A Linguagem Classica Da Arquitetura

download A Linguagem Classica Da Arquitetura

of 20

Transcript of A Linguagem Classica Da Arquitetura

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    1/20

    I M r t ie LX

    -P ropor t iO l I (

    1 As ordens da arqui te tura. Com esta g ravura em madeira, de 1540,SebastI~no Serlio comecou seu tratado sobre "as cinco maneiras de~onstrUlr", As ordens toscana, d6rica, jonica e corintia haviam sidol,cI~ntIflCadaspor Vitnivio. Alberti havia identificado a cornposita, Serliof 01 pllmel~o a mostrar as CI?COordens como uma serie fechada, a qualnenhum acrescimo sena admissfvel,

    CAPITULOUMA ESSENCIA DO CLASSICISMO

    I)(o co rn eca r presumindo que os leitores possuem alguns co-11111IIImtos gerais sabre 0 classicismo. Provavelmente saberao,1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 " 1 0 , que a catedral de S. Paulo, em Londres, e urn edificio

    It "II' a Abadia de Westminster, nao; que 0Museu Britanico eIII I I d f .io classico e 0 Museu de Hist6ria Natural em SouthII II lion nao e . Mais ainda, que todos os ediffcios em torno de11111111I' Square - National Gallery, St. Martins-in-the-Fields,

    IunuluIouse e mesmo South Africa House - sao classicos, mas!jIH II edilfcio do Parlamento nao e . Essas diferencas elementaresjlllIh III I'va-los a pensar que irei tratar de superficialidades. Quan-dl l 1 1 1 1 1 'd i!kio classico nao e classico? Isso tern algum interesse?quul ldades verdadeiramente importantes da arquitetura nao se-

    t I I I I I I H profundas do que uma nomenclatura estilistica, e mesmoII I jllllld sn tes dela? Claro que sim. No entanto, e impossivel abor-

    Ih ll II 'Ill 'sloes que me proponho neste livro sem primeiro mostrarIId I ncuo existente entre os ediffcios que sao prima facie classi-I II I' uHque nao sao. Deverei falar de arquitetura como linguagem p m - nq ua nto , parto do pressuposto de que voces conhecem 0 la-Ih u II Iurquitetura quando 0 escutam - ou melhor, quando 0 veem.I so me faz supor, tambem, que seja do conhecimento geral 01 1 1 1 1 1 til' que arquitetura classica tern suas raizes na Antiguidade, nolUI WI'NI) da Grecia e de Roma, na arquitetura de templos gregos eIII IIlqllit 'ILlrareligiosa, militar e civil dos romanos. Porem, este li-'Ill 1110tratara da arquitetura da Grecia e de Roma e nem do1111II nu o e desenvolvimento da linguagem classica da arquitetu-

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    2/20

    4 A LINGUAGEM CLAsSICA DA ARQUITETURAra, mas sim de sua natureza e de seu uso - seu uso como lingua-gem arquitetonica herdada de Roma e comum a quase todo 0mun-do civilizado durante os c inco secu los que transcorreram da Renas-cenca ate a epoca atual.

    Daqui por diante podemos ser mais prec isos. Vejamos inicia l-mente como a palavra "c lassico" e aplicada a arquitetura. E urn en-gano tentarmos definir classicismo, pois esbarramos num grandemimero de significados cuja utilidade depende de diferentes con-textos. Proponho que consideremos dois significados apenas. 0primeiro e 0 mais 6bvio: um edificio classico e aquele cujos ele-mentos decorativos derivam diretaouindiretamente do vocabula-no arquiietonico do mundo antigo \ 0mundo "classico", comomuitas vezes e chamado. Es~s elementos sao f_acilmerite reconhe-civeis, como, pOl' exemplo, os cinco tipos padronizados de colunasque sao empregados de modo padronizado, os tratamentos padro-nizados de aberturas e frontoes, ou, ainda , as series padronizadas

    -.ae omanientos que sao empregadas nos edificios classicos,Creio que esta e uma definicao clara mas superficial do que

    seja a arquitetura classica. Perrni te reconhecer 0 "uniforme" usadopor uma deterrninada categoria de edificios, a categoria a que cha-mamos chis sica; porem nad,! nos diz sobre a essencia do classi-cismo em arquitetura. Devemos ser extremamente cuidadososneste ponto. "Essencias" sao muito dificeis de apreender, e fre-quentemente verificamos, ao procura-las, que nao existem. Naoobstante, encontramos, ao longo da hist6ria da arquitetura classic a ,uma serie de afirmacoes sobre os aspectos essenc ia is da arquitetura

    ,II que nos perrnitem dizer que 0 obje_!ivo da arq!lit_etUl;:_'Lc_lA_ssic~~em-~ pre foi aIc,!nC;;aru~a harmonia inteligivel entre as partes. Tal har-

    monia foi vista como parte integrante dos edific ios da Antiguidadee como sendo inerente aos principais elementos antigos - em es-pecial as cinco "ordens", as quais logo nos referiremos. Mas foiconsiderada tambem em abstrato por varies te6ricos, os quais _5le-monstraram que a harmonia em uma estrutura, assim como na rmi-sica, e alcancada por meio da.proporcao,' ou seja, ao se fazer comque as proporcoes de todas as partes de um edificio sejam funcoesaritmeticas e este jam re lacionadas entre si. Uma quantidade imensade tolices pretensiosas tern sido escrita a respeito de proporcoes, enao pretendo envolver-me no assunto. 0 conceito renascentista deproporcoes e razoavelmente simples: a finalidade_~ proporcao .e.estabelecer harmonia em uma estrutura - uma harmonia que se

    A ESSENCIA DO CLASSICISMO 5. d I11 1 llgfve], seja pelo uso evidente de uma ou mars or e~s ,

    lomr onentes dorninan tes, seja simp~esm~nte pelo usa ,de d~-1 11 II III requerem a repeticao de razoes simples. Isso e sufi- ,

