A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DOS ADMINISTRADORES E GERENTES PELAS...

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Ano 2 Número 2 VERÃO ARTIGOS COMENTÁRIOS DE JURISPRUDÊNCIA RECENSÕES CRÓNICA DA ACTUALIDADE

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Artigo sobre Responsabilidade Civil Subsidiária do pagamento de multa

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Ano 2 • Número 2 • VERÃO

ARTIGOSCOMENTÁRIOS DE JURISPRUDÊNCIARECENSÕESCRÓNICA DA ACTUALIDADE

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1Índice

ÍNDICE

Editorial – Eduardo Paz Ferreira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Convidado de Verão – Paulo Moita Macedo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

ARTIGOS

João Amaral Tomaz – A reunião do G20 de 2 de Abril de 2009 e o futuro dos paraísos fi scais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Ana Paula Dourado – O papel do G 20: Era uma vez três triliões de dóla-res ou a acção consequente das autoridades nacionais e supra-nacionais

Luís Máximo dos Santos – O G-20 e a reforma da regulação bancária

Pasquale Pistone – XXIV Jornadas Latinoamericanas de Derecho Tri-butario: Los principios tributarios ante las nuevas formas de imposición sobre la renta . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Miguel Silva Pinto – A luta contra a fraude ao IVA na União Europeia, desenvolvimentos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Sérgio Gonçalves do Cabo – Saneamento e reequilíbrio fi nanceiro municipal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

COMENTÁRIOS DE JURISPRUDÊNCIA

João Matos Viana – A (In)Constitucionalidade da Responsabilidade Subsidiária dos Administradores e Gerentes pelas Coimas Aplicadas à

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2Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

Sociedade. Comentário ao Acórdão do Supremo Tribunal Administra-tivo, de 4 de Fevereiro, Processo n.º 0829/08 e ao Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 129/09, de 12 de Março . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

José Almeida Fernandes – Truck Center: Obrigação de Retenção na Fonte no Pagamento de Juros entre Entidades Relacionadas na UE. Comentário ao Acórdão do Tribunal de Justiça, de 22 de Dezembro de 2008, Quarta Secção – Processo C-282/07 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Rui Duarte Morais – A Residência e as Convenções de Dupla tributa-ção. Comentário ao acórdão do STA, de 25 de Março, Proc. nº 068/09 – 2.ª Secção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Nuno Cunha Rodrigues – Protocolo entre a Câmara Municipal da Maia e a “MACMAI – Matadouro Agrícola da Maia, Lda.,” tendo em vista a assunção do passivo desta sociedade. Atribuições das autarquias locais e competência dos seus órgãos. Realização de despesas sem suporte legal. Nulidade. Recusa de visto. Comentário ao acórdão do Tribunal de Contas n.º 5/09, de 20 Janeiro, Proc. n.º 800/08 – 1.ª Secção. . . . . . . . . . . . . . .

Síntese dos principais Acórdãos do Tribunal de Justiça das Comuni-dades em matéria fi scal proferidos desde Fevereiro de 2009 . . . . . . . . .

Síntese de Acórdãos do Tribunal Constitucional (1.º e 2.º Trimestres de 2009) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Síntese de Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de Março a Maio 2009 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Síntese de Acórdãos do Tribunal de Contas de Janeiro a Março de 2009

RECENSÕES

Autonomia Contratual e Direito Tributário (A Norma Geral Anti--Elisão)Diogo Leite Campos e João Costa Andrade por Eduardo Paz Ferreira . . .

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3Índice

Perceber a Crise para Encontrar o CaminhoVítor Bento por Mónica Velosa Ferreira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

A crise, e agora?Jacques Attali por Luís Máximo dos Santos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

A Origem das Crises Financeiras – Bancos centrais, bolhas de cré-dito e o mito do mercado efi ciente George Cooper por Luís Máximo dos Santos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

O Regresso da Economia da Depressão e a Crise ActualPaul Krugman por Nuno Cunha Rodrigues . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Global Tax Revolution – The Rise of Tax Competition and the Battle to Defend ItChris Edwards e Daniel J. Michell por João Ricardo Catarino . . . . . . . .

Appunti di Economia del Benessere e Scienze delle Finanze Giuseppe Campa por Eduardo Paz Ferreira. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Direito Financeiro LocalJoaquim Freitas da Rocha por Guilherme Waldemar d’Oliveira Martins

Anuário fi nanceiro dos municípios portugueses – 2007João Carvalho, Maria José Fernandes, Pedro Camões, Susana Jorge . . .

Livros recentes por Ana Leal e Miguel Brito Bastos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Na WEB

Visita ao site do FMI e Blogue pessoal de Pedro Lains (Economia e His-tória Portuguesa) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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4Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

CRÓNICA DE ACTUALIDADE

Ponto de situação dos trabalhos na União Europeia e na OCDE – 19 de Fevereiro e 14 de Maio de 2009 por Brigas Afonso, Clotilde Palma e Manuel Faustino. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

1. Fiscalidade Directa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .2. Imposto sobre o Valor Acrescentado. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .3. Impostos Especiais de Consumo Harmonizados/Imposto sobre

veículos e União Aduaneira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Estados Unidos ameaçam tributar prémios de gestores à taxa de 90%: breve nota informativa por Carlos Loureiro . . . . . . . . . . . . . . . .

Novos dados sobre a pobreza em Portugal (a propósito de um estudo recente publicado no Boletim Económico do Banco de Portugal) por Nazaré da Costa Cabral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Comentário sobre a Nota Técnica da Unidade Técnica de Apoio Orçamental da Assembleia da República relativa às Parcerias Público Privadas nos Domínios Rodoviário e Ferroviário por Maria Eduarda Azevedo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Conferência “Crise, Justiça Social e Finanças Públicas” por Nazaré da Costa Cabral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal: Primeiro Aniversário

Imigração em Portugal e nos Estados Unidos . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Isabel Marques da Silva no STA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Seminários de Direito Fiscal Europeu e Internacional & The Greit Lis-boa Summer Course in European Tax Law por José Almeida Fernandes

Revista de Direito das Sociedades por Eduardo Paz Ferreira . . . . . . . .

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Editorial

1. No momento em que é escrito este editorial, os contornos da crise económica e fi nanceira continuam a permanecer relativamente indefi ni-dos, ainda que alguns sinais encorajadores, nomeadamente nos mercados bolsistas, tenham vindo a permitir o aparecimento de um discurso opti-mista, porventura prematuro e para cujos riscos o The Economist e mui-tos economistas nos alertam. Fazer futurologia em matéria económica é seguramente uma aposta de grande risco, mas que os últimos tempos tornaram ainda mais perigosa. Não se espere, pois, que se afi rme aqui que a crise terminou ou estás em vias de assim ser, ou que se considere que ela se manterá ainda por algum tempo.

Das muitas conclusões que é já possível extrair, com o carácter pro-visório que só o distanciamento temporal poderá aferir, perfi lam-se com especial relevo as seguintes:

2. Em primeiro lugar, que a circunstância de ter havido uma res-posta internacional coordenada terá sido decisiva para estancar a expan-são da crise, ao mesmo tempo que tornava evidente a impossibilidade de sucesso de medidas tomadas apenas no quadro nacional, bem como a incapacidade da actual ordem económica internacional para responder cabalmente aos grandes desafi os.

Daí a importância que atribuímos à reunião do G-20 em Londres, da qual saíram algumas decisões que, ainda que sem satisfazer as mais ambiciosas pretensões de muitos, correspondem a um passo importante na revisão das actuais regras económicas internacionais, ou da sua ausên-

EDITORIALEduardo Paz Ferreira

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

cia. Especialmente importante é a circunstância de ter sido a nível do G-20 que estas decisões foram tomadas, o que marca o reconhecimento da decisiva importância das economias emergentes. Orientação notoria-mente positiva é aquela que aponta no sentido do reforço do apoio ao desenvolvimento económico internacional. Decisão claramente negativa é a da atribuição ao Fundo Monetário Internacional – instituição com largas responsabilidades pela crise – de um papel pivot nas mudanças.

Honra-nos especialmente o facto de João Amaral Tomaz ter acedido a juntar-se ao conjunto de reputados especialistas que apreciam os princi-pais aspectos da reunião de Londres, num Especial G-20.

3. Em segundo lugar, há que assinalar que a crise veio determinar a falência das concepções liberais sobre a intervenção do Estado, tor-nando manifesto que o funcionamento do mercado não pode prescindir da intervenção pública. Sintomática foi, aliás, a decisão do então ainda presidente George Bush no sentido de apoiar fi nanceiramente as insti-tuições em crise ou o reconhecimento dos seus erros por parte de Alan Greenspan.

A expressão extrema dessa falência foi o desaparecimento do aná-tema de práticas como a nacionalização, de há muito varridas do instru-mental de políticas económicas e do próprio léxico.

No plano doutrinário, o acontecimento mais relevante foi a ren-dição de um dos mais importantes teóricos do movimento económico conservador – Richard Posner – com a publicação um de uma monogra-fi a signifi cativamente intitulada The failure of capitalism, que suscitou atenção generalizada e mereceu até uma magnifi ca recensão do grande Robert Solow no New York Review of Books. A generalizada reabilitação de Keynes e a redescoberta de autores como John Kenneth Galbraith, tão injustamente tratado e remetido para a lista dos autores panfl etistas, são também de salientar.

A crise deu, por outro lado, origem a um intenso movimento edito-rial traduzido no aparecimento de um vasto conjunto de obras de valor muito desigual. Na secção de recensões damos conta de algumas que nos mereceram especial atenção, com relevo para a de Vitor Bento, Per-ceber a crise para encontrar o caminho, comentado por Mónica Velosa Ferreira.

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Editorial

Da mesma forma, a crise abriu caminho a um intenso debate teórico e a um renovado empenho cívico, particularmente evidente nos Estados Unidos da América, mas com expressão bem mais escassa em Portugal. O IDEFF orgulha-se, aliás, de ter instituído um fórum amplamente alar-gado, de que constitui momento alto a Conferência que tive a honra de organizar, em colaboração com João Amaral Tomaz, José Carlos Gomes Santos e Nazaré Costa Cabral.

4. Em terceiro lugar, há que reconhecer a importância do papel da nova Administração norte-americana e do Presidente Barack Obama, na procura de novos modelos de organização sócio-económica em que as preocupações de justiça e solidariedade se conjugam com a racionali-dade económica e com uma atenção particular às questões ambientais, fundamentais para o futuro da Humanidade.

Do mesmo modo e por oposição, deve admitir-se a debilidade da resposta europeia assente, é certo, no aprofundamento de melhores mecanismos de estabilização automática e de solidariedade social que os Estados Unidos. Nem por isso deixa de impressionar a falta de energia e decisão, bem como a forma como a Comissão se manteve agarrada a modelos que mostraram exuberantemente a sua falência, tibieza em que foi acompanhada pela generalidade dos Estados Membros exibindo, de resto, uma grande incapacidade para apoiar membros em especiais difi culdades.

5. Em quarto lugar, a crise veio revelar a existência de um conjunto de práticas fraudulentas em instituições de crédito, a par com um elevado número de operações de elevada complexidade e risco, resultantes da fragilidade da regulação, fruto quer das medidas desregulatórias tomadas nas últimas décadas, quer da aceitação, mais ou menos passiva, pelas instituições reguladoras, de modelos que asseguraram um crescimento muito acentuado da riqueza, criando a ilusão da prosperidade indefi nida.

Tornou-se, por outro lado, visível que o apoio ao sector fi nanceiro foi central em todas as políticas anti-crise, em detrimento da ajuda ao sector produtivo ou à rede de apoio social.

Trata-se de uma opção compreensível, dada a importância do cré-dito para o funcionamento da economia e para o crescimento mas que, ainda assim, não pode deixar de causar algum desconforto, quer em face

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do crescimento exponencial do número de falências e do desemprego, quer em face das difi culdades de fi nanciamento que as empresas conti-nuam a experimentar.

Mais grave ainda e em face de certas formas de intervenção, parece ser a opção de ignorar os problemas do moral hazard, criando a sensação de que a protecção acordada a investimentos de risco é idêntica à dispen-sada às instituições e consumidores mais ponderados e conservadores.

6. Em quinto lugar, assiste-se a uma recuperação do valor da justiça na tributação, tão secundarizado nos últimos tempos, traduzido no agra-vamento da progressividade fi scal, na tentativa de minorar as desigualda-des económicas e de reforçar a luta à elisão tributária.

Trata-se de caminhos muito difíceis de trilhar e que podem levar, por vezes, a soluções excessivas, como o debate parlamentar em torno da tributação dos prémios dos gestores e do sigilo bancário tem tornado patente em Portugal.

Um vez mais, o exemplo americano parece ser decisivo e, por isso, na crónica de actualidade incluímos nota informativa de Carlos Loureiro sobre a polémica proposta democrata.

7. A última e mais importante conclusão que nos parece legítimo extrair é a de que a esperança de que a crise fosse um momento de gesta-ção de um clima de criatividade susceptível de originar a construção de um novo paradigma de sociedade, expressa pelo Papa, ou por economis-tas como Robert Reich e, entre nós, por Paulo Macedo, está a esvair-se. E, no entanto, como sublinhou Francisco Pinto Balsemão, aquando da entrega do Prémio Pessoa ao arquitecto Carrilho da Graça, este poderia ser um momento para que a hipótese da destruição criativa de Schum-peter funcionasse plenamente, “ porque todos temos a sensação de que nada voltará a ser como era e, por isso, a destruição criativa, a inovação radical, o aproveitamento de ideias e a aprovação de valores até aqui submergidos pelas estruturas económicas e sociais prevalecentes serão o caminho, ainda vago e mal iluminado, que nos conduzirá ao próximo futuro”.

A consequência que, como muitos pensam, poderá ser a do retorno à normalidade, representar apenas o adiamento de uma crise que se mani-festará, de novo, dentro de alguns anos e encontrará as sociedades mais

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Editorial

exauridas nas suas forças morais e intelectuais. Claro que no período que mediará poucos continuarão a ganhar muito e muitos continuarão a ganhar pouco. Nem a concepção de justiça que nos ilumina, nem a racionalidade económica que nos deve guiar nos permitem conformar-nos com esta situação.

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CRISE E FINANÇAS PÚBLICAS

PAULO MOITA MACEDO∗

A crise traz progressos. A criatividade nasce da angústia. Na crise nasce a invenção, os descobrimentos e as grandes estratégias. Quem atribui à crise os seus fracassos e penúrias viola o seu próprio talento e respeita mais os problemas do que as soluções. A verda-deira crise é a crise da incompetência. Sem crise não há desafi os, sem desafi os a vida é uma rotina, uma lenta agonia. Sem crise não há mérito. A única crise ameaçadora é a tragédia de não querer lutar.

ALBERT EINSTEIN

A citação com a qual iniciamos esta breve nota não deve induzir o leitor em erro. Não vamos aqui abordar a actual crise1 na interessante perspectiva que nela está implícita, mas pensamos que esta perspectiva não pode ser esquecida e, se devidamente interiorizada, poderá contri-buir para a ultrapassagem da crise e para o que alguns designam a criação de uma nova ordem económica mundial.

Concentrar-nos-emos, ao invés, na análise, necessariamente super-fi cial, das suas manifestações aos diferentes níveis, incluindo o das fi nan-ças públicas, e nas medidas que poderão contribuir para a ultrapassar.

∗ Esta nota baseia-se na apresentação efectuada no Instituto de Direito Financeiro e Fiscal (IDEFF) da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa em 17 de Março de 2009. As opiniões expressas pelo autor são-no a título estritamente pessoal.

1 Para VÍTOR BENTO, “[e]stamos perante a maior crise económica de que há sufi -ciente memória viva” – cfr. Crise económica, ou mais do que isso?, Revista de Finanças Públicas e Direito Financeiro, Ano I, 4, pág. 21.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

Uma crise sem precedentes

Uma das características mais relevantes e menos esperada da crise é a rapidez com que a mesma se instalou. O “mundo em mudança” (já desde o século XVI...) perdeu o estatuto de lugar-comum2 e a necessi-dade de elaboração de orçamentos suplementares generalizou-se. Num período de pouco mais de um ano, os mercados de capitais caíram abrup-tamente; entre Novembro de 2008 e Fevereiro de 2009 o preço do ouro subiu 40%. Os prémios de risco exigidos pelos investidores para a dívida pública britânica ou alemã (a que dispunha de melhor rating) aumenta-ram de forma substancial, colocando em evidência que o processo de reavaliação do risco de crédito não era um exclusivo de entidades (Esta-dos ou empresas) mais fi nanceiramente debilitados.

Em Junho de 2008, constatávamos, quando da participação numa conferência também promovida pelo IDEFF, as tendências de aumento reiterado das taxa de juro pelo Banco Central Europeu, da política econó-mica dirigida essencialmente ao combate à infl ação, da confi ança quase absoluta na política monetária, da política fi scal de “race to the bottom”, da subavaliação do risco, do “crédito fácil”, que originou um aumento do fi nanciamento sem precedentes, da prioridade incontestada ao cum-primento do Pacto de Estabilidade e Crescimento, do Estado tendencial-mente apenas regulador, a valorização prolongada dos activos mobili-ários e imobiliários, o crescimento elevado do comércio e do Produto Interno Bruto (PIB) mundial.

Em Março de 2009 (ou seja, apenas nove meses depois), o pano-rama era completamente diferente: constatávamos a redução das taxas de juro para níveis sem paralelo nas últimas décadas, o combate reforçado ao desemprego, o recurso generalizado à política orçamental3, a necessi-dade de aumentar receitas fi scais a prazo, o combate à defl ação, o cres-cimento da dívida pública (aliás sem paralelo no mundo ocidental nos

2 O “mundo em mudança” está bem patente, por exemplo, na frequência com que o Fundo Monetário Internacional tem vindo a actualizar as suas previsões nos últimos meses. A expressão “business will never be as usual” parece ser ajustada às circunstâncias.

3 Como refere JOSÉ SILVA LOPES, As despesas públicas e o combate à crise econó-mica, Revista de Finanças Públicas e Direito Financeiro, Ano II, 1, pág. 13, “[e]m face da actual crise económica mundial, voltámos a ser (quase todos) keynesianos”.

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Convidado de Verão

últimos 60 anos), a sobrevalorização do risco, o Estado interveniente, a recessão nas economias desenvolvidas, a quebra substancial no valor dos activos.

Desde logo, a crise manifesta-se ao nível do fi nanciamento4, quer quanto à disponibilidade, quer quanto ao custo. Por outro lado, a aver-são ao risco, potenciada pela crise, determinou um aumento substancial dos custos de fi nanciamento ao nível das instituições bancárias5. Este aumento não foi repercutido na totalidade nos fi nanciamentos conce-didos, tendo em grande medida sido absorvido pelo sistema bancário6.

Relevante é também a circunstância de este aumento dos custos de fi nanciamento se verifi car à escala mundial.

A dimensão das perdas nos mercados de capitais é já histórica. Em pouco mais de dois anos, a capitalização bolsista mundial reduziu-se em 35 triliões de dólares americanos7, 5 dos quais no sector da banca8. Alguns dos bancos que foram objecto de aumentos de capital, quer por parte dos estados, quer por alguns fundos soberanos, passaram a valer menos do que os próprios aumentos efectuados nos últimos dezoito meses.

4 De acordo com os dados divulgados pelo Bank for International Settlements, o volume de crédito bancário internacional aumentou de 6 mil milhões de dólares em 1990 para 37 mil milhões de dólares em 2007. De 1995 a 2008, o PIB nominal aumentou 90% nos Estados Unidos da América e 65% na zona euro, enquanto o crédito aumentou, respectivamente, 177% e 180%.

5 Por exemplo, em Janeiro de 2007, um dos maiores bancos portugueses fi nanciava--se com um spread de 12,5 pontos de base, enquanto em Janeiro de 2009 se fi nanciava com spreads que atingiam já 217 pontos de base sobre as taxas de referência do mercado.

6 Nomeadamente no caso do crédito à habitação e contratos a médio e longo prazo com spreads fi xos para empresas. Este fenómeno está relacionado com a natureza típica da actividade bancária, de transformação da maturidade entre os recursos obtidos e os empréstimos concedidos.

7 A quantidade de zeros necessários para indicar este número é elucidativa: $ 35.000.000.000.000...

8 Por exemplo, entre 30 de Junho de 2007 e 20 de Janeiro de 2009, a capitalização bolsista do Citibank reduziu-se dez vezes; no mesmo período, a capitalização bolsista do HSBC, que tinha tradicionalmente um dos melhores comportamentos em bolsa, reduziu--se a metade e a UBS perdeu três quartos do seu valor. E, entre 20 de Janeiro de 2009 e 23 de Fevereiro de 2009, a redução de cerda de dez vezes da capitalização bolsista do Citibank aumentou para vinte vezes, repetindo-se a tendência noutros bancos.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

Tratou-se de uma redução anormal da riqueza quase sem preceden-tes nos últimos 50 anos. Vários factores contribuíram para esta evolução, mas o factor comum e determinante foi a crescente falta de confi ança.

Verifi ca-se, no entanto, um efeito positivo na redução do custo global do fi nanciamento, porque, se os spreads do crédito das empresas aumentaram substancialmente, também as taxas de juro de referência caíram para um valor sem paralelo, conforme é ilustrado pelo gráfi co seguinte.

Euribor a três meses – evolução entre Janeiro de 2008 e Junho de 2009

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Como o quadro demonstra, neste ciclo a Euribor caiu mais de 400 pontos de base9. As empresas que recorreram a fi nanciamento a taxa variável com spreads fi xos através de leasing, através de empréstimos de médio e longo prazo ou de programas de papel comercial a médio e longo prazo verão os seus custos de fi nanciamento reduzidos.

9 A Euribor a três meses atingiu um máximo de 5,393% em Agosto de 2008 e um mínimo de 1,206% em Junho de 2009.

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Convidado de Verão

Uma crise com profundas consequências

Mas se é unânime a opinião quanto à singularidade e carácter único desta crise, não podemos deixar de constatar que os efeitos que a mesma está a causar não são únicos e, em alguns aspectos, são inclusivamente menos gravosos do que os de crises anteriores. Por exemplo, o PIB per capita dos Estados Unidos reduziu-se em cerca de 29% durante a crise de 1929/1933, enquanto se estima que actualmente se possa reduzir cerca de 4%10 no período de 2008 a 2010, conforme resulta do gráfi co seguinte.

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52

2,83

4

4,55

9

5,6

21

7,09

9

1,31

5

1,61

8

2,2

02

2,73

7

3,91

3

4,9

17

5,05

6

38,1

48

34,7

59

28,4

29

23,0

07

28,0

07

22,3

46

34,6

59

1818-19 1837-39 1857 1873 1893-95 1907 1929-33 1980-82 1990-91 2000-01 2007- ? 20??-??

PIB per capita antes da crisePIB per capita depois da crise

PIB per capita antes e depois das crises: o exemplo norte-americanoPIB per capita em termos reais. Dólares de 2000.

-1% -4% -2% -3% -14% -12,5%-29%

-3%

-1,5%

-0,03%

?

Imobiliário, matérias primas, importações

Imobiliário, matérias agricultura, canais

Cereais, ouro

Caminhos de ferro

Caminhos de ferro, acções

Acções Acções, bancos

Energia, imobiliário, banca, desintermediação

Acções, regras contabilísticas

Imobiliário, subprime, derivativos

Energia, imobiliário, banca, desintermediação

Este menor impacto (espera-se) da actual crise dever-se-á, prova-velmente, à rapidez e à dimensão da intervenção dos governos no campo das fi nanças públicas, aos mecanismos de ajustamento automático imple-

10 A redução no crescimento do PIB não é homogénea. A Ásia continua a demons-trar algum dinamismo, com crescimentos ainda signifi cativos, que o Banco Mundial prevê, não obstante, situarem-se a níveis em alguns casos substancialmente mais baixos do que se vinha verifi cando nos últimos anos.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

mentados ao longo das últimas décadas na política orçamental nos paí-ses desenvolvidos (como o subsídio de desemprego e a progressividade dos impostos) e à actuação atempada, coordenada e incisiva da política monetária.

Por outro lado, esta é uma crise que teve o seu início no sector fi nanceiro (sobretudo na banca que era designada de investimento) mas rapidamente alastrou a todos os sectores. Os sectores imobiliário e auto-móvel foram os primeiros a evidenciar indícios de contágio, mas, em maior ou menor grau, todos os sectores económicos foram envolvidos nos efeitos da crise.

Na economia “real” a crise traduz-se na maior difi culdade no acesso a fundos, no aumento signifi cativo do custo do capital, na debilidade e elevada volatilidade dos mercados accionistas, na redução dos cash-fl ows, no pagamento de prémios pela liquidez, no aumento dos riscos de balanço e na maior intervenção do Estado.

São também já evidentes as alterações no comportamento dos con-sumidores e as tentações de proteccionismo do Estado não foram ainda concretizadas muito provavelmente por infl uência da opinião pública “informada”, que difi cilmente aceitará uma tão rápida inversão da ten-dência das últimas décadas.

Constata-se, ainda, que a crise atinge de forma mais intensa os que investiram no mercado de capitais ou no mercado imobiliário11. E este fenómeno é mais visível nos dois extremos dos estratos sociais: os muito ricos, que viram o seu património desvalorizar-se, e os mais desfavoreci-dos, sobretudo os que perderam o emprego.

Os efeitos negativos da crise manifestam-se também em Portugal, com o adiamento da aquisição de bens duradouros e uma forte retracção da procura externa com efeitos relevantes no PIB (por via da queda das exportações) e nas intenções de investimento.

Em termos de dívida pública, Portugal está numa posição intermé-dia, não tendo sido tão afectado como países como a Irlanda, mas cla-ramente pior do Espanha, com menor dívida pública e um défi ce orça-

11 Sobretudo no mercado imobiliário em Espanha, na Irlanda ou nos Estados Uni-dos da América.

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Convidado de Verão

mental mais baixo12, o que signifi ca que este país pode acomodar uma maior intervenção na economia. No entanto, o défi ce da balança corrente e de capitais é claramente superior ao de outros países que connosco se podem comparar.

País

Yield 10

anos Rating

Balança

Externa

(% PIB)

2010

Saldo Orç

(% PIB)

2010

Dívida

Pub. (%

PIB) 2010

Spread

face

Alemanha

Grécia 6,01 A- -13,2 -4,2 98 291

Itália 4,65 A+ -1,4 -3,7 110 155

Portugal 4,66 A+ -10,2 -4,4 72 156Espanha 4,30 AA+ -6,6 -5,7 53 120

Bélgica 4,31 AA+ -1,5 -4,3 94 121

Alemanha 3,10 AAA 5,4 -4,2 72 0

França 3,68 AAA -3,9 -5,0 76 57

Irlanda 5,70 AAA c/ cred watch neg -3,5 -13 68 260

Holanda 3,93 AAA 6,1 -2,7 55 82

Austria 4,05 AAA 2,6 -3,6 65 95

Finlandia 3,66 AAA 2,3 0,5 36 56

Nota: Valores de yields (e spreads) relativos a 23 de Janeiro de 2009. Valores para agregados macro-económicos correspondem a projecções da Comissão Europeia no pressuposto de manutenção das actuais políticas.

Spreads da RepúblicaComparação com pares da área do euro

^

´

Fonte: Eurostat e Bloomberg.

12 A acumulação de dívida externa portuguesa devido ao desequilíbrio crónico da balança de transacções correntes é um dos principais determinantes na aferição do risco de crédito da República. Apesar dos esforços de melhoria de competitividade (desde 2003 que a taxa de câmbio efectiva da economia portuguesa não se desvia da evolu-ção exibida pelo respectivo indicador alemão), com algum efeito na redução do défi ce comercial, a deterioração na balança de rendimentos e a factura energética absorveram na totalidade estes ganhos, mantendo-se o valor geral do défi ce externo em níveis muito elevados e difi cilmente sustentáveis. Com efeito, cerca de metade do défi ce deriva da dependência energética do exterior. A redução do preço do petróleo deverá contribuir para uma redução deste valor e o desenvolvimento de produção de energia renovável deverá, a prazo, permitir uma diminuição sustentada desta dependência e encargo fi nan-ceiro. As elevadas necessidades de fi nanciamento externo num clima de elevada aversão ao risco e de contenção de liquidez constituem uma restrição activa muito importante para o desempenho económico a curto prazo.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

Dependência do financiamento externo das economias desenvolvidasDéfice da balança corrente em % dos rendimentos correntes, 2008

Aust

rália

Áust

ria

Bélg

ica

Cana

Din

amar

ca

Finl

ândi

a

Fran

ça

Alem

anha

Gré

cia

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lând

ia

Port

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nha

Suéc

ia

Suíç

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Rein

o U

nido

EUA

Fonte: Standard and Poor’s

Uma crise que exige medidas urgentes

Neste âmbito, é necessário, em simultâneo com as medidas de polí-tica orçamental, um forte apoio político à manutenção de Portugal na zona euro13, que tem funcionado como um factor de protecção da econo-mia portuguesa. A solidariedade com outros países da zona euro com difi culdades orçamentais (como a Grécia e a Irlanda) é também funda-mental e coerente com um propósito de projecto comum, alicerçado num conjunto de entendimentos estruturantes, mas com liberdade de actua-ção ajustada às diferentes opções de política económica de cada Estado membro. Este apoio deve ser complementado com o apoio político aos pacotes de estímulos estabelecidos a nível internacional, como forma de

13 O Diário Económico de 16 de Março de 2009 dava conta de um estudo que con-cluía que “Portugal ameaça a união monetária”. O mesmo se verifi cava relativamente aos outros países do sul da Europa (Espanha, Itália e Grécia), cuja situação económica “representa um sério risco para a união monetária”. As “hipóteses remotas” de bancar-rota destes Estados, bem como da desintegração da zona euro, são ponderadas no estudo referido, ainda de acordo com o Diário Económico.

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Convidado de Verão

restituir tranquilidade aos agentes económicos, fomentar a confi ança e, por essa forma, relançar o comércio externo a procura externa e, em con-sequência, as exportações portuguesas.

Para além da integração na zona euro, que nos tem protegido (ou que tem amortecido) de algumas das consequências da crise, a economia portuguesa dispõe de alguns amortecedores que permitem que a crise se sinta ainda de forma mitigada.

Desde logo, o peso do Estado (que a curto prazo poderá ultrapas-sar 50% do PIB, o que é manifestamente excessivo) funciona como um amortecedor. Também o peso da economia informal (e apesar da per-versidade da situação) funciona como um amortecedor da crise14. Por outro lado (e nem todas as notícias são más), em 2009 é expectável um aumento da capacidade de poupança dos que mantiverem o seu emprego, por via de aumentos salariais acima da infl ação e por via da redução substancial das taxas de juro e concomitante redução dos encargos com o fi nanciamento15.

A redução do custo global do fi nanciamento é assim um factor que permite amortecer os efeitos da crise. Na mesma linha, a baixa dos pre-ços dos combustíveis pode contribuir para estes efeitos.

Para além da preocupação legítima com a crise propriamente dita, Portugal deverá aproveitar a adversidade que a mesma representa e uti-lizá-la para dar passos decisivos na resolução de problemas estruturais da economia, apostando na redução do nível de endividamento excessivo de alguns sectores ou agentes económicos com níveis de endividamento demasiado elevados e no aumento da competitividade e produtividade16.

14 Tratando-se embora de um factor claramente negativo, o peso da informalidade na economia portuguesa acaba por ter este efeito positivo.

15 Por exemplo, a redução da taxa de juro no caso de um empréstimo de € 100.000 com um spread de 1% signifi cará uma descida de 33% na prestação mensal.

16 Para LARRY SUMMERS, Conselheiro Económico Principal de Barack Obama “[a]lguns defendem que em vez de tentar simultaneamente criar empregos e investir no nosso crescimento de longo prazo, nos deveríamos focar exclusivamente nas políticas de curto prazo geradoras de consumo. Mas essa abordagem conduziu a alguns dos proble-mas com que hoje nos defrontamos – e é essa abordagem que devemos rejeitar se quiser-mos fortalecer, a longo prazo, a nossa classe média e a nossa economia”. – Washington Post de 28 de Dezembro de 2008, apud VÍTOR BENTO, Perceber a crise para encontrar o caminho.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

E, por fi m, o dinamismo das empresas e dos cidadãos deverá ser incentivado, nas vertentes da procura por processos mais efi cientes, da inovação, da valorização profi ssional e da atitude responsável perante o endividamento. As empresas devem ser incentivadas a procurar novos mercados, o investimento, em especial em investigação e desenvol-vimento, deve ser apoiado e a importância da produtividade deve ser enfatizada. Há que explorar oportunidades, assegurar o fi nanciamento de curto e médio/longo prazo, recapitalizar as empresas, aumentar a transpa-rência, ajustar a capacidade à procura e reduzir custos substancialmente.

O crescimento baseado no fi nanciamento fácil com acesso a capital abundante e a custos reduzidos deixou de ser possível com a actual crise. Se dúvidas existissem, fi cou empiricamente comprovado que o risco de incumprimento existe efectivamente17.

Por outro lado, a diferenciação dos custos do fi nanciamento por força do risco, que até agora era mitigada quer em termos de diferenciais de spreads, quer no acesso a fundos, far-se-á sentir de forma sem prece-dentes ao nível das empresas e dos Estados excessivamente endividados, sem condições para fazer face ao serviço da dívida. Os agentes económi-cos actuarão num novo contexto e serão obrigados a corrigir os excessos.

A correcção deveria ser feita mediante o apoio às empresas pres-tadoras de bens transaccionáveis, criando condições que lhes permitam baixar os custos dos seus factores de produção ou evoluir na cadeia de valor, potenciando a sua competitividade e permitindo a recuperação de quotas de mercado nos mercados externos e domésticos, e, por esta via, possibilitar a redução do défi ce externo e do ritmo de endividamento18.

A longo prazo, é inevitável uma redução do endividamento19, que necessariamente terá de surgir por via de uma conjugação do aumento

17 Quem se atreveria a afi rmar, por exemplo há dois anos, que a Lehman Brothers poderia falir ou que a Islândia poderia estar em risco de bancarrota?

18 O apoio ao sector da banca é fundamental, porque contribui decisivamente para a estabilização do sistema fi nanceiro e, nesta medida, afecta todos os restantes sectores. É uma condição necessária, embora não sufi ciente, para esta estabilização. Pela função estruturante desempenhada pelo sector fi nanceiro é igualmente fundamental reforçar a supervisão, enfocando-a nas questões substanciais, dando às questões de forma a impor-tância relativa que, nesta perspectiva, elas merecem.

19 Para os níveis de endividamento anteriores à crise terão certamente contribuído as regras contabilísticas e a fi scalidade associada ao fi nanciamento com recurso a capitais

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Convidado de Verão

das exportações e da redução das importações, que refl icta a melhoria da competitividade das empresas. A redução de custos (capital, salários, fac-tores de produção conexos), incluindo também (e talvez especialmente) os custos de contexto, é um imperativo para o desenvolvimento do país.

O modelo económico global pré-crise tem que ser repensado, tendo presente, se não a sua falência, pelo menos as graves defi ciências que demonstrou.

No caso português haverá que ponderar todos estes aspectos, adap-tando-os à nossa realidade de país periférico, apostando na diferenciação da economia no plano ibérico e europeu por via de competências pró-prias mais exclusivas.

Perante a dimensão da crise, não restaria provavelmente outra alter-nativa que não fosse a intervenção determinada do Estado. No entanto, as medidas já adoptadas e aquelas que ainda poderão vir a ser adoptadas têm uma consequência signifi cativa no aumento da despesa pública, pelo que é consensual que devem ser temporárias (e também reversíveis), devendo retomar-se a via da consolidação orçamental assim que a situa-ção económico-social o permita.

Por outro lado, as medidas que sejam adoptadas com consequências no aumento da despesa pública não exceder, em termos comparados, as de outros países da União Europeia, no sentido de que, por forma a não perder competitividade, a intervenção do Estado não deve ser maior em Portugal do que noutros Estados que têm, aliás, mais espaço de manobra.

No contexto desta crise, que descrevemos em traços muito largos, ressalta a importância renovada das fi nanças públicas como elemento simultaneamente amortecedor e potenciador da transformação pela crise, mas que só é viável num quadro percebido de sustentabilidade presente e futura das contas públicas. É que, como consequência da crise, a receita fi scal baixa: reduzem-se os lucros, registam-se menos-valias, a massa salarial tende a ser menor (nomeadamente pelo aumento do desemprego), pelo que diminui a receita nos impostos sobre o rendimento; reduz-se o consumo, sobretudo o dos bens que não são de primeira necessidade, pelo que diminui a receita de IVA; transmitem-se menos imóveis e a valores mais baixos, pelo que diminui a receita de IMT; reduz-se o fi nan-

alheios, que, em Portugal como em muitos outros países, continua a ter um tratamento mais vantajoso do que o fi nanciamento com recurso a capitais próprios.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

ciamento e realizam-se menos operações fi nanceiras, pelo que diminui a receita de Imposto do Selo...

A pressão verifi ca-se (verifi cava-se já antes da crise), simultanea-mente, do lado da despesa: lançamento de novas infra-estruturas, aumento da protecção social, nomeadamente no caso de desemprego e no combate à pobreza e exclusão social20. Esta pressão é actualmente aumentada pela intervenção acrescida do Estado na economia, nomeadamente através do apoio directo a sectores específi cos (como o da banca ou automóvel) e às pequenas e médias empresas e a prestação de garantias.

A pressão sobre as fi nanças públicas verifi ca-se assim, simultane-amente, em três frentes, num contexto que não encontra paralelo nas últimas décadas.

A aposta na despesa21 que dá frutos a relativamente curto prazo, como é o caso das escolas, é uma aposta com resultados concretos e imediatos, mas menos ambiciosa do que, por exemplo, a aposta na infor-matização acelerada da justiça ou na simplifi cação, nomeadamente pela via da informatização, dos processos de licenciamento administrativo22.

20 É o custo do Estado Social, que, como refere JOSÉ CASALTA NABAIS, Refl exões Sobre Quem Paga a Conta do Estado Social, Ciência e Técnica Fiscal n.º 421 (Janeiro-Junho de 2008), p. 7-46, não se limitam ao dos direitos sociais (que têm por suporte fun-damentalmente custos fi nanceiros públicos directos). Para o autor, todos os direitos têm custos públicos: são “liberdades privadas com custos públicos”, assentando os direitos e liberdades em custos fi nanceiros públicos indirectos.

21 A pressão sobre a despesa reforça a importância do papel desempenhado por organismos como o Tribunal de Contas. Como refere GUILHERME D’OLIVEIRA MARTINS, em O Tribunal de Contas como factor de disciplina, O Economista, 2008, a “obrigatorie-dade de reforço dos poderes de controlo fi nanceiro e orçamental” decorre já de factores como “a necessidade de evitar o endividamento de gerações futuras, a exigência de redução do desperdício público, a sustentabilidade das fi nanças públicas, o equilíbrio entre o défi ce demográfi co e o respeito dos compromissos sociais, a salvaguarda da coe-são social, a credibilização dos instrumentos de fi scalização e controlo e a preservação da confi ança nas instituições e da legitimidade cívica e democrática”. A crise acrescenta uma nova dimensão a esta necessidade.

22 É fundamental o fortalecimento das instituições como a justiça, com vista à cria-ção de uma justiça que não seja limitada a quem tem meios para tal e que seja mais “user friendly” para os cidadãos e para as empresas. A celeridade é igualmente fundamental: a demora na justiça desvirtua-a e contribui para a sua descredibilização. Na área fi scal, por exemplo, uma justiça célere é provavelmente uma das mais importantes garantias dos contribuintes, mas não é ainda uma realidade em Portugal.

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Convidado de Verão

Também a aposta no aumento e na qualifi cação do pessoal que, na Admi-nistração Pública, desempenha funções de valor acrescentado e dirigidas à prevenção e ao combate à criminalidade económica poderá produzir efeitos mais relevantes a médio prazo23.

O défi ce público crescente (considerando também a despesa não orçamentada, como a relativa às parcerias público-privadas) terá que ser combatido e o aumento dos impostos poderá ser inevitável. A pressão sobre as fi nanças públicas faz ressaltar a importância das medidas de consolidação fi scal, que serão indispensáveis a médio prazo, o que signi-fi ca que, provavelmente, a “race to the bottom” já terminou. No período de transição para uma racionalização da despesa do Estado, a estabili-dade da receita fi scal é fundamental, e valerá a pena retomar a discussão em torno da ampliação da base tributável, através da redução de bene-fícios, da redução de deduções e, inclusivamente, estudar a criação de novos factos tributários24.

Medidas como a aproximação da tributação das pensões à tribu-tação dos rendimentos do trabalho dependente, ou o aumento das taxas marginais de IRS, voltarão a estar na ordem do dia dos debates na área fi scal. O aumento das contribuições para a segurança social a cargo dos trabalhadores e a concomitante redução das contribuições a cargo das empresas permitiria a redução dos custos destas, melhorando a sua com-petitividade em termos internacionais.

A crise veio igualmente dar razão aos que (como é o nosso caso) têm vindo a insistir no fortalecimento da administração fi scal, que permita o reforço, entre outros, do combate à evasão e fraude fi scal e à informali-

23 Neste sentido vai uma proposta recente da administração Obama, em reacção aos escândalos fi nanceiros, mas também aos défi ces crescentes.

24 Questões como as emissões de carbono e a abrangência dos impostos especiais sobre o consumo serão fundamentais neste âmbito. JOSÉ CASALTA NABAIS pergunta se esta criação de novos factos geradores de imposto pode levar a um “estado fi scal em duplicado”: a par do “estado fi scal”, conformado pela “constituição fi scal” existiria um “estado fi scal paralelo mascarado de não fi scal que é fi nanciado por impostos especiais, mormente por consumos específi cos, com receitas consignadas, muito embora designa-dos por taxas ou contribuições para assim escaparem à constituição fi nanceira e fi scal” – cfr. Refl exões Sobre Quem Paga a Conta do Estado Social, cit., p. 39 e seg. A preocu-pação do autor é legítima, mas a necessidade de receita fi scal é uma evidência, pelo há que compatibilizar as duas vertentes.

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dade25, e no combate à utilização de offshores, nomeada e especialmente de offshores não cooperantes26. A efectiva tributação de pelo menos uma parte dos rendimentos e do património canalizados para estes offshores permitiria aumentar a receita fi scal sem recurso a medidas que afectam sobretudo aqueles que já pagam impostos.

O combate à evasão e fraude fi scal torna-se aliás cada vez mais importante porque condiciona de forma determinante o único instru-mento signifi cativo de política económica que ainda se mantém na com-petência de Portugal, ou seja, a política orçamental.

Concluindo

E acabamos por concluir (quod erat demonstrandum) que, afi nal, o Estado não é dispensável. Da crise poderá surgir um Estado legitimado pelo papel nela desempenhado, pelo reconhecimento da importância da existência de um Estado que, limitando os riscos de excessos, intervenha no apoio a uma economia de mercado.

Este Estado terá necessariamente que ter uma menor dimensão do que a que atingiu, por exemplo, em Portugal, e será, por isso, obrigado a ser mais efi caz, a melhorar a cobrança da receita e, sobretudo, a optimi-zar a afectação da despesa.

25 O estudo elaborado pela COTEC para a Universidade Católica em Abril de 2008 sobre a economia informal propõe medidas no combate à economia informal, entre as quais se destacam a simplifi cação e agilização dos processos de licenciamento comercial, industrial, ambiental e urbanístico, o incentivo à utilização de mecanismos de certifi ca-ção de contas, a facturação electrónica, a simplifi cação da liquidação de sociedades, a abordagem segmentada da economia informal, a transparência e reforço dos incentivos profi ssionais, o aumento da tempestividade, qualidade e quantidade da informação não fi scal, a obrigatoriedade de publicação das contas das entidades sem fi ns lucrativos, a fusão das direcções-gerais com competências na área fi scal, integração de processos de inspecção e a avaliação regular dos organismos da administração.

26 As recentes tomadas de posição da OCDE nesta matéria, respaldada pela posição assumida pelo G-20 na cimeira de Abril de 2009, podem constituir um ponto de viragem neste combate, nomeadamente pela divulgação de uma lista de paraísos fi scais não coo-perantes abrangendo países que até agora tinham conseguido evitar essa qualifi cação.

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Convidado de Verão

E um Estado com legitimidade reforçada, de menor dimensão e mais efi caz, é, provavelmente, um Estado com o qual os cidadãos estão dispostos e reconciliar-se.

Retomando o espírito da citação de Einstein com a qual iniciámos esta nota, a crise deverá ser aproveitada para continuar, em ritmo mais acelerado, as reformas estruturais de que Portugal tanto necessita em áreas tão diversas como o licenciamento, o ordenamento do território, a justiça e o apoio à actividade empresarial (na vertente da legislação laboral, da prestação de serviços públicos, etc.).

Ainda no mesmo espírito, a crise é uma oportunidade ímpar para as empresas de todos os sectores se reestruturarem, redireccionarem a sua actividade e aumentarem a sua competitividade; em última instância, os benefícios reverterão para o país.

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João Amaral Tomaz

A reunião do G20 de 2 de Abril de 2009e o futuro dos paraísos fi scais

João Amaral Tomaz

Economista e docente universitário. Ex-Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

RESUMO

A actual crise económica e fi nanceira global coloca novas oportunidades aos Governos e Organizações Internacionais para combater os paraísos fi scais e outros cen-tros fi nanceiros não cooperantes.

A reunião do G-20, de 2 de Abril, suscitou particular expectativa, não só pela con-fi rmação das posições já conhecidas de Merkell e Sarkozy, como pelo facto de Obama se estrear na Europa e estar em debate um tema que lhe é particularmente caro dado que tinha sido, então como senador, um dos apoiantes do senador Carl Levin da proposta “The Stop Tax Haven Abuse Act”.

A OCDE vinha pugnando, designadamente no Global Forum In Implementing The Internationally Agreed Tax Standards, sem grande sucesso, para a necessidade de ace-lerar a celebração de acordos de troca de informação para efeitos fi scais com paraísos fi scais e outras jurisdições não cooperantes.

A reacção após a reunião do G20 foi surpreendentemente bastante positiva. Todavia é ainda muito cedo para tirar conclusões. Citando Charles Gnaedinger, os “paraísos fi scais portam-se bem com a OCDE – por enquanto”. Veremos o que o futuro nos reserva…

Palavras-chave:Paraísos fi scais Reunião do G20Acordos de troca de informações fi scais

ABSTRACT

The ongoing global fi nancial and economic crisis presents major challenges to fi ght the tax havens and other non-cooperative fi nancial centres.

G20 meeting has created a large motivation and expectation, either by the reasses-sment of Merkell´s and Sarkozy´s positions or by Obama´s fi rst presence in Europe for the debate of a cherished matter, taking into account that he had been, as senator at time, one of the cosponsors of senator Carl Levin´s proposal “The Stop Tax Haven Abuse Act”.

OECD has been fi ghting, for many years, namely at the Global Forum In imple-menting The Internationally Agreed Tax Standard, without success, for the need to speed up the signing of tax information exchange agreements with tax havens and other non-cooperative jurisdictions.

The reactions after the G20 meeting were surprisingly very positive. However, it is too early to draw conclusions. Quoting Charles Gnaedinger, “tax havens play nice with OECD – for now”. We will see what the future shall deserve to us…

Keywords:Tax havensG20 meetingTax information exchange agreements

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Artigos

O período que antecedeu o G20

Como é normal, a reunião foi precedida de um amplo e diversifi -cado quadro de previsões sobre os resultados expectáveis nas diversas áreas em discussão e, particularmente, no domínio específi co do combate aos paraísos fi scais, embora a maioria dos analistas antecipasse que, para além de mensagens fortes no sentido da contenção da actuação das práti-cas concorrenciais nocivas, particularmente num quadro de crise econó-mica e fi nanceira à escala mundial, não

seria

de esperar nada de concreto.

Havia, no entanto, alguma expectativa face à estreia do Presidente Barak Obama no Continente Europeu, conhecendo-se a sua sensibilidade para o tema do combate aos paraísos fi scais e as suas tomadas de posição, como senador, sobre esta questão, tendo sido um dos principais apoiantes e cosponsor da célebre proposta do senador Carl Levin e Norm Coleman “The StopTtax Haven Abuse Act (S. 681)” 1 apresentada no Senado em 17 de Fevereiro de 2007.

Os escândalos de natureza fi scal num banco do Liechtenstein e nas operações de um banco Suíço para clientes americanos, a que são de acrescer os escândalos fi nanceiros com eventuais implicações fi scais, designadamente nos EUA, Islândia e Reino Unido, vieram tornar impe-riosa e inadiável uma mudança de políticas para fazer face à preocupante erosão das receitas fi scais de muitos países para os paraísos fi scais e outras jurisdições que, não podendo ser rotuladas como tais, eram mani-festamente refractárias a troca de informações para efeitos fi scais.

Em 5 de Março de 2009, a Tax Justice Network tinha divulgado um programa de acção, “Endig the Offshore Secrecy System: An Action Programme to Strengthen International Financial and Fiscal Regulatory Regulation” em que apelava para um modelo global de cooperação fi scal e de melhor coordenação das normas fi scais e fi nanceiras.

Paralelamente, as Nações Unidas estão a preparar uma Conferência sobre o tema World Financial and Economic Crisis and Its Impact on Development, que terá lugar entre 1 e 3 de Junho, sendo a Comissão de preparação presidida por Joseph Siglitz, laureado com o Prémio Nobel da

economia, que esteve recentemente numa conferência em Portugal.

1 Para conhecer a intervenção de Obama, ver “Statements on Introduced Bills and Resolutions, The United States Senate, Feb 17, 2007, Section 21, S. 681”.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

Em fi nais de Março a Comissão Sigglitz apresentou a seguinte recomendação:

“Tax havens and fi nancial centers in both developed and developing countries that fail to meet basic standards of transparency, information exchange and regulation should be given strong incentives to reform their practices, e.g. by restricting transactions between fi nancial institutions in those jurisdictions and those in more highly regulated countries”.

Por outro lado, os governos da Alemanha e a França, a que se jun-tou mais tarde o Reino Unido, vinham defendo, particularmente a partir da reunião do G7 de Junho de 2008 em Osaka e da reunião preparatória do G20, que teve lugar em Berlim em Fevereiro de 2009, uma actuação forte, determinada e coordenada contra os paraísos fi scais.

Finalmente a OCDE, desde há alguns meses, tinha vindo a trans-mitir sinais claros que numa situação de crise

que se estava a revelar

mais grave, profunda e demorada do que havia sido previsto, não pode-ria manter a atitude algo passiva dos últimos anos para com os países e jurisdições não cooperantes.

Recorda-se que a OCDE desde há vários anos que se tem vindo a preocupar com os problemas de concorrência fi scal prejudicial deri-vados da utilização abusiva de paraísos fi scais, mas sem obter resulta-dos importantes. Obviamente, que a atitude de grande permissividade de alguns países membros da Organização, particularmente dos EUA, até há pouco tempo atrás, e da Áustria, Bélgica, Luxemburgo e Suíça, por razões de transitoriedade ou derrogação à obrigatoriedade da troca de informações no domínio dos rendimentos de poupança, para além de, nalguns casos, terem legislações internas muito restritivas sobre o sigilo bancário, não permitiu grandes avanços.

A OCDE havia elaborado um relatório2, poucos meses antes da reu-nião do G-20 de Londres, contendo os resultados da

avaliação efectuada

a 84 jurisdições. O Secretário-Geral da OCDE, Angel Guria, em Janeiro de 2009, na reunião de Davos, já tinha alertado para a mudança de ati-tude da sua Organização ao declarar que estava empenhada em combater

2 “Tax-Cooperation : Towards a Level Playing Field – 2008 Assessment by the Global Forum of Taxation”.

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Artigos

os lados mais sombrios da globalização, em particular a corrupção e a fraude fi scal.

A reunião do G20

Para a reunião do G-20, a OCDE, com base no relatório citado, repartiu as 84 jurisdições que haviam sido supervisionadas pelo Glo-bal Forum In Implementing The Internationally Agreed Tax Standard3 em três blocos: jurisdições que implementaram substancialmente os padrões e princípios (standards) em matéria de transparência e de troca de informações; jurisdições que se haviam comprometido a implementá--los substancialmente, mas que ainda não o tinham feito; e jurisdições que não se haviam comprometido a fazê-lo. Esta seriação foi associada à designação de zona branca, cinzenta e negra, respectivamente. (Ver Anexo no fi nal)

No próprio dia da reunião do G-20, o Uruguai que integrava, con-juntamente com a Costa Rica, a Malásia e as Filipinas, a “zona negra” comprometeu-se a implementar os standards, conseguiu ver o seu nome excluído deste bloco da lista e iniciou uma ampla campanha diplomática para reiterar em todos os países em que tem representação diplomática o seu compromisso.

A Costa Rica, as Filipinas e a Malásia seguiram de imediato o Uru-guai, assumindo idêntico compromisso, tendo igualmente sido retirados da “lista negra”, que assim passou a um conjunto vazio.

Embora a China fi gure na “zona branca” da lista submetida ao G20, a nota de rodapé nº 2 dessa lista exclui daquela classifi cação Hong Kong e Macau, que integrarão a “zona cinzenta”, apesar de se terem compro-metido a fazer as diligências para respeitar os “standards”.

Do segundo subconjunto, “zona cinzenta”, faziam parte, designada-mente três Estados membros da União Europeia, a Áustria, a Bélgica e o

3 O Global Forum é integrado pelos membros da OCDE e pelos não membros que

se comprometeram a aplicar os standards de transparência e de troca de informações para efeitos fi scais, standards esses que se encontram previstos no Acordo Sobre a Troca de Informações em Matéria Fiscal (Tax Information Exchange Agreements – TIEAS), e no artigo 26° da Convenção Modelo da OCDE.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

Luxemburgo, e também Singapura e a Suíça, tendo os mesmos levantado a reserva que vinham colocando ao artigo 26° da Convenção Modelo da OCDE.

A Bélgica contactou 48 países, incluindo Portugal, para propor pro-tocolos de actualização/inclusão nas respectivas Convenções de Dupla Tributação. O ministro das Finanças, Didier Reynders, declarou não estar satisfeito com o enquadramento do seu país mas esperava a pas-sagem à “zona branca” logo que fossem assinados diversos acordos de troca de informações para efeitos fi scais, que estavam em negociação com diversos países.

O ministro das Finanças da Áustria, Joseph Pröll, considerou que o enquadramento do seu país na “zona cinzenta” refl ectia os passos que tinham sido dados na boa direcção.

Ao que se tem conhecimento apenas a Suíça tem vindo a tomar uma atitude menos colaborante, tendo mostrado o seu descontentamento, traduzido numa “retaliação” de cariz político, pelo facto de ter sido colo-cada pela OCDE na “lista cinzenta” sem ter sido previamente infor-mada, tendo simbolicamente bloqueado os fundos destinados àquela Organização.

Andorra, Liechtenstein, Macau, Mónaco e São Marino, ainda antes da reunião do G20, manifestaram a sua intenção de implementar os “standards” da OCDE.

As Ilhas Cayman assinaram também poucos dias antes da reunião acordos bilaterais de troca de informações com os 7 países nórdicos (Dinamarca, Finlândia, Gronelândia, Ilhas Faroe, Islândia, Noruega e Suécia).

Guernsey, Jersey e a Ilha de Man, que já integram a “lista branca”, assinaram novos acordos de troca de informações com diversos países. Em fi nais de Março, o número de acordos assinados com países membros da OCDE atingia o número de 12, tendo Guernsey e Jersey assinado 11 cada. Para além disso, todas aquelas jurisdições tinham assinado mais 2 acordos da mesma natureza com países que não fazem parte da OCDE.

O Principado do Mónaco anunciou recentemente que pretende cele-brar até fi nais de 2009 acordos de troca de informações com todos os Estados membros da União Europeia que o pretendam e, em particular, com os países europeus que também integram o G-20.

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Artigos

Em 16 de Abril, as Bermudas assinaram um acordo de troca de informações com a Nova Zelândia.

No Diário da República, 2ª série, nº 97, de 20/5/2009, foi publicado o Despacho nº 12047/2009 relativo à negociação de acordos em matéria de troca de informações entre Portugal e as seguintes jurisdições: Ilha de Man, Jersey, Guernsey, Ilhas Caimão, Andorra, Antilhas Holandesas, Aruba, Ilhas Virgens Britânicas, Turcos e Caicos, Antígua e Barbuda, Gibraltar, Liechtenstein e Hong Kong.

Irá a reunião do G 20 constituir um marco histórico no reforço das trocas de informações fi scais e de combate aos paraísos fi scais?

Parece ser muito cedo para se poder cantar vitória, não obstante a rápida mudança de posição de alguns países e jurisdições que se vinham comportando de forma ostensivamente não cooperante no domínio da troca de informações.

A questão que muitos analistas colocam é se não iremos assistir a um processo dilatório como já ocorreu no passado na OCDE.

De forma telegráfi ca, recordam-se as diversas fazes deste longo processo:

• Em 1998 a OCDE publica o Relatório Harmful Tax Competition: An Emerging Global Issue;

• Em 2000 a OCDE divulga um relatório em que identifi ca 35 juris-dições como sendo paraísos fi scais face aos critérios enunciados no relatório de 1998;

• Existiam mais 6 jurisdições que seriam classifi cadas como para-ísos fi scais (Bahamas, Chipre, Ilhas Bermudas, Ilhas Cayman, Malta e São Marino) mas que não foram incluídas na lista porque se comprometeram a respeitar os “standards” da OCDE no domí-nio da prestação de informações fi scais;

• A lista de 35 países fi cou reduzida a 7 jurisdições, designadas por não cooperantes, que não se comprometeram formalmente a adoptar os “standards” da OCDE: (Andorra, Ilhas Marshall, Libé-ria, Liechtenstein, Mónaco, Naru e Vanatu);

• Em 2003, Naru e Vanatu comprometeram-se a respeitar os “stan-dards” e foram retiradas da lista;

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

• Em 2007 as Ilhas Marshall e a Libéria fi zeram idênticas promes-sas, sendo igualmente retiradas da lista;

• Alguns dias antes da reunião do G20 em Londres, a lista inicial abrangia apenas Andorra, Liechtenstein e Mónaco;

• Em vésperas da reunião do G20 aquelas 3 jurisdições retiraram as suas reservas e comprometeram-se a respeitar igualmente os “standards” da OCDE

As conclusões do G20 na área do combate à concorrência fi scal

prejudicial são as seguintes, na versão ofi cial, a inglesa:

• increased disclosure requirements on the part of taxpayers and fi nancial institutions to report transactions involving non-coope-rative jurisdictions;

• withholding taxes in respect of a wide variety of payments;• denying deductions in respect of expense payments to payees

resident in non-cooperative jurisdictions;• reviewing tax treaty policy;• asking international institutions and regional development banks

to review their investment policies; and• giving extra weight to the principles of tax transparency and

information exchange when designing bilateral aid programs.

Não deve ser porém ignorado que, sem a alteração profunda da

postura dos EUA, que passou de uma atitude de excessiva tolerância, laxismo e, poderá considerar-se mesmo nalgumas épocas não

muito dis-

tantes, de apoio discreto, não teriam sido possíveis os progressos que agora se detectam no combate à erosão das receitas fi scais através da utilização de jurisdições não cooperantes, em particular dos principais centros fi nanceiros offshore.

O primeiro ministro Gordon Brown foi muito claro e enfático na conferência de imprensa, no fi nal da reunião do G-20, eventualmente também pelo facto de ser o anfi trião de uma reunião que pode vir a fi car na história, ao indicar que podia ser o princípio do fi m dos paraísos fi s-cais: “ We have agreed that there will be an end to tax havens that do not transfer information request. The banking secrecy of the past must come to an end. This is the start of the end of tax havens, because country after

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Artigos

country is now signing up to the principles that have been set forward internationally. The principle is you have to be prepared to exchange information about tax on request”.

Não pode dissociar-se este paradigma de combate à fraude da grave situação económica e fi nanceira mundial. Como referiu recentemente o Director-Geral do Internal Revenue Service (IRS) americano, Douglas Shulman, em períodos de crise não se pode diminuir o rigor perante os infractores, bem pelo contrário.

A mudança de atitude dos EUA relativamente à fuga substancial de capitais e à erosão fi scal através de paraísos fi scais já estava a come-çar a ter lugar mesmo durante a parte fi nal do mandato de Bush. Essa conclusão está alicerçada nos relatórios “tax haven banks and U.S. tax compliance”, de 17 de Julho de 2008, elaborado pelo Permanent Sub-committee on Investigations – United States Senate e do relatório “ear-nings stripping, transfer pricing and U.S. income tax treaties” preparado pelo Departamento do Tesouro para o Congresso, de Novembro de 2007.

Por outro lado, a descoberta de um esquema fraudulento envolvendo o private banking de um banco Suíço, conjuntamente com o conheci-mento de que no escândalo do Liechenstein também estavam envolvidos diversos contribuintes americanos, quase coincidindo com a condenação a elevadas penas de prisão efectivas de ex-quadros de uma auditora, condenados pela venda de produtos especifi camente dirigidos ao plane-amento fi scal abusivo/evasão, podem ser elementos determinantes para que os EUA tivessem começado a abandonar a sua atitude tradicional-mente complacente sobre este tipo de situações.

Deu-se a coincidência de, pouco tempo após estes factos, ter ocor-rido a eleição de Barak Obama para Presidente dos EUA. Acontece que Obama quando era Senador foi cosponsor do Stop Tax Haven Abuse Act, acima referido, que não teve apoios sufi cientes em 2007, mas que voltou recentemente a ser reintroduzido por Carl Levin..

Na sua declaração para a reunião do G-20, o Presidente esclareceu claramente a sua posição relativamente aos paraísos fi scais.4

4 “Temos de tomar medidas severas contra os paraísos fi scais e o branqueamento de capitais. Uma rigorosa transparência e sentido de responsabilidade devem verifi car a existência de fraudes pondo termo a um período de contrapartidas sem controlo…” – Semanário Expresso de 4/4/09.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

Internacionalmente, a profunda mudança de atitude dos EUA foi muito rapidamente interiorizada. Não será por isso de estranhar que tenha sido recentemente assinado um acordo sobre troca de informações entre os EUA e Gibraltar, em 31/3/2009, curiosamente em Londres, à margem da reunião do G-20, em que se prevê a possibilidade de deslocação, com autorização, de autoridades dos EUA a Gibraltar para ouvir ou fi scalizar contribuintes nacionais.

Alguns meses antes tinha sido celebrado acordo similar com o Lie-chtenstein mas, neste caso, é necessário proceder neste país a uma alte-ração legislativa sobre o sigilo bancário, que terá que obter o acordo do Parlamento, podendo não ser uma questão muito pacífi ca. Em todo o caso, se tal acontecer, os EUA podem vir a accionar mecanismos de penalização relativamente aos bancos do Liechtenstein que não forne-çam informações.

O IRS emitiu recentemente instruções/orientações para a comuni-cação voluntária, por parte dos contribuintes de contas não declaradas em offshores. Não se trata de nenhuma amnistia, dado que o imposto devido terá que ser pago, mas apenas de uma redução das coimas. Note--se que, mesmo assim, a penalidade a aplicar será de 20% do saldo da conta5

, podendo ser reduzida a 5% caso sejam verifi cadas determinadas

condições cumulativas. Os governos da Alemanha e França tiveram também um papel deter-

minante no movimento de combate aos paraísos fi scais e tudo indica que irão manter essa atitude no futuro próximo.

Não deixou de causar alguma perplexidade e de colocar algumas

dúvidas sobre a credibilidade das escolhas o facto de os paraísos fi scais constituídos pelas Ilhas do Canal (Jersey e Guernesey) e pela Ilha de Man terem sido integrados pela OCDE na “zona branca” da lista de 2 de Abril, quando a Suça, um dos países fundadores da Organização, tinha sido classifi cada na “zona cinzenta”, enquanto que os territórios ultramarinos associados (overseas territories) de Anguilla, Gibraltar, Ilhas Bermudas, Ilhas Caímão, Turcos e Caicos, Ilhas Virgens Britânicas e Monserrate, continuam a fi gurar na “zona cinzenta” da lista de 2 de Abril.

5 “... a penalty equal to 20 percent of the amount in the offshore account or foreign entity will be imposed for the year with the highest aggregate account value during the six-year period”.

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Artigos

A argumentação da OCDE, alicerçada na utilização de critérios objectivos estandardizados para a avaliação dos 84 países/jurisdições, tomou em linha de conta não só os compromissos assumidos por aque-les territórios dependentes do Reino Unido, anteriormente à reunião do G-20, como principalmente a concretização dos compromissos através da celebração de diversos acordos sobre troca de informações em maté-ria fi scal.

O primeiro ministro Gordon Brown tinha vindo a alertar aquelas jurisdições, particularmente os teritórios ultramarinos, para o risco de sanções caso não

respeitem rapidamente os

standards da OCDE. Já depois

da reunião do G-20, Brown reafi rmou o seu compromisso de combate aos paraísos fi scais, tendo escrito individualmente aos governantes dos ter-ritórios ultramarinos britânicos incluídos na “zona cinzenta”, chamando a atenção para a necessidade de tomarem as diligências necessárias para assinarem, até Setembro, TIEAs com as Administrações Tributárias de outros países, dando assim um sinal claro de que o acordo de Londres do G-20 é para cumprir integralmente.

Aliás, o Reino Unido vinha já sinalizando, desde há algum tempo,

a sua mudança de posição relativamente aos paraísos fi scais, incluindo os “seus”. Um dos primeiros sinais dessa mudança ocorreu, ainda em 2008, quando o Tesouro não

assumiu indemnizar os depositantes da fi lial do

Kaupthing Bank da Islândia.

Em resumo, não é pacífi co antecipar o que vamos ter pela frente no domínio da utilização dos paraísos fi scais para evitar o pagamento dos impostos devidos. Parece no entanto de concluir que, após o G20, nada será como de antes. A “crise” que tem “costas largas” poderá também contribuir, pela positiva, para que não

se

repitam os erros do passado e

para alterar o paradigma que serve de modelo aos “paraísos fi scais”: a opacidade e o sigilo bancário.

Como referiu o Presidente Obama: “Uma rigorosa transparência e sentido de responsabilidade devem verifi car a existência de fraudes, pondo termo a um período de contrapartidas sem controlo”. Se, com o empenhamento de todos, em particular dos países mais desenvolvi-dos, em que os contribuintes têm utilizado de forma ampla e abusiva os paraísos fi scais, houver uma concretização signifi cativa deste ideal, então a reunião do G20, de 2 de Abril, poderá vir a fi gurar na história da fi scalidade.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

O director de Política e Administração Fiscal da OCDE, Jeffrey Owens, afi rmou recentemente que tinham ocorrido mais progressos nos dois últimos meses do que em 20 anos. Vamos ver o que nos reserva o futuro.

A PROGRESS REPORT ON THE JURISDICTIONS SURVEYED BY THE OECD GLOBAL FORUM IN IMPLEMENTING THE INTERNATIONALLY AGREED TAX STANDARD1

Progress made as at 2nd April 2009

Jurisdictions that have substantially implemented the internationally agreed tax standard

Argentina Australia Barbados Canada China2 Cyprus Czech Republic Denmark Finland France

Germany Greece Guernsey Hungary Iceland Ireland Isle of Man Italy Japan Jersey

Korea Malta Mauritius Mexico Netherlands New Zealand Norway Poland Portugal Russian Federation

Seychelles Slovak Republic South Africa Spain Sweden Turkey United Arab Emirates United Kingdom United States US Virgin Islands

1. The internationally agreed tax standard, which was developed by the OECD in co-operation with non-OECD countries and which was endorsed by G20 Finance Ministers at their Berlin Meeting in 2004 and by the UN Committee of Experts on International Cooperation in Tax Matters at its October 2008 Mee-ting, requires exchange of information on request in all tax matters for the administration and enforcement of domestic tax law without regard to a domestic tax interest requirement or bank secrecy for tax purposes. It also provides for extensive safeguards to protect the confi dentiality of the information exchanged.

2. Excluding the Special Administrative Regions, which have committed to implement the interna-tionally agreed tax standard.

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Artigos

Jurisdictions that have committed to the internationally agreed tax standard,but have not yet substantially implemented

Jurisdiction Year of

Commitment Number of Agreements

Jurisdiction Year of

Commitment Number of Agreements

Tax Havens3

Andorra Anguilla Antigua and Barbuda Aruba Bahamas Bahrain Belize Bermuda British Virgin Islands Cayman Islands4 Cook Islands Dominica Gibraltar Grenada Liberia Liechtenstein

2009 2002 2002 2002 2002 2001 2002 2000 2002 2000 2002 2002 2002 2002 2007 2009

(0) (0) (7) (4) (1) (6) (0) (3) (3) (8) (0) (1) (1) (1) (0) (1)

Marshall Islands Monaco Montserrat Nauru Neth. Antilles Niue Panama St Kitts and Nevis St Lucia St Vincent & Grenadines Samoa San Marino Turks and Caicos Islands Vanuatu

2007 2009 2002 2003 2000 2002 2002 2002 2002 2002 2002 2000 2002 2003

(1) (1) (0) (0) (7) (0) (0) (0) (0) (0) (0) (0) (0) (0)

Other Financial Centres

Austria5 Belgium5 Brunei Chile

2009 2009 2009 2009

(0) (1) (5) (0)

Guatemala Luxembourg5 Singapore Switzerland5

2009 2009 2009 2009

(0) (0) (0) (0)

Jurisdictions that have not committed to the internationally agreed tax standard

Jurisdiction Number of Agreements

Jurisdiction Number of Agreements

Costa Rica Malaysia (Labuan)

(0) (0)

Philippines Uruguay

(0) (0)

3. These jurisdictions were identifi ed in 2000 as meeting the tax haven criteria as described in the 1998 OECD report.

4. The Cayman Islands has enacted legislation that allows it to exchange information unilaterally and has identifi ed 12 countries with which it is prepared to do so. This legislation is being reviewed by the OECD.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

5. Austria, Belgium, Luxembourg and Switzerland withdrew their reservations to Article 26 of the OECD Model Tax Convention. Belgium has already written to 48 countries to propose the conclusion of protocols to update Article 26 of their existing treaties. Austria, Luxembourg and Switzerland announced that they have started to write to their treaty partners to indicate that they are now willing to enter into renegotiations of their treaties to include the new Article 26.

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Ana Paula Dourado

O papel do G20: Era uma vez três triliões de dólares ou a acção consequente das autoridades nacionais

e supra-nacionais

Ana Paula Dourado

Professora da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa Consultora do FMI Ex-delegada para o Grupo da Fraude

e Evasão Fiscais da OCDE

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

RESUMO

A recente crise económica mundial colocou um desafi o às instituições decisoras nacionais e internacionais, no sentido de encontrarem mecanismos que consigam evi-tar as externalidades negativas da falência de instituições fi nanceiras multinacionais. Segundo o plano de acção n.º 35 do Grupo de Trabalho n.º 2 do G-20, as entidades supervisoras devem colaborar no sentido de estabelecer colégios de supervisão a nível nacional para todas as instituições fi nanceiras transfronteiriças, como parte dos esfor-ços de vigilância das empresas multinacionais. As instituições de supervisão nacionais e supranacionais devem encontrar uma forma adequada de trocar informações, numa base de regular periodicidade. O objectivo fi nal é repor a estabilidade e a confi ança no sistema fi nanceiro e mantê-las.

Palavras-chave:G 20 e troca de informaçõesSupervisãoRegulação

ABSTRACT

The recent world economic crisis has created a challenge to national and supra-national authorities, in order to fi nd mechanisms that may avoid negative externalities in the case of insolvency of multinational fi nancial institutions. According to Action Plan n. 35 of the WG 2 in the frame of the G20, supervising authorities must cooperate in order to create supervision colleges at the national level. National and supranational supervision instittutios must fi nd an adequate way of exchanging information, on a regular basis. The fi nal aim is to bring back trust and confi dence on the fi nancial system on a stable basis.

Keywords:G 20 and Exchange of informationSupervisionRegulation

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Artigos

A Cimeira de Abril do G 20 chegou a acordos históricos, no quadro de um ambiente eufórico: o fi nanciamento do Fundo Monetário Inter-nacional e do Banco Mundial (o Brasil, a fi nanciar o Fundo Monetário Internacional!), fortes estímulos ao comércio internacional, e Sarkozy a anunciar o fi m do sigilo bancário supervisionado por um Conselho de Estabilidade Financeira, substituto do Fórum de Estabilidade Financeira1.

Nem todas as análises acompanharam a euforia que transparecia do fi m da Cimeira – veja-se o Economist de 11 de Abril2 - mas deve reconhecer-se que as crises económicas de dimensão extraordinária são uma oportunidade para romper com a inércia instalada e convencer as autoridades competentes a agir em áreas que há muito exigiam medi-das (por exemplo, reforço da cooperação internacional na supervisão dos mercados fi nanceiros).

As crises também são (mal) aproveitadas para introduzir medidas populistas contrárias aos direitos fundamentais e a princípios constitu-cionais, e que não actuam sobre as causas verdadeiras dos problemas, mas distraem e entretêm o cidadão/eleitor/contribuinte menos atento e menos esclarecido - veja-se a tributação retroactiva de gestores, nos Estados Unidos3, ou a tributação confi scatória (superior a 50%) e contrá-ria à unicidade do imposto, dos prémios dos gestores, entre nós.

Não vamos comentar o segundo grupo de medidas, mas antes tecer breves considerações sobre o mandato do Grupo de Trabalho n.º 2 no quadro do G-204.

Trata-se de um grupo mandatado para reforçar a cooperação inter-nacional e promover a integridade dos mercados fi nanceiros.

Os montantes injectados no sistema fi nanceiro são defensáveis quando a confi ança no mercado falha totalmente, como ilustra o exem-plo do “Great Capitol Hill Baby-sitting Co-op Crisis” de Joan e Richard Sweeney, contado por Paul Krugman5.

1 V. o Jornal de Negócios, de 3 de Abril de 2009, pp. 8, 10; 2 Pp. 16-17.3 V. o Economist, de 14 de Fevereiro de 2009 .4 G-20 Working Group on Reinforcing International Cooperation and Promoting

Integrity in Financial Markets (WG2), Final Report, de 27 de Março de 2009.5 O Regresso da Economia da depressão e a crise actual, Ed. Presença, Lisboa,

2009 (trad.), pp. 22 e ss..

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Mas mais do que essa injecção, são recomendáveis níveis apropria-dos de regulação e supervisão ao nível mundial6. As instituições fi nan-ceiras multinacionais, ao escaparem a um controlo rigoroso por parte de alguns Estados, comportam graves riscos que podem atingir uma escala supra-nacional como demonstrou a recente crise económica mundial.

Como evitar que as falências provoquem externalidades negativas transfronteiriças? Como limitar, segundo critérios de razoabilidade e sem regulação excessiva, os efeitos da falência a uma sociedade ou sucursal do grupo?

Por exemplo, as regras fi scais predominantes a nível internacional pretendem estabelecer fronteiras e separar os resultados das entidades do mesmo grupo através dos preços de transferência e do princípio da plena concorrência7. Se os preços de transferência forem correctamente apli-cados é possível evitar as externalidades positivas e negativas e estabe-lecer um perímetro de consolidação no apuramento de lucros e prejuízos fi scais. Todavia, reconhece-se que no quadro da globalização o controlo da aplicação efectiva dos preços de transferência acaba por ser, em mui-tos ordenamentos, meramente teórico. E as administrações fi scais têm plena consciência que a aplicação dos preços de transferência pressupõe a troca de informações.

Mas nem todos os domínios fi nanceiros têm “perímetros de conso-lidação” ou um “ring fence” que opere de modo semelhante aos preços de transferência.

A recente crise parece apontar para a necessidade de encontrar um tal perímetro e acentuar a necessidade da troca de informações em todas as áreas de regulação.

Segundo o plano de acção n.º 35 do Grupo de Trabalho n.º 2 do G-20, as entidades supervisoras devem colaborar no sentido de estabe-lecer colégios de supervisão a nível nacional para todas as instituições fi nanceiras transfronteiriças, como parte dos esforços de vigilância das empresas multinacionais.

Todas essas instituições devem ser fi scalizadas por um colégio de supervisão e todas as autoridades nacionais devem ter conhecimento da

6 V. Economist de 16 de Maio de 2009, p. 13.7 V. o art.º 9.º do Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento e o Património

da OCDE .

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lista de instituições fi nanceiras que estão submetidas a esse colégio de supervisão. Mas também devem ser objecto de fi scalização as multina-cionais que não sejam instituições fi nanceiras e que possam ter relações fi nanceiras relevantes com instituições fi nanceiras multinacionais.

As instituições de supervisão nacionais e supranacionais devem encontrar uma forma adequada de trocar informações, numa base de regular periodicidade. O objectivo fi nal é repor a estabilidade e a con-fi ança no sistema fi nanceiro e mantê-las.

Esta cooperação pretende encontrar uma base sólida de regulação, a qual é também o ponto de partida para controlar actividades ilícitas em vários domínios, nomeadamente o fi scal. O incumprimento dos deveres de regulação pode estar associada ao incumprimento de outros deveres legais, nomeadamente, os fi scais.

Neste contexto, com a adopção das Normas (princípios) Interna-cionais de Contabilidade, o Comité Internacional de Princípios de Con-tabilidade (International Accounting Standards Board – IASB) tem um papel relevante, fornecendo dados sobre o progresso realizado na con-vergência destes princípios, assegurando a transparência, uma relação adequada e de troca periódica de informações com as entidades nacio-nais competentes8.

Para assegurar os objectivos enunciados, é fundamental que os ordenamentos jurídicos nacionais e regionais cooperem efectivamente e que sejam transparentes, uma vez que é a ausência de cooperação e de troca de informações que mais facilita a criação e desenvolvimento das actividades fi nanceiras ilícitas.

Desde o ano 2000 que no quadro do Grupo de Trabalho contra a Fraude e Evasão Fiscais da OCDE se acentua a necessidade da troca de informações entre Administrações Fiscais.

Em cooperação com o Grupo de Trabalho da OCDE, há vários gru-pos e subgrupos – nomeadamente o Financial Action Task Force (FATF). O FATF tem identifi cado os ordenamentos que não trocam informações, ao abrigo de certos critérios, que estão a ser revistos. Lembre-se que há diversos ordenamentos que aprovaram já há alguns anos legislação sobre o branqueamento de capitais, mas que não a aplicam.

8 V., entre nós, o Impacto Fiscal da Adopção das Normas Internacionais de Contabilidade, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 200, 2006, pp. 13 e ss..

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Controlar a nível supra-nacional a efectiva aplicação dessa legisla-ção não é tarefa fácil, nem é susceptível de ser verifi cada em missões de um ou dois dias, por parte de instituições supra-nacionais. Ela implica obviamente que as legislações nacionais diminuam ou limitem o sigilo bancário, de modo a que a informação possa ser obtida em primeiro lugar internamente – nomeadamente pelas administrações fi scais – e posterior-mente comunicada às contrapartes. E implica a diminuição efectiva dos índices de corrupção.

É necessário também que as instituições supervisoras tenham um controlo efectivo das multinacionais, nomeadamente, das instituições fi nanceiras que actuam a nível global (em actividades transfronteiriças) e dos riscos que a sua actividade oferece.

