A Indústria Brasileira de Medicamentos e a Associação...

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Associação Brasileira de Cristalografia A Indústria Brasileira de Medicamentos e a Associação Brasileira de Cristalografia: uma Proposta de Colaboração Maio de 2008 Diretoria da ABCr: Presidente: Nivaldo Lúcio Speziali. Vice-Presidente: Irineu Mazzaro. Secretário Geral: Márcia Carvalho de Abreu Fantini. Secretário: Luis Gallego Martinez. Tesoureiro: João Alexandre Ribeiro Gonçalves Barbosa. Secretário para Assuntos de Ensino: Javier Alcides Ellena. Colaboradores na elaboração da proposta Carlos de Oliveira Paiva Santos Fabio Furlan Ferreira Javier Alcides Ellena Nivaldo Lúcio Speziali

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Associação Brasileira de Cristalografia

A Indústria Brasileira de Medicamentos e

a Associação Brasileira de Cristalografia:

uma Proposta de Colaboração

Maio de 2008 Diretoria da ABCr:

Presidente: Nivaldo Lúcio Speziali.

Vice-Presidente: Irineu Mazzaro.

Secretário Geral: Márcia Carvalho de Abreu Fantini.

Secretário: Luis Gallego Martinez.

Tesoureiro: João Alexandre Ribeiro Gonçalves Barbosa.

Secretário para Assuntos de Ensino: Javier Alcides Ellena.

Colaboradores na elaboração da proposta

Carlos de Oliveira Paiva Santos

Fabio Furlan Ferreira

Javier Alcides Ellena

Nivaldo Lúcio Speziali

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1. Introdução

A Associação Brasileira de Cristalografia – ABCr – foi fundada em 1971 e tem por

finalidade “promover o desenvolvimento da Cristalografia no Brasil nos seus diversos setores

básicos, tecnológicos e na formação de recursos humanos em todos os níveis”. Desde a sua

fundação, a ABCr tem contribuído, direta e indiretamente, para o desenvolvimento científico e

social do país.

A recente notícia do acordo entre os governos brasileiro e argentino para a criação de

uma indústria farmacêutica que viesse abastecer a população mais carente, sensibilizou a

comunidade dos cristalógrafos. Tal acordo abre a possibilidade de a Associação poder emprestar

recursos humanos e laboratoriais para auxiliar o Governo Brasileiro na empreitada de melhoria

da saúde pública e do bem estar da população. Também, a notícia de que o BNDES está

articulando a criação de uma super-empresa brasileira de medicamentos, é mais uma motivação

para se oferecer o conhecimento brasileiro de cristalografia nessa área de fármacos com o fim de

permitir a obtenção de medicamentos de alta qualidade para nossa população.

O presente texto tem o objetivo de apresentar algumas áreas onde a ABCr, através de

seus associados, pode contribuir de maneira significativa nessa empreitada. São fornecidas

algumas informações sobre a necessidade da caracterização de polimorfos de princípios ativos

para desenvolvimento de medicamentos sólidos e controle da formulação dos comprimidos

sólidos convencionais, assim como em medicamentos suportados em matrizes poliméricas que

permitem a liberação controlada de drogas no organismo humano. É feita uma descrição sobre

polimorfismo e como ele tem sido tratado no Brasil, assim como um exemplo para mostrar as

alterações nas atividades dos medicamentos quando um polimorfo inadequado é usado.

Comenta-se sobre as técnicas de caracterização e sobre como a difração de raios X e a

cristalografia se encaixam como ferramentas complementares e fundamentais. No final

apresentam-se formas pelas quais a comunidade de cristalógrafos brasileiros poderia contribuir

com a indústria farmacêutica, tanto disponibilizando recursos físicos quanto humanos.