    1111plll 'a que possamos prosseguir. _No ntanto, ha um aspec to dessa concepcao bastante abst:atalit j I II I '0 que pode ser colocado como ~ma p~rgun~a. E pos~lv~lIIIII! II r .lo nao apresentar atr ibutos associados a arquitetura classi-Id I II m in assim, em virtude apenas de suas propor~oes, ser rotul~-li t, II 1\'1,ssico"? Penso que a resposta deva ser ne~atlv:: Pod~-s~ di-I I II' d escrever tal edificio, que suas proporcoes sao classicas,

    1 11 1, 1 I um abuso da terrninologia dizer que e classico. Os p6rticos,h i I nil d ,' i l de Chartres sao, em proporcao e distribuicao, tao c lassi-I II qlllllLO se possa imaginar, po:em ~unc~ d~ixarao de ser consi-IIIIIUlo goticos. E poderiamos citar amda.mumeros o~t~os e~em-111 1 , do sistema g6tico analogos ao classico. A prop~slto, .e uI?1 1 1 1 1 1 1 0 icnceber g6tico e classico como opostos;_eles sao mUl~o di-I II III! rna nao sao opostos e nao estao wmpletamente-desvmcu-I l i l t I 'ntI' si. FoCo romantismo do seculo XIX que nos levou aI"itl 'I los em campos psicol6gicos totalmente diferentes. T~n.b9_.a1 11 11 '(( If L O de que aquelesque afirmam "pref~~" 0 g6tic~ ao classi- ! , \ ,1 1 1 1 1 I I) ' lassico ao g6fiCo sao, geralmente, vit imas ?es~a mterpr~ta-I III II nea feita no seculo XIX. 0 fato e que a essencia da arquite- . \1 1 1 1 1 1 tal como foi exposta pelos te6ricos renascentistas ~ estaI I I 1 1 u, onsc iente ou inconsc ienteme~t~, ~m todas as arqmte!u-1, 1 rlo mundo. E se por um lado e necessano mcorpo~ar essa ess~n-I II I 1l0HSa ideia do que e classico, por outr~. pr~~lsamos a~eltarItllIlllI'm fa te de que a arqu ite tura c lassic .a e reconhecive l ~omo tal'I " 1 1 1 1 quando contem alguma alusao, ainda que vaga:_ amda q~e,. dll II a s "ordens" da Antiguidade. Tal alusao pode nao ser maistill lilli' urn suIco ou uma saliencia que sugira. a prese~c;;a de umaI1 1 1 1 1 I O U uma distribuicao de janelas que sugira a razao entre pe-Ih 1 1 1 1 ' xiluna entre coluna e entablamento. Alguns edificios mo-li t I'll' - em especial os de Auguste Perret e .seus irnitador~s -:- saoII. 'os desse modo, ou seja, foram concebidos em matenais mo-I h 1 1 1 1 1 mas com espirito classico e considerados c lassicos. ape~asIII IIIpi 8 nc;.:ade traces minimos. No ultimo capitulo falare i mm~ aII I" (0. Por enquanto, e fundamental ~?~pre~ndermo~ ~ qu~stao,h i II d ns - as "Cinco Ordens da Arqiiitetura . T od~s ja oU~lramIlIhll III' speito mas 0 que sao exatamente? Por que existem cmco e, . . d ?II I ' 1 1 1 1 1 1 1 ' 0 , ou mesmo dezesseis ou trezentas e vmte e sets or ens.

    ,(..: .-\0, .- ,'C.)

    1 J

    fl. 117

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    3/20

    6 A LINGUAGEM CLAsSICA DA ARQUITETURA

    \ \

    Vejamos uma coisa de cada vez. Primeiro, 0 que sao asordens? Na pagina 136, encontramos urn diagrama muito claro da~rdem dorica, E uma ordem formada por uma col u na de templosobre urn peoestaI; carregando, em seu topo, a arquitrave, 0 friso e~cornija, aquae conjunto de elementos que forma 0 entablamento.Nas ilustracoes de 1 a 4 vemos novamente a ordem dorica, comsuas quatro companheiras; e a segunda, tendo a esquerda a toscanae, a direita, a jonica, a corint ia e a composita. U:lll i!.~~Q[dem" con-siste na unidade "coluna-superestrutura'' que comp6e a colunata deurn templo. Ndo precisa ter pedestal-- e muitas vezes nao tern - eprecisa ter urn entablamento (colunas so tern sentido se suportaremalgo), e a cornija representa os beirais do telhado.

    Agora, vejamos por que existem cinco ordens. Esta questao eurn pouco mais diffcil, e devemos remontar as origens das ordens.A mais antiga descricao escrita de uma ordem encontra-se emVitnivio. 0 nome desse autor romano ira aparecer frequentementenos capftulos seguintes, e este e 0momenta indicado para apresenta-10. Vitnivio foi urn arquiteto de alguma importancia durante 0 rei-nado de Augusto, e escreveu urn tratado em dez livros, De Ar-chitectura, dedicado ao imperador. No genero, este e 0 iinicotratado da Antiguidade que sobreviveu e, por essa razao, tern sidoobjeto de enorme veneracao. Vitnivio nao tinha grande genio nemtalento literario e nem, ao que se saiba, talento arquitetonico, Masseu tratado reune e preserva para nos uma imensa quantidade deconhecimentos tradicionais sobre construcao - e 0manual praticodo arquiteto romano do seculo 1d .C., enriquecido com exemplos eanotacoes historicas.

    Ao longo do terceiro e do quarto livros, Vitnivio descreve tresdas ordens - a j onica, a dorica e a corintia - e faz algumas obser-vacoes sobre uma outra - a toscana. Ele nos diz em que parte domundo cada uma foi inventada, relaciona-as com descricoes detemplos enos conta a que deus ou deusa cada uma se refere. Suasdescricoes nao sao exaustivas. Ele nao mostra a quinta ordem nemapresenta as ordens na sequencia que consideramos "correta" (tos-cana, dorica, jonica, corfntia) e - 0 que e mais importante -- naoas apresenta como urn conjunto de formulas canonicas que resumi-riam em si toda a virtude arquitetonica. Isso ficou por conta dosteoricos da Renascenca.

