A Jurisdição No Estado Constitucional - Marinoni, Luiz Guilherme - Alunos

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7. A jurisdio no Estado contemporneo

7.1. Crtica teoria que afirma que o juiz atua a vontade concreta da lei

A teoria que afirma que o juiz atua a vontade concreta do direito, como visto, foi compartilhada por Chiovenda. O direito nada mais era do que a lei, isto , do que a norma geral a ser aplicada aos casos concretos. Ao juiz bastaria aplicar a norma geral criada pelo legislador. Aplicao e criao, a, separavam-se nitidamente.

Essa teoria supunha que o juiz podia solucionar qualquer caso mediante a aplicao das normas gerais, uma vez que o ordenamento jurdico seria completo e coerente. Por isso, tal teoria pode ser explicada luz do Cdigo Napoleo corolrio da doutrina da diviso de poderes -, diante da sua preocupao de constituir uma legislao completa e coerente para as relaes civis, comerciais etc.

Se a legislao era completa e coerente, e assim capaz de dar jurisdio condies de solucionar qualquer caso, o juiz jamais precisaria cristalizar uma norma - mediante a interpretao da lei de acordo com a Constituio - para regular a situao litigiosa. No precisaria e nem poderia delinear uma norma jurdica segundo os ditames da Constituio porque nessa poca no se apresentava a idia de que a validade da lei vinculada aos princpios constitucionais e aos direitos fundamentais. Como a lei tambm no podia considerar a realidade, as desigualdades sociais e o pluralismo, bastava jurisdio aplicar a lei genrica e abstrata, tpica do Estado liberal.

Por outro lado, os casos conflitivos continham caractersticas homogneas, o que no exigia do juiz uma especial compreenso das suas particularidades. Na verdade, o caso sobre o qual o magistrado devia se debruar era encoberto pela lgica da subsuno, para quem os fatos eram considerados a premissa menor e a norma geral a premissa maior. Tais fatos, ou simplesmente o caso, porque vinham de uma sociedade compreendida a partir de um ngulo igualizador, no exigiam qualquer esforo interpretativo ou de atribuio de sentido, o que dava tarefa do juiz uma qualidade quase mecnica. Era suficiente relacionar o caso, sem a necessidade da sua compreenso, com a norma geral, cujo contedo era claro e indiscutvel.

7.2 Crtica teoria de Carnelutti e teoria que sustenta que o juiz cria a norma individual que d soluo ao caso concreto

J vimos que a teoria de Carnelutti, ao afirmar que a funo do juiz a composio da lide, aceita a idia de que o juiz, ao compor a lide, cria a norma individual que regula o caso concreto. A sentena, ou a norma individual, faz concreta a norma geral, passando a integrar o ordenamento jurdico; a composio da lide ocorre quando a sentena torna a norma geral particular para as partes.

Mas, a diferena entre a teoria que supe que a funo do juiz declaratria limita-se a aplicar a norma geral e a teoria que afirma que o juiz cria a norma individual ao resolver o litgio, no est na tese de que o juiz - na segunda e no na primeira teoria - pode esculpir ou criar a norma geral e, portanto, est livre das amarras do positivismo acrtico.

Isso porque Kelsen deixou claro que o juiz cria a norma individual com base na norma geral, at porque, segundo a sua teoria, toda norma tem fundamento em uma norma superior, at se chegar norma fundamental, que estaria no pice do ordenamento. Ou seja, o legislador, subordinado Constituio, cria as normas gerais, e o juiz, vinculado lei, cria as normas individuais ao proferir as sentenas. Nesse sentido, afirma-se que, para Kelsen, a diferena entre as funes do legislador e do juiz apenas quantitativa, na medida em que, apesar de o juiz estar mais limitado que o legislador, ambos criam normas com fundamento em normas superiores.

As duas teorias, vistas nessa perspectiva, variam apenas porque em uma o juiz declara a norma geral sem produzir uma norma individual, e na outra o juiz cria uma norma individual com base na norma geral declarada na sua fundamentao (da sentena). De modo que as duas teorias esto igualmente subordinadas ao princpio da supremacia da lei.

certo que se pode dizer que a sentena produto de um ato de vontade - e no de mero conhecimento - e, nesse ponto, estar de acordo com Kelsen. Mas isso no pode permitir a concluso, encontrada pelo prprio Kelsen, de que o juiz cria direitos. Isso em razo de uma simples constatao: o juiz no cria direito quando atua com base em uma norma superior.

Concorda-se, tambm que a sentena considera particularidades do caso individual inimaginveis na norma geral, uma vez que essa ltima apenas pode considerar em abstrato aquilo que deve ser considerado no caso concreto. Mas, diante disso, no parece existir substancial diferena entre a declarao da norma geral no caso concreto e a criao da norma individual mediante a particularizao da norma geral para as partes.

O que identifica os dois conceitos a necessidade de considerao das particularidades da situao litigiosa. Tanto a declarao da lei, quanto a criao da norma individual, exige que sejam levadas em conta as peculiaridades do caso concreto. De modo que uma substancial diferenciao entre as duas teorias exigiria uma distino em relao ao modo de apreciao de tais particularidades. Porm, a teoria kelseniana jamais pretendeu se diferenciar da teoria clssica da jurisdio por considerar a realidade do caso concreto a partir de um outro ngulo visual ou de forma mais aprofundada. Na verdade, aqui as duas teorias mais uma vez se aproximam, limitando-se a exprimir de forma terica e linguisticamente diversa situaes que, em substncia, no so aptas para permitir a escolha - ou a diferenciao - de uma diante da outra.

fcil perceber que em uma sociedade legalmente igualizada, em que as relaes tm caractersticas definidas como homogneas, no h dificuldade na visualizao das particularidades dos casos conflitivos. Por esse motivo, na poca em se falava de lei genrica e abstrata, sequer se podia imaginar que um dia o juiz teria que compreender e atribuir sentido e valor aos casos concretos. O caso era visto como algo quase que pr-definido e, nessa linha, a funo do juiz era apenas preencher as suas particularidades. Como a jurisdio no precisava outorgar sentido ao caso, bastava a sua subsuno norma geral mediante mera aplicao lgica.

verdade que a norma individual, ou a sentena, outorga caractersticas ao caso, mas impossvel ignorar que, na atualidade diante do pluralismo da sociedade e da constante transformao dos fatos sociais -, necessrio muito mais do que isso, uma vez que a interpretao da lei, ou a norma formulada pelo juiz, depende do sentido do caso concreto.

Portanto, nenhuma dessas teorias responde aos valores do Estado constitucional. No s porque ambas so escravas do princpio da supremacia da lei, mas tambm porque as duas negam lugar compreenso do caso concreto no raciocnio decisrio, isto , no raciocnio que leva prestao jurisdicional.

7.3 O pluralismo e a necessidade de compreenso dos casos concretos

Quando se insiste na necessidade de o juiz atribuir sentido ao caso levado sua anlise, deseja-se, antes de tudo, dizer que ele no pode se afastar da realidade em que vive. Se a percepo das novas situaes, derivadas do avano cultural e tecnolgico da sociedade, fundamental para a atribuio de sentido aos casos que no esto na cartilha do judicirio, a apreenso dos novos fatos sociais, que atingem a famlia, a empresa, o trabalho etc, igualmente imprescindvel para a atribuio de um sentido contemporneo aos velhos modelos capazes de ser estratificados em casos.

Embora essas duas atitudes tambm importem para desvendar a necessidade de uma nova elaborao legislativa, o seu peso maior recai sobre o juiz, uma vez que evidente que o legislador no pode andar na mesma velocidade da evoluo social o que, alis, j constitui ditado vulgarizado. Por isso, o surgimento de novos fatos sociais d ao juiz legitimidade para construir novos casos e para reconstruir o significado dos casos j existentes ou simplesmente para atribuir sentido aos casos concretos.

7.4 A conformao da lei exige a prvia atribuio de sentido ao caso concreto, mas a definio do caso concreto requer a considerao da lei

Essa necessidade de atribuio de sentido aos casos concretos significa que os novos fatos sociais so vitais para a compreenso do direito ou para a conformao da lei.

Porm, essa atribuio de sentido obviamente no dispensa a prvia anlise da lei. Vale dizer que para se dar sentido ao caso necessrio pensar na lei, ou melhor, necessrio considerar de que modo o caso se insere em face da lei e da interpretao que lhe dada pelos tribunais.

7.5 A jurisdio, aps delinear o caso concreto, deve conformar a lei

Uma vez delineado o caso concreto, resta ao juiz regul-lo atravs da lei. Contudo, como foi amplamente demonstrado, a concepo de direito no Estado constitucional completamente diferente da que lhe foi atribuda pelo Estado liberal. No mais prevalece o princpio da supremacia da lei e essa no mais vista como um produto perfeito e acabado.

Hoje a lei se submete s normas constitucionais, devendo ser conformada pelos princpios constitucionais de justia e pelos direitos fundamentais. correto dizer, alis, que uma das mais importantes caractersticas do constitucionalismo contemporneo est na definio normativo-constitucional de princpios materiais de justia, cuja funo iluminar a compreenso do ordenamento jurdico.

Dizer que a lei tem a sua substncia moldada pela Constituio implica em admitir que o juiz no mais um funcionrio pblico que objetiva solucionar os casos conflitos mediante a afirmao do texto da lei, mas sim um agente do poder que, atravs da adequada interpretao da lei e do controle da sua constitucionalidade, tem o dever de definir os litgios fazendo valer os princpios constitucionais de justia e os direitos fundamentais.

7.6 A deciso a partir dos princpios constitucionais e dos direitos fundamentais

J se deixou claro que a lei, no Estado contemporneo, tem a sua substncia condicionada aos princpios constitucionais de justia e aos direitos fundamentais. Compreender a lei a partir dos direitos fundamentais significa inverter a lgica da idia de que esses direitos dependem da lei, pois hoje so as leis que tem a sua validade circunscrita aos direitos fundamentais, alm de s admitirem interpretaes que a eles estejam adequadas.

Isso obviamente representa uma reao contra o princpio da supremacia da lei e contra o absolutismo do legislador. A fora normativa dos direitos fundamentais, ao impor o dimensionamento do produto do legislador, faz com a Constituio deixe de ser encarada como algo que foi abandonado maioria parlamentar. A vontade do legislador, agora, est submetida vontade suprema do povo, ou melhor, Constituio e aos direitos fundamentais.

