racionalidades não

biomédicas, a integralidade [...] é um alicerce fundador e organizador do saber, presente na

construção da diagnose e da terapêutica...” (TESSER et al, 2008 apud NOGUEIRA, 2010

p.106) com inclusão da “subjetividade na prática clínica, permitindo assim que o Sujeito

possa ser visto” (NOGUEIRA, 2010, p.112).

Luz (2005) traz algumas informações sobre a história da introdução e legitimação dos

serviços de medicinas alternativas na Previdência Social e instituições acadêmicas:

“Em agosto de 1985, a homeopatia, a fitoterapia e a medicina tradicional chinesa, através da acupuntura, foram legitimadas nos serviços médicos da previdência social, através de um convênio celebrado pelo então presidente do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (INAMPS) e o ministro da Previdência Social, com instituições acadêmicas como a Fiocruz e a UERJ, além do Instituto Hahnemanniano do Brasil (IHB), no sentido de estabelecerem-se atividades não apenas de atendimento médico envolvendo homeopatia, acupuntura e fitoterapia, mas também atividades de pesquisa e ensino sobre essas “medicinas alternativas” (LUZ, 2005, p.165).

Dando continuidade a alguns dados históricos, Sandra Chaim Salles (2008) publica:

Em 1988 a Comissão Interministerial de Planejamento e Coordenação (CIPLAN)

composta pelos Ministérios da Saúde, Educação, Previdência Social, do Trabalho e

Planejamento, fixa as primeiras diretrizes para implantação e implementação do

atendimento homeopático no SUDS, atual SUS. (SALLES, 2008, p. 24)

Em 1999 o Ministério da Saúde inseriu na tabela do SIA/SUS a consulta médica

homeopática.

No período de 2002-2005 a OMS estimulou o uso da Medicina Tradicional/Medicina

Complementar/Alternativa no seu documento “Estratégia da OMS sobre Medicina

Page 47: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

46

Tradicional”. Em 2006, através da Portaria número 971, publicada no Diário Oficial da União

de 04/05/2006, o Ministério da Saúde oficializou a aprovação da Política Nacional de Práticas

Integrativas e Complementares – PNPIC – no SUS, onde se estabeleceu dentre outros, a

incorporação da Homeopatia nos diferentes níveis de complexidade no Sistema, com ênfase

na atenção básica assim como no fortalecimento de iniciativas de atenção homeopática na

atenção especializada: nos ambulatórios de especialidades ou nos centros de referência,

emergências, UTI, centros de cuidados paliativos ou em enfermarias hospitalares de forma

complementar, contribuindo para a maior resolubilidade da atenção.

Vale ressaltar que esse estudo só se tornou possível devido aos avanços propostos

pelo Ministério da Saúde através da PNPIC, pois a pesquisa que forneceu os dados para

serem avaliados, ocorreu no Hospital Universitário Antonio Pedro, em ambulatório da

especialidade homeopática.

Luz e colaboradores (2005) em pesquisa realizada nos serviços públicos de

Homeopatia, Biomedicina e Medicina Tradicional Chinesa entre 1994 e 1996, na cidade do

Rio de Janeiro, constataram que as medicinas vitalistas demonstraram aumento da

resolubilidade de doenças crônicas (ou mesmo em relação a distúrbios funcionais), como

doenças circulatórias, reumatismos, problemas osteo-articulares, diabetes, renais crônicos etc.

ao terem seus resultados comparados aos encontrados na Biomedicina.

A abordagem terapêutica biomédica da Hepatite C Crônica, considerada como doença

de origem infecciosa dentro dos critérios propostos pela Biomedicina, tem como estratégia de

cura o combate ao vírus. De modo diverso, na Homeopatia o foco terapêutico é voltado à

redução da suscetibilidade que o indivíduo apresentaria à infecção pelo vírus.

No próximo capítulo, segue-se essa discussão, detalhando-se a abordagem da Hepatite

C Crônica pela Homeopatia Sistêmica.

Page 48: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

47

5 ABORDAGENS DA HEPATITE C CRÔNICA

Através de uma perspectiva vitalista, Canguilhem (2005, p. 63) aborda a doença de forma peculiar, inserindo-a na história pessoal do ser humano: ‘as doenças do homem não são somente limitações de seu poder físico, são dramas de sua história’ (NOGUEIRA, 2010).

5.1 EPIDEMIOLOGIA DA HEPATITE C CRÔNICA

O vírus da hepatite C (VHC), pertence à família Flaviviridae, tendo sido descrito em

1989. Apresenta alta taxa de mutação, responsável pelos diferentes genótipos, subtipos,

quasispécies. Há 06 genótipos descritos e o de maior prevalência no Brasil é o tipo 1,

considerado como o de pior resposta ao tratamento (FERRAZ; LEMOS, 2004).

A hepatite C crônica evolui por décadas, sendo acelerada na presença de co-fatores

como consumo de álcool, diabetes melitus (parece que o vírus a predispõe), idade avançada

de aquisição, co-infecção pelo vírus da imunodeficiência humana ou co- infecção por outros

vírus hepatotrópicos35 (GUIDELINE 2011, p.1). A taxa de cronificação é em torno de 80%,

sendo a hepatite C crônica a principal causa de cirrose no Brasil (FERRAZ; LEMOS, 2004).

O número de pessoas cronicamente infectadas pelo vírus da hepatite C (VHC) ao redor

do mundo pode exceder 200 milhões. Fatores genéticos parecem indicar diferentes

suscetibilidades à infecção pelo vírus tornando o acometimento hepático muito variável. As

lesões no fígado mantêm-se como alterações mínimas, ou estendem-se à fibrose extensa e

cirrose com ou sem hepatocarcinoma sem relação com genótipo ou carga viral. Apenas

excepcionalmente há remissão espontânea (GUIDELINE, 2011).

Nas décadas de 70, 80 a principal via de transmissão era por hemotransfusão. Hoje o

uso de drogas intravenosas assumiu papel primordial. Outras formas são transmissão vertical,

ambiente de hemodiálise, tatugens, body-piercing, acidentes com materiais perfurocortantes

contaminados e sexual (FERRAZ; LEMOS, 2004, p. 47).

35 O consenso para o tratamento biomédico da Hepatite C Crônica foi publicado no GUIDELINE 2011 European Association for the Study of the Liver (EASL), Journal of Hepatology 2011 – Clinical practise Guidelines, Editora Elsevier.

Page 49: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

48

O objetivo da terapia biomédica é eliminar os vírus da hepatite C circulantes, que

deverão permanecer indetectáveis após 6 meses de parada do tratamento. Entretanto

considera-se que poderá ocorrer evolução da Hepatite C Crônica mesmo após a erradicação

do vírus (GUIDELINE, 2011, p. 2).

Dentre os efeitos colaterais dos medicamentos preconizados, pelo consenso interferon

alfa peguilado e ribavirina encontram-se os seguintes: desenvolvimento de fadiga severa,

depressão, irritabilidade, desordem no sono, reações de pele e dispnéia.

5.2 ABORDAGEM DA HOMEOPATIA SISTÊMICA

O tratamento homeopático pretende reduzir a suscetibilidade ao vírus

apresentada pelos indivíduos portadores de sifilinismo (CARILLO JR. et al, 2009), que

determina alterações orgânicas com fisiopatologia similar à das lesões atribuídas ao VHC

(CARILLO Jr, 2000).

O paciente com “sifilinismo” apresenta-se como habitat propício ao vírus da hepatite

C (VHC). Ao infectar esse paciente susceptível, ou seja, predisposto, o VHC aceleraria o

surgimento de lesões típicas ou as agravaria.

Para Carillo Jr. (2000) o acúmulo de toxinas como álcool, dinitrobenzol, ésteres, aloe

nos pacientes portadores de sifilinismo, seria derivado do metabolismo intermediário precário

desses pacientes, realizado pelas células do sistema mononuclear fagocitário. Essas toxinas

desencadeariam citotoxicidade – hipersensibilidade II de Gell e Coombs- com inflamação,

fibrose e necrose predominantemente em glândulas, gânglios, sistema nervoso, ossos, tecido

fibroelástico, vasavasorum e desnutrição parenquimatosa. Por isso haveria a possibilidade de

manifestações extra-hepáticas como glomerulonefrites membranoproliferativas; porfiria

cutânea tardia, alta prevalência de anticorpos antitireoidianos.

Síndromes neurológicas como Parkinson, Alzheimer, esclerose múltipla, esclerose

lateral amiotrófica, (XAVIER MENDES, 2005), sífilis, assim como as dependências químicas

onde o alcoolismo não recuperável é patognomônico, dentre outras patologias, pertencem a

esta tendência. Outras características são as coagulopatias com tendências hemorrágicas e

trombóticas (CARILLO JR. 2000).

Page 50: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

49

Carillo Jr. et al (2010) ponderam que se o indivíduo portador de sifilinismo também

apresentar sicose - outra das 04 diáteses crônicas - poderia haver o surgimento de

hepatocarcinoma, líquen plano, atividade do fator reumatóide na crioglobulinemia mista

essencial, Sindrome de Sjogren, linfoma não-Hodgkin de células B, observados clinicamente

e citados nas publicações de referência. Imunologicamente, a sicose corresponderia à

hipersensibilidade tipo III de Gell e Coombs36 (CARILLO JR. 2000).

Desse modo o recondicionamento do organismo ao funcionamento adequado do

processo vital com retorno à saúde, seria promovido pelos estímulos dos medicamentos

homeopáticos (CARILLO JR, 2008).

Outros benefícios que merecem ser abordados (CARILLO JR. et al, 2009), são o custo

financeiro, pois a utilização de doses infinitesimais torna extremamente pequeno o custo dos

medicamentos utilizados; os efeitos colaterais dos medicamentos praticamente inexistem,

visto que as doses infinitesimais possibilitam a ação primária dos medicamentos sobre os

receptores que lhe têm afinidade por estarem ativados no processo de doença.

Quanto à cronicidade das doenças, a compreensão sobre as diáteses – tendências

crônicas de adoecimento que conferem ao organismo susceptibilidade a determinados agentes

- traz ao paciente a possibilidade de prevenção, tratamento e cura de doenças crônicas através

dos medicamentos homeopáticos (CARILLO JR., 2000).

Finalmente, a questão do cuidado e valorização da subjetividade do paciente, através

de uma abordagem sistêmica e biopsíquica, torna a consulta humanizada.

5.2.1 Avaliação do Tratamento Homeopático em Pacientes Portadores de Hepatite C

Crônica

Nessa pesquisa que serviu de base para o presente estudo, foram atendidos 41

indivíduos portadores de Hepatite C Crônica, sendo previsto no protocolo o retorno trimestral

dos mesmos. Desses, 06 estavam fora do grupo de inclusão, sendo seus dados excluídos deste

relatório.

5.2.1.1 Resultados Preliminares

Page 51: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

50

Os resultados parciais desse estudo foram apresentados no IX CONABRAH

(Congresso Brasileiro da Associação Brasileira de Reciclagem e Assistência em Homeopatia) e

no Primeiro Fórum Nacional de Racionalidades Médicas e Práticas Integrativas e

Complementares realizado em abril de 2012 na Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ.

Dos 35 pacientes do grupo de inclusão, 26 pacientes aderiram ao tratamento

(correspondentes a 74,3% do total) e 09 pacientes não aderiram, (correspondentes a 34,6% do

total), conforme ilustrado no gráfico 1.

Gráfico 1 Adesão de 26 indivíduos ao tratamento homeopático para hepatite C crônica, do total de 35 indivíduos que iniciaram o tratamento. Nove indivíduos não aderiram.

.

Realizou-se o levantamento dos vinte e seis prontuários dos participantes que aderiram

ao tratamento homeopático, correspondentes aos primeiros quatorze meses de evolução, da

primeira etapa da pesquisa “Avaliação do Tratamento Homeopático em Pacientes Portadores de

Hepatite C”.

Seguiu-se a análise da evolução dos vinte e seis casos de portadores de Hepatite C

Crônica através dos prontuários levantados.

Page 52: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

51

Gráfico 2: Principais sintomas referidos por 88,5% a 38,5% de indivíduos em ordem decrescente de frequência:

insuficência hepatobiliar: 23 indivíduos (88,5% dos indivíduos); ansiedade 20 (76,9%); distúrbio do sono 19 (73,1%); apatia

16 (61,5%); artralgia 14 (53,8%); irritabilidade 14 (53,8%); fraqueza de memória 13 (50%); depressão/choro 12 (46,2%);

enxaqueca 11 (42,3%); inapetência 11(42,3%); secura da pele 10 (38,5%).

A seguir apresentaremos cada sintoma de forma gráfica, a partir dos relatos dos

indivíduos, classificados de acordo com critérios de intensidade propostos pela OMS:

extremamente, bastante, mais ou menos, muito pouco, nada, em duas consultas: primeiro

atendimento e após 14 meses de evolução.

Page 53: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

52

Insuficiência Hepatobiliar

Gráfico 3: Sintomas de insuficiência hepatobiliar referidos pelos 26 indivíduos (100%) no início do tratamento- Extremamente: 10 (38,5%), Bastante: 8 (30,8%), Mais ou menos: 4 (15,4%), Muito pouco: 1(3,8%);

Nada: 3(11,1%) e 14 meses após - Extremamente: 2 (7,7%), Bastante: 8 (29,6), Mais ou menos: 4 (15,4%%), Muito pouco: 5 (18,5%); Nada: 7 (25,9%).

Ansiedade

Gráfico 4: Sintomas de ansiedade referidos pelos 26 indivíduos no início do tratamento-Extremamente: 17

(65,47%), Bastante: 3 (11,5%), Mais ou menos: 0, Muito pouco: 0; Nada: 6 (23,0%); total: 26 indivíduos e 14

meses após -Extremamente: 4 (15,4%); Bastante: 5 (19,2%); Mais ou menos: 1(3,8%), Muito pouco: 8 (30,8%);

Nada: 8 (30,8%). Total 26 indivíduos.

Page 54: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

53

Distúrbio do Sono

0

5

10

15

20

Primeira consulta

14 meses após

Gráfico 5: Sintomas de distúrbio do sono referidos pelos 26 indivíduos no início do tratamento-Extremamente: 7

(26,9%), Bastante: 8 (30,8%), Mais ou menos: 4 (15,4%), Muito pouco: 0; Nada: 7 (26,9%) e 14 meses após -

Extremamente: 2 (7,7%), Bastante: 0, Mais ou menos: 4 (15,4%), Muito pouco: 5 (19,2%); Nada: 15 (57,7%).

Apatia

0

2

4

6

8

10

12

14

Primeira consulta

14 meses após

Gráfico 6: Sintomas de apatia referidos pelos 26 indivíduos no início do tratamento -Extremamente: 11 (42,3%), Bastante: 2 (7,7%), Mais ou menos: 3 (11,5%), Muito pouco: 0; Nada: 10 (38,5%) e 14 meses após -

Extremamente: 1 (3,8%), Bastante: 1(3,8%), Mais ou menos: 7 (26,9%), Muito pouco: 4 (15,4%); Nada: 13 (50,0%).

Page 55: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

54

Artralgia/Mialgia

0

5

10

15

20

Primeira consulta

14 meses após

Gráfico 7: Sintomas de artralgia/mialgia referidos pelos 26 indivíduos no início do tratamento -Extremamente: 6 (23,0%), Bastante: 5 (19,2%), Mais ou menos: 2 (7,7%), Muito pouco: 1 (3,8%); Nada: 13 (50,0%) e 14 meses após -Extremamente: 3 (11,5%), Bastante: 4 (15,4%), Mais ou menos: 1 (3,8%), Muito pouco: 2 (7,7%); Nada:

17 (65,4%).

Fraqueza de Memória

0

5

10

15

20

Primeira consulta

14 meses após

Gráfico 8: Sintomas de fraqueza de memória referidos pelos 26 indivíduos no início do tratamento- Extremamente: 3 (11,5%), Bastante: 7 (26,9%), Mais ou menos: 1 (3,8%), Muito pouco: 2 (7,7%); Nada: 13 (50,0%) e 14 meses após -Extremamente: 0, Bastante: 3 (11,5%), Mais ou menos: 3 (11,5%), Muito pouco: 4

(15,4%); Nada: 16 (61,5%).

Page 56: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

55

Irritabilidade

02468

10121416

Primeira consulta

14 meses após

Gráfico 9: Sintomas de irritabilidade referidos pelos 26 indivíduos no início do tratamento -Extremamente: 8 (30,8%), Bastante: 6 (23,0%), Mais ou menos: 0, Muito pouco: 0; Nada: 13 (50,0%) e 14 meses após -

Extremamente: 0, Bastante: 2 (7,7%), Mais ou menos: 3 (11,5%), Muito pouco: 7 (26,9%); Nada: 15 (57,7%).

Depressão/Choro

0

5

10

15

20

Primeira consulta

14 meses após

Gráfico 10: Sintomas de depressão/choro referidos pelos 26 indivíduos no início do tratamento -Extremamente: 11 (42,3%), Bastante: 1 (3,8%), Mais ou menos: 0, Muito pouco: 0; Nada: 14 (53,8%) e 14 meses após -

Extremamente: 2 (7,7%), Bastante: 0, Mais ou menos: 4 (15,4%), Muito pouco: 3 (11,5%); Nada: 17 (65,4%).