    Em meados do seculo XV, mil e quatrocentos anos depois deVitnivio, 0 arquiteto e humanista florentino Leon Battista Alberti

    A ESSENCIA DO CLASSICISMO 7II V1I lS ordens, em parte tomando Vi tnivio como referencia

    I III II 1 1 '1 , baseando-se em suas proprias observacoes de r~inasI IIIIItIIlI ,( Inbase nessas observacoes, acrescentou ao conjunto1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 tu ordem -- a com posita -- , que e uma co~~ina

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    4/20

    8 A LINGUAGEM CLAsSICA DA ARQUITETURAEsse gesto enfatico e literalmente dramatico de Serlio nao foiinutil. E assim, as cinco ordens da arquitetura, encaradas como urn"conjunto fechado", do qual todo e qualquer desvio e questionavel,passaram de mao em mao. Praticamente todos os textos elementa-res de arquitetura nos seculos XVII e XVIII comecam do mesmomodo, com uma estampa de cinco colunas e entablamentos ali-nhados lado a lado - Bloem na Sufca, De Vries em FlandresDietterlin n~ Alemat_lha,~l~art e Perrault na Franca, e, na Inglater~ra~Shute, GIbbs e SIr WIlham Chambers. A edicao de Chambers,feita por George Gwilt, nos leva ate 1825. E se consultarmos aEncyclopedia of Architecture, do mesmo autor, ainda encontrare-mos e~ sua ultima edicao, de 1891, a afirmacao de que "na com-preensao e emprego corretos das ordens se ap6ia 0 fundamento daarquitetura como arte". Quando eu estudava em Bartlett SchoolU~ive.rsity College, em Londres, nao exist iam dtividas de que apnmeira tarefa de urn estudante era tracar detalhadamente tres dasordens classicas.Existem dois pontos importantes a serem considerados. Em

    primeiro lugar, devemos compreender que os romanos, embora te-nham aceitado a individualidade do d6rico, dojonico e do corintioe conhecessem s?as origens historicas, nao foram os que os embal-samaram e ~a.ntI.ficaramda forma arbi trar ia e limitada com que~stamo~ faIruh"an~ados. 0 segundo ponto exige a compreensao daimensa importancia desse processo de canonizacao para 0 conjuntoda producao arquitetonica desde a Renascenca. As_ordens passa-ra~a ser consideradas a pedra de toque da arquitet~os instru-~~~tos-~q~ilet6~iiic;~s_'~~maiotsmileza-'possrvel,"corpOrificaiido,to_ua.~sabedoria acumulada pela humanidade na Antiguldade no9~e diz respei t~~ arte.de construir -- quase que produtos da pro-pna natureza. E e aqui que 0 olho moderno deve freqiientementeconfessar-se derrotado. A menos que voce realmente conheca asorde~s ~ ~ossa reconhecer ~e i.med.iatouma ordem toscana segun-do VltruvlO,.~m_aordem corinna onunda do templo de Vespasiano,uma ordem joruca do templo de Saturno, ou ainda a estranha or-d~m co~posita imaginada por Serlio a partir do Coliseu, nao pode-ra apreclru: em toda a s~a extensao os refinamentos e variacoes queforam cannhosa e assiduamente aplicados as ordens. Mesmo as-sim, uma compreensao superficial ja pode ser t iti l, pois nao e so-men~e~a forma das ordens em si que reside 0 carater da arquitetu-ra classica. Na verdade, seu carater reside muito mais no modo pelo

    A ESSENCIA DOCLASSICISMO 9qual as ordens sao desenvolvidas; mas este assunto pertence aoutro capitulo. 'Por enquanto, basta percebermos 0 quanto a s ordens sao va-riaveis ou invariaveis. Serlio as apresenta corn u r n ar de grande au-toridade, dando as dimens6es de cada elemento, comoque para es-tabelecer definitivamente as proporcoes e os perfisadequados. Noentanto, suas ordens, ainda que refletindo rrroderadamente as des-cricoes de Vitnivio, sao fruto, tambem, da observacao de monu-mentos antigos . .A_ssim,por urn processo de sele\ao pessoal, essasrdens sao - em grau consideravel- inverrcoes doproprio Serlio.E nao poderia ser diferente. As descricoes de Vitnivio apresentamlacunas que so poderiam ser preenchidas atraves do conhecimentodes monumentos romanos que restaram. As ordens, tal comoexemplificadas nesses monumentos, variam consideravelmente deum exemplo para outro, perrnitindo a quem querque seja selecio-nar aquilo que considera como sendo as melhores caracteristicasde cada ordem e estabelecer, assim, 0 que considera ser a ordemideal. Ao longo da hist6ria da arquitetura classica, a especulacaoquanto aos tipos ideais de cada ordem persistiu sempre, oscilandoentre 0 respeito preciosista e a pura invenc ao pessoal, Entre essesextremos ficam as ordens definidas e publicadas pelos grandes teo-ricos - Serlio, inicialmente, em 1537, seguido por Vignola em1562, Palladio em 1570 e Scamozzi em 1615. E foram estas as or- Ils.2, 3dens que desempenharam urn papel normativo emtodo 0mundo.Mas sempre existiram arquitetos que fizeram questao de copiarmodelos antigos especificos. E 0 caso, por exemplo, da grandemansao de Ecouen, proxima de Paris, projetada em 1540 por JeanBullant, cuja ordem corintia deriva, em grande parte, do templo deCastor e Pollux. Em 1630, no projeto para a igreja em CoventGarden, Inigo Jones tomou como base 0 texto deVitnivio para re-construir a ordem toscana - quase urn exercfcio de arqueologia. II. 45Em 1793, no projeto do Banco da Inglaterra, Sir John Soane co-piou literalmente a ordem do templo de Vesta, eni Tivoli. Por outrolado, tambem existiram inovadores ousados. Philibert de l'Ormeinventou uma ordem "frances a" para 0 pa.lacio das Tulherias; as II.5ordens de Wendel Dietter lin, apresentadas em seu livro de 1594,sao variacoes fantasmagoricas sobre Serlio; as ordens de Bor-romini sao invencoes chocantes, extremamente expressivas. Por- Il. 71tanto, seria urn engano considerar as "cinco ordens da arquitetura" I I. 6omo uma especie de jogo de montar usado pelos arquitetos para

