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A LEGITIMADADE DIVINA DO MAGISTRADO CIVIL
A VISO REFORMADA SOBRE A RELAO DA IGREJA COM O ESTADO
Michel Cristiano
Monografia Apresentada ao
Seminrio Teolgico do Nordeste - STNe
Memorial Igreja Presbiteriana da Coria MIPC
Para a Obteno do Grau de Bacharel em Teologia
INTRODUO
O tema do Magistrado Civil dentro do circulo evanglico no tem sido na maioria
das vezes de grande interesse por parte dos fieis. Apesar de vivermos, hoje, sem a
perseguio do Estado, de forma como era antes, em qualquer circulo de pessoas o assunto
que envolve descaso e corrupo por parte do governo est sempre presente em nosso dia a
dia. Crentes que buscam se aprofundar no entendimento bblico e ter uma vida prtica
condizente com a Palavra de Deus, se envolvem algumas vezes em atitudes erradas para
com Estado, achando por vezes que est certo. Da surgem perguntas como: lcito a um
homem de Deus participar da poltica de greves e ainda de revolues? E o que fazer
quando somos governados por um tirano?
Pensando nisso, e vendo a falta de material que conduz a uma boa instruo nessa
rea, me predisps a escolher este tema, para uma abordagem histrica, bblica e
sistemtica confessional, a fim de trazer o melhor entendimento possvel sobre a
legitimidade do Magistrado Civil e seus deveres como tambm a nossa obrigao como
Igreja para com o Estado.
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CAPTULO 1
LEGITIMIDADE DIVINA DO MAGISTRADO CIVIL E O SEU DESENVOLVIMENTO
HISTRICO
O conceito de legitimidade divina do magistrado civil, desde os primrdios do
cristianismo, no foi preocupao da igreja nem quanto ao tipo de sistema governamental
que devia ser vigente, quanto na quebra do quinto mandamento. impressionante a postura
dos cristos ante tirania do imprio. No se tem vestgio de manifestaes populares ou
at mesmo cartas com esse fim, incluindo at as menores linhas sobre tal assunto. Na
verdade os apologetas argumentaram a falta de razo para a perseguio contra os cristos
por parte do Estado, mas nunca levantaram uma nica linha que argumentasse contra o tipo
do sistema governamental imposto naquela poca. Vemos grandes homens de Deus
submissos a suas execues como fruto da conscincia de que a perseguio era promovida,
exclusivamente, por poderes malignos que controlavam o Estado. A esperana dos cristos
no residia na revoluo armada poltica, mas na cristianizao do sistema.
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A. A RELAO DE IGREJA E ESTADO NOS PRIMEIROS SCULOS
A simples frase Da a Csar o que de Csar, e a Deus o que de Deus suou de
forma revolucionria para uma mentalidade em que os conceitos antigos no faziam
qualquer distino entre uma esfera religiosa e outra no religiosa. Tudo estava
profundamente permeado pelo sagrado, de modo que, no perodo anterior aos hebreus, a
relao entre religio e Estado era de incio e estreita entre as duas foras. O Estado
prevalecia como parceiro dominante1.
O termo colocado por Flvio Josefo para o tipo de governo pertencente aos antigos
hebreus, foi de teocracia. A f no era acreditada como religio do Estado, mas como o
prprio Estado2. O povo de Israel tinha como esperana um grande lder que iria
estabelecer de volta o Estado Israel em oposio ao poderio romano. A antiga teocracia
judaica precisava ser estabelecida nas mos daquele que seria o descendente de Davi. Os
impostos que eram constantemente cobrados pelos romanos fizeram os fariseus juntamente
com os herodianos, saber, quais eram as verdadeiras intenes de Jesus com relao ao
Estado. Mesmo que as intenes deles tivesse como objetivo acus-lo, o simples povo ao
redor de Cristo, na expectativa, esperava dEle, talvez, uma resposta revolucionria, essa
caracterstica, j era alimentada desde a infncia do povo de Israel, do Messias libertador de
Israel3.
1Alderi Souza de Matos, Igreja e Estado, ( So Paulo: Centro Presbiteriano de ps-graduao Andrew Jumper, 2000),1,2. 2 Ibid, 1. 3 Comentrio meu
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1. Influncia Helnica sobre o Magistrado Civil
A idia de que tudo est permeado pelo sagrado visto tambm na antiga Grcia,
sem qualquer distino entre o religioso e o secular. As cidades repblicas gregas eram
caracterizadas pela unidade entre a religio subserviente e o Estado dominante. O cidado
ateniense estava livre para cultuar os seus deuses particulares, mas tinha o dever de
participar do culto a Zeus e a Apolo do modo prescrito pela lei4.