Nenhuma lei pode contrariar os princpios constitucionais e os direitos fundamentais e, por isso mesmo, quando as normas ordinrias no podem ser interpretadas de acordo, tm a sua constitucionalidade controlada a partir deles. A lei deve ser compreendida e aplicada de acordo com a Constituio. Isso significa que o juiz, aps encontrar mais de uma soluo a partir dos critrios clssicos de interpretao da lei, deve obrigatoriamente escolher aquela que outorgue a maior efetividade Constituio. Trata-se, desse modo, de uma forma de filtrar as interpretaes possveis da lei, deixando passar apenas a que melhor se ajuste s normas constitucionais.

Note-se que, quando a norma no pode ser interpretada de acordo com a Constituio, evidentemente no h interpretao de acordo, mas sim necessidade de controle constitucional da lei. No caso de lei inconstitucional ou de lei cuja aplicao literal conduz a um juzo de inconstitucionalidade, o juiz de primeiro grau poder declarar a sua inconstitucionalidade ou, mediante a tcnica da interpretao conforme a Constituio, emitir a nica interpretao da lei que no obrigue declarao da sua inconstitucionalidade. Na hiptese de lei que possui interpretaes inconstitucionais, o juiz poder editar a interpretao que lhe parea constitucional, ainda que existam outras que possam se revestir de constitucionalidade. Trata-se, nesse caso, da aplicao da tcnica da declarao parcial de nulidade sem reduo de texto.

Porm, o mais importante, para uma nova concepo de jurisdio, a possibilidade de o juiz controlar a inconstitucionalidade por omisso no caso concreto. Como j foi dito, h normas constitucionais que impem um dever de legislar e h direitos fundamentais que, embora decorrentes de normas que se calam sobre essa espcie de dever, dependem, para a sua efetivao ou proteo, de regramento infraconstitucional.

Como os direitos fundamentais devem ser protegidos ou tutelados pelo Estado e, assim, no apenas pelo legislador, possvel verificar, no caso concreto, se a omisso normativa implicou em negao de tutela ao direito fundamental, para, em caso positivo, admitir que o juiz supra a omisso de proteo devida pelo legislador.

Entretanto, h ainda outra situao. Agora o problema no diz respeito ausncia de lei necessria para a proteo do direito fundamental, mas sim aos limites de um direito fundamental de liberdade. Assim, por exemplo, a situao em que um direito da personalidade, como o direito honra, se coloca em rota de coliso com um direito de liberdade, como o direito liberdade de expresso. Aqui no se lamenta a inexistncia de uma lei que deveria ter sido editada para dar proteo ao direito fundamental (de personalidade), porm se questiona a amplitude do direito fundamental de liberdade frente ao direito fundamental de personalidade, ou melhor, a possibilidade de o direito fundamental de personalidade ser diretamente invocado para conter o direito fundamental de liberdade, quando ento teramos uma coliso de direitos fundamentais no caso concreto, que teria que ser resolvida atravs da regra do balanceamento.

Assim, os princpios e os direitos fundamentais podem ser vistos no apenas como a substncia que orienta o modo de ser do ordenamento jurdico, mas tambm como as ferramentas que servem para: i) a interpretao de acordo; ii) a eliminao da lei inconstitucional (declarao de inconstitucionalidade da lei); iii) a adequao da lei Constituio (interpretao conforme e declarao parcial de nulidade sem reduo de texto); iv) a gerao da regra necessria para que o direito fundamental seja feito valer (controle da omisso inconstitucional); e v) a proteo de um direito fundamental diante de outro (aplicao da regra do balanceamento).

7.7 Conformao da lei e sentido da criao da norma jurdica pelo juiz

Como restou claro no ltimo pargrafo, por conformao da lei no se pode entender simplesmente interpretao de acordo ou adequao da lei Constituio. Nas hipteses de declarao de inconstitucionalidade e de supresso de omisso constitucional h uma conformao da legislao (embora no exatamente da lei) s normas constitucionais.

Mas a conformao da lei ou da legislao faz com que o juiz crie, mediante a interpretao ou o controle da constitucionalidade, uma norma jurdica para justificar a sua deciso.

Trata-se de propor, na verdade, a conhecida distino entre norma, vista como texto da lei, e norma jurdica, compreendida como interpretao do texto legal, deixando-se claro, no entanto, que tal norma jurdica no apenas a expresso da interpretao da lei, mas tambm o resultado do controle de constitucionalidade.

Porm, esse sentido de criao da norma jurdica nada tem a ver com aquele que lhe foi atribudo pelos tericos que viam a sentena como norma individual que particulariza a norma geral.

A norma jurdica, no presente contexto, no almeja ser a parte dispositiva (que define o litgio) da sentena. Essa norma jurdica se destina a fundamentar a parte dispositiva, e assim no pretende ser pensada como uma norma individual que regula o caso concreto, nem mesmo quando fruto do controle da constitucionalidade.

Ademais, a norma jurdica que agora importa, obviamente est muito longe de significar apenas uma particularizao da norma geral (da lei), pois, como est claro, o resultado da interpretao e do controle de constitucionalidade da lei.

De modo que a criao da norma jurdica mediante a conformao da lei e da legislao pode ser dita uma norma jurdica criada diante do caso concreto, mas no uma norma individual que regula o caso concreto. Ou seja, h necessidade de distinguir a cristalizao da interpretao e do controle de constitucionalidade da criao de uma norma individual que, particularizando a norma geral, voltada especificamente regulao de um caso concreto.

Porm, o que importa evidenciar que esse novo significado de criao da norma jurdica serve para explicar no s a conformao da lei isolada, mas tambm da legislao, aos princpios constitucionais de justia e aos direitos fundamentais.

7.8 O significado da norma jurdica que tutela um direito fundamental diante de outro direito fundamental

Lembre-se, agora, do exemplo referido linhas atrs, em que um direito de personalidade tutelado diante de um direito de liberdade (direito honra frente ao direito liberdade de expresso). Nesse caso no correto afirmar que a norma jurdica criada para conformar a legislao s normas constitucionais.

Lembre-se que Alexy atribui aos direitos de liberdade uma espcie de prioridade chamada prima facie sobre os demais direitos fundamentais, mas essa prioridade pode ser superada diante das circunstncias do caso concreto e desde que acompanhada com uma carga de argumentao capaz de demonstrar a necessidade de proteo do direito fundamental que, em abstrato, no detentor de prioridade. No Caso Lebach, mencionado pelo jurista alemo, admitiu-se a proteo do direito de personalidade diante do direito de liberdade de informao, evidenciando-se que a pretendida retransmisso da notcia televisiva no mais respondia a um interesse atual de informao e que essa veiculao colocaria em risco um direito fundamental do autor do delito. Ou seja, nesse exemplo foram invocadas as circunstncias especiais do caso concreto para se demonstrar que o direito da personalidade deveria ser protegido diante do direito de liberdade.

Nessas situaes, sendo completamente impossvel uma hierarquizao dos direitos ou a prvia definio do direito que deve prevalecer em cada caso, resta apenas procurar uma forma racional para balancear os direitos fundamentais que podem colidir nas situaes concretas. Mas aqui no o local para tratar dessa forma ou do meio capaz de permitir o seu adequado controle, pois o que interessa saber o significado da prestao jurisdicional que faz tal balanceamento.

Esse significado pode ser descortinado a partir do momento em que se percebe que a tarefa de balanceamento no se presta conformao da lei ou da legislao, mas sim para a concretude direta e imediata da prpria Constituio, ou melhor, para uma efetividade dos direitos fundamentais que no toma em conta o plano da legislao.

Perceba-se que h situaes em que se questiona a omisso do legislador em dar proteo a um direito fundamental (omisso inconstitucional) e h casos em que se afirma, diante da fora que se pretende dar a um direito fundamental de liberdade, apenas a existncia de um direito fundamental que exige proteo estatal (necessidade de ponderao dos direitos fundamentais no caso concreto). No primeiro caso se v uma omisso da legislao a partir do direito fundamental e, no segundo, se afirma a necessidade de se fazer valer o direito fundamental que requer proteo diante de um direito fundamental de liberdade.

Quando a prestao jurisdicional indica o resultado do balanceamento dos direitos fundamentais (no importa qual seja ele), a norma jurdica est atuando apenas em nome dos direitos fundamentais, sem se preocupar com a conformao da legislao. Alm de dar efetividade ao direito fundamental no caso concreto, a jurisdio permite a convivncia dos direitos fundamentais em abstrato.

7.9 A criao da norma jurdica em face das teorias clssicas da jurisdio

No caso em que o juiz interpreta a lei de acordo com a Constituio ou se vale das tcnicas da interpretao conforme e da declarao parcial de nulidade sem reduo de texto, certamente no h como sustentar que a jurisdio atua a vontade da lei, nos termos propostos por Chiovenda. Tambm no cabvel dizer que h a criao da norma individual capaz de regular o caso concreto, ao menos quando se pensa tal atividade a partir da lgica de que a norma individual (a sentena) deve se fundar em uma norma geral (em uma lei ordinria).

A impropriedade dessas teorias se torna ainda mais marcante diante da declarao da inconstitucionalidade da lei, do controle da inconstitucionalidade da sua omisso e da tutela de um direito fundamental mediante a desconsiderao de outro no caso concreto, quando a sentena no afirma positivamente lei ou norma geral alguma.

Se nas teorias clssicas o juiz apenas declarava a lei ou criava a norma individual a partir da norma geral, agora ele cria a norma jurdica a partir da interpretao de acordo com a Constituio, do controle da constitucionalidade e da adoo da regra do balanceamento (ou da regra proporcionalidade) dos direitos fundamentais no caso concreto.

7.10 A teoria de que a jurisdio pode criar a norma geral

Eugenio Bulygin, sucessor de Carlos Santiago Nino na ctedra de Filosofia do Direito da Universidade de Buenos Aires, sustenta a tese de que os juzes podem criar o direito em determinadas situaes excepcionais.

Bulygin contesta a doutrina de Kelsen, no sentido de que o juiz, ao criar a norma individual do caso concreto, cria o direito. Segundo Bulygin, ainda que se aceite a idia de que o juiz dita a norma individual nos termos kelsenianos, no se pode admitir que o juiz cria o direito, pois tal norma individual se funda em uma norma geral criada pelo legislador. Segundo Bulygin, a concluso de Kelsen somente estaria certa se juiz criasse a prpria norma geral.

Buligyn lembra que Kelsen chegou a admitir, embora de forma contraditria, que a jurisdio pode criar a norma geral quando o juiz valora a norma legislativa ou a sua ausncia como muito inadequada ou injusta. Entretanto, adverte que Kelsen no disse exatamente que o juiz cria a norma geral nesses casos, mas sim que o juiz pode criar a norma individual sem que exista uma norma geral criada pelo legislador, ou melhor, que o juiz pode criar uma norma individual aplicando uma norma geral - que lhe parece justa e adequada - que o legislador no criou.