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    5/20

    A ESSENCIA DO CLASSICISMO 11OA LINGUAGEM CLAsSICA DA ARQUlTETUHA

    nao se darem ao trabalho da invencao.E melhor considera-las f0-pressoes gramaticais que exigem uma imensa disciplina, mas umadisciplina dentro da qual a sensibil idade pessoal tern sempre urndeterminado papel- mais ainda, uma disciplina que pode ser rom-pida por urn lance de genic poetico.A esta al tura, peco que observem novamente a ilustracao daordem d6rica. Acredito que ficarao surpresos com a quantidade deelementos curiosos que compoem 0 entablamento, todos com no-mes pr6prios mas sem urn valor particular perceptivel, seja decora-tivo, seja simbolico. Por que rmitulos? Por que triglifos e metopas?Por que a tenia e os estranhos penduricalhos chamados gotas? Porque tudo isto? Posso dar apenas uma resposta generica, E quasecerto que a ordem d6rica se originou de urn tipo primitivo de cons-trucao em madeira. Quem nos diz isso e Vitnivio. Na verdade,quando olhamos para uma ordem d6rica feita de pedra, estamosvenda uma representacao esculpida em pedra de uma ordem d6ricaconstrufda em madeira; nao uma representacao literal, claro, masurn equivalente escult6rico. Os templos primitivos do mundo anti-go eram de madeira. Gradualmente, alguns desses templos - semduvida, os que eram mais sagrados e que atrafam maiores riquezas_ vieram a ser reconstrufdos em pedra. E talvez tenha sido consi-derado obrigat6rio preservar, na versao mais permanente de pedra,aquelas formas nas quais se havia concentrado tanta santidade. Daiter ia surgido a necessidade de copiar em pedra ou marmore os ele-mentos de carpintaria, a esta altura ja urn tanto estilizados, doentablamento. Mais tarde, ao se erigirem outros templos de pedraem novos sit ios, as c6pias foram copiadas, e assim por diante, atetudo isso se tomar uma f6rmula estavel e aceita.'f - Se reexarninamos a ordem d6rica sob esta luz, ela se explica,ate certo ponto, por si mesma. Os mutulos parecem ser as extremi-dades dos balances que se projetam para suportar os beirais poronde as aguas da chuva escoam, afastadas das colunas. Os triglifos. .. . bern poderiam ser as extremidades de vigas apoiadas na arquitrave.

    ~\'. A tenia parece algum tipo de elemento de amarracao preso aostriglifos pelas gotas, que evidentemente nao sao penduricalhos,mas cavilhas de madeira. Eu disse "parecem ser", "poderiam ser","parece" porque essas hip6teses sao apenas palpites. Alguns a~-queologos ja dedicaram muito talento a tentativa de refazer, a partirda ordem d6rica formalizada, 0prot6tipo inicial de madeira. Seuspalpites valem mais do que os meus, mas sao e nao deixarao de ser

    palpites. Para n6s, interessa que, ao longo do tempo, urn sistema deonstrucao em madeira copiado em pedra cristalizou-se em umaI rrnula l ingufstica conhecida por Vitnivio, assim como por n6s,( mo a "ordem d6rica". Esta cristalizacao possui urn paralelo 6b-vic na linguagem. Em algum momento, palavras, express6es, cons-(l'u9oesgramaticais foram inventadas para preencher uma necessi-dude particular de comunicacao, Essas necessidades imediatas ja,sel loha muito esquecidas, mas as palavras e suas relacoes aindaI'()fluam0 idioma que usamos para imimeras finalidades, inclusiveIpoesia. 0 mesmo acontece com as cinco ordens da arquitetura.Para completar, devo fazer mais uma observa9ao._S~Inpg~),e __'(Hlsid~?~ que a~ .ordens tivessem como que uma personalidade.Vitrtivio talvez tenha sido 0 responsavel porisso. Para de, 0 dorico 0-omo que exemplifica a "proporcao, forca e gra9A.do corpo mascu\ \ l J~ _ ( " }A6 rvI no" - presumivelmente e U r n homem medio e bem-constituido. j I _

    e) jO.ni~ose C,~:'lct.eriZaria.pela ~'e~belteza t:eminina", e 0 cori~tio, + t o' : ;>Ilo r umtar a figura delgada de u1p.amemna", 0 que nao diferemuito do caso anferior. Uiiia vez abertasasportas a personalizacao11Ii'lrdens, por Vitnivio, a Renascenca perdeu 0 controle, permi-t ndo ate interpretacoes contradit6rias. Assim, enquanto ScamozziIli Z ceo a Vitnivio ao chamar de "virginal" a ordem cormtia, Sirltcnry Wotton, alguns anos depois.considera-a "lasciva" e "atavia-