1.1 Sólidos farmacêuticos e o polimorfismo

Medicamento genérico é aquele que contém o mesmo princípio ativo - na mesma dose e

forma farmacêutica - de um medicamento de referência, é administrado pela mesma via e tem

indicação idêntica. É tão seguro e eficaz quanto o medicamento de referência (também chamado

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de medicamento original ou de marca), mas em geral tem um menor custo tendo em vista que a

patente está em domínio público.

A partir do dia 10 de fevereiro de 1999, com a Lei n° 9.787

(http://www.anvisa.gov.br/hotsite/genericos/legis/leis/9787.htm), estabeleceram-se as bases

legais para os medicamentos genéricos e definiram-se as atribuições de poderes da ANVISA

(Agência Nacional de Vigilância Sanitária), para regulamentação das condições de registro e

controle de qualidade. Até então, não existiam medicamentos genéricos no país, só

medicamentos de marca e os similares, sendo que estes últimos utilizavam a denominação

genérica. Os genéricos devem possuir a mesma qualidade dos medicamentos de referência, visto

que são realizados testes de equivalência farmacêutica e terapêutica, de biodisponibilidade e

bioequivalência, previamente à concessão do registro pela ANVISA. O responsável pela garantia

da qualidade do medicamento é o fabricante. Compete a ANVISA monitorar a qualidade

assegurada pelo fabricante e as condições de bioequivalência, através de inspeções sanitárias

sistemáticas.

Compostos farmacêuticos podem existir em diferentes formas sólidas as quais podem

apresentar diferentes propriedades físicas e químicas. Estas distintas formas sólidas incluem

polimorfos, que são compostos com mesma fórmula química mas diferente estrutura cristalina.

Surpreendentemente, um grande número de fármacos exibe o fenômeno do polimorfismo. Por

exemplo, 70% dos barbituratos, 60% dos sulfonamidas e 23% dos esteróides apresentam

polimorfismos [1].

Além das inúmeras propriedades físicas e químicas afetadas pelo polimorfismo nos

sólidos, a possibilidade de manipulação da bioeficácia dos fármacos por meio do polimorfismo,

oferece aos cientistas farmacêuticos oportunidades interessantes, principalmente, no que diz

respeito ao desenvolvimento de novos fármacos. O polimorfismo tem contribuído

significativamente para a variabilidade em produtos com desempenho na indústria farmacêutica,

e ainda continua como um desafio para os cientistas da área em produzir medicamentos de

qualidade consistente.

Entretanto, é possível que um sólido farmacêutico responsável pela atividade desejada em

sua forma polimórfica, quando cristalizado em outra forma polimórfica, apresente menor

atividade, ou até mesmo ausência de atividade devido a sua menor solubilidade. Ou ainda possa

ser tóxico, devido à solubilidade do polimorfo específico estar acima do especificado para o

polimorfo adequado.

No que diz respeito ao desenvolvimento de um novo fármaco (NDA – New Drug

Application) e o seu lançamento no mercado, um aspecto fundamental é a aquisição de

informações sobre a existência de formas sólidas e sua relevância para a qualidade e desempenho

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do mesmo. As diferentes propriedades, particularmente a bioeficácia, e a concernência da

qualidade do produto relativo à segurança humana, são princípios fundamentais a serem

considerados de acordo com as diretrizes da ICH – Q6A (sigla inglesa para International

Conference Harmonization) e da FDA (sigla inglesa para Food and Drug Administration –

USA). Daí surge o interesse em regulamentar as etapas dos processos envolvidos no

desenvolvimento e produção do fármaco para que o produto possa ser aprovado. Estas normas de

procedimentos acenam para o controle da forma cristalina do fármaco, com ênfase significativa

na caracterização e controle das formas sólidas em todo o processamento e na utilização do

medicamento. A legislação brasileira segue as tendências internacionais, e de acordo com a

Resolução RDC n° 135 (http://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2003/rdc/135_03rdc.htm), de 29 de

maio de 2003, que regulariza aspectos relacionados aos medicamentos genéricos, a produção de

medicamentos deve ser acompanhada por ensaios de bioequivalência farmacêutica e apresentar

perfis de liberação dos fármacos compatíveis aos dos medicamentos de referência. Outra

abordagem existente nesta normativa e que merece destaque é que devem existir dados relativos

à existência de polimorfos e técnicas validadas para análise e detecção de diferentes formas

cristalinas em sólidos destinados à formulação de um medicamento, o que exige das indústrias

farmacêuticas investimentos em pesquisas abrangentes sobre os fármacos no estado sólido.