Embora Kelsen entenda que a norma individual (a sentena) somente pode ser justificada por uma norma geral, ele no chega a admitir, de forma clara e explcita, que o juiz pode cri-la, tanto que fala, nessa situao, em aplicao de norma geral no- positiva. Bulygin afirma que isso uma inconseqncia de Kelsen, pois se a positividade do direito resulta do fato de que as normas so criadas por atos humanos como reconhece o prprio Kelsen -, no h razo para se falar em aplicao de norma geral no-positiva.

No raciocnio de Kelsen, essa norma geral seria aplicada, ao invs de criada, em razo de que o juiz no pode criar a norma geral, e seria no-positiva por no ter sido criada pelo legislador. Mas, se a positividade decorre de a norma ter sido criada por ato humano, nada poderia impedir a concluso de que o juiz, quando aplica a norma geral no criada pelo legislador, na verdade a cria, e que essa, por conseqncia, dotada de positividade.

7.11 A teoria de que a jurisdio pode criar a norma geral diante do constitucionalismo contemporneo

Considerando-se as teorias clssicas da jurisdio atuao da vontade da lei e criao da norma individual , no h dvida de que o juiz somente pode proferir a sentena com base em uma norma geral criada pelo legislador. Embora, em princpio, a ausncia de norma geral sequer pudesse ser cogitada em relao a elas, no h motivo para no se indagar o que poderia ser feito pelo juiz de tais teorias se admitida fosse a ausncia de lei. Nessa situao no restaria ao juiz outra alternativa seno criar a norma geral.

Acontece que o problema da insuficincia da lei no pode ser resolvido atravs da simples aceitao de que o juiz pode cri-la. A questo que realmente importa saber como o juiz cria uma norma jurdica para o caso concreto quando a norma geral no existe ou no est de acordo com os princpios constitucionais de justia e com os direitos fundamentais.

A criao dessa norma jurdica no significa criao de norma individual para regular o caso concreto e, menos ainda, criao de norma geral. A criao da norma jurdica mediante a conformao da lei e da legislao ou do balanceamento dos direitos fundamentais pode ser dita uma norma jurdica criada diante das peculiaridades do caso concreto, mas no uma norma individual voltada a regul-lo. Essa norma jurdica, embora derivada de um processo de criao jurisdicional, tambm no tem nada a ver com uma norma geral, porque forjada ou cristalizada a partir da relao entre a legislao e as normas constitucionais ou com base apenas nas normas constitucionais (balanceamento).

Como j foi demonstrado, o juiz, no Estado constitucional, deve interpretar a norma geral de acordo com a Constituio, controlar a inconstitucionalidade da lei - inclusive atravs das tcnicas da interpretao conforme e da declarao parcial de nulidade sem reduo de texto -, a inconstitucionalidade da sua omisso e dar tutela aos direitos fundamentais que entram em coliso no caso concreto.

Nos casos de interpretao de acordo, de interpretao conforme e de declarao parcial de nulidade sem reduo de texto, a norma geral visivelmente conformada em menor (no primeiro caso) ou maior medida (nos demais casos) - pelas normas constitucionais. Nessas trs hipteses o juiz cria a norma jurdica considerando a relao entre o caso concreto, o texto da lei e as normas constitucionais.

Nas situaes de declarao de inconstitucionalidade, de controle de inconstitucionalidade por omisso e de tutela de um direito fundamental diante do outro no caso concreto, tambm no se pode falar em criao da norma geral pelo juiz, embora a situao certamente seja mais delicada. Esses trs casos, se no permitem a conformao da norma geral Constituio, conferem ao juiz a possibilidade de fazer valer a Constituio mediante a eliminao da norma inconstitucional, do preenchimento do vazio normativo que impede a tutela do direito fundamental e da proteo de um direito fundamental que se choca com outro no caso concreto.

Em nenhuma dessas situaes o juiz cria uma norma geral. A jurisdio apenas est zelando para que os direitos sejam tutelados de acordo com as normas constitucionais, para que os direitos fundamentais sejam protegidos e efetivados ainda que ignorados pelo legislador, e para que os direitos fundamentais sejam tutelados no caso concreto mediante a aplicao da regra do balanceamento. E isso obviamente faz parte da tarefa atribuda ao juiz no constitucionalismo contemporneo.

7.12 Ainda que o juiz criasse a norma geral, essa no teria a mesma eficcia de uma norma geral criada pelo legislador

Lembre-se, de qualquer maneira, que mesmo que se admitisse que o juiz pode criar uma norma geral, no se poderia equipar-la, em termos de eficcia vinculante, norma editada pelo legislador.

A norma geral criada pelo legislador obrigatria para todos. Mas, ainda que se aceitasse que o juiz pode criar uma norma geral, ela no seria obrigatria sequer ao juiz que seu vizinho, embora a reiterao de casos perante o judicirio pudesse fazer surgir uma jurisprudncia que a consolidasse. Porm, ainda nessa hiptese, sempre seria possvel que um juiz, por vontade prpria, divergisse frontalmente da jurisprudncia que se formou.

impossvel ignorar que a rediscusso de casos com a mesma configurao e envolvendo a mesma questo de direito permite, mediante o desenvolvimento e a confrontao dos argumentos e fundamentos das decises colidentes, o encontro de uma deciso de equilbrio, que assim possa naturalmente mas sem fora obrigatria se impor.

Contudo, no h como deixar de identificar a grande diferena, em termos de eficcia vinculante, entre a norma criada pelo legislador e a norma geral que seria capaz de ser criada pelo juiz.

7.13 A grande peculiaridade da norma criada pelo juiz: a necessidade da sua fundamentao

A sentena, de acordo com o Cdigo de Processo Civil, composta por trs partes: i) o relatrio; ii) a fundamentao e iii) a parte dispositiva (art. 458, CPC). No relatrio o juiz expe a situao conflitiva, o pedido do autor e os argumentos das partes, as provas produzidas e tudo mais que possa interessar para a formulao da deciso. A parte dispositiva expressa a deciso, afirmando, por exemplo, que o ru condenado a pagar x.

A parte dispositiva da sentena pode ser pensada como a norma individual do caso concreto nos termos kelsenianos, no obstante os termos norma e individual paream repelentes ou inconciliveis, uma vez que a norma requer a condio de generalidade, ao menos no que tange ao seu destinatrio.

Porm, ainda que a idia de norma individual no convena, porque ela nada mais do que a parte que expressa a deciso jurisdicional, seria imprescindvel a sua fundamentao (como ocorre em relao sentena), pois o juiz, enquanto agente do poder no legitimado pelo voto, no pode deixar de justificar as decises que emite. Alis, no se pode esquecer que, enquanto a deciso legislativa (a lei) expressa o resultado do embate parlamentar, a deciso jurisdicional, embora possa ser aperfeioada atravs do sistema recursal e de formao jurisprudencial, pode ser tomada apenas por um juiz.

A legitimidade da deciso jurisdicional depende no apenas de estar o juiz convencido, mas tambm de o juiz justificar a racionalidade da sua deciso com base no caso concreto, nas provas produzidas e na convico que formou sobre as situaes de fato e de direito. Ou seja, no basta o juiz estar convencido; deve ele demonstrar as razes de seu convencimento. Isso permite o controle da atividade do juiz pelas partes ou por qualquer cidado, j que a sentena deve ser o resultado de um raciocnio lgico capaz de ser demonstrado mediante a relao entre o relatrio, a fundamentao e a parte dispositiva.

A fundamentao da sentena, diante da sua essencialidade, foi tornada obrigatria pela Constituio (art. 93, IX, CF). Isso evidencia uma absoluta diferena entre a norma criada pelo legislador e a sentena. A norma geral no justificada. A chamada exposio de motivos que a acompanha no integra a lei.

7.14 A teoria de que a jurisdio se define pelo seu dever de concretizar os valores da Constituio

Owen Fiss, nos Estados Unidos, tem produzido importantes estudos sobre a jurisdio. Segundo Fiss, a funo da jurisdio chamada de adjudicao (adjudication) atribuir significado concreto e aplicao aos valores constitucionais.

A doutrina de Fiss como no incomum nos Estados Unidos preocupada com a proteo das minorias. Nessa linha, deixa claro que o juiz, ao invs de pretender falar em nome das minorias, deve conferir significado aos valores constitucionais. Isso porque no teria sentido dar ao juiz a funo de representante das minorias, mas sim a possibilidade de descobrir o que verdadeiro, correto ou justo a partir do texto da Constituio, da histria e dos ideais de justia.

Embora agora no importe outra preocupao de Fiss, no sentido de saber como a interpretao pode atingir um grau de objetividade consentneo com a funo do direito, no h como negar que no obstante tambm seja necessrio proteger jurisdicionalmente os direitos das minorias - no se pode reduzir a funo da jurisdio descoberta do significado dos valores constitucionais ou dos valores pblicos contidos na Constituio.

Se certo que o juiz deve compreender a lei na medida da Constituio, isso no quer dizer que lhe basta atribuir sentido aos valores da Constituio para dar tutela aos direitos. Para realizar a funo jurisdicional, o juiz deve, em primeiro lugar, pensar na lei ordinria, para depois dimension-la na perspectiva das normas constitucionais.

Como j foi dito, a jurisdio, aps atribuir sentido ao caso concreto, deve relacion-lo com as normas ordinrias e com a Constituio. Ou seja, depois de definir o sentido do caso, o juiz deve procurar o significado da norma ordinria luz da Constituio, quando ento tambm ter que atribuir significado s normas constitucionais definidoras dos princpios de justia e dos direitos fundamentais. Portanto, antes de objetivar atribuir significado aos valores da Constituio, a interpretao visa conferir significado ao direito material. E isso tambm feito quando o juiz faz o controle da constitucionalidade da lei ou supre a omisso que impede a efetividade de um direito fundamental, embora nesses casos, como evidente, o papel da Constituio tenha maior importncia do que quando a lei interpretada de acordo. No possvel esquecer que, nessas hipteses, ainda que o juiz se baseie na Constituio, a sua atuao parte da considerao da lei ou da sua falta.

Ademais, a pura e simples atribuio de significado dico de uma norma seja ela constitucional ou no - corresponde apenas a uma fase de toda e qualquer interpretao. Afinal interpretar, sabe-o qualquer um, nada mais do que expressar significado. Contudo, muito mais do que atribuir significado a uma norma, cabe jurisdio realizar, no caso concreto, o que foi por ela prometido.