No quadro do referido Grupo de Trabalho contra a Fraude e Evasão Fiscais da OCDE, o Modelo de Troca de Informações Fiscais (2002), a recente redacção do art.º 26.º e o recente art.º 27.º do Modelo da OCDE sobre a dupla tributação internacional do rendimento e do património, prevêem uma estreita cooperação entre as autoridades fi scais9. Segundo os referidos Modelos da OCDE, já não é possível estabelecer reservas à troca de informações relacionadas com o sigilo bancário, e há uma troca de informações plena em caso de infracções tributárias (crimes e contra-ordenações), titularidade de bens e rendimentos e informação constante de contabilidade organizada.

Se olharmos para a evolução desta matéria no ordenamento por-tuguês nesta década, apercebemo-nos que temos acompanhado discre-tamente mas de modo coerente e com fi rmeza as melhores práticas da OCDE: veja-se a introdução e alterações aos artigos 63.º-A, B e C da Lei Geral Tributária e a eliminação por parte de Portugal da reserva que acompanhava o referido art.º 26.º do Modelo de Convenção da OCDE.

Contudo, nem todos os ordenamentos introduziram as medidas pre-vistas pelo Modelo, continuando a aplicar o sigilo bancário.

9 V. Ana Paula Dourado «O Princípio da reciprocidade no novo artigo 27.º (n.º 8, al. a)) do Modelo de Convenção da OCDE: significado e alcance para o Estado requerente, o Estado requerido e o sujeito passivo», Estudos Jurídicos e Económicos em Homenagem ao Prof. Doutor António de Sousa Franco, FDUL, Coimbra editora, Coimbra, 2006, pp. 137-144.

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Há neste momento, no quadro do Grupo de Trabalho n.º 2 do G-20 uma preocupação de identifi car os ordenamentos que aplicaram efectiva-mente as recomendações da OCDE.

Cabe saber até onde os actores nacionais e internacionais estarão dispostos a aplicar efectivamente medidas que consigam fazer face às exigências do mundo actual, e esperar que não sejam as medidas popu-listas a vingar.

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Luís Máximo dos Santos

O G-20 e a reforma da regulação bancária

Luís Máximo dos Santos

Mestre em Direito (ciências jurídico-económicas) pela FDULDocente do Instituto Europeu da FDUL

Jurista do Banco de Portugal

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RESUMO

O presente artigo debruça-se sobre o G-20 enquanto fórum internacional e analisa os resultados da Cimeira realizada em Londres, em Abril, em especial quanto às medidas relativas à reforma da regulação bancária nos seus diversos domínios.

Palavras-chave:G-20 Cimeira de Londres Reforma da regulação bancária

ABSTRACT

The present article focus on the G-20 as an international forum and analyses the results of its London Summit, in April, specially about the measures related to the banking regulation reform in its different topics.

Keywords:G-20London SummitBanking regulation reform

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I – A criação do G-20

1. Um dos clássicos instrumentos da cooperação política e econó-mica internacional é o da criação de fóruns constituídos por países e tam-bém, por vezes, por organizações de integração económica, bem como por determinadas instituições internacionais.

A ordem económica internacional erigida a partir da Segunda Guerra Mundial foi, como é sabido, uma ordem fortemente instituciona-lizada, isto é, enquadrada por organizações internacionais intergoverna-mentais. O período entre as duas guerras mundiais abalou de tal modo as bases da convivência internacional, gerou uma tal desintegração política e económica, que os construtores da ordem do pós segunda guerra enten-deram que para criar uma ordem digna desse nome não bastaria confi ar em mecanismos automáticos ou espontâneos (como sucedera no período entre 1815 e 1914), sendo antes indispensável criar estruturas internacio-nais que institucionalizassem, de forma permanente, a cooperação entre os Estados.

Essa cooperação fez-se, em larga medida, através de organizações internacionais formais mas os fóruns internacionais de tipo informal, não constituídos por tratado, têm desempenhado também um papel relevante. Com efeito, em diferentes conjunturas históricas, a partir do reconheci-mento de afi nidades politicas e económicas que faziam emergir uma rele-vante comunhão de interesses, diversos países associaram-se, de modo informal, tendo em vista fazer vingar, em conjunto, as suas posições em determinadas organizações internacionais e, em termos mais gerais, no conjunto da cena internacional.

São vários os exemplos históricos desse fenómeno. É esse o caso, por exemplo, do Grupo dos Setenta e Sete (G-77), constituído por países em desenvolvimento, que esteve na origem da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (CNUCED) e desempe-nhou um relevante papel na cena internacional nas décadas de 60 e de 70 do século XX. Da iniciativa desse grupo sairia, aliás, em 1972, a criação do Grupo dos Vinte e Quatro (G-24), que, no plano das questões mone-tárias internacionais, tão importantes à época por força da necessidade de defi nir novas regras em virtude do colapso do padrão-ouro saído da Conferêcia de Bretton Woods, visou servir de contraponto ao Grupo dos Dez (G-10) criado, em 1962, por dez países industrializados, por ocasião

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da celebração dos Acordos Gerais de Empréstimo ao Fundo Monetário Internacional (FMI).

Todavia, apesar da existência de outros grupos do mesmo tipo1, o grupo informal que nas últimas décadas se tornou mais relevante foi o Grupo dos Sete (G-7), primeiro na sua versão originária e depois, com a queda do Muro de Berlim e a inclusão da Rússia, na sua versão de Grupo dos Sete mais a Rússia ou Grupo dos Oito (G-8).

O G-7 nasceu em 1976. Com efeito, em Novembro de 1975, o Pre-sidente da França, Valéry Giscard d’Estaing, tomou a iniciativa de reu-nir, em Rambouillet, os Chefes de Estado ou de Governo do G-5 mais a Itália. A ideia inicial foi a de, num contexto de crise particularmente grave, pôr os líderes das grandes potências democráticas, acompanhados pelos respectivos conselheiros, a discutir, sem protocolo, em ambiente informal, as grandes questões mundiais. A iniciativa foi bem acolhida e, na segunda cimeira, realizada em 1976, em Porto Rico, o Canadá jun-tou-se ao grupo. Nasceu assim o G-7, composto pelas sete nações mais industrializadas do mundo, todas democracias, a saber: Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Itália e Canadá.

No início dos anos 90, a Rússia foi convidada a participar como observadora. Em 1997, ofi cializou a sua participação, surgindo a partir daí o G-8.

Subjacente à constituição do G-7, está o propósito de tentar cons-truir uma liderança económica global, através do reforço da cooperação entre os países que o integram e do lançamento de iniciativas para fazer face aos principais problemas de cada momento.

1 É o caso, por exemplo, do Grupo dos Cinco (G-5), composto inicialmente pelos cinco países cujas moedas foram incluídas no cabaz de moedas que compunha os Direitos de Saque Especiais, a saber, Estados Unidos, Japão, República Federal da Alemanha, França e Reino Unido. Criado ainda nos anos 60, viria no entanto a ser protagonista do famoso Acordo do Hotel Plaza, de Setembro de 1985, que visou uma acção concertada em ordem a alcançar uma baixa gradual da cotação do dólar dos EUA. Mas poderíamos também referir o G-20 dos países em desenvolvimento, criado em Agosto de 2003, na fase fi nal de preparação da V Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), para se ocupar fundamentalmente das questões agrícolas, matéria em particular destaque na ronda de negociações comerciais multilaterais de Doha. É composto, fundamentalmente, por países de África, da Ásia e da América Latina.

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Ao longo de 34 cimeiras (considerando a de 1975 como tendo sido a primeira)2, contam-se no activo do G-7 (e do G-8) várias realizações importantes em diversos domínios (v.g. combate ao terrorismo, ajuda ao desenvolvimento, combate a certas doenças infecciosas, etc.) mas de que não cabe aqui cuidar.

Porém, a partir de meados dos anos 90 começou a tornar-se claro que o grupo estava em declínio3. A sua acção começou a ser crescen-temente contestada, contestação, aliás, facilitada pelo facto de os pro-blemas mundiais darem mostras de estarem a agravar-se em múltiplos aspectos.

A economia mundial estava em profunda e rápida mutação, cujo sentido punha em causa as ambições de liderança do G-8. De facto, os países emergentes não podiam mais ser deixados à margem dos esforços para estabelecer uma liderança global. Crescia assim um sentimento de falta de legitimidade do grupo, que de algum modo aparecia como uma instância que representava uma hegemonia que estava a desaparecer.

2. É neste contexto que se assiste ao surgimento do Grupo dos Vinte (G-20) como um fórum internacional constituído à imagem e semelhança de outros fóruns internacionais como aqueles a que já fi zemos referência.

Como primeira nota, importa referir que o G-20 é uma emanação do próprio G-7, o que não pode deixar de ser levado a crédito da acção deste grupo. Muito embora as posições de cada um dos sete não fossem exactamente iguais nesta matéria, veio a conseguir-se um consenso que permitiu que, em 25 de Setembro de 1999, os ministros das fi nanças do G-7 anunciassem a criação do G-20 como um novo fórum de ministros das fi nanças e de governadores de bancos centrais de 19 países mais a União Europeia, nele participando também o FMI e o Banco Mundial.

A criação do G-20 veio dar cumprimento ao compromisso assu-mido na Cimeira do G-7 de Junho de 1999 no sentido de estabelecer “um

2 A última teve lugar no Japão, em Novembro de 2008. Referimo-nos às cimeiras de Chefes de Estado ou de Governo, já que o G-8 também reúne ao nível de ministros dos negócios estrangeiros e das fi nanças.

3 A este respeito, ver, por exemplo, C. Fred Bergsten e C. Randall Henning, Global Economic Leadership and the Group of Seven, Institute for International Economics, Washington, D.C., 1996. Cf. também Denis Samuel-Lajeunesse e Michel Foucher (eds.), Les Enjeux du G-7 – Regards croisés sur la mondialisation, Economica, Paris, 1997.

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mecanismo informal para o diálogo entre países importantes do ponto de vista sistémico no quadro do sistema institucional de Bretton Woods” e surgiu claramente como uma resposta, no plano institucional, à crise fi nanceira que entre 1997 e 1999 atingiu vários países asiáticos.

De facto, tal crise veio pôr em evidência que os mercados fi nan-ceiros dos países desenvolvidos podiam ser seriamente afectados pela instabilidade fi nanceira verifi cada nos países emergentes, cuja ausência do G-7 era, afi nal, um obstáculo adicional para fazer face aos problemas de forma coordenada e efi caz.

É óbvio que não foi fácil a defi nição dos países que deveriam inte-grar o G-20, mas foi claro desde o início que a constituição do grupo teria de refl ectir a nova realidade da economia mundial. O G-20 fi cou assim composto por 19 países (África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Uni-dos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia) mais a União Europeia, que é representada pela Presidência do Conselho e pelo Presidente do Banco Central Europeu (BCE). Nele participam também o Director-Geral do FMI e o Presidente do Banco Mundial, bem como os presidentes do Comité Monetário e Financeiro Internacional do FMI, e dos Comités de Desenvolvimento do FMI e do Banco Mundial. Com tais participações, procurou garantir-se uma per-feita articulação do G-20 com as instituições fundamentais do sistema de Bretton Woods4.

Tal como o G-7, também o G-20 não tem um secretariado perma-nente, pelo que, por ora, se mantém a característica da informalidade própria dos fóruns deste tipo. O país que preside assegura apoio de diversa ordem, podendo o G-20 socorrer-se de recursos do FMI e do Banco Mundial, bem como do serviço de funcionários dos países que o integram e de peritos externos.

4 Note-se que na Cimeira de Londres estiveram presentes também a Espanha e a Holanda, o Presidente da Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), o Presidente da Comissão Europeia, o Secretário-Geral das Nações Unidas, o Director-Geral da OMC e o Presidente da Nova Parceria para o Desenvolvimento de África. Por razões várias, há por vezes neste tipo de organizações algumas fl utuações no universo dos participantes, situação que é facilitada pela sua informalidade.

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Durante nove anos, ou seja, entre 1999 e 2008, o G-20 funcionou ao nível de ministros das fi nanças e de governadores de bancos centrais. Mas a crise fi nanceira global que estamos a viver, e que se acentuou especialmente a partir de Setembro de 2008, levou a que se sentisse a necessidade de dar um novo e decisivo passo: fazer reunir o G-20 ao nível de Chefes de Estado e de Governo.

Foi isso que aconteceu, pela primeira vez, em Washington, a 14-15 de Novembro de 2008, e, pela segunda, em Londres, a 1-2 de Abril de 2009. A terceira reunião está já agendada para 24-25 de Setembro, em Pittsburgh, no Estado da Pensilvânia, EUA.

A primeira reunião do G-20 a nível de Chefes de Estado e de Governo surgiu assim num momento carregado de grande simbolismo: o momento em que, após um período de aposta falhada numa estratégia de cunho predominantemente unilateral, os EUA atravessavam a crise económica mais grave desde 1929 e em que (também por isso, mas não só) a sua liderança mundial dava mostras, a vários níveis, de evidente fragilidade, muito embora houvesse sinais (e sobretudo a esperança) de que se estava já a iniciar um período de reajustamento, fruto da eleição de Barack Obama, ocorrida dias antes.

De facto, por muito que duvidemos da capacidade de acção de uma instância como o G-20, a sua emergência na cena internacional com esta nova pujança constitui indiscutivelmente, a nosso ver, um sinal de um mundo novo que se quer afi rmar, resultante de uma diferente partilha do poder à escala internacional.

Com efeito, enquanto até aqui os fóruns deste tipo se tinham cons-tituído na base de homogeneidades bem defi nidas (v.g. países industria-lizados e países em desenvolvimento), o G-20 rompe com essa lógica ao agregar os países mais industrializados e as economias emergentes, algumas das quais, contudo, apresentam ainda evidentes características próprias de países em desenvolvimento. Nesse sentido, o G-20 é já – claramente – uma instância da nova era, o primeiro fórum da globali-zação enquanto realidade insusceptível de ser apropriada pelos países mais ricos e industrializados. Se uma crise global requer soluções glo-bais, conforme apropriadamente se escreve na declaração aprovada na Cimeira de Londres, seguramente que alguns dos países emergentes não poderiam deixar de participar no desenho dessas soluções.

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Entre os resultados da Cimeira de Washington conta-se a Declara-ção sobre Mercados Financeiros e a Economia Mundial que enuncia os cinco princípios que deverão presidir à acção reformadora no domínio dos mercados fi nanceiros, a saber: (i) reforçar a transparência e a respon-sabilização (accountability); (ii) melhorar a qualidade da regulação (iii) promover a integridade dos mercados; (iv) reforçar a cooperação interna-cional e (v) reformar as instituições fi nanceiras internacionais.

Tendo em vista a aplicação de cada um destes princípios, foi apro-vado um Plano de Acção, contemplando acções imediatas e acções a médio prazo. No que diz respeito ao objectivo de melhorar a qualidade da regulação, as acções previstas centram-se em três tópicos: regimes reguladores, supervisão prudencial e gestão do risco. Foram criados cinco grupos de trabalho para pôr em prática as orientações defi nidas. O grupo relativo à regulação fi nanceira é co-presidido por Tiff Macklem, do Canadá, e Rakesh Mohan, da Índia.

II – A Cimeira de Londres: os aspectos relativos à regulação bancária

1. A segunda Cimeira do G-20 ao nível de Chefes de Estado e de Governo foi precedida de uma enorme expectativa. Em muita imprensa falou-se mesmo de um “novo Bretton Woods”, expressão que, por múl-tiplas razões, era profundamente exagerada. Desde logo, em Bretton Woods o que se criou foi um novo sistema monetário internacional, algo que agora manifestamente não estava em causa.

Por outro lado, para o sucesso da Conferência de Bretton Woods muito contribuiu a longa preparação que antecedeu os seus trabalhos, que decorreram nas três primeiras semanas de Julho de 1944. Agora, com a Cimeira do G-20, nada de comparável se passou. Além disso, à data da Conferência de Bretton Woods, com o resultado da guerra já antecipável, havia um poder hegemónico – o dos EUA –, quando actual-mente se está precisamente, de algum modo, a sair dele. Acompanhados pelo Reino Unido, os EUA puderam então ditar as regras que entendiam desejáveis para a nova ordem internacional, situação que também não é de todo comparável à actual. De facto, perdida que foi a oportunidade de ouro de fazer, na década de 90, a adaptação da ordem internacional ao fi m da Guerra Fria (período em que talvez o poder americano tenha atin-

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gido a sua máxima expressão), tudo agora se revela mais difícil. Na ver-dade, qualquer acordo internacional de grande alcance é, neste momento, muito mais difícil de conseguir pois o poder está mais fragmentado e, portanto, torna-se mais complexo satisfazer equilibradamente os diferen-tes interesses em presença.

Importa dizer, desde já, que consideramos correcta a interpretação dominante que foi feita da Cimeira do G-20, ou seja, a de que ela consti-tuiu um assinalável êxito.

Por um lado, o formato a vinte, apesar de todas as inevitáveis con-tradições, concedeu ab initio à Cimeira um crédito que ajudou a que, no mínimo, lhe tivesse sido concedido o benefício da dúvida, coisa que difi -cilmente sucederia, por exemplo, com o G-7 ou mesmo com o G-8. Na ausência de um conselho de segurança económica, instituído ao nível do sistema formal da Organização das Nações Unidas (ONU), como alguns têm proposto, o G-20 é o que mais se aproxima desse conceito, embora sem a força que uma tal institucionalização lhe daria. Por outro lado, a tão popularizada asserção – que já se tornou mesmo um lugar comum –, segundo a qual, sendo a crise global, ela só pode resolver-se através de soluções globais, confere também, à partida, maior credibilidade a uma estrutura como a do G-20, que representa 85% da riqueza mundial.

Acresce que no plano mediático o guião foi desempenhado com competência, já que, em geral, os dirigentes mundiais que nela partici-param souberam passar uma mensagem articulada e consistente de espe-rança, facto cuja importância não pode menosprezar-se para efeito da retoma da confi ança, a qual constitui, afi nal, um dos passos necessários para vencer a crise.

2. Contrariamente ao que se poderia julgar, a grande maioria dos países do G-20 não pretendia que a Cimeira de Londres fosse centrada nas questões da regulação fi nanceira. Em geral, os países emergentes estavam muito mais preocupados com a adopção de incentivos econó-micos capazes de fazer retomar as exportações e com a necessidade de dar fortes sinais de que se pretendia conter a tentação proteccionista, ou seja, a tentação de cada país resolver os problemas internos à custa dos parceiros comerciais.

Quanto à regulação fi nanceira, a sensibilidade dominante nos países emergentes era no sentido de que não havia necessidade de introduzir

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grandes mudanças nos respectivos sistemas de regulação, que considera-vam estar a funcionar bem. E sobretudo não aceitavam que essas mudan-ças fossem ditadas pelos peritos dos EUA e dos países europeus, onde afi nal, depois de décadas de doutrinação sobre a matéria, se revelou que os respectivos sistemas fi nanceiros tinham pés de barro.

Em Londres, o G-20 aprovou o que designou por “Plano Global para a Recuperação e a Reforma”. Nele pode ler-se que “o crescimento económico, para ser sustentado, tem de ser partilhado” e que as bases para uma “globalização sustentável” (conceito sem dúvida apelativo) passam por uma economia mundial aberta baseada nos princípios de mercado, numa regulação efectiva e em instituições globais fortes.

Para além da decisão de reforçar substancialmente os recursos do FMI, incluindo a grande novidade de uma nova emissão de Direitos de Saque Especiais, a estratégia do Global Plan for Recovery and Reform assenta em cinco pilares: retomar o crescimento e a criação de emprego; reforçar a regulação e a supervisão fi nanceira; reforçar as instituições fi nanceiras globais; resistir ao proteccionismo e promover o comércio e o investimento globais e, fi nalmente, assegurar a todos uma retoma justa e sustentável.

O documento contém anexas duas declarações, a saber: a Declara-ção sobre o Reforço do Sistema Financeiro e a Declaração sobre a Atri-buição de Recursos através das Instituições Financeiras Internacionais. Além disso, consta também em anexo um Relatório de Progresso sobre a aplicação das medidas previstas no Plano de Acção aprovado na Cimeira de Washington.

A Declaração sobre o Reforço do Sistema Financeiro ocupa-se de diversos temas de que destacaríamos os seguintes: a criação de uma nova entidade – o Conselho de Estabilidade Financeira (Financial Stability Board, de ora em diante FSB) –, a defi nição dos objectivos da regulação fi nanceira, o quadro da supervisão prudencial, as normas contabilísticas, as agências de rating, os paraísos fi scais e as jurisdições não cooperativas.

Sem dúvida que um dos principais resultados da Cimeira do G-20, no respeitante à regulação fi nanceira, foi a criação do FSB como suces-sor do Financial Stability Forum (FSF)5, mas conferindo-lhe um man-

5 O FSF foi instituído em 1999 pelos ministros das fi nanças e pelos governadores dos bancos centrais do G-7, sob proposta do presidente do Bundesbank, Hans Tietmeyer.

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dato reforçado. O FSB inclui todos os países do G-20, todos os membros do FSF, a Espanha e a Comissão Europeia.

Uma das missões do FSB é a de colaborar com o FMI na emissão de alertas (Early Warning Exercises) e na apresentação ao Comité Mone-tário e Financeiro Internacional do FMI dos riscos e vulnerabilidades fi nanceiras, bem como de recomendações relativamente às políticas ade-quadas para mitigar tais riscos e vulnerabilidades.

Cabem também, entre outras, no mandato do FSB as seguintes atribuições:

• Promover a coordenação e a troca de informações entre autorida-des responsáveis pela manutenção da estabilidade fi nanceira;

• Monitorar os desenvolvimentos ao nível dos mercados, tendo em vista as suas implicações para a regulação;

• Aconselhar quanto às melhores práticas em ordem a encontrar os melhores padrões de regulação.

O FSB é apoiado por um pequeno secretariado situado no Banco de Pagamentos Internacionais, em Basileia, na Suíça. O Presidente do FSB é o Governador do Banco de Itália, Mario Draghi, cargo que é no entanto exercido a título pessoal.

Por outro lado, no quadro do Plano Global que adoptou, o G-20 assumiu também um conjunto de compromissos do maior relevo, de que destacaríamos os seguintes:

• Reformar os sistemas de regulação de modo a que as autori-dades sejam capazes de identifi car adequadamente os riscos macroprudenciais;

• Estender a regulação e a supervisão a todas as instituições fi nan-ceiras, instrumentos e mercados relevantes do ponto de vista sis-témico, aí se incluindo, pela primeira vez, os hedge funds;

• Tomar medidas, uma vez alcançada a retoma económica6, para reforçar a qualidade, a quantidade e a adequação do capital no

6 A adopção dessas medidas só deverá acontecer após a retoma económica ter sido alcançada porque o G-20 considerou desejável que até lá se mantenham inalterados os padrões internacionais relativamente aos níveis mínimos de capital. Subjacente a esta posição (que consideramos correcta) está o receio de que uma maior exigência quanto ao nível dos capitais em plena crise pudesse ter efeitos contraproducentes.

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sistema bancário e para prevenir a excessiva “alavancagem” (leverage);

• Tomar medidas contra as jurisdições não cooperativas, incluindo os paraísos fi scais; nesta matéria, os membros do G-20 declaram estar na disposição de adoptar sanções para proteger as respecti-vas fi nanças públicas e sistemas fi nanceiros, afi rmando mesmo – naquela que foi uma das frases que mais eco teve na comunicação social – que “a era do segredo bancário acabou”;

• Estender a regulação, a supervisão e as obrigações de registo às agências de avaliação do crédito (credit rating agencies), em ordem a garantir que cumprem o código internacional de boas práticas, designadamente em matéria de confl itos de interesses;

• Melhorar os padrões contabilísticos e conseguir um conjunto único de regras contabilísticas globais de alta qualidade.

Estes compromissos são desenvolvidos, com algum detalhe, na Declaração sobre o Reforço do Sistema Financeiro. Naturalmente, na sua formulação percebem-se alguns equilíbrios estabelecidos a partir de posições divergentes. Os hedge funds, por exemplo, são incluídos na regulação mas só se forem “sistemicamente signifi cativos”; não preva-leceram, pois, as teses de alguns países que, sustentando o seu carácter pernicioso, defendiam para estes fundos uma regulação à parte, especial-mente restritiva, ou até a sua pura e simples abolição.

Quanto aos paraísos fi scais – indubitavelmente um dos cancros que corrói a economia mundial –, nota-se que a afi rmada disposição do G-20 para aplicar sanções não se traduziu na indicação de nenhuma em concreto.

Estes compromissos tocam em aspectos que estão, sem dúvida, na génese da crise que estamos a viver. Saber se, e até que ponto, irão ser adequadamente concretizados só o tempo o poderá dizer.

III – Notas conclusivas

1. O recente protagonismo do G-20 corresponde a um desenvolvi-mento perfeitamente coerente com a evolução verifi cada na economia mundial nos últimos 15 anos. Cremos, por isso, que se a evolução que se

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tem vindo a registar seguir o seu curso mais previsível, e não for pertur-bada por nenhum acontecimento profundamente inesperado ou de natu-reza traumática, a importância do seu papel dever-se-á acentuar.

É claro que não se ignoram as limitações de fóruns com estas carac-terísticas, bem patentes, de resto, na maior parte dos que até agora se constituíram. Mas o G-20 apresenta algumas particularidades que o dife-renciam signifi cativamente de anteriores experiências.

Não é sufi cientemente restrito para ser mais um clube nas relações internacionais, nem é tão abrangente quanto as instituições da ONU, fre-quentemente paralisadas em resultado da sua própria dimensão. Há quem veja na sua heterogeneidade um factor de enfraquecimento. Quanto a nós, admitimos que possa ser a sua grande força. Agrupa o país que é ainda (designadamente pelo seu incomparável poder militar) a única superpotência – os EUA –, os demais países industrializados, os países emergentes mais relevantes e praticamente todas as potências regionais.

Pela sua composição, o G-20 não é um grupo dirigido contra nin-guém. À partida, dir-se-ia que está talhado para ser a instância, por exce-lência, desta fase da globalização, a qual se encontra muito bem refl ectida na sua composição. Curiosamente, a expectativa que a Cimeira de Lon-dres gerou, pelo menos nos países europeus, está, quanto a nós, muito associada ao facto de as opiniões públicas terem tido essa percepção.

O risco de o G-20 resvalar para um G-27, em que os EUA e a China tenderiam a ditar as regras, tem subjacente uma visão muito pessimista sobre o poder de afi rmação da Europa, embora concedamos que esse pes-simismo tem actualmente bons argumentos a suportá-lo. Cremos, toda-via, que o G-20 poderá ser um óptimo instrumento para auxiliar a China a encontrar, de forma progressiva e harmoniosa, o novo lugar que lhe parece estar destinado no concerto das nações. O desenvolvimento das relações entre a China e os Estados Unidos pode aliás benefi ciar da pre-sença no G-20 de outros pólos, muito em especial o da União Europeia, que, também por isso, pode ver a sua posição valorizada.

7 Curiosamente, trata-se de um receio recorrente. Nos anos 80 do século XX especulou-se muito sobre a emergência de um G-2 constituído pelo EUA e pelo Japão. Sobre este aspecto, cf. Harold James, International Monetary Cooperation since Bretton Woods, International Monetary Fund / Oxford University Press, 1996, pp. 446 e segs..

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2. A reforma da regulação fi nanceira está a ser objecto de inúmeros estudos e propostas, provenientes das mais diversas instâncias nacionais e internacionais com responsabilidades políticas e técnicas na matéria. O falhanço foi demasiado estrondoso e deixou os países ocidentais numa posição muito incómoda no contexto mundial, tendo objectivamente enfraquecido as suas posições tanto no plano económico como no plano político.

Desengane-se, contudo, quem pensa que se pode sair desta crise com uma mera solução tecnocrática. A crise fi nanceira é muito mais do que uma crise da regulação do sector fi nanceiro. É a crise de um deter-minado modelo económico (não confundir com o sistema económico de economia de mercado), é a crise de uma atitude, de um modelo de com-portamento perante a economia e os seus problemas.

Se o padrão de comportamento não for alterado, não haverá regras, internacionais ou não, por mais consensuais e perfeitas que sejam, que possam evitar o incurso em nova crise. Não se trata, bem entendido, da famosa ganância dos agentes de mercado. Mais ou menos acentuada, essa é uma característica dos homens em todos os tempos e a tentativa de construir um homem novo já se viu que não é tarefa desejável nem exequível. O problema não é da ganância em si mas de um sistema que a permitiu e incentivou para lá dos limites da razoabilidade.

Se essa refl exão não for feita, se uma nova cultura de liderança não for acarinhada, se uma nova ordem de prioridades não for favore-cida as soluções tecnocráticas estarão inevitavelmente condenadas ao fracasso. Sucumbirão, com igual estrondo, num futuro próximo, se os poderes públicos não defi nirem um quadro propício ao fl orescimento de dirigentes económicos e empresariais que interiorizem modelos de com-portamento antagónicos dos que nos conduziram ao que o G-20 desig-nou, a abrir o seu Plano, “the greatest challenge to the world economy in modern times”.

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Pasquale Pistone

XXIV Jornadas Latinoamericanas de Derecho Tributario: Los principios tributarios ante las nuevas

formas de imposición sobre la renta*

Pasquale Pistone

Professor Associado de Direito Fiscal Europeu e Internacional da Uni-versidade de Salerno (Itália) e Professor EURYI-ESF de Direito Fiscal Europeu e Internacional da Universidade de Economia e Gestão (WU) de Viena de Áustria. Organizou seis livros, é autor de duas monografi as, e de 80 artigos em matérias de Direito Fiscal Europeu e Internacional, escritos e/ou traduzidos em diversas línguas. Nos últimos 15 anos tem leccionado em diversas universidades e participado em diversas conferências em todo o mundo. Pasquale Pistone é membro da Junge Kurie da Academia de Ciências Austríaca, Co-director da Intertax, e do comité científi co de di-versas outras revistas internacionais de Direito Fiscal na Europa e Améri-ca do Sul, é membro da Task Force do Tribunal de Justiça da CFE e do Conselho Executivo do Ramo Italiano da IFA. É fl uente em sete línguas da UE e tem noções básicas de russo.

____________________________

* El autor agradece la asistencia de Pablo Sergio Varela (Argentina) para la re dacción de este trabajo.

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RESUMO

Este artigo foi apresentado pelo autor, como relator geral, nas XXIV Jornadas Latino-americanas de Direito Tributário e analisa a forma como a complexidade da tribu-tação sobre o rendimento poderá ser substituída por um sistema linear e um novo quadro para a distribu~ição de competências entre Estados Membros, sem colocar em risco os princípios básicos de tributação.

Palavras-chave:Tributação do rendimentoSimplifi caçãoDistribuição de competências entre Estados

ABSTRACT

This article was presented by the author as general reporter to the “XXIV Jorna-das Latinoamericanas de Direito Tributario “and focuses on how complexity of income taxation could be replaced by a streamlined system and a new framework for interjuris-dictional allocation of taxing powers without harming the basic principles of taxation.

Keywords:Income taxationSimplicityAllocation of taxing powers

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ÍNDICE

Planteamiento del temaSección primera (I) – Imposición tradicional de la renta y nuevos impuestos1. Imposición tradicional sobre la renta y nuevos impuestos

1.1. La evolución del impuesto sobre la renta1.2. La defi nición del concepto de renta1.3. Las clasifi caciones de los impuestos sobre la renta

2. Aspectos conceptuales y estructurales de los sistemas tradicionales de imposición sobre la renta

3. La imposición sobre la renta ante los nuevos impuestos3.1. La primera categoría: los nuevos impuestos en sentido estricto

3.1.1. El Tobin tax3.1.2. El impuesto lineal3.1.3. El impuesto dual

Planteamiento del tema

Esta ponencia general es el resultado de un análisis elaborado para América Latina en los últimos tres años y originado en ocasión de la pre-paración de dos conferencias sobre las nuevas fronteras de la imposición a la renta, que tuvieron lugar en septiembre de 2005 en Montevideo1 y en Vigo2. La feliz coincidencia de que estas XXIV Jornadas Latinoameri-canas de Derecho Tributario hayan escogido a éste como uno de los dos temas principales y, la honrosa invitación que me ha formulado la Presi-dencia del Instituto para llevar adelante la ponencia general, me han ani-mado a continuar un trabajo, que incluye mis refl exiones que todavía no habían sido objeto de publicación, junto a las que he tenido el placer de

1 “Problemáticas en tema de imposición sobre la renta”, Montevideo (Uruguay), 16 de septiembre de 2005, Universidad de la República Oriental del Uruguay, en una conferencia organizada por la Prof. Dra. Addy Mazz.

2 “La normativa común europea en tema de imposición sobre la renta”, Vigo (España), 27 de septiembre de 2005, Universidad de Vigo, en una conferencia organizada por la Prof. Dra. Ana Maria Pita Grandal.

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recibir de los numerosos trabajos presentados, tanto en forma de ponen-cias nacionales, como de comunicaciones técnicas desde nueve países3.

De la lectura de ellos, se advierte alguna terminología particular, en algunos casos producto de traducciones idiomáticas, y en otros, fruto del tecnicismo de esta rama del derecho, que impide unifi car las expresiones recurrentes de los diversos países. Por otro lado, evidenciamos también diversas categorías jurídicas cuya pretensión de unifi cación terminoló-gica confrontaría con el contenido material que cada Estado miembro mantiene en su derecho interno. En función a ello, esta ponencia general, partiendo de los informes nacionales y de las interconsultas internacio-nales, ha intentado sobrellevar con el mejor esfuerzo tales inconvenien-tes del lenguaje jurídico, resultando inevitable esta previa aclaración.

Antes de abordar el análisis del tema objeto de esta ponencia gene-ral, creo que son necesarias algunas consideraciones preliminares, para explicar tanto su objeto, como el espíritu de la investigación que he rea-lizado para América Latina.

A pesar de que el Derecho tributario resulta una disciplina jurídica joven, su desarrollo ha alcanzado una dimensión histórica, ya que han pasado noventa años desde la primera ordenanza tributaria alemana, donde por primera vez se sistematizaban sus principios y reglas. En ese contexto, es razonable que la dimensiones normativa y constitucional del impuesto sobre la renta, nacido en Inglaterra durante la guerra contra Napoleón, sean objeto de un nuevo análisis, para averiguar si, y en qué medida, sus herramientas teóricas y aplicaciones concretas resultan toda-vía adecuadas en el contexto actual. En ese sentido, el impulso directo para redactar un estudio de revisión específi camente dedicado a América Latina se puede encontrar en algunos factores empíricos de inmediata evidencia.

3 Antes de la fecha de entrega de esta ponencia general han presentado ponen-cias nacionales los Dres. Luis Omar Fernández (Argentina), Álvaro Villegas Aldazosa (Bolivia), J. Fernando Álvarez Rodríguez (Colombia), Antonio López Díaz (España), Agostino Ennio La Scala (Italia), José M. Erreguerena Albaitero (México), Orlando Marchesi (Peru), Milagros Acosta Nell (Uruguay), Leonardo Palacios Márquez y Juan Estéban Korody Tagliaferro (Venezuela). Además, el ponente general ha recibido comu-nicaciones técnicas desde Brasil, Colombia, España, México, Uruguay y Venezuela.

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En primer lugar, las últimas décadas han destacado una crisis estruc-tural del impuesto sobre la renta, por efecto de un fenómeno general de estratifi cación normativa de sus principios y normas en los países latinos, tanto de Europa como de América.

En segundo lugar, la globalización de la economía, así como la supresión gradual de las barreras a los movimientos cambiarios y de capitales ha eliminado también la tradicional dimensión nacional, que había sido propia del derecho tributario desde su origen.

En tercer lugar, el desarrollo de las economías en transición de Europa oriental (tanto en el caso de los antiguos estados miembros de la Unión Soviética, como de los restantes), así como de otros países euro-peos (como por ejemplo, Irlanda) se ha realizado en un contexto de radi-cales reformas fi scales, cuyo indudable éxito ofrece al ponente general el apoyo empírico para analizar las perspectivas de “su transplantación” en el contexto de América Latina. Por ello, cabe destacar que dichas reformas han sido un verdadero laboratorio para la aplicación de algunas ideas innovadoras de los teóricos de la hacienda pública, cuyo elemento común está representado por la simplifi cación absoluta del cobro tributa-rio, de la imposición sobre la renta y, además en general, de las manifes-taciones de capacidad contributiva.

La posibilidad de “transplantar” dichas reformas al contexto latino-americano parece prima facie apropiada, ya que creemos que, el desa-rrollo económico puede representar un elemento de fundamental impor-tancia también en los países latinoamericanos. Además, una radical simplifi cación del sistema tributario es fundamental para que la ilusión de gravar con precisión máxima los hechos económicos, no transforme los principios tradicionales de la imposición hasta al punto de perder su dimensión como instrumentos de equidad y justicia sustancial. Eso se realizaría por ejemplo, en la medida en que un profesional con limitada aptitud económica fuese obligado a llevar un número muy elevado de libros contables: así se cumpliría con un sentido formal de equidad y jus-ticia tributaria, pero el sistema se alejaría inevitablemente de la dimen-sión sustancial de ambos principios. Lo mismo opinamos en el caso en que el legislador, en aplicación de sus poderes discrecionales técnicos de imposición, establezca modalidades marcadamente más gravosas, una respecto de otras, para someter a tributación algunas formas de riqueza. Sin embargo, ello no implica que el principio de igualdad suponga una

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uniformidad en la imposición de la renta4, ya que contrario sensu, la fl e-xibilidad del sistema tributario representa uno de los más grandes desa-fíos de la economía globalizada, especialmente para comprobar hasta que punto, las nuevas formas de imposición pueden remplazar a aquéllas más tradicionales, como por ejemplo, el impuesto unitario (o sintético) sobre la renta.

En ese sentido, la ponencia general se ocupará de analizar los pro-blemas de la crisis de la imposición sobre la renta desde una perspec-tiva compleja, cuyo objetivo consiste en averiguar en qué medida resulta compatible con el principio de capacidad contributiva, la evolución de los sistemas tributarios con respecto a nuevos impuestos con característi-cas estructurales más sencillas, fomentando el desarrollo económico sin otorgar benefi cios fi scales.

Después de abordar los aspectos conceptuales y de clasifi cación de la renta, la sección primera analizará la estructura de los impuestos tra-dicionales sobre la renta de tipo tradicional. El trabajo abordará tanto los aspectos relativos a las personas físicas, como aquéllos que se refi eren a las sociedades y otras entidades, ya que – por lo menos en el sistema de los impuestos unitarios –, la imposición a nivel societario representa normalmente sólo una modalidad para anticipar el cobro que se realiza en cabeza de los contribuyentes fi nales. Por esta razón, muchos sistemas integran los dos impuestos o aplican formas de doble imposición, la que se defi ne como económica, por el hecho de oponerse a la de tipo jurí-dica, que se encuentra cuando la duplicación tributaria ocurre respecto a la misma persona. Sucesivamente, la primera sección tratará los perfi -les fundamentales de los nuevos impuestos, que gravan la renta, u otras manifestaciones inmediatas de capacidad contributiva.

La sección segunda analizará los problemas de la imposición a la renta en el contexto internacional, que en Latinoamerica han sido objeto de escasa consideración por causa de la tradicional imposición territo-rial y en la fuente y que, sin embargo, no pueden dejarse de tratar en esta ponencia, ya que es de allí que proceden los factores exogénos más importantes de infl uencia sobre los sistemas tributarios modernos. En ese

4 En este sentido coincidimos con la opinión manifestada en las conclusiones de la comunicación técnica presentada por Fernandez Junquera, M., El IRPF y los principios constitucionales de justicia tributaria: una relación controvertida.

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contexto, la ponencia general abordará el dilema tradicional del derecho tributario internacional, es decir, la imposición en función de la residen-cia o de la fuente, sin dejar de lado los problemas de imposición de los no residentes y de la renta de fuente extranjera, así como tampoco, los de la doble imposición internacional que con frecuencia todavía se verifi can.

Es sólo después de este análisis que la ponencia abordará, en su tercera sección, los principios constitucionales de la imposición. En particular, centraremos nuestra atención en el deber de solidaridad, así como en los principios de igualdad, capacidad contributiva, generalidad, progresividad y no confi scatoriedad. Esta sistematización puede extrañar a nuestros lectores, que están acostumbrados a metodologías de análi-sis que se centran en dichos principios y que desarrollan las cuestiones alrededor de ello. Sin embargo, creemos que esa nueva sistemática per-mite destacar dos aspectos fundamentales en la situación actual de los impuestos tradicionales sobre la renta. En primer lugar, analizar los prin-cipios de la imposición sólo después de haber realizado una compara-ción entre los impuestos tradicionales y los nuevos, tanto en el contexto nacional como internacional. Además, averiguar en qué medida los prin-cipios constitucionales consolidados permiten una evolución de la impo-sición sobre la renta hacia nuevas formas y, de este modo, comprobar si dichos principios resultan adecuados para recoger la realidad actual de la economia globalizada y para ofrecer a los contribuyentes garantías adecuadas en el cobro de los impuestos.

Además, esa metodología de análisis permitirá a esta ponencia general formular, en la sección cuarta, las herramientas de una posible reforma de la imposición sobre la renta, que resuelva su crisis y que sea más adecuada para reestablecer condiciones de equidad y justicia fi scal entre las naciones.

SECCIÓN PRIMERA (I)IMPOSICIÓN TRADICIONAL DE LA RENTA Y NUEVOS IMPUESTOS

1. Imposición tradicional sobre la renta y nuevos impuestos

La imposición sobre la renta representa una de las características más comunes en los sistemas tributarios en el mundo, puesto que, des-

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pués de su reciente reintroducción en Uruguay, casi no se encuentran países que no adopten este tipo de impuesto.

La razón de la difusión de ese impuesto se justifi ca, posiblemente, por el hecho de que, la renta ha llegado a representar la expresión más típica de cómo los sujetos manifi estan su propia aptitud económica: al constituir un incremento patrimonial, la renta prueba en forma inmediata la aptitud del sujeto a contribuir a la fi nanciación del gasto público. Nin-guna sección de esta ponencia general pondrá en discusión ni dicha natu-raleza, ni la función del impuesto sobre la renta en el sistema tributario. Por el contrario, el objetivo de nuestro trabajo consiste en indagar los elementos que fundan el concepto de la renta desde una perspectiva sus-tancial, es decir, más allá de la dimensión normativa que la renta actual-mente encuentra en cada sistema tributario nacional. Para lograr dicho objetivo, opinamos que deviene importante, en primer lugar, analizar la evolución del impuesto sobre la renta.

1.1. La evolución del impuesto sobre la rentaComo bien lo indica José Luis Shaw en su comunicación técnica5,

la imposición sobre la renta se aplicó por primera vez en el siglo XVIII durante las guerras napoleónicas, como nuevo instrumento para que los contribuyentes participasen en la fi nanciación del gasto público. No se trató ni de un impuesto progresivo, ni de un impuesto destinado a ser aplicado en forma estable, ya que desapareció en el momento en que terminó la necesidad de fi nanciación adicional causada por las guerras contra Napoleón. Sin embargo, posiblemente por efecto del éxito que encontró en esta primera fase, así como por las elaboraciones teóricas entre tanto pergeniadas, su reintroducción en el sistema inglés no tardó más que algunas décadas y resultó acompañada por una análoga decisión tomada por otros países antes del fi nal del siglo XIX, de manera que, ya en ese momento, representaba un elemento común a los sistemas tribu-tarios europeos.

La sucesiva evolución del impuesto y su aplicación desde las pri-meras décadas del siglo XX también en los EE.UU.AA. muestran dos fenómenos importantes.

5 Véase en ese respecto, Shaw, J.L., El impuesto progresivo a la renta personal y el paradigma de la equidad, apartado 2.2.

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En primer lugar, el tipo (o alícuota) del impuesto se incrementa por efecto de la necesidad de fi nanciar el creciente gasto público, no sólo en relación a eventos militares, sino también, en conexión con la aplicación de las primeras medidas sociales por parte de los Estados modernos. En ese contexto, se radicaliza la difusión de impuestos progresivos sobre la renta, que obligan a quien más tiene a contribuir en mayor medida a fi nanciar el gasto público; de esa manera, se realizan empíricamente las primeras formas de redistribución de la riqueza y de uso de los tributos para lograr objetivos que son, al mismo tiempo, fi scales y extrafi scales.

En segundo lugar, en los EE.UU.AA. se aplica por primera vez el Corporate Tax, es decir un impuesto sobre la renta que grava también a sujetos distintos de las personas físicas, como las sociedades y entidades similares, para lograr objetivos de neutralidad fi scal y evitar que, la crea-ción de entidades jurídicas pudiese desplazar o evitar la imposición que, de otra forma, hubiera gravado a las personas físicas.

Ya en esa fase de su evolución, y a pesar de la naturaleza cedular de los dos impuestos, se manifi esta la importancia de considerar, en forma unitaria, los distintos tributos que gravan la misma forma de riqueza, o sea la renta, para evitar que el cobro tributario pudiese afectar la econo-mía en forma injusta y excesiva. Sin embargo, la crisis económica de 1929 y la segunda guerra mundial afectan la evolución de los impuestos sobre la renta y determinan un fuerte crecimiento de las alícuotas, lo que a su vez, genera la exigencia de establecer formas de exenciones o reducciones fi scales en favor de algunas categorías de contribuyentes. Ese fenómeno sigue en las décadas sucesivas por efecto de la difusión extensiva de los sistemas del bienestar a nivel mundial, que incremen-tan, en forma exponencial, las exigencias fi nancieras del gasto público. Sucesivamente, algunos estudios proponen integrar los impuestos sobre la renta de las sociedades con los que gravan la renta sobre las personas físicas6, o de gravar las sociedades con un impuesto a los fl ujos de caja (cash fl ow tax)7, pero sin determinar un cambio efectivo en las tenden-cias de la imposición. Sin embargo, ello ocurre sólo a partir de los años

6 Véase el informe de 1966 redactado por la Comisión Carter, cuya versión en idioma español ha sido publicada por el Instituto de Estudios Fiscales, Madrid, 1975.

7 En este sentido el Informe Meade de 1979, traducido al español por el Instituto de Estudios Fiscales, Madrid, 1980.

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‘80 del siglo pasado, cuando algunos gobiernos, como él de Margaret Thatcher en Inglaterra y de Ronald Reagan en los EE.UU.AA., aceptan considerar una inversión de la tendencia y una reducción de la presión fi scal sobre la renta y, en general, sobre los contribuyentes. A mi juicio, no es casual que hayan sido Inglaterra y EE.UU.AA. los primeros en darse cuenta de tal necesidad, ya que tradicionalmente, las economías de estos países se han caracterizado por su apertura en las políticas eco-nómicas y cambiarias en el plano internacional. Además, en el caso del gobierno Thatcher, muchos recordamos la importancia de una gestión efi caz y efi ciente del gasto público para asegurar que, la minimización de los ingresos tributarios pudiese fortalecer una economía en profunda cri-sis, como la de Inglaterra en la década de los fi nales de los ‘70 y ‘80 del siglo pasado8. En ese sentido, no cabe duda de que fue Margaret That-cher quien puso en discusión la tradicional propensión de los sistemas modernos a incrementar la imposición sobre la renta para fi nanciar el gasto público, sin tomar en cuenta la importancia de reducir este último. Opinamos en este sentido, que esa nueva concepción fue una profunda innovación en la hacienda pública, en pos de la función extrafi scal de evitar un gasto improductivo, tal como resulta el generado por las activi-dades estatales desarrolladas en forma no efi ciente.

Posiblemente, la nueva concepción de la hacienda pública afectó el contexto de Europa hacia fi nales del siglo XX, cuando se realizó una pri-mera reducción de los tipos de los impuestos sobre sociedades, así como también sobre la renta de las personas físicas. Sin embargo, las barre-ras fi scales y cambiarias en ese momento, todavía existentes en Europa hasta mediados de los años ‘90, limitaron el impacto de ese fenómeno a los Estados que voluntariamente adecuaron sus propios sistemas nacio-nales a ese nuevo contexto, como especialmente ocurrió con los países escandinavos. Por tal motivo, el Comité Ruding – el que se ocupó de analizar el estado de imposición sobre la renta (y, en particular, respecto a la renta de las sociedades) en la Unión Europea , proponiendo en su

8 En sentido contrario, la reducción de los impuestos en los EE.UU.AA. no se acompañó con los mismos objetivos de política económica y se realizó en un momento de gran crecimiento de la deuda pública norteamericana, cuyos efectos permanecen toda-vía en el presente.

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Informe de 19929, la necesidad de reducir en general los impuestos sobre sociedades – no podía ni imaginar la evolución radical que se generaría por efecto del ingreso de los 10+210 nuevos Estados miembros en un contexto en que, por un lado, se realizaba una completa liberalización de los movimentos de capitales y pagos11, y, por otro lado, un grupo de Estados miembros se había comprometido a reducir su défi cit en ocasión de la introducción de la moneda común europea, o sea el euro.

Sin embargo, antes de analizar esta última etapa de la evolución histórica de los sistemas de imposición sobre la renta, es necesario hacer algunas breves refl exiones sobre las modifi caciones que se realizaron en los países escandinavos y que han llevado a la introducción de formas de imposición dual con alguno tipos reducidos para gravar el capital y otros más elevados respecto a las otras categorías de rentas, incluída la renta del trabajo12. La introducción de los impuestos duales en los países escandinavos no se justifi ca sólo por la exigencia de gravar en menor medida un factor móvil como el capital y en mayor proporción uno menos móvil como el trabajo, sino también por la necesidad de tener en cuenta la relación con los impuestos sobre sociedades, que ya han gravado el capital. En este sentido, y a pesar de los sucesivos desarrollos que se produjeron en ocasión de la aplicación de los impuestos duales en otras partes del mundo, la imposición dual del capital a nivel de las

9 Report of the Committee of Independent Experts on Company Taxation, Bru-selas-Luxemburgo, 1992, traducido al español y publicado como Informe del Comité de Expertos Independientes sobre la Imposición de las Sociedades por el Instituto de Estudios en Hacienda Pública Española, 1992/2.

10 En mayo de 2004 ingresaron en la Unión Europea Chipre, Eslovaquia, Eslove-nia, Estonia, Hungría, Letonia, Lituania, Malta, Polonia y República Checa, mientras que en enero de 2007 a dichos países se han añadido Bulgaria y Rumania.

11 Por efecto del Artículo 56 Tratado CE, esa liberalización de movimentos de capitales y pagos se extende más allá de las fronteras del mercado interno europeo, para aplicarse, y en modo unilateral, también a los países terceros, como bien se entiende de las propias palabras del Tribunal Europeo de Justicia en la reciente sentencia de 18 de diciembre de 2007, asunto C-101/05, Skatteverket vs. A, paras. 31-32.

12 Para un análisis profundo y completo de los sistemas de imposición dual, así como de las características que presentan en algunos ordenamientos tributarios (incluí-dos los de los países nórdicos), véase la comunicación Técnica uruguaya de Blanco, A., D’Angelo, P., Análisis económico de las reducciones de los impuestos a las rentas, apartado 2.3.

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personas físicas representa sólo uno de los dos pilares de la imposición patrimonial. El capital invertido en una sociedad o fondo de inversión se somete a imposición una vez en tanto se convirtió en benefi cio y, una segunda vez en tanto se transforma en dividendo distribuido al accionista o interés pagado a quien otorga el préstamo. Por otro lado, en los siste-mas tributarios escandinavos, se produce una importante peculiaridad estructural, que es fundamental para entender, cómo en dicho contexto, la menor imposición de la renta del capital respecto a la que se aplica sobre el trabajo, no impacta contra el común alcance del concepto de equidad fi scal. A diferencia de lo que ocurre en la mayoría de los sis-temas tributarios, en los escandinavos, la fi nanciación de la seguridad social se realiza de forma casi integral por efecto de los tributos. Por esta razón, los impuestos pagados por cada trabajador incluyen también una porción de las contribuciones sociales, que en otros países serían objeto de un cobro separado, normalmente sin naturaleza tributaria. Ese ele-mento sugiere que la difusión de los sistemas de imposición dual en los países escandinavos no sea unicamente un fenómeno de revitalización de las teorías del benefi cio entre imposición y del gasto público, sino que encuentre una justifi cación más amplia y peculiar, respecto a la fi nancia-ción de la seguridad social a través de los impuestos.

La evolución histórica de los impuestos sobre la renta nos lleva ahora a profundizar las características que ellos presentan en la situación actual. Antes de analizar en forma detallada dichas características en los distintos ordenamientos tributarios de los países miembros del ILADT, creemos necesario anticipar algunas consideraciones sumarias de natu-raleza histórica, respecto a la situación que hallamos en este momento en la Unión Europea. Por efecto de la liberalización de los movimentos de capitales y pagos, los ordenamientos tributarios de los países europeos se encuentran en un contexto normativo totalmente diferente de aquél en el que se han desarrollado. Mientras en el pasado, cada legislador no tenía interferencias externas en la regulación de sus normas tributarias y ni en el ejercicio de sus objetivos de política económica y fi nanciera, la evo-lución del derecho tributario comunitario europeo impone a cada Estado miembro de la Unión Europea, limitar el ejercicio de su propia soberanía tributaria de forma que, no se discriminen las situaciones transnacionales respecto a las que se realizan dentro de un sólo Estado miembro, ni se produzcan restricciones que puedan disuadir a los contribuyentes de ejer-

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cer las libertades comunitarias fundamentales, es decir, la circulación de personas, servicios, bienes y capitales. En ese sentido, opinamos que el derecho tributario comunitario europeo ha generado una forma de trans-nacionalización de los intereses colectivos, los que en el pasado, habían quedado exclusivamente limitados a nivel nacional, pero hoy se discute en Europa si es legítimo aplicar los principios básicos, como el de la soli-daridad. En efecto, históricamente, referíamos al principio de solidaridad a nivel nacional. Hoy, sin embargo, en Europa, ya esto resulta problemá-tico. Esa situación afecta a los impuestos sobre la renta de forma inme-diata, de manera que las relaciones entre los impuestos sobre sociedades y sobre la renta de las personas físicas no deben ser ni discriminatorias, ni fuente de restricciones. Por esta razón, en la medida en que un sis-tema tributario contemple una integración entre los dos impuestos en el marco de las fronteras nacionales, se debe aplicar el mismo tratamiento respecto a situaciones en que, por ejemplo, los dividendos resultan paga-dos a accionistas no residentes. Ello implica por ende, la necesidad de que por un lado, el Estado de residencia del accionista, le reconozca a dicho sujeto un crédito por los impuestos societarios, aún cuando éstos hayan sido pagados por un lado, en otro Estado respecto a un sujeto que no tributa su renta en el Estado de residencia de dicho accionista13 (con la consecuencia de reducir el impuesto debido en el país de residencia del accionista no sólo para eliminar la doble imposición jurídica interna-cional, sino también la doble imposición económica internacional y con el efecto negativo de otorgar un crédito por un impuesto pagado en otro Estado respecto a un sujeto que no tributa su renta en el Estado de resi-dencia); y por otro, por el Estado de la fuente de la renta, la necesidad de no aplicar ningún impuesto sobre los accionista extranjeros (ni siquiera en forma de retención en la fuente) cuando similar circunstanciaocurra

13 En ese modo se logra el objetivo de eliminar no sólo la doble imposición jurí-dica internacional, sino también la doble imposición económica internacional cuando el Estado de residencia del accionista elimine la doble imposición económica también en el contexto de dividendos distribuídos por sociedades residentes en dicho Estado. Sin embargo, la eliminación de la doble imposición económica internacional conlleva una pérdida de rendimiento fi scal para el Estado de residencia del accionista, que, por un lado, otorga el crédito sobre los dividendos aun cuando de fuente extranjera, y, por otro lado, no ingresa la renta sobre las sociedades extranjeras que han distribuido dicho dividendo.

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respecto a sus accionistas residentes. Por el contrario, un sistema tribu-tario que no relacione o coordine a los dos niveles de imposición sobre la renta en cuestión, es decir, imposición de las rentas de las socieda-des y de las personas físicas sino que aplique impuestos cedulares, es decir, separados entre ellos, no estará obligado a desgravar los impues-tos societarios en el momento de alcanzar a dichas rentas en cabeza de las personas físicas. Por efecto de ese nuevo contexto “paneuropeo” de imposición sobre la renta, muchos países han reconsiderado el papel de la tradicional imposición sobre la renta global en favor de impuestos cedulares, o de tipo lineal, sobre las rentas del capital. Dichos impuestos, al aplicarse de forma separada respecto a la imposición sobre la renta, no obligan al Estado miembro de la UE a tomar en cuenta la renta de las sociedades (o de los sujetos en que el capital haya sido invertido) en el momento de gravar la renta del capital de las personas físicas.

A nuestro juicio, esa situación ha fortalecido en Europa la tendencia que separa el impuesto sobre la renta del capital de las demás categorías de renta de los sujetos, en un momento de crisis general de la imposición global sobre la renta. Su análisis en esta sección de la ponencia general era, a nuestro criterio, fundamental para entender las razones de la difu-sión en Europa de los nuevos impuestos sobre la renta y para establecer en qué medida resulta posible “la transplantación” de los resultados del análisis histórico en el contexto latinoamericano. Por un lado, los países latinoamericano se diferencian de los países europeos por el hecho de no poseer ordenamientos tributarios nacionales sujetos a limitaciones de soberanía como las que se encuentran en el contexto europeo; por otro lado, es importante que, en el momento de reconsiderar las característi-cas y objetivos de la imposición de la renta para el siglo XXI, se tome en cuenta la globalización de la economía, de manera que la actualización de los sistemas tributarios latinoamericanos permita un desarrollo eco-nómico no menor al que se realiza en otras regiones del mundo. Enten-demos que la búsqueda de una dimensión global de competitividad y una fi nanciación adecuada y efi ciente del gasto público, son factores típicos de los sistemas tributarios modernos, que cercanos de la equidad fi scal en el sentido tradicional, interaccionan con ésta para permitir la sustenibili-dad fi nanciera del sistema tributario, ya que, si el sistema no resulta com-petitivo, tampoco puede ser efectivamente solidario y por tal, se impide llevar adelante los tradicionales objetivos redistributivos.

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Para cumplir dichos objetivos es importante centrar la atención en el concepto de renta.

1.2. La defi nición del concepto de rentaPreliminarmente, es importante destacar la diferente etimología de

la palabra ‘renta’ respecto a la expresión inglesa ‘income’, utilizada en el sistema tributario que, por primera vez, gravó esa manifestación de capa-cidad contributiva. Mientras que el término inglés se refi ere, en forma objetiva, a los ingresos como tales (así resultan evidentes los dos compo-nentes de dicha palabra tales como ‘in’ y ‘come’), la expresión renta y su correspondiente expresión en portugués, incluyen en si mismas la idea de restitución, que también es propia del término ‘reddito’, en uso común en el idioma italiano. Como se advierte, tanto ‘renta’ como ‘renda’ y ‘reddito’ son derivaciones del verbo latín ‘reddere’14. Análogamente, la palabra francés ‘revenu’ indica algo que vuelve y por ende, comparte, aun en forma más alejada, la idea de devolución que es propia de las expresiones mencionadas en los idiomas español, italiano y portugués.

Las diferentes etimologías refl ejan también una correspondencia a dos conceptos diferentes de renta, ya que el desarrollo de las teorías de renta producto en los sistemas tributarios latinos representa una conse-cuencia natural de la devolución al contribuyente de los frutos, tanto de una actividad, como de una inversión de su capital. Por el contrario, la etimología de renta no es conciliable con lo que el contribuyente ingresa sin efectos de restitución, como es normal desde la perspectiva de gravar cada ingreso, o sea, cada income en el capital de dicho sujeto. En este contexto, creemos que el desarrollo del concepto de renta en los sistemas germánicos y anglosajones en torno a las ideas de renta ingreso, ha sido favorecido por el uso de expresiones que refl ejan esas ideas también en forma etimológica15, ya que existiría una palabra en inglés que se acerca-ría etimológicamente a la de renta, por lo menos por la ‘ruta francesa’, es

14 La expresión ‘reddito’ en italiano o de su equivalente español ‘rédito’, utili-zado en Latinoamérica, es una derivación del participio latín ‘rĕdditum’, tal como ‘renta’ deriva de la otra forma del mismo participio, o sea ‘rĕnditum’, que ha perdido su sílaba central breve por efecto de una forma de contracción en el uso común.

15 Así se habla de ‘income’ (inglés), de ‘Einkommen’ (en alemán), de ‘inkomen’ (en holandés), ‘indkomst’ (en danés) y de ‘inkomst’.

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decir ‘revenue’. Sin embargo, tanto en el uso común, como en la termi-nología técnica tributaria, esa palabra indica las ganancias de la empresa, es decir el fruto de la cesión de los bienes o servicios producidos por la empresa, o el rendimiento del tributo.

Más allá de las consideraciones de naturaleza etimológica, no cabe duda de que el concepto de renta resulta esencialmente de orígen econó-mico16, encontrando distintas defi niciones jurídicas en los ordenamien-tos tributarios nacionales.

En ese sentido, concordamos tanto con Jarach17 y Mazz18 en que, no existe un concepto de renta, así como también con Giuliani Fonrouge respecto a que la renta es un concepto funcional, cuyas formas y conte-nidos son diferentes en relación a los objetivos que es preciso lograr19. Sin embargo, coincidimos con Valdés Costa en la importancia de una defi nición en cuanto puede suprimir cualquier incertidumbre20 y, por esta razón, intentaremos en nuestro trabajo, formular una defi nición que pueda acumular y resumir la opinión de todos. A pesar de que la doctrina tra-dicionalmente se refi era a los conceptos de renta producto, renta ingreso y renta consumida, opinamos que – aún antes de ilustrar las caracterís-ticas propias de dichas tres categorías conceptuales – resulta importante orientar una nueva dimensión dogmática de renta para América Latina, la que permitirá establecer una modalidad de separación clara entre la renta misma del patrimonio y, la renta como un incremento patrimonial. En este sentido, a la renta se le atribuye una naturaleza dinámica, que se contrapone a la estática, propia del patrimonio. A pesar de que se encuen-tren otras formas de incremento patrimonial, como por ejemplo aquéllas

16 Cfr. en ese respecto la ponencia nacional venezolana de Palacios Márquez, L., Korody Tagliaferro, J.E., Los principios tributarios ante las nuevas formas de imposición, sección I.1.

17 Jarach, D., Finanzas públicas y Derecho tributario, Buenos Aires, 1996, pág. 358.18 Mazz, A., Los modelos de imposición a la renta y el proyecto uruguayo de

imposición a la renta personal, en Revista tributaria. Revista bimestral del Instituto Uru-guayo de Estudios Tributarios, Tomo XXXIII, núm. 193, julio-agosto 2006, pág. 527 y ss., numeral 3.1

19 Giuliani Fonrouge, C., Derecho fi nanciero, IX edición, vol. II, Buenos Aires, ed la Ley, 2004, pág. 785 y ss.

20 Valdés Costa, R., Manuales impositivos: Impuesto a la Renta, Fundación Uni-versitaria de Cultura, Montevideo, 1971, pág. 41.

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originadas donaciones y sucesiones, no cabe duda de que la renta resulta la forma más tipica de incremento patrimonial.

Al constituir el patrimonio el conjunto de bienes y derechos de un sujeto, la defi nición de la renta como incremento patrimonial21 podría llevarnos a concluir que la renta no es un fenómeno económico sepa-rable del sujeto que la realiza22. Sin embargo, creemos que, tal como existen impuestos patrimoniales de tipo real, resultaría posible admitir también, impuestos sobre la renta que consideren sólo las características objetivas de la renta como tal, con independencia de los sujetos que la posean, ya que, de todos modos, en las primeras formas de imposición sobre la renta, los elementos subjetivos carecían de relevancia, y sólo interesaba el tipo de renta sujeta a imposición. Por ende, concordamos con la tradicional distinción entre impuestos sobre la renta de naturaleza real y personal, lo que por sí reconoce una diferencia estructural entre los tributos que gravan la renta como tal y los que, por el contrario someten a imposición a los incrementos patrimoniales en función de los caracte-res del sujeto que los genera. Esta clasifi cación se puede combinar, en el plano internacional, con los criterios reales y personales de conexión a la imposición, los que refi eren, respectivamente, a formas de imposición de la renta generada en el territorio del Estado que la grava (fuente) por un lado y, por otro, a tributos que alcanzan en dicho territorio a cualquier supuesto de renta producido en el mundo por un sujeto residente en el (o, en algunos casos, ciudadano del) Estado que aplica dicho impuesto. Se pueden así determinar tributos personales con aplicación real y perso-nal, pero también tributos reales con aplicación real (es decir, limitada al territorio del Estado) o personal (aunque ello se produzca en forma más excepcional).

La defi nición de renta como incremento patrimonial nos permite diferenciar de dicha naturaleza a cualquier forma de pago o benefi cio que

21 Así, intentaremos acompañar la convergencia conceptual en tema de impuesto sobre la renta con la uniformación terminológica, de forma que a conceptos homogéneos correspondan términos iguales, sobrepasando la incertidumbre actual. En esa perspec-tiva, es nuestra intención de lograr los mismos resultados que obtuvieron en el marco del IVA durante las XXII Jornadas del ILADT”.

22 En ese sentido creemos que se trata de una evolución de la defi nición de renta formulada por Haig y Simons.

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el sujeto reciba y obtenga como reintegro patrimonial. En ese sentido, los reembolsos de gastos incurridos en el interés exclusivo del empleador, en la medida en que sean debidamente documentados, no pueden quedar sometidos a imposición. Tampoco quedará sujeta a imposición, cualquier forma de renta obtenida en sustitución de aquélla que el sujeto hubiera podido realizar (como por ejemplo, el caso del pago de la indemniza-ción por el seguro en relación a un incendio ocurrido en los depósitos de una empresa). Por la misma razón, cualquier forma de renta debe quedar sometida a la imposición, aun cuando no sea objeto de un pago en dinero, tratándose de un incremento en especies del patrimonio del contribu-yente23. Así resulta justo que el impuesto sobre la renta grave los lla-mados fringe benefi ts, que incrementan el patrimonio del contribuyente, por ejemplo, a través de la posibilidad de utilizar el coche de la empresa también por razones o intereses particulares del sujeto o por cualquier otro motivo en interés personal del individuo. Más complicada es aun la solución de los problemas relativos a la imposición de los daños patrimo-niales biológicos, así como de aquéllos no patrimoniales. En principio, el pago de indemnizaciones por efecto de daños no impide que dichas sumas puedan ser objeto de imposición sobre la renta, ya que, conforme a su objetivo de gravar todo incremento patrimonial, dicho impuesto se aplicaría aun cuando, por efecto de la indemnización, el patrimonio del contribuyente fuese incrementado no sólo respecto al lucrum cessans, sino también al damnum emergens. Sin embargo, es razonable que, en presencia de situaciones en que el daño patrimonial deviene objeto de compensación en especie, los ordenamientos tributarios, como por ejem-plo hace el italiano, establezcan normas para determinar la no impo-sición de dichas indemnizaciones24. En lo que se refi ere al reintegro o restitución del patrimonio biológico de un sujeto, la efectiva imposición depende de la extensión del concepto de patrimonio en el derecho civil, de manera que, en los sistemas que incluyen los derechos biológicos en

23 Destacamos la actualidad de las ideas de García Belsunce, H., El concepto del rédito en la doctrina y en el derecho tributario, Buenos Aires, ed. Depalma, 1967, pág. 13, que en el contexto de un concepto de renta ingreso se refi ría a la posibilidad de evaluar en moneda, más bien que a la expresión de la renta misma en moneda.

24 Véase en ese respecto la ponencia nacional italiana de La Scala, E., I principi tributari in materia di imposizione sul reddito, en Sezione I, 1.1.

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el patrimonio de un sujeto, se plantea la cuestión si el pago de la indem-nización como tal (por ejemplo, el pretium doloris) no debe resultar gra-vado a los efectos de la imposición sobre la renta.

Esta defi nición de renta nos parece más moderna de las tres defi -niciones tradicionales que se encuentran en la doctrina tributaria, o sea, renta producto, renta ingreso y renta consumida, ya que muchos ordena-mientos se han progresivamente alejado de esas categorías doctrinales en favor de formas de imposición que combinan y transforman dichas cate-gorías en nuevas especies híbridas. Sin embargo, pasaremos brevemente reseña de aquellas tres categorías doctrinales.

El concepto de renta producto nace para permitir gravar exacta-mente la contribución que cada sujeto aporta a la riqueza del país a través de su propia actividad. La característica de la renta producto se encuentra en el hecho de resultar una fuente durable, o permanente25, cuya explo-tación permite un incremento periódico que no afecta el patrimonio26. En ese sentido, Oronzo Quarta en 1902 habló en Italia de la renta como de una “ricchezza novella in relazione di effetto a causa con una energia o forza produttiva”. Su evolución permite justifi car que se sometan a imposición también los supuestos en que la producción de la riqueza no sea fruto de la actividad material del trabajo, sino de la disponibilidad del capital. Por otro lado, algunos sistemas, como él de Inglaterra, todavía diferencian entre la renta que procede periódicamente de la disponibili-dad del capital, como por ejemplo el caso de intereses y dividendos, y la que se halla en el mayor valor del capital al momento de su cesión, la que representa una ganancia del capital y es objeto de un impuesto separado. A pesar de que el concepto de ganancia de capital se encuentre tam-

25 Por esta razón esta teoría es también conocida como teoría de la renta fuente. Opinamos que amplia difusión en Latinoamerica puede haber infl uenciado también la posición que los sistemas tributarios latinoamericanos han adoptado en el plano interna-cional durante muchas décadas, al apoyar la teoría de la imposición de la renta en el país de la fuente frente a la postura opuesta de los países desarrollados a favor de la imposi-ción mundial en el país de residencia o también conocida renta mundial

26 Cfr. amplius Reig, E.J., Impuesto a las ganancias, X edición, Buenos Aires, 2001, pág. 45, así como Mazz, A., Los modelos de imposición a la renta y el proyecto uruguayo de imposición a la renta personal, en Revista tributaria. Revista bimestral del Instituto Uruguayo de Estudios Tributarios, Tomo XXXIII, núm 193, julio-agosto 2006, op. loc. ult. cit.

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bién en la doctrina latina, la mayoría de los ordenamientos tributarios no somete a las ganancias del capital a un impuesto separado del que grava la renta27, fuera de los casos en que el contribuyente mismo opta por una imposición de tipo cedular.

Sin embargo, aún con las modifi caciones que hemos indicado antes, el concepto de renta producto, en forma pura, no permitiría justifi car por sí los supuestos en que la producción de la renta no se genera por efecto de una actividad (como en el caso de la renta que procede de las actividades de abstención o en los períodos de vacaciones) o de la natural remuneración del capital (como en el caso de las plusvalías de capital o de los modernos instrumentos fi nancieros derivados y híbridos, donde el incremento patrimonial es fruto de las tendencias del mercado), de manera que otros utilizan este argumento para afi rmar la superioridad del concepto de renta ingreso. A pesar de que un concepto de renta ingreso pueda incluir dichos supuestos, opinamos que la difusión de ese concepto – teorizado por von Schanz y perfeccionado junto a Haig y Simons – ha contribuido a una absoluta expansión del concepto de la renta, hasta que algunos han llegado al punto de considerar como renta todo y, simple-mente, lo que el legislador en un determinado momento considera como tal. No se trata de una tautología, sino de la crisis total de la dimensión sustancial de las categorías tributarias frente a la omnipotencia del legis-lador, que puede producir consecuencias negativas para nuestra rama del Derecho, a pesar de la vigencia de garantías constitucionales.

Además, el concepto de renta consumida elaborado por Irving Fis-her28 y perfeccionado por Kaldor29 como instrumento de aplicación de un impuesto en función de los gastos de cada persona (expenditure tax), nunca ha encontrado una verdadera aceptación en los ordenamientos tri-butarios, fuera de los estudios efectuados por los gobiernos de India30

27 El ponente nacional argentino señala que en Argentina las ganancias del capital se someten a imposición sólo cuando hayan sido realizadas por las empresas.

28 Fisher, I.,Income in Theory and Income Taxation in Practice, en Econometrica, vol. 5, January 1937, págs. 1-55. I; Fisher I, Fisher, H. W., Constructive Income Taxation. A Proposal for Reform, Harper & Brothers, Nueva York, 1942.

29 Kaldor, N., An Expenditure Tax, Gorge Allen & Unwin, Londres, 1955.30 Kaldor, N., Indian Tax Reform: Report of a Survey, Department of Economic

Affairs, Ministry of Finance, Government of India, New Delhi, 1956.

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y Ceylon31 (ahora Sri Lanka). Posiblemente, eso se debe a la necesidad de someter a imposición sólo la porción del incremento patrimonial no destinada al ahorro, lo que implicaba que se tomase en cuenta también la explotación de los bienes por parte del contribuyente y de esta manera, siempre ha sido considerado como una fuente de complejidad jurídica32.

Ahora bien, a pesar de que este trabajo destaque la importancia de adoptar una defi nición de renta como incremento patrimonial, todavía quedan algunos problemas que no se pueden circunscribir a la determi-nación de la base imponible, sino que a nuestro juicio, son muy propios de una coherente defi nición de la renta.

Nos referimos, en primer lugar, al dilema entre imposición de la renta bruta o de la renta neta, que atañe a todos los legisladores y con-tribuyentes en los distintos países miembros del ILADT. La solución de este problema es muy compleja, ya que, por un lado, se pueden justifi car, en algunos casos, las formas de aproximación en el cálculo de la base imponible, y, por otro lado, dichas aproximaciones pueden represen-tar una manera para que el sistema tributario someta a imposición una manifestación de aptitud económica no efectiva, ni real, sino en algunos casos, meramente presunta.

Durante las últimas décadas, el principio de capacidad contributiva, que sin duda representa el eje de la equidad fi scal en cada sistema tribu-tario, ha sido a veces llevado a derivaciones extremas respecto a la deter-minación exacta de la renta de los contribuyentes. Me parece apropiado mencionar en esta ocasión, tanto las formas de imposición de la renta de las empresas según los resultados contables, como las formas de deter-minación presuntivas de la renta en un régimen de estimación objetiva.

Afi rmar en principio que siempre sería necesario determinar la imposición con arreglo a la efectiva capacidad contributiva de los suje-tos, me parece correcto en la teoría, pero no siempre ocurre en la apli-cación práctica. Tomamos como ejemplo la situación acontecida en el ordenamiento tributario español (al igual de lo que ocurre en la nueva normativa tributaria italiana del Testo Unico delle Imposte sui Redditi,)

31 Kaldor, N., Suggestions for a Compehensive Reform of Direct Taxation, Ses-sional Paper IV, Colombo, 1960.

32 Cfr. amplius sobre ese tema la comunicación técnica italiana presentada por D. Fausto, Alcune considerazioni economiche in tema di imposta progressiva sulla spesa.

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por efecto de la remisión al resultado contable, dispuesta por el Art. 10 de la Ley española sobre el Impuesto sobre Sociedades. Como bien lo afi rma José Juan Ferreiro33, ese reenvío de la norma genera una compli-cación del mecanismo para determinar la base imponible con motivo de la vinculación al resultado contable y del casuismo, que es típico de las reglas contables (incluídas las NIC), alejándonos, no sólo del principio de legalidad de la imposición, sino también de la simplicidad que repre-senta un valor fundamental de los sistemas tributarios. En el caso de las pequeñas y medianas empresas (PyMEs), que por su propia naturaleza tienen una estructura muy sencilla, la obligación de llevar libros con-tables representa un verdadero gravamen adicional a los de naturaleza efectivamente tributaria. Por esta razón, opinamos que el principio de capacidad contributiva no debe representar un dogma tributario, sino una garantía de la imposición tributaria; no se trata de un elemento intrinseco a la defi nición de la renta para pedir que sólo se grave la renta neta, sino que se trata de un instrumento para asegurar que el cobro del impuesto se funde en una situación que efectivamente refl eje la situación del con-tribuyente. En virtud de lo antes expuesto, no deviene razonable, ni se le puede pedir a los sujetos, soportar costes contables gravosos para ofrecer al Estado el tributo sobre el altar de la capacidad contributiva efectiva, ya que de esa manera, se desnaturalizaría la función que es propia de ese principio en el ordenamiento constitucional de todo país latino, tanto de América34 como de Europa. En consecuencia, no creemos que, en presencia de sistemas tributarios que graven la renta en función de una base imponible fi cta para las PyMEs (como en el caso del monotributo argentino, del forfettino italiano o del régimen aplicable en España)35, se genere una lesión al principio de capacidad contributiva, ni que en gene-

33 Véase, en ese respecto, Ferreiro Lapatza, J.J., Legalidad y seguridad. Resultado contable y base imponible. Deslegalización, autodeterminación y delito fi scal, en num. 1

34 En ese sentido entendemos y compartimos la crítica contenida en la comunica-ción técnica redactada por Belisario Rincon, J.R., El principio de capacidad contribu-tiva en los regímenes simplifi cados de imposición, apdo. 2, respecto a la decisión de no introducir un régimen simplifi cado de imposición para gravar la renta de las pequeñas y medianas empresas.

35 Véas en ese respecto la ponencia general de Ferreiro Lapatza, J.J. en las XXIII Jornadas Latinoamericanas de Derecho Tributario sobre el tema ‘Derecho tributario y política fi scal’.

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ral, eso ocurra al gravar una renta de las empresas distinta a la que surja de la aplicación de las reglas contables. Por supuesto, esas conclusiones se aplican en la medida en que sea el propio legislador quien defi na pau-tas ciertas y razonables para determinar la base imponible, es decir, que ellas supongan la existencia de una sustancial capacidad contributiva en el contribuyente afectado.

Por ende, no creemos que la imposición de la renta fi cta represente en si mismo un problema, ni tampoco en los casos en que el legislador se sirva de este instrumento para aproximarse, con un razonable grado de probabilidad, a la renta efectiva del contribuyente36. Eso ocurre también con las formas de predeterminación de la renta en función de las estima-ciones objetivas o, fundadas en las evaluaciones contenidas en los libros catastrales, ya que, en ambos casos, la imposición se funda en evaluacio-nes técnicas efectuadas con un elevado grado de precisión y responde a fi nalidades de relevancia constitucional37. Tampoco se generan proble-mas cuando el legislador aplica métodos de selección entre los contri-

36 Al respecto, el ordenamiento tributario peruano ofrece una interesante siste-matización de la determinación de la renta gravable, por efecto de deducciones fi jas de la renta bruta en función de las distintas categorías de contribuyentes. El ordenamiento tributario peruano se sirve de una presunción legal para determinar las deducciones admi-tidas y gravar una renta fi cta neta, de manera que logra una simplifi cación del sistema tributario sin vulnerar, a nuestro juicio, el principio de capacidad contributiva en forma evidente. Sin embargo, de la ponencia nacional peruana, entendemos que una diferente posición puede determinarse para los sujetos que reciben dividendos, cuya renta está sometida a la tercera categoría.