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56

Secura da pele

0

5

10

15

20

Primeira consulta

14 meses após

Gráfico 11: Sintomas de secura da pele referidos pelos 26 indivíduos no início do tratamento Extremamente: 3 (11,5%), Bastante: 4 (15,4%), Mais ou menos: 3 (11,5%), Muito pouco: 0; Nada: 16 (61,5%) e 14 meses após -

Extremamente: 2 (7,7%), Bastante: 1 (3,8%), Mais ou menos: 3 (11,5%), Muito pouco: 2 (7,7%); Nada: 18 (69.2%).

Enxaqueca

0

5

10

15

20

Primeira consulta

14 meses após

Gráfico 12: Sintomas de enxaqueca referidos pelos 26 indivíduos no início do tratamento -Extremamente: 5 (19,2%), Bastante: 1 (3,8%), Mais ou menos: 2 (7,7%), Muito pouco: 2 (7,7%); Nada: 17 (65,4%) e 14 meses

após -Extremamente: 2 (7,7%), Bastante: 0, Mais ou menos: 2 (7,7%), Muito pouco: 4 (15,4%); Nada: 19 (73,1%).

Page 58: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

57

Inapetência

Gráfico 13: Sintomas de inapetência referidos pelos 26 indivíduos no início do tratamento - Extremamente: 1 (3,8%), Bastante: 5 (19,2%), Mais ou menos: 3 (11,5%), Muito pouco: 0; Nada: 18 (69,2%) e 14 meses após -Extremamente: 2 (7,7%), Bastante: 0, Mais ou menos: 3 (11,5%), Muito pouco: 2 (7,7%); Nada: 20 (76,9%).

Comentários

Verificamos após aproximadamente 14 meses de tratamento homeopático, uma

redução da frequência das categorias ‘extremamente’ e ‘bastante’ e um aumento da frequência

das categorias ‘muito pouco’ e ‘nada’, para os sintomas de ansiedade, distúrbio do sono,

artralgia/mialgia, fraqueza de memória, irritabilidade, depressão/choro, secura da pele,

enxaqueca.

Com relação aos sintomas associados à “insuficiência hepatobiliar” e “inapetência”, a

redução verificada não foi satisfatória, segundo a avaliação dos pesquisadores. Esses dois

sintomas apontaram para a introdução de um segundo equalizador hepático.

5.2.1.2 Resultados parciais referentes à avaliação enzimática

Procedeu-se à dosagem das enzimas AST (aspartato aminotransferase), ALT (alanina

aminotransferase) anteriormente denominadas TGO (transaminase glutâmico-oxaloacética) e

Page 59: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

58

TGP (transaminase glutâmico pirúvica) respectivamente , fosfatase alcalina e gamaglutamil

transferase no início do tratamento e em consultas subsequentes com um mínimo de 03

dosagens por paciente. Como a doença é crônica e progressiva, a “estabilidade” nas dosagens

foi avaliada como positiva, em conjunto com “melhora”.

Seguem os gráficos com os resultados consolidados:

Gráfico 14: Evolução de resultados consolidados da enzima AST -Aspartato aminotransferase- (anteriormente denominada TGO) em 23 indivíduos após 14 meses de tratamento: melhoria(10) e estabilidade(5) = > 15

(57,7%%) piora 8 (30,8%); sem medições seriadas 3 (11,5%).

Page 60: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

59

ALT

Melhoria e Estabilidade

Piora

Sem medições

Gráfico 15: Evolução dos resultados consolidados de enzima ALT -alanino aminotransferase- anteriormente

denominada TGP, em 23 indivíduos após 14 meses de tratamento: melhoria 12 e estabilidade 3 => 15 (57,7%);

piora 8 (30,8%); sem medições seriadas 3 (11,5%).

Gráfico 16: Evolução dos resultados consolidados de enzima FALC em 20 indivíduos após 14 meses de tratamento: melhoria 6 e estabilidade 2 => 8 (30,8%); piora 12 (46,2%); sem medições seriadas 6 (23,1%).

Page 61: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

60

Gráfico 17: Evolução dos resultados consolidados de enzima GGT em 22 indivíduos após 14 meses de

tratamento: melhoria 11 e estabilidade 2 => 13 (50%); piora 9 (34,6%); sem medições seriadas 4 (15,4%).

Gráfico 18: Consolidado da evolução de 88 resultados das enzimas AST, ALT, FALC, GGT após 14 meses de tratamento: melhoria e estabilidade 51 (= 58,0%); piora 37(=42,0%).

Page 62: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

61

Comentários

Conforme mencionado anteriormente, como os sintomas associados à “insuficiência

hepatobiliar” e “inapetência” tiveram uma redução insatisfatória, foi iniciado um segundo

equalizador hepático. Tal necessidade foi corroborada ao se analisar a piora nas dosagens da

Fosfatase alcalina. Essa enzima se refere principalmente às vias biliares (juntamente com a

GGT) e vesícula biliar. O segundo equalizador utilizado foi o Chelidonium majus,

selecionado pelos sintomas apresentados pelos indivíduos (que poderiam corresponder às

vias biliares afetadas na patologia).

Para o consolidado dos resultados enzimáticos, considerou-se como o total de

resultados, o que de fato foi medido, excluindo-se o número equivalente às medidas não

realizadas. A comparação entre a melhoria-estabilidade e piora apresentou como divisor a

soma entre essas duas categorias, ou seja 88 resultados. Assim os resultados referentes à

“melhoria e estabilidade das enzimas”, das 04 enzimas avaliadas, correspondem a 58% do

total; a piora ocorreu em 42% dos resultados.

Assim, as dosagens enzimáticas demonstram que a soma dos resultados de melhoria e

estabilidade supera a piora nos resultados, com exceção da fosfatase alcalina, que evoluiu com

piora predominante em 12 dos 20 pacientes (60%) cujos resultados foram avaliados.

5.2.1.3 Levantamento sobre história familiar e pessoal de interação sifilinismo/sicose

Dos 26 indivíduos avaliados nesse estudo, 100% apresentam sifilinismo pessoal e

história familiar confirmando-o como tendência de adoecimento crônico, hereditário

(“diátese”), condição necessária para o desenvolvimento da Hepatite C Crônica. Desses, 19

(73,1%), além do sifilinismo, apresentavam forte história familiar de sicose proliferativa –

diátese fortemente relacionada com o surgimento de tumores benignos e/ou malignos,

conforme demonstrado no gráfico a seguir.

Page 63: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

62

Gráfico 19: Proporção de 73,1 % de indivíduos com sicose familiar: 19 indivíduos de um total de 26 portadores de sifilinismo.

.

5.2.1.4 Discussão sobre os resultados parciais do tratamento homeopático

Verificou-se como resultados preliminares a predominância de melhoria tanto dos

sintomas referidos pelos indivíduos em tratamento como dos sinais objetivos, verificados

através de dosagens de enzimas hepáticas.

Com relação à interação sifilinismo/sicose, como a sicose está presente na história

familiar de 73,1% desses indivíduos, há um sentido de atenção também a essa diátese, devido

ao seu potencial de desenvolvimento de câncer e manifestações extra-hepáticas, com

potencialidade de prevenção para essa evolução clínica.

Page 64: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

63

6 JUSTIFICATIVA

Apesar dos avanços científicos, uma parte substancial da medicina permanece uma

arte, e requer empatia, sensibilidade e habilidade de comunicação.Para Doherty

(1996), a habilidade de compreender e assimilar o fato biológico e científico é

apenas um componente pequeno entre as necessidades do médico. As habilidades

sociais e interpessoais são igualmente necessárias, especialmente onde os serviços

de saúde são baseados na atenção primária e o GP37 controla a interface entre o

paciente e o especialista e o tratamento (Schroeder, 2010, p. 175).

O trabalho em saúde tem como característica o encontro entre pessoas que trazem um

sofrimento ou necessidades e outras pessoas que dispõem de um conhecimento específico ou

de recursos instrumentais que possam solucionar o problema trazido pelos primeiros (SILVA

JR., ALVES, ALVES, 2005).

Blank (1985:11) enfatiza que “o ponto de partida da medicina, tanto historicamente

quanto a cada nova consulta, é o SOFRIMENTO38, o que determina como dever ético

primordial a atenção à terapêutica, para “aliviar sempre, curar quando for possível”

(CAMARGO JR., 2003).

Mas em trabalho de campo com equipes de saúde da família, Capozzolo (2006)

percebeu profissionais médicos com dificuldades de uma escuta ampliada voltada ao

fortalecimento do sujeito nos quais se percebe a “formação de profissionais de saúde sem

recursos tecnológicos para a escuta e afirmação dos usuários revelando uma “preparação

profissional apartada da integralidade e da humanização” (CECCIM; CAPOZZOLO, 2006).

De acordo com a hipótese que embasa este estudo, tais situações ocorrem devido à

compreensão conceitual hegemônica acerca da doença que “permanece materialista,

mecanicista e fragmentária” (CARILLO JR, 2000).

De acordo com Luz (2005), a Homeopatia tem na relação médico-paciente um

elemento fundamental da terapêutica sendo o indivíduo doente o ponto de partida clínico e o

objeto epistemológico básico do sistema homeopático.

37 GP = General practitioner 38 Grifo do autor

Page 65: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

64

As pessoas que desenvolveram adoecimento com lesões orgânicas graves, sem

possibilidade de continuidade do tratamento hegemônico preconizado, como o caso dos

portadores de Hepatite C Crônica que solicitaram atendimento no Serviço de Homeopatia da

ABRAH, cujos prontuários aqui serão avaliados, chegaram ao serviço desesperados,

demandando acolhimento, compreensão e atenção aos seus sofrimentos.

Foi realizada então, uma revisão de trabalhos publicados na Biblioteca Virtual de Saúde

(BVS) sobre o tratamento homeopático e suas especificidades. Infelizmente há poucos

estudos sobre o tratamento da Homeopatia, como demonstraremos adiante.

Foram encontrados trinta e oito trabalhos (relativos ao período de 2003 a 2011) nas

pesquisas realizadas na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) voltadas aos temas: “homeopatia

e integralidade” (sete referências); “homeopatia e autonomia” (cinco referências);

“homeopatia e cuidado” (onze referências); “homeopatia e qualidade de assistência à saúde”

(quinze referências), sendo que alguns trabalhos se encontram como referências cruzadas em

mais de um descritor.

Para “homeopatia e suscetibilidade” foram encontrados cinquenta e nove resultados, o

que demonstra a importância do tema do tratamento de doenças crônicas, no campo de saber

homeopático.

Para “homeopatia e hepatite C crônica” não foram encontradas referências.

Seguem comentários a respeito de intercessões e diferenças entre o enfoque desse

estudo e alguns dos trabalhos apresentados por esses autores.

Em relação ao tema da “suscetibilidade” percebe-se que se apresenta com maior

número de publicações por sua relevância, pois Hahnemann, em seu “Organon da Arte de

Curar”, já vislumbrava o potencial de cura através do tratamento homeopático, conforme

proposto por ele.

Elizabeth Souza (2011) traz a abordagem de Masi Elizalde, autor influente na

homeopatia desenvolvida na Argentina e no Brasil, como a “individualização na totalidade

expressa no composto substancial que constitui o ser humano”. A Psora primária como

sensação imaginária da perda de uma virtude, consequente ao desejo equivocado de possuir

um atributo divino equivalente, levando ao desencadeamento do estado de desequilíbrio ou

enfermidade. A autora se refere ao fato de Masi Elizalde utilizar o pressuposto de que um

medicamento único - simillimum - reequilibraria a energia vital. As doenças crônicas seriam

Page 66: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

65

todas referentes à psora, sendo a sicose e o sifilinismo doenças reativas desse miasma. Esses

conceitos são diferentes dos conceitos propostos na abordagem preconizada por Carillo

Jr.(2000), utilizada no presente estudo, que considera as diáteses como tendências de

adoecimento com fisiopatologias distintas. Essas poderiam interagir entre si, não

representando estados diferentes da mesma forma de adoecimento, mas ao invés disso, seriam

formas de adoecimento distintas.

Bárbara Metzner (2008) faz uma revisão sobre artritismo descrevendo suas

manifestações como fenômenos associados ligados à psora, mas sem um fio condutor

fisiopatológico conforme proposto por Carillo Jr. e descrito no capítulo 3.

Sandra Allegro (2010) chama a atenção para as dificuldades da interpretação de

difíceis e complexos textos clássicos, que levaria muitos dos profissionais formados em

homeopatia a não praticarem a especialidade. A versão comentada do Organon de

Hahnemann da autoria de Carillo Jr. e Pustiglione (1994), que foi utilizada no presente

estudo, facilita a compreensão dos princípios homeopáticos a estudantes e médicos, ao trazer

o “intercâmbio solidário” entre saberes distintos (NASCIMENTO, 2006).

A suscetibilidade ao adoecimento, através da discussão sobre as idiossincrasias, é uma

questão trazida por Hahnemann. Entretanto, as explicações das diáteses por Carillo Jr. são

inéditas, com fisiopatologias distintas definidas e facilitam a compreensão do diagnóstico e

tratamento de doenças, por ser fruto do “intercâmbio solidário” entre o desenvolvimento de

pesquisas científicas e as observações de Hahnemann, assim como de determinados autores

que o seguiram.

“Integralidade e Homeopatia” têm sido associadas em estudos atualmente, visto que a

Racionalidade Médica Homeopática opera em sintonia com o princípio da integralidade.

Conforme já discutido, as Racionalidades Médicas vitalistas a possuem em sua estrutura de

saber.

Loch-Neckel et al (2010) trabalhando com estudantes de farmácia, odontologia e

medicina de uma universidade do Sul do Brasil, concluíram que “os estudantes souberam

correlacionar o atendimento integral ao sujeito à compreensão de suas necessidades a partir de

sua realidade. Constatou-se desconhecimento sobre os pressupostos teóricos da homeopatia e

o não reconhecimento da incorporação da homeopatia no SUS, para a maioria dos

estudantes”. Isso fortalece a necessidade do desenvolvimento de trabalhos de pesquisa que

Page 67: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

66

legitimem a discussão no meio acadêmico sobre os conceitos homeopáticos e resultados

obtidos no atendimento dos indivíduos com a abordagem terapêutica homeopática.

Santanna et al (2008) estudaram o Centro de Saúde Modelo que foi a primeira unidade

do Sistema Único de Saúde (SUS) a implantar o serviço de atendimento homeopático no Rio

Grande do Sul, para conhecer a “contribuição desse atendimento para o desenvolvimento do

princípio da integralidade. Os resultados indicam que a homeopatia, ao acolher e tratar

pessoas em sua singularidade e totalidade permite uma atenção diferenciada. Entretanto, a

integralidade tem sido restrita a alguns de seus aspectos, como o vínculo e o cuidado

diretamente associados à relação médico-usuário. A dificuldade de acesso foi o principal

problema identificado”.

No presente estudo buscou-se preencher essa lacuna percebida por Santanna et al ao se

agregar a evolução clínica obtida com o tratamento homeopático em doença de grande

morbidade tal qual a hepatite C crônica.

Estrela propõe que se busque avaliar a resposta ao tratamento homeopático a partir das

narrativas dos pacientes e médicos:

A realização de estudos como este, que busquem compreender as terapêuticas que incluem as práticas integrativas e complementares no SUS, tal com a homeopatia, a partir do entendimento sobre sua utilização tanto pelos praticantes como pelos usuários pode contribuir para a pesquisa social sobre essas práticas, visando sua efetiva institucionalização no sistema público de saúde no país [...] qual o entendimento de pacientes e de médicos sobre a resposta ao tratamento homeopático, a partir de suas narrativas, visando identificar a existência de relação com os sentidos da integralidade do cuidado (ESTRELA, 2006).

Assim, no presente estudo, realizado de forma retrospectiva, os dados avaliados foram

coletados das narrativas registradas nos prontuários dos indivíduos portadores de Hepatite C

Crônica durante sua participação na pesquisa anterior sobre a avaliação do tratamento

homeopático e que assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Page 68: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

67

7 OBJETIVOS

7.1 OBJETIVO GERAL

Discutir a potencialidade da Homeopatia para o tratamento dos indivíduos portadores

de Hepatite C Crônica, com enfoque no cuidado integral desses sujeitos.

7.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

− Estabelecer paralelos entre o conceito de Integralidade e a abordagem da Homeopatia

Sistêmica.

− Dimensionar os aspectos subjetivos presentes na abordagem homeopática.

− Demonstrar a especificidade do raciocínio terapêutico homeopático, cujo enfoque aponta a

suscetibilidade individual como fator de desenvolvimento da Hepatite C Crônica.

Page 69: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

68

8 METODOLOGIA

Neste estudo utilizamos como estratégia principal a metodologia qualitativa para

dimensionar o cuidado produzido através das consultas homeopáticas, com enfoque nos

sintomas subjetivos de portadores de hepatite C crônica.