    rlu .omo uma cortesa", nao esquecendo de acrescentar que a moralII orinto era baixa. Sejacomo for, a ordem corintia sempre foivista como feminina e a d6rica como masculina, ficando a jonica11 0 meio, como algo assexuado __urn velho erudito ou uma rnatrona-nlma e gentil . As recomendacoes de Serl io talvez sejam as maisI P scff icas e consistentes'.IPara ele, a ordem d6rica deve ser usadaiIII igrejas dedicadas aossantos mais extrovert idos (S. Paulo, S.II' Iro ou S. Jorge) e a figuras combativas em geral; a jonica, paranntos tranquilos - nem muito fortes nem muito suaves - e tam-I ( 1 1 1 para homens de saber; e a corintia, para virgens, em especial aVII' em Maria. Considera a ordem toscana adequada para fortifica-\ s e prisoes, e nao aponta nenhuma caracterist ica especial para aIIId m comp6sita.Nao existe razao alguma para se levar tudo isso muito a serio.n olharmos as colunas corintias de Mansion House, em Londres,1 1 1 ) 1 ' .xemplo, com certeza nao precisamos nos perguntar se foramInnsideradas virginais por Lord Mayor, que as encomendou. 01 1 1 1 0 que as ordens.eram escolhidas principalmente em funcao do- .. ,. - - . . . . . . . _ - - .- ..~~~-.-,--.-__....------

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    6/20

    12 A LINGUAGEM CLAsSICA DA ARQUITETURAgosto, em func;aQ_gecircunstancias e, imimeras vezes, em funcaodos meios dlsponiveis; j:fque umaconstlU-~ao em que e empregadaa ordem toscana ou a d6rica e, obviamente, mais barata do queaquela onde aparece a escult6rica ordem corfntia. Por outro lado,existem casos em que a escolha de uma determinada ordem foi fei-ta em funcao de seu significado simb6lico. Acredito que Wren te-nha usado a ordem d6rica no Hospital de Chelsea por seu caratermarcial. E temos ainda 0 caso fascinante de Inigo Jones e a ordemtoscana de Covent Garden, a qual me refiro mais adiante. A ordemtoscana e a d6rica sao as mais primitivas, e os arquitetos tendiam autiliza-las quando desejavam expressar rudeza e forca ou, no casoda d6r ica, a chamada "postura marcia l". No outro extremo, a or-dem corfntia foi muitas vezes escolhida quando 0 arquiteto desejoumostrar abundancia, luxo e opulencia, a qualquer preco.De qualquer modo, as ordens vieram propiciar toda uma gamade expressoes arquitetonicas. variando da rudeza e da firmeza ate aesbelteza e a delicadeza. No verdadeiro projeto classico, a selecaoda ordem e uma questao vital - e a escolha do tom. 0 que e feitocom a ordem, quais as proporcoes dadas as diferentes partes, queomatos sao escolhidos ou nao, tudo modifica e define 0tom.Bern, e 0 suficiente quanto as cinco ordens da arquitetura --os cinco elementos basicos da gramatica arquitetonica da Antigui-dade. Mas 0 que e possivel fazer com as ordens? Quais as regrasdessa gramatica?

    ASI~F..TTO DE'CINQV [ ORDJN I DELLE c .. :0 10NNE,CON IA c J /i d La . O n m mt fl N ,c tu/tc I " I cn : ;Mr t i , rfj(l/lIh'p:Nc;/ufi

    A

    3

    o progresso das cinco ordensCo da geracao ap6s Serlio estudou as ordens d . . -culdadcsamente justificadas. 2 A versao de V~ noro e ~sd~lineou com vanacoesobre apareceu em 1563 At' igno a, pnmeira a ser gravada emI l ine' as c inco ordens e~ u es ,a, .segulU-se a de Pal ladio, em 1570, que naoIi S arnozzi feita em 1615m~murnmcatrandcha.~ Entretanto, a gravura em madeira, , U 0 0 espinto de Palladio,

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    7/20

    40 frances Claude Perraul t consultou todas as autoridades i talianas e produziusua pr6pria versao, em uma gravura em cobre, de 1676, com uma escala modulara parti r da qual asproporcoes das diferentes partes podiam ser l idas ememorizadas.

    6

    eO

    5

    5 A "ordem frances a" dePhilibert de l 'Orme (1567)expressa logicamente 0 fatode que uma coluna ecomposta de irnimeras pedrassep~r~das. 6 Urn capitelconn tio de Borromini , comfolhagens invertidas.7 Ordem jonica com secaoquadrada, de Fleart, 1650.

    I

    I, I

    I

    7k,

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    8/20

    CAPITULO DOISA GRAMATICA DA ANTIGUIDADE

    Ja posso consideni-Ios suficientemente familiarizados com asI II 0 ordens para tratar agora de sua utiliza!;{ao.Observem uma vezII I l is a ilustra!;{ao1.0 que sao as ordens? Sao colunas sobre pedes-Illi ujo uso e opcional) , as quais suportam em seu topo vigas!ll Id se ap6ia 0 beiral de urn telhado. Para que servem? Digamos'I" voce esteja projetando urn templo com porticos na frente e naJlIIII~'posterior, e com colunatas nas laterais. Pelo menos no que se'I It I ao exterior, as colunas e seus complementos resolvem 0pro-IIII IIl1l. Basta que as linhas inclinadas da cobertura e a cornija'''"IIU11, nas fachadas principais, aquele elemento triangular co-IIlul' do Como fronrao. Mas suponhamos agora que voce esteja pro-II '"lIdo algo assim como urn teatro ou urn tribunal, com muitos an-1 1 1 1 t 1 imimeras janelas, e cuja estrutura seja formada por arcos e.llIlllIldIiR. Como fica esse projeto? 0 born senso sugere que voce seI, 'I dlll~ordens, por estarem irrevogavelmente associadas a tern-1 ' 1 1 1 ,I 'om ce outra vez, deixando os arcos, as ab6badas e a dispo-, II 1 1 M janelas e das portas encontrarem expressao pr6pria. Esse"II, p!'ovavelmente, 0 caminho indicado pelo born senso rnoder-

    1 1 11 ~ I " IH 0 era 0 que acontecia. Os romanos, ao adotarem arcos e1 1 1 1 " , 1 1 1 " I ' l 1 seus ediffcios publicos, fizeram questao de empregar