37 En el caso de la imposición de la renta medio-ordinaria (también conocida en Latinoamérica como renta normal potencial) de la tierra se entiende que la explotación más intensiva permitirá reducir la incidencia del tributo, de forma que, al no gravar la renta efectiva, el tributo logra también objetivos extrafi scales de fomento al desarrollo económico, como bien lo indica Mazz, A., cit., apdo. 5.4.3.4. A pesar de que esa moda-lidad de imposición resulta bastante común en los ordenamientos tributarios europeos y norteamericanos, entendemos que su aplicación al contexto latinoamericano – propuesta entre otros por Dino Jarach (Jarach, D., El impuesto a la renta normal potencial de la tierra, en Cuadernos de Finanzas Públicas, pág. 5) y por Currie-Musgrave respecto a la situación de Colombia – haya levantado bastante perplejidades, como lo señala Mazz, A., cit., apdo. 5.4.2. y ss., a pesar de su recomendación por parte del Instituto Latinoameri-cano de Derecho Tributario en las III (San Pablo, 1962) y IV (Buenos Aires, 1964) Jor-nadas. Sin embargo, también en el marco del ILADT se pusieron de manifi esto críticas, como en las X (Rio de Janeiro, 1983) y XIV (Buenos Aires, 1989) Jornadas.

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buyentes para la verifi cación y control, fundados éstos en la renta que los mismos hayan declarado y en la congruencia de dicha renta con las estimaciones objetivas efectuadas por las autoridades fi nancieras, dado que, en esta situación – que se realiza en Italia por efecto de los studi di settore –, se reconstruye la renta por efecto de criterios inductivos, pero al fi nal, se sigue gravando la renta efectiva, o por lo menos, se permite al contribuyente ofrecer la prueba en contrario respecto a las conclusiones alcanzadas por la administración fi nanciera. Contrario sensu, pueden determinarse formas de lesiones al principio de capacidad contributiva en la medida que el legislador grave una renta fi cta en situaciones en que es posible o probable que la misma no exista, como por ejemplo, en presencia de mecanismos de impuestos mínimos, que presumen la existencia de una renta y gravan una base imponible fi cta a pesar de lo que efectivamente ocurre38. Los mismos problemas se generan al gravar la renta bruta, en la medida en que la base imponible se aleja en forma sustancial de la efectiva manifestación de capacidad contributiva, por razones distintas a las generadas por la propia simplifi cación del cobro del impuesto. Infelizmente, dichas situaciones son todavía muy frecuen-tes en América Latina, como lo ponen de manifi estos algunos trabajos presentados en estas Jornadas.

En segundo lugar, es necesario pensar en las consecuencias que se generan, dentro de los impuestos tradicionales, por efecto de la existen-cia de diferentes categorías de renta. No es infrecuente que los ordena-mientos tributarios establezcan diferentes reglas para determinar la renta en cada categoría, de manera que, con independencia de la existencia o la carencia de una verdadera y única defi nición de renta, el sistema tribu-tario acaba por gravar cada categoría en forma distinta, a veces también con repercusiones sobre la base imponible. En otras palabras, a pesar de la existencia de sistemas tradicionales de imposición unitaria sobre la

38 A pesar de que en varios países (entre ello, Italia y Perú) han sido declarados inconstitucionales por no gravar una fuerza económica efectiva, los impuestos sobre la renta mínima todavía existen en muchos ordenamientos tributarios latinoamericanos, como por ejemplo en Argentina (impuesto sobre la ganancia mínima presunta), Bolivia (respecto al IUE para empresas y profesionales), Colombia (método alternativo presunto de imposición sobre la renta), México (impuesto a empresarial a tasa única, introducido en 2008) Venezuela (impuesto mínimo complementario a la renta).

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renta, muchos sistemas tributarios han desarrollados microsistemas de determinación y de imposición de las distintas categorías de rentas, de manera que, en muchos países, el impuesto sobre la renta representa nada más que un instrumento para gravar la suma de las distintas rentas. Esa situación queda bastante lejos de las características que eran propias del impuesto complesivo sobre la renta, al momento de su introducción, pero se justifi ca por efecto de la evolución de las formas de riqueza, y de sus distintas manifestaciones. Todo ello, de esta manera, nos induce a consi-derar perspectivas de reformas que orienten al impuesto sobre la renta en dirección a nuevas formas de imposición que sean más apropiadas en el contexto de la globalización de la economía. Sin anticipar las conclusio-nes de este trabajo, creemos importante indicar que en la medida en que, la actual estructura del impuesto complesivo sobre la renta meramente consista en permitir el pago de un único tributo sobre la renta, donde se plasme una suma algebráica de las distintas categorías de rentas – cada una determinada por su cuenta y en base a distintas pautas y conceptos de renta –, no sería imposible reformar el sistema tributario a través de la creación normativa de distintos impuestos sobre la renta, sujetos ellos a mecanismos de compensación en el momento de su recaudación 39, de manera que no hubiese pagos de impuestos frente a la ausencia de la manifestación de una aptitud económica complesiva.

Para permitir a esta ponencia general abordar los fundamentos de ese problema, es necesario analizar ante todo la tradicional separación entre el impuesto sobre (la renta de las) sociedades y el impuesto sobre la renta (de las personas físicas), la que siempre ha sido justifi cada desde la introducción del impuesto sobre sociedades en el siglo XX. Dicha sepa-ración no se debe al hecho de una diferente naturaleza de la renta gravada por los dos impuestos, sino en función de la necesidad de gravar la renta cuanto antes, aun cuando fuese generada por sujetos distintos de sus benefi ciarios fi nales, y así evitar cualquier problema de desplazamiento

39 El establecimiento de formas de compensación entre distintos impuestos ha sido introducido en la última década en Italia y permite la compensación tributaria aun entre impuestos directos, como él sobre la renta, e indirectos, como el IVA. Se realiza por efecto de la obligación por el contribuyente de compilar un sólo modelo de declaración (llamado Modello Unico) en que se suman algebráicamente los distintos impuestos y se determina el saldo del impuesto debido por el contribuyente mismo cada año.

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impositivo respecto a los sujetos que la lograban en forma directa. En consecuencia, creemos que, al momento de teorizar una reforma y una modernización de la imposición sobre la renta, no se pueda ignorar esa conexión estructural entre los dos impuestos, ni tampoco una conside-ración aun más profunda de las distintas modalidades de interacción entre dichos impuestos en todas las posibles situaciones, de manera que resulta necesario para este trabajo abordar el tema de la clasifi cación de los impuestos sobre la renta.

1.3. Las clasifi caciones de los impuestos sobre la rentaA pesar de que resulte posible clasifi car a los impuestos en función

a diferentes pautas, creemos que, en razón de las consideraciones que hemos antepuesto, esta ponencia debe poner especial énfasis en las dos clasifi caciones de los impuestos sobre la renta que son más tradicionales, es decir, aquéllas donde se distinguen en función de los sujetos pasi-vos involucrados, por un lado, y aquéllas que refi eren a los mecanismos cedulares o integrados de imposición, por otro.

No cabe duda de que la primera clasifi cación resulta la más obvia y natural, ya que todos los ordenamientos tributarios aplican distintos impuestos sobre la renta de las personas físicas y sobre sociedades40. Sin embargo, creemos que esta ponencia general debe analizar con antela-ción, la segunda clasifi cación, ya que sus implicancias pueden también afectar las relaciones entre los dos impuestos que gravan la renta de las personas físicas y las sociedades. En este sentido, hemos preferido refe-rirnos a los sistemas integrados de imposición para individualizar a aqué-llos que no sólo aplican un impuesto sobre la renta global de las personas físicas (también conocido como impuesto complesivo), sino también que integran este impuesto con el que grava o recae sobre las sociedades.

A pesar de su origen y etimología indudablemente latina, la palabra ‘cedular’ ha sido introducida en nuestra rama del derecho por deriva-

40 Sin embargo, existen algunas discrepancias entre el marco de aplicación de ambos impuestos y, en particular, respecto a las entidades que no sean ni personas físi-cas, ni sociedades en el sentido estricto, como por ejemplo las sociedades de personas (que en muchos ordenamientos no tienen naturaleza de personas jurídicas y son gravadas en régimen de transparencia fi scal) o las entidades no mercantiles o comerciales sin fi na-lidad de lucro.

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ción de la palabra ‘schedular’, que en inglés, se refi ere a los sistemas de imposición sobre la renta desde la creación de dicho impuesto, indicando ello su aplicación de conformidad de un plan objetivo y predeterminado, o sea una ‘schedule’, sin que quedara ella sujeta a interferencias exter-nas. En este sentido, el impuesto sobre la renta indudablemente nació con características de sencillez y de objetividad tales que, su aplicación resultaba clara y concreta.

Nacido como impuesto cedular, el impuesto sobre la renta se ha transformado en un impuesto complesivo para gravar todas las mani-festaciones directas de capacidad contributiva, y que el ordenamiento tributario nacional califi ca como renta. Sin embargo, en los últimos años, parece volver a tomarse en cuenta la imposición cedular, a veces por efecto o con motivo de opciones del propio contribuyente. En este sen-tido, los países miembros del ILADT no presentan una situación dis-tinta de la que se encuentra en otras partes del mundo. Así por ejemplo, México se convierte a la imposición complesiva sobre la renta a partir de 1964, y otros países latinoamericanos hicieron lo mismo. Tal es incluso el caso de Bolivia, quien ha abandonado la imposición cedular hace más de 20 años. Muchos ordenamientos tributarios nacionales – como los de Argentina, Colombia, Italia y Perú – todavía mantienen la centralidad de la imposición complesiva sobre la renta, a pesar de que hagan eso con muchos y diferentes matices, como por ejemplo en el caso de Venezuela. Este país se convirtió a la imposición de la renta complesiva a fi nales de los años ‘50, por efecto de las recomendaciones de la misión Shoup. Sin embargo, presenta hoy una marcada tendencia a “la cedularización” o “cedulación”, como lo afi rman los ponentes nacionales. En sentido con-trario, Uruguay reintroduce en 2007 la imposición sobre la renta de las personas físicas en forma de impuesto dual para gravar las rentas del trabajo y del capital, de modo similar a lo ocurrido en España en 1998 (así como en Italia entre 1998 y 2002) y a lo que se realizará en el Perú a partir del 1° de enero de 2009. La presencia de impuestos cedulares y complesivos sobre la renta refl eja el actual proceso de reconsideración de las características de los impuestos sobre la renta, que sin embargo, no debe quedar confi nado a las soluciones buscadas en los distintos ordena-mientos positivos, sino que debe abarcar una general visión de las posi-bles formas de imposición sobre la renta.

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La naturaleza del impuesto sobre la renta como impuesto comple-sivo se ha afi rmado en un contexto donde a éste, se le ha progresivamente atribuido funciones de redistribución de la riqueza y de instrumento para lograr la igualdad sustancial (en italiano se ha hablado tradicionalmente de función de perequazione tributaria), así como también, la equidad vertical entre los contribuyentes con distintas situaciones patrimoniales, y por ende, de renta. Así, ya desde el siglo XIX, se han sometido a imposición las rentas de las personas físicas a tipos progresivos y se han establecido mecanismos para desgravar la imposición de los sujetos con una menor aptitud económica. La imposición progresiva y el estableci-miento de exoneraciones, exenciones y regimenes especiales constitu-yenson posiblemente, los factores que más han contribuido a transformar las características estructurales del impuesto sobre la renta para lograr el objetivo de permitir que quien más renta posee, más debe contribuir a la fi nanciación del gasto público. A pesar de compartir ese objetivo, recordamos que el impuesto sobre la renta no nace como un instrumento de redistribución de la riqueza y que sólo puede ser utilizado para lograr dicho fi n, en la medida en que la estructuración del sistema tributario y la efi ciencia de las autoridades fi nancieras, permitan una efectiva recauda-ción41. Este trabajo volverá a analizar en forma más profunda los proble-mas de la progresividad de la imposición en otra sección. Sin embargo, es necesario destacar que el objetivo de realizar una redistribución de la renta no es genéticamente innato a este tipo de impuesto, ni tampoco se logra sólo y necesariamente por el hecho de aplicárselo mediante tipos progresivos. Al respecto, creemos que los bajos niveles de recaudación del impuesto sobre la renta complesiva de las personas físicas en la situa-ción actual de Latinoamérica42, no permiten a este impuesto lograr la

41 Por contra, en la medida en que la estructura del sistema tributario sea demasiado compleja para que las autoridades fi nancieras gestionen el tributo de forma adecuada y aseguren una efectiva recaudación, se ha persuasivamente argumentado que el sistema no logra el objetivo de la redistribución de la renta. En ese sentido cfr. Weller, C.E., The Benefi ts of Progressive taxation in Economic Development, en Review of Radical Poli-tical Economics, vol. 39, No. 368, 2007, pág. 373.

42 En ese sentido véase Costa, C., El Impuesto a la Renta Personal, Global y Pro-gresivo. Estructura Técnica y Realidad de su Aplicación en América Latina, Fundación de Cultura Universitaria, Montevideo, 2004, pág. 161 y ss. y 175 y ss.

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efectiva redistribución de la renta43. Por ende, creemos que resulta posi-ble afi rmar que la tendencia actual de reemplazar los sistemas tributarios de imposición complesiva sobre la renta con impuestos cedulares no des-naturaliza ese tipo de imposición, ni da lugar a otros problemas de difícil solución.

La naturaleza cedular se encuentra generalmente en dos aspectos fundamentales de la imposición sobre la renta.

En primer lugar, puede tener como objeto a la renta de la misma persona, como ocurre cuando el legislador establece distintos impuestos sobre la renta, cada uno de los cuales se aplica según su propia schedule y sin admitir interferencias externas. Así, en un sistema de imposición cedular sobre la renta pueden existir impuestos separados por diversas manifestaciones de rentas que representarán categorías de éstas en un sistema de imposición complesivo. La diferencia principal entre dichas hipótesis se encuentra normalmente en la consolidación de los resultados de cada categoría de renta en los impuestos complesivos, frente a la impo-sibilidad de compensar los resultados positivos y negativos de cada renta en el supuesto de impuestos cedulares. En sentido opuesto, una situación diferente se plantea en las relaciones entre los impuestos (cedulares o complesivos) sobre la renta y los demás impuestos que gravan otra base imponible, de forma adicional o sustitutiva de aquéllos sobre la renta44. En algunos sistemas, se admite esa posibilidad mediante la opción del contribuyente o, en forma obligatoria por decisión del legislador.

En segundo lugar, el sistema de imposición bajo análisis puede tener como objeto la renta de distintos sujetos pasivos, como ocurre en el caso de las relaciones entre la imposición sobre la(s) renta(s) de las personas físicas y de las sociedades. En este sentido, la existencia de una relación de tipo cedular entre tales categorías de impuestos implica

43 Concordamos en ese respecto con Shaw, cit., apdo. 1.9, así como con Barreix, A., Roca, J., Arquitectura de una propuesta de Reforma Tributaria”, Montevideo, abril 2006, en www.ucu.edu.uy/Facultades/Ciencias_Empresariales/ref_tributaria.htm, pág. 26.

44 Esa situación no se encuentra necesariamente respecto a las retenciones en la fuente, ni tampoco cuando el cobro del tributo se concluye por efecto de dicha retención, sin que el contribuyente quede obligado a incluír la renta gravada por la retención en su declaración anual. En ese sentido,, es necesario aclarar que la retención en la fuente sólo representa una modalidad de cobro del tributo y no un impuesto por si mismo.

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que, el legislador establece los tipos para ambos impuestos en función de schedules, es decir, sin importar y ajeno totalmente a que otros impuestos efectivamente ingresados, haya soportado el contribuyente. Se advierte de este modo, la característica aislacionista o “ tipo estanco” que posee cada Schedule bajo análisis. Así, por ejemplo, la posibilidad de que el contribuyente goce de alguna modalidad de reducción o exención a nivel del impuesto sobre sociedades por un lado, y la distribución de los dividendos pagados a partir de ganancias o benefi cios sometidos a una imposición reducida, por otro, no produce consecuencias a nivel de la imposición de la renta del accionista que los recibe. Mientras que en un contexto puramente nacional la diferencia entre sistemas cedulares e integrados de imposición sobre la renta de las personas físicas y de las sociedades se podría generar sólo en la situación que acabamos de describir, en el contexto internacional, los dos sistemas conllevan dife-rencias mucho más importantes. Por ejemplo, puede darse el caso en el que, en un país exista una relación cedular entre los dos niveles de impo-sición, mientras que en el otro país, los mismos sean integrados, o bien, que en el país de residencia de la sociedad que distribuye los dividendos, se aplique un impuesto sobre la renta de las sociedades con tipos inferio-res a los que se aplican sobre los benefi cios de las sociedades del país de residencia del sujeto que recibe dichos dividendos.

En virtud de las consideraciones que hemos antepuesto, es impor-tante considerar que también la segunda clasifi cación de los impuestos sobre la renta, o sea aquélla establecida en función de los distintos suje-tos pasivos (personas físicas y sociedades), puede tener consecuencias diversas, según que se aplique en un contexto cedular o de integración entre los dos niveles de imposición.

En principio, el impuesto sobre sociedades grava la renta con un tipo proporcional, mientras que aquél sobre la renta de las personas fi si-cas – en los sistemas de imposición sobre la renta global –, se suele aplicar con tipos progresivos. Generalmente, se justifi ca con distintos argumentos, tanto la duplicación impositiva como la diferenciación estructural entre los dos impuestos. Así, se considera que el primero es necesario para evitar cualquier desplazamiento de la imposición a través de la creación de sujetos con una propia personalidad jurídica distinta de la de sus socios, por lo que grava la renta en forma real e inmediata, mientras que el segundo permite adaptar la carga impositiva a la aptitud

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económica del sujeto que es benefi ciario fi nal de la renta. Sin embargo, existen impuestos cedulares sobre la renta de las personas físicas con tipo proporcional o, aun impuestos lineales que gravan la renta con un único tipo, como en el caso de Estonia, que grava los benefi cios al momento de su distribución y aplica el mismo tipo impositivo (en este momento el 24%) tanto para los benefi cios de las sociedades, como para la renta de las personas físicas, de forma que logra una máxima simplifi cación en el sistema tributario45.

A pesar de que tanto los sistemas integrados, como los de naturaleza cedular, admiten el fenómeno de la doble imposición entre benefi cios sometidos a imposición al nivel de la sociedad, y dividendos gravados al nivel del socio, existen importantes diferencias entre sistemas cedulares e integrados. En estos últimos, cuando se establecen formas de desgra-vación de la doble imposición46, ésta se calcula respecto a los impuestos efectivamente pagados, mientras que en los sistemas cedulares, la misma desgravación se realiza según las disposiciones predeterminadas en el ‘schedule’ establecido por el legislador. En consecuencia, en la hipóte-sis en que el socio tenga derecho a la desgravación por el método de la deducción (o crédito) de los impuestos sobre sociedades, aplicable al impuesto generado sobre su renta como persona física, aun cuando los benefi cios hayan sido gravados con un tipo preferencial, no se producen consecuencias sobre el monto del crédito establecido por el legislador.

Profundizaremos dichos problemas en la próxima sección.

45 Sobre el sistema estoniano de imposición sobre la renta cfr. amplius Lehis, L., Klauson, I., Pahapill, H., Uustalu, E., The Compatibility of the Estonian Tax System with Community Law, en Intertax 7-8/2008.

46 Algunos sistemas cedulares separan el impuesto sobre sociedades del impuesto sobre la renta de las personas físicas, sin otorgar formas de desgravación. Estos sistemas, llamados sistemas clásicos, se encuentran todavía en EE.UU.AA., Holanda y Luxem-burgo, que sin embargo establecen numerosas excepciones respecto a la necesidad de integrar la imposición sobre la renta dentro de los grupos de sociedades.

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2. Aspectos conceptuales y estructurales de los sistemas tradiciona-les de imposición sobre la renta

En esta sección analizaremos las herramientas de los sistemas tra-dicionales de imposición sobre la renta, es decir, aquellos ordenamientos tributarios que aplican un impuesto proporcional sobre las sociedades y un impuesto progresivo sobre la renta complesiva de las personas físi-cas47. Profundizaremos también, en forma paralela, la interacción entre dichos impuestos, tomando en cuenta las refl exiones e indicaciones ofre-cidas por las ponencias y comunicaciones técnicas presentadas por los representantes de las asociaciones miembros del Instituto Latinoameri-cano de Derecho Tributario.

La separación entre sistemas tradicionales de imposición sobre la renta y los otros impuestos sobre la renta no es tan rígida, como pudiera prima facie parecer, ya que los sistemas admiten también la aplicación de otros impuestos en forma adicional respecto a los impuestos tradicio-nales (como por ejemplo en el caso de Argentina), sustitutiva (como en el caso de Perú para dividendos, o de Italia, aun por el efecto de opcio-nes manifestadas por el contribuyente) o para algunas categorías de con-tribuyentes (como en el caso de Argentina o España respecto a los no residentes) o de rentas (como en Colombia para las rentas agrícolas y ganaderas).

A pesar de las razones que puedan justifi car su instrumentación legal, opinamos que la aplicación de una pluralidad de impuestos sobre la renta, así como también cada forma de exención o exoneración, no representan en si mismo fenómenos deseables, ya que generan una com-plicación de la estructura del sistema tributario, pudiendo crear distorsio-nes. Dichos problemas se presentan también cuando el sistema tributario permite la aplicación de los nuevos impuestos, conjuntamente con los impuestos tradicionales sobre la renta.

El ponente nacional argentino nos informa que, por un lado, el impuesto federal sobre la renta (es decir el “Impuesto a las ganancias”) no es el único que grava esa manifestación de aptitud económica y, por

47 Como bien lo señala el ponente nacional J. Fernando Álvarez, Colombia aplica un sólo impuesto sobre la renta a distintas categorías de contribuyentes, pero establece modalidades especiales y tipo reducido respecto a las entidades sin ánimo de lucro.

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el otro, a pesar de la existencia de otros impuestos (también cedulares) que gravan ciertas categorías de renta o sujetos, quedan todavía muchas situaciones no sujetas a este tipo de imposición. En otras palabras, nos hallamos ante un sistema impositivo complejo e incompleto, que puede ser fuente de distorsiones económicas y que, eventualmente, grava la renta en forma presunta.

En Bolivia la complejidad del sistema se genera, entre algunas razo-nes, por la existencia de dos distintos conceptos de renta, que fundan el impuesto sobre la renta de las personas físicas (es decir el “Régimen complementario al valor agregado”48) en la renta producto, por un lado, y el impuesto sobre las utilidades de las empresas en la renta consumo más incremento de patrimonio resultante de las reglas de contabilidad, por otro. Esos dos diferentes conceptos de renta no pueden, a nuestro criterio, evitar situaciones de no sujeción a imposición (como en el caso de las ganancias de capitales realizadas por las personas físicas) o ser fuente de complejidad del sistema de imposición sobre la renta. Además, el legislador dispone la aplicación de presunciones absolutas y relativas en situaciones de imposibilidad para las autoridades fi nancieras de cono-cer la capacidad económica real.

Por efecto de una reciente reforma tributaria en Italia, el sistema de imposición global a la renta de las personas físicas así como tam-bién el de las sociedades, se ha adaptado a los resultados contables de conformidad con los principios internacionales, de manera que se ha introducido un fuerte elemento de inseguridad jurídica, así como una puerta para la desnaturalización de los principios y reglas impositivas aplicados durante muchas décadas. Sin embargo, esta innovación se ha justifi cado por efecto y con motivo de la exigencia de asegurar que el sistema impositivo pueda adecuarse a las características de la globaliza-ción económica.

Desde una perspectiva tanto conceptual, como estructural, es nece-sario averiguar si un ordenamiento tributario tradicional, o sea que grave

48 El ponente nacional boliviano nos informa que mucho se ha discutido en Bolivia sobre la naturaleza de ese impuesto. A pesar del hecho que la operación del RC-IVA se asemeje a los sistemas de imposición dual, como lo indica el mismo Álvaro Villegas Aldazosa, el RC-IVA boliviano nos parece un impuesto selectivo sobre las (es decir, que sólo grava algunas categorías de) rentas de las personas físicas.

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la renta complesiva de los contribuyentes, puede legítimamente diferen-ciar entre sus sujetos obligados y los distintos tipos rentas, así como tam-bién aplicar distintos regímenes de imposición, o aun de exoneración. En este sentido, cabe destacar que, en principio, la aplicación de dos distintos impuestos para gravar – con tipo proporcional – la renta de las sociedades y – con tipo normalmente progresivo – la renta de las perso-nas fi sicas, representa un elemento común en la amplia mayoría de los sistemas tributarios en el mundo. Sin embargo, las ponencias nacionales nos indican que la situación es diferente en el contexto de los países miembros del Instituto Latinoamericano de Derecho Tributario, ya que algunos (como España, Uruguay y, desde enero de 2009, Perú) aplican impuestos cedulares (y por esta razón, presentan problemas diferentes a los que normalmente se generan en las relaciones entre sistemas de imposición sobre la renta complesiva de las personas físicas y de imposi-ción de las sociedades) y muchos otros, como Argentina, Bolivia49, Bra-sil, Colombia y México50, realizan una integración a nivel de las socie-dades, de manera que no gravan los dividendos recibidos por los socios.

Los fenómenos de doble imposición económica se justifi can en vir-tud de la función que es propia de cada uno de dichos impuestos, ya que se grava la renta de las sociedades para asegurar la imposición inmediata y objetiva de aquellos benefi cios, que se someten otra vez a imposición, en forma de dividendos al momento de su distribución a los socios y que, en este momento, se gravarán con tipos diferenciados en función de la

49 Bolivia sólo realiza una doble imposición económica en el marco internacional, ya que el sistema tributario no grava las distribuciones de dividendos a los socios que sean residentes en el país. Este tipo de imposición representa un obstáculo en la búsqueda de capitales en el extranjero (que cómo tal estaría prohibido en la Unión Europea por aplicación de la sentencia del Tribunal Europeo de Justicia de 14 de diciembre de 2006, Causa C-170/05, Denkavit France) y, por esta razón, no debería existir en la legislación tributaria de un país importador de capitales.

50 Colombia aplica el mismo impuesto sobre la renta de las personas físicas y de las sociedades. Allí la renta gravada como benefi cios de las sociedades no queda sometida nuevamente a imposición al nivel de los socios. A pesar de que el impuesto grave la renta de las personas físicas con tipos progresivos y, de las sociedades con tipo proporcional, el tipo máximo (33%) del primer impuesto (aplicable a las rentas superiores a US$ 43.000) coincide con el del segundo impuesto, de manera que, en la mayoría de los casos, se produce una integración a nivel de la sociedad que evita la doble imposición en forma estructural para muchos socios.

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situación económica personal de dichos sujetos, para asegurar que los mismos contribuyan a la fi nanciación del gasto público, en ocasión de exteriorizar las manifestaciones de su propia aptitud económica y con arreglo a ella.

Como ya mencionáramos anteriormente, los sistemas tradicionales de imposición sobre la renta generan, en forma habitual, un fenómeno de doble imposición respecto a la misma renta, la que por primera vez queda gravada como benefi cio a nivel de la sociedad que la obtiene, y por segunda vez, se someten a imposición como dividendo para el socio que lo recibe. Al tratarse de dos impuestos separados, aplicados a dos suje-tos distintos (pero económicamente relacionados), la doctrina tributaria diferencia esta forma de duplicación impositiva, llamada con el término de doble imposición económica, de la otra que se encuentra normalmente sólo en el contexto internacional y que se defi ne como doble imposición jurídica, por el hecho de impactar al mismo sujeto, también en sentido legal.

Mientras los sistemas clásicos de imposición separan los dos nive-les de tributación, sin otorgar ninguna desgravación respecto a la doble imposición económica que los mismos determinan51, la mayoría de los sistemas tradicionales de imposición sobre la renta, integra ambos nive-les y desgrava la doble imposición económica, tanto a nivel de las socie-dades, como – lo que actualmente ocurre con mucha más frecuencia – de los socios. La desgravación de la doble imposición económica a nivel del socio se obtiene fundamentalmente de dos modos, o sea, mediante la exención y el crédito. Dichos métodos presentan características estruc-turales y tienden a cumplir objetivos diferentes. Al aplicarse el método de la exención, el sistema tributario no somete a imposición a los divi-dendos, de manera que, la imposición sobre los benefi cios societarios deviene fi nal también para los socios, sin diferenciar en razón de la dife-rente capacidad contributiva de éstos; por el contrario, el método del cré-dito para (o deducción de) los impuestos societarios, permite al sistema

51 No creemos que la existencia de una doble imposición económica sea un pro-blema en si mismo, ni que tampoco, deba ser tal la falta de eliminar dicho fenómeno, ya que el ordenamiento tributario puede establecer niveles globales equivalentes de carga fi scal sobre la renta , con independencia de que se desgrave la doble imposición económica.

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tributario someter a imposición los dividendos y al socio, teniendo éste el derecho de deducir del impuesto sobre la renta, un monto igual a la por-ción de impuesto pagado sobre las sociedades, el que se corresponde a los benefi cios de los cuales se han pagado los dividendos recibidos por el socio mismo. Este segundo método realiza una imposición diferenciada en función de la situación económica personal del socio y por esta razón, es este mecanismo el que mejor refl eja las fi nalidades de los sistemas tradicionales de imposición sobre la renta complesiva; sin embargo, el método del crédito conlleva difi cultades administrativas de gestión, así como problemas de neutralidad en el plano internacional.

Estimamos que la aplicación de un impuesto proporcional sobre las sociedades y progresivo sobre la renta de las personas físicas cons-tituye el fruto natural de la evolución de los sistemas tradicionales de imposición sobre la renta complesiva, pero no representa un elemento imprescindible de dichos sistemas, por lo menos en la medida en que, el sistema tributario asegure la no imposición del mínimo vital, es decir, la no aplicación del impuesto respecto a la renta que resulta necesaria para que cada persona pueda disponer de recursos fi nancieros sufi cientes para su sobrevivencia. Sin embargo, entendemos que muchos sistemas cons-titucionales (de los países latinos tanto de Europa, como de América) actualmente incluyen normas para asegurar que el sistema tributario se adecue al principio de progresividad de la imposición. En este sentido, creemos que los sistemas tradicionales de imposición a la renta comple-siva y su utilización con fi nalidades de redistribución, afectan el propio marco constitucional, de manera que, en muchos casos, una reforma de la imposición sobre la renta podría hasta implicar, la necesidad de ade-cuación del encuadre constitucional del sistema tributario. Una posible solución a dichos problemas puede quizás consistir en la aplicación de un impuesto sobre la renta complesiva en donde la progresividad no se ase-gure por medio de los tipos, sino en mejor medida, por la elevación del mínimo exento o, por la gravabilidad parcial de las rentas de los sujetos con una menor aptitud económica. Por supuesto, los sistemas de impo-sición sobre la renta complesiva deberían en todo caso, asegurar que los sujetos con capacidad contributiva no superior al mínimo vital, queda-sen totalmente excluidos de la imposición. Esta ponencia profundizará dichos aspectos en otra sección del trabajo, junto a los otros principios constitucionales de la imposición.

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Es ahora necesario destacar otro punto relativo a las característi-cas propias de los sistemas de imposición de la renta complesiva de las personas físicas. Se trata de la existencia de regímenes alternativos de imposición, así como de exenciones y exoneraciones.

En un primer momento de la evolución de dichos sistemas, el número de esos regímenes ha crecido en forma exponencial. Posible-mente ese fenómeno se debe a dos razones: por un lado, durante muchos años, los legisladores nacionales han considerado apropiado reducir la carga fi scal para fi nalidades extrafi scales o, para tomar en cuenta situa-ciones de reducida aptitud económica del contribuyente; por otro lado, los sistemas han ofrecido a los contribuyentes la posibilidad de optar por regímenes alternativos y más favorables. En ambos casos, esa evolución ha alejado los tipos nominales del impuesto de la presión fi scal efectiva, con consecuencias negativas para el sistema de imposición sobre la renta en su conjunto, tanto en lo vinculado a su gestión como en lo relativo a su rendimiento.

En estos mismos años, se ha remarcado también la creciente dife-renciación de las reglas aplicables a cada una de las categorías de renta, de manera que, la necesidad de simplifi car el sistema se afi rmaba pro-gresivamente como uno de los elementos indispensables para reformar el sistema.

Ahora bien, como ya lo hemos mencionado en otras secciones de esta ponencia, el objetivo de lograr que la imposición refl eje la capacidad contributiva específi ca de todo contribuyente, no puede ni debe justifi -car, la complejidad del sistema de imposición sobre la renta, pues ello produce consecuencias negativas tanto para el contribuyente (que debe soportar costes más elevados de declaración), como para las administra-ciones tributarias. El principio de capacidad contributiva garantiza la justa imposición en el sentido sustancial, no debiendo tratarse como un mero elemento ideal o teórico. A pesar de la importancia de gravar en menor medida (o de no gravar), las situaciones en que el sujeto se encuentra con una menor aptitud económica, ya sea por razones subjetivas u objetivas, creemos que la limitación de las desgravaciones, exenciones o exonera-ciones puede representar un instrumento para evitar el estancamiento del sistema tributario. En este sentido, la presencia de menos excepciones al criterio general de gravabilidad fortalece los principios y la interpre-tación de las reglas existentes. Además, un sistema complejo, que no se

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gestione bien, no recauda bien y por ende, muy difícilmente pueda lograr sus objetivos. En consecuencia, con independencia de que sistemas alternativos de imposición puedan resultar más adecuados en el contexto de globalización económica, opinamos que el futuro de los impuestos tradicionales sobre la renta se orientará, seguramente, en dirección de una fuerte simplifi cación estructural. Posiblemente, se trate de volver al pasado de la imposición sobre la renta y limitar, en lo posible, los regímenes especiales con fi nalidades parafi scales, así como también las exenciones o exoneraciones, ya que la exigencia de adecuar el cobro del impuesto a la efectiva aptitud económica de los contribuyentes, no debe transformar al principio de capacidad contributiva como instrumento de equidad vertical y horizontal, en instrumento de inseguridad jurídica e inefi ciencia del sistema tributario.

El planteo de los problemas relativos a los sistemas tradicionales de imposición sobre la renta no puede omitir considerar las cuestiones relativas a las retenciones en la fuente. Éstas se utilizan en casi todo ordenamiento tributario para asegurar un efi ciente cobro de los impues-tos sobre la renta, ya que, tales retenciones se aplican en cabeza de un sujeto distinto del contribuyente, o sea el agente retenedor, de forma que, se puedan lograr los objetivos de anticipar el pago del tributo, así como también los de facilitar el control, desincentivando la evasión52. En los sistemas tradicionales de imposición sobre la renta de las personas físi-cas, el mecanismo de las retenciones representa normalmente un pago a cuenta del impuesto adeudado a través de la aplicación de los tipos progresivos, frente a la capacidad contributiva global manifestada por el contribuyente durante el período completo. Sin embargo, ya desde los primeros años de existencia de dichos sistemas, las retenciones en la fuente se han aplicado para permitir el pago integral del tributo en ciertas situaciones particulares, como la de los sujetos no-residentes, sin que dichos sujetos quedasen obligados a la confección de las declaraciones del impuesto a la renta y, sin la aplicación de los tipos progresivos de tal imposición.

52 Sobre las cuestiones de sustitución y responsabilidad tributaria, véase amplius las XVII Jornadas Latinoamericanas de Derecho Tributario, celebradas en Cartagena (Colombia) en 1995.

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Durante muchas décadas, dos factores han reducido el interés para analizar, en el contexto de los países latinoamericanos, los problemas de desigualdad que, sin duda, surgen respecto a la aplicación de los impues-tos tradicionales sobre la renta de los no residentes. En primer lugar, el derecho tributario internacional considera que los no-residentes no se encuentren en la misma situación de los residentes en el país de la fuente, de manera que, un régimen diferente no generaría problemas por si mismo. En segundo lugar, y posiblemente por efecto de esa diferencia, los problemas de los no-residentes siempre han sido considerados muy marginales en los países latinoamericanos, de manera que se ha acep-tado, casi sin discusión, la aplicación de reglas impositivas distintas de las que corresponden a los residentes. En este sentido, no puedo dejar de considerar que, se trata de una paradoja para los sistemas tributarios latinoamericanos, si sólo recordamos que durante muchas décadas, los sistemas tributarios de Latinoamérica se han fundado en el principio de tributación en la fuente, y que por tal motivo, no se debería necesaria-mente diferenciar en función de la residencia del sujeto que posee la renta, sino gravar la misma en razón de la capacidad contributiva que dicha renta permite al sujeto de manifestar. En ese contexto y no sólo en Latinoamérica, las retenciones en la fuente han sido aplicadas y siguen aplicándose – a mi juicio en forma injustifi cada –, con tipos normal-mente superiores a aquéllos aplicables respecto a los sujetos residen-tes, en razón de los tipos progresivos de imposición sobre la renta. En las sucesivas secciones de este trabajo (y marcadamente al momento de referirnos a los problemasinternacionales de la imposición sobre la renta) nos ocuparemos de profundizar este aspecto, para llegar a posibles pro-puestas de reforma del sistema.

Sin embargo, es importante destacar que, ya en este momento, el uso de las retenciones en la fuente para fi nalidades de pago integral del impuesto sobre la renta (que podríamos defi nir como retenciones fi na-les e impuestos defi nitivos), se ha desarrollado considerablemente en los sistemas de imposición sobre la renta, hasta aplicarse en sustitución de las modalidades típicas de imposición progresiva, tanto en forma obliga-toria, cuanto opcional por parte del contribuyente. Esa evolución orienta los sistemas tradicionales de imposición sobre la renta en dirección de los sistemas cedulares, ya que, permite la exclusión de una o más cate-gorías de renta desde la base imponible complesiva, para someterlas a

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imposición separada, es decir cedular. En otras palabras, un histórico y arraigado instrumento para la aplicación de los impuestos tradicionales sobre la renta se ha transformado en un elemento de imposición alterna-tivo sobre la renta, como lo demuestran muchas ponencias nacionales. A mi juicio, se trata de una situación que evidentemente, destaca la crisis del impuesto complesivo sobre la renta y manifi esta la importancia de la imposición cedular en la realidad actual de la imposición sobre la renta: no podremos dejar de lado este fenómeno en el momento de formular nuestras refl exiones para una reforma del sistema en las posteriores sec-ciones de este trabajo.

3. La imposición sobre la renta antes los nuevos impuestos

Antes de analizar cómo y en qué medida los nuevos impuestos afectan la imposición sobre la renta, nos parece apropiado clarifi car que, en esta ponencia general, se entienden como nuevos impuestos, todas las formas que gravan la renta según modalidades diferentes de las que se aplican bajo el impuesto tradicional sobre la renta complesiva de las personas, así como los demás impuestos que gravan manifestaciones de capacidad contributivas inmediatas y sin embargo, distintas de la renta y del patrimonio.

Coherentemente con esa defi nición, se considerarán como nuevos impuestos tres categorías de tributos.

La primera categoría incluye a los impuestos de nueva formulación y a aquéllos que se aplican en los impuestos tradicionales, según sus nuevas modalidades, como por ejemplo, el impuesto lineal (fl at tax), el impuesto dual (dual income tax), el impuesto a las transacciones fi nan-cieras (Tobin tax) y el impuesto sobre las rentas excedentes (windfall profi t tax).

La segunda categoría está compuesta por los nuevos impuestos que han desarrollado una función autónoma respecto al mecanismo apli-cado por los tributos tradicionales, como el caso de las retenciones en la fuente, que han llegado a introducir impuestos sustitutivos sobre la renta. En esta categoría, pondremos también a los impuestos cedulares, cuya novedad consiste en el hecho de...volver al pasado y a las primeras fases de la imposición sobre la renta. Después de la segunda guerra mun-

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dial, estos impuestos parecían condenados a desaparecer, por efecto de la incapacidad de someter a imposición el resultado algebraico neto de la capacidad contributiva manifestada en el período fi scal, así como por la complejidad generada por la necesidad de tipifi car las distintas mani-festaciones en cédulas de renta53. Sin embargo, el nuevo contexto de la economía globalizada ha dado nueva vida a estos impuestos, los que sin duda, afectarán en el futuro la imposición de la renta en forma aun más signifi cativa.

Finalmente, la tercera categoría abarca todos los nuevos impuestos que no gravan la renta, sino formas parecidas de manifestación inmediata de capacidad contributiva distintas al patrimonio.

Este trabajo analizará en forma individual, tal como se incluyeran en la primera categoría enunciada, esas cuatro modalidades de nuevos impuestos, con arreglo a los ordenamientos tributarios latinoamericanos. En esta profundización, puntualizaremos las relevantes aplicaciones que, en otras partes del mundo dichos impustos han tenido y su correlativa determinación de efectos positivos en desarrollo en la economía, como por ejemplo, el caso de los países ex-soviéticos y ahora, nuevos miem-bros de la Unión Europea.

Antes de profundizar dichas categorías, es necesario formular algu-nas consideraciones generales que las yuxtaponen a los impuestos tradi-cionales sobre la renta.

Ante todo, los nuevos impuestos consideran que la simplicidad del sistema tributario resulta sinónimo, tanto de efi ciencia recaudatoria como de equidad impositiva. Como señala Shaw, la crisis de equidad manifestada por la incapacidad de los impuestos tradicionales de generar sus efectos de redistribución, prueba que la progresividad de la imposi-ción sea más un paradigma o un mito que una realidad54.

Además, los sistemas tributarios han fuertemente reducido la pro-gresividad de sus impuestos tradicionales sobre la renta complesiva de las personas, con rebajas en particular de los tipos más elevados55. En

53 En ese sentido, véase el informe de la misión Shoup a Venezuela, publicado en 1960 y analizado en la nota 25 por los ponentes nacionales venezolanos.

54 Véase en ese respecto, Shaw, cit., apdo. 2.5 de la comunicación técnica.55 OECD Tax Policy Studies N° 13: Fundamental Reform of Personal Income Tax,

31 de mayo de 2006.

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las economías desarrolladas, ese fenómeno se vio acompañado por un progresivo y generalizado crecimiento de los tipos del impuesto sobre el valor añadido, cuyos tipos ordinarios en Europa generalmente se encuen-tran ahora alrededor del 20%.

Finalmente, en la medida en que el legislador grave manifestaciones de capacidad contributiva y no someta a imposición conceptos y situa-ciones donde la misma no se encuentre presente, no resulta necesario que la imposición sea uniforme, ya que, dicho elemento no es requerido por el principio de igualdad contenido dentro del mismo impuesto, res-pecto a los propios rendimientos con distinta naturaleza56. Sin embargo, volveremos sobre este punto al momento de tratar los problemas de los impuestos duales, ya que la aplicación de diferentes tipos impositivos sobre la renta del trabajo y respecto a la renta del capital, se percibe como un importante elemento de injusticia sustancial.

3.1. La primera categoría: los nuevos impuestos en sentido estrictoLa teorización de esta primera categoría de nuevos impuestos repre-

senta el fruto de la reacción de los economistas de la hacienda pública, especialmente norteamericanos y europeos, en los años ‘70 y ‘80 frente a las imperfecciones que el sistema de imposición de la renta complesiva había paulatinamente manifestado, después de la segunda guerra mun-dial. En ese sentido, el crecimiento de la progresividad de la imposición sobre la renta de las personas físicas hasta niveles que hoy considera-remos confi scatorios, llevó la refl exión teórica de considerar que, más allá de la necesidad de reducir las desigualdades económicas entre los contribuyentes, era fundamental no desincentivar la creación de riqueza para mantener tasas de crecimiento económico sufi ciente para preservar el sistema del bienestar, así como para reducir las tendencias a evadir y eludir los impuestos.

Así, en los años ‘70, el objetivo de los principales estudios de hacienda pública era el de proponer reformas al impuesto sobre la renta complesiva de las personas físicas. En ese contexto, los economistas de

56 Cfr. Tribunal Constitucional de España STC 46/2000, de 17 de febrero, Funda-mento Jurídico 7°.

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las comisiones Lodin57, Bradford58 y Meade59 redactaron nuevas formu-laciones de las teorías de Fisher y Kaldor sobre el impuesto a los gastos (expenditure tax). A pesar de destacar los problemas de la imposición sobre la renta en forma muy clara, las formulaciones alternativas pro-puestas por dichas teorías, nunca han sido sistemáticamente recogidas en la legislación de algún país. Creemos que ello se motivó, ante la imposi-bilidad de realizar el acuerdo entre un número sufi ciente de países, lo que era necesario para poner en marcha un impacto tan radical de reforma tributaria, como el de abandonar completamente la imposición sobre la renta.

Por estas razones, este trabajo no profundizará las cuestiones rela-tivas al impuesto al gasto, sino pondrá el enfoque sobre los cuatro prin-cipales impuestos60 que fueran teorizados entre los años ‘70 y ‘80, y los que, asimismo, se pueden denominar como nuevos en el sentido estricto del término, es decir que han sido objeto de nueva teorización.

57 Lodin, S.-O., Progressive Expenditure Tax- An Alternative. A Report of the 1972 Government Commission on Taxation, Liber Förlag, Estocolmo, 1978.

58 U.S. Department of the Treasury, Blueprints for Basic Tax Reform, U.S. Govern-ment Printing Offi ce, Washington D.C., 1977. Sobre el informe Bradford véase también Bradford, D.F., The Case for a Personal Consumption Tax, en Pechman, J.A. (ed.), What Should Be Taxed: Income or Expenditure?, The Brookings Institution, Washington, D.C., 1980, págs. 75-113.

59 Institute for Fiscal Studies (IFS), The Structure and Reform of Direct Taxa-tion, Report of a Committee chaired by Professor J.E. Meade, George Allen & Unwin, Londres, 1978. El informe Meade afectó indirectamente también la evolución en Argen-tina, ya que se propuso complementar el impuesto sobre sociedades con un impuesto para gravar las rentas excedentes de las empresas, por lo que su denominación fue Impuesto al Excedente Primario de las Empresas (IEPE). Véase en ese respecto Schindel, A., Antí-guos y nuevos desafíos para la delimitación cualitativa y cuantitativa de la base gravable de las ganancias empresariales, en Obra en homenaje de Dr. Enrique J. Reig, denominada “Visión renovada de la imposición directa”, Consejo Profesional de Ciencias Económi-cas de la Ciudad Autónoma de Buenos Aires, Abril de 2001, págs. 157-181,apdo. IV.1.

60 Por el contrario, y a pesar de que habían sido incluídos en las directrices, no trataremos otros nuevos impuestos, como por ejemplo el bit tax, el que considera como manifestación de capacidad contributiva, la transmisión de datos por vía informática, ya que las ponencias y comunicaciones técnicas no han ofrecido elementos de interés para su aplicación en Latinoamérica. Un análisis de formas adicionales de nuevos tributos se encuentra en Schindel, A., cit., apdos. 4.2 y 4.3.

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Se trata del impuesto a las transacciones fi nancieras en divi-sas, conocido también como Tobin tax, el impuesto lineal (fl at tax), el impuesto dual (dual income tax), y el impuesto sobre las rentas exceden-tes (windfall profi t tax).

3.1.1. El Tobin tax

El impuesto sobre las transacciones fi nancieras fue teorizado por James Tobin en los años ‘7061 como fruto de la evolución de su pensa-miento respecto a las teorías de J. M. Keynes para estabilizar las cotiza-ciones de las divisas y evitar, de ese modo, las especulaciones fi nancie-ras. Las fi nalidades extrafi scales de este tributo son de fácil comprensión, ya que se aplica en ocasión de operaciones fi nancieras, que denotan la intención de lograr una ganancia por el efecto de los diferenciales de cambio en las divisas. Menos evidentes son las fi nalidades fi scales del mentado gravamen, sobre las que muchos han dudado62, así como más problemática es aún su aplicación, la que posiblemente, ha condicionado su difusión extensiva en el mundo durante las últimas décadas. En primer lugar, el concepto de especulación es de muy difícil determinación, así como el momento en que la misma se perfecciona. Además, no queda claro quién debe resultar efectivamente el sujeto pasivo, ni cómo se ten-dría que realizar el pago del impuesto. Finalmente, su efi caz recaudación supone la existencia de controles cambiarios, que han sido prácticamente abolidos en numerosos países del mundo a partir de los años ‘80 y ‘90.

Los ordenamientos tributarios de algunos países latinoamericanos establecen formas de imposición sobre las transacciones fi nancieras que son muy parecidas, pero no totalmente coincidentes, con el impuesto Tobin. En particular, se trata de Venezuela, Bolivia, Perú y Colombia.

Venezuela, que desde 2003 ha introducido un sistema de control cambiario, incorporó en 2007 un impuesto a las transacciones fi nancie-ras de las personas jurídicas y entidades económicas sin personalidad jurídica, el que se caracteriza como no deducible del propio impuesto

61 Tobin, J., The New Economics, one Decade Older. Princeton University Press, 1972, págs. 89-93

62 Véase amplius en ese respecto la ponencia nacional venezolana, apdo. I.3.

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sobre la renta. Por ende, en la medida en que esa interpretación se apli-que, ella generará efectos de interferencia con este impuesto63.

Bolivia, en un momento muy difícil de sus fi nanzas públicas, ha introducido el impuesto sobre transacciones fi nancieras con una vigencia originaria limitada en el tiempo pero luego prorrogada, no logrando sin embargo sus objetivos, en virtud de la existencia de numerosas exen-ciones y, por el hecho de intentar gravar específi camente los fondos de inversión.

Un fenómeno análogo ha ocurrido en Perú, que ha introducido con vigencia temporal limitada hasta 2010, el impuesto sobre las transac-ciones fi nancieras en moneda nacional o extranjera para los titulares de cuentas abiertas en las empresas del sistema fi nanciero.

Finalmente, el gravamen colombiano sobre los movimientos fi nan-cieros representa un tributo parecido al impuesto Tobin, por el hecho de aplicarse (desde su introducción en 1998), sobre movimientos fi nancie-ros, incluidos los que se realizan en divisas.

A pesar de que sus objetivos resulten, en principio, signifi cati-vos y totalmente compartidos, creemos que la implementación de este impuesto determinaría diversos problemas en la actual estructura de los sistemas tributarios, así como en términos de competitividad para los operadores económicos en el contexto actual de globalización.

3.1.2. El impuesto lineal

El impuesto lineal, mejor conocido como fl at tax, fue teorizado por Hall y Rabushka en mediados de los años ‘8064, para permitir una simpli-fi cación radical del sistema de imposición sobre la renta; sin embargo, ha conocido su difusión especialmente a partir de su adopción en los países ex-soviéticos (a partir de 1994 en Estonia y Lituania)65, posiblemente

63 Además, los ponentes nacionales venezolanos señalan que la introducción de tal norma se ha efectuado por medio de un decreto del Ejecutivo Nacional.

64 Hall, R., Rabushka, A., The fl at tax. Hoover Institution Press. Stanford Univer-sity, 1985, págs .2-19.

65 Sucesivamente, han conformado su sistema tributario al impuesto lineal Letonia en 1997, Rusia en 2001, Ucrania y Eslováquia en 2004, así como Geórgia y Romania en 2005.

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por efecto del incremento neto en los ingresos tributarios como conse-cuencia de su incorporación al sistema.

A pesar que existen muchas variantes de impuesto lineal, podemos considerar que su expresión más típica está representada, por aquel sis-tema que aplica el mismo tipo a toda renta, sin otorgar la exención del mínimo vital. Sin embargo, en la mayoría de los ocho países europeos que lo han adoptado (por ejemplo, Estonia y Lituania), se ha aplicado una imposición lineal sólo a las rentas superiores al mínimo exento, de manera que, el impuesto lineal puede aplicarse de hecho en un sistema de progresividad por deducción con tipo único. Finalmente, una tercera versión del impuesto lineal consiste en la aplicación del tipo a cualquier renta, reembolsando a todos los contribuyentes una porción del impuesto que corresponda a las rentas más bajas.

Por el contrario, no son verdaderos impuestos lineales, sino más bien impuestos cedulares, aquellos tributos que gravan proporcional-mente una o más categorías de rentas en lugar del impuesto sobre la renta complesiva, como ocurre en muchos otros países de Europa (por ejemplo Alemania, desde 1° de enero de 2009, e Italia) y de Latinoamérica. Ana-lizaremos dichos sistemas en otra sección de este trabajo.

La introducción de los impuestos lineales en Europa oriental se debe, probablemente, a la necesidad de resolver los problemas comunes de las llamadas economías en transición de los sistemas soviéticos, cuyos ordenamientos jurídicos no habían desarrollado una verdadera tradición en la aplicación de tributos, presentando altos niveles de evasión fi scal y corrupción en el sistema de recaudación, así como bajos niveles de efi ciencia entre las autoridades fi nancieras66.

Los efectos de simplifi cación tributaria producidos por los impues-tos lineales parecen muy interesantes, especialmente en la aplicación de este impuesto llevada a cabo por Estonia. Después de la introducción del impuesto lineal en 1994, Estonia ha modifi cado su sistema para aplicar el impuesto lineal con el mismo tipo (21% para 2008 y un punto menos cada año hasta alcanzar 18% en 2011) a cada renta de las personas físicas, haciendo que los benefi cios de las sociedades tributen sólo al momento

66 Cfr. en este sentido Keen, M., Kim, Y., Varsano, R., The „Flat Tax(es)“: Princi-ples and Evidence, en International Monetary Fund, Working Paper, 2006, WP/06/218, pág. 14.

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de su distribución a los socios67. A pesar de que algunos economistas hayan dudado sobre la posibilidad de reconocer en la introducción del impuesto lineal la principal causa del mentado desarrollo económico68, la combinación de este impuesto con la gravabilidad de los benefi cios no distribuidos en Estonia, ha representado un elemento de indudable éxito, lo que ha permitido a este país, aumentar su PIB en un 50 % en algo más de cinco años. Dichas circunstancias indujeron a Moldavia a aplicar este sistema desde 1° enero de 200869.

Opinamos que la experiencia del impuesto lineal y, en particular, en el caso de Estonia, resultaría muy interesante para América Latina, ya que se funda en un sistema tributario muy simplifi cado, que no genera particulares problemas de gestión, y permite la exención del mínimo vital, así como también la posibilidad de las deducciones personales familiares, aplicándose un único tipo tanto a las sociedades, como a las personas físicas y fomentando el desarrollo económico a través de la imposición de los benefi cios societarios, sólo en ocasión de su distribu-ción a los socios. Además, por el hecho de aplicar el impuesto sobre los benefi cios societarios sólo al momento de su distribución, genera una integración total y sencilla con el impuesto sobre las personas físicas, de manera que, no implica ninguna obligación de aplicar impuesto adicio-nal alguno. Finalmente, permite a la imposición sobre la renta, una forma de progresividad por efecto de la no imposición del mínimo exento y, acerca su base imponible a la capacidad contributiva efectiva a través de las deducciones familiares y de los montos pagados a los fondos públicos y privados de pensión.

En el panorama latinoamericano, se encuentran formas parciales y aparentes de imposición lineal (que en sustancia, son formas de imposi-ción dual y en consecuencia, quedarán analizadas en la próxima sección de este trabajo), pero hasta hoy, todavía nada parecido a lo que existe en Europa70, posiblemente con motivo de la escasa comprensión y convenci-

67 Cfr. amplius en Lehis, L., et aa., cit.68 Cfr. Keen, M. et aa., cit., pág. 37.69 Канду, A., Чебан, C., Экономическое обозрение. 19.10.2007, No 38, pág. 18.70 Sin embargo la aplicación de un impuesto lineal en Argentina fue propuesta con

algunas correcciones por Avila, J.C., Propuesta de federalismo fi scal, Consejo Empresa-rio Argentino, Buenos Aires, 2000.

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miento del potencial fomento al desarrollo económico que este impuesto puede producir y, de las cuestiones de compatibilidad con el principio de progresividad de la imposición, hallado en muchas Constituciones nacio-nales. Esta ponencia se propone estimular el debate sobre el impuesto lineal71, especialmente teniendo en cuenta las cuestiones confl ictivas de compatibilización con los principios de equidad de la imposición que la aplicación de impuestos duales genera en algunos países latinoamerica-nos, como el caso de Uruguay. Para analizar dichos problemas en forma más sistemática, resulta necesario profundizar las cuestiones relativas a los impuestos duales.

3.1.3. El impuesto dual

La teorización del impuesto dual se debe a los europeos, y en parti-cular a la investigación del danés Nielsen, presentada en 1980 para refor-mar el sistema de imposición sobre la renta complesiva. A pesar de que el impuesto dual represente la respuesta dinamarquesa a las propuestas de reformas formuladas en los años ‘70 y de que fue Dinamarca el primer país en aplicar este tipo de gravamen, éste sólo se aplicó en Dinamarca entre 1987 y 1994, ya que generó confl ictos sociales y, por esta razón, fue eliminado. Sin embargo, el efecto dominó causado en forma muy rápida por la adopción del mismo (entre 1990 y 1993), por parte de otros países escandinavos – como Suecia, Noruega y Finlandia –, nos ha llevado a considerar al impuesto dual como un impuesto nórdico. Esta caracteri-zación resulta, a nuestro juicio, muy importante para entender correcta-mente las herramientas de dicho impuesto, el que ahora se aplica tanto en otros países europeos, tal los casos de España y Holanda72, como en algunos latinoamericanos, tales como Uruguay y (desde 2009) Perú73.

El elemento característico de los sistemas de imposición dual sobre la renta consiste en la “cedulación” o “cedularización” de la base impo-nible a los fi nes de la aplicación de dos tipos distintos, sea que se trate de

71 Entendemos que resulta a favor de este tipo de imposición Shaw, J.L., cit., apdo. 4.1.

72 Este impuesto se ha aplicado en parte también en Italia entre 1987 y 1994.73 Sin embargo, el ponente nacional boliviano opina que el impuesto RC-IVA

genera, de hecho en ese país, un sistema dual a tipo único con diferenciación en la base imponible.

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las rentas de trabajo y del capital, respectivamente. En ese contexto, la teoría del impuesto dual ha justifi cado la aplicación de un tipo más ele-vado para las rentas del trabajo respecto al que se aplica sobre las renta del capital, permitiendo a este sistema captar a este factor, el que por su propia naturaleza, está dotado de mayor movilidad y puede fácilmente circular entre los distintos países. Creemos que esa pragmática justifi ca-ción resulta insufi ciente desde una perspectiva de la equidad impositiva y por esta razón, inapropiada para permitir la aplicación de ese impuesto en los países latinos tanto de Europa, como de América, pues allí existen consolidados principios constitucionales que erigen la equidad imposi-tiva como uno de los fundamentos del sistema tributario. Compartimos, en consecuencia, las críticas que los ponentes nacionales y comunicantes técnicos uruguayos han formulado a la aplicación del impuesto dual en sus respectivos trabajos: no es justo gravar más a los sujetos que trabajan y menos a los que reciben rentas de la inversión del capital, ni tampoco es apropiado desincentivar el trabajo de quienes tengan capitales, ya que de esa manera, se afectaría negativamente el producto interno bruto de un país y se incrementaría el número de los sujetos sin ocupación.

Sin embargo, hay un elemento más que esta ponencia general debe destacar respecto a los impuestos duales, y que quizás se ha perdido (o por lo menos, no se ha considerado en forma apropiada) en el momento de trasladar su estructura, desde el contexto de los países nórdicos a los ordenamientos tributarios que lo han recogido. No se trata pues, de consideraciones relativas a la simplifi cación del sistema tributario que ese impuesto conlleva, ya que creemos que resulta posible alcanzar los mismos resultados por otros caminos, como por ejemplo, a través del impuesto lineal y de los impuestos cedulares, que aun comparten muchos aspectos estructurales con el propio impuesto dual. Se trata, sin embargo, a diferencia de lo que ocurre en casi todas las otras partes del mundo, del hecho que los sistemas nórdicos fi nancian casi completamente la segu-ridad social a través de los impuestos74. En este sentido, los impuestos sobre la renta del trabajo incorporan como componente al momento de

74 Se trata de una decisión probablemente relacionada a la necesidad de fi nanciar los costes muy elevados de aquellos sistemas de seguridad social, donde las personas tie-nen derecho a recibir prestaciones de calidad muy avanzada, como normalmente ocurre en los sistemas del bienestar.

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su pago, también una porción de la contribución que resulta necesaria para fi nanciar la seguridad social, mientras que, lo mismo no necesa-riamente ocurre respecto a los impuestos sobre la renta del capital. A la luz de las consideraciones antes mencionadas, creemos que la evidente vulneración de la equidad impositiva causada por la menor imposición de la renta del capital respecto a la que procede del trabajo, podría así encontrar una justifi cación más adecuada, por lo menos, en los sistemas en los que se ha desarrollado la imposición dual.

Además, es posible considerar un segundo elemento importante para estimular la refl exión en materia de impuestos duales y para llegar, así, a entender las posibles herramientas de la aplicación de un tipo infe-rior para las rentas del capital respecto de las del trabajo. En particular, para ciertas rentas del capital, como los dividendos y las ganancias del capital, el impuesto pagado en el momento en que el inversor recibe la renta, representa una forma adicional de imposición respecto al tributo que ya se ha aplicado en cabeza a la sociedad generadora del benefi cio. En este sentido, no sería justo considerar la carga impositiva sólo al nivel del socio sin tomar en cuenta los impuestos que ya han alcanzado al sujeto que en realidad ha producido dicha renta. Por esta razón, creemos que ambos factores citados deben ser tomados en cuenta al momento de evaluar si el sistema dual de imposición sobre la renta, origina una vul-neración a los principios de equidad en la imposición.

Ahora bien, no cabe duda de que el primer elemento no se encuen-tra en ningún otro sistema fuera del contexto nórdico. Por ende, ninguna vulneración de los principios constitucionales de la imposición se pro-duce cuando la menor imposición de la renta del capital al nivel de las personas físicas se combina con la aplicación de otro impuesto, como en el caso de la imposición que grava los benefi cios de la empresa que distribuye como dividendo (o por efecto de la prohibición de deducir los pagos de intereses en virtud a las normas de subcapitalización).

En las precedentes secciones de esta ponencia general, ya hemos aclarado que – en la visión moderna, que compartimos – los principios constitucionales de igualdad y capacidad contributiva no implican la uni-formidad tributaria, es decir, no requieren la necesidad de gravar toda la renta con el mismo impuesto o el mismo tipo, ni que tampoco la base imponible se determine por efecto de reglas unitarias aplicables a toda la renta.

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Además, hemos puesto de manifi esto que la tradicional progresivi-dad de la imposición complesiva sobre la renta personal, de hecho, no logra el efecto de redistribución de riqueza, en tanto que dicho impuesto represente una función marginal en el marco del sistema tributario de un país (como ocurre en la realidad actual en la mayoría de los países) y no existan niveles elevados de efi ciencia en la recaudación. En este sentido, la progresividad de la imposición representa un valor constitucional, cuyas herramientas devienen paulatinamente menos sólidas y cuya con-tinuidad podría ser objeto de reforma en el futuro inmediato.

En otras palabras, ni es necesario un sistema uniforme de impo-sición sobre la renta, ni tampoco lo es una imposición con carácter de progresividad.

Sin embargo, queremos destacar que la posibilidad para el legisla-dor de aplicar distintos impuestos, distintas bases imponibles o distintos tipos impositivos sobre la misma manifestación de capacidad contri-butiva, debe fundarse en factores sustanciales y razonables de riqueza, así como también en objetivos de política fi scal orientados a permitir sufi ciencia de recursos para la fi nanciación del gasto público y, posible-mente, para asegurar el desarrollo económico.

Al respecto, reconocemos que un elemento importante de evalua-ción para las refl exiones en el marco de estas Jornadas del ILADT, está constituido por la posibilidad de considerar a las distintas rentas como una homogénea categoría imponible, desde una perspectiva sustancial. En otras palabras, si resulta claro que renta y patrimonio son dos distintas manifestaciones de capacidad contributiva, menor claridad se advierte respecto a la posibilidad de sostener lo mismo respecto a la renta que procede del trabajo y del capital, lo que representa un elemento basilar para llegar a conclusiones compartidas respecto a los sistemas de impo-sición dual.

A pesar de las controversias que este aspecto ha generado, y posi-blemente lo continúe haciendo en los próximos años en las distintas partes del mundo, creemos que dos elementos puedan ser importantes para que la ponencia general adopte una posición respecto a este punto.

En primer lugar, hasta cuando apuntamos a gravar las rentas del tra-bajo y del capital, reconocemos que el objeto de la imposición consiste en dos formas diferenciadas de renta, y como tales, dos manifestaciones del mismo indicador de capacidad contributiva.

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En segundo lugar, durante muchos años se han admitido, en los sistemas de imposición sobre la renta complesiva, deducciones predeter-minadas respecto a las rentas del trabajo, mientras que por el contrario, las rentas del capital en algunos países – como por ejemplo en Italia, y en Uruguay entre 1961 y 197475 – gravaban la renta bruta, es decir, sin posibilidad alguna de deducción de los gastos relativos a la producción de dicha renta. Ello se justifi caba, entre los economistas de la hacienda pública, en la necesidad de discriminar en favor las ‘rentas sudadas’.

Esos dos elementos indican la relevancia sustancial primaria de la renta como indicador inmediato de riqueza y capacidad contributiva, así como la necesidad de que sus especifi caciones secundarias, o sea las fuentes de la misma, puedan justifi car la aplicación de correcciones impositivas para gravar, en forma más onerosa, una u otra categoría de renta. En otras palabras, con independencia de que se apliquen uno o más impuestos para gravar la renta o algunas categorías de renta, creemos que como fenómeno económico, la relevancia sustancial de la renta posee un único y singular contenido, por lo que, sus manifestaciones específi cas deben quedar sometidas a la imposición en forma tal que, no existan distorsiones económicas signifi cativas76. Como ya lo hemos mencio-nado antes, estas argumentaciones no suponen que la intención de esta ponencia general consista en proponer la necesidad de una imposición homogénea y uniforme sobre la renta, sino más bien, la necesidad de excluir la razonabilidad de gravar la renta del trabajo en forma más one-rosa que la renta del capital. Entendemos, por supuesto, que la exigencia de permitir que el nuevo contexto de la economía globalizada, donde

75 Cfr. en ese respecto Shaw, J.L., cit., apdo. 3.1 de la comunicación técnica.76 Esta conclusión no parece compartida por la nueva estructura del sistema tri-

butario español a la luz de la reforma operada por la Ley 35/2006, de 28 de noviembre. Véase en ese respecto la comunicación técnica de Tovillas Morán, J.M., Medidas des-gravatorias y teorías sobre la renta en el IRPF, apdo. 4. Sin embargo, entendemos que, desde la perspectiva del concepto de renta, vigente en el nuevo sistema tributario español, se produjo un alejamiento del concepto tradicional de renta que se podía recoger de la estructura misma del impuesto sintético sobre la renta. En ese sentido, Pita Grandal, A.M., Una aportación a la caracterización del impuesto español sobre las rentas de las personas físicas, indica que “la característica de impuesto sintético que inicialmente se atribuye al IRPF se ve totalmente desvirtuada en la actualidad debido a un progresivo acercamiento a la naturaleza de impuesto analítico”.

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casi no se encuentran controles sobre los movimientos internacionales de capitales, requiera una estructura del sistema tributario, en función de la necesidad de evitar la migración de capitales o aun, de captar los mismos en el mercado internacional. Sin embargo, creemos que la conveniencia económica de reducir la imposición sobre los capitales no puede llegar hasta el punto de pretender gravar más los factores menos móviles de la producción, como lo es el trabajo. En otras palabras, los sistemas duales pueden aplicar distintas reglas para gravar la remuneración del trabajo y del capital, pueden determinar las respectivas bases imponibles en forma distinta y aun aplicar tipos diferentes, ya que el principio de igualdad no implica necesariamente la uniformidad de la imposición, ni tampoco respecto a distintas manifestaciones del mismo indicador de capacidad contributiva. Sin embargo, esa diferenciación debe, a nuestro juicio, res-paldarse en valores sustanciales y no llegar al punto de suponer y fi jar una imposición sensiblemente más onerosa sobre la renta del trabajo res-pecto a la que se aplica sobre la renta del capital, ya que eso vulneraría el sentido común y tradicional de la equidad, así como generaría conse-cuencias no deseables en el mediano plazo, respecto a la posibilidad de desestimular el trabajo y el producto interno bruto de un país.

En estas palabras se sustancia nuestra evaluación crítica a los sis-temas de imposición dual que se están difundiendo tanto en los países latinos de Europa, tal el caso de España, como en los países latinos de América, tal el caso de Uruguay.

Para permitir sustentar con argumentos técnicos esta visión crítica, es ahora necesario ocuparnos brevemente de esa materia en forma sepa-rada de los dos ordenamientos tributarios mencionados.

En ocasión de la introducción del sistema de imposición dual, el sistema español ha eliminado muchos benefi cios fi scales que habían erosionado la base imponible en el precedente sistema de imposición sobre la renta complesiva (o sintético), lo que sin duda, ha permitido a la imposición gravar bases imponibles determinadas en forma transpa-rente y con arreglo al principio de la generalidad77. Asimismo, a pesar de que la introducción del impuesto dual en el sistema tributario español ha evolucionado desde el impuesto sintético de tipo tradicional hacia

77 Cfr. Pagès i Galtés, J., El principio de la generalidad y los benefi cios fi scales en la imposición sobre la renta.

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una imposición de tipo analítico, concordamos con Tovillas78 en la exis-tencia de medidas para aportar correcciones en la base imponible. Tales medidas, en efecto, atenúan la imposición más onerosa de las rentas del trabajo y por tal, ellas no deben considerarse como benefi cios fi scales, sino más bien como partes inmanentes del nuevo sistema que grava en forma separada dichas rentas respecto a las del capital (que todavía no se aplican a todas las modalidades de capital)79. Esas consideraciones son, a nuestro criterio, sufi cientes para demostrar que los posibles problemas de vulneración de los impuestos duales, no proceden necesariamente de la estructura de ese gravamen, sino de la manera en que el legislador ha implementado el mismo en el sistema tributario. Sin embargo, y a pesar de que sea legítimo, en nuestra opinión, pasar de un sistema de imposi-ción sobre la renta complesivo a formas cedulares de imposición para las diferentes categorías de renta, no creemos que la necesidad de tener un sistema competitivo en el plano internacional respecto a la imposición de los capitales, pueda representar en si mismo una posible justifi cación para aplicar ese tipo de imposición. Especialmente, en lo que se refi ere a los Estados miembros de la Unión Europea, creemos que la captación de los fl ujos de inversión internacionales, en particular frente a mecanis-mos de eliminación de la doble imposición internacional fundados en el método de la exención, puede llevar a formas de competición fi scal que distorsionan la inversión de los capitales mismos, a pesar de no confi gu-rarse verdaderas situaciones de competición fi scal dañina.

La introducción del impuesto dual “a la uruguaya” – como lo han denominado sus ideólogos, o sea Barreix y Roca80 – parece presentar problemas más graves de los que se encuentran en el ejemplo español, ya que el impuesto sobre la renta del trabajo grava la renta bruta y, el efecto de simplifi cación parece resultar aun más fuerte que el caso español, de manera que la remuneración del trabajo simplemente tributa mucho más de lo que tributa el rendimiento de los capitales. Sin embargo, entende-mos que por efecto del impuesto a las rentas de las actividades econó-micas, con un tipo del 25% (aun sobre renta neta), más 7% en caso de

78 Véase Tovillas Morán, J.M., cit., apdos. 2 y 3.79 Al respecto, cfr. Pita Grandal, A.M., Una aportación a la caracterización del

impuesto español sobre las rentas de las personas físicas, cit.80 Cfr. Barreix, A., Roca, J., cit.

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distribución de dividendos, la menor imposición sobre la renta del capital respecto a la del trabajo, se reduce en el caso de los dividendos y de las ganancias de capitales.

Más allá del hecho de gravar en forma más onerosa la remuneración del trabajo respecto al rendimiento del capital, que a nuestro criterio, representa un elemento crítico de los impuestos duales, creemos que este impuesto logra objetivos importantes de simplifi cación, que son comu-nes también a los del impuesto lineal (que por el contrario, no presenta el elemento crítico antes mencionado) y en general, a los impuestos cedula-res. Por efecto de esa proximidad estructural, continuaremos el presenta análisis en el momento de abordar la tendencia general a la “cedulación” o “cedularización” de la imposición sobre la renta, tratando allí cuestio-nes relativas a tal modalidad de imposición.

Este artigo continua no próximo número

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Miguel Silva Pinto

A luta contra a fraude ao IVA na União Europeia, desenvolvimentos

Miguel Silva Pinto

Conselheiro Fiscal da Representação Permanente de Portugal junto da UELicenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

Pós-Graduado em Estudos EuropeusDocente e Formador de Direito Fiscal

Autor de livros e artigos sobre temas fi scais

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RESUMO

O texto faz o ponto da situação das medidas de combate à fraude ao IVA adoptadas na União Europeia e refere possíveis tendências nesse campo.

Palavras-chave:IVAFraudeUnião Europeia

ABSTRACT

The text takes stock of the anti-VAT fraud measures adopted in the European Union and indicates possible trends in this area.

Keywords:VATFraudEuropean Union

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1. Enquadramento 2. Breve descrição da fraude carrossel 3. Lançamento da estratégia de luta contra a fraude fi scal na UE 4. Acções a empreender pela Comissão Europeia no domínio do combate à fraude 5. Elementos-chave para o estabelecimento de uma estra-tégia anti-fraude na Comunidade 6. Fixação de metas para a apresentação de propostas 7. Medidas de longo alcance 8. A posição de Portugal sobre as medidas de longo alcance 9. Reacções do sector empresarial em matéria de luta contra a fraude fi scal na UE 10. As propostas da Comissão de Março de 2008 11. A criação da rede EUROFISC 12. Estra-tégia coordenada para melhorar o combate à fraude na UE 13. Fraude ligada à isenção de IVA na importação e aperfeiçoamento da responsabilidade solidária 14. Facturação 15. Revisão da assistência mútua na cobrança 16. Conclusão

1. Enquadramento

A fraude fi scal na União Europeia (de aqui em diante designada pelas iniciais UE) atinge uma dimensão alarmante, podendo situar-se actualmente no intervalo compreendido entre 2 a 2,5% do PIB comu-nitário1. Neste âmbito é signifi cativa a fraude ao IVA, responsável por perdas de receita fi scal estimadas em 60 mil milhões de euros, dos quais 40% correspondem a fraudes do tipo carrossel ou na aquisição, segundo dados avançados pela Europol em Dezembro de 20062.

Em Março de 2008 a Comissão Europeia adoptou a primeira pro-posta legislativa em matéria de medidas de combate à fraude ao IVA, inserida na sua estratégia anti-fraude lançada em 2006. Esta proposta traduziu-se na modifi cação da Directiva nº 2006/112/CE3 do Conselho, de 28 de Novembro de 2006 e, em simultâneo, na introdução de altera-ções ao Regulamento CE nº 1798/2003, de 7 de Outubro de 2003, sobre

1 As perdas de receita resultantes da fraude fi scal atingem entre 200 a 250 mil milhões de euros na UE, segundo o Comissário Europeu para a Fiscalidade, Lászlo Kovács, como resulta do seu discurso “EC’s new initiatives in the fi eld of the fi ght against tax fraud”.

2 Europol press release, Experts discuss Missing Trader Inter-Community Fraud (Dec. 13, 2006)

3 Esta Directiva revogou a Sexta Directiva IVA (77/388/CEE, de 17 de Maio de 1977), correspondendo ao actual quadro legal comunitário regulador do IVA.

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cooperação administrativa. Após vários meses de negociações no Conse-lho, a proposta foi aprovada antes do fi nal de 2008.

Entre os meses de Dezembro de 2008 e Fevereiro de 2009 foram apresentadas novas propostas pela Comissão que já se encontram em debate no Conselho, actualmente sob Presidência da República Checa. Esta encara a aprovação do pacote de propostas anti-fraude como a sua principal prioridade no campo da fi scalidade.

A apresentação destas propostas visa dar resposta à vontade expressa pelos Estados-membros da UE que optaram, no curto e médio prazo, por melhorar o quadro legal do IVA no sentido de o tornar menos permeável à fraude, em grande parte resultante da introdução do regime transitório do imposto em 1993.

O presente texto vai descrever o processo decisório4 que, no con-texto da estratégia anti-fraude ao IVA comunitário, deu preferência às medidas de tipo convencional em detrimento da adopção de medidas mais radicais, de transformação do actual modelo do imposto. Serão tam-bém salientadas as posições que, a esse respeito, foram tomadas pelos representantes do sector empresarial europeu e pela administração fi scal portuguesa. Finalmente, serão descritas as propostas já apresentadas e feita uma antevisão daquelas que se lhes poderão seguir.

2. Breve descrição da fraude carrossel

A fraude carrossel típica é ilustrada pelo esquema seguinte.A fraude carrossel implica, como se pode constatar, um circuito de

operações intracomunitárias, estabelecido entre várias empresas, sujei-tos passivos de IVA registados em diferentes países comunitários (EM 1 e EM 2). A empresa A efectua uma transacção intracomunitária para a empresa B, estabelecida no EM 2. Esta transacção é isenta de IVA, podendo A (designada por conduit company) deduzir o imposto que eventualmente tenha pago a fornecedores.

4 Representado, principalmente, pelas iniciativas da Comissão, vertidas em suces-sivas Comunicações ao Conselho e pelas orientações políticas dirigidas por este último à Comissão, traduzidas em conclusões do Conselho ECOFIN, no sentido de nortear a produção pela primeira de propostas legislativas.

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Empresa AEmpresa A““ConduitConduit companycompany””EM 1

Empresa CEmpresa C““BufferBuffer””

Empresa DEmpresa D““BrokerBroker””

EM 2

Empresa BEmpresa B

““MissingMissing tradertrader””

Por sua vez, a empresa B (a chamada missing trader) vai efectuar uma aquisição intracomunitária no EM 2, autoliquidando o imposto e procedendo em simultâneo à respectiva dedução5. Desde que o sujeito passivo possa deduzir integralmente o IVA, não resultará desta operação qualquer imposto a favor do Estado.

A empresa B vai, de seguida, efectuar uma transacção (domés-tica) para C (Buffer), liquidando imposto. Porém, não entrega o mesmo ao Estado, deixando de cumprir as suas obrigações fi scais. Em regra, o preço por que B comprou a mercadoria é superior ao preço pelo qual a revende, o que constitui um forte indício de que não existem intuitos comerciais reais subjacentes à operação.

C pagou o imposto a B, podendo proceder à sua dedução. De seguida revende a mercadoria a D (Broker), liquidando igualmente IVA. D procede, por sua vez, à revenda da mesma a A, estabelecido no EM 1,

5 A autoliquidação do IVA pelo sujeito passivo adquirente dos bens e serviços é conhecida na terminologia próprio do imposto pelo termo anglófono reverse charge. Sobre este sistema ver o artigo de João José Amaral Tomaz “ O mecanismo de autoliqui-dação do IVA (reverse charge) e o combate à fraude ao IVA”.

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onde se iniciou todo o circuito. D, dado efectuar uma transacção intraco-munitária, pode igualmente deduzir o imposto que pagou a C.

