A Liberdade segundo Jean Paul Sartre

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© Copyright Marisa Milhano 2010 A Liberdade segundo Jean Paul Sartre Jean-Paul Charles Aymard Sartre nasceu em Paris, no dia 21 de Junho de 1905. Foi um filósofo, escritor e crítico francês, conhecido mundialmente como o representante do Existencialismo. Recusou receber o prémio Nobel da Literatura em 1964, uma vez que sempre evitou as distinções e funções oficiais/sociais. Morreu igualmente em Paris, no dia 15 de Abril de 1980, com 75 anos. Existencialismo Na sua obra, “O Existencialismo é um Humanismo” (publicada em 1946), Sartre define o Existencialismo como a doutrina segundo a qual, em primeiro lugar o Homem existe, ou seja, encontra-se no mundo, e só depois define o que é e o que quer ser. Não é a Natureza que determina o que o homem vai ser, o seu destino está nele próprio e no seu projecto de vida, sendo que a sua existência reduz-se apenas à realização desse projecto. O ser em si Segundo o Existencialismo, defendido por Sartre, o mundo é povoado por seres em si. Entende-se como um ser em si qualquer objecto existente no mundo e que possua uma essência definida. Uma caneta, por exemplo, é um objecto criado para suprir uma necessidade: a escrita. Para criá-lo, parte-se de uma ideia que é concretizada, e o objecto construído enquadra-se nessa essência prévia. Um ser em si não tem potencialidades, nem consciência de si ou do mundo. Ele apenas é. O ser por si A consciência humana é um diferente tipo de ser, por possuir conhecimento a seu próprio respeito e a respeito do mundo. É uma forma diferente de ser, denominada por si. É o por si que faz as relações temporais e funcionais entre os seres em si, e ao fazer isso, constrói um sentido para o mundo em que vive. O por si não tem uma essência definida. Ele não é resultado de uma ideia pré-existente. Uma vez que o existencialismo sartriano é ateu, ele não admite a existência de um ser criador que tenha predeterminado a essência e os fins de cada pessoa. É preciso que o por si exista, e durante essa existência ele define, a cada momento, o que é a sua essência. Segundo Sartre, cada pessoa só tem como essência imutável aquilo que já viveu. Ou seja, para saber o que fui, é necessário definir-me por algumas características ou qualidades, bem como por actos que já realizei. Contudo, possuo a liberdade de mudar a minha vida deste momento em diante. Nada me compete a manter esta essência, que só é conhecida em retrospectiva. Podemos afirmar que o meu ser passado é um em si, visto que possui uma essência conhecida, mas essa essência não é predeterminada. Ela só existe no passado. É por isso que se diz no Existencialismo que "a existência precede e governa a essência".

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Guião do trabalho realizado no âmbito da disciplina de Filosofia sobre a Liberdade segundo Jean Paul Sartre © Copyright Marisa Milhano 2010

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A Liberdade segundo Jean Paul Sartre

Jean-Paul Charles Aymard Sartre nasceu em Paris, no dia 21 de Junho de 1905. Foi um

filósofo, escritor e crítico francês, conhecido mundialmente como o representante do

Existencialismo. Recusou receber o prémio Nobel da Literatura em 1964, uma vez que sempre

evitou as distinções e funções oficiais/sociais. Morreu igualmente em Paris, no dia 15 de Abril

de 1980, com 75 anos.

Existencialismo

Na sua obra, “O Existencialismo é um Humanismo” (publicada em 1946), Sartre define o

Existencialismo como a doutrina segundo a qual, em primeiro lugar o Homem existe, ou seja,

encontra-se no mundo, e só depois define o que é e o que quer ser. Não é a Natureza que

determina o que o homem vai ser, o seu destino está nele próprio e no seu projecto de vida,

sendo que a sua existência reduz-se apenas à realização desse projecto.

O ser em si

Segundo o Existencialismo, defendido por Sartre, o mundo é povoado por seres em si.

Entende-se como um ser em si qualquer objecto existente no mundo e que possua uma

essência definida. Uma caneta, por exemplo, é um objecto criado para suprir uma

necessidade: a escrita. Para criá-lo, parte-se de uma ideia que é concretizada, e o objecto

construído enquadra-se nessa essência prévia. Um ser em si não tem potencialidades, nem

consciência de si ou do mundo. Ele apenas é.

O ser por si

A consciência humana é um diferente tipo de ser, por possuir conhecimento a seu

próprio respeito e a respeito do mundo. É uma forma diferente de ser, denominada por si. É o

por si que faz as relações temporais e funcionais entre os seres em si, e ao fazer isso, constrói

um sentido para o mundo em que vive. O por si não tem uma essência definida. Ele não é

resultado de uma ideia pré-existente.

Uma vez que o existencialismo sartriano é ateu, ele não admite a existência de um ser

criador que tenha predeterminado a essência e os fins de cada pessoa. É preciso que o por si

exista, e durante essa existência ele define, a cada momento, o que é a sua essência.

Segundo Sartre, cada pessoa só tem como essência imutável aquilo que já viveu. Ou

seja, para saber o que fui, é necessário definir-me por algumas características ou qualidades,

bem como por actos que já realizei.