7.15 A idia de que a jurisdio tem por objetivo a pacificao social

Fala-se, tambm, que a jurisdio tem por objetivo a pacificao social. Esse fim de pacificao social no resultaria apenas do fato de que os cidados buscam soluo para os seus conflitos no Poder Judicirio, e de que esse, ao solucion-los, permitiria a pacificao de especficas situaes litigiosas.

Na verdade, a idia do fim de pacificao social da jurisdio est relacionada com trs questes: i) a existncia do juiz d aos litigantes a conscincia de que os seus conflitos tm uma forma de resoluo instituda e estatal, o que elimina as tentativas de solues privadas arbitrrias e violentas; ii) a jurisdio acomoda as disputas, evitando a potencializao e o agravamento das discusses; iii) ainda que um dos litigantes no se conforme com a deciso, sabe ele que, diante da impossibilidade de levar novamente ao juiz a situao conflitiva j solucionada, nada mais lhe resta fazer, e que, portanto, seria improdutivo e ilgico continuar alimentando a sua posio.

Acontece que essas trs caractersticas, que serviriam para identificar um fim de pacificao social na jurisdio, so completamente neutras e indiferentes substncia da funo ou da deciso jurisdicional que conduziria pacificao. E definir jurisdio sem saber como a pacificao alcanada pode conduzir a admisso de que qualquer poder institudo, mesmo que atuando de forma ilegtima e de modo contrrio aos princpios materiais de justia, exerce jurisdio.

Na realidade, como no difcil perceber, a pacificao social uma mera conseqncia da existncia de um poder de resoluo dos conflitos que se sobreponha sobre os seus subordinados, e no um resultado particular e prprio do Estado constitucional.

Por isso, no atual estgio dos nossos estudos, parece no ser adequado concluir que a jurisdio se caracteriza pelo fim da pacificao social. preciso, antes de tudo, analisar de que forma esse fim obtido, ou melhor, verificar a legitimidade do poder de resoluo dos conflitos e das decises destinadas a regul-los. Sem isso estaramos aceitando que todo poder direcionado pacificao social um poder jurisdicional e, assim, para dizer o mnimo, igualizando a jurisdio do Estado legislativo com a jurisdio do Estado contemporneo.

7.16 A jurisdio deve responder s necessidades do direito material

Como o juiz deve dar sentido ao caso diante da lei, da realidade social e da Constituio, ele obviamente no pode formular a norma jurdica do caso concreto olhando apenas para a Constituio. Para a prestao da tutela jurisdicional imprescindvel a considerao das necessidades do direito material.

Isso mais fcil de evidenciar do que a prpria idia de que a lei deve ser conformada segundo os princpios constitucionais de justia e os direitos fundamentais. que a tutela ou a proteo jurisdicional tem uma bvia natureza instrumental em relao ao direito material. A tutela jurisdicional, antes de tomar em conta a Constituio, deve considerar o caso e as necessidades do direito material, uma vez que as normas constitucionais devem iluminar a tarefa de tutela jurisdicional dos direitos.

por isso mesmo que a teoria que afirma que a jurisdio tem o objetivo de concretizar os valores constitucionais no bastante para explicar a complexidade da funo do juiz. Na verdade, a jurisdio tem o objetivo de dar tutela s necessidades do direito material, compreendidas luz das normas constitucionais.

Por outro lado, h ntida diferena entre dar tutela s necessidades do direito material e exercer a funo de pacificao social. Como essa ltima (como visto no item que antecedeu) neutra e indiferente ao direito material e aos prprios valores constitucionais, ela apenas pode ser vista como conseqncia da atividade jurisdicional voltada efetiva tutela jurisdicional dos direitos. Ou melhor, a jurisdio tem por objetivo editar a norma jurdica capaz de dar conta das necessidades do direito material, e apenas como conseqncia desta sua misso que pode gerar o efeito da pacificao social.

7.17 A tutela dos direitos transindividuais

O Estado contemporneo realou a existncia de direitos transindividuais, assim compreendidos os direitos que no pertencem apenas a uma, mas sim a vrias pessoas. O Cdigo de Defesa do Consumidor, ao tratar dessa modalidade de direitos, definiu a existncia de direitos difusos e coletivos. Afirmou que ambos so transindividuais, de natureza indivisvel, mas enquanto os difusos so pertencentes a pessoas indeterminadas e ligadas por circunstncias de fato, os coletivos so do grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrria por uma relao jurdica base (art. 81, pargrafo nico, I e II, CDC).

Para a proteo desses direitos, o legislador instituiu tcnicas ou modelos processuais diferenciados, ou seja, voltados a atender as suas especificidades. Como no poderia ser de outra forma, deferiu a determinados entes, como as associaes de defesas do meio ambiente e dos consumidores, legitimidade para a propositura de aes destinadas tutela de tais direitos, e ao mesmo tempo concebeu a sentena de procedncia como capaz de produzir efeitos benficos a todos os titulares do direito afirmado pelo ente legitimado (arts. 82 e 103, CDC).

Mas, para o efeito da compreenso da jurisdio, mais do que a constatao da existncia de tais direitos e de tcnicas processuais voltados sua tutela, importa identificar a razo de ser da idealizao desses novos modelos processuais dirigidos tutela jurisdicional.

As aes coletivas como podem ser chamados os modelos concebidos para a tutela dos direitos transindividuais , tm importante relao com os direitos fundamentais prestacionais. Tais aes permitem a tutela jurisdicional dos direitos fundamentais que exigem prestaes sociais (direito sade etc) e adequada proteo - inclusive contra os particulares - (direito ambiental etc), mas, alm disso tudo, constituem condutos vocacionados a permitir ao povo reivindicar os seus direitos fundamentais materiais.

As aes coletivas, ainda que vistas apenas como mdulos processuais organizados pelo legislador, representam muito mais do que simples procedimentos concebidos para a tutela jurisdicional, pois so verdadeiros instrumentos de uma faceta muito especial dos direitos fundamentais. Ora, como foi dito acima (ver item que tratou, no captulo sobre a teoria dos direitos fundamentais, da multifuncionalidade dos direitos fundamentais), os direitos fundamentais requerem a possibilidade da participao na estrutura social e no poder mediante instrumentos e procedimentos adequados. Essa participao deve ser oportunizada e incentivada no s atravs da reserva de locais de participao em rgos pblicos ou em procedimentos voltados a decises pblicas, mas tambm mediante procedimentos judiciais aptos tutela dos direitos transindividuais.

A ao coletiva, ainda que compreendida apenas como instrumento para a proteo dos direitos fundamentais como o direito ambiental e o direito do consumidor -, , por si s, uma resposta aos direitos fundamentais, ou melhor, a realizao de uma prestao, por parte do legislador, destinada a viabilizar a participao na reivindicao dos direitos fundamentais.

Se a ao coletiva via ou conduto, a jurisdio se torna, inegavelmente, um local que acolhe a participao, viabilizando a realizao de uma prestao estatal imprescindvel aos direitos fundamentais.

Alm disso, algumas aes coletivas, quando endereadas contra o Poder Pblico - assim como a ao popular -, permitem ao povo participar no poder, apontando desvios na gesto da coisa pblica. Nesse sentido a ao jurisdicional configura mecanismo de participao popular, participao essa que pode ser deferida individualmente ao cidado como acontece com a ao popular ou reservada a entes que fazem as vozes dos titulares dos direitos ecoarem nos tribunais como acontece com as aes coletivas.

Nessa ltima perspectiva a jurisdio um poder que permite a participao do cidado na correo dos eventuais desvios na administrao do bem pblico, e, mais do que expressar um local para a participao na reivindicao dos direitos fundamentais, revela um lugar imprescindvel para otimizar a participao e, assim, para democratizar a democracia atravs da participao.

Portanto, a jurisdio fomenta a participao para a proteo dos direitos fundamentais e para o controle das decises tomadas pelo Poder Pblico. Mas no certo concluir que a jurisdio apenas colabora para a participao, pois ela decide, vale dizer, exerce o seu poder ao decidir sobre os direitos transindividuais e sobre a lisura na gesto do bem pblico.

De modo que as aes processuais que garantem a participao, seja na proteo dos direitos fundamentais, seja no controle das decises pblicas, conferem um plus funo jurisdicional. E no apenas porque o juiz deixa de tutelar exclusivamente os direitos individuais e passa a proteger os direitos transindividuais e o patrimnio pblico, mas sobretudo porque a jurisdio toma o seu lugar para a efetivao da democracia, que necessita de tcnicas de participao direta para poder construir uma sociedade mais justa.

7.18 Dar tutela aos direitos no simplesmente editar a norma jurdica do caso concreto

No basta ao juiz compreender e conformar a lei de acordo com as normas constitucionais, concluindo que o autor tem um direito que deve ser tutelado. Cabe jurisdio dar tutela aos direitos, e no apenas dizer que eles merecem proteo. De modo que agora interessa saber o que significa dar tutela jurisdicional aos direitos.

Dar tutela a um direito nada mais do que lhe outorgar proteo. Mas, exceto quando o autor postula uma sentena declaratria da existncia ou da inexistncia de uma relao jurdica ou a constituio ou a desconstituio de uma situao jurdica (sentena desconstitutiva) e, assim, alm da sentena no necessria qualquer atividade de complementao da prestao jurisdicional, no h como admitir que a sentena suficiente para o juiz se desincumbir do seu dever de prestar a tutela jurisdicional.

fcil perceber que a discusso em torno do significado de tutela jurisdicional obriga a uma ruptura com a idia de que a funo jurisdicional cumprida com a edio da sentena (da declarao do direito ou da criao da norma individual), exigindo que, para a compreenso do significado de prestao jurisdicional, caminhe-se um pouco alm.

Frise-se que o direito de ao - visto como contrapartida da proibio da autotutela e da reserva do poder de dirimir os conflitos ao Estado foi concebido, j h bastante tempo, como direito a uma sentena de mrito. Acontece que a sentena que reconhece a existncia de um direito, mas no suficiente para satisfaz-lo, no capaz de expressar uma prestao jurisdicional efetiva, uma vez que no tutela o direito e, por isso mesmo, no representa uma resposta que permita ao juiz se desincumbir do seu dever perante a sociedade e os direitos.

Diante disso, no h dvida que a tutela jurisdicional s se aperfeioa, nesses casos, com a atividade executiva. Portanto, a jurisdio no pode significar mais apenas iuris dictio ou dizer o direito, como desejavam os juristas que enxergam na atividade de execuo uma mera funo administrativa ou uma funo menor. Na verdade, mais do que direito sentena, o direito de ao, hoje, tem como corolrio o direito ao meio executivo adequado.