O produto da fraude é o imposto que B cobrou a C mas que nunca foi entregue nos cofres públicos. Porém, esse mesmo imposto foi fac-turado, gerando, assim, imposto a recuperar, primeiro por parte de C (correspondente à diferença entre o imposto pago a B e o imposto liqui-dado a D) e, no fi nal do circuito, por parte de D (correspondente a todo o imposto pago a C). Ou seja, o Estado vê-se obrigado a restituir um imposto que nunca arrecadou. Os intervenientes A, C e D são sujeitos passivos aparentemente idóneos, que cumprem as obrigações fi scais. Estes circuitos poderão repetir-se várias vezes, sendo sempre a mesma mercadoria a circular entre os EM 1 e 2, daí a designação deste tipo de fraude como “fraude carrossel”.

São propostas duas soluções6 para combater este tipo de fraude, que implicam alterações ao funcionamento do IVA nas operações intracomunitárias.

Uma solução é baseada na substituição do actual modelo plurifásico do IVA, assente em pagamentos fraccionados, por um imposto monofá-sico na fase retalhista, em que passaria a ser aplicado, de modo generali-zado, um sistema de autoliquidação do imposto ou reverse charge. Isso evitaria que B cobrasse imposto a C, sem o correspondente pagamento do IVA ao Estado, já que nas transacções entre B, C e D, seria ao adqui-rente (e não ao transmitente) que competiria fazer a autoliquidação do imposto.

Outra solução assenta na supressão da isenção nas transacções intracomunitárias, o que determinaria a liquidação de IVA pelas ven-das intracomunitárias (de A em relação a B e de D em relação a A). As mercadorias deixariam, consequentemente, de circular entre os Estados membros sem imposto. O “elo mais fraco” do sistema actual, represen-tado pela aquisição intracomunitária feita por B, deixaria de existir.

6 Ver nºs 7 e 8 deste texto.

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3. Comunicação da Comissão Europeia de 2006: Lançamento da estratégia de luta contra a fraude fi scal na UE

Na sua Comunicação de 31 de Maio de 20067, a Comissão dirigiu ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Conselho Económico e Social um repto quanto à necessidade de ser adoptada uma estratégia coorde-nada a nível europeu por forma a ser reforçada e melhorada a luta contra a fraude fi scal na UE. A Comissão identifi cava como mais relevantes, nesse contexto, as fraudes ao IVA, aos impostos especiais de consumo e aos impostos directos, apontando várias vias susceptíveis de serem exploradas no futuro por forma a serem encontrados mecanismos ou ins-trumentos anti-fraude mais efi cazes, como o maior recurso à cooperação administrativa e à assistência na cobrança.

Mais especifi camente, no que diz respeito à fraude ao IVA, a Comissão indicava a necessidade de se ir mais longe na partilha de res-ponsabilidades entre os Estados-membros quanto à protecção da receita, na melhoria da troca de informações e no reforço das obrigações declara-tivas. Quanto ao interesse demonstrado por alguns países8 numa aplica-ção alargada de um mecanismo de autoliquidação, a Comissão, embora admitindo a efi cácia do mesmo quando aplicado a certos domínios ou sectores bem delimitados, demonstrava alguma preocupação quanto à possibilidade de serem criados novos factores de risco de fraude e novas obrigações fi scais, susceptíveis de comprometer a política de simpli-fi cação das normas comunitárias e o bom funcionamento do mercado interno.

Simultaneamente, a Comissão considerava que, no âmbito da dis-cussão sobre eventuais alterações ao sistema comum de IVA, se deveria equacionar também a hipótese de tributação das transacções intracomu-nitárias, bem como o nível da mesma. Isto é, ponderar-se a aplicação de uma taxa única de IVA a nível da UE ou, em alternativa, a aplicação da taxa de IVA em vigor no país de consumo.

Todavia, a Comissão revelava, na Comunicação em causa, a sua preferência por uma solução apontada para a modernização e melho-ramento dos sistemas de controlo dos países comunitários e para uma

7 COM (2006) 254 fi nal.8 Designadamente, Alemanha e Áustria.

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cooperação mais rápida e intensiva entre as administrações fi scais dos Estados-membros.

4. O Conselho ECOFIN de Junho de 2007: acções a empreender pela Comissão Europeia no domínio do combate à fraude

Lançado o debate inter-institucional sobre o combate à fraude ao IVA, o programa comum das Presidências Alemã, Portuguesa e Eslovena do Conselho, para os 18 meses compreendidos entre Janeiro de 2007 e Junho de 2008, viria a dedicar, no capítulo da fi scalidade, um relevo especial àquela matéria, salientando o propósito de ser imprimida uma especial dinâmica à luta contra a fraude fi scal na UE.

Um marco importante nesse contexto foi o Conselho ECOFIN de 5 de Junho de 20079 que, então sob presidência alemã, solicitou à Comis-são a apresentação de propostas sobre medidas convencionais e o exame da viabilidade de duas medidas, consideradas de “longo alcance”: a tri-butação das transacções intracomunitárias e a introdução de um meca-nismo de reverse charge de carácter geral. A este respeito era igualmente pedido à Comissão que analisasse a possibilidade de autorizar um Estado membro, que se apresentasse como voluntário, a implementar no seu sistema fi scal um projecto piloto dessa natureza.

Quanto às medidas convencionais anti-fraude, o Conselho estabe-leceu mesmo uma lista de medidas a tratar pela Comissão com grau de prioridade, destacando-se de entre estas o aumento da periodicidade da entrega de anexos recapitulativos relativos às vendas intracomunitárias, a aceleração das trocas de dados entre autoridades fi scais e a consagração da responsabilidade solidária transfronteiriça.

O Conselho ECOFIN solicitava ainda à Comissão a apresentação, até ao fi m do ano de 2007, de um relatório das actividades por si pros-seguidas de combate à fraude ao IVA, o que viria a ocorrer em Novem-bro desse mesmo ano, através da apresentação de nova Comunicação10 e de um documento de trabalho que fazia o ponto da situação quanto

9 Council Conclusions on combating tax fraud, 2804th Economic and Financial Affairs Council meeting. Luxembourg, 5 June 2007, 10 319/07 (presse 126).

10 Documento COM(2007) 758 fi nal, de 23 de Novembro de 2007.

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aos resultados dos trabalhos desenvolvidos no seio do grupo de peritos ATFS11.

5. A Comunicação da Comissão de Novembro de 2007: elementos--chave para o estabelecimento de uma estratégia anti-fraude na Comunidade

Esta nova comunicação procurou fazer um balanço dos trabalhos empreendidos pela Comissão desde a apresentação, no ano precedente, da sua estratégia anti-fraude dando, ao mesmo tempo, eco das preocu-pações sentidas pelos operadores económicos em matéria de combate à fraude ao IVA.

Em primeiro lugar, é reconhecido que o sistema actual de troca de informações entre as administrações fi scais, o VIES12, não permite um conhecimento sufi cientemente rápido sobre as transacções intracomuni-tárias por forma a impedir em tempo útil a concretização de esquemas de fraude tipo carrossel ou fraude na aquisição. É, por isso, necessário, na opinião da Comissão, introduzir medidas que permitam a recolha mais rápida dessa informação, através da redução dos prazos de apresentação dos anexos recapitulativos. Simultaneamente, é referida a necessidade de ser harmonizado o conteúdo mínimo das informações a transmitir, preconizando-se um certo grau de harmonização das obrigações decla-rativas de IVA13.

11 Grupo Anti-tax fraud strategy. Este grupo de trabalho, que continua activo, é formado por representantes das administrações fi scais, tendo sido constituído em 2006 com a missão de dar um conteúdo concreto às acções consideradas como prioritárias pela estratégia de combate à fraude fi scal na UE, lançada pela Comunicação da Comissão de 31 de Maio de 2006.

12 O VIES (VAT Information Exchange System) consiste na transmissão automática dos dados relativos às transacções intracomunitárias isentas de IVA entre os países comu-nitários. Sobre o funcionamento do VIES ver o artigo “A troca de informações como base fundamental para o controlo do IVA nas transacções intracomunitárias de bens na União Europeia”, de Mário Alberto Alexandre.

13 A Comissão lembrava, a respeito de eventuais alterações a serem introduzi-das em matéria de obrigações fi scais, que estas devem ser sempre equacionadas à luz do objectivo geral comunitário, fi xado pelo Conselho Europeu de redução, até 2012, o

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Em segundo lugar, a Comissão referia a necessidade dos Estados-membros passarem a adoptar uma abordagem comunitária a fi m de ser plenamente assegurado o bom funcionamento do sistema comum do IVA. No plano da luta contra a fraude, essa abordagem poder-se-ia tradu-zir num sistema de partilha dos custos do sistema do controlo das trocas intracomunitárias. Outra medida, a tomar nesse domínio, poderia ser a utilização, por qualquer administração fi scal, dos resultados da análise de risco ou de detecção precoce de mecanismos fraudulentos, obtidos por outra administração.

Alguns Estados-membros pretenderiam mesmo ir mais longe, atra-vés da formação de uma estrutura informal, composta por funcionários de várias administrações fi scais, que seria encarregada de facilitar o intercâmbio de dados entre as autoridades inspectivas e de controlo.

Em terceiro lugar, referia-se a necessidade dos Estados-membros passarem a assegurar de uma forma mais efi caz o controlo do registo dos seus sujeitos passivos de IVA, bem como a manutenção pela sua parte de uma vigilância constante do comportamento dos mesmos, permitindo-lhes proceder ao cancelamento rápido do mesmo registo, em caso de par-ticipação comprovada em esquemas fraudulentos14. Consequentemente, a Comissão admitia a hipótese de poderem ser estabelecidas, a nível comunitário, normas mínimas, relativamente ao registo dos sujeitos pas-sivos de IVA bem como ao respectivo cancelamento.

Finalmente, a Comissão apontava para a necessidade de serem reforçados os sistemas nacionais de cobrança de dívidas fi scais, com ori-gem na prática de fraudes ao IVA. Nesse sentido, defendia a utilização mais recorrente do mecanismo de responsabilidade solidária, já existente no direito comunitário15 e a introdução de melhoramentos no sistema de

mais tardar, de 25% dos encargos administrativos das empresas, em conformidade com o “Programa de acção para a redução dos custos administrativos na União Europeia” (COM(2007) 23 fi nal, de 24 de Janeiro de 2007).

14 Nas fraudes de dimensão transnacional ou intracomunitária, tal como a fraude carrossel, é vital, para evitar a consumação da fraude, que os números de IVA, cance-lados por um Estado membro, sejam rapidamente comunicados às autoridades fi scais dos países em que estejam estabelecidos fornecedores ou clientes dos operadores cancelados.

15 Ver o artigo 205º da Directiva 2006/112/CE. O Código do IVA português estabe-lece, nos artigos 79º e 80º, a responsabilidade solidária dos sujeitos passivos de IVA nas condições aí previstas.

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assistência mútua na cobrança de dívidas fi scais, com vista a facilitar a sua aplicação16.

É sobre estas várias áreas de intervenção que a Comissão procura e obtém orientação política do Conselho, já sob Presidência portuguesa, na segunda metade de 2007.

6. Conclusões do Conselho ECOFIN de Dezembro de 2007: fi xação de metas para a apresentação de propostas

A defi nição de uma estratégia de âmbito comunitário de combate à fraude e à evasão fi scais seria considerada uma das prioridades da Presi-dência Portuguesa para o Conselho ECOFIN, concretizada pela aprova-ção das Conclusões do mesmo Conselho, de 4 de Dezembro de 200717.

Efectivamente, o Conselho solicitou à Comissão a apresentação de novas propostas legislativas durante o primeiro trimestre de 2008, con-vidando-a em simultâneo a apresentar conclusões da sua análise sobre as medidas de longo alcance. Além disso, o mesmo Conselho pedia à Comissão que identifi casse em particular as necessidades de obtenção de informação pelas administrações fi scais por forma a ser adequadamente controlado o comércio intracomunitário, no quadro da política comuni-tária de redução das obrigações fi scais das empresas europeias. A Comis-são era igualmente convidada a ponderar a apresentação de propostas relativas à gestão do sistema de IVA comunitário, ao estatuto dos sujeitos passivos de IVA e à cobrança de dívidas do imposto resultantes da prática de fraudes.

16 A possibilidade de recuperação de créditos de IVA de que é titular um Estado membro por intermédio da intervenção de outra administração fi scal, que pode cobrar coercivamente imposto a um contribuinte residente ou estabelecido no seu território com base num título executivo externo, está hoje em dia consagrada na Directiva 2008/55/CE do Conselho de 26 de Maio de 2008.

17 Council Conclusions on combating tax fraud, 2836th Economic and Financial Affairs Council meeting. Brussels, 4 December 2007, 15698/07 (presse 270).

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7. Comunicação de Fevereiro de 2008: medidas de longo alcance

Em resposta aos apelos dos Conselhos ECOFIN de Junho e de Dezembro de 2007, a Comissão apresentou nova Comunicação em 22 de Fevereiro de 200818. Neste documento são tecidas considerações sobre duas hipóteses alternativas no que concerne a introdução de possíveis modifi cações ao regime transitório de IVA, entrado em vigor em simul-tâneo com a abolição das fronteiras fi scais em 1993. As alternativas apre-sentadas são a tributação das transacções intracomunitárias no país de origem e a introdução de um sistema generalizado de reverse charge aplicável às operações domésticas, devendo este ser precedido de um projecto-piloto de experimentação de um tal sistema, a ser testado volun-tariamente por um Estado-membro.

Porém, a Comissão entende que a passagem à tributação no país de origem, em que está estabelecido o fornecedor dos bens ou servi-ços, depende da existência de um mecanismo de compensação bilateral (clearing system) que possibilite ao Estado-membro de destino, o actual cobrador das receitas resultantes da tributação no seu território das ope-rações intracomunitários, ser compensado da perda de receitas resultante da transferência do ponto de cobrança do imposto para o Estado-membro de origem. A criação deste mecanismo implica, por isso, a colocação do segundo país na dependência fi nanceira do primeiro. A questão essencial que se põe é, pois, se os Estados-membros estão dispostos a aceitar a instituição de um mecanismo de compensação que implica a criação de tal relação de dependência.

Quanto à hipótese alternativa de instituição de um mecanismo de reverse charge generalizado, a Comissão considera que tal mecanismo só poderá funcionar, sem comprometer o funcionamento do mercado interno, se todos os países comunitários alinharem obrigatoriamente por esse modelo. Mostrando-se disposta a encetar estudos sobre a possibili-dade de lançamento de um projecto-piloto por parte de um Estado-mem-bro quanto à aplicação de um mecanismo de tal natureza no seu territó-rio, a Comissão pretende do Conselho um mandato claro e inequívoco para esse efeito.

18 COM(2008) 109 fi nal.

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Estas questões, cujas respostas são fundamentais para a defi nição política do rumo a seguir na condução dos trabalhos futuros, foram deba-tidas nos Conselhos ECOFIN de 18 de Fevereiro, 4 de Março e 14 de Maio de 2008, tendo os Ministros das Finanças decidido dar prioridade às medidas convencionais em detrimento da introdução de medidas mais radicais (as chamadas “medidas de longo alcance”). Relativamente a estas últimas, o Conselho ECOFIN entendeu só se dever avançar na sua análise uma vez feita a avaliação da efi cácia das medidas convencio-nais que, entretanto, deverão ser propostas, debatidas e aprovadas pelos Estados-membros no Conselho.

8. A posição de Portugal sobre as medidas de longo alcance

A administração fi scal portuguesa levou a cabo estudos sobre as duas hipóteses alternativas de substituição do modelo de IVA corrente.

Na análise19 efectuada ao impacto da substituição do actual sistema de IVA por um sistema generalizado de reverse-charge em Portugal, quer a nível da receita pública, quer a nível dos custos de contexto e competi-tividade dos agentes económicos, foi desenvolvido um modelo de micro-simulação de IVA, tendo-se aplicado o reverse-charge a todos os clientes que, relativamente ao mesmo fornecedor, apresentassem um volume de negócios bruto anual acima dos 25 000 euros.

Os resultados obtidos apontavam para uma diminuição de 1,4% da receita líquida de IVA, correspondente a 176,7 milhões de euros. Toda-via, dado que a implementação de tal sistema implicaria, em simultâ-neo, a redução dos custos associados ao IVA suportado nas compras das empresas e a diminuição dos pedidos de reembolso, poder-se-iam cal-cular ganhos fi nanceiros e de competitividade, no mínimo, na mesma ordem de valores.

Quanto ao efeito causado pela transferência da receita cobrada, dos contribuintes de maior dimensão (grossistas) para os de menor dimensão (retalhistas), provocada pela aplicação do reverse charge nos sectores

19 Ver o relatório de Julho de 2007 do Grupo de Trabalho, constituído para esse efeito, em Ciência e Técnica Fiscal n.° 419.

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produtivos intermédios, verifi car-se-ia uma diminuição da importância dos primeiros, em termos de encaixe do imposto, de 28,6% para 22,4%, aumentando a dos segundos, de 9,3% para 21,1%. Sabendo-se que é pre-cisamente no sector retalhista que se concentram mais difi culdades de controlo e maiores riscos de incumprimento, poder-se-ia concluir que a instituição generalizada do mecanismo de reverse charge em Portugal acarretaria riscos de aumento da fraude e evasão fi scais no campo do IVA.

Outro estudo20, conduzido pelo CEF/DGCI, foi dirigido à avalia-ção do impacto da eventual passagem à tributação na origem, à taxa de IVA de 15%, de todas as transmissões intracomunitárias com recurso a um sistema de compensação21. O estudo concluía que a implementação de tal sistema representaria uma vantagem para os países exportadores líquidos, que passariam a cobrar efectivamente imposto, podendo dispor do mesmo até à respectiva transferência para os países de destino. Estes últimos poderiam, por sua vez, registar alguma carência fi nanceira, dado que seriam obrigados a devolver IVA aos seus sujeitos passivos antes de receberem o imposto do país cobrador. Ou seja, o país de destino iria per-der autonomia na cobrança do imposto, visto que esta passaria a ser feita no ponto de partida ou de saída das mercadorias. A gestão do sistema de clearing ou de compensação poderia igualmente implicar custos de tran-sição, quer para as empresas, quer para as administrações.

No entanto, acrescenta ainda o mesmo estudo, a passagem à tribu-tação na origem poderia trazer também algumas vantagens, como uma maior proximidade à lógica do funcionamento do imposto no mercado interno, a redução dos pedidos de reembolso e mais facilidade no con-trolo da tributação das transacções intracomunitárias, com menos hipó-teses de fraude no comércio intracomunitário.

Fazendo eco das dúvidas suscitadas pela hipótese de instituição de um mecanismo de reverse charge alargado às transacções internas, escre-via em Fevereiro de 2007 João José Amaral Tomaz22, na altura Secre-

20 Ver Ciência e Técnica Fiscal, nº 420.21 Como se viu atrás, esta hipótese foi apresentada pela Comissão como contrapro-

posta à pretensão, defendida por alguns Estados-membros, de introdução de um sistema de reverse charge alargado.

22 Artigo citado, pag. 151.

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tário de Estado dos Assuntos Fiscais, que: “O sistema reverse charge generalizado transforma o IVA num tipo de “imposto sobre as vendas a retalho” onde é mais frequente a ocorrência de situações de evasão e fraude fi scal, sobretudo porque se transfere a obrigação de pagamento da totalidade do imposto ao Estado (que actualmente é pago de forma fraccionada sobretudo pelas grandes empresas, onde os riscos de fraude são menores) para as pequenas e médias empresas, nas quais reconheci-damente os riscos de fraude são mais signifi cativos e os mecanismos de controlo mais difíceis de implementar...”. O autor levantava ainda outras questões importantes, quanto à possibilidade de transferência de esque-mas de fraude de países que adoptassem tal mecanismo para países que optassem por não o fazer e igualmente quanto às vantagens competitivas de que benefi ciariam os agentes económicos estabelecidos nos primeiros face aos restantes.

Amaral Tomaz considerava, assim, ser preferível utilizar o meca-nismo de reverse charge de uma forma selectiva, aplicando-o a certos sectores de risco23. Defendia também dever proceder-se ao estudo24 do impacto em Portugal da adopção desse mecanismo na cobrança potencial do imposto e ainda a colaboração activa com a Comissão Europeia na análise das várias hipóteses de soluções para o combate à fraude ao IVA.

Finalmente, além do impulso dado à estratégia de luta contra a fraude na Comunidade pela Presidência Portuguesa do Conselho da UE, durante o segundo semestre de 2007, traduzido nas Conclusões do Con-selho ECOFIN de 4 de Dezembro de 2007, foi organizada em 28 de Setembro em Lisboa, e no âmbito da mesma Presidência, uma confe-rência internacional sobre a estratégia de Lisboa e a luta contra a fraude fi scal na UE25. A conferência permitiu a troca de pontos de vista entre os

23 Portugal já aplica o reverse charge aos sectores das sucatas e materiais reciclá-veis e ao imobiliário, como decorre do disposto no artigo 2º, nº 1, alíneas i) e j) do CIVA e no artigo 6º, nº 2 do Regime de renúncia à isenção de IVA nas operações relativas a bens imóveis, posto em vigor pelo Decreto-Lei nº 21/2007, de 29 de Janeiro. O mesmo sistema é ainda aplicado ao ouro para investimento, conforme artigo 10º do Decreto-Lei nº 362/99, de 16 de Setembro.

24 Este estudo foi, entretanto, efectuado. Ver, a tal respeito, a nota de rodapé nº 19.25 Na conferência participaram a Comissão Europeia, o Parlamento Europeu, o

FMI e a OCDE, representantes das grandes empresas europeias e de sectores institucio-nais nacionais e ainda as administrações fi scais dos Estados-membros. O programa da

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participantes e a conclusão geral da necessidade premente de encontrar respostas para a fraude ao IVA compatíveis com o respeito pelos princí-pios reguladores do mercado interno e pela manutenção da competitivi-dade das empresas europeias legítimas. Foi, mais uma vez, manifestada a preferência pelo desenvolvimento e melhoramento dos actuais sistemas de controlo, sem se alterar radicalmente o modo de funcionamento do IVA em vigor.

9. Reacções do sector empresarial em matéria de luta contra a fraude fi scal na UE

9.1. Estudo da PwC sobre o impacto nas empresas do aumento da frequência das obrigações declarativas

A apresentação pela Comissão das suas propostas de Março de 200826, em matéria de luta contra a fraude ao IVA nas operações intraco-munitárias, foi precedida pela apresentação de um estudo encomendado à consultora Price Waterhouse Coopers (PwC)27. Este estudo procurou avaliar o impacto nos custos das empresas da redução do prazo, de tri-mestral a mensal, da entrega do anexo recapitulativo.

A PwC partiu de um universo de 14 empresas (sete multinacionais e sete pequenas e médias empresas), representativas de diversos sectores de actividade e sedeadas em quatro países da UE28.

O estudo concluiu que uma medida dessa natureza, a ser implemen-tada, provocaria um acréscimo dos custos administrativos das empresas. Esses custos seriam de dois tipos: custos iniciais (em que as empresas incorrem uma única vez) e custos recorrentes. Os primeiros resultariam da preparação e activação dos novos sistemas de tratamento das decla-rações. Os segundos decorreriam da preparação, submissão e validação

conferência, bem como os respectivos discursos de abertura e encerramento, encontram-se reproduzidos na revista “Fiscália” (DGCI) nº 36, pags. 52-59.

26 COM (2008) 147 fi nal de 17 de Março de 2008.27 Study in respect of introducing a change in the requirements to the recapitulative

statements – Increase of submission frequency – Final Report to the European Commis-sion, 15 November 2007.

28 Bélgica, Holanda, Hungria e Reino Unido.

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dos documentos. Enquanto que os custos iniciais seriam marginais (cerca de 344 euros em média), os custos recorrentes seriam mais signifi cativos (cerca de 6 298 euros em média).

As empresas inquiridas no âmbito do estudo referiram que a intensi-fi cação da obrigação de reporte dos anexos recapitulativos poderia ainda provocar maior número de controlos fi scais e o acréscimo de exigências por parte das administrações, questionando a capacidade destas últimas de procederem ao seu tratamento atempado.

Foram, todavia, referidos factos positivos, inerentes à implemen-tação de uma medida de tal natureza, tais como maior exigência e rigor no cumprimento das obrigações declarativas, susceptível de diminuir os erros e inexactidões praticados nas declarações e a harmonização dos períodos de apresentação dos anexos recapitulativos nos diferentes Esta-dos-membros, eliminando as diferenças existentes nesta matéria na UE e facilitando o funcionamento das empresas com actividade em vários países.

9.2. A posição dos representantes das empresas europeias

Ao debate sobre a estratégia de combate à fraude ao IVA na UE não fi caram alheias as empresas europeias. Uma das principais associações das grandes empresas europeias, a Business Europe, produziu um docu-mento em Março de 200729 em que considerava ser prematuro proceder-se à substituição do actual sistema comum do IVA, nomeadamente, atra-vés da instituição de um mecanismo generalizado de reverse charge, tal como pretendido por alguns Estados-membros. Propunha antes, como alternativa, que as administrações investissem mais em meios humanos e materiais, por forma a aumentar a efi cácia da sua actuação ao nível do controlo da fraude fi scal.

A Business Europe mostrava-se também preocupada com os cus-tos administrativos impostos às empresas, por via do combate à fraude, entendendo que os mesmos deveriam ser reduzidos. Propunha, em simul-tâneo, a constituição de parcerias entre as empresas e as administrações fi scais, por forma a melhorar a comunicação e a confi ança recíprocas.

29 Business Europe message on combating VAT fraud – improve effi ciency of tax administrations and remove excessive risks and burdens on bona fi de businesses.

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Sugeria igualmente a criação de uma equipa Pan-Europeia de investiga-dores da fraude ao IVA, com competências de âmbito comunitário, bem como a utilização da tecnologia mais recente por forma a ser prevenida e evitada a utilização abusiva dos números de identifi cação de IVA das empresas de boa fé.

Ideias semelhantes foram veiculadas pelos representantes das empresas e dos consultores fi scais, que participaram numa conferência sobre a fraude ao IVA30, organizada pela Comissão Europeia, em Março de 2007, em Bruxelas. Considerou-se prematuro introduzir modifi cações radicais ao sistema comum do IVA em vigor, envolvendo as mesmas mais custos e maior complexidade funcional. Foi então manifestada a predisposição do sector empresarial em colaborar com as autoridades fi scais e a necessidade de simplifi cação do cumprimento das suas obri-gações fi scais, como instrumento necessário ao reforço da respectiva competitividade.

10. As propostas da Comissão de Março de 2008: Acelerar a fre-quência da recolha e transmissão da informação sobre as tran-sacções intracomunitárias

Na sequência do mandato do Conselho ECOFIN de Junho de 2007, a Comissão apresentou em Março de 2008 a primeira proposta relativa a medidas convencionais anti-fraude. Esta proposta31 procurava colmatar uma das grandes difi culdades existentes actualmente na área do controlo das operações intracomunitárias, ou seja, a existência de prazos distintos na apresentação de anexos recapitulativos entre Estados-membros32.

30 Ver Tackling VAT fraud – possible ways forward em: http://ec.europa.eu/taxation_customs/taxation/vat/vat_conferences/article_3857_en.htm

31 Documento COM(2008) 147 fi nal.32 Dado que os prazos de apresentação dos anexos recapitulativos divergem de país

para país, a informação enviada pelo Estado-membro em que se originou uma transacção pode chegar ao Estado-membro de destino entre três e seis meses após a realização da mesma o que, em termos de controlo da fraude praticada neste tipo de transacções, torna praticamente impossível a detecção atempada das práticas fraudulentas, inviabilizando, assim, o seu combate e eventual ressarcimento dos danos provocados ao tesouro do Estado-membro prejudicado.

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A proposta tem por objectivo encurtar o prazo do período de imposto a que respeita o anexo recapitulativo. Actualmente, o artigo 263º, nº 1 da Directiva 2006/112/CE prevê, enquanto regra, que os mapas recapitula-tivos33 sejam elaborados relativamente a cada trimestre civil, admitindo a mesma norma que os Estados-membros que o pretendam determinem a apresentação dos mapas com periodicidade mensal. De acordo com a proposta, o preenchimento dos mapas passará a ser feito, como regra, em relação às transacções intracomunitárias efectuadas em cada mês.

Por outro lado, tendo em conta objectivos de simplifi cação admi-nistrativa, a proposta prevê que a apresentação dos mapas passará a ser feita, preferencialmente, por via electrónica, deixando, todavia, aos Estados-membros a possibilidade de autorizar os seus sujeitos passivos a submeter esses documentos por outros meios34.

Também se procura sincronizar a frequência da informação relativa às aquisições intracomunitárias com a informação respeitante às transac-ções intracomunitárias, tornando também mensal o período do imposto a que respeitam as correspondentes declarações periódicas.

Porém, por força das negociações no Conselho, foram introduzidas várias alterações ao texto inicial da proposta, por forma a não sobrecar-regar demasiado as empresas com volumes de transacções intracomuni-tárias pouco signifi cativos. Foi, assim, dada a possibilidade aos Estados membros de fi xar, nas condições e limites por si estabelecidos, períodos mais alargados de imposto para os sujeitos passivos com valores de tran-sacções ou de prestação de serviços intracomunitários não superiores a

33 A expressão utilizada na Directiva IVA é “mapas recapitulativos”, enquanto que a legislação portuguesa utiliza o termo “anexos recapitulativos”. Ambos respeitam à mesma realidade: os documentos em que um sujeito passivo de IVA, que efectou opera-ções consideradas como transmissões intracomunitárias de bens, procede à inventariação das mesmas, identifi cando o respectivo valor e a identifi cação dos seus clientes no país de destino. Um exemplo prático do preenchimento destes anexos pode ser encontrado em “Exercícios práticos resolvidos de IVA” de Miguel Silva Pinto, Maria Conceição Lopes e José M. M. Marreiros.

34 A redacção actual do artigo 263º, nº 2 da Directiva 2006/112/CE apenas admite a título subsidiário a apresentação dos mapas recapitulativos por via electrónica. Em Portugal o envio dos anexos recapitulativos por via electrónica é obrigatório para todos os sujeitos passivos, conforme decorre da Portaria nº 375/2003, de 10 de Maio, designa-damente do seu nº 7.

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200 000 euros (ou 400 000 euros durante um período de dois anos após a entrada em vigor das novas medidas).

Finalmente, a proposta procura também preparar a entrada em vigor das novas regras de IVA aplicáveis aos serviços, prevista para 1 de Janeiro de 201035, assegurando a harmonização das normas relativas ao facto gerador e à exigibilidade, aplicáveis às prestações de serviços de dimensão intracomunitária. A proposta visa, assim, assegurar que as prestações de serviços sejam declaradas em simultâneo pelo prestador e pelo adquirente, relativamente ao mesmo período de imposto, sendo por essa via facilitado o correspondente controlo cruzado.

Por outro lado, o período de transmissão ou colocação à disposi-ção das informações recolhidas no Estado-membro de origem, através dos mapas recapitulativos, é igualmente reduzido de três meses para um, visando-se com esta redução tornar o VIES um instrumento de troca de dados mais rápido e efi caz36.

As propostas foram, entretanto, aprovadas pelo Conselho, em 16 de Dezembro de 2008, tendo dado origem à Directiva 2008/117/CE, bem como ao Regulamento (CE) nº 37/200937. A sua transposição para a legislação dos Estados membros deverá ser efectuada até 31 de Dezem-bro de 2009.

11. A criação da rede EUROFISC, um sistema de troca de informa-ção rápida sobre transacções e operadores fraudulentos

Alguns Estados-membros da UE já trocam actualmente entre si informação relativa a determinadas transacções intracomunitárias consi-deradas de “alto risco”, que permitem, designadamente, identifi car, quer no país de origem das mercadorias, quer no país de destino, os operado-

35 Ver Directiva 2008/8/CE de 12 de Fevereiro de 2008. A inclusão dos serviços sujeitos a reverse charge nos mapas recapitulativos resulta igualmente desta Directiva, que alterou nesse sentido a redacção do artigo 262º da Directiva IVA.

36 Vai nesse sentido a proposta de alteração do Regulamento do Conselho nº 1798/2003, de 7 de Outubro de 2003, incluída na mesma proposta legislativa (COM(2008) 147 fi nal).

37 Publicados no JO L 14, de 20.01.2009, pags 1 e 7.

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res envolvidos nos esquemas fraudulentos. Tal possibilita a prevenção da fraude que se traduz em retirar a tais operadores o seu estatuto de sujeitos passivos de IVA. Deixam, assim, de se verifi car as condições que permi-tem a isenção com crédito de imposto das transacções intracomunitárias, reduzindo-se dessa forma a vulnerabilidade à fraude do sistema comum do imposto.

Porém, esse sistema assenta na informalidade e, o facto de não ser clara a sua legitimidade no quadro do direito comunitário, tem levado a que diversos países se recusem a participar no mesmo, diminuindo, por isso, a sua efi cácia. Foi por reconhecer a utilidade do sistema existente e, simultaneamente, a necessidade de assegurar ao mesmo as condições necessárias para uma operacionalidade alargada a toda a União Euro-peia, que a Presidência Francesa decidiu propor a adopção pelo Conselho ECOFIN das directrizes por que se regerá a futura rede de troca de infor-mações sobre fraude nas transacções intracomunitárias, a que foi dada a designação de EUROFISC.

Esta rede visará, num primeiro momento, fornecer informações céle-res sobre trocas de bens entre Estados-membros, funcionando ao mesmo tempo como dispositivo de alerta rápido e multilateral sobre eventuais fraudes. Os países deverão participar na rede numa base voluntária, que passará a ligar os respectivos operacionais anti-fraude, sob coordenação comunitária, assegurando a confi dencialidade das informações trocadas e sem encargos suplementares para os operadores económicos. Admite-se, todavia, que possam ser atribuídas ao EUROFISC novas funcionalidades no futuro, tais como a formulação de análises de risco, de base comum, e a coordenação de controlos multilaterais. O quadro jurídico do EUROFISC deverá ser estabelecido no âmbito do Regulamento CE nº 1798/2003.

No Conselho ECOFIN de 7 de Outubro de 2008, foram aprovadas as directrizes da rede EUROFISC38, tendo sido mandatada a Comissão para apresentar propostas legislativas que permitam o estabelecimento futuro do EUROFISC. Foi, assim, dado mais um passo na concretiza-ção das medidas convencionais anti-fraude, decididas pelo Conselho em 2007.

38 Lute contre la fraude à la TVA – Système Eurofi sc – Conclusions du Conseil, 2894ème session du Conseil Affaires économiques et fi nancières. Luxembourg, 7 octobre 2008, 13784/08 (presse 279)

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12. Comunicação de Dezembro de 2008: estratégia coordenada para melhorar o combate à fraude na UE

Como se viu atrás39, o Conselho não obteve consenso sobre as medidas de longo alcance indicadas pela Comissão na sua Comunica-ção de Fevereiro de 2008, tendo decidido mandatar a Comissão para dar prioridade aos trabalhos sobre as medidas convencionais de luta contra a fraude ao IVA intracomunitário.

A resposta da Comissão a esse mandato do Conselho surge em Dezembro de 2008, através de uma Comunicação40 dirigida ao Conse-lho, ao Parlamento Europeu e ao Conselho Económico e Social Europeu, em que é defi nido um plano de acção a curto prazo para a adopção de um conjunto de medidas que permitam reforçar os mecanismos tradicionais de luta contra a fraude que, apesar de já previstos genericamente no qua-dro jurídico comum, não têm sido objecto de uma abordagem verdadei-ramente comunitária por parte dos Estados membros ou sequer de uma implementação efectiva.

Tendo sido diagnosticadas no seio do Grupo ATFS41 as áreas neces-sitadas de intervenção, através do aperfeiçoamento das normas comuni-tárias, a Comissão vem agora propor o lançamento de várias iniciativas legislativas, distribuídas por três grandes grupos.

No primeiro grupo compreendem-se as medidas destinadas a actuar preventivamente, através do reforço dos sistemas fi scais e da coopera-ção administrativa. Neste âmbito a Comissão deverá apresentar propos-tas que visam a determinação de normas mínimas comuns relativas ao registo e ao cancelamento do registo de IVA dos operadores intracomuni-tários, a confi rmação electrónica da identidade e do endereço dos sujeitos passivos que efectuam transacções intracomunitárias, a simplifi cação, harmonização e modernização das regras de facturação e a harmonização das regras de exigibilidade relativas às mesmas operações42.

Um segundo grupo inclui as medidas de melhoramento da efi cácia das administrações fi scais na detecção da fraude ao IVA. Compreendem-

39 Ver nº 7.40 COM (2008) 807 fi nal, de 01.12.2008.41 Ver nota de rodapé nº 11.42 Esta última proposta foi, entretanto, apresentada. Ver a este respeito o nº 14.

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se aqui a proposta já apresentada e acordada pelo Conselho, relativa à redução dos prazos de declaração das operações intracomunitárias e da transmissão de dados entre autoridades fi scais43, a defi nição de condições relativamente à isenção de IVA na importação44, o reforço da cooperação administrativa através da reformulação do Regulamento CE 1798/2003, o acesso automatizado a determinados dados relativos aos sujeitos passi-vos de IVA e a consagração jurídica da rede EUROFISC45.

Por último, um terceiro conjunto de medidas incidirá sobre o reforço da capacidade das administrações fi scais em matéria de responsabilidade solidária e de cobrança46. Se o considerar necessário, a Comissão poderá ainda apresentar propostas em matéria de protecção comparável em ter-mos de sanções e procedimentos penais contra os autores de fraudes ao IVA.

Além deste pacote de medidas a Comissão também se propõe ence-tar uma refl exão a mais longo prazo sobre a utilização das novas tecnolo-gias para facilitar a troca de informações entre os operadores económicos e as administrações fi scais, o que poderá permitir uma redução da carga administrativa inerente ao cumprimento das obrigações tributárias e à realização de controlos fi scais. Para tal, é sugerida a criação de um grupo ad hoc, em que participarão representantes da Comissão, das administra-ções fi scais e das empresas europeias, que terá como objectivo a promo-ção do debate de ideias e a troca de experiências entre os participantes neste domínio.

13. Proposta de Dezembro de 2008: fraude ligada à isenção de IVA na importação e aperfeiçoamento da responsabilidade solidária

Em simultâneo com o seu plano de acção comunitária coordenada de luta anti-fraude atrás referido, a Comissão adoptou nova proposta legislativa em 1 de Dezembro de 200847. Esta proposta contém duas

43 Ver nº 10.44 Esta proposta foi, entretanto, apresentada. Ver a este respeito o nº 13.45 Ver nº 11.46 Estas propostas foram, entretanto, apresentadas. Ver a este respeito os nºs 13 e 15.47 COM (2008) 805 fi nal.

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medidas distintas. Por um lado, estabelece condições para a isenção de IVA nas importações de mercadorias que visam ser, de seguida, objecto de transmissão intracomunitária para outros Estados membros. Por outro lado, assegura, em determinadas circunstâncias, a responsabilidade soli-dária do fornecedor de bens não estabelecido no país de destino dos mes-mos, quando a sua actuação facilitou aí a prática da fraude ao imposto.

Uma das fraudes correntes ao sistema do IVA comunitário resulta da possibilidade dos importadores de mercadorias provenientes de países terceiros poderem evitar o pagamento do imposto devido pela impor-tação, no caso desta ser seguida de uma transmissão intracomunitária isenta de imposto48. No entanto, o direito comunitário é omisso quanto à regulamentação da isenção, que é assim deixada à discricionariedade dos Estados membros. A falta de regras precisas nesta matéria tem levado a um abuso do regime por parte dos contribuintes fraudulentos que se aproveitam do regime suspensivo para iniciar ou continuar esquemas do tipo fraude carrossel. Simultaneamente, verifi ca-se a falta de coor-denação entre as autoridades do país de entrada das mercadorias e as do respectivo destino fi nal, impossibilitando, por isso, o acompanhamento do trajecto das mesmas, bem como a certifi cação de que as obrigações fi scais no país de destino foram efectivamente cumpridas.

A proposta49 vem criar regras de âmbito comunitário nesta área, estabelecendo, como condição para a efectivação da isenção na importa-ção, que o importador esteja identifi cado para efeitos de IVA no país da importação, ou tenha aí nomeado um representante fi scal. Além disso, o importador terá que apresentar a sua identifi cação fi scal, bem como a do seu cliente no país de destino e comprovar que os bens são transportados ou expedidos entre o país da importação e o país de destino.

Quanto ao mecanismo de responsabilidade solidária, ele já existe hoje na Directiva IVA. No entanto, a sua natureza generalista tem impe-dido a sua aplicação pelos Estados membros a outras situações que não

48 Ver artigo 143º, nº 1, alínea d) da Directiva 2006/112/CE. Esta norma foi trans-posta para o sistema de IVA português pelo artigo 16º do Regime do IVA nas Transacções Intracomunitárias (DL 102/2008, de 20 de Junho).

49 Ver artigo 1º, nº 1 da proposta de Directiva, que introduz alterações ao artigo 143º da Directiva IVA.

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as domésticas. Consequentemente, a proposta50 vem providenciar regras específi cas de responsabilidade solidária para os casos em que estejam em causa transacções intracomunitárias.

Assim, verifi cando-se fraude ao IVA relacionada com uma aqui-sição intracomunitária num determinado país, o fornecedor das merca-dorias poderá ser considerado responsável solidário com o devedor do imposto, ainda que não esteja aí estabelecido, caso não tenha cumprido devidamente as suas obrigações declarativas ou as tenha cumprido de forma incompleta no país em que está estabelecido. Todavia, tendo em conta os princípios de proporcionalidade e certeza jurídica, que devem ser observados nesta matéria51, a responsabilidade do fornecedor poderá ser afastada em dois casos: quando o adquirente tenha apresentado à res-pectiva administração fi scal a correspondente declaração periódica de IVA com toda a informação sobre a aquisição e, ainda, quando o for-necedor esteja em condições de justifi car as razões pelas quais as suas obrigações declarativas não foram cumpridas.

As medidas propostas não são pacífi cas porquanto poderão implicar o agravamento das obrigações e encargos dos operadores estrangeiros que se vêm confrontados com novas exigências em matéria de registo e de responsabilidade pelo pagamento do imposto em falta.

14. Proposta de Janeiro de 2009: Facturação

Em 28 de Janeiro de 2009 a Comissão adoptou uma proposta52 de alteração da Directiva IVA compreendendo um conjunto de regras har-monizadas destinadas a simplifi car e modernizar as actuais disposições relativas a facturação.

50 Ver artigo 1º, nº 2 da proposta de Directiva, que introduz alterações ao artigo 205º da Directiva IVA.

51 Estes princípios foram defi nidos pelo TJCE no acórdão Federation of Techno-logical Industries (caso C-384/04). Ver a este respeito o artigo “Contributos da jurispru-dência comunitária para a luta contra a fraude ao IVA”, de Miguel Silva Pinto, publicado em Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal nº 202.

52 COM(2009) 21.

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A proposta contém várias medidas destinadas a combater a fraude, em particular, no domínio das transacções intracomunitárias. Assim, é proposto que a exigibilidade das transacções passe a coincidir com a data da sua realização, fi xando-se como data limite o 15º dia do mês seguinte. Procura-se por esse meio evitar o adiamento sistemático da entrega de declarações relativas a transacções intracomunitárias para o mês seguinte ao da realização da operação, procedimento que tem em vista impedir o seu controlo atempado.

É também estabelecida a obrigatoriedade da emissão de facturas pela realização de operações tributáveis, ainda que as mesmas sejam objecto de reverse charge. Correspondentemente, só a detenção de uma factura contendo a identifi cação fi scal do sujeito passivo legitimará o exercício do direito à dedução do IVA aí inscrito.

15. Revisão da assistência mútua na cobrança

Sendo as competências dos Estados membros, relativamente à cobrança de impostos, limitada territorialmente, os operadores fraudu-lentos aproveitam-se desse facto para organizar a sua insolvência de modo a escapar ao pagamento dos impostos devidos. Por outro lado, aproveitando-se das facilidades concedidas pelas liberdades de circu-lação asseguradas pelo acervo comunitário, contribuintes desonestos movem-se entre países diferentes por forma a escapar ao pagamento de impostos ou outras imposições de que são devedores nos territórios fi s-cais em que já estiveram registados.

Existe já um quadro jurídico comunitário que procura assegurar mecanismos de assistência mútua na cobrança53. Todavia, o sistema actual tem vindo a acusar várias defi ciências, sendo considerado lento, descoordenado e pouco transparente.

Respondendo ao sentimento generalizado de que o presente sistema de assistência mútua em matéria de cobrança necessita de ser melhorado e modernizado, a Comissão acaba de adoptar uma proposta de Direc-

53 Ver Directiva 2008/55/CE do Conselho, de 26 de Maio de 2008.

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tiva54 que visa criar uma nova organização da assistência mútua entre os Estados membros.

De entre as inovações introduzidas destacam-se o alargamento do campo de aplicação da assistência mútua, que se estende a todos os impostos, taxas e direitos, incluindo as contribuições obrigatórias para a segurança social, sanções, multas e juros. Ou ainda a simplifi cação do processo de assistência na cobrança, através da adopção de instrumentos uniformes ou de medidas cautelares, ultrapassando-se por essa via as difi culdades ligadas ao reconhecimento e à tradução dos instrumentos provenientes de outros países. Salienta-se, por último, a criação de con-dições para a presença e actuação de funcionários estrangeiros noutros países, o que constitui uma das medidas mais arrojadas da proposta e relativamente à qual não será fácil gerar consensos.

16. Conclusão: Perspectivas no campo da luta contra a fraude ao IVA

A introdução de alterações substanciais na matriz e funcionamento do IVA foi considerada, como se viu atrás, arriscada e não isenta de agra-var ainda mais os problemas actuais que gravitam à volta do sistema comunitário do IVA em vigor, isto é, o alargamento territorial da fraude, bem com a mutação da mesma, o aprofundar das distorções de concor-rência e o aumento dos encargos administrativos resultantes do cumpri-mento das obrigações fi scais. Não é por acaso que várias soluções que têm sido apresentadas para resolver a exposição do IVA à fraude têm sido criticadas por serem consideradas como penalizadoras do bom funciona-mento do mercado interno55.

Por tais motivos, a opção tomada pelas medidas convencionais na luta contra a fraude ao IVA reuniu o consenso de opiniões, desde os deci-sores políticos aos operadores económicos. A União Europeia decidiu,

54 COM (2009) 28 fi nal, de 02.02. 2009.55 É o caso, entre outras, das propostas P-VAT (Prepaid VAT), VIVAT (Variable

Integrated VAT) e CVAT (Compensating VAT), consideradas como susceptíveis de criar obstáculos ao desenvolvimento das actividades económicas na UE. Ver a este respeito o documento de trabalho 07/31 do Fundo Monetário Internacional “VAT Fraud and Eva-sion: What do we know and what can be done?” – Michael Keen and Stephen Smith.

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assim, avançar no domínio da melhoria do sistema existente. Nesse sen-tido, apesar de terem passado mais de dois anos desde o lançamento da estratégia da Comissão para esta área, alcançaram-se os primeiros resul-tados em Dezembro de 2008, tendo sido criadas condições para fazer chegar mais rapidamente a informação sobre as transacções intracomu-nitárias às administrações fi scais e sendo acelerados os circuitos de trans-missão de dados entre estas.

Espera-se que esses resultados tenham continuidade em 2009, atra-vés da apresentação de um vasto número de propostas de actos comuni-tários pela Comissão, no sentido do reforço dos mecanismos anti-fraude que, apesar de já estarem previstos em parte na legislação comunitária, necessitam de ser aperfeiçoados ou dotados de maior certeza jurídica.

Ao mesmo tempo, as administrações deverão conciliar as suas acti-vidades de combate à fraude com a redução de encargos para os agen-tes económicos56. Maior simplifi cação das obrigações fi scais, mediante recurso aos novos meios tecnológicos, deverá ser procurada à escala comunitária, divulgando-se as boas práticas levadas a cabo pelos paí-ses mais avançados nessa área. Portugal terá, a esse respeito, oportuni-dade de intervir e infl uenciar a tomada de decisões a nível comunitário. Ao mesmo tempo poderá comunicar a sua experiência de utilização das novas tecnologias como forma de tornar mais fácil o cumprimento pelos contribuintes das respectivas obrigações fi scais.

Mas, para que internamente a efi cácia do combate à fraude possa ser melhorada, será essencial que os serviços inspectivos portugueses continuem a apostar na modernização de meios e metodologias e invis-tam no recrutamento e formação de auditores especializados na detecção e combate à fraude.

É aconselhável, igualmente, que se continue a avaliar o grau de efi -cácia de mecanismos de autoliquidação aplicados sectorialmente, estu-dando a oportunidade da sua eventual extensão a outros sectores que justifi quem a adopção da medida.

Tanto no panorama comunitário, como no interno, é necessário demonstrar abertura para a análise e ponderação de propostas e modelos que vão surgindo como resposta à fraude e evasão na área dos impostos

56 Ver a este respeito a nota de rodapé nº 13.

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indirectos. Existem ideias inovadoras, oriundas de países não comunitá-rios, que merecem atenção, como é o caso do estabelecimento de siste-mas de troca de informações em tempo real, ou numa base diária, entre contribuintes e administrações, facilitando dessa forma o cumprimento dos deveres fi scais e as actividades inspectivas.

Outra solução sugerida, de base tecnológica, consiste na digitali-zação e certifi cação das operações entre sujeitos passivos de IVA. Esse processo permitiria tratar como transacções e/ou aquisições intracomuni-tárias (com o direito ao crédito de imposto inerente) unicamente aquelas que fossem introduzidas no sistema e autenticadas pela administração fi scal como tendo tal natureza57.

Certas administrações fi scais europeias estão, inclusive, a desenvol-ver experiências piloto no sentido de fazer incidir os seus controlos não sobre operações específi cas mas sobre sistemas in-house, utilizados por determinadas empresas, construídos com base nos seus dados logísticos, administrativos, fi nanceiros e contabilísticos, facilitando assim a visão de conjunto da actividade da empresa e da sua cadeia de relações comer-ciais. As empresas objecto desse controlo são seleccionadas em função do grau de confi ança nelas depositado pelas autoridades58.

Estas soluções vão ao encontro da necessidade, já expressa, quer pelos representantes das empresas59, quer pela jurisprudência comunitá-ria60, de tratar de forma distinta realidades diferentes, isto é, distinguir os operadores que estão no mercado e cumprem as normas fi scais dos que

57 MTIC (Carousel) Fraud: Twelve ways forward; two ways “preferred” – Has the technology-based administrative solution be rejected? – Richard Thompson Ainsworth, Boston University School of Law, working paper series, WP 08-10, 3/7/2008.

58 Esta temática foi, aliás, objecto de um seminário organizado pela administração fi scal holandesa em Janeiro de 2009 em que foi debatido o uso de soluções digitais para melhorar o relacionamento entre as administrações e os contribuintes no cumprimento das obrigações fi scais, inspecções e comunicação em geral. A documentação relativa a este evento pode ser encontrada em http://ec.europa.eu/taxation_customs/taxation/vat/vat_conferences/article_5467_fr.htm

59 Combating VAT fraud in the EU – The way forward, International VAT Associa-tion, Report presented to the European Commission, March 2007.

60 Ver os nºs 52 a 61 do Acórdão Kittel, de 6 de Julho de 2006, proferido nos pro-cessos apensos C-439/04 e C-440/04.

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dissimulam, por detrás de uma aparente actividade económica, os seus verdadeiros intuitos fraudulentos.

Todavia, este tipo de soluções exige a instituição de um novo rela-cionamento entre as partes envolvidas, baseado na confi ança mútua, transparência e compreensão. Além disso, põe-se igualmente a questão, face à actual conjuntura de restrição de encargos fi nanceiros para as enti-dades públicas e privadas, da oportunidade da realização dos investi-mentos necessários à exploração e desenvolvimento de novas soluções tecnológicas.

Numa época de desafi os constantes, a todos os níveis, também neste domínio é necessário estar atento aos ventos da mudança, ter ambição e procurar novas oportunidades. A bem dos contribuintes que cumprem os seus deveres cívicos e vêm a sua sobrevivência ameaçada pelos que, violando as normas, distorcem a concorrência. E a bem dos utentes dos bens e serviços públicos que vêem difi cultado o acesso aos mesmos dada a redução da capacidade fi nanceira do Estado resultante da fraude e da evasão fi scais.

Referências

Ainsworth, Richard Thompson – MTIC (Carousel) Fraud: Twelve ways forward; two ways “preferred” – Has the technology-based administrative solu-tion be rejected? Boston University School of Law, working paper series, WP 08-10, 3/7/2008

Alexandre, Mário Alberto – “A troca de informações como base funda-mental para o controlo do IVA nas transacções intracomunitárias de bens na União Europeia” in Estudos em memória de Teresa Lemos, Cadernos de Ciên-cia e Técnica Fiscal, nº 202, pag. 243 e segs.

Business Europe – Message on combating VAT fraud – improve effi ciency of tax administrations and remove excessive risks and burdens on bona fi de businesses disponível em www.businesseurope.ue

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Artigos

Ciência e Técnica Fiscal (Centro de Estudos Fiscais da DGCI):

– Nº 419, Janeiro – Junho de 2007, pags. 151-209 – Estudo de impacto da substituição do actual sistema de IVA por um sistema generalizado de reverse charge

– Nº 420, Junho – Dezembro de 2007, pags. 343-374 – Estudo de impacto da eventual passagem à tributação na origem

Comissão Europeia:

– COM(2004)260 fi nal, de 16.04.2004– COM(2006)254 fi nal, de 31.05.2006– COM(2007)23 fi nal, de 24.01.2007– COM(2007)758 fi nal, de 23.11.2007– COM(2008)147 fi nal, de 22.02.2008– COM(2008)805 fi nal, de 1.12.2008— COM(2008)807 fi nal, de 1.12.2008– COM(2009)21 fi nal, de 28.01.2009— COM(2009)28 fi nal, de 02.02.2009

Conselho ECOFIN:

– Council Conclusions on combating tax fraud, 2804th Economic and Financial Affairs Council meeting. Luxembourg, 5 June 2007, 10 319/07 (presse 126)

– Council Conclusions on combating tax fraud, 2836th Economic and Financial Affairs Council meeting. Brussels, 4 December 2007, 15698/07 (presse 270)

– Conclusions du Conseil, 2894ème session du Conseil Affaires économi-ques et fi nancières – Lute contre la fraude à la TVA – Système Eurofi sc. Luxembourg, 7 octobre 2008, 13784/08 (presse 279)

Directivas do Conselho:

– 77/388/CEE, de 17.05.1977, publicada no JO L 145, de 13.06.1977, p.1 (Sexta Directiva IVA)

– 2006/112/CE, de 28.11.2006, publicada no JO L 347 de 11 de Dezembro de 2006, p. 1 e seguintes (Directiva IVA)

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– 2008/8/CE, de 12.02.2008, publicada no JO L 44 de 20.02.2008, p. 11 (Novas regras de localização dos serviços)

– 2008/55/CE, de 26.05.2008, publicada no JO L 150 de 10 de Junho de 2008, p. 28 e seguintes (Assistência mútua na cobrança)

Europol – Press release, Experts discuss Missing Trader Inter-Community Fraud (Dec. 13, 2006) disponível em hhtp://www.europol.europa.eu

International VAT Association – Combating VAT fraud in the EU – The way forward, Report presented to the European Commission, March 2007 dis-ponível em http://www.iva-online.org

Keen, Michael e Smith, Stephen – “VAT Fraud and Evasion: What do we know and what can be done?” – Documento de trabalho nº 07/31 do Fundo Monetário Internacional

Kovács, Lászlo – “EC’s new initiatives in the fi eld of the fi ght against tax fraud”, 28.09.2007 disponível em: http://ec.europa.eu/commission_barroso/kovacs/speeches/Lisbon_speech_28092007.pdf

Pinto, Miguel Silva, Maria Conceição Lopes e José M. M. Marreiros – Exercícios práticos resolvidos de IVA”, 3ª Edição, Novembro de 2005, Áreas Editora

Pinto, Miguel Silva – Contributos da jurisprudência comunitária para a luta contra a fraude ao IVA”, ” in Estudos em memória de Teresa Lemos, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, nº 202, pags. 271 e segs.

Price Waterhouse Coopers – Study in respect of introducing a change in the requirements to the recapitulative statements – Increase of submission fre-quency – Final Report to the European Commission, 15 November 2007 dispo-nível em: http://ec.europa.eu/taxation_customs/common/publications/studies/index_fr.htm.

Regulamento CE 1798/2003, de 7 de Outubro de 2003, publicado no JOCE L 264, de 15.10.2003, p.1

Tomaz, João José Amaral – “O mecanismo de autoliquidação do IVA (reverse charge) e o combate à fraude ao IVA” in Estudos em memória de Teresa Lemos, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, nº 202, pags. 123 e segs.

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Sérgio Gonçalves do Cabo

Saneamento e reequilíbrio fi nanceiro municipal*

Sérgio Gonçalves do Cabo

Mestre em DireitoDoutorando da Faculdade de Direito de Lisboa

_____________________________

* O presente artigo corresponde a uma versão condensada de um trabalho com o mesmo título, a publicar nos estudos em homenagem ao Professor Doutor Paulo de Pitta e Cunha

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RESUMO

O Presente trabalho analisa a questão do desequilíbrio fi nanceiro municipal per-correndo os sucessivos regimes de endividamento municipal e, em especial, o regime especial de acesso ao crédito para saneamento ou reequilíbrio fi nanceiro municipal resultante da quinta lei das fi nanças locais (Lei n.º 2/2007), mostrando-se especialmente crítico quanto às soluções consagradas no Decreto-Lei n.º 38/2008, que, a pretexto de vir densifi car e regulamentar a quinta lei das fi nanças locais, acabou por introduzir entorses muito signifi cativos no modelo dualista de reequilíbrio fi nanceiro municipal em vigor desde 1984, aproximando, em termos que se afi guram inconstitucionais ou ilegais, as situações de saneamento às situações de reequilíbrio fi nanceiro municipal.

Palavras chave:Finanças locaisEndividamento municipalRecurso ao crédito pelos municípiosSaneamento fi nanceiro municipalReequilíbrio fi nanceiro municipal

ABSTRACT

This article analyses the problems raised by the fi scal imbalances of local govern-ment in Portugal. It runs through the several legal regimes of local government debt in Portugal, paying particular attention to the special regime for credit recovery or rebal-ancing of fi nancially stressed municipalities after the approval of the 5th law on local fi nances (Law No. 2/2007). The author is particularly critic of the solutions laid down in Decree-Law No. 38/2008, which was purported to develop the 5th law on local fi nances. He believes that Decree-Law No. 38/2008 has introduced several distortions to the dual model of local government recovery set forth since 1984 by amalgamating the special regime for credit recovery and the special regime for rebalancing fi nancially stressed municipalities. He also believes that Decree-Law No. 38/2008 might be at several instances in contradiction with the 5th law on local fi nances.

Keywords:Local FinanceMunicipal debtFinancial recovery of stressed municipalitiesRebalancing fi nancially troubled municipalities

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1. Introdução

É corrente a afi rmação de que as situações de desequilíbrio fi nan-ceiro municipal têm a sua origem em insufi ciências estruturais de receita face às despesas emergentes das atribuições municipais. Contudo, na maior parte dos casos, essas situações encontram as suas causas em erros de previsão e execução orçamental, os quais refl ectem opções de gestão municipal que não se enquadram na realidade fi nanceira do conjunto das autarquias ou de cada autarquia em concreto.

Efectivamente, tendo em conta os elementos constantes do ANUÁ-RIO FINANCEIRO DOS MUNICÍPIOS PORTUGUESES 2006, verifi ca-se que uma análise da situação fi nanceira global dos municípios portugueses numa óptica de compromissos (modifi ed cash basis) permite concluir que «o grau médio de execução da despesa (compromissos assumidos) é mani-festamente superior ao da receita (direitos adquiridos ou liquidações)».1

Na realidade e conforme resulta do quadro 1, o diferencial médio entre a despesa comprometida e a receita liquidada situa-se nos 17%, o que revela uma discrepância signifi cativa entre a execução do orçamento das receitas e a execução do orçamento das despesas que, segundo o ANUÁRIO FINANCEIRO DOS MUNICÍPIOS PORTUGUESES 2006, «é uma das cau-sas do despesismo da Administração Local».2

1 Cf. João Carvalho, Maria José Fernandes, Pedro Camões e Susana Jorge, Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses 2006, Câmara dos Técnicos Ofi ciais de Contas, 2008, p. 87.

2 Essas discrepâncias atingem valores ainda mais signifi cativos numa óptica de caixa, uma vez que, em 2006, as receitas por cobrar correspondem a 8,3% do total das receitas liquidadas, ao passo que as despesas por pagar correspondem a 30% das despe-sas comprometidas. Aliás, segundo o Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses 2006, à data de 31 de Dezembro de 2006, o sector autárquico dispunha de meios fi nan-ceiros para pagar menos de metade da sua dívida a terceiros. Cf. João Carvalho, Maria José Fernandes, Pedro Camões e Susana Jorge, Anuário Financeiro dos Municípios Por-tugueses 2006, cit., pp. 66 e 73-75.

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QUADRO 1

Indicadores de despesa e receita com base nos compromissos e liquidações

Fonte: Quadro retirado de João Carvalho, Maria José Fernandes, Pedro Camões e Susana Jorge, Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses 2006, Câmara dos Técnicos Ofi ciais de Contas, 2008, p. 87.

De facto, segundo a mesma publicação, «a despesa foi sustentada numa dotação previsional que na globalidade foi atribuída pela existên-cia previsional de determinado volume de recursos fi nanceiros que a sus-tentasse», mas a concretização desta despesa acaba por ter lugar «inde-pendentemente da realização ou não da receita», o que está na origem da «falta de liquidez da generalidade dos municípios e do crescimento da dívida de curto prazo, face às limitações legais ao endividamento ban-cário». De resto, como também se assinala no ANUÁRIO FINANCEIRO DOS MUNICÍPIOS PORTUGUESES 2006, devido «à sobreavaliação dos orçamentos de receita, é possível a realização de despesas públicas para as quais embora existam dotações orçamentais no orçamento da despesa, em sede de execução não se realizam as receitas necessárias para a sua sustenta-ção, originando por contrapartida, dívida a fornecedores para além do próprio ano económico» o que constitui, segundo a mesma publicação,

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um dos «aspectos mais negativos da gestão municipal»,3 que se refl ecte no facto de, em Dezembro de 2006, 71 municípios apresentarem um valor de dívidas a fornecedores superior a 50% das receitas totais do ano anterior (23 pequenos municípios, 22 municípios médios e 3 municípios grandes).4

Sendo certo que as características populacionais e geográfi cas de cada autarquia, bem como as necessidades específi cas das respectivas populações e o modo como, em cada caso concreto, as mesmas são satis-feitas pelos órgãos autárquicos, podem gerar situações muito diferencia-das no plano da relação entre receitas e despesas e no grau de efi ciência e efi cácia na provisão de bens e serviços públicos, a verdade é que, no seu conjunto, os recursos ao dispor das autarquias foram substancialmente reforçados a partir da quarta Lei das Finanças Locais (Lei n.º 42/98) e das reformas da tributação do património (Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de Novembro5) e da tributação automóvel (Lei n.º 22-A/2007, de 29 de Junho6) não permitindo a utilização do argumento de que as situações de desequilíbrio fi nanceiro local decorrem de insufi ciências estruturais ao nível das receitas.

Aliás, a este propósito, importa notar que as transferências para os municípios e freguesias passaram de 6,8 mil milhões de euros no período de 1996 a 2000, para 10,6 mil milhões de euros no período de 2001 a 2005.7

Tudo isto permite concluir que a problemática dos desequilíbrios fi nanceiros municipais não se coloca, fundamentalmente, no plano da relação entre atribuições e meios fi nanceiros, mas, outrossim, ao nível da forma como os recursos disponíveis são aplicados por cada autarquia. Por isso, não se pode dizer que a problemática dos desequilíbrios fi nan-ceiros municipais radique numa insufi ciência estrutural de receita face

3 Cf. João Carvalho, Maria José Fernandes, Pedro Camões e Susana Jorge, Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses 2006, cit., p. 127.

4 Cf. João Carvalho, Maria José Fernandes, Pedro Camões e Susana Jorge, Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses 2006, cit., p. 131.

5 Alterado pelo Decreto-Lei n.º 211/2005, de 7 de Dezembro, pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro e pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro.

6 Alterada pela Lei n.º 67-A/2007, de 31 de Dezembro.7 Cf. DGAL, Finanças Locais – Indicadores das Autarquias Locais, 2005.

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às despesas municipais, afi gurando-se mais correcto o entendimento de que tais situações se prendem, sobretudo, com erros de previsão orça-mental, sobreavaliando receitas de modo a assegurar a realização de um determinado programa de despesas, ou mesmo com problemas de má gestão dos recursos disponíveis.8

Na verdade, apesar do signifi cativo aumento das receitas muni-cipais ocorrido entre 2000 e 2006, o nível de endividamento total das autarquias locais mais do que duplicou nesse período, parecendo legiti-mar a conclusão de que o efeito conjugado da descida das taxas de juro e do aumento das receitas locais terá contribuído para um crescimento signifi cativo da despesa pública autárquica fi nanciada pelo recurso ao crédito (cfr. quadro 2).9 Contudo, se considerarmos apenas o endivida-mento de curto prazo, verifi camos que este praticamente quadruplicou neste período, passando de 631 milhões de euros em 2000 para 2188 milhões de euros em 2006.

Signifi ca isto que, na sua essência, a problemática do equilíbrio das fi nanças municipais se relaciona mais com a resolução de problemas de liquidez ou de solvência, associados à má previsão orçamental e à má gestão municipal, do que com a problemática do nível de receitas ou do grau de independência fi nanceira dos municípios portugueses, com que muitas vezes anda confundida.

Acontece, porém, que a solução prevista pelo legislador para resol-ver tais problemas de liquidez ou de solvência acabou por se traduzir na construção de um regime especial de acesso ao crédito para saneamento ou reequilíbrio fi nanceiro municipal.

8 JORGE CORREIA DA CUNHA e PATRÍCIA SILVA chegam mesmo a argumentar que, na sequência da Lei das Finanças Locais de 1998, teve lugar um «alargamento da restrição orçamental deste subsector, sem que tenha ocorrido uma aumento signifi cativo das suas competências e atribuições» (cf. Finanças Locais e Consolidação Orçamental em Portu-gal, Boletim Económico do Banco de Portugal, Março de 2002, p. 52).

9 Cf. Jorge Correia da Cunha e Patrícia Silva Finanças Locais e Consolidação Orçamental em Portugal, Boletim Económico do Banco de Portugal, Março de 2002, pp. 53-54. JOÃO PAULO ZBYSZEWSKI, avança ainda como justifi cação para esse aumento do endividamento o facto de os municípios terem pretendido aproveitar as verbas dispo-níveis no âmbito do terceiro quadro comunitário de apoio 2000-2006 (O Financiamento das Autarquias Locais cit., pp. 125-126).

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QUADRO 2

Evolução Financeira dos Municípios Portugueses (2000-2006)

(Milhares de Euros)

ANO 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

RECEITAS TOTAIS 5 375 053 6 462 291 6 979 870 6 510 556 7 163 476 7 606 570 7 387 786

DESPESAS TOTAIS 5 467 536 6 449 517 6 725 864 6 627 197 6 720 806 7 180 498 6 939 253

SALDO FINAL GERÊNCIA 244 799 257 610 512 8238 352 297 442 670 426 072 448 532

ENDIVID. CURTO PRAZO 631 384 1 117 749 1 228 037 1 353 992 1 452 821 2 197 192 2 188 189

ENDIVID. MÉDIO / LONGO PRAZO

2 076 895 2 703 382 3 619 489 4 038 234 4 194 763 4 396 710 4 448 915

TOTAL ENDIVIDAMENTO

2 708 279 3 821 131 4 847 526 5 392 226 5 647 584 6 593 903 6 637 104

SALDO FINAL GERÊNCIA / DÍVIDAS CURTO PRAZO

39% 23% 42% 26% 30% 19% 20%

Fonte: DGAL. Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses 2006.

Numa primeira leitura, tal solução parece fazer pouco sentido, aten-dendo às causas do desequilíbrio fi nanceiro municipal: se as situações de desequilíbrio fi nanceiro municipal se devem, fundamentalmente, a problemas de previsão e execução orçamental, com discrepâncias muito signifi cativas na execução do orçamento das receitas face ao orçamento das despesas, não parece compreensível que os municípios em situação de desequilíbrio fi nanceiro possam contar, nesses casos, com um regime especial de acesso ao crédito para saneamento ou reequilíbrio fi nanceiro municipal.

Contudo, numa segunda leitura, dir-se-á que importa igualmente ponderar os interesses que fi cariam postos em causa caso, porventura, se optasse por resolver essas situações de desequilíbrio fi nanceiro munici-pal através de transferências orçamentais ou mediante reduções abruptas da despesa pública municipal, obrigando o município a ajustar a despesa ao nível das receitas em períodos muito curtos. Desde logo, a solução das transferências orçamentais teria que estar associada a reduções de transferências futuras, sob pena de desresponsabilizar os autarcas, trans-ferindo para a generalidade dos contribuintes os custos de uma gestão municipal pouco prudente. Já a solução de uma redução abrupta da des-

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pesa pública local de modo a gerar os excedentes necessários para pagar aos credores poder-se-ia traduzir em cortes no nível de provisão pública municipal, prejudicando o bem-estar das populações.

Por isso, sendo o problema do desequilíbrio fi nanceiro munici-pal, fundamentalmente, um problema de má gestão autárquica ou, pelo menos, de gestão imprudente ou pouco prudente, qualquer solução que se pretenda implementar tendo em vista a sua resolução não pode, por um lado, deixar de responsabilizar os autarcas e, por outro lado, preju-dicar os credores e as populações locais, ou recair sobre a generalidade dos contribuintes.

Para se poder compreender e avaliar, na sua plenitude, o conteúdo e alcance desse regime especial de acesso ao crédito, importa analisar o regime geral de acesso ao crédito pelos municípios, de modo a apreciar a forma como o legislador procurou resolver os problemas de desequilí-brio fi nanceiro municipal no quadro da garantia constitucional da auto-nomia local.

2. O recurso ao crédito pelos municípios

Embora permitido pelas sucessivas Leis das Finanças Locais, o endividamento municipal foi sempre rodeado das maiores cautelas, numa primeira fase devido ao modo de fi nanciamento dos municípios – assente, fundamentalmente, em transferências do orçamento do Estado – e à necessidade de garantir o equilíbrio das fi nanças municipais10 e, numa segunda fase – quando as receitas próprias dos municípios ultra-passaram as transferências do orçamento do Estado – devido à necessi-dade de assegurar o equilíbrio do conjunto do Sector Público Adminis-trativo (SPA) em função dos compromissos de estabilidade das fi nanças públicas assumidos no quadro da participação de Portugal na União Eco-nómica e Monetária (cfr. Lei da Estabilidade Orçamental – Lei Orgânica n.º 2/2002, de 28 de Agosto).11

10 Cf. Sousa Franco, Finanças do Sector Público. Introdução aos Subsectores Ins-titucionais, Lisboa, AAFDL, 1991, pp. 528-544.

11 Cf. Nazaré da Costa Cabral, O Recurso ao Crédito nas Autarquias Locais Por-tuguesas, Lisboa, AAFDL, 2003, pp. 7-9, 32-35.

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Nesta conformidade, não é de estranhar que as sucessivas leis das fi nanças locais tenham procurado demarcar as circunstâncias em que era admitido o endividamento municipal, quer limitando o seu mon-tante, quer restringindo os encargos anuais com amortizações e juros, quer ainda condicionando o recurso ao crédito em função das fi nalidades do empréstimo: a primeira lei das fi nanças locais (Lei n.º 1/79, de 2 de Janeiro) limitava a contracção de empréstimos a entidades públicas de crédito (artigo 15.º, n.º 1), não permitia que o montante dos empréstimos a curto prazo pudesse exceder 1/12 das receitas orçamentadas para inves-timento pelo município (artigo 15.º, n.º 3) e que os encargos anuais com amortizações e juros dos empréstimos a médio e longo prazo excedes-sem 20% do montante anual das receitas orçamentadas para investimen-tos (artigo 15.º, n.º 4). Por outro lado, o endividamento de curto prazo só podia ser contraído para acorrer a difi culdades momentâneas de tesou-raria, não podendo ser utilizado para despesas correntes, ao passo que os empréstimos de médio e longo prazo só podiam ser contraídos para aplicação em investimentos reprodutivos, de carácter social ou cultural e ainda para proceder ao saneamento fi nanceiro dos municípios (artigo 15.º, n.ºs 2 e 3).

A segunda lei das fi nanças locais (Decreto-Lei n.º 98/84, de 29 de Março) veio ampliar a possibilidade de recurso ao crédito, quer permi-tindo a sua contratação junto de «quaisquer instituições de crédito nacio-nais» (artigo 11.º, n.º 1),12 quer autorizando o fi nanciamento directo dos municípios através da emissão de obrigações (artigo 11.º, n.º 3).13 Além disso, ao indexar o montante dos empréstimos de curto prazo a 5% do Fundo de Equilíbrio Financeiro (FEF) atribuído ao município, e ao pre-ver que os encargos anuais com amortizações e juros de empréstimos a médio e longo prazos não possam exceder o maior dos limites correspon-dentes a 20% do FEF ou 20% das despesas de investimento realizadas pelo município no ano anterior, excepcionando deste limite os emprés-

12 Não obstante, o recurso ao crédito junto de entidades privadas, só era permitido desde que não ocasionasse «encargos nem condições de amortização mais desfavoráveis do que os que resultem da sua contracção, em equivalentes condições de acesso, perante instituições públicas de crédito nacionais» (artigo 11.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 98/84).

13 Esta possibilidade viria a revelar-se mais teórica do que real, conforme se pode ver em Marta Rebelo, Obrigações Municipais, Almedina, 2004, pp. 75-110.

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timos contraídos para a construção de habitações destinadas a venda, bem como os empréstimos para reparação, conservação e reabilitação de edifícios, a segunda lei das fi nanças locais veio aumentar os plafonds do crédito municipal (cfr. preâmbulo do Decreto-Lei n.º 98/84).

A terceira lei das fi nanças locais (Lei n.º 1/87, de 6 de Janeiro) mantendo, no essencial, as soluções constantes da anterior, aumentou para 10% do FEF o montante dos empréstimos a curto prazo, permitindo ainda que os encargos anuais com amortizações e juros dos emprésti-mos a médio e longo prazo (incluindo os empréstimos obrigacionistas) tenham como limite o maior dos valores correspondente a três duodéci-mos do FEF ou a 20% das despesas realizadas para investimento pelo município no ano anterior.

A quarta lei das fi nanças locais (Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto) eli-minou a regra de que os empréstimos contraídos perante entidades priva-das não podem ocasionar «encargos nem condições de amortização mais desfavoráveis do que os que resultem da sua contracção, em equivalentes condições de acesso, perante instituições públicas de crédito nacionais» (artigo 15.º, n.º 8 da Lei n.º 1/87) a qual foi substituída pela regra de que os municípios «podem contrair empréstimos e utilizar aberturas de crédito junto de quaisquer instituições autorizadas por lei a conceder cré-dito, bem como emitir obrigações e celebrar contratos de locação fi nan-ceira, nos termos da lei» (artigo 23.º, n.º 1 da Lei n.º 42/98).

O endividamento municipal passou a estar imperativamente sujeito aos princípios do rigor e da efi ciência e aos seguintes objectivos: «a) Minimização de custos directos e indirectos numa perspectiva de longo prazo; b) Garantia de uma distribuição equilibrada de custos pelos vários orçamentos anuais; c) Prevenção de excessiva concentração temporal de amortização; d) Não exposição a riscos excessivos» (artigo 23.º, n.º 2 da Lei n.º 42/98).

Além disso foram fi xados prazos máximos de vencimento para os empréstimos de médio e longo prazo, matéria que, até então, estava omissa na lei das fi nanças locais,14 exigindo-se ainda uma consulta ao

14 O Decreto-Lei n.º 258/79, de 28 de Julho, que veio regulamentar o recurso ao crédito por parte das autarquias locais em cumprimento do disposto no n.º 6 do artigo 15.º da Lei n.º 1/79, consagrou o princípio da adequação dos prazos de vencimento dos empréstimos contraídos pelos municípios, que não poderiam, em caso algum, «exceder a

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mercado antes de se submeter à assembleia municipal o pedido de auto-rização para a contracção de empréstimos de médio e longo prazo (artigo 23.º, n.ºs 4 e 5 da Lei n.º 42/98). Quanto ao mais manteve-se a indexação do montante dos empréstimos a curto prazo às receitas provenientes de transferências orçamentais (10% das receitas provenientes das participa-ções do município nos Fundos Geral Municipal e de Coesão Municipal) com a particularidade de esse limite se referir agora ao «montante médio anual» dos empréstimos a curto prazo. Manteve-se igualmente a «a regra de ouro da limitação de encargos»15 anuais com amortizações e juros dos empréstimos a médio e longo prazo, incluindo empréstimos obriga-cionistas, os quais não podem exceder o maior dos limites do valor cor-respondente a três duodécimos dos Fundos Geral Municipal e de Coesão Municipal ou 20% das despesas realizadas para investimento pelo muni-cípio no ano anterior (artigo 24.º, n.ºs 1 e 3 da Lei n.º 42/98).16

Até à quarta lei das fi nanças locais (Lei n.º 42/98), os limites ao endividamento municipal apenas incidiam sobre o montante e as fi nali-dades dos empréstimos de curto prazo e sobre as fi nalidades e os encargos

vida útil do respectivo investimento ou o período de recuperação dos encargos fi nancei-ros deles resultantes» (artigo 10.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 258/79). O mesmo diploma consagrou igualmente a regra de que os empréstimos a longo prazo não poderiam, em caso algum, «ter um prazo superior a quinze anos» (artigo 10.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 258/79). Esta regra viria a ser revogada pelo artigo 34.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 98/84 (segunda Lei das Finanças Locais) só voltando a ser introduzida com a quarta Lei das Finanças Locais, que fi xou em 20 anos o prazo máximo de vencimento dos empréstimos de médio e longo prazo. Este prazo, seria, no entanto, modifi cado pelo artigo 28.º da Lei n.º 3-B/2000, de 4 de Abril, que aprovou o Orçamento do Estado para 2000, e passou a distinguir os empréstimos contratados para aquisição e construção de habitação a cus-tos controlados destinada a arrendamento, com prazo máximo de 25 anos, dos demais empréstimos, com prazo máximo de 20 anos.

15 Cf. Sousa Franco, Finanças do Sector Público. Introdução aos Subsectores Ins-titucionais, cit., p. 546.

16 Continuam excluídos da regra da limitação dos encargos os empréstimos para aquisição, construção ou recuperação de imóveis destinados à habitação social e os empréstimos contraídos com o fi m exclusivo de acorrer a despesas extraordinárias neces-sárias a reparação de prejuízos resultantes de calamidade pública. Contudo, passaram a estar excluídos da regra da limitação dos encargos os empréstimos destinados à amorti-zação de outros empréstimos durante o tempo necessário para o efeito (artigo 24.º, n.º 6 da Lei n.º 42/98).