A partir de 2007, os medicamentos genéricos [2] e os medicamentos similares [3], no

momento do registro ou na renovação (pós-registro), ficam obrigados a informar se os fármacos

apresentam polimorfos, descrever o método analítico adotado e resultados dos testes de

determinação dos prováveis polimorfos.

1.2 Técnicas de caracterização de sólidos farmacêuticos

Quanto à caracterização do polimorfismo em sólidos farmacêuticos existem alguns

métodos que são freqüentemente empregados [4], como as técnicas de microscopia, de análises

térmicas (DSC e TG), de espectroscopias (de infravermelho – IR–, Raman, e ressonância

magnética nuclear – RNM) e difração de raios X (DRX).

Uma das técnicas mais apropriadas para diferenciar formas polimórficas é a técnica de

DRX por pó e monocristal. A análise dos difratogramas obtidos nos experimentos de DRX

permite distinguir, com exatidão, os diferentes arranjos dos átomos nos sólidos. Por meio da

DRX de monocristal é possível determinar a estrutura de pequenas moléculas em um cristal,

fornecendo uma informação essencial sobre o sólido polimórfico, uma vez que o critério que

define a existência do polimorfismo é a demonstração de estruturas não equivalentes nas redes

cristalinas. Um fator limitante desta técnica é a necessidade de amostra em forma monocristalina

adequada. A DRX por pó é outra poderosa técnica apropriada para distinguir fases cristalinas

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com diferentes propriedades estruturais. Diferente da DRX por monocristal, a amostra se

apresenta na forma de pó, o qual não passa de monocristais pulverizados. Em alguns casos é

possível determinar parâmetros da cela unitária e grupo espacial bem como a estrutura molecular

[5]. A DRX por pó também pode ser usada para determinação do grau de cristalinidade, análise

quantitativa das fases nos sólidos polimórficos, determinação da forma e tamanho de cristalito e,

com base nos resultados, estudar a cinética das reações no estado sólido, etc [6,7].

1.3 Polimorfismo em sólidos farmacêuticos: exemplos clássicos

O palmitato de cloranfenicol (PCA) e o ritonavir são exemplos clássicos de como o

polimorfismo pode influenciar nas propriedades do medicamento. A forma metaestável do PCA,

forma polimórfica B, tem uma bioatividade oito vezes maior que a forma polimórfica A, e se

administrada em humanos pode causar efeitos adversos como aplasia medular [8]. O ritonavir,

durante o seu desenvolvimento e a prematura fabricação, parecia existir somente em uma fase

monoclínica [9]. Esta forma, conhecida agora como forma I, não foi suficientemente bioeficaz

quando administrada oralmente na forma sólida, requerendo que o produto (Norvir®) fosse

formulado em uma cápsula contendo o fármaco dissolvido em uma solução hidro-alcoólica. Dois

anos após o lançamento, vários lotes de cápsulas de Norvir® começaram a falhar nas

especificações de dissolução. A avaliação dos lotes que apresentavam falhas revelou que uma

segunda forma cristalina do ritonavir (forma II) havia precipitado. Após todo o esforço e tempo

gastos para identificar o problema, este lote, contendo a forma II, 50% menos solúvel que a

forma I, foi afastada do mercado.