A tutela jurisdicional prestada quando o direito tutelado e, dessa forma, realizado, seja atravs da sentena (quando ela bastante para tanto), seja atravs da execuo. De modo que passa a importar, nessa perspectiva, a maneira como a jurisdio deve se comportar para realizar os direitos ou implementar a sua atividade executiva. Ou melhor, o modo como a legislao e o juiz devem se postar para que os direitos sejam efetivamente tutelados (ou executados).

Trata-se, na verdade, de trilhar dois caminhos que se cruzam: um primeiro que aponta para a necessidade de a tcnica processual executiva ser estruturada pela lei conforme o direito material, e um segundo que obriga o juiz a pensar a regra processual definidora das tcnicas processuais com base no direito fundamental tutela jurisdicional efetiva e segundo as necessidades de direito material particularizadas no caso concreto.

7.19 A jurisdio a partir do direito fundamental tutela jurisdicional efetiva

O direito fundamental tutela jurisdicional efetiva incide sobre o legislador e o juiz, ou seja, sobre a estruturao legal do processo e sobre a conformao dessa estrutura pela jurisdio.

Assim, obriga o legislador a instituir procedimentos e tcnicas processuais capazes de permitir a realizao das tutelas prometidas pelo direito material e, inclusive, pelos direitos fundamentais materiais, mas que no foram alcanadas distncia da jurisdio. Nesse sentido se pode pensar, por exemplo, nos procedimentos que restringem a produo de determinadas provas ou a discusso de determinadas questes, nos procedimentos dirigidos a proteger os direitos transindividuais, na tcnica antecipatria e nas sentenas e meios de execuo diferenciados. Na mesma dimenso devem ser visualizados os procedimentos destinados a permitir a facilitao do acesso ao Poder Judicirio das pessoas menos favorecidas economicamente, com a dispensa de advogado, custas processuais etc.

Porm, a estruturao tcnica do processo no suficiente para garantir a tutela dos direitos. que o procedimento, quando considerado como um conjunto de tcnicas previstas em abstrato para determinada situao de direito material, pode no ser capaz de permitir que o juiz responda s necessidades do caso concreto.

O juiz, ao tomar em conta a regra que estabelece o procedimento e a tcnica processual para determinada situao, deve relacion-la com o caso concreto, ou mais precisamente, com o sentido que atribuiu ao caso, o qual deve revelar as necessidades de direito material particularizadas na situao conflitiva. Nesse momento que a regra processual pode no ser suficiente para revelar a tcnica processual capaz de atender ao caso.

Contudo, como o direito fundamental tutela jurisdicional efetiva tambm incide sobre a jurisdio at porque constitui a contrapartida do dever estatal de proteo (que no apenas do legislativo) -, o juiz tem a obrigao de extrair da regra processual a tcnica adequada tutela das necessidades de direito material reveladas no caso concreto.

Na verdade, a procura da tcnica processual adequada exige no apenas a interpretao da norma processual de acordo com o direito fundamental tutela jurisdicional efetiva, mas tambm, para se evitar a declarao da sua inconstitucionalidade, o seu tratamento atravs das tcnicas da interpretao conforme e da declarao parcial de nulidade sem reduo de texto.

Assim, por exemplo, ao analisar a norma que afirma que a tutela antecipatria no pode ser concedida quando puder causar efeitos irreversveis ao ru, o juiz, ao invs de declarar a sua inconstitucionalidade, dever concluir que o texto legal apenas probe a sua concesso quando o valor do direito do ru, diante do caso concreto, no justificar tal risco. Isso porque o risco de prejuzo irreversvel, como bvio, por si s no pode impedir a concesso da tutela antecipatria, pois a proteo adiantada do direito tem como requisitos o risco de irreversibilidade ao direito do autor e a sua probabilidade. Ora, se o direito do autor provvel e est sendo ameaado de leso (e isso premissa para a concesso da tutela antecipatria), completamente irracional e injustificvel pensar que o direito do ru que ento improvvel no pode ser exposto a risco.

Mas, o que realmente importa, na linha que est sendo desenvolvida, a interpretao da norma processual de acordo com o direito fundamental tutela jurisdicional efetiva. A interpretao de acordo com esse direito fundamental (que processual) requer que a interpretao da regra processual seja feita segundo as necessidades de direito material particularizadas no caso concreto. Ou seja, a interpretao de acordo com o direito fundamental tutela jurisdicional efetiva exige a percepo da natureza instrumental da norma processual, ou melhor, a compreenso de que ela deve permitir ao juiz encontrar uma tcnica processual idnea tutela das necessidades do caso conflitivo.

Portanto, a interpretao de acordo com o direito fundamental tutela jurisdicional efetiva outorga ao juiz a obrigao de identificar as necessidades do caso concreto e de descobrir a tcnica processual idnea para lhe dar efetividade.

O art. 461 do CPC afirma que o juiz poder impor multa diria ao ru para constrang-lo ao cumprimento de uma ordem de fazer ou de no fazer, seja na concesso da tutela antecipatria, seja na sentena concessiva da tutela final (art. 461, 3 e 4), e tambm determinar, para dar efetividade a qualquer uma dessas decises, as medidas executivas necessrias, que so exemplificadas, pelo 5 do artigo 461, com a busca e apreenso, a remoo de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva.

O legislador deu ao juiz o poder de impor o meio executivo adequado (art. 461, 4 e 5), adotar a sentena idnea e conceder a tutela antecipatria (art. 461, 3), e assim fez apenas referncia a tcnicas processuais que podem ser utilizadas, mas sem precisar em que situaes de direito material, e muito menos em que casos concretos, elas podem ser aplicadas. A determinao dessas situaes e casos concretos foi expressamente deixada ao juiz, que assim ficou obrigado a preencher clusulas processuais gerais (art. 461, 4 e 5) e a dar sentido a conceitos indeterminados, como, por exemplo, justificado receio de ineficcia do provimento final (art. 461, 3), que constitui requisito para a concesso da tutela antecipatria.

Como se v, para a adequada prestao da tutela jurisdicional, o juiz obrigado a identificar e precisar as necessidades de direito material peculiarizadas no caso concreto. Ou seja, no h como o juiz ordenar um fazer ou um no-fazer sob pena de multa, determinar a busca e apreenso ou conceder a tutela antecipatria (sempre por exemplo), sem anteriormente identificar a razo pela qual est atuando, ou melhor, sem antes identificar as tutelas prometidas pelo direito material e as particularidades do caso concreto.

Frise-se que os procedimentos e as tcnicas processuais somente adquirem substantividade quando relacionados ao direito material e s situaes concretas, e por isso podem ser ditos neutros em relao ao direito substancial e realidade social quando pensados, por exemplo, como procedimentos ou tcnicas voltadas simplesmente imposio de um fazer ou busca e apreenso. Ora, no preciso muito esforo para evidenciar que impor um fazer, ou determinar uma busca e apreenso, no tem qualquer significado no plano do direito material ou concreto.

No por outra razo que se fala em tutela inibitria, ressarcitria, do adimplemento na forma especfica etc. Perceba-se que tutela significa o resultado jurdico-substancial do processo, representando o impacto do processo no plano do direito material. Quando se teoriza o tema das tutelas se tem em mira exatamente a imprescindibilidade da identificao das situaes de direito material para a compreenso crtica da lei processual e para o delineamento das tcnicas processuais capazes de outorgar efetividade prestao jurisdicional e, assim, coloc-la em uma dimenso realmente capaz de concretizar o direito fundamental tutela jurisdicional efetiva.

Mas ainda resta tratar dos casos de ausncia de tcnica processual ou de previso de tcnica processual para uma situao diferente da contemplada no caso concreto. Tome-se, como exemplo, o caso da execuo da tutela antecipatria de soma em dinheiro. O art. 273, 3, do CPC, afirma que a efetivao da tutela antecipada observar, no que couber e conforme sua natureza, as normas previstas nos arts. 588, 461, 4 e 5, e 461-A. Como o art. 461 trata da sentena que impe fazer ou no-fazer, o art. 461-A da sentena que impe entrega de coisa, e o art. 588 diz respeito apenas eficcia da execuo na pendncia do processo - e no sobre a forma mediante a qual a execuo de soma deve se realizar -, conclui-se que essa norma se omitiu em relao forma da execuo da tutela antecipatria de soma em dinheiro.

Essa omisso, no entanto, pode ser seguramente suprida quando se tem conscincia de que a tcnica processual depende apenas da individualizao das necessidades do caso concreto. Quer dizer que se o juiz identifica a necessidade de antecipao de soma em dinheiro, e por isso mesmo concede a tutela antecipatria, acaba lhe sendo fcil identificar a necessidade de um meio executivo capaz de dar efetivo atendimento tutela antecipatria.

Esse meio executivo, dada a urgncia que deve ser admitida como existente para a concesso da prpria antecipao da soma em dinheiro, obviamente no pode ser aquele que foi pensado, h quase um sculo, para dar atuao sentena que condena ao pagamento de dinheiro. Como as necessidades de direito material que tm relao com a tutela antecipatria e a sentena condenatria so aberrantemente distintas, pouco mais do que evidente que os meios executivos devem ser com elas compatveis.

Se o objetivo da multa dar maior celeridade e efetividade realizao das decises judiciais, no h racionalidade em admiti-la apenas em relao s decises que determinam fazer, no fazer ou entrega de coisa. A multa, alm de livrar a administrao da justia de um procedimento oneroso e trabalhoso e de eliminar os custos e os riscos da execuo por expropriao, confere tutela antecipatria de soma a tempestividade necessria para dar efetiva proteo ao direito material.

Portanto, no que diz respeito execuo da tutela antecipatria de soma, a multa meio executivo imprescindvel para permitir que o juiz responda ao direito fundamental tutela jurisdicional. Como esse direito fundamental incide sobre o Estado e, portanto, sobre o legislador e o juiz, evidente que a omisso do legislador no justifica a omisso do juiz.

Sublinhe-se, por fim, que a identificao das necessidades do caso concreto e a escolha da tcnica processual idnea para lhe dar proteo obviamente devem ser justificadas mediante argumentao racional capaz de convencer. Na verdade, mais do que definir as necessidades do caso e explicar o motivo pelo qual escolheu a tcnica processual utilizada, o juiz deve estabelecer uma relao racional entre as necessidades do caso concreto, o significado da tutela jurisdicional no plano substancial (que nada mais do que a expresso da tutela prometida pelo direito material, ou seja, a tutela inibitria etc) e a tcnica processual.