    " ' t I , n da forma mais visfvel possfvel, Talvez achassem que,III II til' I ns, urn ediffcio nao poderia ser significativo. Talvez

    fill 1 1111 (I n I ransferir 0 prestfgio da arquitetura religiosa para pro-ti l 1 1 ' 1 1 1 1 1 1 ' '1 '1 importantes. Nao sei. Seja qual for a razao, combi-1 1 1 1 1 I IIquitetura aItamente estilizada mas estruturalmente bas-

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    9/20

    18 A LINGUAGEM CLAsSICA DA ARQUITETURAtante primitiva dos templos gregos com seus arcos e abob~das. Eassim, ao empregarem as ordens nao co~o mera decoracao. mascomo instrumento de controle de novos tipos de estrutura; re,nova-ram a linguagem arquitetonica- Apesar de serem, n~ ~alona doscasos estruturalmente imiteis, as ordens, com cenmoma e grandeelega~cia, dorninam e control am a ~omposi9ao a qual estao asso-ciadas tomando os ediffcios expresslvoS.Como isto acontece? Certarnente nao basta pendurar colunas,entablamentos e frontoes em uma estrutur

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    10/20

    20 A LINGUAGEM CLAsSICA DA ARQUlTETURAe controlado por urna ordem jonica, que obedeee apenas a suaspr6prias regras estetieas tradicionais. Por outro lado, a forma eo ta-manho dos macicos por tras das eolunas e arcos foram definidospelas exigencies da conveniencia e da constru~ao. As duas disci-plinas tiveram que ser ajustadas harmonicamente. A moldura dopedestal da ordem esta a mesma altura que 0 peitoril da galeria dearcos. 0 plano da imposta do arco esta um poueo aeima da metadeda al tura das colunas e 0arco se assenta confortavelmente entre ascolunas e a arquitrave. Para que essa disposicao satisfat6ria fossealcancada, foi preciso equilibrar cuidadosamente dois aspectos; aditadura estetica da ordem jonica e as necessidades praticas do edi-ffcio como objeto de uso. Uma alteracao. ainda que pequena, dequalquer um dos elementos, destruiria 0 conjunto. Vejamos, porexemplo, 0que aconteceria se alargassemos em trinta centimetrosa abertura do vao. 0 topo do arco ficaria quinze centimetros maisalto. Se desejassemos manter 0 mesmo espaco entre arco e enta-blamento, este ultimo deveria subir quinze centfrnetros. Portanto,as colunas ficariam quinze centimetros mais al tas. E uma vez queas regras da ordeIIl jonica sao como sao, cada elemento da ordemdeveria ser ampliado. 0 pedestal cresceria de tal forma que suamoldura nao estaria mais em nivel com 0peitoril, e, 0 que e pior, 0entablamento teria sua altura aumentada, provavelmente criandoproblemas com OS pisos superiores, para nao falarmos na interfe-rencia com 0 dimensionamento da ordem corintia acima.Na verdade, creio que este VaGdo Coliseu permite um poucomais de "tolerancie" do que dei a entender. Mas voces devem estarcomecando a perceber 0 tipo de disciplina que a linguagem classi-ca exige e que lhe e inerente. Observem agora a ilustracao 17. Emprincipio, temos aqui a mesma disposicao. agora em uma propostate6rica de Vignola, arquiteto italiano do seculo XVI. Obviamente,sua intencao era produzir algo em que todos os elementos depen-dessem inteiramente uns dos outros; nao existe em seu projeto ne-nhuma tolerancia- A largura dos macicos permite apenas apoiar aarquivolta e as laterais da moldura do pedestaL 0 resultado e aper-tado como um no. Se voces,

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    11/20

    22 A LINGUAGEM CLAsSICA DA ARQUlTETURA

    fl. 20

    tanto de pintores como de arquitetos (que muitas vezes eram tam-bern pintores) , fazendo com que caracterist icas t ipicas dos arcostriunfais fossem util izadas em todo tipo de edificio, como expres- -soes gramaticais de controle da estrutura. '- 0exemplo mais impressionante desse fenomeno e a conver-sao do arco do triunfo em uma igreja cat6l ica, realizada por LeonBattista Alberti. Ao projetar 0 Tempio Malatestiano, em Rirnini,Alberti baseou-se, propositadamente, no arco romano existente nosarredores da cidade. Bern mais tarde, ja no fim de sua vida, levou aideia ainda mais longe no projeto da igreja de S. Andrea, em Man-tua. Nesse caso, nao adaptou os principios do arco triunfal apenas afachada principal, mas tambem as arcadas da nave, no interior.Ainda mais, fachadas e arcadas foram dimensionadas na mesmaescala, de tal modo que a igreja - por fora e por de~tro - e um~ampliacao 16gica e tridimensional do tema d~ arco tnu~fal. Albe~lmorreu antes da construcao da fachada e duvido que seja responsa-vel por algumas de suas caracteristicas. Mas a idei~ pri~cipa~ e cla-ra e pode-se fac~lmente perceber co:n0 ress/oa no mtenor: J a a ~e-coracao pretenslOsa das paredes, feita no seculo XVIII, tira murtoda forca do edificio, em especial nas fotografias. De q~alquer for-ma S. Andrea e urn verdadeiro triunfo, tanto na conquista da gra-matica romana como na criacao de uma estrutura continua e logi-ca. Esse projeto serviu de modelo para incontaveis igrejas ciassicasconstruidas nos quatro seculos seguintes, e e 0 primeiro grandepasso em direcao a S.Pedro, em Roma, e S. Paul~, em_Londres.Eu poderia falar ainda rnais sobre os arcos triunfais e sua con-tribui