Concordamos com o comentário crítico de Camargo Jr. sobre a utilização de critérios

de avaliação de eficácia em racionalidades médicas distintas:

“... é inadequado e impróprio supor que critérios de avaliação de eficácia internos a uma racionalidade sejam imediatamente aplicáveis a outras – por exemplo, tomar-se o ensaio clínico randômico controlado como modelo universal de avaliação de eficácia.” (Camargo Jr., 2008, p. 168)

A estratégia metodológica do presente estudo constou de três etapas que

descreveremos a seguir.

1ª Etapa

Levantamento dos prontuários dos indivíduos portadores de hepatite crônica associada

ao vírus da hepatite C, tratados pela Homeopatia Sistêmica, correspondentes aos primeiros

quatorze meses de evolução, da primeira etapa da pesquisa “Avaliação do Tratamento

Homeopático de Pacientes Portadores de Hepatite C”.

2ª Etapa

Análise da evolução dos casos de portadores de Hepatite C Crônica que aderiram ao

tratamento homeopático (e também os casos de abandono), através dos relatos contidos nos

prontuários desses indivíduos onde serão relacionadas as suas falas mais significativas a partir

da “ análise de conteúdo” desenvolvida por Bardin (BARDIN, 1979 apud GOMES, 2009)

cuja definição reproduziremos a seguir:

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69

... conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por

procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens,

indicadores (quantitativos ou não) que permitem a inferência39 de conhecimentos

relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens

(GOMES, 2009).

Gomes (2009) sugere como metodologia da análise de conteúdo, a decomposição do

material em partes, com sua distribuição em categorias que reúnem um grupo de elementos

sob um título genérico – as “unidades de registro” (BARDIN, 1979, in GOMES, 2009); a

descrição dos resultados da categorização e inferência dos mesmos, com o auxílio da

fundamentação teórica para sua interpretação.

Para analisarmos o discurso dos indivíduos em tratamento homeopático, utilizamos

quatro categorias analíticas principais, determinadas previamente: adesão, resgate da

subjetividade, autonomia, mudança de dinâmica vital.

Essas categorias foram escolhidas com base nas discussões propostas pela área de

Saúde Coletiva sobre o conceito de “integralidade do cuidado”, na definição de saúde

proposta por Hahnemann e no estudo de Estrela (2006).

A “boa prática médica” (MATTOS, 2004, 2011) seria um dos princípios da

integralidade, sendo o “cuidado” proposto como seu fio condutor (MERHY, 1997). O

encontro entre sujeitos pressupõe o resgate da subjetividade, considerado como um “caminho

para a integralidade” (NOGUEIRA, 2010). Esse ocorre quando a relação médico- paciente,

fortalecida pelo “vínculo, responsabilização e humildade” (CAMARGO JR. 2003), favorece a

adesão ao tratamento, o que possibilitaria a resolubilidade do sofrimento do indivíduo que

traz o problema emergente, pelo profissional que o acolhe (SILVA JUNIOR et al, 2005).

Assim, esse usuário do serviço de saúde, tendo sido acolhido em suas necessidades, teria sua

autonomia fortalecida (MERHY, 1997). Tal virtude o capacitaria a inventariar suas

possibilidades de vida, com modificação de sua Dinâmica Vital (ESTRELA, 2006), pela

descoberta do melhor sentido para “alcançar os altos fins de sua existência” (HAHNEMANN,

[1810 – 1921?]).

39 Inferência: “ Quando deduzimos de maneira lógica algo do conteúdo que está sendo analisado” (GOMES, 2009).

Page 71: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

70

I – Adesão

Derivada de fatores como vínculo efetivo com algum profissional

(longitudinalidade do atendimento) com “o estabelecimento de uma relação contínua no

tempo, pessoal e intransferível, calorosa – encontro de subjetividades” (CECÍLIO, 2001),

assim como a questão do acesso ao fornecimento de medicamentos gratuitos através da

Farmácia Universitária da UFF e ao local de atendimento.

Para a análise dessa categoria, foram selecionados sete unidades de registro:

frequência às consultas; utilização dos medicamentos; relação pelo participante entre o uso do

medicamento e sua evolução clínica; melhoria clínica; percepção pelos participantes da

pesquisa da sensação de acolhimento por seu médico demonstradas por expressões afetivas;

acesso aos medicamentos de forma gratuita e o acesso ao local de atendimento.

II – Resgate da subjetividade

É uma categoria inerente à própria doutrina médica da Homeopatia, que permite que o

indivíduo doente possa ser visto de forma integral.

Foram utilizadas como unidades de registro para avaliarmos o regaste da

subjetividade, o encontro no prontuário da transcrição, feita pelo médico, das palavras do

próprio indivíduo que utiliza a primeira pessoa do singular durante o diálogo na consulta, pois

na técnica da anamnese homeopática as palavras do próprio indivíduo são utilizadas como

registro, para que se obtenha maior fidelidade à sua descrição “do como se sente”; a

existência de relato no prontuário de sintomas raros, estranhos e peculiares; e dos sintomas

modalizados.

III – Autonomia

Page 72: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

71

A “autonomia do usuário” é uma importante categoria nos estudos da área de saúde

coletiva pois se refere “a uma maior capacidade dos sujeitos compreenderem e agirem sobre

si mesmos e sobre o contexto...” (CAMPOS, 2006 apud VIDAL p. 20).

Foram utilizadas duas unidades de registro retiradas dos relatos dos indivíduos a

partir do tratamento homeopático. A primeira se referiu à melhoria sintomática no processo de

recuperação da saúde física e psíquica e que permite o que foi considerada a segunda unidade

de registro – o retorno às atividades sociais.

IV – Mudança de Dinâmica Vital

A Mudança de Dinâmica Vital, segundo Estrêla (2010), seria a mudança de atitude

da pessoa frente à vida, ou seja, uma mudança interna de padrão.

Como unidades de registro, consideramos depoimentos sobre mudança de emprego;

mudança de relações afetivas; programação de atividades não pensadas antes do tratamento

homeopático, possíveis pelo reconhecimento pelo indivíduo de outras aptidões pela

capacidade de inventariar-se adquirida com o tratamento homeopático.

3ª Etapa

Análise quantitativa descritiva dos dados avaliados, através de uma representação

gráfica das categorias selecionadas e dos medicamentos utilizados.

Page 73: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

72

9 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS

9.1 PERFIL DOS PARTICIPANTES DA PESQUISA

A fim de que o anonimato dos participantes da pesquisa seja preservado, as pacientes

do sexo feminino receberam nomes de flores, e os do sexo masculino nomes de árvores. As

profissões foram excluídas, pois o grupo é pequeno e determinadas especificidades levariam à

identificação dos participantes.

Os resultados de biopsias hepáticas a que tivemos acesso foram transcritos, como

exemplos de comprometimento hepático de alguns dos participantes, ressaltando-se que a

maioria dos resultados correspondem a períodos anteriores ao início da realização da

pesquisa. A classificação histológica da fibrose e atividade necroinflamatória corresponde à

escala METAVIR: a fibrose é graduada em uma escala de cinco pontos, de zero a quatro. A

atividade de lesões necroinflamatórias é graduada em uma escala de A0 a A3 (Kaplan MM,

Bonis PA, Malet, PF., 2009).

9.1.1 Tabela: escala METAVIR

FIBROSE ATIVIDADE NECRO-INFLAMATÓRIA

F0 = sem fibrose A0 = nenhuma atividade

F1 = fibrose dos espaços porta, sem septo. A1 = atividade leve

F2 = fibrose dos espaços porta, poucos septos A2 = atividade moderada

F3 = numerosos septos fibrosados sem

cirrose

A3 = atividade severa

F4 = cirrose //

Page 74: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

73

9.1.2

Tabela: Adesão ao tratamento

Nomes Sexo Idade

FORMA PROVÁVEL DE CONTÁGIO

TEMPO PROVÁVEL DE INFECÇÃO PELO VIRUS

Alguns resultados de biopsias hepáticas

1 AÇUCENA F 54 Transfusão de sangue 28 anos

2 ANGÉLICA F 47 Transfusão de sangue 28 anos A3F3(2005)

3 BROMÉLIA F 59 Não sabe Não sabe

4 CAMÉLIA F 62 Transfusão de sangue 25 anos

5 CAMOMILA F 60 Transfusão de sangue 30 anos

6 CARVALHO M 47 Acidente 12 anos A1F2-3(2004)

7 CIPRESTE M 46 Transfusão de sangue 20 anos

8 CRYSÂNTEMO F 64 Transfusão de sangue 30 anos A2F2(2006)

9 DÁLIA F 65 História de cirurgias anteriores Não sabe A3F4(2009)

10 FLOR DE LIS F 55 Transfusão de sangue Não sabe A2F3(2008)

11 GARDÊNIA F 55 Transfusão de sangue 29 anos A3F4(2007)

12 GIRASSOL F 62 Transfusão de sangue 35 anos A2F3(2005)

13 HORTÊNSIA F 54 Transfusão de sangue 26 anos

14 JASMIM F 53 Transfusão de sangue 18 anos A2F3(2008)

15 LÍRIO F 47 Transfusão de sangue 29 anos A2F3(2004)

16 LOTUS F 57 Transfusão de sangue 21 anos

17 MARGARIDA F 56 Acidente com material perfurante

30 anos A2F3(2006)

18 MYOSÓTIS F 53 Transfusão de sangue 30 anos

19 ORQUÍDEA F 57 Transfusão de sangue 26 anos A3F3(2006)

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74

9.1.3 Participantes que abandonaram o tratamento homeopático

N Nomes Sexo Idade Forma provável de contágio

Tempo provável de infecção pelo virus

Número de consultas

Resultados de biopsias hepáticas

1 ACÁCIA F 58 Provavelmente cirurgia

30 anos 01

2 AZALÉIA F 64 Transfusão de sangue

30 anos 01

3 AMENDOEIRA F 55 Provavelmente cirurgia

20 anos 02

4 CEREJEIRA F 53 Provavelmente cirurgias

Não sabe 03 A1F2(2004)

5 FLAMBOYANT F 46 Não sabe Não sabe 03

6 IPÊ M 50 Não sabe Não sabe 01

7 GERÂNIO F 56 Transfusão de sangue

30 anos 03 A3F4

8 LIMOEIRO F 61 Transfusão de sangue

30 anos 01

9 PESSEGUEIRO M 55 Não sabe Não sabe 01

20 PAEÔNIA F 61 Não sabe Não sabe A2F3 (2001)

21 PETÚNIA F 54 Transfusão de sangue 17 anos

22 STELLARIA F 42 Transfusão de sangue 07 anos

23 TULIPA F 48 Transfusão de sangue 18 anos A2F3 (2006)

24 VERBENA F 61 Não sabe Não sabe

25 VINCA F 62 Transfusão de sangue 27 anos

26 VITÓRIA REGIA

F 55 Transfusão de sangue 30 anos

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75

Percebe-se pela distribuição de gênero a predominância do sexo feminino. Dos 35

participantes da pesquisa, trinta e um são do sexo feminino (81,6%) e quatro são do sexo

masculino (11,4%).

Pela idade dos participantes e longa duração da doença, vinte e três participantes

(65,7%) atribuem às transfusões de sangue a fonte de contágio o que está de acordo com a

epidemiologia da hepatite C crônica citada anteriormente “ nas décadas de 70, 80 a principal

via de transmissão era por hemotransfusão”. Quatro (11,4%) referem cirurgias anteriores;

seis (17,1%) não sabem a forma de contágio; dois (5,7%) relatam acidentes. Atualmente a

principal fonte seria o uso de drogas intravenosas (FERRAZ; LEMOS, 2004, p. 47).

O Consentimento Livre e Esclarecido (CLE) foi solicitado a vinte e oito participantes

da pesquisa anterior “Avaliação do Tratamento Homeopático para Portadores de Hepatite C”,

para a utilização dos seus relatos presentes nos prontuários.

Desses vinte e cinco consentiram formalmente, assinando o Termo de CLE cujos

relatos foram utilizados no presente estudo. Dois participantes deram o consentimento após se

inteirarem do pedido, mas não conseguimos nos encontrar para que a assinatura pudesse ser

feita e por isso agradecemos, mas não pudemos utilizar seus relatos. Um participante não

permitiu a utilização.

Assim, serão analisados nas quatro categorias escolhidas, os relatos de vinte e dois

participantes. A ausência de relatos de quatro participantes se deve a três questões: ao fato de

a pesquisadora não ter conseguido se encontrar com dois dos participantes para a assinatura

do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido; ao falecimento de uma das participantes

por motivo alheio à evolução da hepatite C crônica, e a impossibilidade de contato telefônico

com uma das participantes para o procedimento do pedido de consentimento livre e

esclarecido necessário para o presente estudo. Dois participantes que deram seu

consentimento para o presente estudo abandonaram o tratamento, sendo possível a avaliação

dos mesmos na categoria adesão - abandono do tratamento.

Page 77: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

76

9.2 DISCUSSÃO DOS RELATOS A PARTIR DAS CATEGORIAS ANALÍTICAS

9.2.1 Adesão

A adesão do paciente a uma determinada terapia depende de vários fatores que

incluem, dentre outros, os relativos à relação médico-paciente, às questões

subjetivas do paciente, às questões referentes ao tratamento, à doença, ao acesso ao

serviço de saúde, à obtenção do medicamento prescrito e à continuidade do

tratamento (MANFROI; OLIVEIRA, 2006, p. 165).

A abordagem terapêutica dos indivíduos portadores de hepatite C crônica

correlaciona-se com diferentes concepções do que seria “doença” e “cura” de acordo com as

distintas racionalidades médicas.

De acordo com Camargo Jr. (2003), na biomedicina se considera que a doença

equivale às lesões orgânicas diagnosticadas. Nessa concepção a hepatite C crônica teria

origem exclusivamente externa – infecciosa viral - que também poderia originar

manifestações extra-hepáticas. Dessa maneira, a proposta de tratamento seria a redução da

carga viral definindo-se a cura como carga viral mantida negativa por 6 ou 12 meses após o

tratamento, tempo definido conforme a resposta do indivíduo aos medicamentos, segundo

informações contidas no consenso Infectious Disease Clinics Of North America (2012). A

biopsia hepática é considerada padrão ouro para a instituição da terapêutica. Como nessa

perspectiva a doença viria de fora, o indivíduo não seria o principal foco do tratamento.

Além disso, os medicamentos apresentam toxicidade gerando dois problemas: a

doença é diagnosticada mas não sendo grave o suficiente para justificar o risco dos efeitos

colaterais da terapêutica, o tratamento não é iniciado. O indivíduo é instruído sobre o

problema e pode reagir com desalento conforme relatado por Lotus que era assintomática,

tendo descoberto ser portadora do vírus em exames de rotina.

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77

“O médico que me atendeu “me colocou no caixão”: que a doença era grave, que a cura era difícil... chorei meses. Muito cansaço. Fiquei deprimida, não saía de casa” ( Lotus).

Caso o indivíduo apresente lesões muito graves ou as desenvolva por efeitos

colaterais dos medicamentos preconizados – interferon peguilado, ribavirina, inibidores de

protease (2012), não poderá fazer uso dessa terapêutica. O indivíduo é deixado sem qualquer

perspectiva de melhoria ou cura através do tratamento medicamentoso, restando-lhe apenas o

transplante caso evolua com gravidade.

Iniciei tratamento c/ interferon e ribavirina em 2005 – evoluí com anemia,

emagrecimento – tive que interromper o tratamento 9 meses depois. Até hoje,

apenas fazendo acompanhamento... Ultimamente seguro as lágrimas… (Açucena)

Quando descobri o vírus, fiquei louca! Quero saber a verdade. Isso é grave? É grave. Mata? Mata... Só consegui fazer o tratamento por 05 meses. Passei muito mal. Na primeira aplicação sangramento gengival. Parecia que havia entrado em máquina de moer - “carnes moles”. Febre. Dor por todo o corpo. Parecia pancada no corpo. Coceira insuportável. Plaquetas caindo muito. Sangramento aumentando. Sangrava toda a gengiva: febre direto. Um dia, falta de ar – parecia que o pulmão estava crescendo. Plaquetas 42.000. Sangrava direto. Interrompi o tratamento de imediato. Aí eu já não falava direito, não enxergava direito. Ao parar o tratamento, fui mellhorando (Jasmim).

Acrescente-se o que Araújo (2008) pondera ao discutir sobre o efeito da abordagem

de indivíduos enfermos quando se exclui a subjetividade:

... a percepção do doente sobre sua enfermidade inúmeras vezes não coincide com a

doença lesional ou orgânica diagnosticada pelo médico, o que pode explicar os

motivos de descontinuidade e falta de adesão aos processos terapêuticos. Ao

perceber que o médico frequentemente não valoriza ou não valida suas queixas,

aborta-se a possibilidade do vínculo e o tratamento não se instaura (ARAÚJO,

1999).

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78

Por outro lado, na Homeopatia, Hahnemann estabelece nos parágrafos 7, 8 e 9 do seu

“Organon da Arte de Curar”, que cada caso de doença seria conhecido pela totalidade de

sintomas apresentados pelo indivíduo e que a cura obtida pelo medicamento homeopático

seria o processo de remoção dos mesmos. Tal feito levaria a que todas as partes do organismo

passassem a interagir harmonicamente, “tanto com respeito às sensações como às funções”,

permitindo ao “espírito dotado de razão que habita em nós, (...) empregar esse instrumento

vivo e sadio para os mais altos fins de nossa existência” (HAHNEMANN apud

PUSTIGLIONE e CARILLO JR, 1994).