Esse exemplo mostra bem como uma inadvertida produção de uma forma polimórfica

inadequada formada tanto no estágio de cristalização quanto por meio de qualquer transformação

de uma forma numa outra, durante o processamento (secagem, moagem, granulação,

compressão, secagem por pulverização, solidificação por resfriamento, etc.) [10] e estocagem,

pode resultar em dosagens farmacêuticas que são ineficazes ou mesmo tóxicas. Uma vez

conhecidas as diferentes formas que um fármaco pode apresentar, eventuais casos de ineficiência

terapêutica, como ocorrido com o ritonavir, certamente seriam evitados ou facilmente

reconhecidos.

1.4 Propriedade Intelectual e o Polimorfismo

Uma nova forma polimórfica pode ser considerada uma invenção, e se tiver uma

significativa aplicabilidade industrial poderá ser patenteada, a exemplo do que ocorreu com a

ranitidina, ritonavir, ampicilina, palmitato de cloranfenicol, celecoxib, novobiocina,

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griseofulvina, indometacina, etc. As formas sólidas que mostram vantagens adicionais, em

termos das propriedades físico-técnicas e físico-químicas, e apresentem realce na bioeficácia,

podem ser entendidas como um novo fármaco.

As pesquisas envolvendo a descoberta de novas formas cristalinas de fármacos são

importantes para o processo de patentes, ajudando companhias inovadoras a manter a

propriedade intelectual de uma substância. Existem numerosos exemplos onde companhias

inovadoras adquiriram patentes sobre uma particular forma polimórfica, que se estenderam além

da expiração da patente da molécula básica. Em detrimento disto, há uma grande preocupação da

indústria farmacêutica em exaurir todas as possibilidades de polimorfos de uma dada substância

e, assim, patentear todos os polimorfos possíveis de maneira a proteger o seu produto. Sabe-se

que, pelas leis de patentes atuais, é considerado como nova patente qualquer fármaco que

apresente uma nova forma polimórfica ou esteja co-cristalizado com outra substância. Para a

indústria farmacêutica detentora da patente de um princípio ativo, isso pode significar um

prejuízo enorme caso o novo polimorfo mostre biodisponibilidade equivalente ao(s) polimorfo(s)

original(is) de sua patente. Portanto, isso abre uma nova vertente para os pesquisadores da área

farmacêutica: a busca por um polimorfo ou co-cristal de fármacos já conhecidos, apresentando

bioequivalência farmacêutica ou até mesmo promovendo as características farmacocinéticas em

relação aos polimorfos conhecidos.

2. JUSTIFICATIVAS

Atualmente, o polimorfismo em fármacos é, sem dúvida, uma das linhas de pesquisa

mais contempladas da área de ciências farmacêuticas, devido à relevância não apenas

econômica, mas, principalmente, farmacológica e toxicológica. No Brasil, o problema do

polimorfismo ganha um novo contexto devido às políticas que o governo brasileiro tem adotado

com relação aos medicamentos genéricos e a quebra das patentes dos medicamentos anti-

retrovirais para o tratamento da AIDS.

Uma das preocupações mais importantes dos últimos anos das autoridades sanitárias

brasileiras tem sido o controle dos medicamentos genéricos principalmente relacionados à sua

bioequivalência relativamente ao produto de referência que permita assegurar a qualidade do

mesmo. O país apresenta uma problemática com relação ao controle de qualidade das matérias-

primas e insumos importados; uma vez que, apesar de sua pureza química ser aceitável,

freqüentemente apresentam alta variabilidade em suas características de estado sólido

(polimorfismos, tamanho de partículas, hábitos cristalinos, entre outros). Estes fatores, por sua

vez, afetam principalmente as drogas pouco solúveis que, submetidas a formulações

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farmacêuticas sólidas, apresentam diferentes velocidades de solubilização in vivo, o que,

conseqüentemente, afeta sua biodisponibilidade e bioequivalência. Devido a estes fatores, pode-

se concluir que as características estruturais e morfológicas de estado sólido dos fármacos pouco

solúveis e de alto risco terapêutico afetam fortemente a qualidade dos medicamentos.