Contudo, possuo a liberdade de mudar a minha vida deste momento em diante. Nada

me compete a manter esta essência, que só é conhecida em retrospectiva. Podemos afirmar

que o meu ser passado é um em si, visto que possui uma essência conhecida, mas essa

essência não é predeterminada. Ela só existe no passado. É por isso que se diz no

Existencialismo que "a existência precede e governa a essência".

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A Liberdade em Sartre

Sartre defende que o homem é livre e responsável por tudo que está à sua volta. Somos

inteiramente responsáveis pelo nosso passado, pelo nosso presente e também pelo nosso

futuro. Segundo Sartre, a ideia de liberdade é como uma pena. "O homem está condenado a

ser livre".

As nossas escolhas são direccionadas por aquilo que nos aparenta ser o bem, mais

especificamente por um empenho naquilo que aparenta ser o bem e assim tendo consciência

de si mesmo. Em outras palavras, para o autor, o homem é um ser que "projecta tornar-se

Deus".

Sartre nega por completo o determinismo. Afinal de contas, não é Deus, nem a

natureza, nem tão pouco a sociedade que nos define, que define o que somos por completo

ou nossa conduta. Somos o que queremos ser, o que escolhemos ser; e sempre poderemos

mudar o que somos, pois os valores morais não são limites para a liberdade.

Limitação da Liberdade

A liberdade dá ao homem o poder de escolha, mas esta está sujeita às limitações do

próprio homem. Esta autonomia de escolha é limitada pelas capacidades físicas do próprio

ser. Sartre considerara, porém, que estas limitações não diminuem a liberdade, pelo

contrário; são elas que tornam essa liberdade possível, porque determinam as nossas

possibilidades de escolha, e impõem, na verdade, uma liberdade de eleição da qual não

podemos escapar.

Responsabilidade na Liberdade

O Existencialismo sartriano concede um importante relevo à responsabilidade: cada

escolha carrega consigo a obrigação de responder pelos próprios actos, um encargo que torna

o homem o único responsável pelas consequências das suas decisões. E cada uma dessas

escolhas provoca mudanças que não podem ser desfeitas. Assim, perante as suas escolhas, o

homem não se torna apenas responsável por si, mas também por toda a Humanidade.

Essa responsabilidade é a causa da angústia dos existencialistas, que decorre da

consciência do homem de que são as suas escolhas que definirão a sua essência, e mais, de

que essas escolhas podem afectar, de forma irreversível, o próprio mundo.

Sartre nega, ainda, a suposição de que haja um propósito universal, um plano ou destino

maior, onde seríamos apenas actores de um roteiro definido. Isto implicava a constatação de

que nós mesmos não definimos o nosso futuro, nem através de nossa liberdade de escolha.

A má-fé

Sartre acusa como má-fé a atitude daqueles que não procedem como ele, visto que

renunciam, assim, a sua própria liberdade. De acordo com o autor, a má-fé é uma defesa

contra a angústia criada pela consciência da liberdade, mas é uma defesa equivocada, iludida

e errada, pois através dela afastamo-nos do nosso projecto pessoal, e caímos no erro de

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atribuir as nossas escolhas a factores externos, como a Deus, aos astros, ao destino, ou ao

outro.

Podemos dizer então que, para os Existencialistas, a má-fé compreendia a mentira para

si próprio, sendo imprescindível para o Homem abandonar a má-fé, passando assim à

condição de ser consciente e responsável pelas suas escolhas. Ao fazer isso, o homem passa,

invariavelmente, a viver num estado de angústia, e deixa de se enganar, mas em

compensação retoma a sua liberdade, em sentido pleno.

O outro

Todas as escolhas duma pessoa levam à transformação do mundo para que ele se

adapte ao seu projecto de vida. Contudo, cada pessoa tem um projecto diferente, e isso faz

com que as pessoas entrem em conflito sempre que os seus projectos se sobrepõem. Assim, o

homem por si só, não consegue conhecer-se na sua totalidade. Só através dos olhos de outras

pessoas é que alguém consegue ver-se como parte do mundo. Sem a convivência, uma pessoa

não se pode compreender por inteiro. "O ser por si só é por si através do outro”.

Cada pessoa, embora não tenha acesso às consciências das outras pessoas, pode

reconhecer neles o que possui de igual. E cada um precisa desse reconhecimento. Só através

dos olhos dos outros posso ter acesso à minha própria essência, ainda que temporária. Só a

convivência é capaz de me dar a certeza de que estou a fazer as escolhas que desejo.

Contudo, embora sejam eles aqueles que impossibilitem a concretização dos meus

projectos de vida, colocando-se sempre no meu caminho, não posso evitar sua convivência.

Sem eles, o próprio projecto fundamental não faria sentido.

Sentido da Existência

Contudo, Sartre defendia porém o carácter absurdo da vida humana, e da sua condição

frágil e particular, afirmando que o Homem não é mais que o seu projecto, e que a sua

existência se reduzia à realização desse projecto.

Os existencialistas entendiam como o absurdo da vida humana, a ausência de uma

justificação transcendente, ficando o Homem entregue a si mesmo, e tendo de criar os seus

valores para conferir sentido à sua própria vida.

Sartre reconhece assim um sentido à existência humana, sentido este que tem de ser

encontrado na própria vida humana e por aqueles que a vivem.