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dos empréstimos a médio e longo prazo, não existindo qualquer limite quantitativo para o endividamento municipal delineado em função da respectiva capacidade/necessidade líquida de fi nanciamento. Por outras palavras, os limites quantitativos ao endividamento municipal estavam concebidos em termos stocks para os empréstimos a curto prazo e em termos de fl uxos (juros e amortizações) para os empréstimos a médio e longo prazo, independentemente, neste último caso, da relação entre o volume total da dívida de médio e longo prazo e as receitas municipais.

Esta situação seria profundamente alterada a partir de 2002, com a aprovação da Lei n.º 16-A/2002, de 31 de Maio, que veio proibir a con-tracção pelos municípios e empresas municipais de «quaisquer emprésti-mos que impliquem o aumento do seu endividamento líquido no decurso do ano orçamental», com excepção dos «empréstimos destinados a pro-gramas de habitação social promovidos pelos municípios, à construção e reabilitação das infra-estruturas no âmbito do EURO 2004 e ao fi nancia-mento de projectos com comparticipação de fundos comunitário». A falta de cumprimento daquela proibição permitia ao Governo «determinar a redução, em proporção do incumprimento verifi cado, das transferências a efectuar, nos termos da Lei n.º 42/98, de 6 de Agosto, após audição do respectivo município» (artigo 7.º da Lei n.º 16-A/2002).

No entanto, o legislador não defi niu o conceito de endividamento líquido, nem os critérios que deveriam presidir à sua determinação, o que só viria a suceder com a Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro, que aprovou o orçamento do Estado para 2003.17

17 Nos termos do artigo 19.º, n.º 5 da Lei n.º 32-B/2002 «o conceito de endivida-mento líquido é o defi nido no sistema europeu de contas nacionais e regionais (SEC95)». Esta defi nição manteve-se ao longo das sucessivas leis orçamentais e só foi densifi cada no artigo 33.º, n.º 5 da Lei do Orçamento do Estado para 2006 (Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro) nos seguintes termos:

«O montante de endividamento líquido, compatível com o conceito de necessidade de fi nanciamento do Sistema Europeu de Contas Nacionais e Regionais (SEC95), resulta da diferença entre a soma dos passivos fi nanceiros, qualquer que seja a sua forma, incluindo nomeadamente os empréstimos contraídos, os contratos de locação fi nanceira e as dívidas a fornecedores, e a soma dos activos fi nanceiros, nomeadamente o saldo de caixa, os depósitos em instituições fi nanceiras e as aplicações de tesouraria».

Esta defi nição, como veremos, seria retomada, com ligeiras alterações, pelo artigo 36.º, n.º 1 da quinta lei das fi nanças locais (Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro).

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Apesar da alteração à Lei das Finanças Locais operada pela Lei da Estabilidade Orçamental,18 que lhe aditou um artigo 35.º-A com objec-tivo de evitar que a Lei das Finanças Locais pudesse ser invocada para pôr em causa os princípios da estabilidade orçamental, da solidariedade recíproca e da transparência orçamental,19 a questão do endividamento dos municípios passou a ter um tratamento casuístico, em função do dis-posto no artigo 84.º da Lei de Enquadramento Orçamental (LEO),20 que condiciona os limites específi cos de endividamento anual da administra-ção central do Estado, das Regiões Autónomas e das autarquias locais, ao cumprimento das obrigações de estabilidade orçamental decorrentes do Programa de Estabilidade e Crescimento.

Assim, a questão dos limites ao endividamento municipal de médio e longo prazo21 deixou de ser regulada na lei das fi nanças locais e pas-sou a ser objecto de disciplina anual através das sucessivas leis do orça-mento, que passaram a incluir dois tipos de limites:

– um limite especifi co para o endividamento de médio e longo prazo de cada município, formulado em termos de fl uxos (juros e amortizações);

– um limite global do montante de endividamento líquido do con-junto dos municípios, formulado em termos de stocks por apelo ao conceito de endividamento líquido defi nido no sistema euro-peu de contas nacionais e regionais (SEC95).

18 A denominada Lei da Estabilidade Orçamental (Lei Orgânica n.º 2/2002, de 28 de Agosto) traduziu-se numa alteração à Lei de Enquadramento Orçamental (Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto).

19 O artigo 35.º-A tinha a seguinte redacção:«Artigo 35.º-ARealização do Programa de Estabilidade e CrescimentoA presente lei não exclui a aplicação das normas do novo título V da Lei de Enqua dra-mento Orçamental, até à plena realização do Programa de Estabilidade e Crescimento».

20 Na redacção da Lei da Estabilidade Orçamental (Lei Orgânica n.º 2/2002, de 28 de Agosto).

21 Só esta, já que o endividamento de curto prazo se manteve indexado às receitas provenientes de transferências orçamentais.

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O primeiro limite manteve a mesma formulação ao longo dos anos até à aprovação da quinta lei das fi nanças locais (Lei n.º 2/2007, de 15 de Janeiro).

O segundo limite manteve-se até à Lei do Orçamento do Estado para 2006 como um limite global ao montante endividamento líquido do conjunto dos municípios, em contabilidade nacional, o qual não poderia exceder o verifi cado no ano anterior. Esta solução traduziu-se no con-gelamento da capacidade de endividamento do conjunto do subsector a partir de 2002,22 embora se tenha procurado mitigar a situação através de um sistema de rateio de acordo com o qual o montante global das

22 Estas proibições e limitações funcionaram sempre com excepção dos emprés-timos e amortizações de empréstimos para construção e reabilitação de infra-estruturas no âmbito do EURO 2004, devendo, no entanto, ser utilizados, para esse efeito, priorita-riamente, os recursos fi nanceiros próprios (OE 2003); e com excepção do fi nanciamento de projectos com comparticipação de fundos comunitários, sendo o acesso dos municí-pios a estes créditos autorizado por despacho conjunto dos Ministros das Finanças e das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente, mediante parecer prévio da Associação Nacional de Municípios Portugueses ou a solicitação desta (OE 2004). As condições de acesso ao crédito para fi nanciamento de projectos com comparticipação de fundos comu-nitários seriam, posteriormente, detalhadas nos seguintes termos (OE 2005): o montante máximo do crédito não podia exceder 75% do montante da contrapartida nacional neces-sária para a execução dos projectos de infra-estruturas e equipamentos, integrados no Quadro Comunitário de Apoio 2000-2006 ou na iniciativa comunitária INTERREG III, co-fi nanciados pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) ou pelo Fundo de Coesão; e os projectos a considerar seriam apenas os projectos homologados entre Julho de 2004 e 31 de Dezembro de 2005 e referentes às seguintes tipologias: i) Remodelação e construção de redes de saneamento básico; ii) Infra-estruturas para acolhimento industrial; iii) Modernização/dinamização de infra-estruturas de apoio ao comércio; v) Infra-estruturas de apoio ao turismo da natureza; v) Construção e remode-lação de equipamento educativo; vi) Construção e requalifi cação de vias municipais; vii) Intervenções integradas de reconversão urbana; viii) Construção e remodelação de equi-pamentos e infra-estruturas desportivas; ix) Construção e remodelação de equipamentos culturais; x) Projectos para promoção da sociedade de informação e do conhecimento.

Um pouco estranhamente e ao arrepio das regras de acesso ao crédito de curto prazo constantes da quarta Lei das Finanças Locais, a Lei n.º 39-A/2005, de 29 de Julho (alteração ao Orçamento do Estado para 2005) veio permitir a contratação de emprésti-mos de curto prazo para o fi nanciamento da participação pública municipal em projectos aprovados no âmbito da iniciativa comunitária INTERREG III que, reunidas algumas condições, poderia deixar de ser fi nanciada através de empréstimos de médio/longo prazo. Desconhece-se em que medida esta possibilidade terá contribuído para agravar a

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amortizações efectuadas pelos municípios no ano N-2 (corrigido até 30 de Junho pelos valores das amortizações efectuadas no ano N-1) seria rateado para efeitos de acesso a novos empréstimos, proporcionalmente à soma dos valores dos Fundos Geral Municipal, de Coesão Municipal e de Base Municipal, entre os municípios que não estivessem abrangidos pela proibição do endividamento a médio e longo prazo.

A Lei do Orçamento do Estado para 2006 (Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro), apesar de manter o limite ao montante global do endi-vidamento líquido do conjunto dos municípios, apurado de acordo com as normas do Sistema Europeu de Contas Nacionais e Regionais (SEC 95) veio introduzir o conceito de limite ao endividamento líquido de cada município, o qual não podia exceder no ano N, o existente no ano N-1 acrescido do valor que coubesse ao município no procedimento de rateio e diminuído do valor das amortizações de empréstimos efectuadas durante o ano N (artigo 33.º, n.ºs 5 e 6 da Lei n.º 60-A/2005).

Este limite visava aplicar à escala municipal a restrição orçamental imposta ao conjunto dos municípios, antecipando a solução que viria a constar da Lei do Orçamento do Estado para 2007 (Lei n.º 53-A/2006, e 29 de Dezembro) e da quinta lei das fi nanças locais, nos termos da qual o endividamento municipal passa a estar indexado ao conjunto de receitas mais signifi cativo dos municípios (v. quadro 3).

Ou seja, com a entrada em vigor do orçamento do Estado para 2007 e da quinta lei das fi nanças locais, o limite global ao montante endivida-mento líquido do conjunto dos municípios foi substituído por um limite ao montante de endividamento líquido de cada município, defi nido de acordo com o conceito de necessidades líquidas de fi nanciamento, em contabilidade nacional, e calculado tendo por referência um cabaz com-posto pelas principais receitas dos municípios.23

Neste sentido, o novo conceito de endividamento líquido municipal introduzido no nosso direito fi nanceiro local a partir de 2007, implica que se proceda ao apuramento do stock líquido da dívida municipal –

dívida de curto prazo do conjunto do subsector, embora seja notório esse agravamento face a 2004 (cf. supra quadro 2).

23 Cf. Marta Rebelo, O Conceito de endividamento líquido municipal compatível com o SEC 95: interpretação do art. 36.º, n.º 1, da LFL, Direito Regional e Local, n.º 1 (Jan.-Mar. 2008), pp. 38-40.

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que há-de corresponder à diferença entre um determinado conjunto de activos e passivos fi nanceiros – e se verifi que se aquele stock excede em mais de 125% o conjunto das receitas composto por impostos munici-pais, participação do município nos impostos do Estado (FEF e parti-cipação variável até 5% no IRS) derrama e participação do município nos resultados das entidades do sector empresarial local relativos ao ano anterior.

QUADRO 3

Limites ao endividamento municipal a partir de 2007

Limites ao endividamento

municipal(Lei do Orçamento

do Estado para 2007e quinta lei das fi nanças locais)

Empréstimosde médio

e longo prazo

100% das receitas provenientes de impostos municipais, da participação do município nos impostos do Estado (FEF, FSM (*) e 5% da colecta de IRS (**)), da derrama e da participação nos

resultados das entidades do sector empresarial local relativos

ao ano anterior.

Endividamento líquido municipal

125% das receitas provenientes de impostos municipais, da participação do município nos impostos do Estado

(FEF, FSM (*) e 5% da colecta de IRS), da derrama e da participação

nos resultados das entidades do sector empresarial local relativos

ao ano anterior.

*(*) As receitas correspondentes ao FSM seriam eliminadas deste cabaz de receitas pela LFL 2007.(**) Os 5% da colecta do IRS previstos no artigo 24.º, n.º 2, alínea c) da Lei do Orçamento do Estado

para 2007, foram convertidos pela LFL 2007 numa participação variável até 5% no IRS (cfr. artigos 19.º, n.º 1, alínea c) e 20.º da LFL 2007).

Caso tal suceda, não só o município fi ca obrigado a reduzir em cada ano subsequente pelo menos 10% do montante que excede o seu limite de endividamento líquido, até que aquele limite seja cumprido (artigo 37.º, n.º 2 da LFL 2007 e artigo 33.º, n.º 4 do OE 2007), como a violação do limite de endividamento líquido previsto para cada município origina uma redução no mesmo montante das transferências orçamentais devi-

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das no ano subsequente pelo subsector Estado, o qual é afecto ao Fundo de Regularização Municipal (artigo 5.º, n.º 4 da LFL 2007 e artigo 33.º, n.º 8 do OE 2007).

Além disso, o limite específi co para o endividamento de médio e longo prazo de cada município deixou de ser formulado em termos de fl uxos (juros e amortizações) para passar igualmente a ser formulado em termos de stocks, estando indexado a 100% do mesmo cabaz de receitas municipais (artigo 39.º, n.º 2 da LFL 2007).24 Para este efeito, conside-ram-se os empréstimos obrigacionistas, mas também os empréstimos de curto prazo e aberturas de crédito que não sejam amortizados até 31 de Dezembro do ano em causa (artigo 39.º, n.º 4 da LFL 2007).

Signifi ca isto que um município cujo endividamento de médio e longo prazo corresponda a 100% daquele cabaz de receitas, ainda não tem esgotada a sua capacidade de endividamento líquido, podendo dis-tribuir os 25% remanescentes por empréstimos de curto prazo – desde que estes, em termos absolutos, não excedam 10% do mesmo cabaz de receitas e sejam amortizados no ano em que são contraídos25 – contratos de locação fi nanceira e dívidas a fornecedores.

Por outras palavras, se o endividamento de curto prazo, as dívidas a fornecedores e os contratos de locação fi nanceira forem superiores a

24 Cf. João Carvalho e Ana Teixeira, O Recurso ao Crédito por parte das Autar-quias Locais, cit., pp. 116-123. Manteve-se, no entanto um conjunto de excepções aos limites de endividamento, quer nas leis do orçamento do Estado para 2007 e para 2008, quer na quinta lei das fi nanças locais, as quais não são totalmente coincidentes, uma vez que no OE 2007 constituem excepções ao limite do endividamento líquido e ao limite de endividamento de médio e longo prazo (artigo 33.º, n.ºs 5, 6 e 7), ao passo que na LFL 2007 apenas estão concebidas como excepções ao endividamento de médio e longo prazo (artigo 39.º, n.ºs 5, 6 e 7 da LFL 2007) e no OE 2008 parece que a excepção até abrange os limites de endividamento de curto prazo (artigo 27.º do OE 2008).

Além disso, a LFL 2007 exclui do limite do endividamento líquido e do limite de endividamento de médio e longo prazo os empréstimos e os encargos com emprésti-mos anteriormente contraídos ao abrigo de disposições legais que os excepcionavam dos limites de endividamento municipal; os empréstimos e os encargos com empréstimos a contrair para a conclusão dos programas especiais de realojamento (PER) cujos acordos de adesão tenham sido celebrados até 1995; e as dívidas dos municípios às empresas con-cessionárias do serviço de distribuição de energia eléctrica em baixa tensão, consolidadas até 31 de Dezembro de 1988 (cf. artigo 61.º, n.º 2 da LFL 2007).

25 Artigo 39.º, n.º 1 da LFL 2007.

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25% das principais receitas municipais; e se o município não pretender sujeitar-se ao quadro sancionatório previsto para os casos em que seja ultrapassada a respectiva capacidade de endividamento líquido, ver-se-á obrigado a reduzir o passivo de médio e longo prazo ou, então, a aumen-tar as suas receitas.

FIGURA 1

Limites de endividamento

Endividamento líquido (*)

125% das receitas provenientes de impostos municipais, da participação do município nos impostos do Estado (FEF, FSM e participação variável no IRS), da derrama e da participação nos resultados das entidades do sector empresarial local relativos ao ano anterior.

Endividamento de médioe longo prazo

100% das receitas provenientes de impostos municipais, da participação do município nos impostos do Estado (FEF, FSM e participação variável no IRS) da derrama e da participação nos resultados das entidades do sector empresarial local relativos ao ano anterior.

Endividamentode curto prazo

10% das receitas provenientes de impostos municipais, da participação do município nos impostos do Estado (FEF, FSM e participação variável no IRS), da derrama e da participação nos resultados das entidades do sector empresarial local relativos ao ano anterior.

Contratos de locação fi nanceira e dívidas a fornecedores

15% das receitas provenientes de impostos municipais, da participação do município nos impostos do Estado (FEF, FSM e participação variável no IRS), da derrama e da participação nos resultados das entidades do sector empresarial local relativos ao ano anterior (**)

*(*) O aumento das receitas alarga a capacidade de endividamento líquido.(**) Limite variável. A redução do endividamento de médio e longo prazo ou do endividamento de

curto prazo, permite o aumento do montante dos contratos de locação fi nanceira ou da dívida a fornecedores.

Por outro lado, pode dar-se o caso de um município exceder os res-pectivos limites de endividamento de médio e longo prazo, sem com isso exceder o limite de endividamento líquido: basta que não tenha outros passivos de curto prazo, dívidas a fornecedores ou contratos de locação fi nanceira, podendo alargar o endividamento de médio e longo prazo até

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125% daquele cabaz de receitas. Nesse caso, não excede o limite de endi-vidamento líquido, mas ultrapassa o limite do endividamento de médio e longo prazo, fi cando obrigado a reduzir, em cada ano subsequente, pelo menos 10% do montante que excede o seu limite de empréstimos, até que aquele limite seja cumprido (artigo 39.º, n.º 3 da LFL 2007).26

Ou seja, ao fi xar, simultaneamente, três limites ao endividamento municipal (endividamento líquido, endividamento de médio e longo prazo e endividamento de curto prazo) formulados por referência ao mesmo stock de receitas (v. fi gura 1), o legislador procurou condicio-nar a utilização do endividamento a médio e longo prazo, mas também a utilização do endividamento de curto prazo, limitando igualmente o montante das dívidas a fornecedores e os contratos de locação fi nanceira, de tal forma que os municípios fi cam sujeitos a uma espécie de escada em matéria de endividamento, cujo tecto consiste no limite de endivida-mento líquido municipal.

Dir-se-ia que a instituição de limites ao endividamento líquido municipal visa sujeitar os municípios a uma espécie de garrote fi nanceiro procurando, por essa via, forçar os órgãos autárquicos a tomar medidas de contenção orçamental, dando-lhes, no entanto, capacidade de gestão para compor as diversas parcelas do endividamento líquido, embora com algumas condicionantes:

– Em primeiro lugar, os municípios não podem deixar de regula-rizar débitos a terceiros que ultrapassem, por credor ou fornece-dor, em 31 de Dezembro do ano N, um terço do montante global dos créditos de idêntica natureza e que exista há mais de seis meses. Nesses casos, a câmara municipal está obrigada a apre-sentar à assembleia municipal, juntamente com as contas anuais, uma informação fundamentada e um plano de resolução do refe-rido crédito, no período de um ano, o qual não pode, em qual-quer caso, ultrapassar o fi nal do mandato dos órgãos autárquicos (artigo 38.º, n.º 9 da LFL 2007);

26 É curioso verifi car que idêntica obrigação não foi prevista para os empréstimos a curto prazo e abertura de crédito, embora a ultrapassagem dos limites de endividamento seja, em qualquer caso, facto constitutivo de responsabilidade fi nanceira sancionatória (artigo 65.º, n.º 1, alínea f), 2.ª parte) da LOPTC).

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– Em segundo lugar, é proibida a celebração de contratos com enti-dades fi nanceiras com a fi nalidade de consolidar a dívida a forne-cedores ou outra dívida de curto prazo (artigo 38.º, n.º 12 da LFL 2007), a não ser no âmbito de um contrato de empréstimo para saneamento fi nanceiro (artigo 40.º, n.º 1 da LFL 2007);

– Em terceiro lugar, é proibida a cedência de créditos não vencidos (factoring) como forma de antecipação de receitas (artigo 38.º, n.º 12 da LFL 2007).

Neste sentido, pode dizer-se se que a instituição de limites ao endi-vidamento líquido municipal, complementada com algumas exigências quanto à composição dos passivos, funciona como uma espécie de ele-mento preventivo ou dissuasor de situações de desequilíbrio fi nanceiro municipal.

Assim se vê que é fundamental não confundir a problemática do endividamento municipal e dos respectivos limites qualitativos e quanti-tativos (e respectivas excepções), bem como o seu quadro sancionatório próprio,27 com a problemática do desequilíbrio fi nanceiro municipal, que supõe e exige uma análise integrada da situação fi nanceira do município.

Não quer dizer que a ultrapassagem dos limites de endividamento não possa consubstanciar uma situação de desequilíbrio fi nanceiro. Mas, para se chegar a essa conclusão, importará fazer uma avaliação da situa-ção fi nanceira do município no seu conjunto, tendo em conta, nomeada-mente, as causas dessa situação (que podem ter natureza circunstancial – por exemplo, devido à incapacidade de cobrar toda a receita liquidada e, consequentemente, de amortizar parte dos passivos fi nanceiros) e a capa-cidade de, por exemplo, no ano seguinte, o município voltar a cumprir os limites de endividamento, quer por conseguir cobrar receitas liquidadas

27 Referimo-nos à obrigação de reduzir, em cada ano subsequente, pelo menos 10% do montante que excede o limite fi nanceiro violado, seja ele o limite ao endividamento de médio e longo prazo, seja ele o limite ao endividamento líquido, até que aquele limite seja cumprido (artigos 37.º, n.º 2 e 39.º, n.º 3 da LFL 2007 e artigo 33.º, n.º 4 do OE 2007) e à redução das transferências orçamentais devidas no ano subsequente pelo subsector Estado no caso de violação do limite ao endividamento líquido (artigo 5.º, n.º 4 da LFL 2007 e artigo 33.º, n.º 8 do OE 2007). À violação do limite ao endividamento de médio e longo prazo não foi associada pela LFL 2007 qualquer sanção no plano da redução das transferências orçamentais.

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no ano anterior, quer por apresentar um orçamento de despesas mais rea-lista ou melhor indexado à receita cobrada.

É que, como vimos, na maior parte dos casos, as situações de dese-quilíbrio fi nanceiro municipal encontram as suas causas em problemas de previsão e execução orçamental, os quais não traduzem, necessaria-mente um problema de solvência (com natureza estrutural) mas antes problemas de liquidez (com natureza conjuntural) ou meros desequilí-brios de caixa.

Signifi ca isto que cada caso exige uma apreciação própria e autó-noma, de modo a poder avaliar o grau ou o tipo de desequilíbrio fi nan-ceiro registado, as suas causas e a forma como pode ser ultrapassado.

3. Do saneamento ao reequilíbrio fi nanceiro

A primeira lei das fi nanças locais (LFL 79) reconduzia toda a pro-blemática do desequilíbrio fi nanceiro municipal à fi gura do saneamento fi nanceiro ao admitir a possibilidade de contracção de empréstimos a médio e longo prazo “para proceder ao saneamento fi nanceiro dos muni-cípios” (artigo 15.º, n.º 2, in fi ne). Esta matéria foi regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 258/79, de 28 de Julho, que limitou esses empréstimos aos “casos de grave desequilíbrio das fi nanças municipais, tendo em vista o restabelecimento do respectivo equilíbrio num prazo razoável”. Eram considerados casos de grave desequilíbrio das fi nanças municipais, a título meramente exemplifi cativo, os casos de “insufi ciência das cobran-ças de receitas previstas para fazer face a compromissos assumidos”; de “necessidade de dilatar o prazo de empréstimos cujo vencimento se apro-xime em altura de falta de recursos”; e de “conveniência de substituição de empréstimos por outros em condições menos onerosas” (cfr. artigo 4.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 258/79).

Este elenco de situações aponta, sobretudo, para a resolução de pro-blemas de liquidez, insusceptíveis de resolução através de empréstimos de curto prazo, os quais não podiam ser usados para fi nanciar despesas correntes (artigo 15.º, n.º 3 da LFL 79). Além disso, a referência à neces-sidade de dilatar o prazo de empréstimos cujo vencimento se aproxime em altura de falta de recursos e à conveniência de substituição de emprés-timos por outros em condições menos onerosas, indicia a utilização do

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saneamento fi nanceiro como instrumento de consolidação de passivos. A ideia de que o saneamento fi nanceiro se situa num patamar em que se visa obter o equilíbrio das fi nanças municipais ressalta claramente do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 258/79, de 28 de Julho, e do facto de se limitar o prazo de vencimento dos empréstimos para saneamento fi nan-ceiro a um máximo de 8 anos, “admitindo-se um período de diferimento máximo de dois anos, durante o qual apenas haverá lugar ao pagamento de juros” (cfr. artigo 10.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 258/79).

A segunda lei das fi nanças locais (LFL 84), aprovada numa altura em que já se manifestavam alguns sinais de crise das fi nanças locais – devido ao acréscimo das despesas com investimentos locais e à signifi -cativa redução das receitas fi scais dos municípios ocorrida depois do 25 de Abril de 1974, que se acentuou com a entrada em vigor da primeira lei das fi nanças locais e não foi compensada pelo aumento das transferências do Estado28 – veio introduzir a “possibilidade de celebração de contratos de reequilíbrio fi nanceiro entre os municípios e as instituições públicas de crédito, quando ocorram situações de ruptura fi nanceira” (cfr. preâm-bulo do Decreto-Lei n.º 98/84). Contudo, não defi niu em que consistiam essas situações de ruptura fi nanceira, o que só viria a suceder com o Decreto-Lei n.º 322/85, de 6 de Agosto, que, ao regulamentar a forma de celebração de contratos de reequilíbrio fi nanceiro entre os municípios e as instituições públicas de crédito, caracterizou nos seguintes termos as situações de desequilíbrio fi nanceiro estrutural ou de ruptura fi nanceira que davam acesso à celebração de contratos de reequilíbrio fi nanceiro:

– Esgotamento da capacidade de endividamento do município; – Incumprimento atempado das obrigações assumidas para com

terceiros, em virtude da insufi ciência de recursos fi nanceiros, depois de esgotada a utilização de todos os instrumentos legais possíveis (artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 322/85).

28 Cf. Vasco Valdez Matias, Sistemas Fiscais das Autarquias, Rei dos Livros, 1987, pp. 13-24 e Manuel Porto, A Reforma Fiscal Portuguesa e a Tributação Local, separata do número especial do BFDUC – Estudos em Homenagem ao Prof. Doutor Eduardo Correia, 1984, pp. 5-13.

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Esta caracterização, além de ser meramente exemplifi cativa, parece fazer depender o acesso às linhas de crédito para reequilíbrio fi nanceiro29 do esgotamento da capacidade de endividamento do município, o que supõe a impossibilidade de recorrer aos empréstimos para saneamento fi nanceiro, por terem sido atingidos os limites fi xados por lei para os encargos anuais com amortizações e juros dos empréstimos a médio e longo prazo (artigo 10.º, n.º 5 da LFL 84).

Neste sentido, os empréstimos para reequilíbrio fi nanceiro surgem como uma espécie de ultima ratio ou como derradeiro instrumento para assegurar o equilíbrio das fi nanças municipais, o que se torna particular-mente evidente quando confrontados com os empréstimos para sanea-mento fi nanceiro, onde, como se viu, o que está em causa é, fundamen-talmente, a resolução de problemas de liquidez e de consolidação de passivos. Por isso, bem se compreende que os contratos de reequilíbrio fi nanceiro só pudessem ser celebrados “após os Ministérios da Adminis-tração Interna e das Finanças e do Plano reconhecerem a impossibilidade de o município promover autonomamente o seu equilíbrio fi nanceiro” (artigo 13.º, n.º 2 da LFL 84).

Com efeito, enquanto os empréstimos para saneamento fi nanceiro operam no quadro da autarquia, uma vez que o “estudo fundamentado sobre a situação fi nanceira da autarquia” e o “plano de saneamento fi nan-ceiro para o período a que respeita o empréstimo” são aprovados pela assembleia municipal (artigos 4.º, n.º 2 e 6.º do Decreto-Lei n.º 258/79), os empréstimos para reequilíbrio fi nanceiro, porque partem de uma situa-ção de esgotamento da capacidade de endividamento do município e de todos os outros instrumentos legais possíveis (incluindo o saneamento fi nanceiro), exigem a elaboração de um plano de reequilíbrio fi nanceiro que defi na “as medidas específi cas necessárias para atingir uma situação fi nanceira equilibrada, nomeadamente no que respeita à libertação de fundos e à contenção de despesas”, “o montante do empréstimo a con-trair” e “o prazo previsto para o pagamento dos juros e das respectivas amortizações” (artigo 3.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 322/85), o qual carece de aprovação tutelar.

29 Cf. Decreto-Lei n.º 212/87, de 28 de Maio, que cria uma linha de crédito até ao montante de 12 milhões de contos para saneamento dos municípios que recorram aos contratos de reequilíbrio fi nanceiro.

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Efectivamente, os planos anuais e plurianuais de actividades a rea-lizar num período de 5 anos, bem como os respectivos orçamentos, con-tendo as medidas a que se refere o artigo 4.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 322/85,30 juntamente com as actas relativas à sua aprovação em assem-bleia municipal e em que foi reconhecida e declarada a situação de dese-quilíbrio estrutural ou de ruptura fi nanceira do município, são objecto de apresentação aos Ministros da Administração Interna e das Finanças para efeitos de aprovação do plano de reequilíbrio fi nanceiro (artigos 5.º e 6.º do Decreto-Lei n.º 322/85).

Uma vez aprovado por despacho conjunto Ministros da Administra-ção Interna e das Finanças, o plano de reequilíbrio fi nanceiro permite ao município celebrar com uma instituição pública de crédito um contrato de reequilíbrio fi nanceiro, o qual deverá conter objectivos quantifi cados; prazos de recuperação da situação fi nanceira do município; instrumentos adequados, designadamente os de carácter fi nanceiro, em particular as condições de concessão de empréstimos; compromissos que ambas as partes assumem no sentido da realização dos objectivos programados; e garantias de cumprimento dos cláusulas contratuais (cfr. artigos 7.º e 8.º do Decreto-Lei n.º 322/85).

O despacho conjunto que autoriza a celebração do contrato de ree-quilíbrio fi nanceiro permite ao município requerer, com o acordo de todas as partes, ao juiz do tribunal competente a suspensão da instância nos autos de execução pendente à data da celebração do contrato de ree-quilíbrio fi nanceiro (artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 322/85).

Finalmente, sob pena de rescisão unilateral do contrato de reequilí-brio fi nanceiro, os municípios fi cam obrigados a cumprir o plano de ree-quilíbrio fi nanceiro, bem como os requisitos estabelecidos nas condições

30 Essas medidas incluem o lançamento de derramas; a fi xação de taxas e tari-fas, actualizadas anualmente em função da infl ação verifi cada nos últimos 12 meses; evolução das despesas com o pessoal, correspondente apenas ao aumento das respec-tivas remunerações, salvo quando a alteração do número de efectivos for devidamente fundamentada para o exercício de novas competências, nos termos do Decreto-Lei n.º 77/84, de 8 de Março; evolução das despesas correntes em termos que não ultrapasse a taxa global de crescimento fi xada pelo Orçamento do Estado para as rubricas da mesma natureza; fi xação das despesas de investimento cujo fi nanciamento deve ser limitado ao valor global da receita corrente acrescido da componente capital do Fundo de Equilíbrio Financeiro, deduzido das despesas obrigatórias.

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de acesso; a actualizar, anualmente, os planos plurianuais de actividade, bem como os orçamentos respectivos; e a não contrair empréstimos nem assumir encargos que não estejam previstos no plano de reequilíbrio fi nanceiro (artigos 12.º, n.º 1 e 13.º do Decreto-Lei n.º 322/85).

Confrontando o quadro de exigências constante do Decreto-Lei n.º 322/85 em matéria de reequilíbrio fi nanceiro, com o quadro de exi-gências constante do Decreto-Lei n.º 258/79, em matéria de saneamento fi nanceiro, afi gura-se evidente que, além dos diferentes pressupostos que subjazem aos dois conjuntos de medidas de reequilíbrio fi nanceiro muni-cipal, avulta, sobretudo, o facto de o saneamento fi nanceiro se confi gurar como uma operação intra-municipal, que dispensa a intervenção tutelar do Governo, ao passo que o reequilíbrio fi nanceiro, depende, não só, de despacho conjunto dos Ministros da Administração Interna e das Finan-ças, como obriga o município a apresentar aos Ministros da Administra-ção Interna e das Finanças um relatório semestral sobre o cumprimento do contrato de reequilíbrio fi nanceiro, permitindo ainda ao Ministro da Administração Interna, em caso de rescisão do contrato, a retenção na fonte dos montantes necessários à satisfação dos encargos fi nanceiros com juros e amortizações, e transferi-los para a instituição de crédito credora (cfr. artigo 13.º, n.º 4 da LFL 84 e artigos 12.º, n.º 2, alínea b) e 14.º do Decreto-Lei n.º 322/85).

Este modelo dualista de equilíbrio das fi nanças municipais foi mantido pela terceira leis das fi nanças locais (LFL 87), que manteve igualmente em vigor os dois diplomas que regulamentaram a primeira e a segunda lei das fi nanças locais em matéria de endividamento e de empréstimos para saneamento e reequilíbrio fi nanceiro, na parte em que não entrassem em contradição com a nova legislação (cfr. artigo 29.º, n.º 2 da LFL 87).31

A mesma solução foi seguida pela quarta lei das fi nanças locais (LFL 98) que manteve em vigor os diplomas legais publicados em execução de anteriores leis das fi nanças locais, salvo quando fossem incompatíveis com a nova legislação (artigo 36.º, n.º 2 da LFL 98). Essa

31 Apenas se regista contradição face à LFL 84 na parte em que a LFL 87 permite a celebração de contratos de reequilíbrio fi nanceiro com quaisquer “instituições autori-zadas por lei a conceder crédito”, ao passo que a LFL 84 apenas permitia a celebração desses contratos com “instituições públicas de crédito”.

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incompatibilidade era patente, desde logo, quando aos empréstimos para saneamento fi nanceiro, na medida em que o Decreto-Lei n.º 258/79 limi-tava a sua duração a 8 anos, com deferimento de 2 anos, ao passo que a LFL 98 veio permitir que esses empréstimos pudessem ter um prazo de amortização até 12 anos e um período máximo de diferimento de 3 anos (artigo 25.º, n.º 3 da LFL 98). Além disso, a LFL 98 veio tornar claro que os empréstimos para saneamento fi nanceiro não permitiam ao município ultrapassar os limites ao endividamento de médio e longo prazo, pelo que, sendo empréstimos cuja fi nalidade era a “consolidação de passivos fi nanceiros ou outros, designadamente nos casos de desequilíbrio fi nan-ceiro”, deviam conter-se dentro dos limites de endividamento municipal (artigo 25.º, n.ºs 1 e 2 da LFL 98).

Já no caso dos empréstimos para reequilíbrio fi nanceiro o esgota-mento da capacidade de endividamento constitui um dos pressupostos da sua celebração – em linha, de resto, com o disposto no Decreto-Lei n.º 322/85 – mas passou a fi car claro que os mesmos não poderiam ter “um prazo superior a 20 anos, incluindo um período de diferimento máximo de 5 anos” (artigo 26.º, nºs 1 e 2 da LFL 98). Além disso, foi igualmente previsto que o acesso a empréstimos para reequilíbrio fi nanceiro “é inde-pendente da existência de linhas de crédito com taxas de juro bonifi cado, criadas para o efeito”, tendo a LFL 98 revogado tacitamente o artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 322/85.

4. A problemática do saneamento e do reequilíbrio fi nanceiro muni-cipal na LFL 2007

A quinta lei das fi nanças locais (LFL 2007) apesar de declarar que se mantêm em vigor, “até à respectiva alteração, os diplomas legais vigen-tes publicados em execução de anteriores leis das fi nanças locais, na parte não contrariada pela presente lei” (artigo 64.º, n.º 2 da LFL 2007) não contém nenhuma norma habilitante que permita ao Governo, com base na lei das fi nanças locais, regulamentar o acesso ao crédito pelos municípios e pelas freguesias.

Com efeito, confrontando a LFL 2007 com as anteriores, verifi ca-se que nas anteriores leis das fi nanças locais a matéria do recurso ao crédito foi sempre remetida para diploma regulamentar (cfr. artigo 15.º, n.º 6 da

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LFL 79; artigos 10.º, n.º 10 e 13.º, n.º 5 da LFL 84; artigos 15.º, n.º 12 e 16.º, n.º 2 da LFL 87 e artigo 28.º da LFL 98); o que contrasta com a situa-ção actual, sobretudo quando o Governo, invocando a sua competência legislativa em matérias não reservadas à Assembleia da República, veio aprovar um diploma que “densifi ca as regras referentes aos regimes de saneamento e de reequilíbrio fi nanceiro municipal, bem como do Fundo de Regularização Municipal, previstos na Lei das Finanças Locais” – o Decreto-Lei n.º 38/2008, de 7 de Março.

Sendo embora certo que o artigo 42.º da LFL 2007 remete para “diploma próprio” o rateio das verbas provenientes da redução das transferências dos municípios que violem o respectivo limite de endi-vidamento líquido, tal não signifi ca que o Governo possa, por exem-plo, determinar por decreto-lei a sua devolução ao município se este, no prazo de três anos sobre o facto gerador da retenção, eliminar o excesso de endividamento líquido (artigo 19.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 38/2008). Não se discute, bem entendido, a bondade da solução: agora, não se pode dizer que a devolução das retenções corresponda à ideia de rateio a que se refere o artigo 42.º da LFL 2007, ideia essa que, de resto, surge bem concretizada no artigo 19.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 38/2008. É que, estando em causa uma matéria reservada à competência legislativa da Assembleia da República (artigo 165.º, n.º 1, alínea q) da Constituição) e mesmo que se aceite alguma competência legislativa complementar do Governo, nomeadamente em matérias já abrangidas por diplomas regulamentares,32 existem limites em matéria de densifi cação da Lei das Finanças Locais por acto legislativo do Governo, limites esses que se tornam evidentes sempre que as soluções vertidas no diploma governa-mental se mostrem inovadoras ou contrárias à Lei das Finanças Locais.

Anote-se que esta questão tem a mesma relevância caso se considere que o Decreto-Lei n.º 38/2008, apesar de formalmente emitido ao abrigo da competência legislativa do Governo em matérias não reservadas ao Parlamento, tem a natureza jurídica de um regulamento administrativo, editado ao abrigo do artigo 199.º, alínea c), da Constituição, pois tam-bém nesse caso não é permitido ao Governo consagrar soluções que se afastem daquelas que foram consagradas pela Assembleia da República

32 Cf. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo II, Coimbra Editora, 2006, p. 693.

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na Lei das Finanças Locais, uma vez que se trata de matéria reservada pela Constituição à competência legislativa parlamentar e a competência regulamentar é uma competência vinculada ao respeito pelas soluções consagradas pelo legislador (artigo 112.º, n.º 7 da Constituição). Acresce que a Lei das Finanças Locais não tem a natureza de uma lei de bases ou de princípios, pelo que o Decreto-Lei n.º 38/2008 nunca poderia ter sido aprovado ao abrigo do disposto no artigo 198.º, n.º 1, alínea c), da Constituição.

Estas considerações permitem situar a problemática do saneamento e do reequilíbrio fi nanceiro municipal no quadro da quinta lei das fi nan-ças locais que, sendo profundamente inovadora, difi cilmente se poderia conciliar com diplomas regulamentares editados no âmbito da primeira e da segunda lei das fi nanças locais.33

Realmente, uma das primeiras inovações que resultam da LFL 2007 consiste na obrigatoriedade de promoção do saneamento fi nan-ceiro municipal sempre que os municípios “se encontrem em situação de desequilíbrio fi nanceiro conjuntural” (artigo 40.º, n.º 1 da LFL 2007). O legislador não defi niu “desequilíbrio fi nanceiro conjuntural” nem tão pouco identifi cou os seus elementos caracterizadores, deixando essa tarefa aos órgãos autárquicos no âmbito do estudo fundamentado sobre a situação fi nanceira da autarquia a que se refere o n.º 2 do artigo 40.º da LFL 2007. Com efeito, ao estipular que os municípios que se encontrem em situação de desequilíbrio fi nanceiro conjuntural “devem contrair empréstimos para saneamento fi nanceiro” e que “os pedidos de emprés-timos para saneamento fi nanceiro dos municípios são instruídos com um estudo fundamentado sobre a situação fi nanceira da autarquia e um plano de saneamento fi nanceiro para o período a que respeita o empréstimo” (artigo 40.º, n.ºs 1 e 2 da LFL 2007), o legislador atribuiu ao município a possibilidade de proceder à auto-avaliação da sua situação fi nanceira, sem pré-determinar a qualifi cação do desequilíbrio fi nanceiro municipal.

33 Referimo-nos, naturalmente, ao Decreto-Lei n.º 258/79 e ao Decreto-Lei n.º 322/85. Por isso, é de estranhar que o Decreto-Lei n.º 38/2008, embora revogue expres-samente o Decreto-Lei n.º 322/85 (artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 38/2008), nada diga em relação ao Decreto-Lei n.º 258/79 que, por força do artigo 64.º, n.º 2 da LFL 2007, manter-se-á em vigor, na parte em que as suas disposições não se possam considerar contrárias à LFL 2007 ou contrárias ao Decreto-Lei n.º 38/2008.

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Essa capacidade de auto-avaliação está igualmente presente nas situações mais graves de desequilíbrio fi nanceiro estrutural, as quais pressupõem igualmente uma proposta da câmara à assembleia municipal (cfr. artigos 40.º, n.º 3 e 41.º, n.º 2 da LFL 2007), embora o desequilíbrio fi nanceiro estrutural possa ser declarado, supletivamente, por despacho conjunto do Ministro das Finanças e do ministro que tutela as autarquias locais, após comunicação da Direcção-Geral das Autarquias Locais, sempre que se verifi que uma das seguintes situações:

– Existência de dívidas a fornecedores de montante superior a 50% das receitas totais do ano anterior;

– Incumprimento, nos últimos três meses, de dívidas provenientes de contribuições e quotizações para a segurança social e para a ADSE, de créditos laborais e de rendas de qualquer tipo de loca-ção, sem que as disponibilidades sejam sufi cientes para a satisfa-ção dessas dívidas no prazo de dois meses.

A obrigatoriedade de promoção do saneamento fi nanceiro muni-cipal e a intervenção supletiva do Governo nos casos de desequilíbrio fi nanceiro estrutural correspondem, pois, a um primeiro conjunto de ino-vações face ao direito anterior nesta matéria, uma vez que a LFL 98 – na linha das anteriores – deixava ao critério de cada município a iniciativa de lançar mão dos empréstimos para saneamento ou reequilíbrio fi nanceiro. Assistiu-se, por isso, no quadro da LFL 2007, a uma relativa compressão da autonomia municipal nesta matéria, muito embora se tenha preser-vado uma margem de auto-avaliação que assegura a compatibilidade das soluções consagradas com a garantia constitucional da autonomia local.

No caso específi co do reequilíbrio fi nanceiro e embora se permita, subsidiariamente, ao Ministro das Finanças e ao ministro que tutela as autarquias locais, a declaração da situação de desequilíbrio fi nanceiro estrutural ou de ruptura fi nanceira, substituindo-se o Governo, nessa medida, aos órgãos autárquicos (cfr. artigo 41.º, n.ºs 2 e 3 da LFL 2007), é sempre competência do município a elaboração do plano de reequi-líbrio fi nanceiro, no qual hão-de constar as medidas específi cas neces-sárias para atingir uma situação fi nanceira equilibrada, nomeadamente no que respeita à libertação de fundos e à contenção de despesas; as medidas de recuperação da situação fi nanceira e de sustentabilidade do endividamento municipal durante o período de vigência do contrato de

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reequilíbrio fi nanceiro; os objectivos a atingir no período de reequilíbrio fi nanceiro e o seu impacte anual no primeiro quadriénio (artigo 41.º, n.º 4 da LFL 2007).

Verifi ca-se, deste modo, que as soluções encontradas pelo legisla-dor em matéria de saneamento e reequilíbrio fi nanceiro procuraram con-ciliar um maior grau de injuntividade do regime com a preservação da componente institucional da autonomia local, enquanto poder de gestão municipal.34

Recorde-se, a este propósito, que na maior parte dos casos, as situa-ções de desequilíbrio fi nanceiro municipal encontram as suas causas em problemas de previsão e execução orçamental, o que explica que caiba ao município – como de resto já sucedia no direito anterior (cfr. artigo 4.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 258/79) – alguma margem de apreciação de modo a poder avaliar o grau ou o tipo de desequilíbrio fi nanceiro regis-tado, as suas causas e a forma como pode ser ultrapassado.

Tratando-se de um desequilíbrio que pode ser resolvido através da reprogramação da dívida e da consolidação de passivos fi nanceiros, sem aumento do respectivo endividamento, haverá lugar ao saneamento fi nan-ceiro. Estando em causa uma operação que aumente o endividamento líquido do município, então, nesse caso, não restará outra alternativa ao município senão a de enveredar pelo reequilíbrio fi nanceiro, havendo a possibilidade de – verifi cados certos pressupostos – intervenção suple-tiva do Governo na declaração da situação de desequilíbrio fi nanceiro estrutural (v. quadro 4).

Um segundo grupo de inovações emergentes da LFL 2007 situa--se ao nível do cumprimento e garantias de cumprimento dos planos de saneamento e de reequilíbrio fi nanceiro.

No caso dos empréstimos para saneamento fi nanceiro, foram intro-duzidas diversas vinculações ao plano de saneamento fi nanceiro que não resultavam do direito anterior e que consistem, fundamentalmente, na obrigatoriedade de a Câmara Municipal cumprir o plano de saneamento fi nanceiro; não celebrar novos empréstimos de saneamento fi nanceiro; elaborar relatórios semestrais sobre a execução do plano de saneamento

34 Cf. a este propósito o importante artigo de Vital Moreira, Empréstimos munici-pais, autonomia local e tutela governamental, in Direito Regional e Local, n.º 3 (Jul.-Set. 2008), pp. 25-44.

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fi nanceiro e remetê-los, para apreciação, à Assembleia Municipal (artigo 40.º, n.º 4 da LFL 2007).

Em caso de incumprimento do plano de saneamento fi nanceiro, o mesmo é comunicado, pela assembleia municipal, ao Ministro das Finanças e ao ministro que tutela as autarquias locais e, “até à correc-ção das causas que lhe deram origem”, determina a impossibilidade de contracção de novos empréstimos durante um período de cinco anos e a impossibilidade de acesso à cooperação técnica e fi nanceira com a admi-nistração central (artigo 40.º, n.º 5 da LFL 2007).

Por outro lado, durante todo o período de vigência do contrato de empréstimo para saneamento fi nanceiro, “a apresentação anual de contas à assembleia municipal inclui, em anexo ao balanço, a demonstração do cumprimento do plano de saneamento fi nanceiro” (artigo 40.º, n.º 7 da LFL 2007).

No caso dos contratos de reequilíbrio fi nanceiro municipal, por estar em causa uma situação que envolve a ultrapassagem dos limites de endividamento líquido do município, afectando o equilíbrio do conjunto do SPA e, por conseguinte, pondo em causa os princípios da estabili-dade orçamental e da solidariedade recíproca entre níveis de adminis-tração (artigo da LEO 81.º, nºs 1, 2 e 3 e artigo 4.º, n.º 4 da LFL 2007), o acompanhamento da execução do plano de reequilíbrio fi nanceiro cabe ao ministro que tutela as autarquias locais, devendo os municípios comunicar-lhe previamente a contratação de pessoal, a aquisição de bens e serviços ou a adjudicação de empreitadas de valor superior ao legal-mente exigido para realização de concurso público (artigo 41.º, n.º 7, da LFL 2007). O incumprimento dessa obrigação de comunicação prévia, bem como os desvios em relação aos objectivos defi nidos no plano de reequilíbrio fi nanceiro, determina a retenção de 20% do duodécimo das transferências do FEF até à regularização da situação (artigo 41.º, n.º 8, da LFL 2007).35

35 Pode estranhar-se o maior detalhe com que o legislador regulou a matéria cum-primento e garantias de cumprimento dos planos de saneamento fi nanceiro face aos pla-nos de reequilíbrio fi nanceiro, mas, a nosso ver, a explicação encontra-se no facto de o Decreto-Lei 322/85 defi nir pormenorizadamente essa matéria, ao passo que o Decreto-Lei n.º 258/79 era completamente omisso a esse propósito. Trata-se, em todo o caso, de matéria que foi retomada e disciplinada no Decreto-Lei n.º 38/2008.

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QUADRO 4

Saneamento e reequilíbrio fi nanceiro

Tipo de empréstimo

Pressupostos/fi nalidades Intervenção do Governo

Saneamento fi nanceiro

• Desequilíbrio fi nanceiro conjuntural

• Reprogramação de dívida e consolidação de passivos

• Não agravamento do endividamento líquido municipal

• Comunicação ao Ministro das Finanças e ao ministro que tutela as autarquias locais em caso de incumprimento do plano de saneamento fi nanceiro

Reequilíbrio fi nanceiro

• Desequilíbrio fi nanceiro estrutural ou ruptura fi nanceira

• Recuperação da situação equilíbrio fi nanceiro e de sustentabilidade do endividamento municipal

• Possibilidade de agravamento do endividamento líquido municipal

• Possibilidade de declaração, a título supletivo, da situação de desequilíbrio fi nanceiro estrutural

• Aprovação do plano de reequilíbrio fi nanceiro

• Acompanhamento trimestral da execução do plano de reequilíbrio fi nanceiro

• Comunicação prévia pelos municípios ao ministro que tutela as autarquias locais, da contratação de pessoal, da aquisição de bens e serviços ou da adjudicação de empreitadas de valor superior ao legalmente exigido para realização de concurso público

• Retenção de 20% do duodécimo das transferências do FEF em caso de incumprimento

A terceira inovação constante da LFL 2007 em matéria de sane-amento e reequilíbrio fi nanceiro municipal consistiu na criação de um Fundo de Regularização Municipal (FRM) com o objectivo de “fazer face a situações de desequilíbrio fi nanceiro estrutural ou de ruptura fi nanceira dos municípios”. Este fundo é alimentado “pelos montantes das transferências orçamentais deduzidas dos municípios” em situação de excesso de endividamento líquido, os quais seriam rateados nos ter-mos a defi nir por diploma próprio (artigo 42.º da LFL 2007).

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Não obstante e apesar de todas estas inovações, a quinta lei das fi nanças locais manteve o modelo dualista de reequilíbrio fi nanceiro dos municípios emergente da primeira e da segunda lei das fi nanças locais em termos que, no essencial, continuam a refl ectir a ideia de que o sane-amento fi nanceiro corresponde a uma operação de conversão de passivos de curto prazo em passivos de médio e longo prazo que ocorre dentro dos limites da capacidade de endividamento do município; ao passo que o reequilíbrio fi nanceiro pressupõe o esgotamento dessa capacidade de endividamento e o não cumprimento atempado de obrigações perante terceiros em virtude da insufi ciência de recursos fi nanceiros: no primeiro caso sobrelevam problemas de liquidez que podem ser resolvidos no âmbito da própria autarquia, no segundo está em causa a solvabilidade do município, que exige intervenção tutelar.

Contudo esse modelo dualista foi, de algum modo, posto em causa pelo Decreto-Lei n.º 38/2008 que, a pretexto da densifi cação da Lei das Finanças Locais, consagrou diversas soluções que, a nosso ver, estão com ela em aberta contradição, o que torna várias normas daquele diploma organicamente inconstitucionais (por invasão da reserva de competência legislativa do Parlamento) ou ilegais (por violação da Lei das Finanças Locais).

5. Saneamento ou reequilíbrio fi nanceiro municipal

Observe-se, desde logo, que o artigo 40.º, n.º 1 da LFL 2007 e o artigo 3.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 38/2008 situam os empréstimos para saneamento fi nanceiro, no plano da “reprogramação da dívida” e da “consolidação de passivos fi nanceiros”, desde que o resultado da ope-ração “não aumente o endividamento líquido dos municípios”. Aliás, ambas as disposições determinam igualmente que “os municípios que se encontrem em situação de desequilíbrio fi nanceiro conjuntural devem contrair empréstimos para saneamento fi nanceiro”. A expressão “devem contrair empréstimos para saneamento fi nanceiro” tem a sua razão de ser no facto de a “reprogramação da dívida” e a “consolidação de passi-vos fi nanceiros” se perspectivar, normalmente, como uma medida de boa gestão, na medida em que permite converter passivos de curto prazo que oneram excessivamente as fi nanças municipais em passivos de médio e

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longo prazo que permitem ajustar a gestão das fi nanças municipais a um quadro mais rigoroso de previsão e execução orçamental.36

Ora, se assim é, não se compreende que o legislador tenha erigido em fundamento da necessidade de recurso a empréstimo para sanea-mento fi nanceiro “a ultrapassagem do limite de endividamento líquido previsto no n.º 1 do artigo 37.º da LFL” (artigo 3.º, n.º 4, alínea a) do Decreto-Lei n.º 38/2008).

De facto, se o artigo 40.º, n.º 1 da LFL 2007 e o próprio artigo 3.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 38/2008 só permitem a realização de emprésti-mos para saneamento fi nanceiro quando o resultado da operação “não aumente o endividamento líquido dos municípios”, não se vê que “a ultrapassagem do limite de endividamento líquido” possa ser conside-rada fundamento da necessidade de recurso a empréstimo para sanea-mento fi nanceiro.

Esta solução é, a nosso ver, tanto mais incompreensível quanto o n.º 3 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 38/2008 estabelece que o limite previsto no n.º 1 do artigo 37.º da LFL (limite do endividamento líquido municipal) não prejudica a contracção de empréstimos para saneamento fi nanceiro, o que está em total contradição com o n.º 1 do mesmo artigo 3.º e com o artigo 40.º, n.º 1 da LFL 2007.

Por outro lado, no artigo 8.º, n.º 1, alínea a) do Decreto-Lei n.º 38/2008 prevê-se que uma das situações que pode levar à declaração de desequilíbrio fi nanceiro estrutural ou de ruptura fi nanceira é a ultrapas-sagem do limite de endividamento a médio e longo prazo. Ora, tal faria mais sentido como pressuposto da necessidade de recurso a empréstimos para saneamento fi nanceiro, sempre que a ultrapassagem do limite de endividamento a médio e longo prazo não implicasse a ultrapassagem do limite de endividamento líquido, do que como pressuposto do desequilí-brio fi nanceiro estrutural.

Na realidade, e mesmo tendo em atenção o facto de o artigo 8.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 38/2008 exigir a verifi cação simultânea de três situ-ações de desequilíbrio fi nanceiro, a verdade é que não é líquido que as diversas combinações possíveis dessas situações correspondam a fenó-

36 Recorde-se que as situações de desequilíbrio fi nanceiro municipal se devem, na maior parte dos casos, a orçamentos de receita pouco prudentes que atingem taxas de execução muito baixas quando comparados com o orçamento das despesas.

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menos de ruptura fi nanceira. Por exemplo, a ultrapassagem do limite de endividamento a médio e longo prazo, com consequente violação da obrigação de proceder à sua redução, associado a um prazo médio de pagamentos a fornecedores superior a seis meses, não signifi ca, necessa-riamente, uma situação de ruptura fi nanceira.

Por outro lado, a ultrapassagem do limite de endividamento líquido em valor superior a 175 % das receitas relevantes para o efeito, normal-mente há-de estar associada à ultrapassagem do limite de endividamento a médio e longo prazo e à violação das obrigações de redução dos limites de endividamento, mas podem não existir dívidas a fornecedores ou o prazo médio de pagamento ser inferior a seis meses.

Em segundo lugar, e numa linha que corresponde a aproximar as situações de saneamento às situações de reequilíbrio fi nanceiro, o artigo 3.º, n.º 4, alínea b) do Decreto-Lei n.º 38/2008 vem afi rmar que constitui “fundamento da necessidade de recurso a empréstimo para saneamento fi nanceiro” a “existência de dívidas a fornecedores de montante superior a 40 % das receitas totais do ano anterior, tal como defi nidas no artigo 10.º da LFL”. Por seu turno, o artigo 8.º, n.º 1, alínea c) do Decreto-Lei n.º 38/2008, permite a declaração de desequilíbrio fi nanceiro no caso de “existência de dívidas a fornecedores de montante superior a 50 % das receitas totais do ano anterior”. 37

Ou seja, dívidas a fornecedores de montante superior a 40 %, mas inferior a 50% podem refl ectir, segundo o legislador, a diferença entre uma situação de desequilíbrio fi nanceiro conjuntural ou estrutural.

Além disso, é um elemento comum às duas situações a circuns-tância de o prazo médio de pagamentos a fornecedores ser superior a seis meses (cfr. artigo 3.º, n.º 4, alínea d) e artigo 8.º, n.º 1, alínea e) do Decreto-Lei n.º 38/2008).

Por outro lado, se o rácio dos passivos fi nanceiros, incluindo o valor dos passivos excepcionados para efeitos de cálculo do endividamento líquido, em percentagem da receita total for superior a 200 %, temos saneamento fi nanceiro, mas se for superior a 300% já podemos ter ree-

37 A expressão “tal como defi nidas no artigo 10.º da LFL” não é retomada no artigo 8.º, n.º 1, alínea c) do Decreto-Lei n.º 38/2008, mas deve entender-se que “receitas totais do ano anterior” são as defi nidas no artigo 10.º da LFL 2007.

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quilíbrio fi nanceiro (cfr. artigo 3.º, n.º 4, alínea c) e artigo 8.º, n.º 1, alí-nea d) do Decreto-Lei n.º 38/2008).

O facto de existirem diversas situações que podem ser comuns ao desequilíbrio fi nanceiro conjuntural e estrutural explica que o artigo 8.º, n.º 2 do Decreto-Lei n.º 38/2008 exija que a proposta de declara-ção de situação de desequilíbrio fi nanceiro estrutural deva “fundamentar a impossibilidade de recurso a outros mecanismos, designadamente à adopção de plano de saneamento fi nanceiro”.

Mas, o que mais impressiona nas soluções encontradas pelo legisla-dor para determinar a escolha entre saneamento e reequilíbrio fi nanceiro é que, no primeiro caso, basta que um dos pressupostos se verifi que, inde-pendentemente dos outros, para que um município se veja obrigado a con-trair empréstimos para saneamento fi nanceiro, ao passo que, no segundo caso, é necessária a verifi cação cumulativa de pelo menos três pressupos-tos o que, com algum cuidado, pode ser facilmente evitado pelo município.

Ora, como se teve oportunidade de observar, nesta matéria cada caso tem características próprias que exigem uma apreciação autónoma de modo a poder avaliar o grau ou o tipo de desequilíbrio fi nanceiro registado, as suas causas e a forma como pode ser ultrapassado.

Signifi ca isto, que em matéria de saneamento e reequilíbrio fi nan-ceiro municipal, importa observar algum casuísmo e, sobretudo, atribuir às autarquias alguma margem de auto-avaliação da situação em linha com a garantia constitucional da autonomia local, na sua expressão ins-titucional, sobretudo num contexto em que o preenchimento, simultâneo dos três dos pressupostos do desequilíbrio fi nanceiro estrutural poderá ser de difícil verifi cação.

6. Contradições entre o Decreto-Lei n.º 38/2008 e a Lei das Finanças Locais

Acontece que, a nosso ver, o Decreto-Lei n.º 38/2008 não só redu-ziu a margem de auto-avaliação da respectiva situação fi nanceira por parte dos municípios, como consagrou soluções que se nos afi guram em aberta contradição com a LFL 2007.

É o caso do artigo 3.º, n.ºs 3 e 4, alínea a), que está em contradição com o artigo 40.º, n.º 1 da LFL 2007 e, nessa medida importa inconsti-

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tucionalidade orgânica ou ilegalidade do Decreto-Lei n.º 38/2008 (con-soante se entenda ser o mesmo emitido ao abrigo do poder legislativo ou do poder administrativo). É o caso do artigo 3.º, n.º 4, alíneas b) e d), na medida em que obriga os municípios com dívidas a fornecedo-res de valor superior a 40% das receitas totais do ano anterior ou com atrasos médios nos pagamentos a fornecedores superiores a seis meses a lançar um empréstimo para saneamento fi nanceiro, quando tal pode ser resolvido através de medidas de gestão orçamental, o que importa uma inovação em relação à LFL 2007 a descoberto de credencial parlamentar, para além de constituir um interferência desproporcionada na garantia constitucional da autonomia local, na sua vertente fi nanceira. É também o caso do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 38/2008, que envolve o Governo no acompanhamento da execução do plano de saneamento fi nanceiro, quando a LFL 2007 comete essa tarefa à Assembleia Municipal, num contexto em que o saneamento fi nanceiro se confi gura como uma ope-ração intra-municipal, que dispensa a intervenção tutelar do Governo.

Concomitantemente, ao mesmo tempo que alarga as situações que obrigam à elaboração de planos de saneamento fi nanceiro (cfr. artigo 3.º, n.º 4)38, o Decreto-Lei n.º 38/2008 restringe as situações que envol-vem a declaração de desequilíbrio fi nanceiro estrutural, uma vez que esta passa a ter natureza residual, quer porque a verifi cação cumulativa de três das situações previstas no artigo 8.º, n.º 1 pode ser de difícil veri-fi cação, quer porque muitas dessas situações podem, de forma isolada, obrigar à adopção de um plano de saneamento fi nanceiro, quer ainda porque é pressuposto da declaração de desequilíbrio fi nanceiro estrutu-ral a “demonstração do esgotamento de todos os mecanismos legais de

38 Observe-se que, nos termos do artigo 3.º, n.º 4 do Decreto-Lei n.º 38/2008, qual-quer uma das seguintes situações obriga à contratação de empréstimos para saneamento fi nanceiro:

– ultrapassagem do limite de endividamento líquido;– existência de dívidas a fornecedores de montante superior a 40 % das receitas

totais do ano anterior;– rácio dos passivos fi nanceiros, incluindo o valor dos passivos excepcionados

para efeitos de cálculo do endividamento líquido, em percentagem da receita total superior a 200 %;

– Prazo médio de pagamentos a fornecedores superior a seis meses.

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saneamento das fi nanças, nos termos da LFL” (artigo 9.º, n.º 1, alínea b) do Decreto-Lei n.º 38/2008).

Além disso e ao contrário do que resulta de uma primeira leitura, a fi nalidade do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 38/2008 foi a de limitar as situações em que o município pode, por sua iniciativa, declarar o dese-quilíbrio fi nanceiro estrutural, uma vez que é mais fácil a verifi cação dos pressupostos que permitem ao Governo declarar, subsidiariamente, o desequilíbrio fi nanceiro estrutural de um município, do que a verifi cação dos pressupostos que permitem ao município declarar por sua iniciativa o seu próprio desequilíbrio fi nanceiro estrutural.

Com efeito, para que o Governo possa declarar o desequilíbrio fi nanceiro estrutural, basta que se verifi que uma das seguintes situações:

a) A existência de dívidas a fornecedores de montante superior a 50% das receitas totais do ano anterior;

b) O incumprimento, nos últimos três meses, de dívidas de algum dos seguintes tipos, sem que as disponibilidades sejam sufi cien-tes para a satisfação destas dívidas no prazo de dois meses:

i) Contribuições e quotizações para a segurança social; ii) Dívidas ao Sistema de Protecção Social aos Funcionários e

Agentes da Administração Pública (ADSE); iii) Créditos emergentes de contrato de trabalho; iv) Rendas de qualquer tipo de locação (artigo 41.º, n.º 3 da LFL

2007).

Para que um município possa declarar o desequilíbrio fi nanceiro estrutural é necessário que se verifi quem pelo menos três das seguintes situações:

a) Ultrapassagem do limite de endividamento a médio e longo prazo previsto no artigo 39.º da LFL;

b) Endividamento líquido superior a 175 % das receitas previstas no n.º 1 do artigo 37.º da LFL;

c) Existência de dívidas a fornecedores de montante superior a 50% das receitas totais do ano anterior;

d) Rácio dos passivos fi nanceiros, incluindo o valor dos passivos excepcionados para efeitos de cálculo do endividamento líquido, em percentagem da receita total superior a 300%;

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e) Prazo médio de pagamentos a fornecedores superior a seis meses;

f) Violação das obrigações de redução dos limites de endivida-mento previstos no n.º 2 do artigo 37.º e no n.º 3 do artigo 39.º, ambos da LFL (artigo 8.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 38/2008).

Além disso, a declaração da situação de desequilíbrio fi nanceiro estrutural ou de ruptura fi nanceira, por iniciativa do município, é acom-panhada dos seguintes elementos:

a) Análise detalhada da situação fi nanceira do município; b) Demonstração do esgotamento de todos os mecanismos legais

de saneamento das fi nanças, nos termos da LFL; c) Plano de reequilíbrio fi nanceiro; d) Planos e orçamentos plurianuais que perspectivem o impacte das

medidas propostas no plano referido na alínea anterior (artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 38/2008).

Já a declaração da situação de desequilíbrio fi nanceiro estrutural pelo Governo é precedida de audição prévia do município, o qual deve pronunciar-se no prazo de 30 dias, presumindo-se, na falta de resposta, que confi rma a situação de desequilíbrio (artigo 10.º, n.º 2 do Decreto--Lei n.º 38/2008).39 Após audição do município, a DGAL, no prazo de 10 dias elabora relatório fundamentando a impossibilidade de recurso a mecanismos de saneamento fi nanceiro, o que permite ao Governo decla-rar a situação de desequilíbrio fi nanceiro estrutural ou de ruptura fi nan-ceira do município em questão, o qual fi ca, então, obrigado a preparar um plano de reequilíbrio fi nanceiro (artigo 10.º, n.ºs 3 e 4 do Decreto-Lei n.º 38/2008).

39 É duvidoso que esta norma seja compatível com o artigo 242.º da Constitui-ção ao presumir que a falta de resposta do município equivale à confi rmação, por este, da situação de desequilíbrio fi nanceiro estrutural, quando, para que o município possa declarar o desequilíbrio fi nanceiro estrutural, é necessário que se verifi quem três dos pressupostos constantes do artigo 8.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 38/2008, quando, para que o Governo possa emitir a mesma, declaração basta que se verifi que um dos pressupostos constantes do artigo 41.º, n.º 3 da LFL 2007.

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Ocorre aqui, a nosso ver, uma completa inversão do modelo con-sagrado na LFL 2007 que, garantindo a mais ampla margem de apre-ciação do município, permitia que este declarasse de forma mais fácil que o Governo a situação de desequilíbrio fi nanceiro estrutural, uma vez que não condicionava essa declaração à demonstração de um conjunto de pressupostos de verifi cação cumulativa, como a que consta agora do artigo 8.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 38/2008.40

Ao introduzir no saneamento fi nanceiro pressupostos típicos do reequilíbrio fi nanceiro, como é o caso da ultrapassagem dos limites de endividamento líquido, o Decreto-Lei n.º 38/2008 pôs em causa o modelo dualista de reequilíbrio fi nanceiro dos municípios e entrou em contradição com a LFL 2007, sendo, por conseguinte, a nosso ver, orga-nicamente inconstitucionais (por invasão da reserva de competência legislativa do Parlamento) ou ilegais (por violação da Lei das Finanças Locais) e ainda materialmente inconstitucionais por violação da garantia constitucional da autonomia local, na sua expressão institucional e na sua vertente fi nanceira, as disposições constantes dos seus artigos 3.º, n.ºs 3 e 4, alíneas a), b) e d), 6.º, 8.º, 9.º e 10.º do Decreto-Lei n.º 38/2008.

Além disso, é também, a nosso ver, organicamente inconstitucional ou ilegal, o artigo 19.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 38/2008, na medida em que o artigo 42.º da LFL 2007 remete para “diploma próprio” o rateio das verbas provenientes da redução das transferências dos municípios que violem o respectivo limite de endividamento líquido, e aquela dispo-sição legal vem permitir a sua devolução ao município se este, no prazo de três anos sobre o facto gerador da retenção, eliminar o excesso de

40 Anote-se, a este propósito, que basta a existência de dívidas a fornecedores de montante superior a 50 % das receitas totais do ano anterior para que o Governo possa declarar (supletivamente) um município em situação de desequilíbrio fi nanceiro estru-tural ou ruptura fi nanceira, ao passo que esse elemento, verifi cado isoladamente, não permite ao município, à luz do Decreto-Lei n.º 38/2008, produzir idêntica declaração, quando tal seria possível à luz do artigo 41.º, n.ºs 1 e 2 da LFL 2007. Dir-se-á que, apenas com base naquele critério e tendo em atenção os dados constantes do ANUÁRIO FINANCEIRO DOS MUNICÍPIOS PORTUGUESES 2006, cerca de 71 municípios, por apresentarem um valor de dívidas a fornecedores de superior a 50 % das receitas totais do ano anterior, podem ser declarados pelo Governo em situação de ruptura fi nanceira. Cf. João Carvalho, Maria José Fernandes, Pedro Camões e Susana Jorge, Anuário Financeiro dos Municípios Por-tugueses 2006, cit., p. 131.

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endividamento líquido. Ou seja, em lugar de prever o rateio pelos demais municípios das verbas provenientes da redução das transferências dos municípios que violem o respectivo limite de endividamento líquido, conforme decorre do artigo 42.º da LFL 2007, o legislador veio congelar essas verbas, para as devolver ao município em causa se, passados três anos, este reduzir o excesso de endividamento líquido.

Densifi car é, seguramente, desenvolver ou regulamentar; agora não pode ser re-regulamentar ou inovar em relação a matérias abrangidas por reserva de lei parlamentar, pondo em causa os elementos institu-cionais e fi nanceiros da garantia constitucional da autonomia local, sob pena de inconstitucionalidade ou ilegalidade. Parece-nos pois que, a vários títulos, o Decreto-Lei n.º 38/2008 contém disposições orgânica ou materialmente inconstitucionais (por invasão da reserva de competência legislativa do Parlamento ou por violação da garantia constitucional da autonomia local) ou ilegais (por violação da Lei das Finanças Locais).

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Comentários de Jurisprudência

A (IN)CONSTITUCIONALIDADE DA RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DOS ADMINISTRADORES E GERENTES PELAS COIMAS APLICADAS À SOCIEDADE

COMENTÁRIO AO ACÓRDÃO DO STA, DE 4 DE FEVEREIRO (PROCESSO N.° 0829/08)

E AO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL N.° 129/2009, DE 12 DE MARÇO

João Matos Viana1

I. Introdução

A responsabilidade subsidiária dos administradores e gerentes pelas coimas aplicadas às pessoas colectivas vem consagrada no artigo 8.º do Regime Geral das Infracções Tributárias2 (doravante apenas «RGIT»3).

Recentemente, o Supremo Tribunal Administrativo entendeu, no seu Acórdão de 04.02.20094, Processo n.º 0829/08, que o citado artigo

1 Assistente na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa2 O artigo 8.º, n.º 1, do RGIT estabelece o seguinte:

«Os administradores, gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração em pessoas colectivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras entidades fi scalmente equiparadas são subsidiariamente responsáveis:

a) Pelas multas ou coimas aplicadas a infracções por factos praticados no período do exercício do seu cargo ou por factos anteriores quando tiver sido por culpa sua que o patrimó-nio da sociedade ou pessoa colectiva se tornou insufi ciente para o seu pagamento;

b) Pelas multas ou coimas devidas por factos anteriores quando a decisão defi nitiva que as aplicar for notifi cada durante o período do exercício do seu cargo e lhes seja imputável a falta de pagamento».

3 Aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, com sucessivas alterações, sendo a última introduzida pela Lei nº 64-A/2008, de 31 de Dezembro.

4 Disponível em http://www.dgsi.pt/.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

8.º do RGIT é inconstitucional, por violação do princípio da intransmis-sibilidade das penas (artigo 30.º, n.º 3, da Constituição da República Por-tuguesa – adiante CRP)5. Com os seguintes fundamentos:

a. O artigo 8.º, n.º 1, do RGIT consagra uma verdadeira transmis-são do dever de cumprimento da sanção contra-ordenacional, do responsável pela infracção (a pessoa colectiva), para terceiros (os seus administradores e gerentes);

b. O princípio da intransmissibilidade das penas consagrado no alu-dido preceito da CRP é igualmente aplicável ao Direito de Mera Ordenação Social.

Em sentido discordante pronunciou-se, também recentemente, o Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.º 129/20096, não declarando a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 8.º, n.º 1, do RGIT, e considerando, em suma, o seguinte:

a. O artigo 8.º do RGIT não consagra qualquer mecanismo de trans-missibilidade da responsabilidade contra-ordenacional;

b. O referido preceito limita-se a prever uma forma de responsabi-lidade civil subsidiária dos administradores e gerentes da pessoa colectiva, resultante de um (autónomo) facto culposo que lhes é imputável;

c. Não é certo que o princípio da intransmissibilidade das penas consagrado no artigo 30.º, n.º 3, da CRP, seja aplicável à respon-sabilidade contra-ordenacional.

5 Este entendimento corresponde à linha jurisprudencial mais actual do Supremo Tribunal Administrativo. Sustentando a inconstitucionalidade daquela disposição nor-mativa, com os mesmos fundamentos, e invocando argumentos semelhantes, veja-se Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 28.05.2008, Processo n.º 31/08, e de 27.02.2008, Processo n.º 1057/07, ambos em www.dgsi.pt.

6 Disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/.

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Comentários de Jurisprudência

II. Coima enquanto sanção e sua legitimidade (responsabilidade por culpa)

A coima assume, enquanto sanção principal, natureza estritamente patrimonial, não sendo convertível em pena de prisão (cfr. artigo 89.º do DL 433/82, de 27 de Outubro, o qual consagra o Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas – «RGCOC»).

Contudo, a coima não pode ser assimilada a um mero «direito de crédito do Estado»7. Ao invés, a coima constitui uma «reacção social à contra-ordenação»8 que se traduz numa verdadeira e própria sanção restritiva de direitos. Ou seja, a coima é, tal como a pena criminal, uma sanção de «carácter repressivo»9.

Nessa medida, o facto típico nas contra-ordenações, ainda que careça do substrato ético e axiológico próprio das condutas penalmente relevantes10, tem forçosamente de ser imputável a um autor, no sentido

7 Como sublinha JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal Português. As Conse-quências Jurídicas do Crime, Coimbra Editora, 2005, p. 118, ainda que a propósito de outra sanção, desta feita penal, que assume igualmente natureza pecuniária: a pena de multa.

8 JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, «O movimento da descriminalização e o ilícito de mera ordenação social», in AA. VV., Direito Penal Económico e Europeu: Textos Dou-trinários, Volume I (Problemas Gerais), Coimbra Editora, Coimbra, 1998.

9 JOSÉ LOBO MOUTINHO, Direito das Contra-Ordenações – Ensinar e Investigar, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2008, p. 37.

10 Por regra, a infracção contra-ordenacional baseia-se na violação de um dever jurídico instituído para regular (para ordenar) um certo domínio da actividade social (entre muitas outras, a condução rodoviária, a publicidade, a intermediação fi nanceira, a exploração de estabelecimentos comerciais). Assim, a ilicitude contra-ordenacional está centrada, em primeira linha, na violação da ordem e da disciplina (das regras do jogo) de uma certa actividade social, a qual frequentemente tem natureza estritamente técnica, e satisfaz-se com essa mesma violação, independentemente de qualquer experiência socialmente desvaliosa, vivida e apreendida nas relações inter-pessoais. Esta caracte-rística permite compreender o carácter axiologicamente neutro dos comportamentos que integram os ilícitos de mera ordenação social – a este propósito, veja-se AUGUSTO SILVA DIAS, Delicta in se e Delicta Mere Prohibita, Uma Análise das Descontinuidades do Ilícito Penal Moderno à Luz da Reconstrução de uma Distinção Clássica, Coimbra Editora, 2008.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

de que o mesmo possa ser censurado pela comissão da infracção (cfr. artigo 1.º do RGCOC)11.

Esse juízo de censura, necessariamente individualizador, não assenta, como sucede no caso da culpa jurídico-penal, na personalidade desvaliosa que o agente actualiza na comissão do facto típico12, mas antes na «imputação do facto à responsabilidade social do seu autor»13.

Em particular, a culpa contra-ordenacional traduz uma censura pela divergência do comportamento do agente face ao comportamento regular do “papel”. Ou seja, o ilícito de mera ordenação social visa garantir a funcionalidade (a ordem e a disciplina) de uma certa actividade social, no âmbito da qual o agente desempenha um determinado “papel”. No domínio rodoviário, o agente desempenha o “papel” de condutor, no domínio da publicidade, o agente desempenha o “papel” de anunciante, no domínio da negociação de valores mobiliários, o agente desempe-nha o “papel” de intermediário fi nanceiro, e assim sucessivamente. Esse “papel” é concretizado e densifi cado pelo conjunto de deveres que tradu-zem a disciplina jurídica (as regras do jogo, o guião) daquela actividade social. Ora, a culpa contra-ordenacional traduz uma censura pelo facto de o agente não ter cumprido correctamente o “papel” que, no âmbito daquela actividade social, era por si assumido 14.

Assim, sem prejuízo da impossibilidade de igualar a culpa contra-ordenacional à culpa jurídico-penal (baseada numa censura ética, diri-gida à personalidade do agente), o certo é que tem cabimento falar-se do princípio da culpa também em matéria de contra-ordenações15.

11 Nem sempre foi assim pois o artigo 1.º, n.º 2, da versão original do RGCOC, admitia formas de responsabilidade contra-ordenacional, independentemente da censu-rabilidade do facto («a lei determinará os casos em que uma contra-ordenação pode ser imputada independentemente do carácter censurável do facto»).

12 JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, Liberdade – Culpa – Direito Penal, Coimbra Editora, Coimbra, 1995, p. 176.

13 JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, «O movimento…» cit., p. 29. 14 A este propósito, AUGUSTO SILVA DIAS, «Delicta in se e…», pag. 743 e sgs. 15 Veja-se que o próprio regime legal do ilícito de mera ordenação social convoca

(repetidamente) a noção de culpa (cfr. artigos 8.º, 9.º, n.º 1, 16.º, n.º 2, 18.º, n.º 1, 21.º, n.º 1, 26.º, alínea a) e 51.º, n.º 1 do RGCOC). Contudo, a especial confi guração da culpa contra-ordenacional determina, por exemplo, que a mesma não funcione, de forma rigorosa, como limite da coima (cfr. artigo 40.º, n.º 2, do CP), estando esta associada ao

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Comentários de Jurisprudência

III. Natureza jurídica do artigo 8.º do RGIT

No que diz respeito à natureza jurídica do artigo 8.º, n.º 1, do RGIT, o Tribunal Constitucional entende que se trata de uma forma de respon-sabilidade civil, respondendo o administrador ou gerente por danos cul-posamente causados à Fazenda Nacional.

Assim, no Acórdão n.º 129/2009, o Tribunal Constitucional consi-dera que «a responsabilidade subsidiária dos administradores e gerentes assenta, não no próprio facto típico que é caracterizado como infracção contra-ordenacional, mas num facto autónomo, inteiramente diverso desse, que se traduz num comportamento pessoal determinante de pro-dução de um dano para a Administração Fiscal»16 (sublinhado nosso).

Ou seja, na perspectiva do Tribunal Constitucional, o artigo 8.º do RGIT não tem quaisquer implicações no domínio da responsabilidade contra-ordenacional subjacente, antes fazendo eclodir – por força de um facto culposo e danoso autónomo, a saber, o não pagamento da coima que era devida e/ou colocação da sociedade numa situação de impossi-bilidade de cumprimento da dívida – uma responsabilidade (meramente) civil dos administradores e/ou representantes.