Estes problemas se apresentam em fármacos com diversas ações terapêuticas, sendo

atualmente mais importantes e interessantes aqueles de alto risco terapêutico e, em particular, os

anti-retrovirais. Cabe mencionar que estes últimos, em sua maioria, não estão ainda codificados

em farmacopéias internacionais nem estão disponíveis seus respectivos padrões para utilização

como “referência” para o controle de qualidade de matérias-primas ou de produtos acabados.

Por tudo o que foi exposto, pode-se concluir que é relevante para a área da saúde em

geral e de interesse para o país somar esforços para aproveitar as facilidades e ¨know how¨

existentes no país para melhorar os vários pontos importantes neste tema tais como a

classificação e controle de qualidade dos ingredientes ativos, o controle dos processos de

classificação, o controle sanitário dos medicamentos já existentes nas prateleiras, bem como o

desenvolvimento de padrões de maneira a facilitar estes controles, reduzir os custos, etc. Dessa

forma, pode-se perceber a grande importância da caracterização dos polimorfos, tanto dos

fármacos quanto dos excipientes usados na preparação dos comprimidos. Além da caracterização

estrutural, a caracterização física e morfológica dos compostos também é relevante, para atender

adequadamente a formulação proposta.

Lembrando-se ainda que os genéricos são os medicamentos de uso privilegiado para as

camadas de baixa renda da população, pode-se afirmar que a ABCr tem como oferecer uma

contribuição também de cunho social para o país.

3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1] Chawla, G. & Bansal, K. A. CRIPS 5, 9, 2004.

[2] Brasil. RDC no 16 de 02 de março de 2007. Aprova regulamento técnico para medicamento

genérico. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, 05 de mar. de 2007a.

[3] Brasil. RDC no 17 de 02 de março de 2007. Dispõe sobre registro de medicamento similar e

dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, 05 de mar. de

2007b.

[4] Raw, A. S. et al. Adv. Drug Deliv. Rev. 56, 397, 2004.

[5] Stephenson, G. A. J. Pharm. Sci. 89, 958, 2000.

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[6] Yu, L. X. et al. Pharm. Res. 20, 531, 2003.

[7] Paiva-Santos, C. O.; Gouveia, H.; Las, W. C.; Varela, J. A.”Gauss-Lorentz Size-Strain

Broadenning and Cell Parameters Analysis of Mn Doped SnO2 Prepared by Organic Route”.

MATERIALS STRUCTURE in Chemistry, Biology, Physics and Technology. Vol.6, no 2, 111-

114 (1999). http://www.xray.cz/ms/bul99-2/santos.pdf. ISSN 1211-5894

[8] Haleblian, J. et al. J. Pharm. Sci. 64, 1269, 1975.

[9] Morissette, S. L. et al. PNAS 100, 2180, 2003.

[10] Brittain, H. G. et al. J. Pharm. Sci. 91, 1573, 2002.

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ANEXO

I- Relação de grupos de pesquisa que trabalham com cristalografia estrutural

1. Grupo de Cristalografia de Pequenas Moléculas do Instituto de Física de São Carlos – SP,

SP. (http://www.ifsc.usp.br/~cristalografia/)

2. Grupo de Química do Estado Sólido da Universidade Federal de Alfenas, MG.

(http://www.unifal-mg.edu.br/website/ensino/pos-graduacao/posgraduacao.asp)

3. Laboratório Computacional em Análises Cristalográficas e Cristalinas do Laboratório

Interdisciplinar em Cerâmicas, Instituto de Química, UNESP, Araraquara, SP.

(http://labcacc.iq.unesp.br/)

4. Laboratório de Cristalografia da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte,

MG (http://www.fisica.ufmg.br/~cristal/)

5. Departamento de Química Universidade Federal de Maceió, AL.

6. Grupo de Cristalografia e Materiais da Universidade Federal de Goiás.

(http://www.if.ufg.br/05_06.html)

7. Laboratório de Cristalografia, Instituto de Física da USP, SP.

(http://www.if.usp.br/cristal/)

Como exemplos de trabalhos de pesquisa que vêm sendo desenvolvidos recentemente por

alguns dos grupos mencionados acima, podemos citar a caracterização estrutural de polimorfos

de fármacos por meio de medidas de difração de raios X de alta resolução em policristais e do

método de Rietveld, combinando análises quantitativas de fases e indexação de novos

polimorfos.