Em 2008, com o conhecimento de ter em seu quadro indivíduos sem possibilidade

terapêutica pela biomedicina, a liderança do Grupo Gênesis - ONG de apoio ao portador do

vírus da hepatite C, reconhecida e legitimada pelos seus associados, soube da satisfação da

frequentadora do grupo Otimismo-RJ com relação a seu tratamento homeopático oferecido

pela ABRAH no HUAP. Intermediou então, junto à coordenação do ambulatório da ABRAH,

o acompanhamento homeopático para esses indivíduos que apresentavam necessidade urgente

de acolhimento tanto para seus sofrimentos como para resolubilidade para as consequências

de lesões já estabelecidas em seus organismos, dentre elas fibrose e cirrose hepáticas,

urgência essa perceptível em seus discursos durante as consultas homeopáticas realizadas.

Com o estabelecimento da dinâmica dos atendimentos, Gardênia que recebeu

transfusão de sangue contaminado durante o parto há 29 anos e havia sido tratada com

interferon peguilado e ribaverina por 6 meses sem negativar a carga viral, trouxe o sentimento

de alegria e segurança através do relato do médico assistente no prontuário: “muito feliz

porque agora tem alternativa de tratamento – sente-se segura porque voltou a ter referência e

esperança de melhora”.

“Antes era como estar à deriva” (Gardênia).

Em seu artigo “Racionalidades Médicas e Integralidade” Tesser e Luz (2008)

ponderam que:

Page 80: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

79

Os doentes esperam e valorizam um compartilhamento simbólico e um acolhimento

emocional na relação com o curador pois permite a reorganização simbólica

juntamente com o tratamento... Mas os doentes têm uma perspectiva pragmática... o

que interessa para o doente é uma resolução favorável de seus sofrimentos e

adoecimentos ... Ele quer ser curado e satisfaz-se com sentir o compromisso na

intenção e ação do curador, aderindo ao tratamento sem exigir explicações

pormenorizadas dessa ou daquela natureza. O curador detém uma expertise própria

que lhe permite interpretar as queixas do doente, reorganizar o vivenciado dando

sentido a ele e executar ações em saúde-doença, preventiva e/ou terapêuticas

(TESSER; LUZ, 2008, p. 197).

Em seu artigo “Homeopatia: uma abordagem do sujeito no Processo de Adoecimento”

(2008), Araújo considera que:

A sistemática de consultas programadas que caracteriza a continuidade inerente ao processo terapêutico homeopático, fortalece o vínculo e favorece o desenvolvimento de uma ‘aliança terapêutica’ entre paciente e médico. Este fato torna possível a existência de um projeto de recuperação da saúde, o que por si só pode ser considerado um fator mobilizador do processo curativo.”

Lírio - 4 meses de tratamento: “Foi Show!” Minhas enzimas reduziram bonito! 14

meses de tratamento: chegou a pensar de não vir hoje. Mas caiu em si e descobriu que ainda

não chegou a minha hora – preciso continuar. Levanto a cabeça e sigo em frente.

Outro aspecto considerado por Araújo (2008) é o tempo de duração da consulta

homeopática:

A disponibilidade de tempo durante a consulta, permitindo maior espaço para a conversa e para a escuta, constitui-se em componente do vínculo e pode ser destacada como fator que proporciona outra dimensão ao atendimento, importante tanto para o paciente como para o trabalho do médico (ARAÚJO, 2008).

No caso dos indivíduos da pesquisa, cada consulta transcorria durante

aproximadamente uma hora.

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80

O acesso ao fornecimento gratuito de medicamentos foi garantido através da

Farmácia Universitária da UFF.

O local de atendimento já era previamente conhecido pelos participantes da pesquisa,

pois esses são acompanhados pelo Serviço de Hepatologia do HUAP nas mesmas salas que

são utilizadas pela ABRAH para as consultas homeopáticas.

Assim a categoria “adesão ao tratamento” no presente estudo enfatizou

principalmente a avaliação da relação médico–paciente através da “longitudinalidade” do

atendimento - “o estabelecimento de uma relação contínua no tempo pessoal e intransferível,

calorosa – encontro de subjetividades” (CECÍLIO, 2001) entre o indivíduo e o profissional.

As unidades de registro para sua análise foram:

- a transcrição no prontuário pelos médicos durante a consulta, do discurso dos

participantes da pesquisa, evidenciando silêncios e intensidades. Esse acolhimento foi

percebido pelos indivíduos, que se comunicavam expressando-se afetivamente demonstrando

com clareza seus sintomas, sentimentos e afetos.

- a frequência às consultas: foram consideradas como abandono de tratamento os

indivíduos que tiveram até 03 consultas nos 14 meses avaliados. A frequência em 04

consultas foi considerada irregular, pois o intervalo entre elas foi maior do que o preconizado

no tratamento (retorno de 3 em 3 meses), mas houve vínculo com o serviço e por isso esses

indivíduos foram considerados como tendo aderido ao tratamento homeopático, assim como

os de frequência acima, até 07 consultas.

- a capacidade do usuário em utilizar os medicamentos prescritos;

- a relação feita pelo usuário entre a evolução clínica e o uso dos medicamentos

homeopáticos.

- os resultados do tratamento homeopático verbalizados através dos relatos de

sintomas e atitudes e avaliados pelos médicos.

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81

Seguem os relatos dos participantes da pesquisa com a discriminação das unidades

de registro de análise da adesão ao tratamento homeopático – transcrição afetiva dos relatos,

frequência às consultas; utilização dos medicamentos; relação pelo participante entre o uso do

medicamento e sua evolução clínica e evolução clínica.

Açucena: 3 meses de tratamento...quando tomo bórax (medicamento homeopático

prescrito) melhora. 6 meses de tratamento: Comprei óculos novos e quero passar

batom. 14 meses de tratamento: agora estou calmíssima...(sorri) cansaço? bem

melhor; joelho: passou, não estou sentindo nada. Até o inchaço não tenho mais;

as dores (no hipocôndrio) não sinto mais. Aquela sensação de mal estar e

estômago cheio não sinto mais. Sinto apetite.

� Boa frequência às consultas (sete).

� Uso adequado dos medicamentos.

� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o tratamento homeopático.

� Melhoria clínica.

Angélica: 3 meses de tratamento: cefaléia: tinha melhorado - há duas semanas

sem o remédio ela piorou. Oscilo muito – hoje estou bem leve; amanhã bate uma

tristeza. 6 meses de tratamento: Leva mais tempo para ter a “sensação de um

lado da cabeça funcionando e outro não”. Estou corujando ele ... – dá alegria e

motivação... dá vontade de fazer as coisas. 13 meses de tratamento: Há dias que

me sinto bem melhor, porém cansada. Tem dia que estou mais expansiva,

conversando mais... querendo caminhar a partir desse mês...

� Boa frequência às consultas (cinco).

� Uso adequado dos medicamentos.

� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o tratamento homeopático.

� Melhoria clínica.

Page 83: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

82

Bromélia: Difícil tomar a medicação.. Estava tomando errado. Tomava a receita

inteira três vezes ao dia. 3 meses de tratamento: melhorei da tosse e do engasgo.

Melhorei da irritabilidade: estou uma bênção! 7 meses de tratamento: Estou

melhorando. Teve um dia que acordei e a mente clara! Parecia que eu estava

boa! Tem hora que a gente sente tão bem...!

� Frequência irregular às consultas (quatro).

� Uso inadequado dos medicamentos.

� Referência sobre o uso da medicação sem relação direta entre a evolução do

quadro clínico e o tratamento homeopático.

� Melhoria clínica

Camélia: 3 meses de tratamento: apesar da piora das varizes não evoluiu mais

com erisipela. 8 meses de tratamento: as dores estão diminuindo.13 meses de

tratamento: dores no corpo, coceira, alergia. As varizes coçam muito! E agora no

corpo todo! Parece que os ossos estão esgotados. Não trabalhe tanto e tão

cansada...

� Boa frequência às consultas (cinco).

=> Uso adequado dos medicamentos.

=> Sem referência ao uso dos medicamentos.

=> Piora clínica.

Camomila: 03 meses de tratamento: diminuí agitação nas pernas. Percebo que

estou falando mais (trabalhando melhor a empatia). 9 meses de tratamento: Ela

tem que fazer sim...! Antigamente eu ficava com aquela raiva! Agora consigo

ficar bem comigo mesma. OBS: a partir do 19º mês de tratamento consegue

relacionar os sintomas ao medicamento homeopático: o phosphorus me ajuda

bastante. Durmo bem com o Phosphorus.

� Boa frequência às consultas (cinco).

Page 84: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

83

� Uso adequado dos medicamentos.

� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o tratamento homeopático.

� Melhoria clínica.

Carvalho: 3 meses de tratamento: melhora do aspecto da urina. 4 meses de

tratamento: melhorou da prostração; fica mais animado para fazer as coisas;

melhorou muito do humor. 7 meses de tratamento: mais ativo, mais disposto.

Trabalhando muito. 11 meses de tratamento: no trabalho assumindo tarefas extras.

Mais atento!

� Boa frequência às consultas (cinco).

� Uso adequado dos medicamentos.

� Sem referência direta à relação entre o quadro clínico e a medicação homeopática

� Melhoria clínica

Cipreste: 3 meses de tratamento: melhora da disposição, das dores articulares, dos

tremores de extremidades. Pensando em voltar a estudar – estou montando o

plano. Estou mais confiante. 7 meses de tratamento: Tenho dormido mais

relaxado. Bastante disposição.

� Boa frequência às consultas (cinco).

� Uso adequado dos medicamentos.

� Sem referência direta à evolução do quadro clínico e o tratamento homeopático.

� Melhoria clínica.

Crysântemo: 3 meses de tratamento: não dormi. Tenho depressão. Choro à toa. 6

meses de tratamento: Quando perguntam como estou começo a chorar. Esqueço

as coisas. 9 meses de tratamento: melhorou a tendinite, melhorou a secreção

Page 85: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

84

esbranquiçada. Esqueço as coisas, mas fico insistindo até lembrar. Não usou

iodium, allium sativum, argentum nitricum: esqueceu! 10 meses de tratamento:

Melhora da gastrite. Não sinto mais nada!

� Boa frequência às consultas (seis).

� Uso inadequado dos medicamentos.

� Não refere a relação entre evolução clínica e o uso dos medicamentos homeopáticos.

� Melhoria clínica aquém do previsto por não conseguir tomar adequadamente os

medicamentos.

Dália: 3 meses de tratamento: dormindo melhor. Compulsão para comer. No

calcanhar as rachaduras pararam. 6 meses de tratamento: um desastre! Mal

estar no estômago; câimbras; dores nas articulações! Os sibilos melhoraram

muito com a homeopatia. 10 meses de tratamento: Irritabilidade: melhorou muito!

Achei que o remédio tem sonífero (dá risada).13 meses de tratamento: sinto o

sono, que antes não sentia. Pele: sem prurido. Apetite: melhorou do excesso, mas

ainda ansiosa.

� Boa frequência às consultas (seis).

� Uso adequado dos medicamentos.

� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o tratamento homeopático.

� Melhoria clínica

Gardênia: Primeira consulta: Não me imagino mais com homem...3 meses de

tratamento: Emocionalmente: “Maravilhosa”!!! estou amando...! é um ex..paixão

muito antiga. Sou muito ansiosa. a pressão está beleza... minha PA tem estado

130x90. Sem cansaço. Me sinto bem. Não sei ficar parada. Memória boa. Estou

bem compreensiva com os filhos. Eu atrapalhava . Agora bem mais calma.. agora

mais tranquila. Ajudo muita gente que precisa de mim.

Page 86: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

85

� Boa frequência às consultas (seis).

� Uso adequado dos medicamentos.

� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o

tratamento homeopático.

� Melhoria clínica.

Girassol: 15 meses de tratamento: desanimada, vontade de largar tudo! A vida

não tem sentido. Desanimada para trabalhar.

� Boa frequência (cinco)

� Uso adequado dos medicamentos

� Sem referência à medicação

� Sem melhoria clínica

Hortênsia: 2 meses de tratamento: Só uma vez dor de cabeça, forte. De modo

geral, bem. Se eu passar dias tranquilos, fazendo só o que gosto, não sinto nada.

Uma beleza! Rouquidão e choro quando fala de si (chora de novo). Memória:

melhorou um pouquinho. Consigo me lembrar de coisas que antes não lembrava.

Tive oportunidade de ficar muito estressada, mas lidei com isso bem. 8 meses:

tremor no corpo passou. Confusão na fala passou totalmente. Notei que a

impaciência retorna no final do intervalo da Ignatia. (obs: medicamento Ignatia

amara prescrito por 15 dias alternando-se com intervalo de 15 dias)

� Boa frequência (cinco).

� Uso adequado dos medicamentos

� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o

tratamento homeopático.

� Melhora clínica.

Page 87: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

86

Jasmim: 3 meses de tratamento: Fiz a medicação – resposta positiva. Eu estava

tensa, impaciente - a compulsão por comer diminuiu bastante – gostei muito

desta resposta à medicação. Consigo dormir em qualquer posição, não sinto mais

falta de ar deitada sobre o lado esquerdo.

� Boa frequência às consultas (seis).

� Uso adequado dos medicamentos.

� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o tratamento homeopático.

� Melhora clínica.

Lírio: 4 meses de tratamento: “Foi Show!”Minhas enzimas reduziram bonito! 14

meses de tratamento: refere melhora quase que completa (do sintoma) após a

introdução da Euphrasia 6 CH.

� Frequência irregular às consultas (quatro).

� Uso adequado dos medicamentos.

� Referência ao uso da medicação e evolução clínica.

� Melhoria clínica.

Lotus: 3 meses de tratamento: sentindo-se bem, melhorou muito do cansaço e do

peso nas pernas. Memória ainda dando rateadas. 6 meses de tratamento: dor no

peito. Se envolveu muito com sofrimento – quero abraçar o mundo com as pernas.

Sempre fui assim. Me revolto com a indiferença dos outros.

� Boa frequência às consultas (cinco).

� Uso errático dos medicamentos.

� Sem referência espontânea à relação entre evolução clínica e os medicamentos homeopáticos.

� Melhoria clínica

Page 88: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

87

Margarida: 3 meses de tratamento: Melhorei bastante com a medicação. 6 meses

de tratamento: O ânimo: tenho andado muito cansada. Querendo tomar

vitaminas. Memória: melhorei bastante. O relacionamento em casa melhorou

bastante. Trabalho melhorou. Sem stress, sem aborrecimento. Sem vontade de

chorar.

� Boa frequência às consultas (seis).

� Uso adequado dos medicamentos.

� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o tratamento homeopático.

� Melhoria clínica.

Miosótis: 15 meses de tratamento: os remédios vão chegando a um período que os

efeitos são mais rápidos. Aquelas dores que eu sentia na barriga, quase não sinto

mais. Tenho andado muito. Essa semana saí a semana toda. Remédio milagroso...

o remédio é muito bom... e tonteira?? Antes a cabeça rodava. Agora não tenho

tido tonteira.

� Boa frequência às consultas (cinco).

� Uso adequado dos medicamentos.

� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o

tratamento homeopático.

� Melhoria clínica.

Paeônia: 3 meses de tratamento: Observei que com a medicação tive melhora na

concentração, estou lembrando mais dos compromissos. 6 meses de tratamento: A

homeopatia aumenta minha energia.

� Boa frequência às consultas (cinco).

� Uso adequado dos medicamentos.

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� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o tratamento homeopático.

� Melhoria clínica.

Petúnia: Sou muito severa em meus julgamentos. Sou inquieta, não consigo ficar

parada, preciso ler, ficar andando, ir para o computador. Eventualmente lapsos

de memória – dependo de agenda pra tudo, faço muita coisa junta ao mesmo

tempo. 3 meses de tratamento: melhora da insônia, dormindo bem! Passei o Natal

feliz, em paz, com tranquilidade, no silêncio. O cabelo está crescendo. Super feliz

por isso.

� Boa frequência às consultas (cinco).

� Uso errático dos medicamentos.

� Sem referência à relação entre a evolução clínica e os medicamentos

homeopáticos.

� Melhoria clínica.

Stellaria: 1 mês de tratamento: Depois do início do tratamento, melhorei

bastante, dormindo melhor; prisão de ventre melhorou muito. 4 meses de

tratamento: Tensa durante o dia. Medo .... vou ficar envolvida com outras coisas.

7 meses de tratamento: Sem câimbras. ... ajudando, mas sem esquentar a cabeça.

Estou mais tranquila. Relacionamento em casa está bom. 14 meses de tratamento:

Não sinto fome. Medo de engordar. Medo de doença. Trabalhando, ajudando às

pessoas. Quando posso vou à praia. Não quero me magoar esse ano.

� Boa frequência às consultas (seis).

� Uso inadequado dos medicamentos (a partir do oitavo mês de tratamento.)

� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o

tratamento homeopático.

� Melhoria clínica.

Page 90: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

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Tulipa: Falta de ar, desânimo, dor nos ossos, no frio piora. Faço o serviço todo.