Tal responsabilidade implica a obrigação de proceder ao paga-mento, não da coima, mas antes do valor patrimonial do dano causado, o qual corresponde ao valor daquela coima. Ou seja, o valor da coima

limite do benefício económico que o agente retirou da alegada infracção (artigo 18.º, n.º 2, do RGCOC). Para além disso, verifi ca-se uma certa funcionalização da coima, ou seja, uma certa associação entre coima e satisfação das necessidades puramente funcionais do sistema (in casu, necessidades de prevenção). Nessa medida, a coima é frequentemente entendida como «especial advertência ou reprimenda relacionada com a observância de certas proibições ou imposições legislativas» (JORGE DE FIGUEIREDO DIAS, Direito Penal, Parte Geral, 2007, pág. 166). Ou seja, a coima é frequentemente entendida como advertência social ao agente, pelo facto de este não ter respeitado a ordem vigente, pelo que desempenha, em grande medida, uma função positiva de (re)afi rmação dessa mesma ordem vigente e demonstração de que essa mesma ordem continua a ser o guião e o padrão mediante o qual o “papel” do agente (condutor, fabricante, contribuinte, empre-gador, etc.) deve ser desempenhado.

16 Cfr., no mesmo sentido, GERMANO MARQUES DA SILVA, Responsabilidade Penal das Sociedades e dos seus Administradores e Representantes, Verbo, Lisboa, 2008, pp. 434-436.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

não paga traduz «a expressão pecuniária do dano que ao lesante cabe reparar, que é necessariamente coincidente com a receita que deixa de ter dado entrada nos cofres da Fazenda Nacional» (sublinhado nosso).

Ao invés, o Supremo Tribunal Administrativo entende que se trata de uma forma de responsabilidade contra-ordenacional, a qual foi trans-mitida do verdadeiro infractor (a sociedade) para um terceiro (o adminis-trador ou gerente).

Assim, o Acórdão do STA, de 04.02.2009, vem sustentar que a dis-tinção entre cumprimento da coima e pagamento de um valor correspon-dente à coima, a título de ressarcimento de danos, é totalmente artifi cial. A suposta artifi cialidade de tal distinção resulta da circunstância de a coima ter natureza exclusivamente pecuniária (não podendo ser conver-tida em sanção de outra natureza), pelo que a imposição da obrigação de pagamento do valor correspondente à coima coincide, exactamente, com a (única) forma de cumprimento da sanção respectiva. Assim, afi rma o STA que «(…) é realidade insofi smável que quem faz o pagamento de uma sanção pecuniária é quem a está a cumprir, e que, efectuando o cum-primento por terceiro, ele deixa de ser exigível ao autor da infracção»17.

Tudo visto, em nossa opinião, merece destaque a afi rmação do Tri-bunal Constitucional de que o administrador ou gerente, no âmbito do artigo 8.º do RGIT, responde civilmente pelo “dano” que culposamente provocou à Fazenda Nacional.

Para melhor compreender aquela afi rmação, tome-se em considera-ção um lugar paralelo, também no domínio tributário.

O artigo 24.º da Lei Geral Tributária (adiante LGT) consagra a res-ponsabilidade subsidiária dos administradores e gerentes pelas dívidas tributárias das respectivas sociedades. Esta disposição normativa visa garantir a efi cácia na cobrança coerciva dos créditos tributários. No que diz respeito ao seu âmbito material, a referência a dívidas tributárias

17 No mesmo sentido, JORGE LOPES DE SOUSA e MANUEL SIMAS SANTOS, Regime Geral das Infracções Tributárias – Anotado, 3.ª edição, Rei dos Livros, Lisboa, p. 98 e GONÇALO MELO BANDEIRA, Responsabilidade Penal Económica e Fiscal dos Entes Colectivos, Almedina, 2004, pag. 401.

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Comentários de Jurisprudência

remete para o artigo 3.º, n.º 2, da LGT, o qual estabelece que os tributos compreendem, entre o mais, impostos e taxas18.

Ora, a ideia de “dano” invocada pelo Tribunal Constitucional para justifi car a sua conclusão (recorde-se: “facto ilícito e culposo que é pra-ticado pelo administrador ou gerente, e que constitui causa adequada do dano que resulta, para a Administração Fiscal, da não obtenção da receita em que se traduzia o pagamento da multa ou da coima que eram devidas”) – poderia ser aceite se este Tribunal estivesse a pronunciar-se sobre a ratio do artigo 24.º da LGT.

Com efeito, no âmbito do artigo 24.º da LGT, existe uma relação jurídico-tributária, cujo objecto inclui o crédito e a dívida tributária, bem como outros direitos, como seja o direito a deduções e juros, que vincula um sujeito activo de direito público que é titular do direito de exigir o cumprimento das obrigações tributárias e um sujeito passivo que está vinculado ao cumprimento da prestação tributária, e cujo fi m último consiste na satisfação das necessidades fi nanceiras do Estado (artigo 5.º da LGT), ou seja, na obtenção de “receita” fi nanceira para o Estado.

Neste enquadramento, seria razoável entender que o não pagamento da prestação tributária constitui um “dano” para a Administração Tribu-tária – pois a diminuição da “receita” prejudica, desde logo, o fi m último da tributação que é exactamente a obtenção dessa mesma “receita” (rec-tius, a satisfação das necessidades fi nanceiras do Estado) –, “dano” esse que se pretende reparar através da responsabilização subsidiária dos agentes que culposamente deram causa ao mesmo.

Contudo, a ideia de “dano”, enquanto «não obtenção de receita», invocada pelo Tribunal Constitucional, já não pode funcionar para jus-tifi car o regime do artigo 8.º do RGIT, uma vez que a coima, ao contrá-rio do que acontece com a relação jurídico-tributária, escapa à lógica da “receita” e da garantia de obtenção da “receita”.

Do ponto de vista normativo, e na linha do que se disse inicialmente no presente comentário, a coima deve ser perspectivada, exclusivamente,

18 Entendendo que o regime do artigo 24.º da LGT não se aplica, nem às taxas, nem às dívidas por entregas por conta do imposto devido a fi nal a que a sociedade está obrigada no domínio do IRC, DIOGO LEITE DE CAMPOS, Lei Geral Tributária Comentada e Anotada, 3.ª edição, Vislis Editores, p. 143.

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como «reacção social à contra-ordenação» que se traduz numa verda-deira e própria sanção restritiva de direitos.

Ainda que o produto da coima, actualmente, possa assumir uma importância relevante nos orçamentos das autoridades administrativas (o que é legítimo e tem cobertura legal), a “coima”, enquanto fi gura jurídico-sancionatória (enquanto fi gura repressiva), com fi nalidades de advertência social, legitimada pela censura de uma culpa funcional, deve estar desligada da lógica economicista da mera garantia de obtenção de receita.

Face ao exposto, em nossa opinião, (i) o pressuposto da argumen-tação do Tribunal Constitucional (o alegado “dano” para a Fazenda Pública) não é aceitável, uma vez que a coima não pode ser normati-vamente perspectivada sob o ponto de vista da garantia da obtenção de receita, (ii) por força da inadmissibilidade daquela ideia de “dano”, a distinção (formulada pelo Tribunal Constitucional) entre cumprimento da coima e pagamento de um valor correspondente à coima é efectiva-mente artifi cial e (iii) a afi rmação do STA, no sentido de que o regime do artigo 8.º do RGIT traduz «uma busca obsessiva de formas de ampliar as receitas da Fazenda Pública à custa dos cidadãos» revela-se acertada.

Contudo, a afi rmação de que a coima escapa à lógica da garantia da mera obtenção da receita parece ser contrariada pelo facto de o ordena-mento jurídico estabelecer formas de responsabilidade cujo objectivo é garantir o pagamento do valor da coima.

Por exemplo, o n.º 3, do artigo 2.º, do DL 28/84, de 20 de Janeiro, estabelece que as pessoas colectivas «respondem solidariamente, nos termos da lei civil, pelo pagamento das multas, coimas, indemnizações e outras prestações em que forem condenados os agentes das infracções previstas no presente diploma, nos termos do número anterior». Este mecanismo é orientado por «uma razão de garantia»19, aumentando as probabilidades de pagamento do conteúdo da sanção pecuniária.

A existência deste regime legal virado para a garantia da obtenção do valor da coima – ainda que se admita a respectiva conformidade cons-

19 INÊS GODINHO, A Responsabilidade Solidária das Pessoas Colectivas em Direito Penal Económico, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 180.

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Comentários de Jurisprudência

titucional 20, tema que excede o objecto do presente comentário – não prejudica o que se disse anteriormente.

Com efeito, o n.º 1, do referido artigo 2.º, do DL 28/84, consagra a Responsabilidade por actuação em nome de outrém do órgão, membro ou representante de uma pessoa colectiva (reconhecendo que a responsa-bilidade da própria pessoa colectiva – artigo 3.º, n.º 1, do DL 28/84 – não constitui obstáculo para a responsabilização daqueles que agem em seu nome21).

Como tal, a responsabilidade solidária da pessoa colectiva prevista no n.º 3, do artigo 2.º, do DL 28/84, embora se possa confi gurar como verdadeira responsabilidade civil 22 (e ainda que se admita a sua constitu-cionalidade – vide nota 19), tem por referente a responsabilidade daque-les que agem em nome da própria pessoa colectiva.

Assim, ainda existe um nexo de imputação (uma conexão) entre o responsável solidário (a pessoa colectiva) e a própria infracção contra-ordenacional, uma vez que esta foi praticada, exactamente, por quem age em nome daquele23.

20 AUGUSTO SILVA DIAS, O Novo Direito Penal Fiscal Não Aduaneiro, in AA. VV., Direito Penal Económico e Europeu: Textos Doutrinários, Volume II (Problemas Espe-ciais), Coimbra Editora, Coimbra, 1999, pág. 250, sustenta que «a solução da responsa-bilidade civil solidária da pessoa colectiva pelo pagamento das multas (ou coimas) em que são condenados os seus órgãos ou representantes (artigo 6.º, n.º 3, do decreto-lei [20-A/90 de 15 de Janeiro]), muito utilizada no Direito Penal francês como garantia de cumprimento, representa um hábil estratagema para proteger os cofres públicos da falta de liquidez dos autores, mas à custa do princípio da pessoalidade e intransmissibilidade das penas (artigo 30.º, n.º 3, da Constituição)».

21 INÊS GODINHO, ob. cit., pag. 157 e sgs (em especial pag. 171), sustentando que «quase nos atreveríamos a dizer que o artigo 2.º faz o “levantamento do véu” da pessoa colectiva, à semelhança do que acontece com o movimento da desconsideração da per-sonalidade colectiva (...). Na verdade esta norma legal não permite que a consagração da responsabilidade criminal das pessoas colectivas constitua obstáculo ao aperfeiçoa-mento dos mecanismos de responsabilização daqueles que a formam (...)»

22 Sobre essa questão, largamente, INÊS GODINHO, ob. cit.23 Ainda que possa não existir culpa do responsável solidário (pessoa colectiva)

por força do artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 28/84, o qual determina que «a respon-sabilidade [da pessoa colectiva] é excluída quando o agente tiver actuado contra ordens ou instruções expressas de quem de direito».

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

Ao invés, no caso do artigo 8.º, n.º 1, do RGIT, não existe qualquer nexo de imputação (não existe qualquer conexão) entre o responsável subsidiário e a própria infracção ou comportamento contra-ordenacio-nal, uma vez que o suposto facto culposo imputado ao administrador da sociedade tem a ver, exclusivamente, com o pagamento da coima, não apresentando qualquer referência ao ilícito-típico fundador da responsabilidade.

IV. O princípio da intransmissibilidade das penas (e das coimas?)

O princípio da intransmissibilidade das penas, consagrado no artigo 30.º, n.º 3, da CRP, determina que a responsabilidade se extingue com a morte do agente, não se transmite para familiares, parentes ou terceiros (sucessão), não havendo possibilidade de sub-rogação no cumprimento das penas24.

No citado Acórdão n.º 129/2009, considerou o TC que não é líquido que o princípio da intransmissibilidade das penas seja aplicável no âmbito contra-ordenacional. Em nossa opinião, tal aplicação deve ser afi rmada.

Por um lado, verifi ca-se uma «extrema proximidade do Direito das contra-ordenações ao Direito e ao processo penal»25. Nesse sentido têm-se pronunciado, aliás, alguns Acórdãos do TC, subscrevendo o entendi-mento de que sobre o Direito das contra-ordenações recai a infl uência de vários princípios inscritos na chamada Constituição Penal, como sejam as garantias constantes do artigo 29.º da CRP (cfr. Acórdãos do TC n.ºs 380/99 e 547/01) e o próprio princípio da culpa (cfr. Acórdãos do TC n.ºs 59/95, 547/01 e 357/01). Isto, sem prejuízo de a Jurisprudência Constitu-cional também admitir uma clara margem de diferença entre a natureza e o regime dos ilícitos penal e de mera ordenação social.

Por outro lado, o modelo de imputação contra-ordenacional não abdica do necessário juízo individualizador de culpa ou censurabilidade (ainda que tal juízo de censurabilidade, conforme referido na Secção

24 Cfr. J. J. GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, Constituição da República Portu-guesa Anotada, 3.ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, pp. 197-198.

25 JOSÉ LOBO MOUTINHO, ob. cit., p. 75.

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Comentários de Jurisprudência

II do presente comentário, não se confunda com aquele que justifi ca a imputação jurídico-penal). Ora, a eventual admissão da transmissibi-lidade das coimas implicaria o esvaziamento absoluto de tal juízo de censurabilidade, pois permitir-se-ia a imputação da coima a quem não praticou a infracção.

Por fi m, a jurisprudência constitucional vertida no Acórdão n.º 160/04 – convocada pelo TC no Acórdão agora sob comentário – tem pouca ser-ventia para o presente problema. Com efeito, a possibilidade de os direitos e obrigações (inclusive, de natureza contra-ordenacional) das sociedades extintas por incorporação ou por fusão se transmitirem para a socie-dade incorporante ou nova sociedade (possibilidade que efectivamente existe), em nada belisca o princípio da intransmissibilidade das coimas.

E isto porque a referida possibilidade de transmissão justifi ca-se, não por uma suposta admissão constitucional genérica da transmissibi-lidade das sanções de mera ordenação social, mas antes pelo facto de se entender que a necessidade de censura social de uma determinada organização económica prevaricadora (v.g., uma sociedade comercial), permanece na plenitude, se uma organização juridicamente diversa (v.g., a sociedade incorporante ou a nova sociedade) mas material, económica e fi nalisticamente idêntica, prosseguir as mesmas fi nalidades, desenvol-vendo os mesmos interesses, usando os mesmos meios, no mesmo plano material de intervenção em que foram afectados os interesses cuja viola-ção constitui contra-ordenação a impor uma censura social26.

V. Nota fi nal

A Lei 59/2007, de 4 de Setembro, introduziu um novo n.º 9, no artigo 11.º do Código Penal, estabelecendo a responsabilidade subsidiária das

26 Nesse sentido, Acórdão do STJ de Fixação de Jurisprudência n.º 5/2004, de 2 de Junho, no qual se determinou que «a extinção, por fusão, de uma sociedade comercial, com os efeitos do artigo 112.º, alíneas a) e b), do Código das Sociedades Comerciais, não extingue o procedimento por contra-ordenação praticada anteriormente à fusão, nem a coima que lhe tenha sido aplicada». Sobre o assunto, v. JORGE DOS REIS BRAVO, Direito Penal de Entes Colectivos – Ensaio sobre a Punibilidade de Pessoas Colectivas e Entidades Equiparadas, Coimbra Editora, Coimbra, 2008, p. 362 e ss.

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pessoas que ocupem uma posição de liderança na pessoa colectiva, pela pena de multa em que esta for condenada. Verifi cou-se, portanto, uma generalização da regra constante do artigo 8.º, n.º 1, do RGIT27.

Os problemas que identifi cámos anteriormente a propósito da res-ponsabilidade subsidiária por coimas colocam-se, agora, ainda com mais intensidade, a propósito da responsabilidade subsidiária por multas.

Em tom necessariamente tópico, e para além de tudo o que já se deixou referido: por um lado, é duvidosa a necessidade da previsão da responsabilidade subsidiária da pessoa que ocupa posição de liderança, em caso de diminuição dolosa ou negligente do património da pessoa colectiva. Tais situações já encontram tutela sufi ciente no artigo 227.º (insolvência dolosa), artigo 227.º-A (frustração de créditos), artigo 228.º (insolvência negligente) e artigo 229.º (favorecimento de credores), todos do Código Penal. Por outro lado, é duvidosa a necessidade da pre-visão da responsabilidade subsidiária da pessoa que ocupa posição de liderança da pessoa colectiva, em caso de não pagamento da multa, pois tal hipótese encontra solução no artigo 90-B, n.º 6, do CP («fi ndo o prazo de pagamento da multa ou de alguma das suas prestações sem que o pagamento esteja efectuado, procede-se à execução do património da pessoa colectiva ou entidade equiparada»).

A única necessidade que tal (nova) disposição legal satisfaz é a da efi caz arrecadação das quantias pecuniárias tituladas pelas multas.

Acompanhamos portanto NUNO BRANDÃO quando afi rma que esta norma «constitui uma autêntica burla de etiquetas, ao travestir de res-ponsabilidade pelo cumprimento da sanção aquilo que na realidade é uma autêntica transmissão da responsabilidade penal, ainda que ope-rada por via legal»28.

27 Nesse sentido, estabelecendo a continuidade entre artigo 8.º do RGIT e novo artigo 11.º, n.º 9, do RGIT, PAULO PINTO DE ALBUQUERQUE, Comentário do Código Penal, Universidade Católica Editora, 2008, pag. 85 e in A Responsabilidade Criminal das Pessoas Colectivas ou Equiparadas, in Revista da Ordem dos Advogados, ano 66, II, pag. 643.

28 O Regime Sancionatório das Pessoas Colectivas na Revisão do Código Penal, in AA. VV., Direito Penal Económico e Europeu: Textos Doutrinários, Volume III, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pág. 469.

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Comentários de Jurisprudência

TRUCK CENTER: OBRIGAÇÃO DE RETENÇÃO NA FONTE NO PAGAMENTO DE JUROS ENTRE ENTIDADES RELACIONADAS NA UE

COMENTÁRIO AO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, DE 22 DE DEZEM-

BRO DE 2008, QUARTA SECÇÃO – PROCESSO C-282/07

José Almeida Fernandes1

O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (“TJCE”) decidiu, em 22 de Dezembro de 2008, o caso Truck Center (C-282/07), no qual se discutia a compatibilidade com o diretio comunitário de uma norma fi scal belga, designadamente a sua compatibilidade com a liberdade de estabelecimento protegida pelo artigo 43.º do Tratatado da Comunidade Europeia (“TCE”)2. A norma doméstica em análise estabelecia que os pagamentos de juros a entidades relacionadas não residentes estavam sujeitos a uma retenção na fonte à taxa de 15%, mas no caso desses pagamentos serem efectuados entre entidades relacionadas residentes na Bélgica, os mesmos estariam dispensados de retenção na fonte.

O acórdão do TJCE e as Conclusões da Advogada-Geral (“AG”) Kokott encerram um conjunto de desenvolvimentos relativamente à jurisprudência comunitária, ainda que discutíveis. A interpretação do

1 Adv LLM (Hons.) Leiden. Advogado.2 No que respeita às liberdades fundamentais susceptíveis de ser violadas e consi-

deradas pelo TJCE na sua apreciação do caso concreto, o TJCE reafi rmou a sua jurispru-dência de que a liberdade de estabelecimento prevalece sobre a liberdade de circulação de capital no caso da norma em análise respeitar a relações entre entidades relacionadas [cf. Burda (C-284/06), § 68-69].

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direito comunitário adoptada é igualmente inovatória quanto à análise da compatibilidade da aplicação de retenções na fonte nos pagamen-tos transfronteiriços na UE, bem como quanto ao modo de aferição da existência ou não de um tratamento discriminatório ou restritivo suscep-tível de ser considerado contrário ao direito comunitário, ainda que pas-sível de justifi cação ao abrigo da “rule of reason” adoptada pelo TJCE.

Efectivamente, mais do que a própria decisão de não incompati-bilidade com o direito comunitário de uma norma fi scal que obriga à aplicação de uma retenção na fonte num pagamento transfronteiriço, mas que o isenta dessa retenção caso o pagamento seja puramente doméstico, são os próprios fundamentos dessa decisão que suscitam uma análise cuidada do acórdão Truck Center.

Hoje, pode-se questionar se existe um recuo do TJCE face à sua jurisprudência inicial - desfavorável à utilização da retenção da fonte como um mecanismo para a cobrança de impostos por este afectar a criação do mercado único3, particularmente evidente quando aplicado no pagamento de dividendos4 -, sendo que pode-se intuir que «a mera imposição de tributação na fonte de não-residentes, em circunstâncias em que os residentes são tributados através de um diferente método de liquidação não é ipso facto discriminatório, sendo que a tributação na fonte pode vir a ser justifi cada como uma matéria de necessidade administrativa»5.

Acresce que, o TJCE parece ter adoptado no acórdão Truck Center6 uma posição que, ainda que se possa dizer implícita em outros acórdãos (maxime no acórdão ACT Group Litigation7), parece distinguir, para

3 Cf. Scorpio (C-290/04), § 38.4 Cf. Denkavit France (C-170/05), § 29-33.5 Cf. Julian Ghosh, United Kingdom Report, in Cahiers de Droit Fiscal Interna-

tional, Sdu Fiscale & Financiële Uitgevers, 2008, pp. 740.6 Cf. Truck Center (C-282/07), § 43: «quando a sociedade distribuidora de juros

e a sociedade benefi ciária desses juros residem na Bélgica, a posição do Estado belga é diferente daquela que toma quando uma sociedade residente nesse Estado paga juros a uma sociedade não residente, porquanto, no primeiro caso, o Estado belga actua na sua qualidade de Estado da residência das sociedades em causa e, no segundo caso, como Estado de origem dos juros».

7 Cf. ACT Group Litigation, (C-374/04).

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Comentários de Jurisprudência

efeitos de saber se um residente e um não-residente8 se encontram ou não numa situação objectivamente comparável, consoante se está a analisar a compatibilidade de uma determinada norma fi scal do Estado da Fonte ou uma norma fi scal do Estado da Residência, em conformidade com os princípios do direito fi scal internacional e subjacentes à interpretação do Modelo de Convenção da OCDE9.

No fundo, o TJCE teria proferido neste acórdão aquilo que um autor já intitulou «uma lição nas obrigações da Fonte vs Residência na EU»10. Contudo, entendemos que o pressuposto inicial da análise do TJCE deve alicerçar-se não nos princípios e matriz de interpretação do direito fi scal internacional, mas sim nos princípios e objectivos do TCE e, em par-ticular, no objectivo de criação de um mercado único11. Isto é, “o objec-

8 Igualmente, o TJCE parece aparentemente de forma inconsistente analisar em sede de obrigações de retenção na fonte em pagamentos transfronteiriços os efeitos discriminatórios ou restritivos de uma determinada norma por vezes na óptica da enti-dade (residente) obrigada a proceder à retenção na fonte e, outras vezes, atendendo a esses mesmos efeitos sobre a entidade (não-residente) sujeita à retenção na fonte, sendo que se entende que ambas as perspectivas devem ser objecto de análise tendo em vista poder aferir da natureza discriminatória ou restritiva de uma norma fi scal (cf. Joachim Englisch, Truck Center: Withholding tax on intercompany interest compatible with fre-edom of establishment, Highlights & Insights, Ano 2, n.º 2, pp. 49).

9 No entanto, a lógica de Estado da Fonte e da Residência e a sua aplicação na interpretação da Convenção Modelo da OCDE deve ser adoptada com as devidas cau-telas, conforme se ilustra no artigo seminal de Klaus Vogel, “State of Residence” may as well be “State of Source” – There is no Contradiction», in Bulletin of International Fiscal Documentation, 2005, pp. 420 e segs.

10 Cf. Tom O’Shea, Truck Center: A Lesson in Source vs Residence Obligations in the EU, Tax Notes International, February 16, 2009, pp. 593 e segs.

11 O TJCE tem procurado em matéria fi scal estabelecer um «equilíbrio entre o direito fi scal internacional e o direito comunitário», razão pela qual tem aceite, em princípio, diferenças de tratamento entre residentes e não-residentes (cf. a denominada doutrina Schumacker (C-279/93), § 31), mas apenas se essa diferença «pode ser expli-cada por um diferença de relevo factual ou diferença na asserção de poderes tributários (disparidades; i.e. diferenças não causadas pelo exercício de poderes tributários no âmbito daquela asserção) (…) or por um requisito obrigatório de interesse público (o rule of reason)» (cf. Ben Terra, Peter Wattel, European Tax Law, Kluwer, 5.ª Edição, 2008, pp. 718-719).

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

tivo que determina a comparabilidade deve ser um objectivo inerente às próprias liberdades fundamentais”12.

Acresce que, a AG Kokott13 parece nas suas Conclusões e, em certa medida, o próprio TJCE, proceder desde logo a um juízo susceptível de ser confi gurado, de certo modo, como um juízo de proporcionalidade da norma para efeitos de análise da existência ou não de um tratamento discriminatório ou restritivo do exercício das liberdades fundamentais protegidas pelo TCE (i.e., ao invés da análise da proporcionalidade da norma ser efectuada apenas ao nível de uma possível justifi cação de um tramento fi scal considerado prima facie discriminatório ou restritivo).

Concretizando, a relevância de questões relativas à cobrança de imposto para efeitos de saber se uma norma é discriminatória ou res-tritiva apenas tem sido avaliada ao se determinar se uma determinada medida é ou não proporcional e, por isso, passível de justifi cação14.

Acresce que, a arguição de difi culdades administrativas na cobrança de imposto para efeitos de negar a existência de uma situação objectiva-mente comparável parece contrária à posição sustentada anteriormente pelo AG Léger no caso Turpeinen, onde se afi rmou expressamente que «o regime de retenção fi xa na fonte parece igualmente desproporcionado tendo em vista a exigência de assegurar a cobrança efectiva do imposto devido junto de sujeitos passivos não residentes15» e ainda que «as

12 Cf. Joachim Englisch, Truck Center: Withholding tax on intercompany interest compatible with freedom of establishment, Highlights & Insights, Ano 2, n.º 2, pp. 43 e segs.

13 Rectius, a AG Kokott parece propor incorporar no juízo da natureza discrimina-tória ou restritiva da norma em análise em termos mais gerais, o que equivaleria a incor-porar um completo juízo de proporcionalidade nesta sede, por apenas assim se poder confi rmar que, citando o AG Poiares Maduro, «a diferença das suas situações respectivas é susceptível de justifi car a diferença de tratamento [cf. Truck Center (C-282/07) Con-clusões AG Kokott § 37].

14 Cf. Truck Center (C-282/07), § 48: «as sociedades benefi ciárias residentes estão directamente sujeitas ao controlo da Administração Fiscal belga, que pode assegurar a cobrança coerciva do imposto», enquanto tratando-se da cobrança de imposto a socieda-des não residentes «a cobrança do imposto exige a colaboração da Administração Fiscal do respectivo Estado da residência».

15 O TJCE não analisou, sem apresentar qualquer justifi cação, as consequências decorrentes das autoridades belgas poderem invocar para efeitos de cobrança de imposto

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Comentários de Jurisprudência

difi culdades suplementares de ordem administrativa que podem emer-gir para uma administração fi scal nacional, do facto do sujeito passivo residir noutro Estado-membro, não são consideradas pela jurisrpudência como podendo justifi car, enquanto tais, que se obrigue esse sujeito pas-sivo a suportar um imposto mais elevado do que se fosse residente»16.

O TJCE concluiu, ainda, que a diferença de tratamento «não con-fere necessariamente uma vantagem às sociedades benefi ciárias» e a «taxa do referido imposto aplicada aos juros pagos a uma sociedade não residente é claramente inferior à do imposto sobre as sociedades»17. No que respeita a este último argumento, entende-se que a adopção de uma presunção implícita de que a tributação de um não residente é infe-rior18, por simples referência a uma diferença nas taxas aplicáveis, não se afi gura uma análise adequada da compatibilidade de uma norma com o TCE19. No que concerne ao primeiro argumento (i.e., a inexistência de uma vantagem para os residentes), o TJCE já se tinha pronunciado nesta

a Convenção Benelux de 5 de Setembro de 1952 que previa a assistência mútua para a cobrança de dívidas fi scais. Acresce que na decisão do TJCE em Scorpio admitia-se implicitamente que a existência de um acto jurídico comunitário relativo à assistência mútua em matéria de cobrança de dívidas fi scais poderia conduzir a uma diferente afe-rição da compatibilidade em concreto do procedimento de retenção na fonte como «um meio legítimo e adequado» [cf. Scorpio (C-290/04) § 38].

16 Cf. Turpeinen (C-520/04), Conclusões AG Léger, § 78-79.17 cf. Truck Center (C-282/07), § 49.18 O TJCE não apreciou também a questão suscitada pelo facto da retenção na

fonte ser aplicada sobre um montante bruto dos juros no caso dos não-residentes, ao contrário da tributação ser feita sobre um montante líquido para os residentes. A AG Kokott procurou nesta matéria proceder a uma distinção entre a jurisprudência anterior do TJCE sobre a matéria e o caso sub judice, por se tratar de casos em que a liberdade fundamental em questão era a liberdade de prestação de serviços e a circunstância de ser «lógico que as despesas de exploração deverão ser também dedutíveis no quadro da tributação no Luxemburgo» [cf. Truck Center (C-282/07) Conclusões AG Kokott, § 70]. A aceitação desta diferença na construção das liberdades fundamentais e, em especial, a presunção da dedutibilidade no outro Estado-Membro para aferir da compatibilidade de uma norma doméstica de um Estado-Membro, afi gura-se isoladamente insufi ciente para uma fundada análise da compatibilidade de uma norma doméstica com o direito comunitário.

19 Cf. Pasquale Pistone, European Direct Tax Law: Quo Vadis?, in Hinnekens (ed.) A Vision of Taxes and Outside European Borders – Festchrift in honour of Prof. Dr. Fran Vanistandael (2008), pp. 722-723.

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matéria na sua apreciação de uma possível justifi cação baseada num con-ceito de coesão fi scal, no sentido de que «é necessário que se demonstre a existência de uma relação directa entre o benefício fi scal em causa e a compensação desse benefício através de uma determinada imposição fi scal»20, demonstração essa não efectuada no caso Truck Center e que se afi gura mesmo não se encontrar preechida no caso concreto21.

Em conclusão, o acórdão Truck Center não encerra certamente a discussão sobre a matéria da aplicação de retenções na fonte em paga-mentos transfronteiriçoes e, em especial, no pagamento de juros entre entidades relacionadas residentes em diferentes Estados-Membros. Acresce que se entende admissíveis algumas reservas quanto à suscepti-bilidade do acórdão Truck Center ser considerado um precedente válido para futuras decisões, pelo que se admite que o TJCE analise futuramente estas matérias de forma diversa. Refi ra-se que o TJCE será já proximam-ente confrontado com uma novo caso, precisamente um caso português, em que se discutirão as matérias referidas da compatibilidade de aplica-ção de retenções no pagamento transfronteiriço de juros a instituições fi nanceiras não residentes quando se debruçar sobre o Caso C-105/08 (Comissão vs Portugal)22.

20 Cf. Thin Cap (C-524/04), § 68.21 Cf. Joachim Englisch, Truck Center: Withholding tax on intercompany interest

compatible with freedom of establishment, Highlights & Insights, Ano 2, n.º 2, pp. 50.22 Cf. Ana Paula Dourado, José Almeida Fernandes, Portugal: The Infringement

Procedures Involving Portugal and the Commission v. Portugal Case, in Michael Lang et. alia (eds.), ECJ- Recent Developments in Direct Taxation 2008, Linde Verlag Wien, 2008, pp. 329 e segs.

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Comentários de Jurisprudência

A RESIDÊNCIA E AS CONVENÇÕES DE DUPLA TRIBUTAÇÃO

COMENTÁRIO AO ACÓRDÃO DO STA, DE 25 DE MARÇOPROC. N.° 068/09 – 2.ª SECÇÃO

Rui Duarte Morais1

Descritores: Convenção para a Evitar a Dupla Tributação

Critério

Residência2

1 – A factualidade subjacente ao acórdão em anotação é simples:

• A permanece normalmente na Alemanha, aí auferindo a totali-dade dos seus rendimentos, enquanto trabalhador dependente.

• Na Alemanha, foi sujeito a tributação, na qualidade de residente nesse país.

• No período em causa, a mulher de A permaneceu em Portugal.• A nossa Administração Fiscal, por aplicação do disposto no

artigo16.°, n.° 2, do CIRS3, considerou que A era residente em Portugal, liquidando o imposto que, nessa condição, seria devido4.

1 Professor da Faculdade de Direito da Universidade Católica do Porto.2 No texto deste acórdão, tal como consta da base de dados da dgsi, aparece, ainda,

como descritor, “rendimento do capital”. O que, certamente resultará, de mero lapso.3 O qual dispõe: “São sempre havidas como residentes em território português

as pessoas que constituem o agregado familiar, desde que naquele resida qualquer das pessoas a quem incumbe a direcção do mesmo”.

O n.° 3 de tal artigo, aditado em 2005 (não aplicável aos factos a que se reporta o acórdão, porque anteriores) veio transformar esta fi cção numa presunção legal, ilidível.

4 No caso, procedeu à liquidação de imposto relativo aos rendimentos auferidos por A, uma vez que a sua mulher não era titular de quaisquer rendimentos.

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2 – O interesse deste acórdão está não na decisão propriamente dita, mas sim na sua fundamentação.

Confrontaram-se duas teses: o entendimento, inovador em termos de jurisprudência do STA, propugnado pela relatora, Conselheira Isabel Marques da Silva, com o apoio do Conselheiro António Calhau; o enten-dimento correspondente à jurisprudência anterior do STA, do qual, na circunstância, foram porta-vozes o Conselheiro Brandão de Pinho e, no seu parecer, o Procurador-Geral Adjunto.

No caso concreto, ambas as posições conduziriam ao mesmo resul-tado, ou seja, à anulação da liquidação impugnada.

Tal coincidência quanto à decisão a ser tomada não obsta a que con-sideremos ser a doutrina defendida pela Conselheira Relatora a (única) correcta5.

3 – Como vimos, da aplicação do já citado n.° 2 do art. 16.° do CIRS, resultaria que A deveria ser, também, considerado como residente fi scal em Portugal.

Estaremos perante um confl ito positivo de residências, a ser dirimido por aplicação das regras de desempate previstas no n.° 2 do art. 4 da CDT Portugal/ Alemanha?

A jurisprudência dominante entenderia que sim6.

4 – Este acórdão vai mais longe, situando a questão “a montante”.Assumiu, como pressuposto, que, para existir um confl ito de resi-

dências, é necessário que um sujeito passivo possa, legitimamente, ser havido como residente nos dois Estados.

Para que tal aconteça, não basta que resulte da aplicação da lei interna de cada um desses a qualifi cação como residente. É preciso,

5 Tínhamos tido oportunidade de analisar este tipo de situações no nosso estudo «Dupla tributação internacional em IRS: notas de uma leitura em jurisprudência», Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, n.° 1, 2008, pp. 109 ss.

6 Assim entendeu o Conselheiro Brandão de Pinho, cuja declaração de voto se transcreve: “votei a decisão com o fundamento de que, sendo o contribuinte (cônjuge marido) residente simultaneamente em Portugal e na Alemanha, todavia nesta se radicar o seu centro de interesses vitais – cfr. n.° 12 do probatório -, nos termos do art. 4.° n.° 2 da respectiva Convenção para evitar a dupla tributação [negrito nosso].

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Comentários de Jurisprudência

antes, saber se o elemento de conexão previsto na lei, do qual decorre tal qualifi cação, é legítimo.

Não existindo qualquer dúvida quando à legitimidade da qualifi ca-ção de A como residente na Alemanha, punha-se a questão da legitimi-dade do elemento de conexão utilizado pela lei portuguesa para o haver como residente em Portugal.

5 – É conhecida, no Direito Fiscal Internacional, a questão da exi-gência de limites jurídicos à extensão da lei nacional. Como escrevemos noutro local7, as normas nacionais que visem sujeitar a tributação factos ocorridos fora das fronteiras desse Estado devem obedecer ao princípio da razoabilidade: ao criar leis visando tirar consequências de factos ocorridos no estrangeiro, o legislador nacional não pode, não deve, igno-rar que determinadas situações caem na previsão de outras legislações nacionais, expressões de soberanias estaduais igualmente legítimas, por-ventura melhor posicionadas, por uma mais intrínseca ligação de tais factos ao respectivo território, para as regular. O abuso de conexão é ilegítimo, por violar os princípios do Direito Internacional, o qual vin-cula o legislador nacional sempre que estejam em causa situações com dimensão internacional.

Há, pois, que recusar o “ponto de partida” da jurisprudência ante-rior (decorrente de raciocínios positivistas, que continuam a ser domi-nantes entre nós): o de que os elementos de conexão (que defi nem o ele-mento espacial do facto tributário) são necessariamente legítimos (talvez melhor, que a sua validade é insusceptível de sindicância judicial) pelo facto de constarem da lei.

6 – No caso concreto, a razoabilidade do elemento de conexão em que Portugal fundava a sua pretensão podia ser aferido a partir de normas convencionais, das disposições da CDT Portugal/Alemanha, ou seja, não existia a necessidade de invocar os (sempre discutíveis) princí-pios de Direito Internacional.

7 Rui Duarte Morais, Imputação de lucros de sociedades não residentes sujeitas a um regime fi scal privilegiado, PUC, 2005, pp. 44 ss.

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A celebração de uma tal convenção implica o acordo dos dois Esta-dos no sentido de limitarem as suas pretensões tributárias, no que inte-ressa, em limitações quanto ao modo como irão concretizar os elementos de conexão integrantes das normas defi nidoras da incidência dos impos-tos abrangidos pela convenção.

Se a convenção não defi ne o que é residente em cada um dos Estado contratante, remetendo tal defi nição para as respectivas leis internas, fi xa, explícita8 e, sobretudo, implicitamente, critérios que, quando não observados, conduzem à ilegitimidade da tributação.

É, pois, exacta a conclusão do acórdão em anotação quando afi rma que “a remissão para a legislação interna dos Estados contratantes constante do art. 4.°, n.° 1, da Convenção entre a República Portuguesa e a República Federal Alemã para evitar a Dupla Tributação em matéria de Impostos sobre o rendimento e sobre o capital não deve ser entendida como uma remissão incondicional”9.

7 – Quais são os critérios que devem presidir à defi nição, por cada Estado contratante, da noção de residência, em termos de tal defi nição ser conforme com as disposições convencionais (hierarquicamente supe-riores às leis nacionais)?

O acórdão responde: “impondo-se que tais critérios exprimam uma ligação efectiva com o território desse Estado”.

A resposta é exacta. Apenas duas notas:

• a defi nição legal de “residência” tem, necessariamente, que incluir a exigência de presença física. Ninguém pode ser havido como

8 “Para efeitos da presente convenção, a expressão «residente de um Estado con-tratante» signifi ca qualquer pessoa que, por virtude da legislação desse Estado, está aí sujeita a imposto devido ao seu domicílio, à sua residência, ao local de direcção ou a qual-quer outro critério de natureza similar ( )” – art..° 4, n.° 1, da CDT Portugal/Alemanha.

9 Aliás, qualquer remissão feita pelas convenções para a lei interna dos Estados contratantes nunca poderá ser entendida como incondicional. De outra forma, abrir-se-ia a possibilidade de os estados, modifi cando a sua legislação nacional, alterarem (a seu favor) o equilíbrio convencional. Veja-se Helmut Becker/Felix Würm, «Double Taxa-tions conventions and the confl ict between international agreements and subsequent domestic law», Intertax, n.°8-9 (1988), pp. 257 ss.

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residente em determinado estado se nele não esteve presente, com alguma constância, durante o período em causa.

• a defi nição de residência, tal como consagrada pelo legislador nacional, deve ser apta a apenas fazer qualifi car como residentes aqueles sujeitos passivos cujas “ligações” (essencialmente, liga-ções de carácter económico) aconteçam predominantemente com esse Estado.

Isto porque, no equilíbrio convencional, o Estado da residência é aquele que ocupa o “papel central” relativamente à pessoa desse contri-buinte, o que legítima que aí aconteça a tributação do rendimento mun-dial (que o seu direito à tributação não fi que circunscrito a uma dimensão meramente territorial) e que, ao menos na maioria dos casos, tal tributa-ção revista a natureza de um imposto pessoal.

Assim sendo, é exacta a conclusão do acórdão recorrido ao afi rmar “o critério de ‘residência por dependência’ adoptado no artigo 16.°, n.° 2, do Código do IRS não é fundamento válido para uma pretensão tribu-tária do estado português relativamente a um residente na Alemanha que aí tenha obtido, no ano em causa todos os seus rendimentos ( )”

Na realidade, a “residência por dependência”, tal como defi nida pela nossa lei, prescinde quer da presença física do sujeito passivo em território nacional, quer da preocupação de que os seus “laços” , econó-micos e outros, aconteçam predominantemente com Portugal.

O que, manifestamente, torna ilegítimo tal elemento de conexão quando aferido à luz dos princípios subjacentes às CDT.

8 – Deixámos, intencionalmente, para último lugar, aquela que poderá parecer uma das conclusões mais relevantes (e mais inovadoras) deste acórdão: “O art. 4.°, n.° 1, da referida convenção obriga a que a questão da análise da questão da residência seja feita individualmente, pessoa a pessoa, abstraindo da situação familiar do sujeito em causa”.

Porém, esta é uma posição há muito pacífi ca na nossa doutrina, desde ALBERTO XAVIER (tal como nos dão conta as referências doutrinais constantes do acórdão), mas que, até agora, não havia sido acolhida pelo STA.

Entendimento este que é decorrência necessária do que fi cou exposto: se a qualidade de residente supõe uma presença efectiva e uma

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ligação efectiva (a mais íntima das ligações fi scais) com o território de determinado Estado, tal avaliação terá, necessariamente, que ser ”feita individualmente, pessoa a pessoa, abstraindo da situação familiar do sujeito passivo”, como concluiu, e bem, o acórdão.

9 – A questão da tributação conjunta (a possibilidade de um ou ambos os Estados contratantes elegerem a família como unidade tributá-ria) é algo que pura e simplesmente, não assume relevo nas CDT.

O que se compreende: nas convenções está em causa, no que aqui releva, a partilha do direito à tributação entre os Estados contratantes e não a escolha de um qualquer modelo de tributação de rendimentos.

Ao Estado de residência cabe, em exclusivo, o direito à tributa-ção numa base mundial, ou seja, o direito de tributar os rendimentos por auferidos por determinado contribuinte, quer no seu território, quer os de fonte estrangeira. Como o fará é algo que não respeita ao acordo convencional10.

10 – O facto de a CDT conferir ao Estado da residência a competên-cia exclusiva para proceder a uma tributação de âmbito mundial inviabi-liza, por defi nição, a pretensão do outro Estado em proceder a idêntico tipo de tributação (invocar existência do mesmo tipo de conexão), sob pena de se gerar uma situação de dupla tributação (no caso, total)11. O que se projecta numa consequência inevitável: existindo “casais mistos” – em que cada um dos cônjuges deva, conformemente com os princípios convencionais, ser havido como residente num diferente país (situação de que o caso subjacente ao acórdão é exemplo) – cada um dos Estados contratantes apenas poderá tributar, a título de residente, um desses côn-juges (aquele que cuja residência fi scal deva ser localizada no respectivo território). Nestes casos a tributação separada é uma imposição conven-

10 Muitas das convenções subscritas por Portugal (nomeadamente a CDT Portu-gal/ Alemanha) foram celebradas na vigência dos impostos anteriores à Reforma Fiscal de 1989. Apesar da profunda mudança no modelo de tributação do rendimento que tal reforma provocou, as convenções existentes permaneceram em vigor, sem quaisquer alterações.

11 O princípio da unicidade da residência, expressamente invocado no acórdão.

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cional, que terá que acontecer apesar de o direito interno determinar a tributação conjunta dos cônjuges12.

11 – Em resumo, um acórdão inovador no contexto da nossa juris-prudência, que procedeu à correcta aplicação do direito numa área pouco conhecida pelos nossos Tribunais, com uma fundamentação clara, sucinta e bem sustentada em referências doutrinais, a merecer o nosso inteiro aplauso.

12 O que, já no quadro da legislação vigente, nos leva a questionar a conformidade do disposto no n.° 4 do art. 16.° do CIRC com as exigências decorrentes de uma CDT. Nestes casos, não está em causa uma separação de facto, mas a imposição, resultante de uma norma de direito internacional convencional, de que aconteça a tributação separada. O regime aplicável deverá, assim, ser o dos não-casados.

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PROTOCOLO ENTRE A CÂMARA MUNICIPAL DA MAIA E A “MACMAI – MATADOURO AGRÍCOLA DA MAIA, LDA.,” TENDO EM VISTA A ASSUNÇÃO DO PASSIVO DESTA SOCIEDADE. ATRI-BUIÇÕES DAS AUTARQUIAS LOCAIS E COMPETÊNCIA DOS SEUS ÓRGÃOS. REALIZAÇÃO DE DESPESAS SEM SUPORTE LEGAL. NULIDADE. RECUSA DE VISTO.

COMENTÁRIO AO ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS N.° 5/09, DE 20 JANEIRO, PROC. N.° 800/08 – 1.ª SECÇÃO

Nuno Cunha Rodrigues1

No Acórdão do Tribunal de Contas n.° 5/09, de 20 de Janeiro (1.ª Secção – Subsecção) – Proc. n.° 800/08 –, decidiu-se:

I. A Câmara Municipal da Maia submeteu a fi scalização prévia do Tribunal de Contas uma minuta de protocolo a celebrar com a socie-dade comercial da “MACMAI, Lda”., criada e regida pela lei comercial, designadamente pelo Código das Sociedades Comerciais.

II. Embora o Município da Maia seja sócio da citada empresa, não é validamente detentora da maioria do capital social, uma vez que foram inválidos os aumentos de capital social ocorridos após a sua constituição.

III. Por esta razão, detendo o Município da Maia apenas 50% do capital social da empresa, esta não possui a natureza jurídica de empresa municipal, por não estar preenchido o requisito da al. a) do art. 3.° da Lei n.° 53-F/2006, de 29 de Dezembro.

1 Assistente da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa

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IV. Por outro lado, a decisão de criação de empresas municipais, bem como a decisão de tomada de uma participação que confi ra infl u-ência dominante, deve ser precedida de estudos técnico-fi nanceiros que demonstrem a viabilidade económica da unidade e a racionalidade da operação, o que não ocorreu no caso vertente.

V. Tendo a “MACMAI, Lda.”encerrado a sua actividade em 31-07-2007, com dívidas que, à data de 7-09-2007, se contabilizaram em €671.234,95, a Câmara Municipal da Maia deliberou, em 12-09-2007, reorganizar o capital social da empresa e, em 5-06-2008, assumir o pas-sivo da mesma, em lugar de requerer a dissolução administrativa da sociedade, por força do art. 142.° do Código das Sociedades Comerciais.

VI. Ora, para além de não ter sido obtida autorização da Assem-bleia Municipal para tal deliberação, nas circunstâncias do caso con-creto em apreço, a Câmara Municipal não tinha competência para tal, face ao disposto no art. 64.° da Lei n.° 169/99, de 18 de Setembro.

VII. Nestes termos, a deliberação da Câmara Municipal de assun-ção do passivo de uma empresa de que é associada e cuja actividade se encontrava encerrada não tem suporte legal no quadro das atribuições do Município e da competência dos respectivos órgãos, como resulta do disposto nos arts. 53.°, n.° 2, e 64.° da Lei n.° 169/99, de 18 de Setembro.

VIII. As deliberações de qualquer órgão dos municípios que deter-minem ou autorizem a realização de despesas não permitidas por lei são nulas, de acordo com o disposto no art. 3.°, n.° 4, da Lei das Finanças Locais.

IX. Nos termos do art. 44.°, n.° 3, al. a) da Lei n.° 98/97, de 26 de Agosto, constitui fundamento de recusa de visto a desconformidade dos actos, contratos e demais instrumentos que implique nulidade.

1. O presente acórdão tem por objecto a fi scalização prévia de uma minuta de protocolo a celebrar entre a Câmara Municipal da Maia e “Macmai – Matadouro Agrícola e Comercial da Maia, Lda.”, tendo em vista a assunção do passivo desta sociedade.

A empresa em causa – “Macmai” – é uma sociedade por quotas detida a 50% pelo Município da Maia.

O Tribunal de Contas procede à análise dos factos à luz do regime jurídico do sector empresarial local – aprovado pela Lei n.° 53-F/2006, de 29 de Dezembro.

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Comentários de Jurisprudência

A aplicação deste regime implica a qualifi cação da empresa com referência ao disposto no artigo 3.°, n.° 1 daquele diploma.

2. A noção de empresa municipal, intermunicipal ou metropolitana, prevista no artigo 3.°, n.° 1 da Lei n.° 53-F/2006, parte do conceito de infl uência dominante. Este conceito assenta no critério da detenção pelo município, associação de municípios ou área metropolitana da:

i) maioria do capital social ou dos direitos de votos ou ii) direito de designar ou destituir a maioria dos membros do órgão

de administração ou de fi scalização.

A solução é uma réplica da que decorre do regime jurídico do sector empresarial do Estado – aprovado pelo Decreto-Lei n.° 558/99, de 17 de Dezembro2 – e é claramente inspirada na noção de empresa pública utilizada no direito comunitário.

Neste domínio, a Directiva 2006/111/CE, de 16 de Novembro de 20063, relativa à transparência das relações fi nanceiras entre os Esta-dos-membros e as empresas públicas, bem como à transparência fi nan-ceira relativamente a certas empresas, defi ne empresa pública, no artigo 2.°, alínea b), como qualquer empresa em que os poderes públicos pos-sam exercer, directa ou indirectamente, uma infl uência dominante em consequência da propriedade, da participação fi nanceira ou das regras que a disciplinam. Estabelece, por outro lado, nas alíneas a), b) e c), pre-sunções da existência de infl uência dominante.

Como tivemos ocasião de sustentar, as noções de empresa pública (e, consequentemente, de empresa municipal, intermunicipal e metropo-

2 Este diploma sofreu uma modifi cação substantiva com a aprovação do Decreto--Lei n.° 300/2007, de 23 de Agosto, que adaptou o regime do sector empresarial do Estado às modifi cações introduzidas no Código das Sociedades Comerciais com a Lei n.° 76-A/2006, de 29 de Março.

3 A directiva revogou a Directiva 80/723/CE, de 25 de Junho de 1980 que conti-nha uma defi nição rigorosamente idêntica de empresa pública. A Directiva 80/723/CE foi transposta para o direito português pelo Decreto-Lei n.° 148/2003, de 11 de Julho, alterado pelo Decreto-Lei n.° 120/2005, de 26 de Julho e pelo Decreto-Lei n.° 69/2007, de 26 de Março.

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litana) resultantes da aplicação do direito português e do direito comuni-tário não são coincidentes.4

No direito comunitário, o conceito de empresa pública é mais compreensivo do que no direito português. Neste, a noção de infl uência dominante reconduz-se a um elenco de situações tipifi cadas na lei; no direito comunitário, exprime-se exemplifi cativamente por um conjunto de situações descritas na directiva.

Trata-se, em qualquer caso, de situações distintas: por um lado, a transparência fi nanceira na relação entre o Estado e o sector público empresarial (em que a noção de empresa pública refl ecte a noção comu-nitária); por outro lado, a conceptualização jurídica de empresa pública, operante a nível interno, de harmonia com o entendimento fundado no princípio da neutralidade proclamado pelo artigo 295.° do TCE.

O acórdão em análise considera que, apesar de a autarquia deter apenas 50% do capital social da empresa, não se encontra preenchido o requisito previsto na alínea a) do artigo 3.° da Lei n.° 53-F/2006, de 29 de Dezembro, pelo que não pode ser qualifi cada como empresa municipal.

Parece-nos correcto este entendimento, ainda que se afaste, como vimos, da solução postulada pelo direito comunitário que, de jure con-dendo, deveria, a nosso ver, ser traduzida no direito português.

3. O acórdão examina irregularidades que apelam à aplicação simultânea do Código das Sociedades Comerciais, da Lei de Finanças Locais e do Regime Jurídico do Sector Empresarial Local. As irregulari-dades estão relacionadas, nomeadamente, com a deliberação de aumento de capital social.

4. A questão nuclear consistia em saber se um município pode deli-berar a assunção do passivo de uma empresa participada cuja actividade se encontra encerrada. O Tribunal de Contas entendeu que a deliberação não tem suporte legal nem no quadro das atribuições do município nem no das competências dos respectivos órgãos.

4 Cfr. NUNO CUNHA RODRIGUES, “Golden-shares” – As empresas participadas e os privilégios do Estado enquanto accionista minoritário, Coimbra Editora, Coimbra, 2004, p. 72.

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Duas matérias abordadas pelo Tribunal de Contas merecem refl e-xão particular:

i) Saber se uma operação de aumento de capital realizada por um município, numa empresa participada, deve ser qualifi cada como uma decisão de tomada de uma participação;

ii) Saber se a decisão de assunção do passivo de uma empresa par-ticipada por um município se enquadra nas suas atribuições;

5. Em termos sintéticos, cremos que a resposta a ambas as questões não pode ser dada sem a análise do caso concreto.

É que a decisão de aumento de capital pode implicar a alteração da qualifi cação jurídica da empresa (quando, verbi gratia, na decorrência do aumento de capital, o município deixa de ser maioritário ou, em sentido inverso, quando a empresa participada passa a empresa municipal) ou implicar a entrada do município como novo sócio (subscrevendo parte ou a totalidade do aumento de capital social numa sociedade da qual não era sócio).

O aumento de capital pode, contudo, ter um efeito neutral na estru-tura da empresa e na participação do município já existente (visando, v.g., o reforço dos capitais próprios da sociedade).

Neste último caso, não haverá lugar à aplicação do artigo 9.°, n.° 1 da Lei n.° 53-F/2006 que exige a apresentação de um estudo de viabili-dade económico-fi nanceira.

Esta exigência verifi ca-se apenas quanto à decisão de criação das empresas, bem como a decisão de tomada de uma participação que con-fi ra infl uência dominante.

Não pode fazer-se equivaler a uma decisão de tomada de partici-pação qualquer operação de aumento de capital social, nomeadamente quando a estrutura societária se mantém rigorosamente inalterada.

O mesmo não pode dizer-se quando, em resultado da operação de aumento de capital, o município passa de sócio minoritário a sócio maio-ritário da empresa ou quando o município, não sendo sócio, subscreve o aumento de capital social.

Idêntico raciocínio é aplicável ao disposto nos artigos 53.°, n.° 2, alínea m) e 64.° da Lei n.° 169/99, de 18 de Setembro.

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Nestes preceitos, defi ne-se a competência da assembleia municipal para autorizar o Município a criar ou participar em empresas privadas de âmbito municipal.

Uma operação de aumento de capital social não pode ser equi-parada, genericamente, à decisão de participar em empresas privadas quando, em rigor, a decisão de participar pode já ter sido tomada ante-riormente pelo município (na medida em que, sendo sócio, decide subs-crever o aumento de capital social).

Ora, no caso em apreço, o município já era sócio da empresa e o aumento de capital social não produziu a modifi cação da estrutura socie-tária da empresa.

Neste ponto, hesitaríamos em aderir ao entendimento do Tribunal de Contas quando aplicou o artigo 9.°, n.° 1 da Lei n.° 53-F/2006.

6. Diga-se, por último, que a assunção do passivo de empresas deti-das por municípios decorre, em alguns casos, de imperativo legal, ainda que não esteja expressamente prevista nas atribuições dos municípios.5

Referimo-nos ao artigo 31.°, n.° 2 da Lei n.° 53-F/2006, de 29 de Dezembro, que, no caso de o resultado de exploração anual operacional acrescido dos encargos fi nanceiros se apresentar negativo, exige a reali-zação de uma transferência fi nanceira a cargo dos sócios, na proporção respectiva da participação social, com vista a equilibrar os resultados de exploração operacional do exercício em causa, norma que entendemos aplicável quer às empresas municipais, intermunicipais e metropolitanas quer às empresas participadas (ainda que, nestas últimas, apenas quanto à participação social detida por entes públicos locais).

Poder-se-ia, consequentemente, legitimar uma decisão de realiza-ção de despesa fundada neste preceito, ainda que não expressamente pre-vista na Lei n.° 169/99, de 18 de Setembro.

5 Sem prejuízo das atribuições dos municípios se encontrarem refl examente pre-vistas no objecto social das empresas por estes detidas de harmonia com o artigo 5.° da Lei n.° 53-F/2006.

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Comentários de Jurisprudência

SÍNTESE DOS PRINCIPAIS ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DAS COMUNIDADES EM MATÉRIA FISCAL PROFERIDOS DESDE FEVEREIRO DE 2009

IMPOSTO SOBRE O VALOR ACRESCENTANDO

Processo C-357/07 (Segunda Secção) de 23 de Abril de 2009

Sexta Directiva IVA – Isenções – Artigo 13.°, A, n.° 1, alínea a) – Prestações realizadas pelos serviços públicos postais

O conceito de «serviços públicos postais», constante do artigo 13.°, A, n.° 1, alínea a), da Sexta Directiva, deve ser interpretado no sentido de que visa os operadores, públicos ou privados, que se obrigam a assegurar num Estado-Membro a totalidade ou parte do serviço postal universal, tal como é defi nido no artigo 3.° da Directiva 97/67/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Dezembro de 1997, relativa às regras comuns para o desenvolvimento do mercado interno dos serviços postais comunitários e a melhoria da qualidade de serviço, conforme alterada pela Directiva 2002/39/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 10 de Junho de 2002.

A isenção prevista no artigo 13.°, A, n.° 1, alínea a), da Sexta Direc-tiva, aplica-se a prestações de serviços e a entregas de bens acessórias destas, com excepção dos transportes de pessoas e das telecomunica-ções, que os serviços públicos postais realizam nessa qualidade, ou seja, precisamente em virtude da sua qualidade de operador que se obriga a assegurar num Estado-Membro a totalidade ou parte do serviço postal universal. Não se aplica a prestações de serviços nem a entregas de bens acessórias destas, cujas condições sejam negociadas individualmente.

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Processo C-74/08 (Quarta Secção) de 23 de Abril de 2009

Sexta Directiva IVA – Adesão de um novo Estado-Membro – Imposto relativo à aquisição subvencionada de bens de equipamento – Direito a dedução – Exclusões previstas por uma legislação nacional no momento da entrada em vigor da Sexta Directiva – Faculdade de os Estados-Membros manterem exclusões

O artigo 17.°, n.os 2 e 6, da Sexta Directiva, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que, em caso de aqui-sição de bens subvencionada por fundos públicos, só permite deduzir o imposto sobre o valor acrescentado correspondente à parte dessa aquisi-ção que não tenha sido subvencionada.

O artigo 17.° n.° 2, da Sexta Directiva confere aos sujeitos passivos direitos que estes podem invocar perante o juiz nacional para se oporem a uma legislação nacional incompatível com essa disposição.

Processo C-10/08 (Primeira Secção) de 19 de Março de 2009

Tributação na Finlândia dos veículos usados importados de outros Estados-Membros – Conformidade da legislação nacional com o artigo 90.°, primeiro parágrafo, CE, a Sexta Directiva IVA e a Directiva 2006/112/CE

Ao permitir que o imposto previsto no artigo 5.° da Lei n.° 1482/1994, relativa ao imposto sobre os veículos [autoverolaki (1482/194)], de 29 de Dezembro de 1994, seja deduzido ao imposto sobre o valor acrescentado, nos termos do artigo 102.°, n.° 1, ponto 4, da Lei n.° 1501/1993, relativa ao imposto sobre o valor acrescentado [arvonlisäverolaki (1501/1993)], de 30 de Dezembro de 1993, a Republica da Finlândia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 90.°, primeiro pará-grafo, CE, bem como do artigo 17.°, n.°s. 1 e 2, da Sexta Directiva.

Ao optar, no imposto sobre veículos, pelo mesmo valor tributável para os veículos com menos de três meses e para os veículos novos, a República da Finlândia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 90.°, primeiro parágrafo, CE.

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Comentários de Jurisprudência

Processo C-302/07 (Quarta Secção) de 5 de Março de 2009

Primeira e Sexta Directivas IVA – Princípios da neutralidade fi scal e da proporcionalidade – Regras respeitantes ao arredondamento dos montantes do IVA – Métodos e níveis de arredondamento

O direito comunitário, no seu estado actual, não contém um pre-ceito específi co respeitante ao método de arredondamento dos montan-tes de imposto sobre o valor acrescentado. Na falta de regulamentação comunitária específi ca, cabe aos Estados-Membros determinar as regras e os métodos de arredondamento dos montantes do imposto sobre o valor acrescentado, estando esses Estados obrigados, no momento desta determinação, a respeitar os princípios em que assenta o sistema comum deste imposto, nomeadamente os da neutralidade fi scal e da proporciona-lidade. Em particular, o direito comunitário, por um lado, não se opõe à aplicação de uma regra nacional que exija o arredondamento para o valor superior dos montantes do imposto sobre o valor acrescentado, quando a fracção da mais pequena unidade monetária em causa seja igual ou superior a 0,5, e, por outro, não exige que os sujeitos passivos sejam autorizados a arredondar para o número inferior o montante do imposto sobre o valor acrescentado, quando esse montante comporta uma fracção da mais pequena unidade monetária nacional.

No caso de uma venda a um preço que inclua o imposto sobre o valor acrescentado, na falta de regulamentação comunitária específi ca, incumbe a cada Estado-Membro determinar, nos limites do direito comu-nitário, nomeadamente respeitando os princípios da neutralidade fi scal e da proporcionalidade, o nível em que o arredondamento de um montante do imposto sobre o valor acrescentado que comporta uma fracção da mais pequena unidade monetária pode ou deve ocorrer.

Dado que os operadores que calculam os preços das suas vendas de bens e das suas prestações incluindo o imposto sobre o valor acrescen-tado se encontram numa situação diferente dos que efectuam esse mesmo tipo de operações a preços sem imposto sobre o valor acrescentado, os primeiros não podem invocar o princípio da neutralidade fi scal para rei-vindicar a autorização de proceder igualmente ao arredondamento por defeito ao nível da linha de produtos e da transacção dos montantes do imposto sobre o valor acrescentado devidos.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

Processo C-1/08 (Terceira Secção), 19 de Fevereiro de 2009

Sexta Directiva IVA – Artigo 9.°, n.° 2, alínea e) – Artigo 9.°, n.° 3, alínea b) – Décima Terceira Directiva IVA – Artigo 2.° – Lugar da pres-tação – Prestações de serviços de publicidade – Reembolso do IVA – Representante fi scal

Em matéria de prestação de serviços de publicidade, quando o des-tinatário da prestação está estabelecido fora do território da Comunidade Europeia, o lugar da prestação é, em princípio, nos termos do artigo 9.°, n.° 2, alínea e), da Sexta Directiva, o lugar da sede do destinatário. Toda-via, os Estados-Membros podem recorrer à faculdade prevista no artigo 9.°, n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva e determinar que o lugar da pres-tação dos serviços em causa, como excepção ao referido princípio, é o território do Estado-Membro em questão.

Se se recorrer à faculdade prevista no artigo 9.°, n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, a prestação de serviços de publicidade efectuada por um prestador estabelecido na Comunidade Europeia em benefício de um destinatário, fi nal ou intermediário, situado num Estado terceiro, consi-dera-se efectuada na Comunidade Europeia, desde que a utilização e a exploração efectivas, na acepção do artigo 9.°, n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, se realizem no território do Estado-Membro em questão. É o que sucede, em matéria de prestação de serviços de publicidade, quando as mensagens publicitárias objecto da prestação são difundidas a partir do Estado-Membro em questão.

O artigo 9.°, n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, não permite tribu-tar as prestações de serviços de publicidade asseguradas por um pres-tador de serviços estabelecido fora da Comunidade Europeia aos seus próprios clientes, ainda que esse prestador de serviços tenha a qualidade de destinatário intermediário relativamente a uma prestação de serviços anterior, uma vez que essa prestação não está abrangida pelo artigo 9.°, n.° 2, alínea e), dessa directiva, nem, mais geralmente, pelo artigo 9.° no seu todo, para os quais remete expressamente o artigo 9.°, n.° 3, alínea b), dessa mesma directiva.

A natureza tributável da prestação, na acepção do artigo 9.°, n.° 3, alínea b), da Sexta Directiva, não obsta ao direito do sujeito passivo ao reembolso do imposto sobre o valor acrescentado, quando preencha

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Comentários de Jurisprudência

os requisitos estabelecidos no artigo 2.° da Décima Terceira Directiva 86/560/CEE do Conselho, de 17 de Novembro de 1986, relativa à harmo-nização das legislações dos Estados-Membros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios – Modalidades de reembolso do imposto sobre o valor acrescentado aos sujeitos passivos não estabelecidos no território da Comunidade.

A nomeação de um representante fi scal não tem, em si mesma, inci-dência na natureza tributável ou não das prestações recebidas ou efectua-das pela pessoa representada

Processo C-515/07 (Quarta Secção) de 12 de Fevereiro de 2009

Sexta Directiva IVA – Bens e serviços afectos à empresa para os fi ns das operações tributáveis e de operações diferentes das operações tributáveis – Direito a dedução imediata e integral do imposto relativo à compra desses bens e serviços

Os artigos 6.°, n.° 2, alínea a), e o artigo 17.°, n.° 2, da Sexta Direc-tiva, devem ser interpretados no sentido de que não são aplicáveis à uti-lização de bens e de serviços afectos à empresa para os fi ns de operações diversas das operações tributáveis do sujeito passivo, pelo que o imposto sobre o valor acrescentado devido pela aquisição desses bens e desses serviços, relacionado com essas operações, não é dedutível.

CLOTILDE PALMA

Processo C-138/07 (Cobelfret) de 12 de Fevereiro de 2009 – A legislação belga previa que os rendimentos correspondentes a lucros dis-tribuídos por sociedades-fi lhas (incluindo não residentes) fossem incluí-dos na base tributável das sociedade-mãe, apenas ocorrendo dedução dos mesmos quantitativos se, após a dedução das perdas acumuladas de anos anteriores, a sociedade-mãe ainda apresentasse resultados positivos. Acresce que os valores não deduzidos não o podiam ser nos anos seguin-tes. Tal regime implicou uma efectiva tributação dos lucros recebidos pela sociedade Cobelfret, que apresentou nesses anos perdas reportáveis.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

O TJCE considerou este regime contrário à Directiva 90/435, ape-sar de ele se aplicar indistintamente a sociedades residentes e não resi-dentes, posto que ele implica uma real dupla tributação económica dos lucros (absorvidos pelas perdas) e não traduz com rigor o método da isenção previsto no artigo 4.º/n.º 1/1 travessão da mencionada Directiva.

Processo C-67/08 (Block) de 12 de Fevereiro de 2009 – O Estado Alemão, enquanto Estado da última residência do de cujus, liquidou o correspondente imposto sucessório ao único herdeiro, a Srª. M. Block. Simultaneamente, foi a herança objecto de imposto sucessório também em Espanha, onde se situavam alguns bens, a saber capitais aplicados em instituições fi nanceiras. Este imposto espanhol não foi deduzido ao imposto alemão – mas apenas considerado dívida da herança – pelo que subsiste alguma dupla tributação fi scal internacional (situação que não se verifi caria acaso o de cujus apenas possuísse bens na Alemanha).

O TJCE considerou que o método de eliminação da dupla tribu-tação adoptado pela legislação alemã não afronta a liberdade de circula-ção de capitais (artigo 56.º), posto que não existe qualquer harmonização fi scal na presente área, o que pode conduzir a que o tratamento fi scal concedido a bens sitos na Alemanha ou sitos fora da Alemanha não seja neutral.

GUSTAVO LOPES COURINHA

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Comentários de Jurisprudência

SÍNTESE DE ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

[1.° E 2.° TRIMESTRES DE 2009]

ACÓRDÃO N.º 26/09

Pronuncia-se pela inconstitucionalidade, por violação do disposto no artigo 227.º, n.º 1, alínea a), da Constituição, das normas contidas nos artigos 1.º e 2.º, do Decreto Legislativo Regional, aprovada na ses-são plenária de 16 de Dezembro de 2008, da Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, intitulado “Alteração à lei orgânica da Assembleia Legislativa”, em especial no que concerne à matéria do fi nanciamento público para a realização dos fi ns próprios dos partidos políticos e a competência legislativa do parlamento regional.

ACÓRDÃO N.º 128/09

Não julga inconstitucional, face aos artigos 2.º e 103.º, n.º 3, da Constituição, a norma ínsita ao artigo 7.º, n.º 3, da Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, na parte em que revoga o n.º 31 do artigo 11.º do Código Municipal de Sisa e de Imposto sobre Sucessões e Doações, quando aplicável a transacções ocorridas depois da sua entrada em vigor e a sociedades abrangidas pelo regime de tributação do lucro consolidado

ACÓRDÃO N.º 129/09

Não julga inconstitucionais, face aos artigos 29.º, n.º 2, e 30.º, n.º 3, da Constituição, as normas do artigo 8.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

Junho, na parte em que se refere à responsabilidade civil subsidiária dos administradores e gerentes por coimas aplicadas a pessoas colectivas em processo de contra-ordenação.

ACÓRDÃO N.º 144/2009

Julga inconstitucionais as normas dos artigos 10.º n.º 4 e 13.º n.º 1, alínea a) do Regulamento da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, aprovado pela Portaria n.º 487/83, de 27 de Abril, na redacção dada pelo n.º 1.º da Portaria nº 884/94, de 1 de Outubro, e a norma do n.º 2.º da Portaria nº 884/94, de 1 de Outubro, no segmento em que revoga os artigos 19.º e 20.º do referido Regulamento, por violação do princípio da precedência da lei, consagrado no n.º 7 do artigo 115º da Constituição, na versão decorrente da Lei Constitucional n.º 1/82 (actual n.º 7 do artigo 112.º).

ACÓRDÃO N.º 150/09

Não julga inconstitucional, face aos artigos 30.º, n.º 3, e 32.º, n.º 2, da Constituição, as normas do artigo 7.º-A do Regime Jurídico das Infrac-ções Fiscais Não Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 20-A/90, de 15 de Janeiro, na parte em que se refere à responsabilidade civil subsidi-ária dos administradores e gerentes pelos montantes correspondentes às coimas aplicadas a pessoas colectivas em processo de contra-ordenação fi scal.

ACÓRDÃO N.º 151/09

Não julga inconstitucional, face aos artigos 1.º, 18.º, n.º 2, 29.º, n.º 1, 32.º, n.º 1, 266.º, n.º 2, e 268.º, n.º 3, da Constituição, a norma extraída do artigo 105.°, nº 4, alínea b), do Regime Geral das Infracções Tribu-tárias segundo a qual pode ser criminalmente punido quem tenha sido notifi cado para pagar uma prestação tributária acrescida dos respectivos juros, sem que seja indicado o montante concreto desses juros, nem a

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Comentários de Jurisprudência

forma de os calcular, designadamente por omissão das respectivas taxas, do período de cálculo dos mesmos e das normas legais que os prevêem.

ACÓRDÃO N.º 234/09

Não julga inconstitucional, face aos artigos 30.°, n.°3, e 32.°, n.° 2, da Constituição, as normas do artigo 7.°-A do Regime Jurídico das Infrac-ções Fiscais Não Aduaneiras, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 20-A/90, de 15 de Janeiro, na parte em que se refere à responsabilidade civil subsidi-ária dos administradores e gerentes pelos montantes correspondentes às coimas aplicadas a pessoas colectivas em processo de contra-ordenação fi scal.

(Nota: Todos os Acórdãos encontram-se disponíveis em http://www.tribunalconstitucional.pt)

Guilherme W. D’Oliveira Martins Miguel Bastos Cristina Máximo dos Santos

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Comentários de Jurisprudência

SÍNTESE DE JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO DE MARÇO A MAIO 2009

IMPOSTO/FIGURAS AFINS

Processo n.° 0947/08 (2.ª) de 18-02-2009

A Distinção Constitucional e Legal entre os Conceitos de Imposto e de Taxa

A distinção constitucional e legal entre os conceitos de imposto e de taxa tem por base o carácter unilateral ou bilateral e sinalagmático dos tributos, sendo qualifi cáveis como impostos os que têm aquela pri-meira característica e como taxas os que têm as últimas. Essa relação sinalagmática entre o benefício recebido e a quantia paga não implica uma equivalência económica rigorosa entre ambos, mas não pode ocor-rer uma desproporção que, pela sua dimensão, demonstre com clareza que não existe entre aquele benefício e aquela quantia a correspectivi-dade ínsita numa relação sinalagmática. Tem a natureza de taxa o tributo cobrado por uma autarquia, conexionado com a actividade de licencia-mento de instalação de infra-estruturas de telecomunicações. Na apre-ciação da existência ou não de desproporção entre o tributo liquidado e a actividade desenvolvida como contrapartida pelo ente público, há que ter em conta os encargos gerais necessários para a manutenção dos ser-viços municipais conexionados com a prestação de tal serviço, que, sem descaracterização da relação como sinalagmática, podem ser ponderados na fi xação do valor dos tributos a cobrar, a fi m de serem repartidos pelos utentes desses serviços.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

IMPOSTOS SOBRE O RENDIMENTO

IRS

Processo n.° 068//09 (2.ª) de 25-03-2009

Convenção para evitar a Dupla TributaçãoA remissão para a legislação fi scal interna dos Estados contratantes

constante do artigo 4.°, n.° 1 da Convenção entre a República Portu-guesa e a República Federal da Alemanha para evitar a Dupla Tributação em matéria de Impostos sobre o rendimento e sobre o Capital não deve ser entendida como uma remissão incondicional. O artigo 4.°, n.° 1 da referida Convenção obriga a que a análise da questão da residência seja feita individualmente, pessoa a pessoa, abstraindo da situação familiar do sujeito em causa e estabelece limites à natureza das conexões adop-tadas pelas leis dos Estados Contratantes, impondo-se que tais critérios exprimam uma ligação efectiva com o território do Estado. O critério de “residência por dependência” adoptado no artigo 16.°, n.° 2 do Código do IRS, porque não respeita as limitações convencionais ao conceito de residência que os Estados Contratantes podem adoptar, não é funda-mento válido para uma pretensão tributária do Estado português em face de um residente na Alemanha que aí tenha obtido no ano em causa todos os seus rendimentos e que não seja tributado nesse país apenas pelo facto de o Estado alemão ser o Estado da fonte dos rendimentos do trabalho.

IRC

Processo n.° 0916/08 (2.ª) de 25-02-2009

Benefício Fiscal por “criação de empregos para jovens”O benefício fi scal, de majoração de custos dedutíveis ao lucro tribu-

tável em IRC, por “criação de empregos para jovens”, previsto no artigo 48.°-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais (aprovado pelo Decreto-Lei n.° 215/89, de 1 de Julho), na redacção introduzida pela Lei n.° 72/98, de 3 de Novembro (a que corresponde o artigo 17.° na redacção do Decreto-Lei n.° 198/2001, de 3 de Julho), é atribuído quando houver no exercício

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Comentários de Jurisprudência

«criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos». A condição legal-mente prescrita, de “criação líquida de postos de trabalho”, não pode dar-se por cumprida, unicamente e sem mais, pela celebração de contra-tos sem termo com trabalhadores inicialmente contratados a termo ou a termo incerto. O cumprimento daquela condição legal exige a verifi cação de acréscimo efectivo do número global de trabalhadores jovens admiti-dos na empresa em determinado exercício, por contrato sem termo.

Processo n.° 0890/09 (2.ª) de 19-03-2009

Tributação por métodos indirectosA tributação por métodos indirectos não só não constitui o meio

normal, como a possibilidade do seu uso está restringida aos casos em que a lei expressamente a admite, verifi cados que estejam determina-dos pressupostos. Se os peritos dos Serviços da Fiscalização Tributária detectaram que a contabilidade do contribuinte não permite formular um juízo de valor sobre as margens de comercialização de azeite, justifi ca-se o recurso a métodos indiciários. O direito à fundamentação do acto tributário ou em matéria tributária, constitui uma garantia específi ca dos contribuintes, devendo obedecer aos requisitos expressos nos art.s 82° do CPT e 125° do CPA, correspondentes, aliás, no essencial, ao art. 1°, n.°s 1 e 2 do Decreto-Lei n.° 256-A/77 de 17/06 – cfr., hoje, o art. 77° da LGT. Não está fundamentado um acto de liquidação, com uso de méto-dos indirectos, em que foi aplicada uma margem de comercialização de 25% sobre o presumido volume de vendas, sem nada se dizer sobre as razões da escolha dessa margem, em detrimento de qualquer outra.

Processo n.° 0548/08 (2.ª) de 22-04-2009

Conceitos próprios de fusão de sociedades (art. 67.° do CIRC) e os conceitos de fusão de sociedades comerciais adoptados no Código das Sociedades Comerciais

A adopção de conceitos próprios de fusão de sociedades, que é feita no n.° 1 do art. 67.° do CIRC, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

n.° 221/2001, de 7 de Agosto, tem o alcance de afastar, nesta matéria, os conceitos de fusão de sociedades comerciais adoptados no Código das Sociedades Comerciais, que eram aplicáveis à face da redacção inicial do CIRC, que não continha conceitos próprios. Justifi ca-se que, no âmbito do direito fi scal, se considerem como casos de fusão de sociedades os de transferência global de activo e passivo de uma sociedade para outra que é detentora da totalidade do seu capital social, quando não houve qual-quer actividade distinta dessa que seja denominada «liquidação». Não podem considerar-se «elementos necessários ou convenientes para o per-feito conhecimento da operação» de fusão de sociedades os necessários para averiguar se existem ou não dívidas à Segurança Social. Formado deferimento tácito, nos termos do art. 69.°, n.° 7, do CIRC, na redacção da Lei 32-B/2002, de 30 de Dezembro, sobre um pedido de transmissi-bilidade dos prejuízos fi scais, na sequência de fusão de sociedades, ele confi gura um acto constitutivo de direitos para o requerente, que só pode ser revogado com fundamento em invalidade [arts. 140.° e 141.° do CPA, subsidiariamente aplicáveis, por força do preceituado nos arts. 2.°, alínea c), da LGT e 2.°, alínea d), do CPPT].

IVA

Processo n.° 0951/08 (2.ª) de 15-04-2009

Factura para Dedução de ImpostoA factura ou documento equivalente passado em forma legal exi-

gida pelo artigo 19.°, n.° 2 do CIVA para a dedução do imposto é a que respeite todas as exigências do artigo 35.°, n.° 5 do mesmo Código. A exigência desse formalismo constitui um verdadeiro requisito substan-cial do direito à dedução do imposto, apesar de o sujeito passivo estar isento de IVA

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Comentários de Jurisprudência

PROCEDIMENTO E PROCESSO TRIBUTÁRIO

Processo n.° 0111/09 (2.ª) de 04-03-2009

Litigância de Má FéDa conjugação dos artigos 13.° e 114.° do CPPT não decorre que

o juiz esteja obrigado à realização de todas as diligências que sejam requeridas pelas partes, antes o dever de realizar as correspondentes diligências se deve limitar àquelas que o tribunal considere, no seu livre juízo de apreciação, como úteis ao apuramento da verdade. O prazo de um ano previsto no artigo 177.° do CPPT (extinção da execução) reveste natureza ordenadora e disciplinadora, daí resultando que a não conclusão do processo nesse prazo não tem qualquer relevo a nível da cobrança da dívida, não provocando, designadamente, a extinção da execução fi scal. A condenação como litigante de má fé não reveste uma dimensão violadora do princípio do acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva, uma vez que o uso dos correspondentes meios processuais não pode deixar de estar submetida a regras éticas de lisura e transparência.