7.20 A subjetividade do juiz e a necessidade de explicitao da correo da tutela jurisdicional mediante a argumentao jurdica

evidente que a necessidade de compreenso da lei a partir da Constituio confere ao juiz maior subjetividade, o que vincula a legitimidade da prestao jurisdicional explicao da sua correo. Mas, o problema da legitimidade da tutela jurisdicional, no Estado contemporneo, est em verificar se possvel atribuir correo deciso do juiz, ou melhor, encontra-se na definio do que se pretende dizer com correo da deciso jurisdicional.

Na verdade, j vimos que no possvel chegar a uma teoria da deciso correta, isto , a uma teoria que seja capaz de sustentar a existncia de uma deciso correta para cada caso concreto. Porm, a circunstncia dessa impossibilidade no pode retirar do juiz o dever de demonstrar que a sua deciso racional e, nessa linha, a melhor que poderia ser proferida diante da lei, da Constituio e das peculiaridades do caso concreto.

Acontece que uma deciso no racional em si, pois a racionalidade da deciso no atributo dela mesma. Uma deciso se mostra racional ou no. Para tanto, necessita de algo, isto , da racionalidade da argumentao. Essa argumentao, a cargo da jurisdio, que pode demonstrar a racionalidade da deciso e, nesse sentido, a deciso correta.

certo que a deciso deve se guiar pela lei e pela Constituio, mas isso obviamente no suficiente como argumento em favor de uma deciso correta. Portanto, uma deciso racional no sinnima de uma deciso baseada apenas em dados dotados de autoridade, pois tambm exige uma argumentao fundada em pontos que no podem ser dedutivamente expostos. Ou melhor, a racionalidade do discurso jurdico necessariamente envolve a racionalidade do discurso que objetiva um juzo prtico ou moral.

Segundo Alexy, no so possveis teorias morais materiais que dem uma nica resposta, intersubjetivamente concludente, a cada questo moral, porm so possveis teorias morais procedimentais que formulem regras ou condies da argumentao ou da deciso prtica racional, sendo que a teoria do discurso prtico racional uma verso muito promissora de uma teoria material procedimental. Essa teoria tem uma grande vantagem sobre as teorias morais materiais, pois muito mais fcil fundamentar as regras da argumentao prtica racional do que as regras morais materiais.

Para o aperfeioamento da racionalidade da argumentao judicial, Alexy prope a passagem por quatro procedimentos ou a criao de um procedimento com quatro etapas ou graus: O primeiro o discurso prtico, envolvendo um sistema de regras que formula uma espcie de cdigo geral da razo prtica; o segundo o procedimento legislativo, constitudo por um sistema de regras que garante uma considervel medida de racionalidade prtica e, nesse sentido, justifica-se dentro das linhas do discurso prtico. Depois seguem o discurso jurdico e o procedimento judicial.

A teoria do discurso jurdico se assemelha teoria do discurso prtico por tambm constituir uma teoria procedimental fundada em regras de argumentao e ser incapaz de levar a um nico resultado, caracterizando-se por ser sujeita lei, aos precedentes judiciais e dogmtica. O discurso jurdico restringe a margem de insegurana do discurso prtico, mas, devido ao fato de que a argumentao prtica obrigatoriamente se insere na argumentao jurdica, obviamente no permite chegar a um grau de certeza suficiente, no eliminando a insegurana do resultado.

Da a necessidade do procedimento judicial, no qual, do mesmo modo do que ocorre no procedimento legislativo, h argumentao e deciso. Adverte Alexy que os resultados do procedimento judicial so razoveis se as suas regras e a sua realizao satisfazem as exigncias dos procedimentos que lhe antecedem, isto , as regras do discurso prtico, do procedimento legislativo e do discurso jurdico.

7.21 A regra do balanceamento dos direitos fundamentais, a interpretao de acordo e as tcnicas de controle da constitucionalidade diante da argumentao jurdica

Como foi dito acima, embora os princpios no possam ser hierarquizados, eles podem ser colocados em ordem mediante uma relao de prioridade. Essa prioridade significa que os direitos de liberdade e igualdade preferem aos demais direitos fundamentais. Ou melhor, tal prioridade ou preferncia faz com que os direitos fundamentais no estejam em um mesmo plano, na perspectiva da argumentao, quando se chocam em um caso concreto.

Quando, por exemplo, o direito de liberdade de expresso colide com o direito honra, j existe em favor do direito de liberdade uma carga argumentativa implcita. Assim, caso a argumentao em favor do direito da personalidade no seja capaz de demonstrar que o direito de liberdade deve ceder, isso no ocorrer. Para que um princpio possa se sobrepor ao princpio da liberdade preciso uma argumentao mais forte do que a necessria para sustent-lo. Ou seja, a argumentao constitui nus do direito que confronta com o direito de liberdade, isto , do direito que no se vale da ordem de prioridade.

Como fcil perceber, ao se outorgar prioridade aos princpios da liberdade e da igualdade, articula-se uma forma de argumentao que se diferencia de acordo com a natureza do direito fundamental, estruturando-se uma argumentao jurdica segundo os princpios.

Porm, quando se argumenta em favor de um direito fundamental em face de outro, devem ser consideradas as particularidades do caso concreto que podem demonstrar a necessidade de precedncia de um direito sobre o outro. Nesse sentido, para a argumentao em favor do direito honra, devem ser invocadas particularidades do caso concreto que permitam concluir que esse direito deva preceder ao direito de liberdade. Como bvio, no basta salientar que a argumentao estruturada segundo a natureza do direito fundamental; preciso deixar claro que essa argumentao deve recair nas caractersticas concretas que sejam capazes de sustentar tal argumentao.

A partir da no difcil descer para a interpretao de acordo e para as tcnicas de controle da constitucionalidade. A interpretao de acordo exige que em primeiro lugar se faa a interpretao da lei segundo os mtodos clssicos de interpretao. Encontrando-se duas ou mais interpretaes viveis, o raciocnio deve buscar aquela que melhor se ajusta s normas constitucionais. Ou melhor, o resultado preferido pelo intrprete deve ser o que melhor realize o desejo da norma constitucional, ou ainda, o que d a maior efetividade possvel ao direito fundamental.

Nesse caso no se prefere o direito fundamental em detrimento da lei e no se conclui que a lei no afronta o direito fundamental, mas apenas se afirma a melhor soluo diante do direito fundamental. De modo que no preciso argumentar contra ou a favor da lei, mas apenas em prol da sua melhor interpretao, isto , da soluo que confira a maior efetividade ao direito fundamental.

O mesmo no ocorre nos casos de controle da constitucionalidade. A no h como interpretar a lei de acordo, pois a lei no compatvel com a Constituio. No clssico controle difuso da inconstitucionalidade da lei, o juiz deve argumentar que a interpretao da lei no se concilia com a Constituio. Portanto, em desfavor da lei e em favor da Constituio.

No caso de interpretao conforme, a lei, aplicada em sua literalidade, inconstitucional - e assim preciso agregar algo ao texto legal para que surja uma norma jurdica conforme a Constituio , ao passo que, na hiptese de declarao parcial de nulidade (inconstitucionalidade) sem reduo de texto, determinadas interpretaes da lei so inconstitucionais. De modo que no o caso de procurar a interpretao que d maior efetividade Constituio.

Nesses casos preciso argumentar: i) que a aplicao da lei, na sua literalidade, conduz a um juzo de inconstitucionalidade (interpretao conforme) ou que determinadas interpretaes da lei violam a Constituio (declarao parcial de nulidade); ii) que as normas jurdicas, frutos dessas interpretaes, podem ser transformadas a partir da prpria Constituio; e iii) que essa transformao necessria e oportuna para que a lei no seja declarada inconstitucional.

Mediante o emprego de tais tcnicas possvel encontrar uma nica norma jurdica capaz de impedir a declarao de inconstitucionalidade ou vrias normas jurdicas que possam evit-la, argumentando-se, na primeira hiptese, ser essa a nica interpretao capaz de fazer valer a Constituio e, no segundo caso, que as interpretaes originrias so contrrias Constituio, embora existam outras que, transformando essas normas jurdicas, sejam idneas na compreenso constitucional.

A direo da argumentao volta a se modificar no caso de omisso constitucional. Nessa hiptese necessrio argumentar que o direito fundamental necessita de uma lei para implement-lo ou para proteg-lo. Assim, preciso demonstrar que o direito fundamental necessita de uma regra legal para lhe dar efetividade. Como bvio, no se trata de argumentar contra a lei pois ela no existe -, mas de sim de argumentar que a ausncia de lei impede a realizao do direito fundamental. Nesse caso, como a amplitude da prestao jurisdicional no circunscrita pela lei (que no existe), a tutela jurisdicional, ainda que necessria para a tutela do direito fundamental no protegido pelo legislador, deve configurar a menor restrio possvel esfera jurdica do demandado, o que acaba tambm fazendo parte da carga de argumentao necessria para a supresso da omisso inconstitucional.

Mas no basta apenas demonstrar de que forma a argumentao incide diante da regra do balanceamento, da interpretao de acordo e das tcnicas de controle da constitucionalidade, sendo tambm necessrio precisar em que termos a lei e os direitos fundamentais sujeitam a argumentao.

claro que os mtodos de interpretao dos direitos fundamentais so completamente diferentes daqueles que servem para dar significado lei. Mas isso aqui no importa. Interessa constatar que o texto da lei sujeita a argumentao com mais intensidade do que o texto da norma de direito fundamental, mas igualmente perceber que a argumentao tambm vinculada pelo texto da norma de direito fundamental.

As normas de direito fundamental so naturalmente abertas e, assim, certo dizer que a lei mais objetivvel do que os direitos fundamentais. De modo que mais fcil, ao menos como regra geral, atribuir significado a uma lei do que a um direito fundamental, o que faz com que o texto da lei goze, nessa dimenso, de uma posio de vantagem em relao ao texto da norma de direito fundamental.

Porm, bvio que dos textos das normas de direito fundamental podem ser retirados significados, e que esses tm evidente impacto sobre a argumentao. Por esse motivo, o texto da norma de direito fundamental, assim com o texto da lei, tambm sujeita a argumentao. No se quer dizer, evidentemente, que o texto da norma de direito fundamental no admita argumento contrrio, mas sim que necessrio, nesse caso, que a argumentao tenha um peso capaz de justificar, a partir da prpria Constituio, que o intrprete se afaste do texto.

O texto da norma de direito fundamental, da mesma maneira que o texto da lei, faz com que o peso da argumentao recaia sobre aquele que tem interesse em demonstrar um resultado que a ele contrrio. Nesse sentido, possvel dizer que o texto da norma possui, por assim dizer geneticamente, o peso da argumentao do seu lado.