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    12/20

    24 A LINGUAGEM CLAsSICA DA ARQUITETURAcar 0 intercohinio com a terminologia musical. Eu sugeriria "ada-gio" para 0 didstilo, "andante" para 0 eustilo e "allegro" para 0sistilo. Mas nao me agrada "presto" para 0picnostilo e menos ain-da "largo" para 0 araeostilo. Como sempre, e tol ice levar analo-gias longe demais. A importancia do intercoltinio - 0 "compasso"em arquitetura - e imensa. A questao fica clara se analisarmos 0contraste visivel entre as ilustracoes 32 e 34. Temos aqui edificioscom a mesma forma e, aproximadamente, com a mesma finalidadecomemorativa. Mas como sao diferentes as emocoes que sugerem:o didstilo (3 diametros) empregado por Bramante e majestoso, se-reno e meditativo, enquanto que 0picnostilo (1 V 2 diametro), empre-gada por Hawksmoor e tenso e distante, parecendo uma muralha. Ese examinarmos outras ilustracoes com a questao do "andamento"em mente, nao restarao diividas quanta a importancia do inter-cohinio. Comecaremos a perceber tambem as variacoes que podemser introduzidas - colunas aos pares, pares espacados de colunas,colunas dispostas no ritmo estreito-Iargo-estreito dos arcos triun-fais e os ritos realmente intrincados que se conseguem quando co-lunas, meias-colunas e colunas-de-tres-quartos comecam a ser em-pregadas juntas, algumas vezes despertando duvidas quanta aotempo basico dominante (como nas fachadas das igrejas que vimosanteriormente ).

    Venho falando de gramatica e regras a ponto de voces come-carem a conceber a l inguagem class ica como algo assustadoramenteimpessoal e intratavel, algo que desafia 0 arquiteto a cada momen-to, que suprime sua intuicao e que the deixa apenas uma estreitamargem de escolha. Se ficaram com essa impressao, nao lamento,pois fa; parte das regras do jogo. Mas nao nos esquecamos daidentificacao do arquiteto com os pr6prios elementos que 0 desa-fiam, de modo que se coloca tao intensamente a Javor das ordensque esta usando, como contra elas, chegando ao ponto de acredi tarque criou a ordem cuja manipulacao the da tanta dor de cabeca. Al-gumas observacoes feitas por urn grande arquiteto da geracao pas-sada, Sir Edwin Lutyens, ilustram bern a questao, Lutyens formou-se na pitoresca tradicao da "Velha Inglaterra" de fins do seculoXIX, a qual pertencem todos os projetos residenciais de sua carrei-ra. Por volta de 1903, aos trinta e cinco anos de idade, comecou ater uma compreensao da natureza do c1assicismo, que iria fazerdele urn dos mestres da arquitetura em sua epoca, Em uma carta aseu amigo Herbert Baker, descreve vividamente como, ao projetar

    A GRAMATICA DA ANTIGUIDADE 251I cas.a de urn rico industrial de IIkley, 0 esplendor da lingu'h'lsslca apoderou-se dele. agem

    . Tenho a audacia de adotar aquela coisa adoravel, carco-nuda pelo tempo, que e a ordem d6rica. Nao se pode copia-laPara acer:mr, voc__eem, que esco lh e - ta e p r o i e t a- I a . .. Voce na~pode copiar, voc~ se da conta de que, se copiar, esta perdidofica uma confusao. ' e. Isso si_ni~ica tr~balho arduo, muita reflexao sobre cadaI inha , em tres dlme~soes e em cada junta; e na o se pode deixar

    ~enhuma pedra des l iza r . Se voce ataca 0problema desse jeito a[dem pertence. a voce, e cada traco, sendo trabalhado me~-ta mente, deve ficar irnbufdo de toda a poesia e arte que Deus

    ~?e deu. Se urn elemento e alterado (0 que sempre e necessa-no) , !odos ?~outros devem ser revistos com 0mesmo cuida-d~ e!nve~tIvlda~e.' para que concordem outra vez. Como se ve ,nao e um jogo facil, que se possajogar despreocupadamente."Nao se pode copiar", diz Lutyens. Em outra carta porem es(" ve: ' ,-

    'II

    ,I

    ~ao se po de ~sar orig~nalidade com relacao as Ordens.Elas teI? que serAta~ bern digeridas para que nao permane anada alem da. essencI~. Quando corretas, as Ordens sao curi~-same~t~ bonitas - ma~teraveis como form as vegetais ... Aperfeicao da Ordem ~sta muito mais pr6xima da natureza doque qualquer outra coisa produzida por impulso ou por acaso.

    ., Por ter aprendido sozinho, Lutyens foi urn arquiteto ue sabia,Il fato 0 que slglllflcava a linguagem classica. Ao mes:!o tempo'I" a r nava as ?rdens, ele as obedecia e desafiava. E se a compreen-1~)I"[d~eglr~ ~ urn dos fatores essenciais,na criacao dos grandesI (I CIOSc assrcos, 0 desafio da regra e 0 outro.

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    13/20

    10 9

    Otemplo 11As ordens foram desenvolvidas a parti r da arqui tetura dos templos. No entanto,a pr6pr ia forma dos templos nunca foi copiada a te os seculos XVllI e XIX.Acima de tudo, foi a eloquencia da coluna com os perfis esculpidos que tomouconta da imaginacao da Renascence. Apenas quando a Antiguidade classicacomecou a ser vist a dentro de uma perspec tiva hi st6r ica mais ampla e que aforma do templo foirevivida e , entao, na maior parte das vezes, mais como urnsfmbolo de poder secular do que como urn edificio rel igioso. 8 0 temploromano melhor preservado e a Maison Cartee em Nimes (c. 130 d.C.), comuma ordem corintia. 9 A Madeleine, em Paris , comecou a ser construida paraser uma igreja, foi prosseguida por Napoleao para ser urn Temple da Gloria,mas foi completada em 1842, como igreja. 10 Sei s seculos e meio apos aMaison Cartee, Thomas Jefferson comecou a construir 0Capit6lio do Estadoda Virginia (Richmond, EUA) como urn templo jonico. 11Em Birmingham,urn concurso para a nova prefeitura da cidade foi vencido em 1832 per JosephHansom, com urn projeto que compete valentemente com as templos daAntiguidade.