Processo n.° 0709/08 (2.ª) de 11-03-2009

Presunções Legais e Presunções JudiciaisA responsabilidade subsidiária de gerentes de sociedades, prevista

no art. 24°, n° 1 da LGT, depende do exercício de facto da gerência. São presunções legais as que estão previstas na própria lei e presunções judiciais as que se fundam em regras práticas da experiência. Não há uma presunção legal que imponha a conclusão de que quem tem a qua-lidade de gerente de direito exerceu a gerência de facto. No entanto, o facto de não existir uma presunção legal sobre esta matéria, não tem como corolário que o Tribunal com poderes para fi xar a matéria de facto, no exercício dos seus poderes de cognição nessa área, não possa utilizar as presunções judiciais que entender, com base nas regras da experiência comum.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

Processo n.° 0135/09 (2.ª) de 19-03-2009

Derrogação do Sigilo BancárioAs decisões da administração tributária de acesso a informações

e documentos bancários de acordo com o art. 63°-B da LGT devem ser fundamentadas com expressa menção dos motivos concretos que as justifi cam, podendo essa fundamentação, em face do disposto no art. 77° do mesmo diploma, consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propos-tas, incluindo os que integrem o relatório de fi scalização tributária. Se a notifi cação de um acto tributário não continha os requisitos exigidos pelas leis tributárias tinha o recorrente à sua disposição a possibilidade de requerer a notifi cação da fundamentação ou dos requisitos exigíveis, nos termos do art. 37.° do CPPT ou de requerer a passagem de certidão gratuita. Se o contribuinte, no caso vertente, não usou tal possibilidade não pode vir depois pretender que o acto é nulo por falta de fundamen-tação da notifi cação, nem daí resulta qualquer violação constitucional. Tendo o juiz proferido sentença sem que, previamente, tenha procedido à inquirição das testemunhas arroladas na petição inicial e justifi cado tal procedimento por despacho devidamente fundamentado, tal omissão constitui não nulidade processual, mas sim erro de julgamento. O art. 146.°-B, n.° 3 do CPPT, na parte em que determina que os elementos de prova, a acompanhar a petição inicial, “devem revestir natureza docu-mental”, é materialmente inconstitucional por violar o disposto no art. 20.°, n.° 4 da CRP.

Processo n.° 0866/08 (2.ª) de 19-03-2009

Oposição à Execução FiscalA assunção de dívida, que consiste no acto pelo qual um terceiro se

vincula perante o credor a efectuar a prestação devida por outrem (artigo 595.° do CC), pode também ocorrer no domínio das dívidas tributárias, o que, de resto, se encontra contemplado no art. 7.° do Decreto-Lei n.° 124/96 de 10/8. Assim, assume voluntariamente a dívida exequenda a associação desportiva que interveio em nome de um seu associado num auto de aceitação de dação em pagamento. Em tal auto, a referida asso-

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Comentários de Jurisprudência

ciação interveio não só na qualidade de representante dos clubes mas também, sem dúvida, em nome próprio, dada a presença e intervenção dos seus legais representantes. O facto de ter iniciado todo este procedi-mento na qualidade de gestora de negócios dos clubes de futebol e de ter subscrito o aludido auto de dação na qualidade de representante desses clubes não signifi ca, nem é impeditivo, que a associação desportiva não pudesse assumir, como o fez, na qualidade de terceiro, responsabilidades na garantia da dívida ou que o credor não pudesse condicionar a acei-tação da dação à assunção da dívida remanescente por parte daquela. Deste modo, a Federação Portuguesa de Futebol, que, assim, assumiu as dívidas tributárias contraídas pelos clubes de futebol seus associados, é parte legítima na oposição à execução fi scal deduzida para cobrança de tais dívidas.

INFRACÇÕES TRIBUTÁRIAS

CONTRA-ORDENAÇÕES

Processo n.° 0103/09 (2.ª) de 15-04-2009

Recurso para Melhoria da Aplicação do DireitoNos processos judiciais por contra-ordenações tributárias pode ser

admitido recurso, mesmo que a coima aplicada seja de valor inferior à alçada dos tribunais tributários, quando tal se afi gure manifestamente necessário à melhoria da aplicação do direito (artigo 73.°, n.° 2 da Lei-Quadro das Contra-Ordenações, aplicável ex vi do artigo 3.°, alínea b) do RGIT). Não se confi gura uma situação de manifesta necessidade de admissão do recurso para a melhoria da aplicação do direito nos casos em que a decisão recorrida apenas adoptou uma corrente jurisprudencial mais exigente sobre o preenchimento do conceito “descrição sumária dos factos” que deve constar da decisão de aplicação da coima (artigo 79.°, n.° 1, alínea b) do RGIT).

Alexandra Pessanha e Ana Leal

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Comentários de Jurisprudência

SÍNTESE DE ACÓRDÃOS DO TRIBUNAL DE CONTAS DE JANEIRO A MARÇO DE 2009

1.ª Secção (fi scalização prévia)

1. Recusa de visto. Contratação de seguros de saúde, vida e aciden-tes pessoais.

No Acórdão do Tribunal de Contas n.° 8/09, de 18 de Fevereiro (1.ª Secção – Plenário) – Proc. de recurso ordinário n.° 18/08 –, decidiu-se:

I. A contratação de serviços de seguro de saúde, vida e acidentes pessoais para os trabalhadores de um Município carece de fundamento legal.

II. Não pode considerar-se que o disposto na alínea g) do n.° 2 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 122/2007 permita a contratação daqueles seguros. Este diploma legal não regula a acção social complementar como uma actividade a realizar pela via seguradora, com fi nancia-mento exclusivo pela Administração Pública, e, por outro lado, limita as prestações possíveis ao elenco a ser defi nido e regulado por Porta-ria, excluindo as prestações cobertas pelos regimes gerais de protecção social, e afastando ainda, em particular, as comparticipações em despe-sas de saúde.

III. A celebração de contratos de seguro de saúde, visando diversi-fi car o acesso dos trabalhadores a cuidados de saúde e assegurar-lhes uma comparticipação nas respectivas despesas, não integra quaisquer medidas activas de acompanhamento das condições de trabalho e da saúde. Não é, pois, minimamente adequada nem sufi ciente para cumprir as exigentes obrigações legais da Administração em matéria de higiene, segurança e saúde no trabalho, por não corresponder a nenhuma das formas descritas na lei para assegurar o cumprimento dessas obriga-

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ções legais e por não contemplar o acompanhamento e as actividades necessárias.

IV. Essa contratação viola ainda o disposto no artigo 156.° da Lei n.° 53-A/2006, de 28 de Dezembro, de acordo com o qual cessaram “com efeitos a 1 de Janeiro de 2007, quaisquer fi nanciamentos públicos de sistemas particulares de protecção social ou de cuidados de saúde”.

V. A contratação dos serviços de seguro, sem fundamento legal, implica a nulidade da deliberação que autorizou a despesa e a conse-quente nulidade do contrato celebrado, por força do disposto nos arti-gos 3.°, n.°s 2, al. e), e 4 da Lei das Finanças Locais e 42.°, n.° 6, al. a) da Lei de Enquadramento Orçamental, no ponto 2.3.4.2., alínea d), do POCAL e no artigo 95.°, n.° 2, al. b), da Lei n.° 169/99, constituindo ainda violação de normas fi nanceiras.

VI. Nos termos das alíneas a) e b) do artigo 44.° da LOPTC, a nuli-dade e a violação de normas fi nanceiras constituem fundamento para a recusa de visto aos contratos submetidos a fi scalização prévia do Tribu-nal de Contas.

2. Recusa de visto. Critério de adjudicação.No Acórdão do Tribunal de Contas n.° 36/09, de 18 de Fevereiro (1ª

Secção – Subsecção)– Proc. n.° 1482/08 –, decidiu-se:

I. Do disposto nos art.s 190.°, al. b), 194.°, n.° 1, 80.°, n.° 1 e 87.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 197/99, de 8 de Junho, resulta que os pro-cedimentos concursais conducentes a aquisição de bens móveis por parte dos municípios, de valor igual ou superior a €124.699,00, care-cem de ser publicitados no Jornal Ofi cial da União Europeia (JOUE), o que não sucedeu no caso em apreço, em que o contrato tem o valor de €490.854,24.

II. A não publicitação do concurso no JOUE traduz-se na falta de um elemento de uma enorme relevância para o procedimento em causa, consubstanciando-se numa ilegalidade grave, por ser fortemente cerce-adora da concorrência, e que, sendo susceptível de alterar o resultado fi nanceiro do contrato, é, só por si, fundamentado de recusa de visto ao contrato (art. 44.°, n.° 3, al, c), da Lei n.° 98/97, de 26 de Agosto).

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Comentários de Jurisprudência

III. Por outro lado, no caso vertente, a defi nição dos subfactores que integraram o critério de adjudicação, incluindo a respectiva ponde-ração quantitativa, foi estabelecida após o prazo fi xado para a entrega das propostas, mostrando-se, pois, violado o disposto no art. 94.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 197/99.

IV. Trata-se de uma ilegalidade grave por violar o núcleo essencial dos princípios da transparência e da imparcialidade, bem como o prin-cipio da concorrência, enquanto corolário do principio da estabilidade das regras concursais, e que, sendo susceptível de alterar o resultado fi nanceiro do contrato, é, só por si, no circunstancialismo apurado, fun-damento de recusa do visto ao contrato (art. 44.°, n.° 3, al. c), da Lei n.° 98/97, de 26 de Agosto).

V. Termos em que, com fundamento no art. 44.°, n.° 3, al. c, da citada Lei n.° 98/97, se decide recusar o visto ao contrato

3. Falta de cabimento orçamental. Recusa de visto.No Acórdão do Tribunal de Contas n.° 58/09, de 24 de Março (1ª

Secção – Subsecção)– Processo n.° 98/2009 –, decidiu-se que:

I. O n.° 1 do art. 4.° da Lei n.° 2/2007, de 15 de Janeiro (Lei das Finanças Locais), estabelece que os municípios estão sujeitos às normas consagradas na Lei de Enquadramento Orçamental.

II. A al. b) do n.° 6 do art. 42.° da Lei n.° 91/2001, de 20 de Agosto, alterada pelas Leis n.°s. 2/2002, de 28 de Agosto, 23/2003, de 2 de Julho, e 48/2004, de 24 de Agosto (Lei de Enquadramento Orçamental) esta-belece que nenhuma despesa possa ser autorizada sem que disponha de inscrição orçamental e tenha cabimento na respectiva dotação.

III. Por outro lado, a al. d) do n.° 2.3.4.2. do POCAL (aprovado pelo Decreto-Lei n.° 54-A/99, de 22 de Fevereiro, com alterações introduzi-das pelos Decretos-Leis n.° 162/99, de 14 de Setembro, e n.° 315/2000, de 2 de Dezembro) determina que as despesas só podem ser cativadas, assumidas, autorizadas e pagas se, para além de serem legais, estiverem inscritas no orçamento e com dotação igual ou superior ao cabimento e ao compromisso, respectivamente.

IV. No caso em apreço, ao autorizar-se a celebração do contrato e a despesa correspondente sem estarem assegurados os fi nanciamentos

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previstos no PPI e sendo a informação de cabimento prestada mera-mente formal, foi violado o disposto na al. d) do n.° 2.3.4.2. e no n.° 2.6.1. do POCAL e na al. b) do n.° 6 do art. 42.° da Lei de Enquadra-mento Orçamental.

V. Estabelece o n.° 1 do art. 44.° da Lei n.° 98/97, de 26 de Agosto, que a fi scalização prévia tem por fi m verifi car se os actos, contratos ou outros instrumento geradores de despesa estão conformes à lei e se os respectivos encargos têm cabimento em verba orçamental própria.

VI. Nos termos do art. 44.°, n.° 3, al. b) da citada Lei n.° 98/97, constitui fundamento de recusa de visto a desconformidade dos actos e contratos que implique encargos sem cabimento em verba orçamental própria.

4. Preço anormalmente baixo. Notas justifi cativas dos preços. Poder discricionário. Conceito indeterminado. Procedimento contraditório especifi co em caso de preço anormalmente baixo. Preço de fornecimento dos documentos do concurso. Visto com recomendações

No Acórdão do Tribunal de Contas n.° 13/09, de 24 de Março (1.ª Secção – Plenário)

– Processo de Recurso Ordinário n.° 21/2008-R –, decidiu-se:

I. O artigo 107.°, n.° 1, alínea f) do Decreto-Lei n.° 59/99, de 2 de Março (RJEOP), estabelece uma proibição de adjudicação da emprei-tada quando todos os concorrentes apresentam propostas com preços totais anormalmente baixos e as respectivas notas justifi cativas forem tidas como não esclarecedoras. Trata-se de um comando imperativo dirigido à Administração e ao qual esta está vinculada. É um poder-dever de não adjudicação que constitui uma excepção ao dever de adju-dicação que, em geral, impera nos procedimentos visando a contratação púbica para realização de obras públicas. Tal proibição é testemunhada pela evolução legislativa nesta matéria.

II. A proibição de não adjudicação pressupõe a verifi cação de dois pressupostos:

a) O preço total apresentado por cada e todas as propostas ser anormalmente baixo, o que constitui um conceito indeterminado;

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Comentários de Jurisprudência

b) As notas justifi cativas dos preços serem consideradas como não esclarecedoras o que envolve o exercício de um poder discricio-nário na sua apreciação.

III. No exercício do poder discricionário de apreciação das notas justifi cativas o aplicador do direito, está balizado:

a) Por um critério de competência: no caso, a comissão de ava-liação e a Câmara Municipal que assumiu o relatório daquela tinham competência legal para considerarem como esclarece-doras ou não esclarecedoras as notas justifi cativas dos preços;

b) Pela fi nalidade da norma: a norma em causa visa evitar a degradação das empreitadas de obras públicas e a execução de trabalhos a um nível de qualidade inferior aos esperados pondo em causa a prossecução do interesse público;

c) Por critérios fi xados na lei: no caso são relevantes os critérios fi xados no n.° 3 do artigo 105.° do RJEOP;

d) Pela necessidade de se conduzir um procedimento específi co de contraditório, previsto no n.° 2 do artigo 105.° do RJEOP;

e) Pela necessidade de fundamentação de rejeição ou de não adju-dicação, nos termos do n.° 4 do artigo 105.° do RJEOP.

f) Pelos princípios a que se deve subordinar a actividade adminis-trativa, nomeadamente, o da adequação ao interesse público, o da justiça, o da imparcialidade, o da igualdade, o da proporcio-nalidade e o da boa fé.

IV. A enunciação dos motivos justifi cativos referidos na alínea c) do número anterior – consagrada no n.° 3 do artigo 105.° do RJEOP – deve ser considerada como exemplifi cativa. Os concorrentes devem poder expor quaisquer motivos que contribuam para a demonstração da seriedade das suas propostas. Igualmente a entidade adjudicante, para avaliar sobre tal seriedade, no exercício do poder discricionário, pode socorrer-se das razões expressamente invocadas pelos concorrentes, nas notas justifi cativas e noutros elementos das propostas e de quaisquer outras razões, mesmo que não sejam expressamente invocadas.

V. A lei ao estabelecer o conceito de “preço anormalmente baixo” não o determinou, conferindo assim, ao intérprete uma margem de dis-cricionariedade. Na determinação de conceito deve o intérprete fazer apelo:

a) A outros conceitos ou mecanismos legalmente fi xados;

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b) A “preenchimentos valorativos” de natureza objectiva e pré-existentes em domínios sociais e económicos relevantes.

VI. A que outros conceitos ou mecanismos legalmente fi xados deverá o intérprete apelar? Aos seguintes:

a) Ao de preço base do concurso: contudo ao contrário do que acontece na norma constante da alínea b) do n.° 1 do artigo 105.° do RJEOP – relativa ao preço total consideravelmente superior – no caso da alínea f) a lei não o refere expressamente o que signifi ca que a margem de discricionariedade do intér-prete é, neste caso, maior.

Assim, o preço base do concurso deve ser considerado como indício que outros elementos podem afastar. Neste caso, o intér-prete não está juridicamente vinculado a adoptar o critério do preço base do concurso. E o apelo ao preço base como critério pode ser ultrapassado se houver sufi cientes indícios de que este foi mal calculado;

b) A métodos quantitativos como os consagrados no regime de 1986 ou no Código dos Contratos Públicos: uma relação per-centual com o preço base ou com a média das propostas. Con-tudo, não se pode retirar consequências automáticas de tais métodos, porque o RJEOP não os consagra e porque proíbe tais automatismos, na medida em que exige um procedimento espe-cífi co de contraditório. Tal abordagem quantitativa deve cons-tituir também um mero indício de que se está ou não perante preços anormalmente baixos.

VII. Concluindo:a) O dono da obra, através de decisão fundamentada, não pode

adjudicar a empreitada se, face aos preços propostos, às res-pectivas notas justifi cativas e aos esclarecimentos prestados pelos concorrentes em contraditório específi co imprescindível, concluir que são preços anormalmente baixos os oferecidos por todas as propostas;

b) Na apreciação das notas justifi cativas e esclarecimentos, o dono da obra não está vinculado a atender exclusivamente aos crité-rios estabelecidos no n.° 3 do artigo 105.°;

c) Para decidir sobre se os preços oferecidos são anormalmente baixos, o dono da obra deve atender:

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Comentários de Jurisprudência

i. Ao preço base do concurso, como critério indicativo; ii. Às diferenças quantitativas entre tal preço e os preços ofe-

recidos como indício de se estar (ou não) perante preços anormalmente baixos, mas sem poder extrair conclusões automáticas de tal indício;

iii. A valorações objectivas pré-existentes em domínios sociais e económicos relevantes;

iv. À fi nalidade da norma; v. Aos princípios a que se deve subordinar a contratação

pública e que têm consagração bastante na lei.

Nuno Cunha Rodrigues

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Diogo Leite Campos, professor catedrático da Faculdade de Direito de Coimbra, é uma das mais importantes fi guras da fi scalidade, sendo as suas opiniões sempre marcadas por um profundo desassombro e frontali-dade que se conjugam com a qualidade da análise e a vasta e actualizada informação.

Doutorado em Direito em Coimbra e em Economia em Paris, Leite Campos conjuga instrumentos de análise que em muito enriquecem o seu trabalho, que situa, no entanto, preferencialmente no domínio do direito fi scal.

O Estado português fi cou-lhe ainda devedor dos mais relevantes trabalhos como Presidente da Comissão que elaborou um projecto sobre a tributação da família e como Presidente da Comissão da Lei Geral Tri-butária, sem esquecer a sua passagem pela Administração do Banco de Portugal.

Leite Campos é, aliás, um dos poucos fi scalistas portugueses que domina, com igual mestria, o direito privado, área que merece a sua prin-cipal atenção na Universidade com o Direito Fiscal. Talvez, por isso, as relações entre o Estado e os contribuintes constituem um universo a que tem dado particular atenção, dentro da preocupação de garantir que a

Autonomia Contratual e Direito Tributário(A Norma Geral Anti-Elisão)

DIOGO LEITE CAMPOS

JOÃO COSTA ANDRADE

Almedina, Coimbra, 2008

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necessária compressão da esfera de autonomia privada não ultrapasse os limites do razoável.

É também sabido como nos trabalhos legislativos conducentes à Lei Geral Tributária, Leite Campos se opôs à introdução de uma cláusula geral anti-elisão. É natural, pois, o interesse com que quantos trabalham nesta área acompanharam a publicação do seu novo livro – Autonomia Contratual e Direito Tributário (A Norma Geral Anti-Elisão) – escrito em parceria com João Costa Andrade e que sai a lume num momento em que a jurisprudência portuguesa considerou, de forma continuada e uniforme, a compatibilidade dessa cláusula com a Constituição.

Numa obra repleta de informação e caracterizada por uma adequada ponderação dos valores que aqui se confrontam, os autores não divergem dessa apreciação global da constitucionalidade mas, correctamente, não tiram daqui a conclusão de que através da utilização da cláusula o Estado possa desconsiderar toda uma série de valores que se reconduzem, em última instância, à certeza e estabilidade do Direito.

Os autores exploram, aliás, de forma muito inteligente a possibili-dade dos resultados pretendidos pelo legislador serem obtidos através de um procedimento diferente - a requalifi cação jurídica dos actos e contra-tos –, entendendo que só se poderá passar à aplicação da norma. Como escrevem (pág. 13) “se nada é anómalo; se nada há a desconsiderar; mas tão só a Administração Fiscal não concorda com a qualifi cação jurídica dos actos ou negócios, então bastar-lhe-á qualifi cá-los adequadamente e retirar daí as devidas consequências fi scais”.

É ainda nessa linha que Leite Campos e Costa Andrade aproximam a cláusula geral da fi gura do abuso do direito para concluir que é de rejeitar o carácter de “panaceia universal”, que permitiria rejeitar todos os comportamentos que não permitissem ao Fisco ter os resultados que pretendia, o que teria como consequência um total afastamento soa valo-res da segurança e certeza.

Particularmente sugestiva é a conclusão da existência de um princí-pio da boa-fé, tutelado constitucionalmente, aplicável, por igual, a con-tribuintes e Administração e que acarreta princípios que lhe estão asso-ciados, tais como o da proporcionalidade, confi ança e previsibilidade.

A conclusão que se retira do livro e que só posso acompanhar é, então, a de que mais do que a discussão da constitucionalidade da norma, importa colocarmo-nos no plano da sua interpretação e aplicação.

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Recensões

O livro corresponde, sem dúvida, a um objectivo central, defi nido pelos autores, e que é da melhor compatibilização da cláusula, de origem marcadamente anglo-sáxónica, para o sistema continental.

Naturalmente que recomendo vivamente a sua leitura e que espero que esta possa motivar o debate a que apelam os próprios autores.

Eduardo Paz Ferreira

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Perceber a Crise para Encontrar o Caminho de Vitor Bento é, segu-ramente, um dos mais importantes contributos para compreender a crise em que se encontra mergulhada a economia portuguesa e a economia mundial. O autor não se limita, de resto, a estudar a crise, mas avança com ideias importantes e motivadoras para sair da mesma.

Vitor Bento é licenciado em economia pelo Instituto Superior de Economia e Gestão e tem um mestrado em Filosofi a pela Universidade Católica. Tem tido uma notável carreira de gestor, sobretudo, no sector púbico. Foi administrador do Instituto Emissor de Macau, Director do departamento de Estrangeiro do Banco de Portugal, Director-Geral do Tesouro, Presidente do Instituto de Gestão do Crédito Público e membro do Comité Monetário da EU. É actualmente Presidente da SIBS e Vice--Presidente do Fórum para a competitividade. Leccionou diversas cadei-ras nas faculdades de economia da Universidade Nova e da Universidade Católica.

Paralelamente tem desenvolvido uma intensa actividade no domí-nio cívico, tendo sido presidente da SEDES e integrando diversas outras associações, para além de manter uma presença regular nos princi-pais órgãos de comunicação social. A independência e o desassombro

Perceber a Crise para Encontrar o Caminho

VÍTOR BENTO

Bnomics 2009

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caracteriza sempre tais intervenções. A Revista orgulha-se, aliás, de ter já publicado uma importante contribuição sua sobre a crise actual, ao mesmo tempo que o IDEFF pôde contar com ele em duas importantes conferências.

A sua opção por juntar à formação de base económica uma forma-ção complementar em fi losofi a terá contribuído de modo decisivo para que a sua refl exão nunca se situe a um nível meramente técnico, procu-rando sempre encontrar um enquadramento mais amplo e enriquecedor nos seus trabalhos.

O livro é prefaciado por um dos mais respeitados economistas do País, Rui Vilar, que nos recorda a singularidade da nossa trajectória enquanto comunidade como uma história de sucessos e regressos mar-cados pela difi culdade em manter coerência e visão de longo prazo na condução do interesse colectivo, alertando para a importância de se agir, corajosa e objectivamente, sem nostalgia nem proselitismo.

Para Rui Vilar «Vitor Bento tem sabido juntar uma brilhante car-reira de economista profi ssional e de gestor com uma intervenção cívica, atenta e independente. Este livro colhe o saber do macro-economista, aproveita da experiência de gestor e refl ecte o empenho do cidadão responsável».

O livro, escrito numa linguagem de fácil leitura e acessível a não especialistas de económica, sem que tanto implique perda de rigor, está dividido em duas partes: uma primeira sobre a história económica recente do nosso país, permite compreender que a crise já estava anunciada, enquanto que, na segunda, refl ecte sobre as condições da envolvente sócio-política que condiciona o funcionamento da economia portuguesa.

O estudo foi enriquecido com gráfi cos e quadros que ajudam o lei-tor a compreender como muito antes da crise económica internacional ter aparecido, Portugal vivia já mergulhado numa outra crise – a crise nacional – que segundo o autor tem conduzido ao nosso empobrecimento relativo.

Conforme refere o autor, este livro constitui uma chamada à reali-dade a todos aqueles que se têm deixado iludir por fantasiosas expecta-tivas, na esperança de que, ganhando consciência da situação que todos temos pela frente, se possam mobilizar no sentido de atalhar caminho.

Para Vitor Bento, a saída da crise passa por profundos ajustamento estruturais e alargados consensos nacionais, nos quais assente uma visão

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Recensões

estratégica do país, que esteja especialmente atenta às possibilidades abertas pela internacionalização.

O projecto que apresenta assenta numa maior responsabilização individual, numa maior fl exibilidade do funcionamento da economia e do quadro regulador. Especialmente preocupado com aquilo que consi-dera ser o “modelo desintegrador”, resultante da integração europeia e da globalização, Vitor Bento conclui «Num enquadramento destes e apesar dos seus efeitos nacionalmente desintegradores, não faz sentido (nem é opção viável) recusar, quer a lógica da integração europeia, quer da glo-balização. No entanto, e na medida em que se entenda continuar a fazer sentido a preservação de uma comunidade nacional – única razão, aliás, para justifi car órgãos nacionais de governo – a gestão daqueles processos deve ter em vista assegurar a capacidade de afi rmação desta comuni-dade, prevenindo, na medida possível, os efeitos mais desintegradores. Ora, a acção política necessária para alcançar tal desiderato precisa de tomar como referencia os agregados macroeconómicos “nacionais”, de se apoiar nos instrumentos da análise macroeconómica e de utilizar ade-quadamente os instrumentos de gestão macroeconómica ainda disponí-veis, nomeadamente as políticas orçamental e de rendimentos. E esta deve ser continuar a ser a área de intervenção económica a que o governo se deve dedicar preferencialmente.».

Mónica Velosa Ferreira

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Pela sua indiscutível qualidade, Jacques Attali desperta sempre o maior interesse. Doutorado em Ciências Económicas, foi um dos mais conhecidos conselheiros do Presidente François Mitterrand, cargo que exerceu entre 1981 e 1991. É autor de um vasto número de ensaios sobre temas económicos e outros, bem como de várias biografi as, livros de memórias, mas também de romances, teatro e até contos para crianças. Recentemente, presidiu à Comissão para a libertação do crescimento francês, que apresentou o Relatório 300 decisões para mudar a França, mais conhecido por Relatório Attali.

Com esta obra, Jacques Attali intervém no debate que por todo o lado irrompeu sobre a crise global que estamos a viver. Na Introdução, o Autor esclarece-nos que a fi nalidade do livro é explicar o “mistério” da crise, “da forma mais simples possível, prever para onde nos leva para evitarmos cairmos no mesmo”, procedendo, logo aí, a um breve resumo do seu livro. No capítulo I, ocupa-se de várias crises passadas, que des-creve em traços muito gerais, mas, a nosso ver, não extraindo verdadei-ras lições das mesmas, apesar do título do capítulo ser precisamente “A Lição das Crises Passadas”.

A crise, e agora?

JACQUES ATTALI

Tribuna, Lisboa, 2009(tradução de La crise, et aprés? Fayard, 2008)

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Segue-se a sua visão de “como tudo começou”. Neste ponto não poderíamos deixar de sublinhar o muito mérito de Jacques Attali quando, ao contrário do que (convenientemente?) temos visto em muitos autores, dá o destaque merecido, na explicação da crise, ao problema da insufi -ciência da procura (“tudo começou pela liberalização da economia que levou em toda a parte ao aumento da proporção dos lucros no rendimento nacional” - p. 46) e à consequente tentativa de superar essa insufi ciência através do recurso ao endividamento das famílias.

De facto, como mais à frente refere (cf. p. 112), “o encadeado de acontecimentos que conduziu à situação actual começa no agrava-mento, nos Estados Unidos e nos países desenvolvidos, das desigualda-des sociais que limitam a procura. E continua pela decisão implícita da sociedade americana de fazer do seu sistema fi nanceiro um substituto de uma justa distribuição de rendimentos”.

De forma sucinta, Attali explica ainda o papel das baixas taxas de juro, as razões da corrida à titularização e aos produtos derivados, a importância dos credit default swap e a “cegueira das agências de rating”.

Na parte em que se refere aos que previram a crise, cremos que podia ter ido um pouco mais longe. Afi nal, não foram assim tão pou-cos quanto isso. Jacques Attali podia (devia?) ter ido muito para além dos nomes que menciona, mesmo numa obra com estas características. Interessantes são as páginas em que procura explicar porque não se deu ouvidos a tais pessoas, nas quais o Autor não hesita em recorrer a algu-mas imagens fortes mas verdadeiras.

O capítulo III tem uma designação apelativa mas propositadamente exagerada: “o dia em que o capitalismo esteve para desaparecer”. Nele se descrevem, em estilo muito directo, numa base essencialmente cronoló-gica, os acontecimentos que em Setembro e Outubro de 2008 mudaram o sistema fi nanceiro internacional. No capítulo IV, Jacques Attali ocupa-se das “ameaças que ainda estão para vir”, afi rmando mesmo que a demo-cracia e o mercado são valores ameaçados (p. 109). E no capítulo V dis-serta sobre “o suporte teórico das crises e das respostas”, considerando que é imperioso fazer com que a democracia e o mercado se reforcem mutuamente.

Como escreve na Introdução (p. 10), para que o crescimento eco-nómico harmonioso seja retomado, é necessário “reequilibrar à escala do planeta o poder dos mercados pelo poder da democracia” (…), “o poder

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fi nanceiro pelo do direito” e o poder dos que chama “iniciados” (que defi ne como os benefi ciários do status quo e que “não pensam senão nos seus bónus anuais” - p. 122) pelo dos cidadãos.

Não hesita em proclamar que a solução para a crise passa pelo reequilíbrio do mercado através do Estado de direito, abrindo assim espaço para a revalorização da dimensão institucional da economia, quem sabe se da própria “economia política”, o que não deixa de ser interessante para os juristas, cujo papel pode vir assim a ganhar novo relevo, agora que os economistas “puros e duros” parecem já ter tido melhores dias…

Como tópicos do que designa “programa de emergência” (capítulo VI), o Autor refere-se à necessidade de reforçar a regulamentação euro-peia e pôr em prática um sistema de regulação global (o que não é pro-priamente inovador), bem como à criação de diversos instrumentos para o exercício de uma “soberania global”. No fundo, Jacques Attali glosa aqui a velha utopia do “governo mundial ou internacional”, que, entre muitos outros, e num contexto diferente, teve no fi lósofo Bertrand Russel um dos seus arautos mais conhecidos.

Em jeito conclusivo, diremos que não estamos, certamente, perante uma das mais brilhantes obras de Jacques Attali, nem esse foi, segura-mente, o seu propósito ao escrevê-la. Mas sem dúvida que o objectivo a que se propôs foi plenamente alcançado.

Jacques Attali escreveu uma obra acessível, de leitura fácil, mas também rigorosa e estimulante, e que é um óptimo instrumento para que os leitores melhor compreendam esta crise, que tanto nos vem afectando a todos, e de que urge sair encontrando o caminho certo e não outros que venham a tornar tudo ainda mais negro.

Uma palavra fi nal, para dizer que foi pena que Jacques Attali não indique, pontualmente, a fonte de algumas citações que faz e, bem assim, que a revisão não tenha sido um pouco mais cuidada, de modo a evitar certas gralhas e até pequenas repetições de texto (cf. pp. 27-28, in fi ne).

Luís Máximo dos Santos

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George Cooper nasceu em Sunderland, na Inglaterra, formou-se na Universidade de Durham, foi gestor de fundos na Goldman Sachs e estratega de grandes empresas como o Deutsche Bank e a J. P. Morgan, dirigindo actualmente a Alignment Investors, uma divisão da BlueCrest Capital Management. Tratando-se de um autor quase desconhecido, o edi-tor entendeu útil, em termos promocionais, chamar para a capa do livro – antes do próprio título – a apreciação feita pelo The Economist, segundo a qual “este é de longe o melhor diagnóstico da crise publicado até agora”.

Compreensivelmente, a crise rende em termos editoriais. A apre-ensão generalizada que gerou, o facto de ter abalado muitas certezas, a necessidade de encontrar explicações convincentes e, sobretudo, recei-tas para reencontrar o caminho do crescimento económico, faz com que exista uma grande apetência pela literatura sobre a crise, apesar da dita.

Segundo o próprio Autor, o propósito do livro é o de “explicar as razões pelas quais a economia global, e a economia norte-americana em particular, se encontra refém de uma aparentemente infi ndável procissão de bolhas de preços de activos, seguida de apertos de crédito devastado-res” (cf. prefácio), na esperança de assim potenciar uma discussão infor-mada sobre como as políticas macroeconómicas devem ser modifi cadas.

A Origem das Crises Financeiras – Bancos centrais, bolhas de crédito e o mito do mercado efi ciente

GEORGE COOPER

Lua de Papel, Alfragide, 2009(tradução de The Origin of Financial Crises, Harriman House, 2008)

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Como já escrevemos noutra ocasião, esta crise tem múltiplas face-tas, pois começou por ser fi nanceira, tornou-se depois económica, mas revela também uma profunda crise da gestão empresarial e da própria política. Mas além disso, para muitos, esta crise tem também a virtuali-dade de revelar uma crise da própria teoria económica prevalecente nas últimas décadas, pelo menos relativamente a alguns dos seus postulados fundamentais.

É justamente nesse plano que se coloca o livro de George Cooper. A tese central do seu livro consiste em demonstrar que o sistema fi nanceiro não se comporta de acordo com as leis da hipótese do mercado efi ciente, tal como são entendidas pela teoria económica dominante. Para George Cooper, o sistema fi nanceiro, entregue a si próprio, não tende para um equilíbrio óptimo, sendo antes intrinsecamente instável e propenso à for-mação de ciclos prejudiciais de crescimento e explosão. Defende, por isso, a necessidade de os bancos centrais fazerem a gestão do processo de criação de crédito mas sustenta que, por vezes, a política dos bancos centrais – em virtude do seu carácter assimétrico – pode ter efeitos per-versos, na medida em que, a prazo, o resultado da sua acção pode con-tribuir para amplifi car os mencionados ciclos de crescimento e explosão, deixando assim de exercer uma infl uência verdadeiramente estabiliza-dora da actividade económica.

Para que assim não suceda, é forçoso que a política monetária seja simétrica, isto é, a expansão excessiva do crédito deve ser travada com o mesmo vigor com que se luta contra o excesso de contracção do crédito.

Ao longo do livro, George Cooper convoca em suporte das suas posições as teses de Keynes sobre a refutação da teoria do mercado efi -ciente e de Hyman Minsky sobre a hipótese da instabilidade fi nanceira, procurando combinar estas últimas com os trabalhos do matemático Benoit Mandelbrot, cujos estudos empíricos das séries de preços “evi-denciam um efeito de memória, por via do qual os preços de mercado futuros têm uma maior probabilidade de repetir comportamentos recen-tes do que à partida seria sugerido por um processo puramente aleatório” (pp. 135-136).

Estas teses são postas em contraposição às de Milton Friedman. Diz o Autor que “se a escola de Friedman está correcta e os mercados fi nanceiros são destabilizados pela presença de bancos centrais, então, os actuais acontecimentos sugerem que devemos encerrar essas institui-

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ções”; ao contrário, se a escola de Keynes/Minsky está correcta e os mer-cados são inefi cientes e instáveis, exigindo, por isso, uma estabilização por parte dos bancos centrais, “então temos de descobrir o que levou ao fracasso destas últimas políticas estabilizadoras e como implementar, no futuro, políticas melhores” (p. 14).

Evidentemente, é nesta perspectiva que o Autor se coloca, pois, a seu ver, a hipótese do mercado efi ciente “tem falhas impossíveis de sanar” (p. 44) e a hipótese da instabilidade fi nanceira é “a melhor base de trabalho para perceber a forma como o nosso sistema fi nanceiro real-mente funciona” (p. 142).

De facto, George Cooper sustenta que “enterrada, bem fundo, na hipótese do mercado efi ciente está uma suposição não declarada de que os investidores têm sempre de ter a informação necessária para calcular o preço correcto de um activo”. Ora, continua o Autor, “se esta supo-sição acabar por ser falsa e aos investidores for, por vezes, negada a informação necessária para tomar decisões informadas sobre os preços dos activos, ou pior ainda, se receberem informação enganadora, então é possível que as bolhas de preços dos activos se formem sem que os investidores se comportem de forma irracional” (p. 106).

Um dos aspectos interessantes desta obra é o paralelismo que George Cooper estabelece entre o papel dos reguladores das máquinas a vapor, estudado pelo físico inglês James Clerk Maxwell, e o papel regu-lador dos modernos bancos centrais. Claro que, como o Autor reconhece, o paralelismo não pode ser perfeito, embora o qualifi que como “muito próximo”. Para sustentar as suas as teses, George Cooper convoca os contributos em matéria de teoria dos sistemas de controlo de James Clerk Maxwell, reproduzindo mesmo, em apêndice ao livro, o texto deste autor intitulado “On Governors”, publicado em 1868.

Assim, George Cooper refere que no caso de um sistema intrinseca-mente instável, como é o caso dos mercados fi nanceiros, “não devemos tentar alcançar uma estabilidade perfeita”, considerando o Autor que a prossecução de tal objectivo pode mesmo ter conduzido aos problemas que enfrentamos hoje (p.143). Dever-se-ia seguir uma estratégia que levasse a mais ciclos de curto prazo, com abrandamentos menores, mas mais frequentes, por forma a purgar o sistema de excessos, desse modo evitando crises violentas do tipo da actual. Para alcançar essa política, Cooper considera que importa restringir tanto a criação excessiva como

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a destruição excessiva de crédito. O paradigma da intervenção dos ban-cos centrais deveria também ser alterado, de modo a que deixemos de encarar qualquer contracção económica como sintoma de uma política falhada, considerando-a antes como parte normal do funcionamento de uma economia vibrante e saudável.

A criação de crédito é vista por George Cooper como base do pro-cesso de criação de riqueza mas também como causa de instabilidade fi nanceira. Sustenta que o principal objectivo de um banco central deve ser evitar que a economia acumule um stock de dívidas excessivo e inge-rível e que, se isso for alcançado, o mandato de prosseguir a estabilidade dos preços a longo prazo e a própria estabilidade fi nanceira tornar-se-ão uma e a mesma coisa.

Como sempre sucede com qualquer grande crise, muitos ensina-mentos há a retirar de tudo quanto está acontecendo. A crítica ao pen-samento económico dominante há muito que vinha sendo feita por reputados autores mas, infelizmente, não teve o eco social e político que merecia. Em certos sectores, o comodismo intelectual instalou-se. A concluir o seu livro, Goerge Cooper tem mesmo uma afi rmação algo provocatória, mas que não deixa de traduzir uma grande dose de ver-dade: “Se se tem de atribuir a culpa a alguém, então coloque-se aos pés de toda a comunidade académica, por ter optado por continuar a promo-ver as suas defeituosas teorias dos mercados auto-regulados e efi cientes, quando confrontada com tantas provas contrárias”.

Pouco importa que seja ou não o melhor livro sobre a crise. Pode gostar-se mais ou menos dele, aceitar ou não as teses que aí se defen-dem. Mas, em qualquer caso, não se lhe pode negar o relevante mérito de constituir um importante contributo para o tão necessário repensar de diversos aspectos do pensamento económico dominante. Temos, na ver-dade, de evitar a conhecida tentação de quando os factos não confi rmam as teorias continuar a fi ngir que são estas que estão certas e que algo de errado se passa do lado dos factos.

Luís Máximo dos Santos

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Paul Krugman está defi nitivamente na moda.Trata-se de um dos mais conceituados economistas norte-americanos.Amplamente estudado e conhecido nas faculdades de economia e

em algumas faculdades de direito, desde fi nais da década de 70, – nomea-damente pelos seus trabalhos sobre Economia Internacional –, passou por Portugal, em algumas ocasiões (fi cou célebre a sua estadia prolon-gada, em 1977, a convite de Silva Lopes).

Esta revista assinalou, em número anterior, um trabalho de Paul Krugman – The conscience of a liberal – em recensão da autoria do Pro-fessor Eduardo Paz Ferreira.

A obra de Krugman não estava, no entanto, ainda então, difundida junto da opinião pública.

Um conjunto de circunstâncias contribuiu para a divulgação actual de Krugman : a atribuição do Prémio Nobel da Economia, em 2008; a crítica sem tréguas que Krugman fez, nos últimos anos, à administra-ção Bush, solidamente estruturada no plano económico e publicamente defendida no conhecido blog “the conscience of a liberal”1; e, por último, o turbilhão económico que se desencadeou e tem vindo a agudizar-se, com uma espécie de retorno aos estudos de Keynes e seus discípulos.

1 Cfr. krugman.blogs.nytimes.com

O Regresso da Economia da Depressão e a Crise Actual

PAUL KRUGMAN

Editorial Presença

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

É neste contexto que surge a mais recente obra de Paul Krugman – O regresso da economia da depressão e a crise actual –, em que o Autor retoma ensinamentos que alguns consideravam ultrapassados.

O livro sequencia um outro, do mesmo autor, de 1999 – “The return of depression economics” – em que são analisadas crises económicas ocorridas na década de 90 (Japão; Brasil; Suécia; México; Argentina; Sudeste Asiático).

Não se trata, por consequência, de novidade editorial absoluta.O leitor de Krugman sabe, de resto, o que o espera.Como afi rma Paz Ferreira, “quem enceta um livro de Paul Krugman

sabe ao que vai” considerando a “raiz keynesiana do seu pensamento”.2

O Autor não disfarça o Keynesianismo militante quando, por exem-plo, na parte fi nal da obra, escreve que o pensamento de John Maynard Keynes é, no contexto actual, mais relevante do que nunca.

O livro começa com uma critica subtil a Robert Lucas – Prémio Nobel da Economia em 1995 – que, em 2003, tinha defendido que o problema central da prevenção da depressão tinha sido resolvido para todos os efeitos, opinião posteriormente secundada por Ben Bernanke, Professor de Princeton e actual Presidente da Reserva Federal.

Krugman identifi ca algumas das causas do problema, como a regu-lação insufi ciente ou a confi ança desproporcionada na auto-regulação.

De seguida, o prémio Nobel procede a uma análise de crises regio-nais que davam sinais de aviso prenunciando a crise global actual, como as ocorridas no Sudoeste Asiático, na América Latina ou no Japão, explica a especulação fi nanceira internacional – descrevendo a actuação de alguns dos maiores especuladores internacionais (“the masters of the universe”, sendo interessante a descrição do ataque de George Soros à libra inglesa em 1992) para chegar à crise norte-americana surgida com o rebentamento da bolha do “sub-prime” (“a bolha de Greenspan”).

A questão central que, aliás, justifi ca o título da obra, é suscitada na parte fi nal do livro: o que signifi ca o retorno da economia da depressão?

A resposta é dada de imediato. “Essencialmente signifi ca que pela primeira vez em duas gerações, falhas no lado da procura tornaram-se

2 In Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, ano 1, n.º 1, p. 325.

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na limitação mais clara e presente para a prosperidade na maior parte do mundo.”

Como se sabe, grande parte dos estudos, nesta área, visam o cresci-mento económico a longo prazo. E, no entanto, como ironizava Keynes, a longo prazo todos estaremos mortos. Importa, por isso, encontrar solu-ções a curto prazo.

É que, entretanto, o mundo vai saltando de crise em crise: Japão, no início dos anos 90; México, em 1995; México, Tailândia, Malásia, Indo-nésia e Coreia do Sul, em 1997; Argentina, em 2002 e, agora, o mundo inteiro.

A economia da depressão está, por assim dizer, de regresso.Paul Krugman aponta soluções genéricas sem, contudo, as descre-

ver pormenorizadamente, o que pode, de certo modo, defraudar o leitor.Segundo Krugmam, a primeira solução passa por aumentar a liqui-

dez do sistema fi nanceiro, renovando a confi ança interbancária, mesmo que isso implique uma “nacionalização temporária do sistema fi nanceiro”

Uma outra solução traduz-se num estímulo fi scal keynesiano que impõe despesa pública em infra-estruturas.

Por último, a regulação do sistema fi nanceiro pode ser reformada de acordo com um princípio básico: toda a actividade que deva ser salva no contexto de uma crise fi nanceira deve ser regulada quando não se verifi ca uma crise fi nanceira.

O trabalho de Paul Krugman não deixa de revelar algum optimismo – que parece contrastar com a realidade - quando sustenta que a econo-mia mundial não está em depressão (em fi nais de 2008) e que, prova-velmente, não entrará em depressão. O ano de 2009 parece desmentir esta observação, o que refl ecte aquilo que alguns criticam no Autor: a publicação excessivamente rápida, que já tinha ocorrido com o trabalho de 1999.

Os mesmos críticos reconhecem, todavia, que é este estilo apres-sado que permite a Paul Krugman ser tão escutado, ao contrário de outros que aspiram apenas a limpar a loja depois da louça já ter sido partida...3

3 Assim, cfr. o comentário de J. Bradford DeLong, Professor de Economia em Berkeley, em www.j-bradford-delong.net

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A linguagem utilizada é acessível e clara para qualquer leitor e per-mite alcançar uma compreensão global das causas da actual crise e dis-por de pistas para soluções no futuro.

Trata-se, por tudo isto, de uma obra essencial, o que já foi, de alguma forma, assimilado pela opinião pública, atendendo a que estamos perante a 3.ª edição de um livro publicado há menos de três meses na tradução portuguesa.

Nuno Cunha Rodrigues

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Chris Edwards e Daniel J. Michell são dois reputados investi-gadores do The Cato Institute de Washington D.C. que vêm há muito dedicando as suas energias ao estudo das questões relacionadas com a competitividade dos sistemas fi scais, dos regimes de tributação e do seu impacto no desenvolvimento das nossas sociedades em geral. O seu recente livro, Global Tax Revolution – The Rise of Tax Competition and the Battle to Defend It, publicado em 2008 pelo referido instituto, vem na linha do extenso pensamento já desenvolvido pelos autores em arti-gos tão relevantes quanto Simplifying Federal Taxes: The Advantages of Consumption-Based Taxation, Policy Analysis, Cato Institute, 2001, Replacing the Scandal-Plegued Corporate Income Tax whit a Corporate Income Tax, in Policy Analysis, 2003, Options on Tax Reform, Policy Analysis, 2005, International Tax Competition, A 21st Century Restraint on Government, (Daimler Chrysler versus EUA) Policy Analysis, 2002, e na linha de outros trabalhos, igualmente interessantes, como é exemplo o desenvolvido por Richard Teather, The Benefi ts of Tax Competition, The Institute of Economic Affairs no Reino Unido, em 2005.

Nesta obra, porém, o pensamento dos autores surge mais estrutu-rado. Do que nele se trata é da perda de centralidade dos Estados sobe-

Global Tax Revolution – The Rise of Tax Competition and the Battle to Defend It

CHRIS EDWARDS

DANIEL J. MICHELL

The Cato Institute, Washington D.C. 2008

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ranos no manejo da função tributária, como resultado do incremento da competição fi scal internacional. O território e as fronteiras, o pleno con-trolo dos factos tributários e a materialidade das operações, factores tra-dicionais de suporte dessa manifestação de soberania, têm dado lugar à desmaterialização, à desintermediação e à digitalização, suscitando uma concorrência acrescida, nem sempre saudável.

O incremento da mobilidade dos factores tradicionais de produção: o capital, o trabalho e a empresa e os novos factores técnicos de mobili-dade, criam um contexto internacional favorável à competição fi scal, que os autores abordam, tratando especifi camente as questões da crescente mobilidade do conhecimento e da riqueza possuída, da importância do factor capital no desenvolvimento das sociedades humanas, mas também da competição fi scal. Esta merece, de resto, o destaque principal no livro, sendo abordada sob três aspectos, a saber: (1) como questão moral, (2) como factor nuclear do desenvolvimento económico e, (3) como indica-dor de liberdade económica.

No primeiro dos casos, os autores salientam que o tema não tem apenas uma vertente económica, onde normalmente é tratada, mas tam-bém se constitui como factor de luta pelos direitos humanos e pela liber-dade individual, na defesa, algo estranha do nosso ponto de vista, que fazem das jurisdições de baixa tributação e dos paraísos fi scais, como forma de refúgio contra o que designam de fi scalmente oprimidos, para proteger os seus activos. De facto, não estamos habituados a olhar esses espaços ou zonas como mecanismos de protecção de certos direitos e valores institucionais dos indivíduos, como é o caso do direito à pro-priedade privada, nem a olhar a tributação levada a efeito pelos Esta-dos como um fundamento para a defesa e invocação de uma espécie de “habeas corpus” patrimonial.

A justifi cação destes regimes fi scais é claramente assumida pelos autores, para quem as medidas derrogatórias da OCDE e da UE nesta matéria, por exemplo, se constituem como entraves a uma competição global que prejudica, na sua visão, uma real competição dos Estados que muito benefi ciaria os agentes do mercado, a economia global e a produção da riqueza e do rendimento. Trata-se, como bem se vê, de uma visão do mundo muito singular, que nos merece algumas reservas, pelos perigos que encerra.

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No segundo dos casos enunciados – a competição fi scal como factor nuclear do desenvolvimento económico – o enfoque dos autores é posto nos efeitos que esta já produziu. Sem ela, o corte nas taxas dos impostos sobre o rendimento não se teria dado, permanecendo, para as pessoas singulares na fasquia dos 70%, os sistemas de taxa única não teriam sido implementados, e os governos seriam maiores e não teriam aberto mão dos seus monopólios fi scais. Assim, defendem que competição fi scal se pode constituir no maior factor de redução do tamanho dos governos, dos seus orçamentos e da burocracia associada. Igualmente peculiar é o entendimento expresso de que os trabalhos desenvolvidos pela OCDE, pela UE e por outras instâncias internacionais, de nivelamento das taxas e de contenção da competição fi scal internacional dentro de certos limi-tes, se revelam contrários a uma verdadeira competição, benéfi ca para todos os contribuintes.

Peculiares são também as críticas que fazem quanto às iniciativas tomadas, em especial pela OCDE – que consideram possuir um pro-jecto anti-competição fi scal - contra as jurisdições de baixa tributação, defendendo que elas desempenham um papel relevante na promoção da competição fi scal internacional, na melhora do funcionamento das insti-tuições que as governam, não podendo dar-se ao luxo de ser inefi cientes, no incremento das condições de vida e na reorientação das (legítimas) opções dos agentes económicos (Dharmika Dharmapala, John Hines).

Em termos tais que, do ponto de vista dos autores, a competição fi scal internacional deveria ser aplaudida, não perseguida uma vez que ela constitui uma questão chave ao encorajar os governos a reduzir a tributação dos investimentos e da poupança. Tal competição, na medida em que fomenta movimentos reformistas, constitui um factor de melho-ria dos níveis de vida das populações. As jurisdições de baixa tributa-ção favorecem e protegem, segundo os autores, os capitais num mundo onde os governos estão cada vez mais interessados em coligir e processar cada vez maiores massas de informação dos seus próprios cidadãos. Um ponto de vista que constitui, do nosso ponto de vista, uma visão par-cial do problema num mundo onde a informalidade tem crescido, muito vezes em benefício de actividades que é preciso combater, como o crime organizado.

No terceiro dos casos enunciados – a competição fi scal como indi-cador de liberdade económica – os paraísos fi scais e as denominadas

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zonas ou jurisdições de baixa tributação são um refúgio, protegendo os recursos das minorias de perseguição política, étnica e religiosa. Num mundo cada vez mais aberto, em que tais jurisdições acolhem capitais de qualquer proveniência, incluindo as de actividades e factos ilícitos, não deixa de ser curiosa a posição dos autores, na defesa intransigente des-tes espaços, como se deles pudessem provir apenas resultados positivos, esquecendo o enorme incremento da informalidade a que se assiste um pouco por toda a parte. Defendem, assim, que tais jurisdições providen-ciam “o céu” para os que vivem em países dominados pela corrupção e pela incompetência governativa. Para estes, tais jurisdições são fonte de estabilidade dos seus rendimentos, conferem-lhes estabilidade fi nanceira que não pode ser atingidas por medidas – quaisquer medidas – dos seus próprios governos.

Consequentemente, Chris Edwards e Daniel J. Michell desenvol-vem um conjunto de propostas no sentido de preservar a competição fi scal, vendo-a como ferramenta adequada a suster o tamanho dos gover-nos e dos seus recursos, obrigando-os ao que designam de dieta fi scal reduzindo os gastos e as políticas públicas. A primeira delas centra-se no corte das taxas do imposto, defendendo um sistema de taxa única para todos os rendimentos como forma de melhorar o rendimento disponível, incentivar a poupança e incrementar o crescimento. Depois, defendem uma idêntica redução para o imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, na esteira de tendência que já se vem verifi cando em resul-tado da competição fi scal internacional e, apenas para o Estados Unidos da América do Norte, a adopção de um modelo de tributação territorial e não universal, como hoje sucede, que desencoraja a repatriação dos lucros obtidos pelas empresas americanas no exterior, e coloca os agen-tes económicos norte americanos em desvantagem.

Não deixa de ser, para nós curioso notar que os autores fazem a defesa de regimes de baixa tributação, criticando o papel regulamentador que tanto a União Europeia através do Código de Conduta e outras ini-ciativas, como a OCDE já tomaram para minimizar a concorrência fi scal prejudicial levada a efeito por tais jurisdições. Com isso, consideram nefastas as medidas limitadoras de uma concorrência aberta, debaixo do postulado, como se viu, das mais amplas liberdades que aos agentes eco-nómicos em geral devem ser reconhecidas para salvaguardar o que é seu.

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Num momento de profunda crise fi nanceira e económica mundial, em que a OCDE prepara, tanto quanto se sabe, nova lista “negra” das jurisdições não amigáveis à troca de informações para efeitos de con-trolo da evasão fi scal, onde, aparentemente, o Luxemburgo a Áustria e até a Suíça serão incluídas, podendo sofrer sanções e ver revogados os seus ADT’s com a comunidade internacional, a obra de Chris Edwards e Daniel J. Michell revela a coragem de contrapor numa matéria onde parece reinar um enorme consenso. Tive ocasião de participar nas reu-niões do Comité dos Assuntos Fiscais da OCDE num período onde se construíam os critérios caracterizadores das zonas francas e dos regimes fi scais privilegiados. Nelas, qualquer destes Estados procurou a todo o custo – e até certo ponto conseguiu - evitar a troca de informações e, por isso, quer a iniciativa da OCDE, recentemente revelada, quer a dos autores que a criticam veementemente, atiçam um interesse que sai refor-çado com as iniciativas mais gerais dos Estados em constituir um abran-gente modelo de regulação económica e mundial. Essa situação conhece agora novos ímpetos de regulação e controlo que nos parecem de todo descabidos.

Finalmente, é do maior interesse o raciocínio que desenvolvem em torno da ideia de adopção, pelos EUA, de um modelo de de fl at tax, con-forme proposto por Robert Hall / Alvin Rabuska e Steve Forbes / Dick Armey, que muito bem pode constituir uma base de trabalho para uma discussão alargada sobre um novo modelo de tributação do rendimento das pessoas singulares em Portugal, que defendo, conforme tive ocasião de escrever muito recentemente.

Independentemente, das ideias pré concebidas em torno destas novas propostas, o facto é que os argumentos neste respeito expendidos são do maior interesse para os que se preocupam com as coisas da fi sca-lidade e pretendem conhecer as tendências da tributação neste início de século. Um livro que, do nosso ponto de vista, vale a pena ler e conservar por perto, como referência futura.

João Ricardo Catarino

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As Finanças Públicas, ou a “scienza delle fi nanze”, para utilizar a bela expressão italiana, tem uma longa e prestigiada história, marcada por vivos debates intelectuais e por construções teóricas da mais ele-vada qualidade. Nos fi nais do século XIX e inícios do século XX, as escolas económica, política e sociológica deram origem a sofi sticados argumentos que ressurgiriam, mais tarde, sob outras roupagens, man-tendo ainda hoje muito da sua actualidade. James Buchanan, que tanto fi caria a dever ao período de estudo que fez em Itália nos anos cinquenta do século passado, não deixaria, aliás, de reconhecer essa qualidade da doutrina fi nanceira italiana em “”La Scienza delle Finanze. The Italian Tradition in Fiscal Theory” (in Fiscal Theory and Political Economy. Selected Essays, 1960).

Da prolixa obra de economistas e fi nanceiros como Pareto, Di Viti de Marco, Grizziotti, Puviani, Loria, e tantos outros, resultou uma acu-rada análise do fenómeno fi nanceiro e das suas implicações na socie-dade, que estaria na base de uma valoração das escolhas por referência a parâmetros externos aos das fi nanças públicas.

Não só as questões de fundo merecerem uma viva atenção, uma vez que também os aspectos metodológicos foram profundamente con-

Appunti di Economia del Benessere e Scienze delle Finanzet

GIUSEPPE CAMPA

L.S.D., 2008

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trovertidos sobretudo no que respeita ao ensino simultâneo das fi nanças públicas e do direito fi nanceiro (vivamente defendido por Grizioti “Per ) e os autores, como Einaudi, que cedo preconizaram a separação dos estudos, linha que viria a prevalecer no segundo pós-guerra, sobretudo por infl uência de Cosciani e Steve – dois nomes maiores da “scienza delle fi nanze. Esta orientação que coincide e é infl uenciada por aquela que no mundo anglo-saxónico levou ao desenvolvimento da “economia pública” como disciplina autónoma não foi, no entanto, dominante no restante universo latino (França, Espanha e Portugal). Esta é, no entanto, uma questão que ultrapassa amplamente os limites dessa recensão.

Cosciani vai afi rmar-se como o grande vulto das fi nanças públicas na Itália, através de uma longa carreira docente que o levou a ser titular da cátedra de fi nanças públicas da Universidade La Sapienza de Roma, onde terminaria a sua docência, por mais de vinte anos e, também, de relevantes intervenções em comissões de reforma fi scal. O seu manual inicialmente publicado em…..conheceu diversas edições e, já depois da morte do Ilustre Professor, Giuseppe Campa coordenou uma equipa que fez uma signifi cativa actualização que em muito enriqueceu o livro.

Cosciani manteve, também, um conjunto de contactos com fi nan-ceiros de outros países, sendo especialmente de salientar o seu diálogo científi co com Teixeira Ribeiro que abriu de alguma forma portas para um colaboração regular entre académicos portugueses e italianos. José Xavier de Basto, fi gura maior da fi scalidade portuguesa, estudou em Roma e ai aprofundou os seus conhecimentos sobre o imposto sobre o valor acrescentado, que tão úteis se viriam a mostrar à academia e ao país. Anos mais tarde teria a generosidade, que não esqueço, de me abrir as portas para investigar no Instituto de Economia e Finanças.

Nos dois anos em que preparei a minha dissertação de doutora-mento em Roma benefi ciei do permanente apoio de Franco Romani, a cuja memória presto comovida homenagem, e de Giuseppe Campa, que me souberam abrir novas perspectivas metodológicas, orientando-me quer no terreno da rica doutrina italiana, quer alertando-me para as mais recentes novidades nos domínios fi nanceiro e da moderna ciência política norte-americana. Importantes foram, também, os contributos de Ruggero Paladin, Giuseppe Dalera e Elena Granaglia.

É, pois, com natural prazer que saúdo a publicação de Appunti di Economia del Benessere e Scienze delle Finanze de Giuseppe Campa

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Recensões

que, inserindo-se embora na tradição do ensino de Cosciani, a actualiza e aprofunda à luz, sobretudo, da moderna economia pública e da teoria da escolha colectiva.

Giuseppe Campa é um brilhante professor. Catedrático mais jovem da Itália, sucedeu a Cosciani na cátedra de la Sapienza e manteve o pres-tígio da escola. O seu ensino insere-se, naturalmente, na linha do seu mestre, mas foi vivamente infl uenciado pela passagem por York, onde concluiu o mestrado.

É este ensino que é agora vertido num notável manual, de grande clareza de escrita e que se situava muito em contra-corrente, aquando da sua escrita, privilegiando as questões do bem-estar social sobre a pers-pectiva meramente técnica ou gestionária dominante na área da econo-mia pública.

Campa analisa, com especial acuidade, a questão bem-estar social como critério de valorização das políticas económicas, o que o leva a um estudo profundo das políticas fi scais redistributivas e da desigualdade e da pobreza. As fi nanças públicas surgem, assim, como um instrumento fundamental para a criação de um “estado do mundo”, considerado como preferível à luz de valores éticos explicitamente estabelecidos.

Natural é, pois, a importância dada a temas como a função redis-tributiva ou a desigualdade e pobreza, que constituem aspectos funda-mentais na actual crise económica e, em relação aos quais, o ensino de Campa fornece importantes pistas.

Eduardo Paz Ferreira

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Em boa hora, o Professor Doutor Joaquim Freitas da Rocha, da Escola de Direito da Universidade do Minho, lançou um estudo de direito fi nanceiro local, um cruzamento entre o Direito fi nanceiro, como ramo autónomo de Direito, e o Direito autárquico, tendo como referente principal as autarquias locais portuguesas. Neste sentido, estão traçadas as bases para a juridifi cação da actividade fi nanceira autárquica, “porque enformada por um alargado conjunto de normas jurídicas, as quais pos-suem natureza e valor normativo diferenciados” (página 19). Por outro lado, e uma vez identifi cado o regime normativo próprio disciplinador das Autarquias locais, há que “individualizar as principais manifestações de vontade autárquicas com incidência fi nanceira” (página 48) através daquilo que o autor chama de teoria geral dos actos fi nanceiros autárquicos.

O texto está dividido em cinco capítulos. O capítulo um trata do enquadramento do direito fi nanceiro local, sendo assinalados os seus princípios enformadores, a saber: os princípios da autonomia, da igual-dade entre autarquias, da solidariedade, da transparência e da livre inicia-tiva económica. O capítulo dois trata da teoria geral dos actos fi nanceiros autárquicos, sendo dada importância aos princípios e regras orçamen-tais autárquicos, bem como aos actos de prestação de contas. Já o capí-tulo três trata das despesas das autarquias locais, correntes e de capital, enquanto o capítulo quatro trata das receitas, originárias (tributárias,

Direito Financeiro Local

JOAQUIM FREITAS DA ROCHA

CEJUR, 2009, 212 páginas

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patrimoniais e creditícias) e derivadas (detectadas no fenómeno pere-quitativo). Finalmente, o capítulo cinco faz um breve enquadramento do contencioso tributário local.

A autonomia normativa da actividade fi nanceira autárquica defendida pelo Professor é posta, contudo em causa, pelas proibições decorrentes do pacto de estabilidade e crescimento europeu e, conse-quentemente, da aplicação do Protocolo sobre o procedimento relativo aos défi ces excessivos. É neste sentido, que, na nova Lei das Finanças Locais, (1) surge a regra de dívida para os municípios, que vem estabe-lecer um limite de endividamento (líquido e não bruto) aplicável indivi-dualmente a cada municípios (125% das receitas municipais relativas ao ano anterior) e, (2) de forma complementar, são ainda defi nidos limites, também em percentagem das receitas, para os empréstimos a curto prazo e aberturas de crédito, e para os empréstimos a médio e longo prazo.

De facto, desde 2003, que os sucessivos Orçamentos do Estado vinham instituindo um princípio anual de não aumento do endivida-mento líquido do conjunto dos municípios, classifi cável como uma regra de saldo orçamental, e que é agora substituído por uma regra de dívida aplicada município a município. As razões desta mudança prendem-se com os objectivos de maior responsabilização individualizada das autar-quias e de incentivo à programação plurianual de actividades e investi-mentos, desde que perfeitamente concatenada com a actividade estadual/central. Nesse sentido, é de sustentar que a juridifi cação da actividade fi nanceira autárquica desvanece-se perante as funções do Estado, fi cando a actividade individualizadora dependente de critérios centrais defi nidos pelo Governo central, numa lógica de consolidação orçamental formal de cima para baixo (top-down) e não de baixo para cima (bottom-up).

Somos, assim, tentados a defender que o referencial normativo do direito fi nanceiro (central e local) não se situa apenas no direito interno, mas sim no direito internacional, pelo que as regras e princípios clássi-cos outrora admitidos passam a ceder perante os objectivos próprios de uma zona óptima cambial, como aquela que é o espaço do Euro. Não obstante, o texto é excelente para termos uma compreensão global do fenómeno fi nanceiro local e iniciarmos uma discussão profunda sobre os refl exos da integração europeia na autonomia local.

Guilherme Waldemar d’Oliveira Martins

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Desde 2005 que têm sido publicados todos os anos o Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses, onde são analisadas as con-tas de municípios todos os municípios do continente (278), dos Açores (19) e da Madeira (11), recolhendo informação sobre o cumprimento do POCAL e sobre o conteúdo das contas (estrutura orçamental, económica, fi nanceira e patrimonial). E, temos vindo a assistir a um aperfeiçoamento contínuo dos dados disponibilizados todos os anos, sendo de assinalar que, já desde 2007, têm sido apresentando rankings dos melhores e pio-res em relação a diferentes aspectos fi nanceiros, económicos e orçamen-tais, considerados separadamente, tendo em conta, preferencialmente uma combinação de 10 indicadores fi nanceiros, económicos, orçamen-tais e de conformidade.

O texto mantém a estrutura dos anos anteriores. Assim, encontra-se organizado em três partes. Na primeira parte, faz-se um enquadramento dos municípios e respectivo sistema contabilístico, pela abordagem da implementação do POCAL, designadamente através da análise das obri-gações contabilísticas. Na segunda parte são analisadas as contas dos municípios nas diferentes ópticas (orçamental, fi nanceira, patrimonial e

Anuário fi nanceiro dos municípios portugueses – 2007

JOÃO CARVALHO

MARIA JOSÉ FERNANDES

PEDRO CAMÕES

SUSANA JORGE

2009, 242 páginas

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económica). Assim, procede-se à análise da execução orçamental apre-sentando-se alguns rankings sobre a execução da despesa e da receita. Inclui-se ainda uma análise aos PPI (Plano Plurianual de Investimentos). Procede-se, ainda, à análise da situação fi nanceira, económica e patri-monial, com base no balanço e demonstração dos resultados de cada município. São também apresentados vários rankings, incluindo o endi-vidamento líquido exigido pela Lei das Finanças Locais. Finalmente, na terceira parte são apresentados três estudos ao relatório de gestão e con-tas dos municípios, relativamente aos últimos anos. No primeiro estudo aborda-se a implementação do POCAL, designadamente através da aná-lise da conformidade com os requisitos normativos e a consequente fi a-bilidade das contas dos municípios. No segundo estudo apresenta-se uma breve análise dos indicadores de gestão utilizados apenas pelos muni-cípios e listam-se uma bateria de indicadores que se constatam serem os mais utilizados por todos os municípios. No terceiro e último estudo analisa-se a evolução dos resultados líquidos apresentados pelos municí-pios no período de 2003 a 2007.

Sendo o estudo de natureza fortemente contabilística, seríamos tentados a sugerir que, em próximas edições, fosse criado um capítulo dedicado à consolidação formal dos orçamentos e das contas munici-pais, dado que esta representa a sistematização previsional das receitas e das despesas de um grupo económico composto por várias entidades, tratando de reunir a unidade formal e a unidade material próprias do orçamento local. Ora, como é o Governo o órgão responsável perante as instituições comunitárias pelo cumprimento dos limites decorrentes do protocolo dos défi ces excessivos, seria importante clarifi car qual a meto-dologia aplicável à consolidação das receitas e das despesas municipais, tendo em conta, especifi camente que o ordenamento fi nanceiro portu-guês, ao contrário do que sucede com o ordenamento francês, de cariz fortemente autonómica, tem criado um conjunto de regras fi nanceiras numéricas (de receita e de endividamento) que nos permitem apurar que a consolidação deva ser feita de cima para baixo (isto é, da administração Central/serviços integrados para os administração local). Aguardemos por novas edições.

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LIVROS RECENTES

• Sérgio Vasques – Regime das Taxas Locais – Introdução e Comen-tário, N.º 8 da Colecção Cadernos IDEFF, Almedina, Janeiro de 2009.

• Nazaré Costa Cabral – As Parcerias Público-Privadas, N.º 9 da Colecção Cadernos IDEFF, Almedina, Janeiro de 2009.

• Tânia Meireles da Cunha – Da Responsabilidade dos Gestores de Sociedades Perante os Credores Sociais: a Culpa nas Responsabi-lidades Civil e Tributária, Almedina, Fevereiro de 2009, 2.ª Edição.

• Feliciano Barreiras Duarte – Regime Jurídico e Fiscal das Funda-ções com Apêndice Legislativo, Âncora Editora, Fevereiro de 2009.

• AAVV – Vinte anos de imposto sobre o valor acrescentado em Por-tugal, Coimbra Editora, Março de 2009.

• Gonçalo Ribeiro da Costa – Lei das Finanças Locais – Anotada, Edi-ção de Autor, Abril de 2009.

• Paulo Trigo Pereira/António Afonso/Manuel Arcanjo/José Carlos Gomes Santos – Economia e Finanças Públicas, Abril de 2009, 3ª Edição.

• José Casalta Nabais – O Dever Fundamental de Pagar Impostos – Contributo para a compreensão constitucional do estado fi scal contemporâneo, Almedina, Abril de 2009, 2.ª Reimpressão da edição de 2004.

• Gustavo Lopes Courinha – A Cláusula Geral Anti-Abuso no Direito Tributário, Almedina, Abril de 2009 (reimpressão da edição de 2004).

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

• Verônica Scriptore Freire e Almeida, A Tributação dos Trusts, Alme-dina, Maio de 2009.

• Fernanda Alves/Nuno Victorino, Código do Imposto Sobre Veículos e Regime Infraccional Anotado, Áreas Editora, Maio de 2009.

Ana Leal e Miguel Brito Bastos

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Recensões

NA WEB

Por Nuno Cunha Rodrigues

SITE DO FUNDO MONETÁRIO INTERNACIONALwww.imf.org

Propomos uma visita ao site do Fundo Monetário Internacional (www.imf.org).

O Fundo Monetário Internacional é uma das duas – juntamente com o Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento – orga-nizações saídas dos acordos de Bretton Woods, na sequência de comple-xas negociações entre as delegações norte-americana, chefi ada por Harry Dexter White (Plano White), e britânica, chefi ada por John Maynard Keynes (Plano Keynes), em que o primeiro saiu claramente vencedor.

Procurou-se, com a criação do FMI, assegurar a estabilidade mone-tária internacional e eliminar as restrições cambiais que difi cultavam o processo de reconstrução, na sequência da II grande guerra.

O papel do FMI foi evoluindo, ao longo dos anos, nomeadamente com o fi m do sistema de Bretton Woods, no início dos anos 70, altura em que a Organização procura auxiliar os Estados que mais sofreram com o choque petrolífero e com o fi m da paridade cambial. A evolução pros-seguiu com as célebres intervenções em Estados em que se verifi caram crises fi nanceiras resultantes de endividamento excessivo, no início da década de 80, (como sucedeu em Portugal), o apoio aos antigos países de Leste na transição para economias de mercado, no início da década de 90 e, muito recentemente, a acção do FMI no contexto da actual crise fi nanceira global.

Tudo isto é relatado detalhadamente, no site que vimos acompa-nhando, quando descreve a história do FMI.

Para além de informações habituais neste tipo de sites institucionais (descrição dos órgãos dirigentes, estatutos, relatório anual, organização interna, orçamento da instituição) encontramos outros elementos que podem ser uma mais-valia para os estudioso de fi nanças públicas e de direito fi scal e, bem assim, para a opinião pública em geral.

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Destacamos, em particular, a agenda do FMI, em que se descrevem os principais pontos de intervenção do FMI no âmbito da actual crise: apoio de emergência aos mercados emergentes, ajuda aos países com baixos rendimentos, defesa de um estímulo fi scal global e reforma do sistema fi nanceiro internacional.

O site fornece informação sobre a actividade realizada pelo FMI, nomeadamente alguma menos conhecida, como o combate ao branque-amento de capitais e ao terrorismo ou a análise da regulação do sistema fi nanceiro.

Com particular interesse, registe-se a informação disponibilizada sobre os 185 Estados-membros do FMI, com relatórios e publicações relacionadas com cada Estado.

Os elementos relativos a Portugal encontram-se actualizados até 6 de Fevereiro de 2009 – data em que foi inserido um relatório sobre a apli-cação de recomendações no âmbito do combate ao branqueamento de capitais e ao terrorismo – e incluem a indicação de previsões económicas do FMI para Portugal (com o PIB a sofrer uma redução de 4,1% em 2009 e 0,5% em 2010 e a infl ação prevista de 0,3% em 2009 e 1% em 2010).

Os relatórios sobre Portugal comportam outros elementos que importa conhecer, nomeadamente no que se refere à regulação do sis-tema fi nanceiro, com informação sobre a regulação no sector segurador e a regulação do mercado de capitais (ambos de 30 de Janeiro de 2007).

Em secção específi ca, o site contém estatísticas detalhadas sobre a actividade económica mundial – actualizados quase diariamente – que refl ectem a dimensão da crise económica mundial e permitem antever a sua evolução.

A informação fornecida é abundante e inclui dezenas de indicadores económicos e fi nanceiros.

O site permite ainda aceder à consulta de publicações do FMI.É certo que o site padece de um defeito. A informação é fornecida

em inglês, francês, espanhol, russo, chinês, japonês e árabe. Infelizmente, porém, a língua portuguesa não é considerada como língua de trabalho.

A visita ao site é, pelas razões indicadas, indispensável para a com-preensão do fenómeno fi nanceiro, a nível mundial e nacional, consti-tuindo um excelente ponto de partida para qualquer investigação no con-texto das fi nanças públicas ou do direito fi scal.

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Recensões

Por Guilherme Waldemar d’Oliveira Martins

BLOGUE PESSOAL DE PEDRO LAINS – ECONOMIA E HISTÓRIA PORTUGUESAhttp://pedrolains.typepad.com/

“Havia um tempo em que as nossas vidas estavam arrumadas em caixotes. Nas minhas costas tenho uma estante com alguns metros de dossiers com fotocópias. Agora isso já não é assim. Este blog vai-me ajudar a arrumar o trabalho, para além, claro, de me ajudar a arrumar as ideias, à medida que vou fazendo posts” (4 de Abril de 2008).

No dia 4 de Abril de 2008, surgiu na blogoesfera económica portu-guesa, o blogue do economista Pedro Lains, que é investigador Coorde-nador do Instituto de Ciências Sociais, doutorado em História no Insti-tuto Universitário Europeu de Florença (1992) e que ensina actualmente Teoria e História da Integração Europeia no Mestrado em Política Com-parada do Instituto de Ciências Sociais.

Para além de textos sobre a actualidade, o economista arruma os seus assuntos favoritos em seis “caixotes”: (1) Convidados; (2) Desi-gualdade; (3) Economia Internacional; (4) Economia Portuguesa; (5) História; (6) História económica. Sem sermos exaustivos assinalamos alguns temas ainda em discussão aberta.

Na secção Convidados, assinale-se o texto de Álvaro S. Pereira, sobre o impacto económico do terramoto de 1755, no qual refere, sem qualquer assombro que o custo directo do terramoto de 1755 foi esti-mado entre 32 e 48% do PIB português – “um valor signifi cativo, mas certamente não devastador”, nas palavras do convidado (23 de Outubro de 2008).

Já na secção de História o economista e autor do blogue acredita pouco na visão contrafactual, uma vez que “se na história política acon-tecer o mesmo que na história económica, então a conclusão geral vai ser que tudo teria fi cado mais ou menos na mesma” (23 de Junho de 2008).

Não menos interessante será seguir a discussão em torno do “Para-doxo dos Jerónimos”, na qual se lançam as bases para um tema bastante

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

actual: “Como é que uma coisa é tão odiada antes de ser feita e tão amada depois de o ser? Não se trata de uma defesa dos monumentos nacionais, mas sim de introduzir uma muito necessária perspectiva histórica à dis-cussão sobre os investimentos públicos e privados em infra-estruturas. O argumento passa por lembrar os comboios do Sr. Fontes Pereira de Melo, odiados pelo Partido Progressista e pelo Joaquim Pedro Oliveira Martins, e amados pelos emigrantes em Paris, um século depois; as bar-ragens do Doutor Salazar, odiadas pelos camponeses alagados e amadas por quem acendia a luz eléctrica em casa nos anos 1950 e pelos ecolo-gistas nos dias de hoje; as auto-estradas e a ponte Vasco da Gama do Professor Cavaco, odiadas pelos ecologistas e amadas por todos nós; ou o Alqueva do Professores Marcello Caetano e Cavaco Silva e do Eng. Guterres, odiado pelos conservacionistas e que agora está a começar a ser amada pelos olivais alentejanos e pelos turistas de longe e de perto” (4 de Novembro de 2008).

Finalmente, Pedro Lains volta à discussão, pouco estudada pela estatística, dos efeitos do “crowding-out” monetarista na economia por-tuguesa. E a impressão é que, em Portugal, nunca foi possível demons-trar que o aumento da despesa pública conduzisse à expulsão do inves-timento privado. De facto, “é minha impressão – e friso impressão, não certeza – que, na história da industrialização europeia do século XIX, os efeitos de crowding-out era relativamente pequenos. A razão é que a principal limitação do crescimento do investimento não decorria de fra-cos níveis de poupança, fracas disponibilidades fi nanceiras e de capitais caros, mas sim de sistemas fi nanceiros desadequados ou de fracas opor-tunidades de investimento. Se em Portugal se investia menos do que em Inglaterra, não era porque por cá havia menos dinheiro para investir, mas sim porque havia menos oportunidades de investimento. Esta impres-são histórica baseada, claro, em muitas leituras, nunca me abandonou e sempre que ouço falar de crowding-out lembro-me dela” (30 de Outubro de 2008). Contudo, o mais curioso nesta constatação é que vem de um economista não-keynesiano – “Por causa dele [Miguel Beleza], também, nunca fui keynesiano” (27 de Dezembro de 2008).