Cansaço por dentro. Se eu ficar nervosa, eu fico rouca. Aborreço, perco a voz.

Vontade de respirar e prende por dentro. 3 meses de tratamento: melhor. Saindo.

Antes eu não saía para nada. O nervoso é mais interno. Não sou de soltar. 6

meses de tratamento: Barriga desinchou mais. Me senti bem melhor da parte

digestiva com a Ignatia. (obs: Ignatia amara medicamento homeopático.) Sinto

que no intervalo volto a piorar. 15 meses de tratamento: Irmão internado. Stress

mais cansaço. Diminuiu bastante a dor no estômago, bastante! Agora é só de vez

em quando. Cansaço: reduziu bastante, mas ainda tenho. Dores nas pernas

diminuíram mais. Por causa da arnica. Sem dores na sola do pé! Sumiu! Dor de

cabeça diminuiu bastante.

� Boa frequência às consultas (cinco).

� Uso adequado dos medicamentos.

� Referência à associação direta entre a evolução do quadro clínico e o

tratamento homeopático.

� Melhoria clínica.

Vinca: 3 meses de tratamento: já não estou mais com aquela canseira. A unha

começou a crescer e os cabelos pararam de cair. Hoje vou dançar. Adoro

dançar! 13 meses de tratamento: ótima com a disposição de sempre.

� Boa frequência às consultas (cinco).

� Uso adequado dos medicamentos

� Sem fazer relação entre os medicamentos e a evolução clínica.

� Melhoria clínica.

9.2.1.1 Abandono do tratamento

Page 91: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

90

Neste tópico analisamos a situação de indivíduos que abandonaram o tratamento após

uma, duas ou três consultas.

Pela dificuldade de se fazer novo contato para obtenção do Consentimento Livre e

Esclarecido tivemos apenas os relatos de dois participantes.

Acácia, Azaléa, Ipê, Copo de Leite e Oliveira foram à primeira consulta.

Gerbera foi à duas consultas.

Flor de Cerejeira, Hibiscus, Gerânio frequentaram três consultas.

- Casos que abandonaram o tratamento após três consultas e que permitiram através do

consentimento livre e esclarecido a divulgação de seus relatos:

Flor de Cerejeira: crises de dores no corpo. Se eu ficar parada as dores pioram.

A sola do pé dói de manhã ao levantar. Estou usando antidepressivo que não

aliviou – só resseca a boca. Sono: não durmo a noite inteira por causa das dores

Quero as coisas certas. Fico contrariada. Se eu puder falar, fico aliviada. Não

sou de guardar rancor. Me deixa falar! Se não falar fica engasgado, ou então

ignoro. Se eu puder falar, acabou ali. Se eu não puder falar, não engulo fingindo

que está tudo bem. Me afasto. Eu me emociono hoje em dia com criança

chorando em novela, se ouvir algo de sofrimento...quando nova, chorava muito de

raiva. 2 meses de tratamento: melhorei muito! Diferença absurda! Sem dores à

noite. Irritada. Falta de paciência. Tolerância pequena. Memória tem falhas. Mas

não atrapalha o dia a dia. Estou mais disposta que antes. 6 meses de tratamento:

Não estou bem. O fígado continuou a doer. Dor em repouso, em peso, piora ao

movimento. Sensação de plenitude até como copo de água. Irritada. Dores nos

pés – tem que movimentar para melhorar.

� Boa frequência às consultas durante os seis meses de tratamento (três).

� Uso adequado dos medicamentos no período de seis meses de frequência ao tratamento.

� Sem referência à relação entre evolução clínica e o tratamento homeopático.

Page 92: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

91

� Houve melhoria clínica seguida de piora, tendo deixado de retornar às

consultas.

Gerânio: cansaço quando respiro. Peso no peito. Mesmo quieta – cansada.

Tristeza: muita ... Sofro muito... Recorri a ele para que ele ajudasse ... Foi

humilhante ele se esquivar de ajudar. Me entristece muito isso. (chora).

Taquicardia. Palpitação. Há dor no peito às vezes. Não é forte. Dá e passa.

Quando dá incomoda. Impaciência: muito stress. Estou cansada e estressada. 3

meses de tratamento: Em todos os sentidos tive uma melhora boa! Muito serviço

que eu não fazia, voltei a fazer. Pego a vassoura e já varro um espaço grande! O

coração parou de disparar. Agora estou bem mais tranquila, mais calma ...

Passou tudo... Aquela tristeza que tinha dentro de mim... já superei tudo... (Rs) 6

meses de tratamento: Continua bem disposta. A coceira acabou – não sente mais

nada. OBS: em consulta desenvolveu sintomas pelo uso de um dos medicamentos

homeopáticos – patogenesia.

� Boa frequência às consultas durante os seis meses de tratamento (três).

� Uso adequado dos medicamentos no período de seis meses de frequência ao

tratamento.

� Relacionou a patogenesia com a medicação.

� Melhora clínica seguida de piora.

No relato de Flor de Cerejeira houve períodos de melhora do quadro clínico e piora

a seguir, o que possivelmente levou ao abandono do tratamento homeopático.

Gerânio melhorou muito, mas durante intercorrência clínica fez uso de

medicamento homeopático, tendo desenvolvido sintomas patogenéticos40. Após esse

episódio, apesar de terem sido dadas explicações sobre a metodologia homeopática,

não mais retornou ao tratamento. No entanto, durante o contato para assinatura do 40 Sintomas patogenéticos se desenvolvem durante a experimentação de substâncias por indivíduos sadios sensíveis a elas. No caso dessa participante ela provavelmente ingeriu o medicamento durante tempo maior que o indicado por sua necessidade, e passou a reproduzir sintomas causados pela substância.

Page 93: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

92

consentimento livre e esclarecido, Gerânio mostrou-se bem de saúde, feliz em

participar desse estudo.

9.2.2 Resgate da subjetividade

“O que diferencia as pessoas e as torna únicas são detalhes.”

E. Merhy, 2012.

A subjetividade é uma categoria inerente à própria doutrina médica da Homeopatia, o

que permite que o indivíduo doente possa ser visto de forma integral.

Percebo que antes do tratamento homeopático, eu me sentia um fígado com

duas pernas. Eu vinha ao hospital para trazer meu fígado. Hoje quando venho

na Homeopatia, sei que o tratamento é para mim. Nem leio mais artigos sobre

hepatite. O fígado é apenas uma parte de mim. Estou recuperando minhas

emoções (Paeonia).

Hahnemann propôs como técnica de semiologia homeopática que o discurso do

paciente fosse escrito na íntegra, o que permitiria a percepção do seu modo particular de

adoecer - “exame individualizador de um caso de doença” (Parágrafos 83 e 84

HAHNEMANN apud PUSTIGLIONE E CARILLO, 1994). A variabilidade de resposta aos

fenômenos que acontecem no meio onde os indivíduos se encontram inseridos é evidenciada

durante a anamnese. Assim durante o acolhimento ao indivíduo doente pelo médico assistente

- relação médico-paciente - estabelece-se o diálogo que, associado ao olhar atento e

observador do médico também no exame físico e quando necessário, nos resultados de

exames complementares, origina os elementos diagnósticos que indicarão a substância

terapêutica, eleita pela Lei dos Semelhantes.

Page 94: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

93

O indivíduo pode ser portador de sintomas raros que se repetem também em um

grupo restrito de pessoas que adoeceria assim de forma similar. O diagnóstico do

medicamento homeopático adequado poderá ser feito e os indivíduos tratados. Então mesmo

no processo de individualização - a doença de cada pessoa - o médico homeopata

diagnosticará a semelhança entre o sintoma referido e observado tanto nesse indivíduo como

na matéria médica homeopática que contém o registro da repetição do mesmo sintoma em

determinados indivíduos.

A individualidade de cada pessoa é perceptível em sua história - Carillo Jr. enfatiza

em suas palestras - mas o que é digno de curar é o sofrimento do indivíduo, evidenciado

através de seus sinais e sintomas. O sistema de auto-regulação alterado pelo padrão de

organização que expressa seu adoecimento é o que sofrerá a intervenção do medicamento

homeopático (CARILLO JR., 2008). Uma vez que o indivíduo esteja curado, haverá a

possibilidade de que ele exerça com plenitude o sentido de sua vida, conforme preconizado

por Hahnemann.

Para a análise de conteúdo dos discursos presentes nos prontuários,

consideraremos três unidades de registro: os relatos com verbos na primeira pessoa do

singular como “expressão de si mesmo”; sintomas “raros, estranhos e peculiares” e sintomas

modalizados.

a) Relatos com verbos na primeira pessoa do singular como “expressão de si

mesmo”

Os relatos com verbos na primeira pessoa do singular refletem a “expressão de si

mesmo” pelo portador de hepatite C crônica durante o acolhimento na anamnese

homeopática:

Açucena: Ultimamente seguro as lágrimas – “Se você perguntar mais sobre isso

vou chorar”. Me sinto rejeitada. Gostaria ainda de estar trabalhando ... queria

voltar a fazê-lo.

� seguro, vou chorar, me sinto, (eu) gostaria, (eu)queria.

Page 95: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

94

Angélica: se começar a falar sinto vergonha, não me sinto bem. Tenho a sensação

de que vou inflar e falta pouco para cair. Pavor de estar em lugar com muita

gente – pode acontecer alguma coisa, posso não ser aceita. Venho mais cedo do

trabalho por conta disso.

� sinto, não me sinto, tenho, vou inflar, posso não ser aceita, venho.

Bromélia: ... não lembro de nada. Se alguém falar que é o que não é me irrita.

Gosto de tudo limpinho. Não posso ver sujeira, poeira, quero limpar. Quando

tenho problemas, qualquer um, preciso de portas e janelas abertas.

� não lembro, me irrita, gosto, não posso, quero limpar, tenho, preciso.

Camélia: Não aceito que venham me aborrecer, ditar ordem no que já resolvi.

Adoro ficar sozinha, não gosto de muita gente aglomerando. Quero fazer minhas

coisas, bater um bolo; quero eu resolver meus problemas.

� não aceito, me aborrecer, resolvi, adoro, não gosto, quero, quero eu resolver.

Camomilla: Insônia. Pernas agitadas. Estou com emocional muito mexido, me

fecho muito, me descontrolo e me escondo no trabalho ... sofro calada.

� Estou, me fecho, me descontrolo, me escondo, sofro calada.

Carvalho: Gosto de dar atenção aos outros, ajudar. (estou) Sempre disponível

para ajudar.

� Gosto, (estou).

Cipreste: ... o desânimo foi geral – inclusive no trabalho, no estudo. Sinto

dificuldades para aprender coisas novas. Busco fazer outras atividades, pensar

positivo...

Page 96: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

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� sinto, busco.

Crysântemo: Acho que oscilo muito, hora estou muito feliz, hora estou chorosa e

depressiva. Boa relação com os amigos, converso muito com eles.

� acho, oscilo, estou, converso.

Dália. Não consigo dormir bem por preocupações com família. Eles não gostam

de ouvir a verdade. Gritei muito! Varejava as coisas! Durante muito tempo fiz

isso. Me saí bem. Nunca devi.

� não consigo, gritei, fiz, me saí, nunca devi.

Gardênia: o problema da pressão arterial é emocional. Se eu estiver nervosa a

tendência é subir. Se eu ficar feliz demais. Tudo é motivo. Ansiosa com doença.

Não me imagino mais casada... Sou severa - gosto das coisas direitinho: não

gosto de mentira. Fico revoltada. Não sou de esconder. Gosto das coisas claras.

Brigo! Mas são todos velhos..rsrs

� se eu estiver, se eu ficar, não me imagino, sou, gosto, não gosto, fico, não

sou, brigo.

Girassol: Quando me aborreço, pressão sobe. Fiquei mais de um ano rouca

quando a filha nasceu. “Esqueço tudo”. Não lembro onde coloco as coisas. Tudo

anoto. Falo muito. Sempre sorrindo, falando. Adoro dançar. Atualmente não ligo

para dançar. Chega uma época que a gente cai tanto que nem liga mais. Tem

hora que parece que vou ficar deprimida. Procuro relaxar. Sou muito ansiosa.

Quero fazer tudo ao mesmo tempo. Ando sem paciência com as coisas.. quero só

ficar em casa. Ando muito magoada (chora muito).

� me aborreço, fiquei, esqueço, não lembro, coloco, anoto, falo, adoro, não ligo,

vou ficar, procuro relaxar, sou, quero, ando.

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Hortênsia: Está me cansando muito! Me aborreço muito... (chora). Quando vou

levantar, tenho que caminhar devagarinho. Dificuldade de falar. Acho que pela

depressão, pelo excesso de trabalho.

� me cansando, me aborreço, vou , tenho, acho.

Jasmim: Sempre fui impaciente. Não gosto que me dê palpite. Eu era bem

malcriada. Não gosto que me mandem fazer as coisas Tenho horror que me

chamem atenção. Não gosto que gritem comigo, não gosto que me chamem

atenção na frente dos outros. Antes eu era muito brava mesmo! Já não sou mais

agressiva. Eu brigava muito. Não tinha medo de nada! Hoje em dia tenho

controle. Tenho tremor nas carnes.

� descobri, fiquei, quero saber, fui, não gosto, me dê, eu era, não gosto, me

mandem fazer, tenho, me chamem, gritem comigo, não sou

Lírio: Acho-me com personalidade – encaro tudo com naturalidade. Tem

momentos na vida que prefiro ficar entocada, sem falar com ninguém. Mas passa

e sai, “vai dar tudo certo”. Adoro estudar doenças, p/ saber o que está

acontecendo. Não tinha vontade de viver. Pensei em suicídio.

� acho-me, encaro, prefiro ficar, adoro estudar, pensei.

Lotus: Fico desanimada, sinto logo dor nas pernas.

� fico, sinto.

Myosotis: Mágoas .... Não durmo: carnes tremem, por dentro ! Deito não

durmo. Muito agitada, muitos tremores, não quero falar com ninguém! Sem

vontade de comer. Vontade de chorar, de não ver ninguém. Muito medo!

=> deito, não durmo, acordo, levanto, não quero.

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Paeonia: não estou interessada, medo tenho muito, fico parada, não consigo

assimilar. Hoje tenho vontade de fazer as coisas. Tenho ido à missa. Depois estou

lendo. Voltando ao tempo que eu era ativa.

� estou interessada, tenho, fico, não consigo, percebo, eu me sentia, eu vinha,

meu fígado. Venho, sei para mim, nem leio, estou recuperando minhas

emoções, tenho ido, estou lendo, eu era.

Petúnia: apenas tenho vontade de tomar uma cervejinha de vez em quando.

Tenho vergonha de ficar parada, ociosa. Tenho o direito de me aposentar mas

tenho vergonha de reivindicar isso. Critico os que ficam parados, que não fazem

nem um bordado! como podem se conformar com isso? Como eu posso ficar na

mesma posição dos que critico? Sou inquieta, não consigo ficar parada, preciso

ler, ficar andando, ir para o computador.

� tenho vontade, tenho vergonha, tenho o direito, critico, eu posso, sou, não consigo, preciso.

Stellaria: Sempre gostei da área de Medicina. Preocupação com a saúde.

Controla gorduras, doce (ansiedade). Moro sozinha. Pesquiso sintomas nos

livros. Quero fazer Psicologia. Trabalho muito no serviço. Insônia por stress? Me

dedico muito às coisas. Se pego algo para fazer, me coloco inteira naquilo...

Perdoei ele...raiva um pouquinho ... depois de tudo o que ele me fez...

� gostei, moro, pesquiso, quero, trabalho, me dedico pego, me coloco, perdoei,

me fez

Tulipa: Atualmente: falta de ar, desânimo Falta de ar. Cansaço por dentro.

Quando ando. Se eu ficar nervosa, eu fico rouca. Vontade de respirar e prende

por dentro. Deprimida. Não tenho vontade de sair. Só vou a médico. Choro às

vezes. Faço o serviço todo. Depois que paro, sinto dores na parte da tarde.

� ando, se eu ficar, eu fico, não tenho, vou, choro, faço, paro, sinto.

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Vinca: Sou tagarela. Sou ... estou ... Sou explosiva. Porta de banco me irrita

profundamente. Coisas malfeitas me deixam com raiva: problemas de fora - se

leio algo... Em casa em geral, não me importo. Não coloco nem óculos para não

ver. Ignoro. Não vou me irritar por pouco. Antigamente era chatinha, chamava

atenção para o sujo, ia limpar. Agora se tá sujo, fica...Medo: tenho, mas enfrento-

avião, elevador - de ficar presa, dele cair. Raiva: da doença.

� sou, estou, me irrita, me deixam, se leio, não me importo, não coloco, ignoro,

não vou, tenho, enfrento.

b) Sintomas raros, estranhos e peculiares:

Tais sintomas são valorizados na homeopatia para o diagnóstico do adoecimento

e seleção de medicamentos. Esses, embora sejam incompreensíveis em sua

fisiopatologia, por não se correlacionarem com lesões orgânicas perceptíveis,

exprimem o modo peculiar de adoecimento daquele indivíduo e que se repete em

grupos de pessoas afins.

Açucena: Nem gosto de roupa fechada porque me sinto agoniada. As pernas

parecem amarradas. Parece uma friagem no joelho por dentro do osso. Dorme

bem, somente de bruços sobre os braços cruzados.