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    14/20

    13 Em meados do seculo XVAlberti reintroduziu a ideia d~superposicao no Palazzo RucellaiFlorenca, '14 Em Oxford, os construtoresjacobeanos, que projetaram asEscolas em 1613, demonstrarams~us conhecimentos ao empregar as~Inco ordens num portae estiloTudor.1 5 Salomon de Brosse introduziuIres ordens superpostas no projetoultamente elaborado de St G .. ervalSm Pans, 1616-21.

    12 Ordem sob re o rd emOs romanos tomaram as ordens da arqui tetura dos templos e as manipularampara decorar e controlar seus monumentos seculares. Quando estes se elevavampor mumeros andares, cada andar recebia uma ordem adequada - a ordemd6rica, forte e simples embaixo, depois a ordem jonica, mais leve, seguida pelaelegante ordem corintia e, eventualmente, a ordem comp6si ta no alto.120 Coliseu de Roma (seculo 1d.C.) e 0exemplo antigo mais espetacular deordens superpostas.

    13

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    15/20

    18 > -

    1716

    A ordem e 0 areoAs ordens constituem fundamentalmente urn sistema arquitravado (pilar ev iga); u rn dos problemas dos roman os fo i como cornbina -lo com urn s is temade a rcos . Ao emoldurar urn a rco ent re urn par de colunas e urn entab lamento,aquele a rco deve ter uma relacao determinada ent re sua impos ta e seu topo.16 Eleva9ao do vao do segundo andar ( jonico) do Col iseu . 17 0mesmo temainterpretado por Vignola, 1563. Nesta versao, cuidadosamente desenvolvida,nenhuma dimensao pode ser mudada sem afe ta r a s propor90es da ordem e,conseqtientemente, do conjunto. 18 0ensaio pioneiro de Bramante sobre estetema, no c laus tro de S.Maria del la Pace, Roma, 1500-04 .

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    16/20

    o areo t riun fa lo arco t riunfal romano , como tipo , foi uma das pr inc ipa is fontes para aexpressao da Renascenya, com sua divisao tripart ida de quatro colunasiguais desigualmente espac;adas. 190 arco de Constantino, 0maior asobreviver, forneceu a ideia da coluna "independente" com entablamentosal iente e do "at ico" coroando a composicao- 200 projeto da fachada doTernpio Malatestiano, Rimini, de Alberti e nitidamente baseado no esquemado arco triunfal.

    20

    III

    23Z I Ern S. Andrea, Mantua (1472) Alb . .principal, mas substituiu 0 atico p 'o ' erftlapl~cou 0mesmo tema it fachada,. Iurn rontao 22 N' .I .la, os arcos e macicos com il tr '. 0 mtenor da mesmaIII' os triunfais. 23 A intensa f p. as I_aspodern ser lidos como uma sucessao dI I d ascinacao que a a it eII,u n c 0 a Renascenca reflete-se ' . rqut etura romana exerceu no,\l'/wstiiio de Mantegna, no LOUv~~~bem na pmtura: detalhe do Martirio de S.

    22

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    17/20

    2 4 25

    Te rmas romanas

    n

    s re stos de termas roman as .(thermae) constitufram uma vastah 'ranl;a de material arquitetonico.Suns plantas complexas sugeriamdlsposicoes variadas de diversost lpos e seus vestibulos abobadados(ornaram-se prot6tipos para edificios piiblicos na era das estradas de ferro.24 0 tepidarium das termas de Diocleciano, Roma, transforrnado por Miguelt\r l,gelo, em 1563, na igreja de S. Maria degli Angeli. 25 Planta das terrnas deTho, segundo a restauracao de Palladio, cujos desenhos foram coletados porI .ord Burlington e publicados em 1730. 26 0 grande vestibulo da PensylvaniaRailroad Station, Nova York (1906-10, demolida em 1965), proje tada porMcKim, Mead e White, numa imi tacao do saguao cen tra l das ter rnas det 'aracalla.

    . ~.~\_~.~

    ; \ :;,~( ;tfU".i..

    26

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    18/20

    29

    o tem a d o P an teo no Panteon e urn temploromano de formaexcepcional, devido a scircunstancias especiaisde sua construcao, quelevou urn longo perfodode tempo. A cornbinacaode urn corpo cilfndricorecober to po r domo e urnp6rtico saliente encontroueco do seculo XVII emdiante.27 Gravura em meta l de Piranesi do Panteon , como era em 1760.28 Interpretacao de Bernini do tema em S. Maria del l' Assunta, Ariccia,proximo de Roma (1664) . 29 Urn Pan teon domest ico em min ia tura, em umailha do lago Windermere - "Belle Isle", projetado por John Plaw, 1774-75.300 ediffcio da biblioteca,que domina a composicao da Universidade deVirginia, Charlottesville, projetado por Thomas Jefferson e construido em1817-26.

    30" ,'I.

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    19/20

  • 5/10/2018 A Linguagem Classica Da Arquitetura

    20/20

    32

    A p rogen it ur a do t emplo c ir cu la rEste tema estava destinado a ter muitas variacoes de forma. 32 A primeiraderivacao foi 0Tempiet to de Bramante, no claustro de S. Pietro in Montorio,1502.330 domo de Wren em S.Paulo, Londres (1696-1708) , e leva ainterpreta\;ao de Bramante a escala colossal da catedral, cuja composicaodomina. 340 mausoleu do castelo de Howard (1729), de Hawksmoor, tambemderiva deste tema, mas com um espirito completamente diferente. 35 JamesGibbs empregou 0mesmo tema com ritmos elaborados na sua bibliotecaRadcliffe, em Oxford (1739-40).

    33

    35