Por outro lado, sabe-se que a lei, em princpio, considerada de acordo com a Constituio. Por isso, a declarao da inconstitucionalidade da lei exige que a argumentao tenha um peso capaz de demonstrar a sua incompatibilidade com os direitos fundamentais. Quer dizer que, quando da comparao dos significados da lei e do direito fundamental, a argumentao, em um plano esttico, prepondera em favor da lei, obrigando a argumentao a demonstrar, no plano dinmico, que o direito fundamental invalida a lei.

7.22 A argumentao jurdica em prol da tcnica processual adequada ao direito fundamental tutela jurisdicional

Para a descoberta da tcnica processual adequada preciso interpretar a norma processual de acordo com o direito fundamental tutela jurisdicional efetiva ou tratar da norma processual atravs das tcnicas da interpretao conforme e da declarao parcial de nulidade sem reduo de texto.

Mas, para a busca da interpretao de acordo ou para se agregar algo mais interpretao da regra processual, tornando-a capaz de fornecer a tcnica adequada, necessrio delimitar as necessidades de direito material reveladas no caso concreto. Isso significa que a argumentao, porque deve relacionar a regra processual ao direito material, assume uma configurao marcada pela instrumentalidade da norma interpretada.

Antes de partir para o encontro da tcnica processual adequada, o juiz deve demonstrar as necessidades de direito material, indicando como as encontrou no caso concreto. De maneira que a argumentao se desenvolve sobre um discurso de direito material j justificado. Nesse caso existem dois discursos jurdicos, um sobre o direito material e outro sobre o direito processual. O discurso de direito processual um sobre-discurso, no sentido de que recai sobre um discurso jurdico que lhe serve de base para o desenvolvimento. O discurso jurdico processual , em outros termos, um discurso que tem a sua base comprometida pelo discurso de direito material.

Alm disso, como tais discursos se entrelaam diante do juiz, certo que a idoneidade de ambos se vale dos benefcios gerados pela realizao e pela observncia das regras do procedimento judicial. Mas, ainda assim, no se pode deixar de perceber a ntida distino entre um discurso de direito material legitimado pela observncia do procedimento judicial e um discurso de direito processual que, alm de se beneficiar das regras do procedimento judicial, sustenta-se sobre um outro discurso (de direito material).

E o problema no aumenta muito de tamanho quando se pensa na incidncia direta do direito fundamental tutela jurisdicional efetiva sobre o trabalho do juiz, pois nessa situao isso tambm se d aps a justificao das necessidades concretas de direito material.

A diferena, em termos de argumentao, que o juiz dever demonstrar que as necessidades de direito material exigem uma tcnica que no est abarcada pela legislao processual ou que est prevista para outra situao, e no para a revelada no caso concreto. Cumprida essa fase pela argumentao, restar outra questo, naturalmente decorrente da prpria inexistncia da tcnica processual. Ao juiz no bastar demonstrar a imprescindibilidade de determinada tcnica processual no prevista pela lei, sendo necessrio argumentar, considerando o direito de defesa, que ela deve prevalecer no caso concreto.

Na interpretao de acordo, argumenta-se em prol de uma interpretao que, sendo capaz de atender s necessidades de direito material, confira a devida efetividade ao direito fundamental tutela jurisdicional. Lembre-se, porm, que as clusulas processuais abertas, como, por exemplo, a do art. 461 do CPC, devem ser concretizadas a partir das necessidades do direito material reveladas no caso, pois se destinam a dar mobilidade ao juiz para dar efetividade ao direito material. Mas, para dar efetividade ao direito material, o juiz deve encontrar um modo que esteja de acordo com o direito fundamental tutela jurisdicional efetiva e, portanto, correto dizer que a concretizao dessas clusulas, ainda que obviamente servindo para a adequada proteo do direito material, deve ser feita de acordo com o direito fundamental tutela jurisdicional. Alm do mais, como esse modo a expresso da concretizao de uma clusula aberta, o juiz, para a chegar, deve argumentar que o modo encontrado, alm de adequado e idneo em relao ao direito fundamental tutela jurisdicional efetiva, deve prevalecer diante do direito de defesa.

Na interpretao conforme, argumenta-se que a lei, consideradas as necessidades do caso concreto e o direito fundamental tutela jurisdicional, precisa de algo mais ou de um ajuste para no ser dita inconstitucional. Na declarao parcial de nulidade, o argumento deve ser no sentido de que determinadas interpretaes inviabilizam o efetivo atendimento das necessidades de direito material e, por conseqncia, a atuao do direito fundamental.

Por fim, no que diz respeito incidncia direta desse direito fundamental, cabe ao juiz, alm de demonstrar que a necessidade de direito material revelada no caso concreto no encontra tcnica processual adequada na legislao processual e que essa omisso impede a realizao do direito fundamental tutela jurisdicional efetiva, tambm argumentar que o modo de supresso dessa omisso, consideradas as particularidades do caso concreto, no afronta o direito de defesa.

7.23 Concluses acerca da concepo contempornea de jurisdio

Diante da transformao da concepo de direito, no h mais como sustentar as antigas teorias da jurisdio, que reservavam ao juiz a funo de declarar o direito ou de criar a norma individual, submetidas que eram ao princpio da supremacia da lei e ao positivismo acrtico.

O Estado constitucional inverteu os papis da lei e da Constituio, deixando claro que a legislao deve ser compreendida a partir dos princpios constitucionais de justia e dos direitos fundamentais. Expresso concreta disso so os deveres de o juiz interpretar a lei de acordo com a Constituio, de controlar a constitucionalidade da lei, especialmente atribuindo-lhe novo sentido para evitar a declarao de inconstitucionalidade, e de suprir a omisso legal que impede a proteo de um direito fundamental. Isso para no falar do dever, tambm atribudo jurisdio pelo constitucionalismo contemporneo, de tutelar os direitos fundamentais que se chocam no caso concreto.

Mas se o juiz, ao cumprir tais funes, fica muito longe das idias de declarao da lei e de criao da norma individual, ele passou a ter o poder de criar o direito. O juiz est sujeito s normas constitucionais e, portanto, se pode conformar a lei e a legislao ou mesmo tutelar os direitos que colidem no caso concreto, isso evidentemente no quer dizer que possa criar o direito.

Porm, quando se compreende norma como texto e norma jurdica como interpretao dela decorrente, torna-se fcil atribuir ao juiz a misso de criar a norma jurdica que cristaliza a compreenso da lei na medida das normas constitucionais - ou mesmo, na hiptese especfica de tutela de direitos fundamentais colidentes, a razo jurdica determinante, diante do caso concreto, da prioridade de um direito fundamental sobre o outro.

Contudo, dizer que a jurisdio objetiva apenas atribuir significado e aplicao aos valores constitucionais no permite abarcar toda a complexidade da funo jurisdicional. Isso porque, ainda que o juiz tenha como parmetro as normas constitucionais, cabe-lhe, antes de tudo, dar tutela ao direito material. Tanto verdade que lhe incumbe atribuir sentido ao caso, definindo as suas necessidades concretas, para ento buscar na lei a regulao da situao que lhe foi apresentada, ainda que isso deva ser feito luz da Constituio.

A importncia da perspectiva de direito material fica ainda mais ntida quando se deixa claro que a funo do juiz no apenas a de editar a norma jurdica, mas sim a de tutelar concretamente o direito material, se necessrio mediante meios de execuo.

O direito fundamental tutela jurisdicional, alm de ter como corolrio o direito ao meio executivo adequado, exige que os procedimentos e a tcnica processual sejam estruturados pelo legislador segundo as necessidades do direito material e compreendidos pelo juiz de acordo com o modo como essas necessidades se revelam no caso concreto.

Note-se que os direitos fundamentais materiais, alm de servirem para iluminar a compreenso do juiz sobre o direito material, conferem jurisdio o dever de proteg-los (ainda que o legislador tenha se omitido), ao passo que o direito fundamental tutela jurisdicional efetiva incide sobre a atuao do juiz como diretor do processo, outorgando-lhe o dever de extrair das regras processuais a potencialidade necessria para dar efetividade a qualquer direito material (e no apenas aos direitos fundamentais materiais) e, ainda, a obrigao de suprir as lacunas que impedem que a tutela jurisdicional seja prestada de modo efetivo a qualquer espcie de direito.

O juiz tem o dever de utilizar o procedimento e a tcnica idnea efetiva tutela do direito material. Por isso deve interpretar a regra processual de acordo, trat-la com base nas tcnicas da interpretao conforme e da declarao parcial de nulidade sem reduo de texto, ou suprir a omisso legal que, ao inviabilizar a tutela das necessidades concretas, impede a realizao do direito fundamental tutela jurisdicional.

Porm, diante da maior subjetividade outorgada ao magistrado para a tutela dos direitos - natural a uma lgica que faz as normas constitucionais preponderarem sobre a legislao - e da impossibilidade de se encontrar uma teoria capaz de sustentar a existncia de uma deciso correta para cada concreto, preciso atribuir ao juiz o dever de demonstrar que a sua deciso a melhor possvel mediante uma argumentao fundada em critrios racionais.

Por outro lado, preciso deixar claro que a pacificao social apenas uma conseqncia da adequada tutela jurisdicional, e no um elemento capaz de definir a essncia da jurisdio. Alm disso, importante frisar que a jurisdio exerce, no Estado contemporneo, uma relevante funo diante da imprescindibilidade da participao popular na reivindicao dos direitos transindividuais e na correo dos desvios na gesto da coisa pblica.

Eugenio Bulygin, Los jueces crean derecho?, Texto apresentado ao XII Seminario Eduardo Garca Maynez sobre teoria e filosofia do direito, organizado pelo Instituto de Investigaciones Jurdicas y el Instituto de Investigaciones Filosficas de la UNAM, p. 10.

Eugenio Bulygin, Los jueces crean derecho?, Texto apresentado ao XII Seminario Eduardo Garca Maynez sobre teoria e filosofia do direito, organizado pelo Instituto de Investigaciones Jurdicas y el Instituto de Investigaciones Filosficas de la UNAM, p. 13-14

Ver Gustavo Zagrebelsky, El derecho dctil, cit., p. 136-139.

Para a compreenso dessa idia, ver o prximo item.

Ver Gustavo Zagrebelsky, El derecho dctil, cit., p. 136-139.

Lembre-se que os direitos fundamentais fundam princpios objetivos orientadores do modo de ser do ordenamento jurdico.