Angélica: no abdome como se estivesse entornando algo dentro, tipo cachoeira.

Sensações como se não tivesse ossos, de que flutua quando se irrita. Tenho a

sensação de que vou inflar e falta pouco para cair. Cefaléia pulsátil, de dentro

para fora, parece que vai explodir; sensação de um lado da cabeça funcionando,

o outro não.

Bromélia: Aversão a frutas. Maracujá: fico doente como se fosse dengue.

Camélia: Parece que os ossos estão esgotados.

Camomila: Dor em articulação do joelho (e metatarso) como se travasse.

Carvalho: a urina tem óleo por cima.

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Cipreste: Transpiração manchando as roupas de branco.

Crysântemo: sem relato de sintoma raro, estranho e peculiar.

Dália: Dor (no hipocôndrio direito) sobe e dá agulhada (na fossa clavicular);

sensação de “cica” na boca

Gardênia: não apresenta sintomas raros, estranhos ou peculiares descritos no

prontuário.

Girassol:Fiquei mais de um ano rouca quando a filha nasceu. Dor nas juntas

queimando e ardendo. Gosma branca parece cola com espuma. A pessoa fala

comigo, não entendo o que a pessoa fala. Não é surdez. Não entendo o que a

pessoa fala... parece que o som passa de um ouvido para o outro.

Hortênsia: Dificuldade de respirar quando nervosa. Um pouco de dor nas pernas

e coluna. Se eu ficar nervosa, fica latejando.

Jasmim:Tenho tremor nas carnes. Comia pimenta e sentia dor de cabeça (gosto

muito de pimenta).

Lírio: Fico com uma dor de cabeça! Parece que vou explodir. É a mesma que me

dá vontade de tirar o tampão da cabeça.

Lotus: Cefaléia pulsátil como se o olho fosse pular da órbita. Sente odor de rosas

vê vulto de espírito.

Margarida: Hiperemia de escleróticas, com prurido local no “resfriado”.

Myosotis: Não durmo: carnes tremem, por dentro

Paeonia: Cabeça como se crescendo. Não consigo chorar apesar de ter muita

vontade. Aí fico com enjoo.

Petúnia: como se os polegares fossem repuxados; dor como se estivessem

quebrando os dedos

Stellaria: Intolerância à fruta ácida (laranja, tangerina) levando à febre. Aversão

à água. Chuvisco na vista... se eu ficar nervosa, dá.

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Tulipa: Se eu ficar nervosa, eu fico rouca. Vontade de respirar e prende por

dentro.

Vinca: Ando à vontade na reta. Subiu, fico exaurida.

c) Sintomas modalizados

O desencadeamento dos sintomas dos indivíduos pode estar associado tanto a

fatores do ambiente, como horários, tempo, umidade do ar, quanto à alimentação,

posição corporal, movimentos, assim como aos fatores emocionais, que remetem a

sensações que se repetem nos diversos órgãos e sistemas.

Açucena: Suo muito. É só no peito, mal estar. Detonei uma garrafa de vinho...

abriu .... não tem como....(desejo de vinho).

Angélica: Desejo de café (não consigo parar) e doces.

Bromélia: Dores na coluna parecem facadas. Dores melhoram quando estou em

movimento. Parece mosquito andando na perna...mosquito, formiga...

Camélia: Varizes ardentes com ferroadas por dentro.

Camomila: Agrava com alimentos ácidos: língua arde e empola. Muita dor no

cotovelo; caminhando não sentia.

Carvalho: Cefaléa: dor que se localiza à esquerda, migrando da região do

supercílio para a têmpora, como se fosse explodir.

Cipreste: Dores articulares erráticas piores pela manhã e quando em repouso.

Desejos de frutas. Intolerância frituras e pimenta.

Crysantemo: Desejo de pimenta caiena; desejo de gordura. Não gosto de dormir

no escuro, tem dificuldades para dormir.

Dália: Asma brônquica quando criança em abril e maio. Muita compulsão para

comer. Desejo de doce: pudim de leite condensado inteiro, um pote inteiro de

Page 102: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

101

sorvete. Aí vou ficar sem comer um ano. Rachaduras próximas aos dedos dos pés

na mudança de temperatura - no outono.

Gardênia: O problema da pressão é emocional. Se eu estiver nervosa a tendência

é subir. Se eu ficar feliz demais. Tudo é motivo. Memória: esquecendo-se do nome

das pessoas, “dando falhas”.

Girassol: Couro cabeludo está sensível. Parece queimando. Muito pigarro,

catarro durinho, amarelo escuro. Às vezes levanto cheia de dor. Quando ando

melhora.

Hortênsia: Dores no corpo todo. Quando vou levantar, tenho que caminhar

devagarinho. Dorzinha nos pés espetando, formigando. Cãibras de extremidades

(mãos e pés) irradiando-se proximalmente – pior quando expõe ao frio e melhora

com fricção.

Jasmim: Consigo dormir em qualquer posição, não sinto mais falta de ar deitada

sobre o lado esquerdo.

Lírio: Fico com uma dor de cabeça! Parece que vou explodir. Cefaléia: como se

fosse arrancar a face!

Lotus:, rinite no frio; obstrução nasal piora com vento, com ar frio.

Margarida: Cefaléia supraorbitária a esquerda que irradia para têmpora

esquerda, como se fosse explodir; eventualmente acomete a nuca, não

conseguindo sequer virar o pescoço, acompanhada de náuseas. Odinofagia à

esquerda, com descarga nasal posterior ora esbranquiçada, ora amarelada,

grossa.

Myosótis: acordo e levanto com mal estar, dor de cabeça e dor de ouvido.

Paeonia: alimentícios - Aversões: qualquer coisa fria; paralisia facial aos 33

anos por choque emocional; dor de cabeça por coco e chocolate; intolerancia a

açúcar: enjôo

Petúnia: Como se os polegares fossem repuxados A dor nos dedos como se

estivessem quebrando os dedos.

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102

Stellaria: muita enxaqueca alimentar, dor ocular, melhorava com pressão. Coriza

por dois, três dias, na mudança do tempo firme para o úmido.

Tulipa: Depois que paro, sinto dores na parte da tarde.

Vinca: Prefere sal que doce.

9.2.3 Autonomia

Existem diferentes concepções sobre o que estudiosos do campo da saúde coletiva

consideram como “autonomia do sujeito”.

Estrêla (2006) comenta que Illich (1982) consideraria perda de autonomia a

dependência dos sujeitos à excessiva medicalização imposta pelos serviços de saúde e esse

autor proporia que os sujeitos exercessem “diversas formas de auto-cuidado para recuperar

sua autonomia a fim de não necessitarem da intervenção profissional”.

Em “A clínica do sujeito: por uma clínica reformulada e ampliada” Gastão Wagner de

Sousa Campos (1996,1997) se contrapõe a Illich (1982) argumentando que essa postura “nem

sempre ajuda o enfermo”. E se pergunta “como produzir saúde para aqueles Sujeitos

portadores de qualquer enfermidade sem considerar também o combate a esta enfermidade?”

Igualmente para Campos (1996, 1997) essa enfermidade seria diferente de um indivíduo para

outro:

... doenças semelhantes do ponto de vista classificatório podem incidir de forma

diferenciada conforme a história e os recursos subjetivos e materiais de cada Sujeito.

Os serviços de saúde deveriam operar com plasticidade suficiente para dar conta

desta variedade (Campos, 1996,1997, p.6).

Campos (2006, apud VIDAL) conclui sobre autonomia que seria “uma maior

capacidade dos sujeitos compreenderem e agirem sobre si mesmos e sobre o contexto...”

(CAMPOS, 2006 apud VIDAL, p.20).

Page 104: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

103

Para Merhy, “O sentido de qualquer serviço de saúde é o de se centrar no usuário e

intervir a partir de seus problemas procurando contribuir para um caminhar mais autônomo no

seu “modo de andar a vida” (MERHY, 1997, p.30).

Assim, no presente estudo consideramos autonomia nos sentidos propostos por

Campos e Merhy, pois se assemelham ao que Hahnemann propõe como objetivo do

tratamento homeopático que seria a possibilidade do “espírito dotado de razão que habita em

nós, utilizar desse instrumento vivo e são para alcançar os altos fins de sua existência”. Ou

seja, Hahnemann chama atenção para o corpo saudável como pré-requisito para que o

indivíduo exerça plenamente sua Missão.

Vale acrescentar um comentário de Campelo (2001) em sua dissertação “Relação

Médico-Paciente na Homeopatia: Convergência de Representações e Prática”:

... esta atitude do médico que ouve seu paciente e que, além disso, estimula seu relato e quer saber sobre os desencadeantes de suas emoções, suas vulnerabilidades a fim de abarcar a totalidade individual, para que possa desta forma tratá-lo, com o intuito de possibilitar-lhe autonomia para desenvolver “os mais altos fins de sua existência” faz parte da própria racionalidade da medicina homeopática (CAMPELO, 2001, p.37).

Assim, nesse trabalho consideramos que o ganho de autonomia para os indivíduos

portadores de hepatite C crônica, estaria condicionado à sua recuperação clínica seja no

aspecto orgânico, seja no psíquico.

Então, como “unidades de registro” selecionamos melhoria clínica e recuperação de

atividades que esses indivíduos haviam deixado de exercer antes da intervenção do tratamento

homeopático.

Os relatos encontram-se transcritos a seguir.

Açucena

� Melhoria clínica: 3 meses de tratamento: Eu sentia muitas cólicas.

(Agora) uma vez ou outra, bem menos. (fezes) amarronzadas, antes

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104

esbranquiçadas. 14 meses de tratamento: artralgia do joelho - passou.

Não estou sentindo nada. Até o inchaço não tenho mais. Cansaço:

bem melhor. As dores (no hipocôndrio) não sinto mais. Estômago

cheio não sinto mais ...

� Recuperação de atividades: 14 meses de tratamento: Tênis para

caminhar incomoda... Tem hora que pego paninho para pintar ...

� Ganho de autonomia.

Angélica

� Melhoria clínica: 13 meses de tratamento: Há dias que me sinto bem

melhor, porém cansada. Tremores. Glicose subindo. Oscilando muito.

Esquecimento para lugares onde coloquei as coisas. Teve uma

melhora (porque a frequência dos erros por fraqueza de memória,

diminuiu). Falta de ar se seu fizer muito esforço. Dor no peito. Muita

dor de cabeça. Diminuiu a dor precordial. Pressão chegou a 200x160,

mas reduziu a 160x100 quando no Pronto Socorro. Querendo galinha

com macarrão. Carne de porco! Se eu sentir o odor não consigo

comer. Melhorou. Há algo que já tolero.

� Recuperação de atividades: 3 meses de tratamento: Oscilo muito – hoje

estou bem leve; amanhã bate uma tristeza. Mas é tudo assim mesmo:

tudo aos pouquinhos. 13 meses de tratamento: Querendo caminhar a

partir desse mês...

o Ganho, pois apesar de apresentar-se com bastante instabilidade física e

emocional, consequência de graves perdas afetivas relatadas no

prontuário, a atitude foi de oferecer suporte aos familiares, “

querendo caminhar”.

Bromélia:

� Melhoria clínica: 4 meses de tratamento: Melhorei bastante da tonteira

que vinha com o calor por esforço. Melhorei da irritabilidade. Estou

uma bênção! Agora mais tolerante. Teve um dia que acordei e a

mente clara! Melhora do sono; melhorei da tosse e do engasgo. 7

Page 106: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

105

meses de tratamento: Teve um dia que percebi que estava

caminhando bem. Nesse dia andei bem, que até parece que rebolei.

Atualmente vou para cama 1 hora e se não for interrompida durmo

até às 10 horas.

� Recuperação de atividades: Vou voltar para o trabalho.

o Ganho

Camélia:

� Piora clínica: Varizes ardentes com ferroadas por dentro. As varizes

coçam muito. E agora no corpo todo! parece que os ossos estão

esgotados.

� Recuperação de atividades: Não trabalhei tanto e tão cansada...

o Perda

Camomila:

� Melhoria clínica: Melhorou muito da irritabilidade e das pernas

inquietas.

� Recuperação de atividades: Tenho conseguido me controlar mais mas

acabo brigando.

o Mantida

Carvalho:

� Relato de Familiar: 2 meses de tratamento: “Desanimado para

caramba. Ele tenta levantar, mas fica aquela prostração” Memória:

desatento, desligado, memória recente: não gravo. OBS: o intervalo

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106

pergunta-resposta normalizou! Mais atento! ... alguns lapsos de

memória – melhor que na consulta anterior.

� Recuperação de atividades: 8 meses de tratamento: Mais ativo, mais

disposto, trabalhando muito.

o Ganho.

Cipreste

� Melhoria clínica: 7 meses de tratamento: urticária parece que empola e

agrava ao coçar. Muito raro eu sentir dor. Parece que está

desaparecendo. 11 meses de tratamento: Melhora do cansaço, bom

preparo físico. Diminuição da urticária.

� Recuperação de atividades: Melhora da disposição. Pensando em voltar

a estudar – estou montando o plano. Voltando a concentrar-se mais

no trabalho.

o Ganho

Crysântemo:

� Melhoria clínica: Muito esquecida e muito estressada.

� Recuperação de atividades: Fico memorizando e aí lembro

o Mantida.

Dália:

� Melhoria clínica: Ansiedade com compulsão para comer. Não consigo

dormir bem por preocupações com a família. Púrpura, artrose, dor em

hipocôndrio direito. 13 meses depois: Sinto sono que antes não sentia.

Púrpura. Apetite: melhorou do excesso, mas ainda ansiosa. Cismo

Page 108: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

107

com um alimento. Isso melhorou um pouco. Quando mais nervosa,

tremores - iguais ao que já tinha

� Recuperação de atividades: Acho que não tenho nada mais a

fazer...Carnaval me ofereci para ficar com meu tio que estava no

hospital.

o Mantida

Gardênia

� Melhora clínica: 14 meses de tratamento: a pressão tem se mantido

controlada. Não sinto dor, não sinto nada.

� Recuperação de atividades: 14 meses de tratamento: 1Curtimos

enquanto deu. Vivi o que não vivia há muitos anos. Feliz porque valeu

a pena!

o Ganho

Girassol:

� Melhora clínica: 12 meses: Pé rachado, doendo. Dor lombar igual. Sem

dor no joelho. Às vezes querendo dar câimbra. Tosse mais calma. A

pessoa fala comigo não entendo o que a pessoa fala. Parece

perturbação do ouvido.

� Recuperação de atividades: 15 meses de tratamento: Sem paciência.

Não tenho paciência. Com nada! Aflição! Quero largar tudo para lá!

Sem ânimo! Muito desanimada. Não tenho paciência com nada. Sem a

coragem que eu tive. Ainda um pouco desanimada. Tem hora que dá

vontade de largar tudo. Para mim a vida não tem sentido. Deprimida

de novo.

o Perda

Page 109: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

108

Hortênsia:

� Melhora clínica: Tremor no corpo passou. Confusão na fala passou

totalmente. Memória boa. Lembrando geografia, história. Fadiga

depois do almoço que havia passado totalmente, voltou. Parei de

chorar como antes (diminuiu muito).

� Recuperação de atividades:

o Ganho

Jasmim

� Melhoria clínica: 19 meses de tratamento: Melhorei muito do desejo

alimentar. Consigo controlar. Havia saído do controle e não fico

cansada. Agora sempre ânimo que eu não estava tendo.

� Recuperação de atividades:19 meses de tratamento (perda afetiva por

falecimento de familiar há 5 meses): Sou eu sozinha. Mas acho

natural da vida. Tenho que ter força para continuar a viver. Quero

meus projetos para fevereiro.

o Ganho

Lírio

� Melhoria clínica: Ainda em pânico. Tem vezes que fica doze dias sem

sair à rua. Meu amigo me estimula muito me chama para estudar e eu

vou – gosto muito de estudar!

� Recuperação de atividades: Relação com o filho melhorou muito

o Mantida

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109

Lotus:

� Melhoria clínica: Sentindo-se bem: melhorou muito do cansaço e do

peso nas pernas – está caminhando melhor. A angiolista descartou a

necessidade de cirurgia de varizes, devido à melhora do quadro

angiológico. Pensando em se aposentar.. muita mesquinharia.

Questionei. Deseja muito viajar. Há 01 mês sentindo dor no peito com

sensação de aperto na garganta e vômito por 15 min, com melhora

espontânea. Trabalhou muito nas chuvas ajudando no resgate de

moradores.

� Recuperação de atividades: Se envolveu muito com sofrimento. – quero

abraçar o mundo com as pernas. Mas sempre fui assim – me revolto

com a indiferença dos outros (chora).

o Mantida

Margarida

� Melhoria clínica: 9 meses de tratamento.. No final de novembro é que

foi o resfriado. Eu estava bem melhor, mais disposta, sem cansaço. 12

meses de tratamento: memória: Melhorei bastante. Eu estava muito

esquecida. Às vezes ia fazer uma coisa e esquecia. Agora melhorei

bastante.