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Crónica de Actualidade

PONTO DE SITUAÇÃO DOS TRABALHOS NA UNIÃO EUROPEIA E NA OCDE – 19 DE FEVEREIRO E 14 DE MAIO DE 2009

Brigas Afonso, Clotilde Palma e Manuel Faustino

1. FISCALIDADE DIRECTA

1.1 A Comissão instaurou no TJCE um processo contra a Grécia por normas fi scais discriminatórias aplicáveis à aquisição da primeira habitação neste país.

A Comissão Europeia decidiu instaurar junto do TJCE um processo contra a Grécia em virtude do tratamento fi scal dado por este Estado membro à aquisição da primeira habitação no seu território. A legislação grega isenta os residentes permanentes do imposto sobre a aquisição de bens imóveis na aquisição da primeira habitação, mas não concede a mesma isenção aos adquirentes que ainda não residam na Grécia a título permanente, embora tenham a intenção de aí passar a residir. Por outro lado, nalguns casos, as disposições gregas prevêem a mesma isenção para cidadãos gregos vivendo no estrangeiro que comprem a primeiro habitação na Grécia, mas não prevêem a mesma isenção para os estran-geiros (IP-09-287. de 19-02-2009).

1.2 A Comissão instaurou no TJCE uma acção contra Portugal por tri-butação discriminatória dos contribuintes não residentes.

A Comissão intentou uma acção contra Portugal junto do TJCE em vir-tude das normas fi scais que obrigam os contribuintes não residentes a nomearem um representante fi scal caso obtenham rendimentos tributá-veis em Portugal. A Comissão considera esta exigência incompatível com a livre circulação de pessoas e de capitais garantida pelos artigos 18.º e 56.º do Tratado CE, bem como pelos artigos 36.º e 40 do Acordo EEE (IP-09-288, de 19-02-2009)

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

1.3 A Comissão pede à Bulgária para extinguir o tratamento fi scal dis-criminatório das obrigações estrangeiras emitidas pelos Estados, pelas autarquias locais e pelas sociedades.

A Comissão pediu formalmente à Bulgária para modifi car as disposi-ções internas que isentam de imposto as obrigações emitidas pelo Estado, autarquias locais e sociedades, e não dão igual tratamento a obrigações semelhantes emitidas no estrangeiro. A comissão considera que a regula-mentação em causa é incompatível com o Tratado CE, que garante a livre circulação de capitais. O pedido reveste a forma de parecer fundamen-tado (segundo passo o procedimento de infracção previsto no artigo 226.º do Tratado CE). Se a Bulgária não responder satisfatoriamente no prazo de dois meses, a Comissão pode decidir instaurar um processo junto do TJCE (IP-09-289, de 19-02-2009),

1.4 A Comissão instaura um processo contra a Hungria no TJCE, por causa das disposições fi scais discriminatórias relativas ao imposto devido na aquisição de imóveis para uso habitacional.

A Comissão decidiu instaurar no TJCE um processo contra a Hungria por causa das suas disposições fi scais relativas ao imposto devido na aquisição de imóveis para uso habitacional. Estas disposições desfavore-cem os contribuintes cuja aquisição é precedida ou seguida da alienação da sua residência anterior noutro Estado membro. São, pois, incompatí-veis com a livre circulação de pessoas e a liberdade de estabelecimento, garantidas pelos artigos 18., 39.º e 43.º do Tratado CE, bem como pelo artigos correspondentes do acordo EEE (IP-09-290, de 19-02-2009)

1.5 Fiscalidade directa: a Comissão pede à República Checa para eli-minar a tributação discriminatória dos contribuintes não residentes.

A Co missão pediu formalmente à República Checa para modifi car as normas fi scais que impõem aos não residentes a tributação, sobre uma base bruta, de alguns rendimentos obtidos naquele território, enquanto os residentes podem deduzir os encargos conexos com a obtenção desses mesmos rendimentos. A Comissão considera que tal regulamentação é incompatível com o tratado CE que garante a livre prestação de serviços

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Crónica de Actualidade

e a livre circulação de capitais. O pedido reveste a forma de parecer fundamentado (segundo passo no procedimento de infracção previsto no artigo 226.º do Tratado CE). Se a República Checa não responder satis-fatoriamente no prazo de dois meses, a Comissão considerará instaurar um processo junto do TJC (IP-09-291, de 19-02-2009).

1.6 Fiscalidade directa: a Comissão pediu à Finlândia para eliminar a tributação discriminatória dos artistas e desportistas não residentes.

A Comissão pediu formalmente à Finlândia para modifi car a sua legisla-ção, em virtude da qual os artistas e desportistas não residentes são tribu-tados de modo discriminatório.Com efeito, são tributados a um imposto liberatório de 15% sobre os rendimentos obtidos na Finlândia, uma vez efectuados os poucos abatimentos previstos por despesas de deslocação, estada e salários. Os artistas e desportistas residentes estão submetidos a uma tributação progressiva e podem deduzir os encargos reais conexos com os seus rendimentos. O pedido da Comissão reveste a forma de pare-cer fundamentado, segundo passo no procedimento de infracção previsto no artigo 226.º do Tratado CE. Se a Finlândia não responder satisfato-riamente no prazo de dois meses, a Comissão considerará levar o caso à apreciação do TJCE (IP-09-292, de 19-02-2009)

1.7 Fiscalidade directa: a Comissão pediu à Bulgária para eliminar a tributação discriminatória dos contribuintes não residentes.

A Comissão pediu formalmente à Bulgária para modifi car as normas fi s-cais que impõem aos não residentes a tributação, sobre uma base bruta, de alguns rendimentos obtidos naquele território, enquanto os residentes podem deduzir os encargos conexos com a obtenção desses mesmos ren-dimentos. A Comissão considera que tal regulamentação pode conduzir a uma tributação mais elevada dos não residentes e, nessa conformidade, que é incompatível com o tratado CE que garante a livre prestação de serviços e a livre circulação de capitais. O pedido reveste a forma de parecer fundamentado (segundo passo no procedimento de infracção pre-visto no artigo 226.º do Tratado CE). Se a República Checa não respon-der satisfatoriamente no prazo de dois meses, a Comissão considerará instaurar um processo junto do TJC (IP-09-427, de 19-03-2009).

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

1.8 A Comissão pede à Áustria para eliminar o tratamento fi scal discri-minatório dos donativos no domínio das ciências e da investigação

A Comissão pediu formalmente à Áustria para modifi car as disposições do seu regime fi scal que concedem um tratamento mais favorável aos donativos no domínio das ciências e da investigação efectuados em favor de instituições sem fi ns lucrativos, estabelecidas no seu território ou que desenvolvam actividades em favor do sector científi co austríaco ou da economia austríaca. A Comissão considera que tal regime é incompa-tível com a livre prestação de serviços e a livre circulação de capitais. O pedido reveste a forma de parecer fundamentado (segundo passo no procedimento de infracção previsto no artigo 226.º do Tratado CE). Se a República Checa não responder satisfatoriamente no prazo de dois meses, a Comissão considerará instaurar um processo junto do TJC (IP-09-428, de 19-03-2009).

1.9 A Comissão instaura no TJCE um processo contra Espanha por medidas restritivas em matéria de tributação à saída sobre as pes-soas singulares

A Comissão decidiu instaurar no TJCE um processo contra a Espanha em razão das suas disposições fi scais que prevêem a aplicação de um imposto de saída às pessoas singulares que deixam de ter a sua residência fi scal em Espanha. Tais disposições são incompatíveis com a livre circu-lação de pessoas consagrada nos artigos 18.º, 39.º e 43.º do Tratado CE e nos artigos 28.º e 31.º do Acordo EEE (IP-19-431, de 19-03-2009)

1.10 Fiscalidade directa: a Comissão instaura um processo no TJCE contra a Alemanha por discriminação fi scal mo que se refere a imó-veis situados no estrangeiro.

A Comissão decidiu accionar a Alemanha perante o TJCE em virtude das regras discriminatórias de amortização fi scal que são aplicadas no que diz respeito a bens imóveis situados fora do seu território. Com efeito, a legislação alemão prevê a possibilidade de aplicação, durante a constru-ção ou nos primeiros anos seguintes à construção ou à aquisição de bens imóveis situados na Alemanha taxas de amortização superiores às que se

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Crónica de Actualidade

aplicam a bens idênticos situados no estrangeiro. A Comissão considera que esta diferença de tratamento é incompatível com o princípio da liber-dade de circulação de capitais (IP-09-433, de 19-03-2009).

1.11 Fiscalidade directa: Comissão Europeia intenta acção contra a Ale-manha no TJCE por tributação discriminatória dos dividendos à saída

A Comissão decidiu intentar uma acção contra a Alemanha no TJCE em razão das suas disposições fi scais relativas aos pagamentos de dividen-dos à saída a empresas. A Comissão considera que a tributação mais elevada dos dividendos à saída é contrária ao Tratado CE e ao acordo EEE, considerando que ela constitui um obstáculo à livre circulação de capitais e à liberdade de estabelecimento previstas no artigo 56.º do tra-tado e no artigo 40.º do acordo EEE (IP-09-435, de 19-03-2009).

1.12 Empresa e fi scalidade: a Comissão adopta um relatório sobre o funcionamento da Directiva Juros e Royalties (COM(2009) 179 FINAL, de 17-04-2009).

A Comissão Europeia enviou ao Conselho um relatório sobre o funciona-mento da directiva dos juros e royalties. O objectivo da directiva é elimi-nar a dupla tributação sobre pagamentos de juros e royalties transfrontei-ras entre empresas associadas. O relatório afi rma que a aplicação global da directiva tem sido satisfatória. No entanto, são propostas sugestões para a interpretação mais uniforme e juridicamente mais segura. O rela-tório também analisa a melhoria do texto existente, incluindo o alarga-mento do âmbito de aplicação da directiva. Os debates sobre as con-clusões do relatório, ao nível do Conselho, deverá fornecer orientações à Comissão para uma futura alteração legislativa proposta. O relatório pode ser encontrado neste link: http://ec.europa.eu/taxation_customs/common/publications/com_reports/taxation/index_en.htm

1.13 Promover a boa governação em questões fi scais: a Comissão pro-pôs medidas para melhorar a transparência e a troca de informações e o progresso no caminho da concorrência fi scal leal no domínio fi scal (COM (2009) 200 FINAL, de 28-04-2009)

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

A Comissão adoptou uma comunicação em que são inventariadas as medi-das que os Estados membros deveriam adoptar para promover a «boa governação» em questões fi scais (ou seja, mais transparência e troca de informações e novos progressos no caminho da concorrência leal em matéria fi scal). Esta comunicação indica os meios que permitiriam melho-rar a boa governação no seio na UE. Ela indica igualmente as ferramen-tas ao dispor da Comunidade e dos Estados para que os princípios da boa governação sejam utilizados ao nível internacional. Por último, esta comunicação convida os Estados membros a adoptar, nas suas relações bilaterais com países terceiros e no seio das organizações internacio-nais, uma abordagem mais coerente com referência aos princípios da boa governação. A comunicação apoia-se na política actualmente prosseguida pela UE no domínio fi scal e nas recentes conclusões do G20 em matéria de jurisdições fi scais não cooperantes (IP-09-650, de 28-04-2009)

1.14 Ajudas de Estado: a Comissão aprovou três dispositivos fi scais relativos a capital de risco.

A Comissão aprovou três dispositivos fi scais do Reino Unido relativos ao capital de risco,no quadro da aplicação das regras do tratado CE sobre as ajudas de Estado. Trata-se da Entreprise Investment Scheme (EIS), da Venture Capital Trust (VCT) e da Corporate Venturing Scheme (CVS). Estes dispositivos fazem parte das medidas adoptadas pelo Reino Unido para facilitar o acesso das PME aos meios fi nanceiros e para conceder vantagens fi scais aos investidores privados e comerciais a fi m de os inci-tar a investir nas PME não cotadas. Todas as exigências das linhas direc-toras da Comunidade relativas aos investimentos de risco nas PME (ver IP/06(1015) se consideraram cumpridas, a partir do momento em que o Reino Unido modifi cou estes dispositivos. Assim, a Comissão considera que as ajudas são compatíveis com o artigo 87.º, § 3.º, ponto c), do tra-tado que autoriza as ajudas destinadas a facilitar o desenvolvimento de algumas actividades económicas (IP-06-661, de 29-04-2009).

1.15 Fiscalidade directa: a Comissão pede à Polónia que elimine a tribu-tação discriminatória dos fundos de pensões, dos fundos de inves-timentos e das sucursais fi nanceiras estrangeiras

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Crónica de Actualidade

A Comissão dirigiu um parecer fundamentado, segundo passo do proce-dimento de infracção prevista no artigo 226.º do tratado CE, à Polónia, relativamente à sua legislação que prevê uma tributação mais elevada dos juros e dividendos pagos aos fundos de pensões e aos fundos de inves-timento estrangeiros e uma tributação mais elevada dos juros pagos às sucursais fi nanceiras estrangeiras. Se a Polónia não responder satisfato-riamente no prazo de dois meses, a Comissão poderá demandar a Poló-nia perante o TJCE (IP-09-790, de 14 de Maio de 2009).

1.16 Fiscalidade directa: a Comissão pede ofi cialmente à Áustria para modifi car algumas regras discriminatórias relativas à designação de representantes fi scais.

A comissão pediu ofi cialmente à Áustria para modifi car as suas disposi-ções fi scais relativas à designação de um representante fi scal. A Comissão considera que as regras que impõem aos fundos de investimento estran-geiro, aos fundos de investimento imobiliário e às sucursais fi nanceiras a obrigação de designarem representantes fi scais induzem um tratamento discriminatório. A Comissão considera igualmente discriminatória a interdição de designar as sucursais fi nanceiras e os técnicos de contas estrangeiros como representantes fi scais por conta dos investidores nos fundos de investimento e considera que estas regras são incompatíveis com a liberdade de prestação de serviços. O pedido reveste a forma de parecer fundamentado (segundo passo no procedimento de infracção pre-visto no artigo 226.º do Tratado CE). Se Áustria não responder satisfato-riamente no prazo de dois meses, a Comissão considerará instaurar um processo junto do TJC (IP-09-782, de 14-05-2009).

1.16 Tax Forum 2009:

Nos dias 30 e 31 de Março de 2009 realizou-se em Bruxelas a 3.ª edição do Tax Forum promovido pela Comissão, subordinado ao tema «Sistemas de Tributação num Mundo em Mudança». No primeiro dia abordaram-se temas relacionados com os meios de assegurar o reforço das bases fi scais e ainda com a necessidade de uma boa governação do domínio da tributação. No segundo dia, foram tratados aspectos da tributação sobre o rendimento e sobre o consumo no século XXI. Ambas as sessões foram

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asseguradas por distintos intervenientes do mundo académico, do mundo empresarial e das administrações públicas.

1.17 Colecção Taxation Papers

Mais três volumes vieram enriquecer a colecção Taxation Papers: o Volume 14 – Corporate effective tax rates in an enlarged Eurepan Union; o Volume 15: Corporate income tax and economic distortions; o Volume 16 – International Taxation and multinational fi rm location decisions; todos disponíveis no site da EU – Fiscalidade.

1.18 O Centro para a Política Fiscal e Administração da OCDE publi-cou o «Report on abuse of Charities for Money Laudering and Tax Evasion», considerando que a evasão fi scal e fraude fi scal através do abuso de organizações de caridade é um sério e acrescido risco em muitos países, enquanto o seu pacto é variável. Muitos países estimam que o uso abusivo de organizações de caridade custa aos respectivos tesouros muitas centenas de milhões de dólares e está cada vez mais na moda.

2. IMPOSTO SOBRE O VALOR ACRESCENTADO

2.1 Comissão solicita à Letónia que aplique IVA nos terrenos para construção

A Comissão veio solicitar à Letónia que deixe de isentar os terrenos para construção (Comunicado de imprensa IP/09/781, de14.05.2009).

2.2 Comissão inicia acção contra a Polónia relativamente à apli-cação do IVA a serviços transfronteiriços de transporte de passageiros

A Comissão decidiu iniciar uma acção contra a Polónia no Tribunal de Justiça relativamente à aplicação de um regime especial de IVA a servi-ços transfronteiriços de transporte de passageiros efectuados por auto-

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carros registados no estrangeiro (Comunicado de imprensa IP/09/779, de 14.05.2009).

2.3 Comissão solicita à Itália que altere as regras de determinação do valor tributável das transmissões de imóveis

A Comissão solicitou à Itália que alterasse as regras de determinação do valor tributável das transmissões de imóveis, calculado em função de uma percentagem do valor de mercado em caso de divergência entre o valor declarado e aquele valor (Comunicado de imprensa IP/09/430, de 19.03.2009).

2.4 Comissão inicia acção contra a Grécia por não ter notifi cado a transposição de duas Directivas

A Comissão iniciou uma acção contra a Grécia no Tribunal de Justiça por não ter notifi cado a Comissão da transposição das Directivas 2006/69/CE e 2006/112/CE (Comunicado de imprensa IP/09/432, de 19.03.2009).

.2.5 Comissão inicia acção contra a Polónia pela inclusão do imposto

automóvel de registo no valor tributável do IVA

A Comissão iniciou uma acção contra a Polónia no Tribunal de Jus-tiça por incluir o imposto automóvel de registo no valor tributável do IVA aquando da transmissão de veículos automóveis (Comunicado de imprensa IP/09/429 de 19.03.2009).

3. IMPOSTOS ESPECIAIS DE CONSUMO HARMONIZADOS, IMPOSTO SOBRE VEÍCULOS E UNIÃO ADUANEIRA

3.1 União Aduaneira – Comissão altera Disposições de Aplicação do Código Aduaneiro Comunitário

Foi publicado no JOUE, em 17.04.2009, o Regulamento (CE) n.º 312//2009, que altera as Disposições de Aplicação do Código Aduaneiro Comunitário, instituindo o Número EORI (Número de Registo e Identifi -

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cação dos Operadores Económicos), que é um número, único em toda a Comunidade Europeia, atribuído aos operadores económicos e a outras pessoas pelas autoridades aduaneiras ou pelas autoridades designadas por um Estado-Membro, bem como o respectivo sistema electrónico comunitário de gestão.

3.2 Tributação automóvel – Comissão Europeia pede esclareci-mentos à França relativos ao imposto sobre veículos

A Comissão Europeia solicitou à França, em 14.04.2009, para prestar informações relativas à tributação dos veículos automóveis registados pela primeira vez em França, considerando que o método de cálculo for-fetário da depreciação dos veículos usados é discriminatória dos veículos usados adquiridos noutro Estado-Membro.

3.3. União Aduaneira – Transmissão electrónica da declaração sumária

A Comissão Europeia adoptou em 02.04.2009 um regulamento que esta-belece um período transitório, de 1 de Julho de 2009 a 31 de Dezembro de 2010, durante o qual os operadores poderão optar pela apresentação das declarações sumárias por via electrónico, quer na importação quer na exportação. Esta medida insere-se nas precauções com a segurança da cadeia logística internacional e visa melhorar a análise de risco das operações do comércio externo comunitário.

3.4 União Aduaneira - Acordo de cooperação UE/Suíça

No dia 17.02.2009 foi publicado no JOUE n.º L 46 um acordo de coope-ração entre a EU e a Suíça, que tem como objecto o combate à fraude em matéria de IVA, IEC´s e direitos aduaneiros, incluindo o contrabando, com o consequente reforço da cooperação administrativa.

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Crónica de Actualidade

ESTADOS UNIDOS AMEAÇAM TRIBUTAR PRÉMIOS DE GESTORES À TAXA DE 90%: BREVE NOTA INFORMATIVA

Nota introdutória

A crise fi nanceira, e subsequentemente económica, que se abateu sobre os Estados Unidos da América e se propagou pelo resto do Mundo, estará, tudo indica, longe de fi car solucionada. As economias mundiais sofreram um impacte considerável, que poderá subsistir por diversos anos. No entanto, variados são já os Estados cuja palavra de ordem con-siste na implementação de medidas futuras tendentes à minimização da crise, à estimulação dos mercados e à retoma da economia.

De entre as diversas medidas assumidas recentemente pelos Gover-nos, tanto a nível político e económico, como a nível legislativo, salien-tamos as subsequentes injecções de capital nos mercados nacionais e, bem assim, a previsões de diversos pacotes fi scais anunciados pelos Governos.

Neste contexto, o Governo norte-americano apresenta claramente um dos esforços mais signifi cativos relativamente a esta temática, nome-adamente no que concerne ao fi nanciamento de instituições diversas, em particular fi nanceiras, com o objectivo de assegurar a sua subsistência e continuidade perante uma insolvência iminente. Montantes estes, refi ra-se, inéditos em termos de subsídios governamentais norte-americanos.

Contudo, foi igualmente noticiado que se verifi caram casos de insti-tuições intervencionadas onde, ao invés da retromencionada injecção de capital assegurar a posição das mesmas perante os respectivos credores, montantes de centenas de milhões de dólares terão sido atribuídos aos seus quadros e gestores, enquanto pagamento de prémios pelos serviços prestados.

Perante esta atitude assumida pela gestão, o Conselho Económico Nacional da Casa Branca apressou-se a comunicar o seu manifesto des-

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contentamento. No entanto, algumas dessas instituições recusaram-se a reverter a decisão, sob pretexto de que se colocariam numa posição pro-pícia a potenciais processos judicias por parte dos seus funcionários. Em causa estaria, em alguns casos, o pagamento de prémios em atraso, em concordância com os contratos de trabalho concluídos antes da presente crise fi nanceira.

A Administração Obama apressou-se a criticar o sucedido, refe-rindo que os verdadeiros prejudicados seriam os contribuintes, os quais teriam transferido o dinheiro dos seus impostos para as contas bancárias de gestores de topo.

Ora, foi precisamente nesta contextualização, com o intuito de miti-gar futuras situações semelhantes, que surgiu uma proposta de lei, apre-sentada pela Câmara dos Representantes norte-americana a 18 de Março de 2009 e aprovada no dia seguinte por uma maioria superior a 2/3 dos votos.

Proposta de lei

Nos termos da proposta de lei H.R. 1586, apresentada perante o Congresso norte-americano pela Câmara dos Representantes, de acordo com a verifi cação de determinados requisitos, o Legislador propõe uma tributação agravada incidente sobre os prémios distribuídos aos colabo-radores de sociedades que tenham previamente sido objecto de subsí-dios estatais destinados a mitigar a actual crise. A ratio legis subjacente à mesma prender-se-á com a premência de se evitar futuras situações semelhantes à recente polémica gerada em torno dos prémios pagos em algumas empresas benefi ciárias de apoio estatal.

Concretamente, as sociedades visadas serão as benefi ciárias dos Troubled Assets Relief Program Funds (comummente referidos por “TARP”), fundos estes disponibilizados recentemente pelo Governo norte-americano com o intuito de mitigar a presente crise fi nanceira.1 A

1 Refi ra-se que se encontrarão abrangidas quaisquer entidades benefi ciárias dos fundos TARP, a Federal National Loan Mortgage Association e a Federal Home Loan Mortgage Corporation, assim como entidades relacionadas.

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Crónica de Actualidade

legislação aplicar-se-ia a quaisquer sociedades receptoras de um mon-tante superior a 5 mil milhões de dólares proveniente dos referidos sub-sídios federais norte-americanos.

Consequentemente, de acordo com a letra da lei, encontrar-se-ão sujeitos a imposto, a uma taxa de 90%, os prémios (genericamente desig-nados por “bónus”) pagos pelas entidades benefi ciárias dos TARP, abran-gidas pela proposta.

A referida tributação, à taxa de 90%, incidirá sobre os bónus rece-bidos por colaboradores das respectivas entidades. Refi ra-se ainda que o termo “bónus” deverá ser aplicado lato sensu, abrangendo não somente as remunerações ocasionais colocadas à disposição dos colaboradores a título de prémio pelos esforços desenvolvidos, mas igualmente quaisquer montantes pagos enquanto incentivo à retenção dos presentes colabo-radores. Com efeito, o Legislador apenas terá excluído do signifi cado da referida expressão os pagamentos efectuados a título de comissões, benefícios sociais e outros benefícios acessórios, bem como o reembolso de despesas.2

Adicionalmente, a tributação agravada incidirá sobre os rendimen-tos dos colaboradores destas entidades, cujos rendimentos anuais do agregado familiar sejam superiores a um determinado escalão, i.e., um montante de 250.000 dólares. Desta forma, as quantias em excesso do montante anual referido serão igualmente consideradas para efeitos de atribuição de prémios. Quererá isto signifi car que o montante dos salá-rios considerado excessivo será, em ultima ratio, equiparados ao paga-mento de bónus.

Salientamos igualmente que os ex-colaboradores das sociedades que preencham os requisitos anteriormente aludidos encontrar-se-iam, igualmente, sujeitos à referida tributação agravada.

No que respeita à aplicação da lei no tempo, uma vez em vigor, a mesma aplicar-se-á retroactivamente a quaisquer situações susceptíveis de preencherem os referidos requisitos desde 31 de Dezembro de 2008, claramente abrangendo, desta forma, os bónus recentemente disponibili-zados pelas empresas aos seus gestores de topo.

2 De acordo com a proposta de lei, os pagamentos excluídos são apenas “commis-sions, welfare or fringe benefi ts, or expense reimbursements”.

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Porém, cumpre ressalvar que existirá a possibilidade dos colabora-dores visados pela referida norma evitarem a aplicação do preceituado sob análise, na medida em que os mesmos poderão optar por devolver as quantias auferidas às suas sociedades.

Perspectivas futuras

De acordo com os defensores desta nova lei, o objectivo será devol-ver aos contribuintes o dinheiro que lhes pertenceria originalmente.

Porém, o Senado norte-americano terá já manifestado alguma dis-sonância, anunciando que irá propor uma nova “versão” da mesma, ligeiramente alterada. Embora nenhuma comunicação ofi cial tenha sido proferida até à data, rumores sugerem uma potencial redução da taxa de tributação incidente sobre os referidos prémios, podendo igualmente ser apresentada uma nova proposta de lei consideravelmente menos abrangente.3

Inconstitucionalidade por acção

No entanto, independentemente de se considerar, ou não, excessiva a taxa de tributação proposta pela Câmara dos Representantes (de notar que os Estados Unidos não conheciam uma taxa de tributação de 90% há aproximadamente 5 décadas, desde a Administração Kennedy), discus-sões acesas têm surgido no Capitólio relativamente à constitucionalidade da lei, na sua generalidade.

De facto, embora a referida proposta de lei não seja directamente dirigida a casos concretos, poderá violar peremptoriamente a Cláusula 3, da Secção 9 do Artigo I da Constituição Federal Norte-Americana, a qual

3 Com efeito, o Senado terá apresentado, a 19 de Março do corrente ano, a “Lei da Compensação Equitativa”, S. 651 (mais concretamente, a apelidada de Compensation Fairness Act of 2009), nos termos da qual se propõe uma alteração ao Código do IRS norte-americano, sugerindo, entre outras medidas, a imposição de uma taxa de 70% sobre os prémios pagos. Espera-se que a mesma seja apresentada a votação em breve, existindo a possibilidade de coincidir com a lei proposta pela Câmara dos Representantes.

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Crónica de Actualidade

proíbe a existência de leis específi cas, aplicáveis a situações anteriores à sua entrada em vigor, destinadas a penalizar um grupo específi co de indi-víduos, sem audição prévia, bem assim como a existência de impostos sancionatórios.4

Ademais, destacamos que a mencionada retroactividade prevista no preceituado da presente proposta de lei seria directamente aplicável aos prémios anteriormente pagos aos gestores da AIG, embora a referida data exclua da sua aplicação a situação semelhante verifi cada aquando do escândalo que ocorreu no seio da Merrill Lynch.

Considerações fi nais

As presentes notas são de natureza necessariamente geral e refl ec-tem apenas as discussões presentemente em curso nos Estados Unidos, sobre uma temática que em Portugal começa já a ganhar também particu-lar acuidade. De facto, a Assembleia da República aprovou na generali-dade uma proposta de lei, em discussão a esta data na especialidade, que pretende também tributar os prémios, à taxa de 75% (e agravando para 30% a tributação das empresas), com carácter generalizado.

De salientar ainda que os autores das propostas de lei norte-ame-ricanas não publicaram quaisquer comentários sobre as mesmas, ape-nas tendo surgido uma discussão maioritariamente política, desprovida de considerações técnicas e legais. Assim, não surpreenderá o facto dos comunicados proferidos pelo Congresso apresentarem grande subjectivi-dade a infi ltrar-se nas posições assumidas.

Ora, não obstante a polémica suscitada em torno deste tópico, bem assim como no que concerne à constitucionalidade da referida lei, apenas nos restará esperar pela votação da outra Câmara do Congresso norte--americano, i.e., o Senado, após a qual ainda deverá ser tida em consi-deração a apreciação fi nal pelo Presidente dos Estados Unidos. Saliente--se, a título de curiosidade, que o Presidente Obama terá já expressado,

4 “[…] No bill of attainder or ex post facto Law shall be passed […]” – The Con-stitution of the United States of America – The Legislative Branch – Limits on Legislative Power.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

publicamente, o seu desagrado relativamente à proposta, indiciando um possível desfecho da mesma.

Sobre a potencial aprovação em Portugal de legislação sobre esta temática, tudo indica que possa vir a ser publicada brevemente legis-lação, em termos mais latos, e não apenas dirigida a instituições que receberam apoios públicos, como é o caso dos Estados Unidos supra descrito. No entanto, ainda não se conhecem os respectivos contornos, pelo que não nos pronunciaremos sobre esta possibilidade no presente artigo, dado ser ainda cedo para existirem bases sólidas para comentar as iniciativas legislativas em Portugal nesta sede.

Contudo, a já referida aprovação na generalidade de uma proposta de lei visando a tributação agravada dos prémios, segundo a informa-ção disponível, em face da actual conjuntura político-económica, faz recear o pior, com potenciais impactes nefastos que urge ponderar cuidadosamente.

Carlos Loureiro

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Crónica de Actualidade

NOVOS DADOS SOBRE A POBREZA EM PORTUGAL

(A PROPÓSITO DE UM ESTUDO RECENTE PUBLICADO NO BOLETIM

ECONÓMICO DO BANCO DE PORTUGAL)

Nazaré da Costa Cabral

Foi recentemente publicado no Boletim Económico do Banco de Portugal (Primavera), um estudo da autoria de Nuno Alves (2009) intitu-lado Novos factos sobre a pobreza em Portugal. Este estudo baseia-se no Inquérito às despesas das famílias, 2005-2006, realizado pelo Instituto Nacional de Estatística – INE (2008a) e refere-se ainda ao documento informativo elaborado também pelo INE (2008b), Rendimento e con-dições de vida, 2007. Dos textos mais recentes publicados – como por exemplo os de Albuquerque e outros (2006), Rodrigues (2007) e Costa e outros (2008) –, o estudo em apreço é, na verdade, o que se baseia em dados mais actualizados.

Do ponto de vista metodológico, existe um aspecto que importa mencionar (e que de resto é salientado pelo autor): a análise centra-se de forma simétrica em agregados de despesa e rendimento, o que contrasta com a maioria dos estudos recentes em Portugal, que se baseiam unica-mente em agregados de rendimento. Deve-se isto à circunstância de que indicadores de pobreza baseados em agregados de despesas desempe-nharem uma função, pelo menos, complementar dos indicadores basea-dos em agregados de rendimentos.

A utilidade desta opção metodológica, de relevar os agregados de despesa, é depois confi rmada pelo autor quando evidencia que o nível de pobreza calculado com base nos agregados de despesa é maior do que o calculado com agregados de rendimento, o que demonstra que não existe coincidência entre os respectivos resultados Do grupo de indivíduos que

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são pobres com base em agregados de despesa, apenas cerca de metade são igualmente pobres com base em agregados de rendimento). De entre as razões apontadas para este facto, salienta: i) o facto de as despesas terem uma natureza discreta no curto prazo, em particular no que respeita à aquisição de bens duradouros, o que pode alterar a posição relativa dos indivíduos nas distribuições da despesa e rendimentos; ii) o facto de os inquéritos aos agregados familiares apresentarem tipicamente erros de medida signifi cativos e que, designadamente, o rendimento surge em geral sub-reportado nesses inquéritos; iii) o facto de o rendimento variar ao longo do ciclo de vida dos indivíduos e em resposta a choques idios-sincráticos (desemprego, reformas, etc.), o que leva a que os indivíduos alisem as suas despesas, alterando o nível de poupança ou dívida.

De seguida, o autor procede à identifi cação das categorias de pobres em Portugal, considerando a informação disponível em INE (2008b). Mantendo-se a taxa de pobreza nos 18%, ela apresenta graus de intensi-dade diferenciados por categorias de população. Assim:

– Quanto à localização geográfi ca, as regiões com as mais altas taxas de pobreza são a Madeira, os Açores e o Alentejo;

– Quanto à dimensão do agregado familiar, as maiores taxas de pobreza ocorrem em famílias compostas por seis ou mais indiví-duos, ainda que agregados familiares compostos apenas por um indivíduo registem igualmente taxas de pobreza acima da média;

– Relativamente à estrutura etária da população, as taxas de pobreza mais elevadas são concentradas nas famílias cujo representante tem acima de 64 anos e, sobretudo, com idade superior a 74 anos.

– Também o número de anos de educação é variável importante na identifi cação da incidência em Portugal, sendo que a taxa de pobreza diminui de forma consistente em função do número de anos de escolaridade completa do representante;

– Quanto à condição perante o trabalho, o estudo demonstra que as taxas de pobreza são signifi cativamente mais elevadas nos casos em que o representante se encontra desempregado, reformado ou sem trabalho por outros motivos. Situação de particular vulnerabilidade acontece, sempre que o representante e o seu cônjuge se encon-trem, ambos, desempregados. Ainda assim, existe uma parcela signifi cativa de indivíduos empregados em situação de pobreza.

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A leitura deste estudo, em articulação, com os dados recentes do INE (2008b), sugere-nos as seguintes conclusões:

1. Do ponto de vista estrutural, retiramos que dos factores explicati-vos da pobreza em Portugal, o mais importante é nível de educa-ção da população. A experiência passada, como assinala o autor, revela a transmissão intergeracional de baixos níveis de educação como determinante da transmissão intergeracional da pobreza. Pelo contrário, a incidência da pobreza decresce muito, relativa-mente a indivíduos com níveis mais elevados de escolaridade. Esta evidência constitui fundamento de acção política presente e futura, baseada numa estratégia orientada para o aumento dos níveis de educação;

2. Do ponto de vista conjuntural, o estudo citado e os dados do INE não avaliam ainda o impacto da crise actual e a sua repercussão sobre a taxa de desemprego. Teme-se que, dada a ligação evi-dente entre o desemprego e a pobreza, o crescimento daquele conduza à ultrapassagem da já de si elevada taxa de 18%, aspecto que deverá, por isso, merecer a atenção prioritária por parte dos decisores políticos, agentes económicos e parceiros sociais.

Referências bibliográfi cas

ALBUQUERQUE, José Luís (coord.) et aliud (2006), Medidas de pobreza e exclu-são social em Portugal, DGEEP/MTSS, Lisboa, 2006.

ALVES, Nuno (2009), Novos factos sobre a pobreza em Portugal, Boletim Econó-mico do Banco de Portugal (Primavera), 2009.

COSTA, Alfredo Bruto et aliud (2008), Um olhar sobre a pobreza – Vulnerabi-lidades e Exclusão Social no Portugal Contemporâneo, Gradiva, Lisboa, 2008.

INE (2008a), Inquérito às despesas das famílias, 2005-2006, 2008. INE (2008b), Rendimento e condições de vida, 2007, 2008.RODRIGUES, Carlos Farinha (2007), Distribuição do Rendimento, Desigualdade e

Pobreza – Portugal nos Anos 90, Almedina, Coimbra, 2007.

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COMENTÁRIO SOBRE A NOTA TÉCNICA DA UNIDADE TÉCNICA DE APOIO ORÇAMENTAL DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA RELATIVA ÀS PARCERIAS PÚBLICO PRIVADAS NOS DOMÍNIOS RODOVIÁRIO E FERROVIÁRIO

Maria Eduarda Azevedo

1. Enquadramento

Em 2006, após a terceira revisão da Lei de Enquadramento Orça-mental (LEO)1, a Assembleia da República (AR) criou a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) enquanto dispositivo de suporte técnico à Comissão Parlamentar do Orçamento e Finanças (COF)2. Reconhecendo que os encargos plurianuais comprometidos com contratos em parce-ria com o sector privado haviam atingido um montante signifi cativo, a UTAO foi chamada a elaborar uma nota técnica sobre os encargos do Estado com as concessões rodoviárias e ferroviárias3.

Perante a insufi ciência da informação do relatório que acompanha a apresentação anual do OE, a análise da UTAO fi rmou-se sobretudo nas auditorias do Tribunal de Contas (TC), tendo ensaiado ainda uma

1 Cf., Lei nº 48/2004, de 24 de Agosto.2 Cf., Resolução da AR nº 53/2006, DR, 1ª série, nº 151, de 7 de Agosto.3 Cf., Nota Técnica da UTAO sobre as parcerias público-privadas: encargos do

Estado com as concessões rodoviárias (com portagem real e SCUT) e ferroviárias – Aná-lise das questões técnicas suscitadas pela auditoria do Tribunal de Contas, Diário da AR, II série – C, nº 11, de 16 de Novembro de 2006, X Legislatura, 3ª sessão legislativa (2007-2008).

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estimativa do custo fi nanceiro para o Estado decorrente das concessões rodoviárias em regime de portagem virtual.

Tratou-se de um primeiro exercício que, centrado nos aspectos específi cos do processo orçamental, repousou nas conclusões e recomen-dações do TC. Deste modo, a nota técnica não retira conclusões, nem formula recomendações a incorporar no processo de formulação política. O relato também não faz o “ponto da situação” sobre o grau de imple-mentação das recomendações tecidas pelo TC.

De facto, as auditorias do TC tinham evidenciado debilidades em várias áreas: além da estruturação e gestão do processo PPP, também matérias relativas ao processo orçamental, atinentes, em especial, à trans-parência, controlo orçamental, avaliação de encargos presentes e futuros, transferências entre orçamentos e no plano intergeracional4.

2. Da Análise das Auditorias do TC

2.1. Programação Orçamental dos Encargos com PPP’s Neste capítulo, as recomendações do TC têm aludido a um núcleo

central de obrigações do Estado emergentes das disposições aplicáveis da LEO:

Os compromissos fi nanceiros com PPP’s hão-de ser objecto de inscrição nos mapas orçamentais plurianuais, desde o ano em que estiver previsto o seu lançamento, independentemente de se pre-verem, ou não, quaisquer pagamentos

Os encargos adicionais têm de ser objecto de igual previsão orça-mental, a fi m de assegurar permanentemente uma estimativa actualizada dos compromissos PPP, evitando a suborçamentação5

4 Nestes domínios, as auditorias do TC compreendem: em 2003, auditoria às con-cessões rodoviárias em regime de portagem SCUT; em 2004, parecer do TC sobre a CGE de 2004; em 2005, auditoria às concessões rodoviárias em regime de portagem SCUT – follow-up; em 2005, auditoria aos encargos do Estado com PPP: concessões rodoviárias e ferroviárias; em 2007, auditoria aos encargos do Estado com PPP: concessões rodovi-árias e ferroviárias – follow-up.

5 Os custos adicionais podem advir de modifi cação unilateral do contrato, atrasos nas expropriações e nas aprovações ambientais.

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Requer-se ainda a fi xação de um limite máximo para a assunção de encargos plurianuais com parcerias, bem como uma memória descritiva por projecto, justifi cando a opção com base no “Value for Money” (VfM).

Aspectos que têm merecido a atenção de organizações internacio-nais – FMI6 e OCDE7 –, visto a abordagem PPP alterar não só o perfi l do fl uxo de pagamentos efectuados pelo Estado, mas também a percepção do “stock” de encargos e da respectiva suportabilidade, tendo em conta o diferimento da despesa para exercícios orçamentais futuros e a contabili-zação dos custos do investimento “fora” das Contas Públicas.

Donde a necessidade das responsabilidades públicas com PPP’s serem devidamente quantifi cadas, registadas e reportadas segundo cri-térios e convenções contabilísticas “standard” e de forma transparente, facilitando o escrutínio das contas públicas e da “accountability”.

Considerando que a legislação em vigor acolheu grande parte das boas práticas internacionais, a UTAO concluiu que as fragilidades identi-fi cadas pelo TC não resultam da falta de um quadro legal adequado, antes da sua aplicação.

2.2. Informação Orçamental ao ParlamentoAtendendo a que é elementar dispor de informação credível e trans-

parente sobre os compromissos fi nanceiros do Estado com PPP’s, o TC evidenciou, em relação ao Relatório do OE-2007, que persistia a prá-tica de apresentar os encargos previstos e já assumidos com as parcerias, sem uma desagregação adequada e inteligível por projecto, nem capaz de refl ectir os “custos adicionais”.

Por seu turno, com referência ao aludido Relatório, a UTAO des-tacou a opacidade relativa dos elementos informativos disponibilizados, que não discriminam os encargos por parceria, nem contemplam uma nota metodológica sobre o seu apuramento. Nesta medida, salienta tam-bém não ser possível descortinar os encargos respeitantes a parcerias

6 Cf., IMF Code of Good Practices on Fiscal Transparency, 2007, Revised Version.7 Cf., OECD Best Practices for Budget Transparency, 2002.

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consoante a sua fase de desenvolvimento: preparação, contratação e exe-cução de contrato.

Por outro lado, observa não terem sido efectuados quaisquer exercí-cios de contextualização e de comparação, estabelecendo, por exemplo, o peso dos encargos face a variáveis-chave como o PIB ou o seu cotejo com o apuramento dos encargos a preços constantes.

Outro aspecto limitativo, não negligenciável, decorre da ausência de explicação sobre a evolução anual da estimativa dos encargos com parcerias no Relatório dos sucessivos OE.

2.3. Contabilização dos Encargos com PPP’sO TC tem evidenciado que o registo dos encargos com as parcerias

em várias rubricas do OE e da Conta Geral do Estado (CGE) difi culta o apuramento dos encargos do Estado em termos objectivos. Daí a UTAO relevar a recomendação deste Tribunal no sentido de deverem passar a ser descritos num quadro tecnicamente adequado, tanto no OE, como na CGE8.

Com efeito, segundo o levantamento do TC no domínio das conces-sões rodoviárias e ferroviárias, a dispersão da contabilização de encargos tornara-se um aspecto crítico. Os encargos relativos a portagens virtuais eram contabilizados como despesa corrente numa rubrica de aquisição de serviços; os encargos resultantes de equilíbrios fi nanceiros eram levados a despesas de capital numa rubrica de transferências; os encargos com expro-priações corriam por uma rubrica de despesas de capital; e, no tocante a comparticipações ao investimento e a incentivos atribuídos às concessio-nárias, os encargos eram classifi cados em despesa corrente como subsídios.

3. Da Quantifi cação do Custo Financeiro das Concessões SCUT

3.1. Estimativa do Acréscimo de Custos Financeiros derivados das SCUT

Nesta primeira Nota Técnica, UTAO procurou também determinar em que medida a opção PPP nas SCUT veio gerar encargos fi nanceiros

8 Cf., TC Parecer sobre a Conta Geral do Estado, 2004.

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acrescidos para o erário público face à opção de montagem e fi nancia-mento tradicionais.

Assim, conduziu uma calculatória de nível agregado para o “porto-folio” das concessões SCUT, estimando que a opção PPP redundou num encargo líquido adicional para o sector público na ordem dos 3.6 milhões de euros (i.é., cerca de 2.2% do PIB de 2007).

Todavia, o exercício parte do principio de que as efi ciências pública e privada são idênticas, não diferenciando o perfi l de risco inerente às opções em confronto. Nestas condições, é natural não observar qualquer vantagem comparativa do envolvimento do sector privado, traduzível em ganhos de VfM para o erário público, constatando apenas o efeito do maior custo do fi nanciamento privado face ao endividamento público.

De facto, para que uma PPP a cargo do sector público obtenha VfM, é necessário que certos factores compensem o acréscimo de despesa pública resultante do incremento do custo do fi nanciamento privado: a optimização da afectação dos riscos do projecto; as sinergias resultantes da agregação de funções numa operação única, minimizando custos e maximizando benefícios na óptica de ciclo de vida do projecto; a inova-ção ao nível das soluções técnicas e de prestação do serviço por parte do parceiro privado; e, ainda, a intensifi cação da concorrência na transacção da parceria.

Nesta linha, o exercício do impacto fi nanceiro das SCUT conduzido pela UTAO não deixa de confi rmar, nas parcerias a cargo do Estado, a indispensabilidade de uma avaliação prévia diligente de cada projecto, tendo por base um Comparador Público (CP) credível9.

No caso vertente, impõe-se ainda notar que o modelo SCUT não representa o único modelo PPP para construir infra-estruturas rodoviá-rias com envolvimento fi nanceiro público10. Por outro lado, na medida

9 No que toca ao programa das concessões rodoviárias em modelo SCUT, é de referir que este foi lançado ainda na década de 90, ou seja, antes da adopção das dispo-sições orçamentais relativas a PPP’s consubstanciadas na LEO de 2001. Deste modo, a generalidade das concessões rodoviárias SCUT foram aprovadas sem uma aferição estruturada e comprovada de VfM assente na utilização de comparadores públicos tec-nicamente adequados.

10 Um modelo PPP alternativo ao uso de “portagens virtuais”, inerentes ao modelo SCUT, é aquele em que o mecanismo público de pagamento é desenhado em termos

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em que o modelo SCUT assenta em uma partilha de risco de procura, importa admitir que a transferência de parte deste risco para o operador privado haja tido como consequência o aumento do risco comercial do projecto e, bem assim, do custo do fi nanciamento privado.

Uma consideração que não é despicienda, reconduzindo-se à rele-vância da escolha do modelo de parceria mais consentâneo, em cada caso, com o interesse público e as vantagens na óptica das Finanças Públicas.

3.2. A Avaliação Prévia de Parcerias e o Uso de Comparadores Públicos

O Relatório da UTAO abordou também a necessidade da opção PPP ser fundamentada e a respectiva decisão pública requerer uma avaliação prévia em termos de demonstração de VfM11, fazendo-se eco da reco-mendação do TC sobre a importância das análises de VfM serem supor-tadas por CP’s12

A este propósito o TC assinalou que a utilização de CP’s não con-fi gura ainda uma prática corrente, nem a sua aplicação demonstra estar devidamente estruturada numa abordagem coerente e uniforme.

Nesta matéria é de salientar que continua a aguardar-se a publica-ção, por parte da célula PPP da Parpública, de orientações técnicas sobre a avaliação de VfM e a construção de CP’s apropriados13. Acresce que, ao contrário do que aparentemente a UTAO faz subentender, a existência de orientações metodológicas genéricas sobre esta temática não dispensa, quando se está perante uma parceria com envolvimento fi nanceiro ou a cargo do Estado, a construção de um CP adequado para efeitos da ava-

de pagamentos por disponibilidade e em que não se observa a transferência de risco de procura; outro esquema alternativo baseia-se na adopção de um modelo de portagem real em conjugação com uma participação fi nanceira pública limitada, a disponibilizar de acordo com o desempenho do parceiro privado em termos dos níveis de serviço.

11 Cf., Artº 19º da LEO e artº 6º do Decreto-Lei nº 86/2003.12 O primeiro exercício ofi cial de aferição de VfM com recurso a um comparador

público foi conduzido pela Estrutura de Missão Parcerias. Saúde, em 2003, no âmbito do lançamento do Hospital de Loures, em regime PPP, conforme registo do Relatório do OE – 2004. O cumprimento deste requisito, tornou-se prática corrente nas parcerias em saúde.

13 A emanação de orientações técnicas sobre VfM e CP’s é uma tarefa assegurada normalmente pelas unidades centrais PPP.

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liação do VfM de cada projecto e fundamentação da respectiva decisão pública.

4. Apontamento Final

A função de apoio técnico da UTAO à COF é fundamental em maté-rias complexas e de “expertise” multidisciplinar, como as PPP’s. Após esta primeira nota técnica, espera-se o seu aprofundamento e reporte em moldes sistemáticos, contribuindo regularmente com o seu valor acres-centado para enriquecer a abordagem PPP. Aliás, este contributo é par-ticularmente oportuno num momento em que, após a entrada em vigor do Código dos Contratos Públicos, se afi gura imprescindível revisitar a política PPP em sede legislativa.

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CONFERÊNCIA “CRISE, JUSTIÇA SOCIAL E FINANÇAS PÚBLICAS”

Nazaré Costa Cabral

No mês de Março passado, teve lugar na Faculdade de Direito de Lisboa, a Conferência “Crise, Justiça Social e Finanças Públicas”, promovida pelo Instituto de Direito Económico, Financeiro e Fiscal (IDEFF) daquela Faculdade. A Comissão Organizadora foi constituída por Eduardo Paz Ferreira, João Amaral Tomaz, José Gomes Santos e Nazaré da Costa Cabral. Esta iniciativa, que contou com a participação não apenas de diversos académicos e especialistas, nacionais e estran-geiros, nas áreas das fi nanças públicas, políticas sociais e fi scalidade, mas também de membros do Governo, constituiu uma oportunidade e um local habilitado para refl ectir sobre os problemas centrais colocados pela crise actual, seus efeitos e desafi os. Os diferentes painéis, modera-dos por jornalistas convidados para o efeito, traduziram a diversidade de pontos de vista, perspectivas e propostas de solução, a que se associou uma grande adesão e participação do público.

O objectivo da Conferência era o de permitir analisar as consequên-cias da actual crise sobre as fi nanças e políticas públicas e, ao mesmo tempo, proceder à identifi cação e crítica das medidas que os diversos paí-ses, designadamente os países europeus e os Estados Unidos, têm vindo a adoptar, desde que em 2007 surgiram as primeiras evidências de uma crise sectorial e localizada – a crise do “subprime”–, até à confi rmação da sua generalização e globalização, isto é, a sua afi rmação como crise económica e social à escala mundial.

No primeiro dia de Conferência, a abordagem centrou-se no impacto da crise sobre as fi nanças e políticas públicas, especialmente as políticas sociais. Nos três painéis, estiveram: 1.º painel, intitulado “Crise

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económica e políticas públicas”, Teresa Ter Minassian, José Silva Lopes, Eduardo Ferro Rodrigues, José Manuel Varejão, Paulo Moita de Macedo e, encerrando os trabalhos, o Ministro das Finanças e da Administra-ção Pública, Fernando Teixeira Santos; 2.º painel, intitulado “Exclusão e Pobreza, Segurança e Protecção Sociais”, Maria Manuela Silva, Gui-lherme d´Oliveira Martins, Vitor Bento e Carlos Farinha Rodrigues; 3.º painel, intitulado “Respostas públicas e privadas à Crise: o Papel dos Actores Sociais”, Edmundo Martinho, Nazaré da Costa Cabral, Acácio Catarino, Manuel Brandão Alves e, encerrando os trabalhos, o Minis-tro do Trabalho e da Solidariedade Social, José António Vieira da Silva.

No segundo dia de Conferência, os trabalhos versaram essencial-mente sobre o impacto da crise na fi scalidade e caracterização das princi-pais alterações de política fi scal em curso. Os três painéis contaram com as seguintes intervenções: o 1.º painel, intitulado “Medidas orçamentais e fi scais anti-crise”, de Dave Turner (OCDE), Teodora Cardoso, João Fer-reira do Amaral, João Amaral Tomaz e, encerrando os trabalhos, o Secre-tário de Estado Adjunto e do Orçamento, Emanuel Santos; o 2.º painel, denominado a “Erosão das bases tributárias”, de Diogo Leite Campos, António Carlos Santos, Rogério M. Fernandes Ferreira e Miguel Silva Pinto; o 3.º painel, intitulado “Novas áreas e modelos de tributação”, de António Martins, Manuel Freitas Pereira, Sérgio Vasques e José Xavier de Basto, sendo os trabalhos encerrados pelo Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Carlos Lobo.

A abrangência dos painéis e a profundidade no tratamento dos temas permitiu clarifi car a verdadeira dimensão da actual crise, a sua expressão económica e social e dar conta das mudanças de política que ela está a implicar. Pela sua expressividade e dimensão, esta coloca em causa solu-ções e políticas que até há pouco mais de um par de anos, a maioria dos teóricos e dos políticos consideravam certeiras. As crises em geral são inimigas dos dogmas e obrigam à redefi nição dos quadros mentais e fi lo-sófi cos. Como resultou claro das sucessivas intervenções nesta Confe-rência, a actual crise provoca já novas interrogações, tanto no campo da micro como da macroeconomia, mas que são também do foro ético: que racionalidade económica no funcionamento dos mercados efi cientes; que relação entre a economia “real” e a economia fi nanceira “especulativa”; o efeito, talvez contraproducente, da globalização sobre as relações comer-ciais entre os países e a tentação neo-proteccionista; a questão (moral) do

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“laissez-passer, laissez-cacher” dos capitais e dos patrimónios; a questão (moral) da sediação improdutiva, em territórios sem nação, de capitais e patrimónios (que é afi nal a questão da função económica do capital e do património); a questão da subsistência de recursos subaproveitados ou de factores subempregados, mormente nas economias mais desenvolvidas; a questão (moral) da persistência da pobreza, desde logo nestas mesmas economias desenvolvidas.

Associada a estes temas, surge invariavelmente a questão da reabili-tação do Estado – como se deu nota também na Conferência, proliferam análises económicas sobre as causas da crise, apontadas agora aos exa-geros do individualismo e ao enviesamento do liberalismo económico, dominantes desde a década de setenta. Em resposta e em síntese, surgirá um novo Estado, com missões renovadas, como garante dos direitos fun-damentais, como regulador e como agente económico – e esta síntese faz-nos recordar o sentido dialéctico (hegeliano) da evolução das ideias e do mundo. Chegados, na época actual, a um ponto de grande desenvol-vimento económico, de avanços magnífi cos na tecnologia e na ciência, subsistem mau grado, como mencionámos antes, fenómenos e situações moralmente inaceitáveis – que a crise patenteou ou acentuou. O Estado das últimas décadas, malquisto porque malfeitor, nada pôde contra eles. Valeria ainda a pena reler e recordar Hegel, quando reconduzia o Estado às ideias de eticidade (“die Sittlichkeit”) e de totalidade ética (“sittli-che totalität”). São hoje, certamente, ideias muito necessárias àquela reabilitação.

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REVISTA DE FINANÇAS PÚBLICAS E DIREITO FISCAL: PRIMEIRO ANIVERSÁRIO

Foi num ambiente de festa que se celebrou o primeiro aniversário da Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal. De primavera a prima-vera fi caram quatro números. Um ano de trabalho intenso e apaixonado, segundo Eduardo Paz Ferreira, director da Revista, que “concluímos com orgulho e com a convicção de termos cumprido as metas que tínha-mos traçado. Foi um ano de reforço do trabalho colectivo e de crescente participação na Revista”.

O director da Revista na sua intervenção nas comemorações que decorreram na Faculdade de Direito congratulou-se pela união em torno deste projecto, afi rmando: “É com enorme júbilo que vejo tantas caras que estiveram connosco o ano passado. Como então disse, para muitos, é o regresso à nossa comum alma mater. Alguns sentem-se mais próxi-mos outros menos. Mas recordamos todos a passagem por estes corredo-res, por estas salas de aulas e por estes espaços de convívio. Estudámos, discutimos ideias, confrontámos projectos, construímos amizades e hoje aqui estamos, de novo. Mas, como é óbvio, nem todos aqui estudaram. Nem todos por aqui passaram, mas nem por isso esta casa lhes pertence menos. A Faculdade de Direito de Lisboa é e será sempre, um espaço de todos os que prezam o conhecimento e valorizam a infl uência dos sabe-res na sedimentação da diversidade que nos caracteriza como indivíduos. A sua presença, que muito nos honra, é para nós evidência da contribui-ção da Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal para a construção do projecto de uma Universidade que se renova nos seus métodos e abre espaço para um relacionamento diferente com a comunidade em que se integra, ao serviço da comum ideia de desenvolvimento e modernidade”.

A capacidade de atracção da Revista viu-se pela adesão de novas pessoas a esta festa de aniversário.

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“O ambiente desta Primavera de 2009 é – claro está – bem diferente do da Primavera de 2008, ainda que já se anunciassem, então, tempos difíceis. Mas poder-se-á – uma vez que a música será essencial hoje – parafrasear a velha canção de Dinah Washington – What a Diference a Day Made – transpondo-a para outra envolvência, centrada na crise que entretanto se instalou e dizer: What a Diference a Year Made!”, comen-tou Eduardo Paz Ferreira, acrescentando: “Essa percepção determinou, aliás, a escolha do tema da conferência com que se iniciaram as come-morações deste aniversário da Revista - Crise, Justiça Social e Finanças Públicas em que académicos, estudiosos, profi ssionais das áreas mais contaminadas pela crise discutiram entre si e interpelaram responsáveis políticos sobre as respostas possíveis nos planos fi nanceiro, económico e social”.

“Vivemos tempos de grande turbulência, geradores de ansiedade e férteis em arautos da desgraça e mercadores da felicidade. Estes tempos convocam o melhor da nossa energia e da nossa coragem, a concentração na análise rigorosa da experiência passada e o abandono de posições de apatia ou pessimismo”, disse o director da Revista e recordou a confe-rência de Paulo Macedo nestas comemorações que citou Eistein: “Não pretendamos que as coisas mudem se fazemos sempre a mesma coisa. A crise é a maior benção que pode suceder a pessoas e países porque a crise traz progressos”.

“Falar de crise é promovê-la e calar a crise é exaltar o conformismo. Em vez disto trabalhemos duro. Acabemos de uma vez com a única crise ameaçadora que é a tragédia de não querer lutar para superá-la”. Por isso, com o aniversário da Revista de Finanças Públicas e Direito Fis-cal, promoveram-se dois dias de debates em torno da crise. Pois, como Eduardo Paz Ferreira concluiu na sua intervenção: “Voltamos à música para afi rmar, com a Elis Regina, a nossa convicção de que nada será como dantes. Mas está nas nossas mãos garantir que caminharemos no rumo certo. Como académicos, como cidadãos, interrogar, questionar, acompanhar, intervir. Se a crise actual põe em evidência os limites e difi culdades dos agentes económicos para conseguirem a maximização do bem-estar social sem uma presença efectiva do Estado, ela mostrou também a essencialidade de sociedades civis pujantes e empenhadas na construção de um presente e de um futuro mais justos”.

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A preocupação da Revista com a cultura, já demonstrada no lan-çamento do primeiro número em 2008, foi reiterada com o convite a Camané para actuar no auditório da Faculdade.

Camané e os seus colaboradores foram capazes de ir buscar às raí-zes populares as melhores tradições portuguesas – como fez Piazolla na Argentina, com o tango – e afi rmar a sua perenidade e capacidade de renovação.

“A Lisboa dos bairros populares das colectividades de recreio, das associações em que assentava a grande noite do fado, em que Camané se revelou há trinta anos já não existe. Uma Lisboa, mais moderna, mais rica talvez, mas seguramente mais desumana, tomou o seu lugar. A Lisboa que honra David Mourão Ferreira ou Francisco Salgado Zenha dando os seus nomes a ruas seguramente dignas, mas situadas em urbani-zações que não enriquecem a cidade, apenas conhecidas dos seus mora-dores. Já não é a Lisboa orgulhosa dos seus valores e tradições”, disse Paz Ferreira.

Mónica Velosa Ferreira, da Comissão de Redacção da Revista, na apresentação do concerto de Camané chamou a atenção para outros tra-balhos do fadista, “a participação no projecto os Humanos, onde com Manuela Azevedo e David Fonseca, vozes oriundas de estilos musicais muito diferentes, reconstruíram, para nosso grande prazer, o horizonte sonoro e as belas imagens de António Variações”, e recordou, também, a série de espectáculos no São Luiz com músicas de Jacques Brel, Sinatra, Tom Jobin, Chico Buarque, entre outros.

“Camané tem colaborado, aliás, de forma especialmente intensa, com José Mário Branco, nome maior da música de intervenção portu-guesa, sendo, capaz de seduzir para o fado músicas de áreas muito dife-rentes. Recorde-se, por exemplo, o extraordinário concerto no Centro Cultural de Belém, com Bernardo Sassetti e Mário Laginha” afi rmou Mónica Velosa Ferreira aplaudindo seguidamente o Fado trazido por Camané na passagem do primeiro ano de existência da revista de Finaças Públicas e Direito Fiscal.

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Crónica de Actualidade

IMIGRAÇÃO EM PORTUGAL E NOS ESTADOS UNIDOS

No âmbito da Cooperação entre a Faculdade de Direito de Lisboa e a Universidade Católica da América, teve lugar, no fi nal do mês de Março passado, em Washington, a oitava conferência sobre as leis portuguesa e norte-americana, consagrada, este ano, à imigração, que foi analisada em diversos ângulos desde as questões do asilo e do multiculturalismo, aos aspectos procedimentais e à mobilidade dos trabalhadores.

Na conferência participaram a professor Carla Amado Gomes, Dario Moura Vicente, António Pedro Barbas Homem e Eduardo Paz Ferreira.

A análise económica da emigração esteve a cargo do Director da Revista, que insistiu nos aspectos positivos da emigração quer no reforço da capacidade produtiva e criativa dos Estados de acolhimento, quer na ajuda à resolução dos problemas demográfi cos, quer nos seus efeitos sobra a segurança sócia, concluindo. “To sum up, I don’t think immi-gration is a phenomenon that can only be analysed from an economic point of view due to his moral and political implications, but I defend it’s mainly a positive phenomenon on the ground that can leave to a more correct distribution of populations and wealth. To the soundness of this reasoning is nevertheless essential that it’s a pure voluntary movement”.

Em Maio, o Presidente do IDEFF participou num colóquio em Paris, no Ministério do Orçamento, das contas públicas e da função publica, sobre o tema das fi nanças públicas face à crise, organizado pela FON-DAFIP, em que participaram, para além do Ministro e do Presidente do Tribunal de Contas francês, Michel Bouvier presidente da FONDAFIP e director da Revue Française des Finances Publiques e outros professores e altos funcionários franceses e anglo-saxónicos.

Em Junho, O IDEFF e a Revista de Finanças Públicas e Direito Fis-cal, organizaram, em colaboração com o Tribunal de Contas, a FONDA-

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

FIP e a Revue française de fi nances publiques, um colóquio evocativo dos 160 anos do tribunal sobre o tema da “nova governação fi nanceira pública: uma rersposta à crise económica”, que reuniu prestigiados espe-cialistas franceses e portugueses.

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ISABEL MARQUES DA SILVA NO STA

É com o maior orgulho que a Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal assinala a tomada de posse como conselheira do Supremo Tribunal Administrativo de Isabel Marques da Silva, docente do IDEFF, membro do Conselho de Redacção da Revista e uma das suas mais empenhadas colaboradoras.

Isabel Marques da Silva possui características pessoas e profi ssio-nais ímpares e é, pois, natural que expresse a minha profunda convicção de que o seu ingresso na magistratura administrativa e tributária constitui um reforço da maior qualidade e que seguramente contribuirá para traçar novos rumos à notável jurisprudência tributária, que se vem desenvol-vendo, conjugando criatividade com segurança e rigor técnico.

Logicamente, um universitário nunca pode ver com total tranquili-dade o risco de se perder um elemento com a qualidade de Isabel Mar-ques da Silva, mas o conhecimento que tenho do seu amor à investigação e às instituições onde tem leccionado levam-me a estar seguro de que a Universidade poderá continuar a contar com ela.

Depois de um longo período de divórcio, a Universidade e os tribu-nais têm-se aproximado crescentemente, quer através de acções conjun-tas, quer do doutoramento de um notável conjunto de magistrados num caminho que importa desenvolver.

A escolha de Isabel Marques da Silva para as suas novas e impor-tantes funções foi feita ao abrigo do novo Estatuto dos Tribunais Admi-nistrativos e Fiscais e, como afi rmou o Presidente do STA, conselheiro Bravo Serra, na cerimónia de posse, “ na selecção da Dr.ª Isabel Marques da Silva, o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais quis renovar a aposta, que sempre foi a sua, num Supremo Tribunal que é ponto cimeiro de convergência de vários saberes, experiências e pers-pectivas sobre o que é fazer-se justiça administrativa e fi scal ao mais alto

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

nível em Portugal, com correcção jurídica, com sensatez de solução, com tempestividade de resposta”.

Naturalmente que é de saudar vivamente uma tal orientação, bem como a abertura a uma geração jovem para a entrada numa magistratura suprema, mas tal opção fundamentou-se, no excepcional curriculum, devidamente salientado pelo Conselheiro Bravo Serra, que afi rmou, a este propósito, “falo-vos de mais de dez anos de actividade profi ssional rica em conhecimentos e experiências, que se desdobraram, primeiro, entre a investigação e a docência desde logo na Universidade Católica, sua instituição mãe, mas também noutras instituições de ensino supe-rior e organismos fi scais; depois numa carreira repartida por variados grupos de trabalho e comissões legislativas, para não falar já do tempo dedicado a obras jurídicas, numa produção doutrinária também ela de elevado valor”.

No belo discurso que proferiu na cerimónia de posse, perante uma vasta plateia de magistrados, amigos e colegas, impressiona. Sobrema-neira, a humildade e o reconhecimento com que evoca os seus professo-res e, especialmente, a memória de Sousa Franco.

A dado passo, Isabel Marques da Silva, afi rmou, “os meus pais ensinaram-me o valor do trabalho e da integridade. Pude sempre contar com o imenso amor e compreensão da minha família próxima e mais alargada. A vida deu-me um amor e muitos amigos. Tenho sido feliz”. Como é bom ouvir isto. Quem poderá abdicar “ex cuore” de lhe desejar que assim continue a ser para sempre.

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Crónica de Actualidade

SEMINÁRIOS DE DIREITO FISCAL EUROPEU E INTERNACIONAL & THE GREIT LISBOA SUMMER COURSE IN EUROPEAN TAX LAW

José Almeida Fernandes*

No decurso do ano de 2008 iniciou-se a organização de um conjunto de Seminários de Direito Fiscal Europeu e Internacional tendo em vista aprofundar o estudo destas aréas em Portugal, integrado num programa de desenvolvimento de estudos e investigação a cargo da Prof.ª Doutora Ana Paula Dourado e do Dr. José Almeida Fernandes.

A receptividade dos Seminários, a participação elevada e as interes-santes discussões suscitadas nos debates subsequentes às apresentações dos oradores e comentadores, permitiram fazer um balanço positivo da iniciativa. Razão pela qual, um novo ciclo de Seminários irá ser realizado no decurso de 2009, com regularidade mensal, e, novamente, contando entre nós com alguns dos mais reputados especialistas do Direito Fiscal Internacional e Europeu.

Igualmente, a recepção encorajadora dos nossos Seminários con-duziu, ainda, à opção pelo aprofundamento das iniciativas na área do Direito Fiscal Europeu com a criação do The GREIT Lisbon Summer Course on European Tax Law a realizar-se em Lisboa entre 13 e 17 de Julho de 2009, em organização conjunta do GREIT (Group for Research on European and International Taxation) e do IDEFF, o qual pretende posicionar-se como o Summer Course de referência de Direito Fiscal Comunitário a nível europeu, contando para o efeito com a participação dos mais eminentes académicos e profi ssionais.

* Adv LLM (Hons.) Leiden. Advogado.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

I. Seminários De Direito Fiscal Europeu E Internacional > 2009

A proposta dos Seminários é a de, com regularidade, convidar os mais reputados especialistas para apresentarem os seus trabalhos cientí-fi cos entre nós e, bem assim, um ou dois comentadores (discussants), de modo a activamente incitar uma discussão aprofundada dos principais temas em debate. Adicionalmente, também com o intuito de estimular o debate, os Seminários foram estruturados de forma a ser disponibili-zado, previamente, aos participantes um estudo ou artigo relativamente ao tema a abordar e, bem assim, documento de suporte à intervenção dos comentadores (discussants).

Os Seminários são destinados a um público especialista interes-sado na matéria (advogados, auditores, consultores, mestrandos, pós--graduandos), sendo de destacar ainda a participação de membros da Administração Fiscal e dos Tribunais Tributários e Administrativos e Fis-cais. Pretende-se instituir um verdadeiro debate entre especialistas, e não um modelo de aula ou prelecção por parte do orador convidado. Adicio-nalmente, um outro objectivo prende-se com a publicação dos estudos preparados para os Seminários em revistas da especialidade, o que igual-mente já ocorreu em 2008 com a publicação de alguns desses estudos na própria Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal e na revista Intertax .

Os Seminários que tiveram lugar no decurso de 2008, foram orga-nizados em conjunto com o Instituto de Direito Económico Financeiro e Fiscal (IDEFF) e o Centro de Investigação da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, contando, também, com o apoio do Grupo Por-tucel Soporcel. Este esforço conjunto permitiu, ao longo do ano, contar com a presença, entre nós, da Doutora Rita de La Feria (Universidade de Oxford), Dr. João Amaral Tomaz (ex-SEAF), do Doutor Alexander Rust (Universidade de Munique), do Mestre Ricardo Borges (Universidade de Lisboa), do Professor Dennis Weber (Universidade de Amesterdão), do Doutor Julian Ghosh (QC), do Prof. Dr. Malcolm Gammie (QC), a Prof. Ruth Mason (Universidade de Connecticut) e o Advogado-Geral Miguel Poiares Maduro (TJCE).

O balanço do ciclo de Seminários realizados em 2008 foi fran-camente positivo. Razão que conduziu ao desenvolvimento de esfor-ços para assegurar a sua continuação em 2009 com um novo ciclo e os mesmos padrões de qualidade e exigência, estando a sua organização a

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Crónica de Actualidade

cargo, em conjunto do IDEFF e o Centro de Investigação da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, contando, também, uma vez mais, com o continuado e generoso apoio do Grupo Portucel Soporcel.

O primeiro Seminário realizou-se já no dia 23 de Abril de 2009, dedicado ao tema “Casos Pendentes e Recentes do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias - Disparidades e Discriminação no Direito Fiscal Europeu” com apresentação pelo Prof. Frank Engelen (Universi-dade de Leiden). No dia 6 de Maio de 2009, os Seminários prosseguiram com uma sessão dedicada ao tema “União Europeia & Terceiros Estados: Acordos de Cooperação”, a qual contou com uma apresentação do Prof. Pasquale Pistone (Universidade de Salerno e WU Wien). No dia 7 de Maio de 2009, o último dos Seminários realizados até ao momento, foi desta feita subordinado ao tema “Tributação de Dividendos & Direito Fiscal Comunitário” e foi apresentado pelo Prof. Joachim Englisch (Uni-versidade de Augsburg).

No sentido de assegurar de forma regular a discussão e actualização permanente e contínua dos participantes sobre temas do Direito Fiscal Europeu e Internacional, os Seminários prosseguem já no próximo dia 19 de Junho de 2009 tendo como oradores o Doutor Julian Ghosh (QC) e o Mestre António Frada de Sousa (UCP – Porto), bem como o comen-tário do AG Miguel Poiares Maduro, o qual será dedicado ao tema do “Abuso de Direito no Direito Comunitário”, sendo também enquadrado nos Seminários conjuntos com o Prof. Dr. Luís Morais.

Seguidamente, os Seminários prosseguem em 22 de Setembro de 2009, com uma sessão dedicada à “Arbitragem nas Convenção Modelo da OCDE” a cargo do Prof. Roland Ismer (Universidade de Nuremberga).

Em 2 de Outubro de 2009 será a vez do Dr. Raffaele Russo (LLM Leiden/OCDE) apresentar um Seminário dedicado ao tema “Defi nições no Direito Fiscal Internacional: Sobreposições entre o Direito Fiscal Comunitário e o Direito Convencional”.

No dia 13 de Novembro de 2009, o Dr. Richard Lyal (Comissão Europeia) apresentará o tema “O Papel da Comissão Europeia no Con-tencioso junto do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias”.

Finalmente, em 11 de Dezembro de 2009, os Seminários concluem com um Seminário dedicado à “Convenção Modelo da OCDE: A Actua-lização de 2008” a cargo do Prof. Dr. Kees van Raad (Universidade de Leiden).

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

II. The Greit Lisbon Summer Course On European Tax Law

O GREIT (“Group for Research on European and International Taxation”) é uma rede de académicos especializados no Direito Fiscal Europeu e Internacional, criado com o objectivo de aprofundar o estudo dos temas centrais do Direito Fiscal Comunitário, nomeadamente a juris-prudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e do Tri-bunal da EFTA, o direito comunitário secundário em matéria fi scal e o respectivo soft law desta área.

O GREIT pretende desenvover pesquisa independente de investi-gação e contribuir para o desenvolvimento Direito Fiscal Internacional e Europeu na União Europeia. O GREIT foi fundado pelos seguintes aca-démicos: Prof. Dr. Cécile Brokelind (Universidade de Lund), Prof. Dr. Ana Paula Dourado (Universidade de Lisboa), Prof. Dr. Pasquale Pistone (Universidade de Salerno/WU Vienna) e Prof. Dr. Dennis Weber (Uni-versidade de Amsterdam).

O primeiro The GREIT Lisbon Summer Course on European Tax Law será dedicado a temas centrais da tributação na Europa, bem como a tópicos específi cos actualmente a serem debatidos quer ao nível aca-démico como profi ssional na União Europeia. O The GREIT Lisbon Sum-mer Course on European Tax Law será realizado em Lisboa, nas instala-ções da Faculdade de Direito de Lisboa entre os dias 13 e 17 de Julho de 2009. O curso está aberto a doutorandos, mestrandos, pós-graduandos, e a um público especialista interessado na matéria (advogados, auditores, consultores, etc), bem como a membros da Administração Fiscal e dos Tribunais Tributários e Administrativos e Fiscais.

O The GREIT Lisbon Summer Course está estruturado de forma a promover o debate entre os prelectores e participantes dos diferentes países, de modo a permitir a análise detalhadas da jurisprudência dos casos recente e pendente do TJCE também e tópicos específi cos (i.e., Transfronteiriça de Prejuízos Fiscal, Tributação não Discriminatória dos Dividendos na UE, Dedutibilidade de Juros, Obrigações de Retenção na Fonte e o Abuso de Direito). Acresce que o The GREIT Lisbon Summer Course incluirá também a análise de alguns case study, os quais visame permitir aos participantes explorar a interação do Direito Fiscal Comuni-tário e os seus respectivos sistemas fi scais nacionais.

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Crónica de Actualidade

Finalmente, o painel internacional de prelectores inclui reputados académicos e profi ssionais do Direito Fiscal Comunitário, a saber: o Prof. Dr. Frans Vanistendael (Universidade de Leuven), Prof. Dr. Cécile Brokelind (Universidade de Lund), Prof. Dr. Ana Paula Dourado (Univer-sidade de Lisboa), Prof. Dr. Pasquale Pistone (Universidade de Salerno/WU Vienna), Prof. Dr. Dennis Weber (Universidade de Amsterdam), Prof. Dr. Georg Kofl er (Universidade de Linz), Prof. Ruth Mason (Uni-versidade de Connecticut), Prof. Dr. Ekkehart Reimer (Universidade de. Heidelberg), Dr. Rita de La Feria (Universidade de Oxford), Dr. Mario Tenore (Universidade de Salerno/WU Vienna), José Almeida Fernandes (Adv. LLM Leiden/MLGTS) e o Mestre João Pedro Santos (Centro de Estudos Fiscais – Ministério das Finanças).

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Crónica de Actualidade

REVISTA DE DIREITO DAS SOCIEDADES

Eduardo Paz Ferreira

António Meneses Cordeiro é um nome maior da cultura jurídica portuguesa, autor de uma extensa obra que se estende por praticamente todos os domínios do direito privado, para além de valiosas incursões no direito público e na área jurídico-económica..Aos muitos serviços que a Faculdade de Direito de Lisboa e a comunidade jurídica em geral lhe devem junta-se, agora, a nova Revista de Direito das Sociedades, que vem colmatar uma importante falha no panorama editorial português.

Propriedade da Faculdade de Direito de Lisboa e editada pelo Insti-tuto de Direito das Sociedades, a nova revista propõe-se, além de publicar estudos originais sobre temas societários, relatar as alterações das leis, dar notícia das reformas em curso no Direito societário, comentando-as, reportar as decisões jurisprudenciais nesse domínio, analisando as mais signifi cativas e explicitando as grandes tendências, recensear as obras nacionais relevantes e, bem assim, dar conta das obras estrangeiras de maior peso.

Dirigida a um vasto público, em que incluem magistrados, advoga-dos generalistas ou de empresa, gestores, consultores, revisores ofi ciais de contas, auditores, fi scalistas, entre tantos mais, em que não podem ser omitidos os universitários e os estudantes de Direito, Gestão e Econo-mia, a nova revista vem satisfazer uma real necessidade no ordenamento nacional, contando com uma comissão de redacção que integra, além do Director, os Mestres Diogo Costa Gonçalves e Francisco Mendes Correia e a Dr.ª Ana Perestrelo de Oliveira, assistentes da Faculdade de Direito de Lisboa.

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Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal

O sumário do primeiro número ilustra os objectivos que a Revista se propõe atingir. No editorial, informa-se, em largos traços, os princi-pais indicadores do sector (número de sociedades, volume de negócios, etc.), a situação do Direito das sociedades (legiferação, jurisprudência e doutrina) e enunciam-se os objectivos da Revista.

Na secção de actualidade, o director da Revista desenvolve o tema “Uma nova reforma do Código das Sociedades Comerciais?”, concluindo no sentido da necessidade de, quanto antes, dar início a uma reforma glo-bal do Direito das sociedades, visando a sua simplifi cação radical.

Ainda da responsabilidade de Menezes Cordeiro, a mesma secção trata “A nacionalização do BPN”, tema de evidente actualidade, anali-sando a Lei n.º 62-A/2008, de 11 de Novembro, no quadro do regime jurídico das nacionalizações e da sua compatibilização com a Consti-tuição, pondo em relevo que, não obstante a sua natureza de excepção e anomalias que envolve, tanto a nacionalização em si, como o diploma que a acompanha, são enquadráveis no Direito português, resolvidas que sejam inconstitucionalidades pontuais.

Na secção de doutrina, Ana Perestrelo de Oliveira subscreve o estudo “Os credores e o governo societário: deveres de lealdade para os credores controladores?”; Ana Filipa Leal apresenta “Alguma notas sobre a parassocialidade no Direito português” e Miguel Brito Bastos, “As consequências da aquisição ilícita de acções próprias pelas socieda-des anónimas”.

Na secção de jurisprudência crítica, Menezes Cordeiro anota favo-ravelmente o Acórdão da Relação de Lisboa de 29/4/2008, sobre a cessa-ção de funções dos gerentes de sociedades por quotas.

A revista termina com secções de “breves recensões”, “nota biblio-gráfi ca” (monografi as e artigos, nacionais e estrangeiros) e “notícias”, em que dá conta da legislação publicada e em preparação e ainda deci-sões jurisprudenciais relevantes, com os respectivos sumários.

À nova publicação, ao seu Ilustre Director e Meu Caro Amigo, bem com ao brilhante grupo de colaboradores que reuniu em torno do pro-jecto, permito-me desejar as maiores felicidades, congratulando-me com mais esta iniciativa que confi rma a sua posição ímpar no panorama jurí-dico português.