J nesse perodo, os gregos estavam cnscios do processo do pensamento filosfico,
a partir do questionamento sobre qual seria o melhor governo: dos homens ou das leis? Tal
discusso era feita entre os maiores filosficos que o mundo j conheceu, Plato,
Aristteles e Scrates5. Talvez fosse o primeiro sinal da idia de separao entre o que
sagrado e o secular. O primeiro sculo j estava permeado desses pensamentos provindos
dos filsofos gregos que muito contriburam para a formao do pensamento poltico e seu
relacionamento com a Igreja6.
O filsofo Plato, com o intuito de procurar na moral o bem supremo da virtude,
percebeu que convinha mais procurar corrigir a poltica e as instituies do que o
aperfeioamento dos indivduos. A Repblica de Plato , pois, uma utopia impraticvel
como tantas outras, porm muito dos meios que ele persegue nesse ideal, so, na verdade,
aplicveis e lhe fazem grande honra. Para Plato uma calamidade para um Estado, quando
os tribunais fracos ou mudos ocultam ao pblico os seus julgamentos, pronunciando
sentenas, a portas fechadas. A lei no deve agravar a pena do roubo em proporo do seu
4 Ibid, 1. 5 Roberto Bobbio, O futuro da democracia, (So Paulo: Paz e Terra, 2002),165. 6 Comentrio meu
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valor, mas somente em caso em que aquele que o cometeu, se mostre incorrigvel. Plato
chegou at a prever que, se aparecesse sobre a terra um ente sumamente justo, seria preso,
castigado e crucificado por aqueles que, cheios de iniqidade, teriam a fama de justiceiros.
Assim, enquanto as sociedades caprichosas e turbulentas da Grcia, aturdidas pela sua
liberdade arbitrria esqueciam as leis estveis da humanidade e abandonavam o direito s
flutuaes populares ou a sbios sofismas, Plato proclamava uma justia superior e eterna
ordem e moral. Isso terminou, na sua concepo de Deus, de humanidade e de cidade, a
depreciar o individuo homem, ultrajando a sua liberdade considerando-o simplesmente
arvores de uma grande floresta, as quais o machado faz servir todas a um mesmo fim. Por
este motivo ele deseja que certas verdades no sejam divulgadas, estabelecendo assim uma
aristocracia do saber7. Plato defendia a idia do governo a partir dos melhores homens,
no a partir da forma, mas do modo de governar. Aristteles, por sua vez, era totalmente
contrario a essa idia e acreditava na fora da lei como senhora dos governantes8. A igreja
Catlica Romana partir da idia de Plato em que o Estado deve ser somente governado a
partir dos melhores homens, nesse caso aqueles que servem a Deus, principalmente o
Papa9.
impossvel deixar de falar da influncia do pensamento grego na era crist quando
o assunto poltica. Quando a igreja pensava em viver s, aps um certo tempo, percebeu-
se permeada pelo Estado. A dvida se o Estado deve ser governado por sacerdotes ou civis
j era assunto entre os filsofos antes de Cristo. No perodo conhecido por Homrico, a
7 Csare Cantu, Histria Universal, (So Paulo: Das Amricas, 1960),119,120,121. 8 Bobbio, O futuro da democracia, 166. 9 Will Durant, Introduo a Filosofia, A Vida e as Idias dos Grandes Filsofos. (So Paulo: Editora Nacional, 1926).
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Grcia era fortemente marcada pelos cls, comunidade fortemente baseada no parentesco,
sem quaisquer desigualdades10. A transio do domnio rural comandada pela aristocracia
para o mundo urbano, acompanhado pelo aparecimento da filosofia, das leis e das escritas,
trouxe mudanas em busca da racionalidade, desligada totalmente do mito e, portanto, da
tutela divina. Em conseqncia, Atenas desenvolve a concepo de cidadania e de
democracia em oposio idia aristocrtica de poder. O cidado visto como uma pessoa
que deve atuar na vida pblica independentemente da origem familiar, classe ou funo11.
O autor dessa proeza foi o filsofo, poltico e legislador grego Clstenes, dando aos
cidados os mesmos direitos, apesar de no abarcar os estrangeiros, os escravos e as
mulheres. Ele dividiu a populao ateniense de forma a diluir a influncia local das famlias
poderosas e abolir o carter tribal da sociedade12. Os cidados detinham o poder poltico
atravs da ekklhsia (ekklesia - assemblia poltica) para ouvir os orientadores do povo13.
2. Influncia Romana sobre o Magistrado Civil
Com o domnio da Roma imperial, o imperador era considerado como Pontifex
Maximus ou sumo-sacerdote da religio do Estado. Por causa dos interesses polticos, o
imperador Csar Augustos (27 a.C. a 14 A.D.) ordenou a restaurao dos templos e o
10 Projeto Cultural 2000, Grcia Antiga, (So Paulo: DCL, 1999), pg. 197. 11 Ibid, 152. 12 Material coletado no site: http://www.dec.ufcg.edu.br/biografias/Clistene.html 13 Material coletado no site: http://pt.wikipedia.org/wiki/Democracia_ateniense . interes