Ver Javier Jimnez Campo, Derechos fundamentales. Concepto y garantas, Madrid: Trotta, 1999, p. 51

A teoria da norma jurdica repousa na idia fundamental de que a norma, objeto da interpretao, no se identifica com o texto, antes se apresenta como o resultado de um trabalho de construo, correntemente designado de concretizao. Mesmo o juiz, logo um tribunal, longe de se limitar a aplicar automaticamente a norma a um caso particular, exercer uma liberdade de opo (discretion) que opera, em termos prticos e operativos, como uma verdadeira deciso. E como o texto suscetvel de comportar vrios significados (plurisignificatividade), tarefa do juiz escolher de entre estes a norma a aplicar ou regra de deciso. essa escolha ou opo que correntemente se designa de interpretao. Esta consiste na determinao do significado objetivo de um texto. Isto leva necessariamente a uma interpretao integrativa do texto no quadro de uma teoria da norma para o caso particular (case law, Fallnorm) (Cristina Queiroz, Direitos fundamentais. Coimbra: Coimbra Editora, 2002, p. 178).

Sobre o conceito de parte dispositiva da sentena, ver adiante o item A grande peculiaridade da norma criada pelo juiz: a necessidade da sua fundamentao.

Ver acima item A deciso a partir dos princpios constitucionais e dos direitos fundamentais.

Robert Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, cit, p. 540-552.

Ver acima o item A teoria dos direitos fundamentais como teoria dos princpios.

Robert Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, cit, p. 552.

De acordo com Alexy, las condiciones bajo las cuales un principio precede a otro constituyen el supuesto de hecho de una regla que expresa la consecuencia jurdica del principio precedente (Robert Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, cit, p. 94-95). Alexy chama este enunciado ou lei de lei de coliso, que constitui um dos fundamentos da sua teoria dos princpios.

Segundo Srgio Moro, quando declarada a inconstitucionalidade de uma lei, o grau de interferncia da jurisdio sobre o legislativo maior do que quando se faz o controle da inconstitucionalidade por omisso no caso concreto (Sergio Fernando Moro, Jurisdio constitucional como democracia, So Paulo: Ed. RT, 2004, p. 244).

Eugenio Bulygin, Los jueces crean derecho?, Texto apresentado ao XII Seminario Eduardo Garca Maynez sobre teoria e filosofia do direito, organizado pelo Instituto de Investigaciones Jurdicas y el Instituto de Investigaciones Filosficas de la UNAM, p. 8.

Eugenio Bulygin, Los jueces crean derecho?, Texto apresentado ao XII Seminario Eduardo Garca Maynez sobre teoria e filosofia do direito, organizado pelo Instituto de Investigaciones Jurdicas y el Instituto de Investigaciones Filosficas de la UNAM, p. 11.

Eugenio Bulygin, Los jueces crean derecho?, Texto apresentado ao XII Seminario Eduardo Garca Maynez sobre teoria e filosofia do direito, organizado pelo Instituto de Investigaciones Jurdicas y el Instituto de Investigaciones Filosficas de la UNAM, p. 12.

Eugenio Bulygin, Los jueces crean derecho?, Texto apresentado ao XII Seminario Eduardo Garca Maynez sobre teoria e filosofia do direito, organizado pelo Instituto de Investigaciones Jurdicas y el Instituto de Investigaciones Filosficas de la UNAM, p. 12.

Eugenio Bulygin, Los jueces crean derecho?, Texto apresentado ao XII Seminario Eduardo Garca Maynez sobre teoria e filosofia do direito, organizado pelo Instituto de Investigaciones Jurdicas y el Instituto de Investigaciones Filosficas de la UNAM, p. 12.

The function of a judge is to give concrete meaning and application to our constitutional values (Owen Fiss, The forms of justice, Harvard Law Review, 93, novembro/1979, p. 4).

The task of the judge is to give meaning to constitutional values, and he does that by working with the constitutional text, history, and social ideals (Owen Fiss, The forms of justice, Harvard Law Review, 93, novembro/1979, p. 4).

Will Kymlicka (Multicultural Citizenship. A liberal theory of minority rights, Oxford: Clarendon Press, 1995), embora em outro plano, afirma que o Estado deve instituir direitos diferenciados em benefcio de alguns grupos - peculiarizados pela raa ou classe ou caracterizados por culturas minoritrias -, advertindo que a proteo dos direitos das minorias no fere os princpios liberais bsicos, como o princpio liberal em favor da igualdade (Cf. Roberto Gargarella, Las teoras de la justicia despus de Rawls, Barcelona: Paids, 1999, p. 151). Ver, tambm, Roberto Gargarella, Crisis de la representacin poltica, Mxico: BEFDP, 1997, p. 49-76.

Em outra parte do seu artigo The forms of justice, Fiss afirma: Judges have no monopoly on the task of giving meaning to the public values of the Constitution, but neither is there reason for them to be silent. They too can make a contribution to the public debate and inquiry. Adjudication is the social process by which judges give meaning to our public values (Owen Fiss, The forms of justice, Harvard Law Review, 93, novembro/1979, p. 1).

Ver Lei n. 4.717/65, que regula a ao popular.

Segundo o art. 1, caput, da Lei 4.717/65, legitimado para a ao popular qualquer cidado. O 3 deste artigo diz que a prova da cidadania, para ingresso em juzo, ser feita com o ttulo eleitoral, ou com documento que a ele corresponda.

Canotilho, quando alude s tcnicas diretas de participao democrtica, fala em democratizar a democracia atravs da participao (Jos Joaquim Gomes Canotilho, Direito constitucional, cit, p. 366).

A sentena declaratria tambm pode limitar-se declarao da autenticidade ou falsidade de documento (art. 4, II, CPC). Alm disso, admissvel a ao declaratria ainda que tenha ocorrido a violao do direito (art. 4, pargrafo nico, CPC).

Isso para no falar em teorias ainda mais insustentveis, como as que afirmavam que o direito de ao depende da existncia do direito material ou de uma sentena de procedncia.

Ver Luiz Guilherme Marinoni e Srgio Cruz Arenhart, Manual do processo de conhecimento. So Paulo: Ed. RT, 2005, 4a. ed., pp. 419-427.

No direito portugus reconhece Canotilho: a existncia de uma proteco jurdica eficaz pressupe o direito execuo das sentenas (fazer cumprir as sentenas) dos tribunais atravs dos tribunais (ou de outras autoridades pblicas), devendo o Estado fornecer todos os meios jurdicos e materiais necessrios e adequados para dar cumprimento s sentenas do juiz. Esta dimenso da proteo jurdica extensiva, em princpio, execuo de sentenas proferidas contra o prprio Estado (CRP, art. 205./2 e 3, e, em termos constitucionalmente claudicantes, o Decreto-lei 256/A/77, de 17 de junho, art. 5. e ss., e Decreto-lei 267/85, de 12 de julho, art. 95. e ss.). Realce-se que, no caso de existir uma sentena vinculativa reconhecedora de um direito, a execuo da deciso do tribunal no apenas uma dimenso da legalidade democrtica (dimenso objectiva), mas tambm um direito subjectivo pblico do particular, ao qual devem ser reconhecidos meios compensatrios (indemnizao), medidas compulsrias ou aces de queixa (cfr. Conveno Europia dos Direitos do Homem, art. 6.), no caso de no execuo ilegal de decises dos tribunais (cfr. o caso Hornsby, de 19.03.1997, em que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem sublinha o momento de execuo como dimenso intrnseca da Declarao do Processo) (Joaquim Jos Gomes Canotilho, Direito constitucional e teoria da Constituio. Coimbra: Almedina, 2002. p. 496).

Os procedimentos dos Juizados Especiais Cveis.

Art. 273 (....)

2 No se conceder a antecipao da tutela quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.

(...).

Ver Luiz Guilherme Marinoni, Tutela inibitria, So Paulo: Ed. RT, 2003, 3. ed e Tcnica processual e tutela dos direitos, So Paulo, Ed. RT, 2004.

A execuo sob pena de multa somente tem sentido em relao ao devedor que possui patrimnio suficiente para responder ao crdito. Na hiptese de devedor sem patrimnio, no cabe, como bvio, a execuo sob pena de multa. Assim, na hiptese de antecipao da execuo, o juiz deve dar ao ru a oportunidade de justificar o no adimplemento. Alm disso, fundamental que o juiz estabelea prazo suficiente para o ru adimplir, sendo que a sua justificativa tambm pode ser no sentido de que necessita de mais tempo para cumprir a obrigao (Ver Luiz Guilherme Marinoni, A antecipao da tutela, So Paulo: Ed. RT, 2004, 8. ed).

A respeito da argumentao jurdica, alm das teses precursoras de Perelman (Perelman e Olbrecht-Tyteca, Trattato dellargomentazione, Torino: Einaudi, 1966), Viehweg (Tpica e jurisprudncia, Braslia: UNB, 1979) e Toulmim (The uses of argument, Cambridge: Cambridge Universiy Press, 1958), so fundamentais as teorias de MacCormick (Legal reasoning and legal theory, Oxford: Oxford University Press, 1978) e Alexy (Teoria da argumentao jurdica, So Paulo: Landy, 2001)

Sobre a conexo entre direito e moral no pensamento de Alexy, ver a polmica travada entre Alexy e Bulygin, La pretensin de correccin del derecho, Bogot: Universidad Externado de Colombia, 2001.

Robert Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, cit, p. 530.

Robert Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, cit, p. 531.

Robert Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, cit, p. 532.

Robert Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, cit, p. 532.

Ver item A teoria dos direitos fundamentais como teoria dos princpios

Cf. Robert Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, cit, p. 549.

Cf. Robert Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, cit, p. 549.

Cf. Robert Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, cit, p. 549.

Como j foi explicado, a teoria da norma jurdica repousa na idia fundamental de que a norma, objeto da interpretao, no se identifica com o texto, antes se apresenta como o resultado de um trabalho de construo, correntemente designado de concretizao (Cristina Queiroz, Direitos fundamentais, cit., p. 178).

Com o texto das disposies jusfundamentais concilivel muito, porm no tudo. O fato de que o texto exija ou exclua uma determinada interpretao um argumento muito forte em favor ou contra essa interpretao (...) O fato de que o argumento semntico seja muito forte no significa que se imponha sempre (...) no basta expor que a soluo contrria ao texto melhor do que a conforme ao texto; as razes em favor de uma soluo contrria ao texto tm que ter um peso tal que, do ponto de vista da Constituio, justifiquem um afastamento do texto (...) Portanto, o texto das disposies jusfundamentais vincula a argumentao jusfundamental porque existe em seu favor a carga da argumentao (Robert Alexy, Teoria de los derechos fundamentales, cit, p. 534). Ver tambm Robert Alexy, Teoria da argumentao jurdica, cit., p. 182 e ss.

Ver acima o item A jurisdio a partir do direito fundamental tutela jurisdicional efetiva.