A Indisciplina Em Contexto Escolar

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1 A INDISCIPLINA EM CONTEXTO ESCOLAR Apontamentos sobre a comunicação do Prof. Dr. Luís Picado 01-04-2010 – Agrupamento de Escolas de Darque Disciplina e Indisciplina A indisciplina é , sem dúvida, sintoma de desajuste social, pelo que requer uma gestão preventiva ao nível da construção identitária da personalidade, que está dependente da idade de cada um, principalmente no caso das crianças. A disciplina , pelo contrário, é um valor social importante, pelo que importa definir melhor este conceito. A palavra vem de “discere”, que pode ser entendido como apreender, ou aprendente; está portanto associada à vontade de aprender; na verdade, não há aprendizagem se não houver disciplina. A disciplina é, também, um compromisso que tem que englobar toda a comunidade escolar, na medida em que é condição fundamental para o sucesso do processo de ensino-aprendizagem. Reporta-se a comportamentos dos alunos durante as actividades pedagógicas, mas não só, também na sua relação com todo o contexto educativo, nomeadamente o patrimonial. Quem é indisciplinado é-o na maioria dos contextos, embora possa não o ser num ou noutro… A disciplina é então cidadania activa e tem objectivos claros do ponto de vista educativo : A curto prazo visa: Realizar tarefas de aprendizagem; Adquirir hábitos sociais adequados ao nível de desenvolvimento do aluno; Usar, de modo adequado, o material escolar. A longo prazo pretende: Desenvolver o auto-controle (a criança até aos 5 anos tem o cérebro como uma esponja; tudo o que vivencia passa a integrar a sua identidade. Por isso, é nessa altura da vida que se deve desenvolver a capacidade para a auto-regulação); Limitar a sua vontade; Desenvolver a responsabilidade pessoal (pois a disciplina que não é promotora de auto-controlo, não é promotora de responsabilidade); Adquirir hábitos de participação e cooperação. Fazer o que é necessário o melhor possível, mesmo que não apeteça – é uma característica das pessoas disciplinadas e profissionais. Uma pessoa disciplinada adquire hábitos de estudo e trabalho, sem os

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Apontamentos sobre a comunicação do Prof. Doutor Luís Picado

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A INDISCIPLINA EM CONTEXTO ESCOLAR

Apontamentos sobre a comunicação do Prof. Dr. Luís Picado

01-04-2010 – Agrupamento de Escolas de Darque

Disciplina e Indisciplina

A indisciplina é, sem dúvida, sintoma de desajuste social, pelo que requer uma gestão preventiva ao

nível da construção identitária da personalidade, que está dependente da idade de cada um,

principalmente no caso das crianças.

A disciplina, pelo contrário, é um valor social importante, pelo que importa definir melhor este

conceito. A palavra vem de “discere”, que pode ser entendido como apreender, ou aprendente; está

portanto associada à vontade de aprender; na verdade, não há aprendizagem se não houver disciplina.

A disciplina é, também, um compromisso que tem que englobar toda a comunidade escolar, na

medida em que é condição fundamental para o sucesso do processo de ensino-aprendizagem.

Reporta-se a comportamentos dos alunos durante as actividades pedagógicas, mas não só, também

na sua relação com todo o contexto educativo, nomeadamente o patrimonial.

Quem é indisciplinado é-o na maioria dos contextos, embora possa não o ser num ou noutro…

A disciplina é então cidadania activa e tem objectivos claros do ponto de vista educativo:

A curto prazo visa:

• Realizar tarefas de aprendizagem;

• Adquirir hábitos sociais adequados ao nível de desenvolvimento do aluno;

• Usar, de modo adequado, o material escolar.

A longo prazo pretende:

• Desenvolver o auto-controle (a criança até aos 5 anos tem o cérebro como uma esponja; tudo o

que vivencia passa a integrar a sua identidade. Por isso, é nessa altura da vida que se deve desenvolver a

capacidade para a auto-regulação);

• Limitar a sua vontade;

• Desenvolver a responsabilidade pessoal (pois a disciplina que não é promotora de auto-controlo,

não é promotora de responsabilidade);

• Adquirir hábitos de participação e cooperação.

Fazer o que é necessário o melhor possível, mesmo que não apeteça – é uma característica das

pessoas disciplinadas e profissionais. Uma pessoa disciplinada adquire hábitos de estudo e trabalho, sem os

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quais nunca se comprometerá com um projecto nem terá sucesso no trabalho. Terá que adquirir auto-

disciplina, como forma de limitar a sua vontade, para atingir o caminho da liberdade.

A última instância da disciplina é a dispensa do professor, é a liberdade. Do constrangimento

imposto, ao auto-constrangimento.

A indisciplina é um comportamento que viola os hábitos sociais estabelecidos e que perturba:

• A comunicação;

• O rendimento (do estudante e do professor);

• As relações humanas

Factores associados à indisciplina, identificados por docentes e corroborados pelas investigações: são

problemas ou soluções?

• As famílias

A família é construtora de modelos de comportamento?

Há discrepâncias entre as expectativas, normas e regras de funcionamento da família e da

escola?

Há diferenças assinaláveis entre códigos de valores do meio social e da escola?

• Os alunos

Há problemas de saúde mental ao nível dos alunos? (por ex. estes não terem construído

hábitos sociais adequados)

Há características da personalidade (auto-conceito, auto-estima, auto-controlo) que

predispõem para a indisciplina?