Outros grupos utilizam a difração de raios X em monocristais como ferramenta principal na

determinação de estruturas cristalinas.

Vários trabalhos decorrentes destas pesquisas têm sido apresentados em reuniões científicas

nacionais e internacionais, resultando em publicações de trabalhos completos em periódicos

científicos internacionais indexados.

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II – Eventos relacionados ao tema

Para tratar especificamente deste problema tão importante de saúde pública que atinge o

Brasil, o professor Dr. Javier Ellena (e-mail: [email protected], tel.: (16) 3373-8096, fax: (16)

3373-9881) organizou, juntamente com o professor Alejandro Pedro Ayala do Depto. de Física

da UFC, o “I Simpósio Latino-Americano de Polimorfismo e Cristalização em Fármacos e

Medicamentos” na cidade de Fortaleza, Ceará, entre os dias 30 de setembro e 02 de outubro de

2007 (http://www.fisica.ufc.br/lapolc/index-br.html). O objetivo deste simpósio foi o de

estabelecer um foro de discussão multidisciplinar para profissionais latino-americanos

vinculados às instituições de pesquisa acadêmicas, laboratórios governamentais, indústria

farmacêutica e agências reguladoras que atuam nas áreas de Pesquisa e Desenvolvimento,

Formulação de Produtos, Controle de Qualidade, Novos Produtos e Processos, e afins. Nele

foram realizados um mini-curso, várias palestras, painéis e foros de debates e intercâmbio de

informações. O mencionado simpósio contou com a participação de mais de 180 pessoas tanto da

área acadêmica como mais de 10 de empresas do setor farmacêutico do Brasil e do exterior, além

de órgãos oficiais tais como a ANVISA, o INPI e o INMETRO. Alguns dos temas abordados

neste simpósio foram:

• Polimorfismo em Fármacos

• Cristalização

• Equivalência Farmacêutica • Biodisponibilidade

• Caracterização de Formas Sólidas

• Propriedade Intelectual

• Legislação • Inefetividade Terapêutica e Farmacovigilância

Cabe aqui destacar a solicitude do INPI para que

o evento fosse filmado com o intuito de que os

resultados do mesmo servissem de base para o estabelecimento de normas nacionais para o

patenteamento de polimorfos. Dada a ampla repercussão do evento e a urgência que deve ser

dada ao tratamento deste tema, os representantes dos órgãos do governo presentes no

mencionado evento solicitaram que fosse realizada uma nova edição do mesmo. Desta forma, o

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“II Simpósio Latino-Americano de Polimorfismo e Cristalização em Fármacos e Medicamentos”

será realizado do 9 ao 11 de março de 2009 no Hotel Fazenda Fonte Colina Verde, Estância de

São Pedro, SP.

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III – Exemplos ilustrativos de aplicações metodológicas

Análise quantitativa de polimorfos de tibolona em matérias-primas usadas por uma

farmácia de manipulação e uma indústria farmacêutica.

Tibolona é prescrita para o tratamento dos sintomas da menopausa. Depois da

administração oral ela é rapidamente convertida em três metabólitos. Dois são estrogênicos e o

terceiro é progestênico. Dois polimorfos são conhecidos: um de estrutura monoclínica (Forma I)

e outro de estrutura triclínica (Forma II). A utilização da forma I é preferível, pois possui maior

estabilidade que a forma II, o que aumenta significativamente o prazo de validade do

medicamento comercializado, garantindo, dessa forma, um produto de melhor qualidade. A

proporção dos polimorfos deve definir o prazo de validade do produto comercializado. Foram

realizadas análises em três amostras, usando dados de média resolução obtidos no Laboratório

Nacional de Luz Síncrotron (LNLS).