� Recuperação de atividades: Não tenho ânimo para trabalho. Se puder

ficar em casa, prefiro. Até as coisas de casa, empurro pra frente,

sempre fui muito ativa e isso me incomoda. 03 meses de tratamento:

Melhorou 100% o estresse no trabalho – trocou de chefe – foi o

melhor remédio... Melhorou o ânimo pra fazer as atividades diárias. O

desânimo para fazer estas atividades cessou.

o Ganho

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Miosótis

� Melhoria clínica: 3 meses de tratamento: Sem tremores internos Era

muito cansaço. Não tenho sentido como antes, só se ando muito.

Agora não tenho tido tonteira. 12 meses de tratamento: Família nota

que aumentei o peso. A netinha falou que estou comendo melhor. 15

meses de tratamento: Estou me sentindo bem. Caminhando bem...

Aquelas dores que eu sentia na barriga, quase não sinto mais.

� Recuperação de atividades: 3 meses de tratamento: Fez o cabelo. Bem

melhor. ...cuidando da filha, fiquei muito junto dela. 6 meses de

tratamento: Estou ajudando minha mãe e estamos caminhando

(sorrindo, excelente estado geral) 15 meses de tratamento: Tenho

andado muito. Essa semana saí a semana toda.

o Ganho

Paeonia

� Melhoria clínica: 9 meses de tratamento: Memória: melhorada, boa.

Começando a assimilar bem o que estou lendo.

� Recuperação de atividades: 6 meses depois: Mais animada, vida

tranquila. Há muitos anos não ajudava na casa. 12 meses após:

Saindo mais. Voltando ao tempo que eu era ativa. Curtindo esse

momento de volta ao trabalho.

o Ganho

Petúnia

� Melhoria clínica: Sou inquieta, não consigo ficar parada, preciso ler,

ficar andando, ir para o computador. 16 meses de tratamento. Não

que tenha piorado, mas tem se cobrado mais desses lapsos (de

memória).

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� Recuperação de atividades

o Mantida

Stellaria:

� Melhoria clínica: 3 meses de tratamento: Depois do início do

tratamento melhorei bastante. Prisão de ventre: melhorou muito.

Caimbra: muito difícil, bem mais rara...

� Recuperação de atividades: 8 meses de tratamento: ajudando, mas sem

esquentar a cabeça. Estou mais tranquila. 14 meses de tratamento:

Bem, trabalhando, ajudando as pessoas.

o Ganho

Tulipa:

� Melhoria clínica: 6 meses de tratamento: sem falta de ar. Não tenho

percebido rouquidão. Me senti bem melhor da parte digestiva. 9

meses de tratamento: Antes tudo o que eu comia passava mal. Agora

não. Posso comer e não há gases, até frituras.

� Recuperação de atividades: 9 meses de tratamento: Esquecida de mim.

Esqueço até que estou doente. Não sinto nada mesmo quando pego

peso.

o Ganho

Vinca: Melhoria clínica: 11 meses de tratamento: Ótima. Com a disposição de

sempre. Sem queixas.

� Recuperação de atividades: 10 meses de tratamento: Viajou no

Carnaval. Adoro mar!

Page 113: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

112

o Mantida

Os relatos em sua maioria demonstram ganho de autonomia a partir do tratamento

homeopático. Ponderamos que a manutenção de autonomia deveria igualmente ser

considerada como “ganho de autonomia”, pois seria esperado que o indivíduo portador de

uma doença crônica evoluísse com piora gradativa de seu quadro clínico.

Em sua dissertação “Integralidade no Cuidado nas Medicinas Naturais: a resposta dos

usuários ao medicamento homeopático”, Estrêla (2006) citando Luz, (1997), Ayres, (2001) e

Lacerda, (2004) problematiza o conceito Hahnemanniano de autonomia:

Finalmente, se o processo terapêutico logrou êxito, o paciente está saudável, pronto para viver e atingir “os mais altos fins de sua existência” (Hahnemann,1992), corroborando sua autonomia no que diz respeito ao livre arbítrio para escolher o caminho de lidar com sua vida e de como cuidar dela. Entende-se que a expressão teleológica de Hahnemann – “os mais altos fins de sua existência” – volta-se para o enaltecimento de diferentes valores e princípios tais como liberdade, autonomia e integralidade, apresentando convergência com definições relacionadas ao conceito de cuidado em saúde, quando se referem a “projeto de vida e felicidade”, “cuidado de si” e “apoio social” (ESTRELA, 2006 p.19).

Compreendemos que para Hahnemann, o conceito de “ autonomia” incluiria a

capacidade do indivíduo modificar sua atitude frente a vida, a partir do tratamento

homeopático. Nesse trabalho nós consideramos que essa capacidade pode ser estudada em

uma quarta categoria analisada a seguir: Mudança de Dinâmica Vital.

9.2.4 Mudança de Dinâmica Vital

Dentre os critérios que definem as Racionalidades Médicas, existe o de “Dinâmica

Vital” que corresponde à compreensão de “fisiologia”, de “funcionamento do organismo”,

pela racionalidade médica estudada.

Page 114: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

113

No entanto no presente estudo esse conceito terá o sentido que lhe atribui Estrêla

(2006), referindo-se à “ mudança de atitude da pessoa frente à vida”, ou seja, uma mudança de

sentido de sua atuação.

O sentido em que nos apropriamos da integralidade do cuidado (Pinheiro & Mattos, 2001) está na propriedade da evolução que pacientes apresentam durante um tratamento homeopático (...) se houve mudança na atitude vital do paciente na acepção do modo singular como o indivíduo reage aos estímulos, tanto na dimensão física quanto na psíquica (ESTRELA, 2006 p. 37).

Essa categoria também se depreende nos resultados obtidos por Campelo (2001)

em sua pesquisa de mestrado, ao avaliar os resultados terapêuticos da homeopatia através de

entrevistas com pacientes tratados no serviço público:

O aspecto mencionado com mais entusiasmo pelos pacientes, talvez por ser o menos

esperado é que o tratamento homeopático trouxe melhora a suas vidas. Referem

mudanças no psiquismo, na maneira de agir, de pensar. Um dos entrevistados chega

a chorar, emocionado, por estar falando sobre as mudanças ocorridas “sempre que

eu converso com alguém sobre a minha vida assim, sobre o que eu era e o que eu

sou agora, sempre me dá emoção, sabe. Porque quando eu me lembro a vida que eu

levava, antes desse tratamento aí; era uma vida muito ruim, mas muito ruim,

mesmo”. Daí a gratidão imensa que sente por seu médico, por quem pede sempre a

Deus que o mantenha com saúde neste caminho (CAMPELO MF, 2001, p.

102,103).

Nesse estudo procuramos sedimentar o conceito de mudança de dinâmica vital,

observando-o nos relatos dos indivíduos e que seguem abaixo.

Açucena:

3 meses de tratamento: Menos irritada, menos preocupada. 14 meses de

tratamento: Gosto de ficar parada, meditando. Adoro dormir. Mas também

nunca parei na vida... só trabalho... é experiência boa ficar

parada...Antigamente qualquer coisa irritava e eu queria resolver... Agora

Page 115: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

114

estou calmíssima... (sorri). Antigamente eu queria dar conta das cobranças...

agora não...

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

OBS: com dois anos de tratamento está animada, trabalha em nova atividade

como cuidadora e viaja pelo trabalho, o que a deixa feliz.

Angélica:

Primeira consulta: Não se sente bem no meio das pessoas; se começar a falar

sinto vergonha, não me sinto bem.... Tenho vontade de ficar distante, de entrar no

quarto e ficar quieta. ... posso não ser aceita. Venho mais cedo do trabalho por

conta disso.13 meses de tratamento: Me senti melhor consegui me divertir mais

do que das outras vezes. Arrisquei passos de dança. Coisas que jamais faria... me

entrosei no meio deles; ficar conversando jamais faria...

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

Bromélia: Primeira consulta: esquecimento total... não lembro de nada... não sei

se tomei o remédio de pressão...um nervoso! Me irrita! 7 meses de tratamento:

Quero estudar! ... Querendo fazer gestão de meio ambiente

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

Camélia: parece que os ossos estão esgotados. Não trabalhei tanto e tão

cansada...

o Mudança para pior da dinâmica vital

Camomila 3 meses de tratamento: Percebo que estou falando mais, trabalhando

Page 116: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

115

melhor a empatia. Sabendo lidar melhor com as mágoas. 12 meses: Assimilando

melhor a saída dele ... melhorou da irritabilidade e das pernas inquietas.

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

Carvalho: 2 meses de tratamento: Desanimado para caramba. Ele tenta levantar, mas

fica aquela prostração. Desatento, desligado. Não gravo. Após 12 meses de

tratamento: Tô legal. No trabalho, assumindo bem tarefas extras.

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

Cipreste: Bastante disposição. Namorando. Preciso dormir mais. Levanto 5:30 e

durmo 1 hora. Porque fico empolgado. Quer prestar concurso público. Estou mais

confiante.

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

Crysântemo: Estou sem estímulo. Não ligo para arrumar a casa (chora). Ele deveria

ter mais atenção comigo... dela não reclamo, ela paga meu convênio.

o Manutenção da dinâmica vital

Dália: Contando até 10 para não explodir! Não pular da ponte! Está difícil! Me

ofereci para ficar com meu tio que estava no hospital. Fiquei indignada!

o Manutenção da dinâmica vital

Gardênia: Primeira consulta: Não me imagino mais com um homem... Após 8 meses

de tratamento: Melhora de emotividade, está com um companheiro e está muito feliz

por isso.

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

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116

Girassol: Aflição! Quero largar tudo para lá! Sem ânimo! Muito desanimada.

Não tenho paciência com nada. Sem a coragem que eu tive. Ainda um pouco

desanimada. Tem hora que dá vontade de largar tudo. Para mim a vida não tem

sentido. Deprimida de novo.

o Mudança para pior da dinâmica vital

Hortênsia: “... pastas para os exames, cópias organizadas – em outros tempos

teria esquecido”. Não estou muito cansada. Fazendo tudo. Trabalhando em

várias áreas, ajudando como empresária. E paralelo a isso, trabalhando em casa.

Com o marido: “Não estamos discutindo mais. Estamos mais tolerantes – um

com o outro. Estou muito calma. Aparece um jeito dentro de mim e não me irrito.

Acho normal. Fazendo curso de fotografia e fui a campo. Fazendo curso de corte

e costura.

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

Jasmim: Eu estava com a mente muito conturbada, muito revoltada ... foi bom

parar um pouco (afastou-se de atividades após perda familiar). Vi que não estava

pronta para aprender. Eu queria ensinar a quem estava ensinando... Fiz inscrição

para atividades de idosos, aprender violão, curso de teologia. Me engajei em uma

ONG de assistência social. Mas a atividade será ano que vem...

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

Lírio: Muito tensa (problemas familiares). Não consigo nem chorar. Pensando em

desistir da vida, em dizer chega !... mas descobri que ainda não chegou a minha

hora. Meus amigos se preocupam comigo e fico feliz de saber que posso contar

com alguém.

o Manutenção da dinâmica vital

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117

Lotus: Se envolveu muito com sofrimento. – quero abraçar o mundo com as

pernas. Mas sempre fui assim – me revolto com a indiferença dos outros (chora).

Muito triste porque a minha grande amiga está muito mal. Muito angustiada por

ela.

o Manutenção da dinâmica vital

Margarida: 03/04/2009- Primeira Consulta: Não tenho ânimo para trabalho. Se

puder ficar em casa, prefiro. Até as coisas de casa, empurro pra frente, sempre

fui muito ativa e isso me incomoda. 3 meses de tratamento: Melhorou o ânimo pra

fazer as atividades diárias. O desânimo para fazer estas atividades cessou. 9 meses

esse ano espero que consiga comprar minha casa. E muitas outras coisas. Espero

que seja melhor do que ano passado. 12 meses: continuo querendo comprar

minha casa até o final do ano.

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

Myosotis: Participando do grupo antitabagismo. Quarta feira iniciou aurículo -

terapia pelas dores nas pernas.

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

Paeonia: Curtindo o momento de volta ao trabalho.

o Manutenção da dinâmica vital

Petúnia: Primeira consulta: Tenho vergonha de ficar parada, ociosa. Tenho

direito de me aposentar, mas tenho vergonha de reinvindicar isso. Após 3 meses

de tratamento: Muito feliz porque voltou a trabalhar! 14 meses: Não que tenha

piorado mas tem se cobrado mais desses lapsos (faz uso errático das medicações).

o Manutenção da dinâmica vital

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118

Stellaria: Quando posso saio, vou à praia para relaxar. Não quero me magoar

este ano. ... cursos para ficar envolvida com outras coisas.

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

Tulipa: Esquecida ainda de mim. Preocupando-me apenas com problemas

alheios. Não me esquento mais com pouca coisa.

o Mudança positiva de sua dinâmica vital

Vinca: Levo vida na boa.

o Manutenção da Dinâmica Vital

Page 120: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

119

9.3 ANÁLISE QUANTITATIVA DESCRITIVA DO MATERIAL EXAMINADO

9.3.1 Adesão

Gráfico 9.3.1.1 Adesão 26 indivíduos (74,28%). Abandono: 9 indivíduos (25,71%) durante os primeiros 14

meses de tratamento.

Gráfico 9.3.1.2 Adesão 26 indivíduos: Frequência e número de indivíduos (entre parênteses) que aderiram ao

tratamento homeopático: 7 consultas (1 – 3,8%); 6 consultas (6 – 23%); 5 consultas (13 – 50%); 4 consultas (2 –

7,7%). Abandonaram o tratamento 9 (34,6%) indivíduos: desses, frequentaram 3 consultas(3 -11,5%); 2

consultas (1 – 3,8%); 1 consulta (5 – 19,2%).

Page 121: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

120

Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

Consentiram Não Consentiu

Gráfico 9.3.1.3: Solicitação a 28 pessoas. 27(96,4%) consentiram ; um indivíduo (3,6%) recusou.

O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi solicitado a vinte e oito pessoas,

das quais vinte e sete (96,4%) deram o consentimento para a utilização de seus relatos. Um

indivíduo recusou (3,6%). Dessas vinte e sete pessoas, duas não conseguiram assinar o TCLE

e por isso seus relatos não foram utilizados.

Vale ressaltar que o número de consentimentos foi muito significativo, tendo em vista

que a médica e pesquisadora Míriam Figueira Reis encontrava-se afastada do campo de

pesquisa há um ano. A resposta positiva para a realização do presente estudo demonstra o

forte vínculo criado através da relação médico-paciente e dos resultados clínicos obtidos

através da terapêutica homeopática.

Page 122: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

121

Gráfico 9.3.1.4: Total de 26 indivíduos (100%) aderiram ao tratamento homeopático. 22 (84,6%)

tiveram seus relatos analisados. De 04 participantes (15,4%) que aderiram ao tratamento, não foi possível a

análise.

Gráfico 9.3.1.4: Referem uso adequado dos medicamentos: 17 (77,3%) indivíduos; e inadequado: 05 (22,7%)

indivíduos.

Page 123: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

122

Gráfico 9.3.1.5: Associam nos relatos dos prontuários a evolução clínica ao tratamento homeopático 13 (59,1%)

indivíduos. Não fazem essa associação 9 (40,9%) indivíduos.

Gráfico 9.3.1.6: Apresentaram relato de melhora em seu quadro clínico: 19 (86,4%) indivíduos; manutenção

1(4,5%) e piora: 1 (4,5%) indivíduo.

Page 124: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

123

9.3.2 Resgate da Subjetividade

Gráfico 9.2.1: Relatos utilizando a primeira pessoa do singular: 22 indivíduos (100%).

Demonstra a utilização adequada da técnica homeopática que busca a valorização do

encontro entre sujeitos, em 100% dos atendimentos, conforme demonstrado nos relatos em

primeira pessoa encontrados em todos os prontuários avaliados.

Gráfico 9.3.2.2: Registro de sintomas raros, estranhos e peculiares: 21 (95,5%) indivíduos; ausência de registro

1(4,5%) indivíduo.

Page 125: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

124

A percepção de sintomas pelo indivíduo dependeria também do quanto ele valoriza o

que está sentindo, ou do quanto é capaz de se observar. Caberia então o seguinte

questionamento: Isso teria sido um obstáculo para a não obtenção de sintomas raros estranhos

e peculiares em um dos prontuários?

Gráfico 9.3.2.4: Relatos nos prontuários com modalização dos sintomas: 22 indivíduos (100%).

A evidência da modalização dos sintomas em 100% dos prontuários avaliados

comprova a utilização da técnica homeopática em 100% dos atendimentos e a confirmação da

preocupação de individualização dos participantes da pesquisa.

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125

9.3.3 Autonomia

Gráfico 9.3.3.1: Apresentaram relato de melhora em seu quadro clínico: 19 indivíduos (86,4%); manutenção: em

1 indivíduo (4,5%), e piora: em 1 indivíduo(4,5%).

Gráfico 9.3.3.2: Recuperação de atividades: ganho em 13 indivíduos (59,1%); manutenção em 07 indivíduos

(31,8%) ; perda em 02 indivíduos (9,1%).

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126

9.3.4 Mudança de Dinâmica Vital

Mudança de Dinâmica Vital

Para melhor Manutenção Para pior

Gráfico 9.3.4.1: Mudança de Dinâmica vital: Para melhor: 13 (59,0%) indivíduos; Manutenção: 07 indivíduos

(31,8%); Para pior: 2 indivíduos (9,0%).