Há dificuldades ao nível do grupo de pares? Maior socialização por pares do que por acção de

professores, por ex.)

• A escola – Ministério da Educação

Políticas, Programas e Regulamentos disciplinares;

Locais de implementação das escolas;

Equipas escolares – há cultura de diálogo entre professores?

Os professores actualmente têm de responder a desafios constantes, exigentes e permanentes;

o stress docente – prazos apertados, o trabalhar “a toque de caixa”…

• Os professores

Há falta de capacidade para motivar os alunos com técnicas e métodos adequados?

Há impreparação para lidar com situações de conflito?

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É muito importante, ao nível da formação inicial de docentes, o choque com a perspectiva da

indisciplina, antes do choque com a realidade da indisciplina, para se aprender a lidar com

estes problemas de forma eficaz.

• Sociedade

Predominam os modelos de violência?

A sociedade é uma sociedade orientada para o prazer – gratificação imediata?

Há grupos sociais problemáticos?

Gestão e Intervenção Disciplinar

O sucesso em lidar com a indisciplina resultará numa focagem na promoção do envolvimento com a

escola e não somente numa orientação exclusiva no controlo da disciplina; assim, antes de chamar os pais à

escola por motivos de indisciplina, dever-se-á:

• Envolver os pais na dinâmica da escola;

• Criar uma “zona de conforto” entre a escola e a família.

Programas de combate à indisciplina:

• Dimensão preventiva

Visa reduzir os factores de risco;

A directriz disciplinar de base preventiva é o melhor recurso que uma escola pode ter;

Um compromisso escrito, legitimado por docentes, AAE, representantes de alunos, de EE e com

visibilidade ao nível do Projecto Curricular de turma e do Projecto Educativo.

• Promoção de um ambiente escolar humanista

Linhas estratégicas e actividades práticas que cultivem o diálogo e a afectividade humana

(abordar temáticas como o bullying, as etnias, os direitos humanos…)

• Inclusão social

Do comum para o diferente; Inversão do slogan: “Todos iguais, todos diferentes”, pois afinal

somos mais iguais do que diferentes.

• Uma direcção da escola visível e encorajadora de docentes, AAE, alunos…

• Estreitas relações entre a escola e a comunidade

A escola deve estar preparada para lidar com a indisciplina.

• Grupos de professores com cultura de partilha e diálogo – zona de conforto.

Actuação face à indisciplina

O professor tem a responsabilidade de geria a aula mas não tem culpa das situações de indisciplina.

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O Semáforo da Indisciplina:

Verde – resolução do problema no contexto.

Amarelo – Regulação emocional por parte do professor (pode ou não resolver o problema).

Vermelho – negação e evitamento (não resolvem os problemas de indisciplina).

Modelo Desenvolvimentista para situações disciplinares

(Com crianças pequenas o modelo desenvolvimentista só deve ser utilizado de forma preventiva).

Integra os contributos de Piaget, no que se refere à aprendizagem, e de Kohlberg, no que diz respeito

ao desenvolvimento moral, do qual se destacam apenas e sumariamente 3 estádios:

1. Pré-convencional – até aos 5 anos – a criança age de acordo ou conforme a retribuição

2. Convencional – dos 6 anos em diante - actuação para reconhecimento pelos pares

3. Pós-convencional – 20-25 anos - age assim porque é ético, por altruísmo, porque gosta de fazer o

bem.

Estádio 1 – 3 / 4 anos Positivo Negativo

Utilização de meios físicos Exclusão temporária Fechar a criança

Obediência devido á

desigualdade de poder

Segurar os braços (controlar

a birra)

Bater

Eficaz a curto prazo Aproximar-se, ficar junto da

criança

Gritar

Estádio 2 – 5 / 9 anos Positivo Negativo

Consequências dos

comportamentos

Princípio de Premack

(enunciado por D. Premak, é um

princípio da psicologia e afirma

que as actividades mais

desejadas podem servir como

reforços para actividades menos

desejadas; os reforços podem

variar de um sujeito para outro

e depender de situações

específicas)

Uso excessivo de punição

Globalmente eficaz a curto

prazo, enquanto o reforço

está em vigor

Reforços de Skinner (Para B. F.

Skinner, o comportamento pode

ser modelado através da

administração de reforços

positivos e negativos, o que

implica também numa relação

causal entre reforço (causa) e

comportamento (efeito)

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O uso do reforço em crianças dos 5 aos 9 anos:

• Usar imediatamente a seguir ao comportamento que se quer melhorar (aqui e a gora, que seja

relevante já)

• Ser criativo nos reforços utilizados , para evitar a saturação (dar algo mais, as crianças nesta fase

são interesseiras, têm pensamento menos abstracto)

• Usar reforços naturais – oportunidades de brincar são mais positivas do que doces, por exemplo –

como fizeste isto, tens direito a isto – levar a criança a entender a relação entre o seus comportamento e as

suas consequências.

• Quando as crianças começam a corresponder ao comportamento desejado, baixar a frequência

dos reforços.

• Punições – evitar críticas ou lições de moral em público; excluir do grupo não resolve o problema

da criança, apenas o do grupo; ao contactar os EE ter em conta que os pais e os professores vêem as

crianças sob pontos de vista diferentes.

Maria Jesus Rocha Costa de Sousa

Educadora de Infância