Foi determinada a proporção Forma I : Forma II de 19 : 81 em massa para o caso de uma

amostra de indústria farmacêutica (Fig.1) e 43 : 57 para o caso de uma de farmácia de

manipulação (Fig.2). No caso das matérias-primas da indústria farmacêutica, foram medidas

também matérias-primas apenas com a fase monoclínica (Fig.3). A quantificação em

comprimidos comercializados, também é possível. No caso do material de referência, apenas a

fase monoclínica foi observada.

Essa contribuição serve para auxiliar tanto

a indústria quanto a farmácia de manipulação na

definição da matéria-prima a ser usada e controle

dos fornecedores da matéria-prima adquirida. Os

resultados também são interessantes para a

ANVISA decidir sobre liberar ou não um produto. Obviamente, esta metodologia, que pode ser

aplicada na análise de tibolona, também pode ser aplicada para uma grande variedade de

matérias-primas e produtos comercializados.

Figura 1 Figura 2

Figura 3

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Determinação da estrutura cristalina da dietilcarbmazina com dados de

difração de raios X de monocristal

A filariose é uma doença endêmica das regiões tropicais da Ásia, África, América Central

e do Sul. O tipo mais comum de filariose é a Filariose Linfática (FL), causada pelos vermes

nematódeos Wuchereria bancrofti, Brugia malayi e Brugia timori, cujas larvas são transmitidas

aos seres humanos por picadas de mosquitos infectados. O estágio avançado da doença é

caracterizado por edemas doloridos que desfiguram as pernas e/ou órgãos genitais.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera a FL como sendo potencialmente

erradicável e planeja eliminá-la por meio de programas de administração massiva de drogas.

Nesse contexto, a dietilcarbamazina (DEC), C10H21N3O, é um dos principais compostos

farmacêuticos usados no programa. Trata-se de um derivado da piperazina, sintetizada

inicialmente como 1-dietilcarbamil-4-metilpiperazina e comercializada, no início da década de

50, como sal citratado. No Brasil, esta droga está sendo testada como segundo uso clínico no

combate ao mal de Chagas.

Apesar de sua grande importância farmacêutica, não existem relatos de caracterização

estrutural. Assim, estudos conduzidos no IFSC permitiram a análise da estrutura cristalina da

dietilcarbamazina pura (DEC pura) e do citrato de dietilcarbamazina (DEC citrato), por meio da

técnica de difração de raios X por

monocristal. Os resultados obtidos

foram comparados a fim de

estabelecer parâmetros químicos

para a compreensão das alterações

responsáveis pelas diferentes

estabilidades apresentadas pelo

composto.

Figura 1 - Diferença entre as interações intermoleculares da a) DEC Pura e b) da DEC Citrato.

Estes estudos mostraram que a DEC citrato apresentam um padrão de ligações de

hidrogênio fortes entre a molécula do API e do agente de co-cristalização (Fig. 1a) o que leva a

um empacotamento estrutural fechado (Fig. 2). Isto incrementa a maior estabilidade do composto

quando comparado com o da DEC pura, uma vez que essa forma cristalina livre do citrato

apresenta apenas interações fracas (Fig. 1b). Isto explica claramente baixo o ponto de fusão da

DEC na ausência do citrato o que leva a uma instabilidade do medicamento quando ele é usado

como Ingrediente Ativo (API).

(a) (b)

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Também se comprovou a existência, em ambos os

casos, de transformações de fases sólido-sólido, não

reportadas na literatura o que deve ser levado em

consideração na hora da manipulação deste Ingrediente

Ativo. Por último, a análise de difração de raios X em

monocristal permitiu a obtenção de um padrão de difração

de raios X em pó para ser usado no controle da qualidade

tanto dos ingredientes ativos entregues pelos fornecedores

como da porcentagem de amostra contida no medicamento.

Figura 2. Empacotamento cristalino da

DEC Pura.