9.4 CORRELAÇÃO ENTRE BIOPSIAS HEPÁTICAS, AUTONOMIA e MUDANÇA DE

DINÂMICA VITAL.

A tabela seguir foi construída com base na análise dos relatos das categorias

autonomia e mudança de dinâmica vital, avaliadas previamente de maneira independente.

9.4.1 Tabela: Correlações entre biopsias hepáticas, autonomia, mudança de dinâmica vital

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127

Resultados de biopsias hepáticas/ano de realização

Autonomia Mudança de Dinâmica vital

1 AÇUCENA Ganho Para melhor

2 ANGÉLICA A3F3(2005) Ganho Para melhor

3 BROMÉLIA Ganho Para melhor

4 CAMÉLIA Perda Para pior

5 CAMOMILA Mantida Para melhor

6 CARVALHO A1F2-3(2004) Ganho Para melhor

7 CIPRESTE Ganho Para melhor

8 CRYSÂNTEMO

A2F2(2006) Mantida Mantida

9 DÁLIA A3F4(2009) Mantida Mantida

10 GARDÊNIA A3F4(2007)

Ganho Para melhor

11 GIRASSOL A2F3(2005) Perda Para pior

12 HORTÊNSIA Ganho Para melhor

13 JASMIM A2F3(2008) Ganho Para melhor

14 LÍRIO A2F3(2004) Mantida Mantida

15 LOTUS Mantida Mantida

16 MARGARIDA A2F3(2006) Ganho Para melhor

17 MYOSÓTIS Ganho Para melhor

18 PAEÔNIA A2F3 (2001) Ganho Mantida

19 PETÚNIA Mantida Mantida

20 STELLARIA Ganho Para melhor

21 TULIPA A2F3 (2006) Ganho Para melhor

22 VINCA Mantida Mantida

Page 129: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

128

A adesão ao tratamento e o resgate da subjetividade, nesses 22 indivíduos, está

implícita.

Observou-se que o ganho de autonomia por 13 indivíduos correlacionou-se com a

modificação da dinâmica vital para melhor em 11 deles (84,6%). Isso demonstraria que o

indivíduo no processo de recuperação de autonomia faz um inventário de suas melhores

possibilidades e modifica suas atividades para melhor.

Logo, essas duas categorias deveriam ser analisadas conjuntamente, conforme

discutido por Campello (2001) e Estrela (2006), quando analisaram o parágrafo 9 do Organon

escrito por Hahnemann.

Observou-se também que mesmo indivíduos com lesões graves hepáticas,

diagnosticadas em biópsias hepáticas, apresentaram evolução positiva com o tratamento

homeopático. Desse modo, poderíamos então aventar a hipótese de que a homeopatia traria

ganho no aproveitamento da reserva funcional presente no fígado lesado, assim como a

regeneração possível do órgão seria efetiva.

Page 130: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

129

9.5 PRESCRIÇÃO DOS MEDICAMENTOS HOMEOPÁTICOS

Medicamentos Homeopáticos Utilizados

Zincum metallicum

Ignatia amara

Arnica montana

Cactus grandiflorus

Nitri acidum

Nux vomica

Iodium

Selenium

Chelidonium majus

Hamamellis virg

Berberis vulg

Kali brichr

Solidago

Metallum album

Cocculus ind

Coffea

Rhus tox

Cuprum met

Passiflora

Allium sativum

Sygygium jam

China off

Gráfico 9.5: Demonstra o caleidoscópio dos 81 medicamentos utilizados e o número de indivíduos (entre

parênteses) para os quais aqueles foram prescritos.

Zincum metallicum (26), Cactus grandiflorus (9), Arnica montana (9), Ignatia amara para (9). Nitri acidum (8)

Nux vômica (8); Selenium (7), Iodium (7), Chelidonium majus (6), Hamamellis virg. (6); Berberis vulg(5), Kali

bichromicum (5), Solidago(5), Metallum album(5), Cocculus indicus (5); Coffea cruda (4), Rhus Tox(4),

Cuprum metallicum(4), Passiflora (4), Allium sativum (4), Syzygium jambolanum (4); China off (3), Sanícula

aqua (3), Robinia(3), Kalmia latifolia(3), Latrodectus mactans(3), Ruta graveolens (3), Ledum palustre (3),

Sabadilla (3), Phosphorus (3); Carbo veg (2), Glonoinum (2), Serotoninum(2), Indigo(2), Hypericum perf (2),

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130

Rumex crispus (2), Hydrastis canadenses (2), Symphytum(2), Apis mel(2), Cantharis(2), Aescullus hip(2),

Ribavirina 6 CH (2); Colchicum(1), Antimonium crudum(1), Borax(1), Crataegus(1), Plantago(1), Belladona(1),

Cajuputum(1), Agaricus muscarius(1), Natrum mur(1), Lachesis trig(1), Bryonia alba(1), Eupatorium perf(1),

Kali mur(1), Drosera(1), Secale(1), Sticta pulm(1), Antimonium tartaricum(1), Ipecacuanha(1), Gnaphallium(1),

Harpagophytum(1), Ooforinum(1), Lapis albus(1), Cimicifuga racemosa(1),Calcarea phosphorica(1),

Sambucus(1), Rhododendron(1), Myristica sebifera(1), Sataphysagria(1), Thuya occ(1), Pancreatinum(1) cada

medicamento.

Foram utilizados 81 medicamentos para os 26 indivíduos portadores de hepatite C que

aderiram ao tratamento. O Zincum metallicum é o medicamento de escolha para o padrão de

organização hepático alterado. Por esse motivo todos os indivíduos o utilizaram. Os outros

medicamentos variaram conforme as necessidades individuais.

Page 132: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

131

10 CONSIDERAÇÕES FINAIS .

Neste estudo procurou-se dimensionar a potencialidade da Homeopatia, em especial

da abordagem da Homeopatia Sistêmica, para oferecer um cuidado integral aos indivíduos

portadores de hepatite C crônica. Para tal, discutiu-se paralelamente a abordagem da

biomedicina, na qual a doença encontra-se diretamente associada a uma lesão orgânica. Desse

modo, para o portador de hepatite C Crônica, a biomedicina propõe a eliminação do vírus

como critério de cura.

Ao discutir o paradigma biomédico, Luz (1987) discorre sobre suas categorias

constituintes – “doença, entidade mórbida, corpo, organismo, fato patológico, lesão, sintoma”

– e pondera que “vida, saúde e cura” deixam de ser tematizáveis neste modelo. Camargo Jr.

(2003) corrobora esse pensamento ao afirmar que “o saber médico é um saber sobre a doença,

não sobre o homem, o qual só interessa ao médico, enquanto terreno onde a doença evolui: “a

construção das doenças como categorias teve de ser feita excluindo-se os indivíduos

acometidos” (CAMARGO JR. 2003, p.79, 80).

Assim, nesse estudo, acrescentamos à pesquisa “Avaliação do Tratamento

Homeopático em Indivíduos Portadores de Hepatite C Crônica”, apresentada no capítulo

cinco, algumas interrogações: se a Homeopatia Sistêmica teria oferecido a esses indivíduos

um cuidado integral, se teria sido capaz de trazer o indivíduo doente de volta ao centro da

intervenção. Foram utilizadas quatro categorias para análise do discurso dos indivíduos em

tratamento homeopático: adesão, resgate da subjetividade, autonomia, mudança de dinâmica

vital.

Encontramos adesão ao tratamento homeopático de 74,3% dos indivíduos portadores

de hepatite C crônica que procuraram o serviço.

Percebemos também presentes nos relatos de 77,3% dos que aderiram ao tratamento

homeopático, referência ao uso adequado dos medicamentos. Dentre esses 59,1%

relacionaram aos medicamentos homeopáticos sua melhoria clínica, sendo que relatam

evolução clínica com melhoria: 86,4%.

Poderíamos deduzir que o resgate da subjetividade em 100% dos relatos dos

participantes da pesquisa, durante a anamnese homeopática, com a compreensão de sinais e

sintomas indefinidos ou “raros, estranhos e peculiares”, satisfez suas expectativas de

acolhimento e compreensão.

Page 133: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

132

A análise dos resultados do tratamento homeopático sobre a autonomia desses

indivíduos mostra que, após o tratamento homeopático, 59,1% conseguiu reassumir atividades

durante os primeiros 14 meses de tratamento e 31,8% manteve o que já exercia, o que poderia

ser considerado positivo em se tratando de uma doença crônica, o que equivale a 90,9% de

resultados positivos. Sobre este aspecto, vale mencionar Merhy (1997), ao propor que os

serviços de saúde deveriam auxiliar o indivíduo no seu “modo de andar a vida”.

Com a homeopatia, ao recolocar o indivíduo em um processo de cura, com a

recuperação de “sua harmoniosa função vital” (HAHNEMANN, [1810-1921] in

PUSTIGLIONE, CARILLO JR., 1994), esses indivíduos tornaram-se capazes de inventariar

suas possibilidades na vida com mudança em sua dinâmica vital, em sua maioria,

proporcionalmente à recuperação de sua autonomia. Isso confirma a compreensão de

Hahnemann de que essas duas categorias estão intrinsecamente ligadas no mesmo processo.

Através da ótica homeopática, a Hepatite C Crônica teria uma origem

predominantemente intrínseca de caráter crônico – o “sifilinismo” (CARILLO JR., 2000).

Assim sendo o vírus não seria determinante da mesma, mas um agente externo que poderia

desencadear ou agravar um processo já presente intrinsecamente no indivíduo doente e

tratável pela homeopatia, conforme demonstrado pelos resultados obtidos nesse estudo.

Percebeu-se que a diferença conceitual sobre o que seja cura nos paradigmas

biomédico e homeopático é fundamental, pois mesmo os indivíduos que aderiram ao

tratamento homeopático com boa evolução isto é, sentindo-se melhor, vivendo melhor,

modificando sua dinâmica vital com novas perspectivas e capacidade de traçar seu futuro -

retornando às atividades de trabalho, viajando, amando, não se sentem seguros com seu

processo de cura, em vista do único critério de cura proposto pela biomedicina - paradigma

hegemônico na sociedade - ser a eliminação da carga viral. Esses indivíduos apresentaram-se

assim vulneráveis (pois que desejosos) ao retorno ao tratamento biomédico com

medicamentos experimentais (associados aos anteriores), na tentativa de negativação da carga

viral. Tal opção poderá torná-los expostos potencialmente ao desenvolvimento de lesões

orgânicas graves e concomitantes repercussões psíquicas, devido a toxicidade desses

medicamentos, como divulgado no consenso de 2012 sobre o tratamento da hepatite C

crônica: sintomas depressivos, incluindo tendências suicidas, exacerbação de doenças

autoimunes, supressão da medula óssea, anemia hemolítica. Enquanto isso o mesmo consenso

ressalta que “uma proporção significativa de pacientes já tratados não alcançarão resposta

Page 134: a homeopatia e a integralidade do cuidado de indivíduos ...

133

virológica mantida com terapia tripla com inibidores de proteases, então a necessidade de

terapia alternativas para esses pacientes permanece alta”. Assim a cura pela ótica da

biomedicina assemelha-se a uma situação praticamente inalcançável.

Pelo grande número de substâncias medicamentosas utilizadas em combinações

diferentes para cada participante da pesquisa, percebe-se o “exame individualizador de cada

caso”, preconizado por Hahnemann, que confirma que a homeopatia aborda o indivíduo

doente e suas singularidades.

O Zincum metallicum é o único medicamento oferecido a 100% dos indivíduos

portadores de Hepatite C, visto ser o que mais se assemelha às lesões e sintomas hepáticos

apresentados por esses indivíduos.

Um outro elemento que merece ser mencionado nessas considerações finais diz

respeito ao encontro intersubjetivo que ocorre no transcorrer de cada consulta homeopática,

que modifica também a vida do profissional de saúde. Mas isso não fica relatado nos

prontuários. Não há espaço na ficha clínica para que o médico exponha seus sentimentos e

transformações pelas quais passa durante o encontro com a pessoa que o procura.

Consideramos que o presente estudo cumpriu os objetivos propostos.

Tendo sido enfatizado através desse estudo, em conformidade com estudos de outros

autores, a importância da Homeopatia como uma “tecnologia leve-dura” (que se refere tanto

aos aspectos relacionais quanto ao conhecimento técnico estruturado), conforme discutido por

Merhy41 (1998, 2003), esperamos contribuir para sua incorporação na estratégia Saúde da

Família (ESF), com incentivo à disponibilização de medicamentos distribuídos gratuitamente,

produzidos em Farmácias Homeopáticas próprias do Sistema Público de Saúde uma vez que a

Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde propõe que a

Homeopatia seja incorporada nos vários níveis de atenção, com ênfase na Atenção Básica.

Estima-se que esse estudo sobre a abordagem da Hepatite C Crônica também poderá

contribuir para a discussão sobre a importância da suscetibilidade individual hereditária no

adoecimento crônico, questão trazida pela homeopatia, mesmo quando se considera pela

biomedicina - racionalidade médica hegemônica - que o adoecimento crônico seja causado

por um agente externo infeccioso.

41 Merhry (1998, 2003) identifica três tipos de tecnologia presentes no trabalho em saúde – leve, leve-dura e dura –, enfatizando a importância da tecnologia leve, ou relacional, para as práticas de cuidado.

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134

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ANEXO

TERMO DE CONSENTIMENTO DO PACIENTE

TÍTULO DO PROJETO: “Homeopatia e a Integralidade do Cuidado de Indivíduos Portadores de Hepatite C Crônica”.

RESPONSÁVEL PELO PROJETO: Míriam Figueira Reis (Mestranda) e Maria Inês Nogueira (Orientadora)

Telefone para Contato: (021) 9648-3621.

INSTITUIÇÃO: INSTITUTO DE SAÚDE DA COMUNIDADE, PÓS - GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA, UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE.

NOME DO VOLUNTÁRIO: _________________________________________________________

IDADE:__________ANOS. RG: _______________________________________

RESPONSÁVEL LEGAL (quando for o caso)

________________________________________ RG:________________________

Eu, _________________________________________________________, abaixo assinado, responsável pelo meu parente próximo, __________________________________________, declaro ter pleno conhecimento do que se segue:

O(A) Sr. (ª) está sendo convidado(a) a participar do projeto de pesquisa “ A Homeopatia e a Integralidade do Cuidado de Indivíduos Portadores de Hepatite C Crônica” de responsabilidade da pesquisadora Míriam Figueira Reis sob orientação de Maria Inês Nogueira por sua experiência com a abordagem homeopática durante a pesquisa “Avaliação do Tratamento Homeopático para Portadores de Hepatite C”.

A Homeopatia considera para o diagnóstico e tratamento do processo de doença, tanto as lesões orgânicas quanto os aspectos subjetivos como sentimentos e emoções, sensações, respostas diferenciadas às interações com o meio, o que pode ser traduzido como a integralidade no cuidado.

A importância do presente estudo é perceber através dos seus relatos no prontuário, qual a impressão que os atendimentos e o tratamento lhe deixaram, para colocarmos em discussão esse potencial da Homeopatia no cuidado do indivíduo com um todo.

Caso seja confirmado através desse estudo que a Homeopatia é uma Racionalidade Médica de abordagem integral à pessoa e sendo a integralidade um dos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) se reforçará a importância de torná-la acessível aos usuários que desejarem utilizá-la no SUS.

O que lhe está sendo solicitado com esse documento, garantindo-se seu anonimato com manutenção do sigilo da identidade, é a possibilidade de divulgação de trechos de seus relatos já anotados no prontuário durante as consultas que ocorreram ao longo da pesquisa anterior. Tal

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divulgação seria feita em revistas científicas, aulas e congressos e apenas com o propósito científico. Para se garantir o anonimato e sigilo, serão utilizados no lugar dos nomes verdadeiros, nomes de flores e árvores tendo-se ainda o cuidado de não serem divulgadas informações que poderiam identificar a pessoa.

Esse consentimento poderá ser retirado a qualquer momento caso o Sr.(a) não queira permitir a continuidade da divulgação solicitada, sem que isto traga prejuízo ao seu tratamento homeopático.

A qualquer momento haverá a possibilidade de se obter informações atualizadas acerca do estudo, ainda que isto possa afetar sua vontade de continuar dele participando.

Serão fornecidos respostas ou esclarecimentos a qualquer dúvida acerca dos assuntos relacionados com a pesquisa. O telefone de contato para qualquer dúvida será o celular pertencente à Dra. Míriam Reis 9648-3621.

Eu, __________________________________________, RG nº _____________________ declaro ter sido informado e concordo em participar, como voluntário, do projeto de pesquisa acima descrito.

Ou

Eu, __________________________________________, RG nº _______________________, responsável legal por ____________________________________, RG nº _____________________ declaro ter sido informado e concordo com a sua participação, como voluntário, no projeto de pesquisa acima descrito.

Niterói, _____ de ____________ de _______

Nome e assinatura do paciente ou seu responsável legal

_________________________________

____________________________________

Nome e assinatura do responsável por obter o consentimento

______________________________________________________________

_________________________________

Testemunha

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