A Luta de Yaacov Com o Anjo

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A Luta de Yaacov com o Anjo: o Encontro Histórico Rabino Eliahu Birnbaum Parashat Vaishlach Nesta parashá nos encontramos diante de um dos relatos mais difíceis, porém ao mesmo tempo, mais interessantes da Torá: a luta entre nosso patriarca Yaacov e um anjo. A Torá não define claramente quem era o personagem com o qual lutou Yaacov, porém segundo a continuação do texto, fica refletida sua luta com a presença Divina. O combate de Yaacov com o anjo não está anunciado como sonho. Entretanto, ronda neste relato, a aura misteriosa dos sonhos. Maimônides e Nachmânides interpretam este episódio da vida de Yaacov, e possuem opiniões distintas sobre o que realmente aconteceu neste episódio, se foi um sonho ou foi realidade. A luta aconteceu durante a noite. O enfrentamento começa unicamente depois de que Yaacov fica sozinho, solitário. A leitura dos acontecimentos provoca surpresa e foram feitas inúmeras sugestões interpretativas a fim de resolver as aparentes obscuridades do texto. É possível interpretar que se trata de um relato cujos componentes simbólicos se misturam, tal como no fragor de uma luta; a luta é a circunstância na qual está imerso Yaacov, mesmo ele não sendo o protótipo de um guerreiro. Entretanto, em sua vida, já enfrentou situações de conflito, astúcia, medo e triunfo. Esav e Laban constituem os principais sinais do caminho de um homem que se sente predestinado e que tem tido revelações que o colocam à prova. Quando Yaacov ficou sozinho, começou a luta. A luta em seu fervor e em seu fastígio provoca uma transformação na personalidade de Yaacov. Seu novo nome, “Israel”, indica que ele conquistou uma nova posição. A mudança do nome é, neste caso, um renascimento simbólico. A luta de Yaacov não foi suscitada por um objetivo; tem o caráter de uma provação. É uma luta que inclui em sua própria essência a fonte da missão, que constitui o sentido da existência de Yaacov. O temor e a ambição poderiam ser vistos como rasgos dominantes na vida deste

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A Luta de Yaacov Com o Anjo

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A Luta de Yaacov com o Anjo: o Encontro Histórico Rabino Eliahu Birnbaum

Parashat Vaishlach

Nesta parashá nos encontramos diante de um dos relatos mais difíceis, porém ao

mesmo tempo, mais interessantes da Torá: a luta entre nosso patriarca Yaacov e

um anjo.

A Torá não define claramente quem era o personagem com o qual lutou Yaacov,

porém segundo a continuação do texto, fica refletida sua luta com a presença

Divina.

O combate de Yaacov com o anjo não está anunciado como sonho. Entretanto,

ronda neste relato, a aura misteriosa dos sonhos. Maimônides e Nachmânides

interpretam este episódio da vida de Yaacov, e possuem opiniões distintas sobre o

que realmente aconteceu neste episódio, se foi um sonho ou foi realidade.

A luta aconteceu durante a noite. O enfrentamento começa unicamente depois de

que Yaacov fica sozinho, solitário. A leitura dos acontecimentos provoca surpresa e

foram feitas inúmeras sugestões interpretativas a fim de resolver as aparentes

obscuridades do texto.

É possível interpretar que se trata de um relato cujos componentes simbólicos se

misturam, tal como no fragor de uma luta; a luta é a circunstância na qual está

imerso Yaacov, mesmo ele não sendo o protótipo de um guerreiro. Entretanto, em

sua vida, já enfrentou situações de conflito, astúcia, medo e triunfo. Esav e Laban

constituem os principais sinais do caminho de um homem que se sente

predestinado e que tem tido revelações que o colocam à prova. Quando Yaacov

ficou sozinho, começou a luta.

A luta em seu fervor e em seu fastígio provoca uma transformação na

personalidade de Yaacov. Seu novo nome, “Israel”, indica que ele conquistou uma

nova posição. A mudança do nome é, neste caso, um renascimento simbólico.

A luta de Yaacov não foi suscitada por um objetivo; tem o caráter de uma provação.

É uma luta que inclui em sua própria essência a fonte da missão, que constitui o

sentido da existência de Yaacov. O temor e a ambição poderiam ser vistos como

rasgos dominantes na vida deste patriarca, porém na luta, a ambição vence a prova

de fogo e é premiada com: “Não será mais teu nome Yaacov e sim Israel, porque

lutastes com D-us e com os homens e vencestes”.

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Quando Yaacov pergunta qual o nome de seu adversário, este responde: “Por que

me perguntas por meu nome?”

Nesta pergunta se condensa o mistério e a fascinação do relato. O ser responde:

por que me perguntas por meu nome? Certamente, a pergunta de Yaacov era

retórica. Ele sabia com quem tinha lutado. Cabe pensar que esta certeza não

formulada durante o sonho, estava como evidência quando despertou: “E chamou

Yaacov o nome daquele lugar Peniel” (o rosto de D-us) porque disse: “Vi a D-us cara

a cara e foi libertada minha alma”.

A luta de Yaacov não é vista como um episódio pessoal; representa a luta do povo

de Israel durante todas as gerações.

A vida de Yaacov é o protótipo do destino do povo judeu na diáspora. Ele é o

patriarca mais perseguido, o escravizado, o que deve fugir e aquele cuja vida está

repleta de sofrimentos.

Yaacov representa, em sua personagem e em sua história, todo o povo de Israel e é

por esse motivo que D-us lhe dá um novo nome que será o nome do povo de Israel

no futuro.

Milhares de anos transcorreram desde este enfrentamento histórico, porém até o

dia de hoje Yaacov encontra-se sozinho e solitário. Até o dia de hoje, o povo de

Israel deve enfrentar lutas noturnas contra aqueles que querem apagá-lo do cenário

histórico, afetando sua integridade física e sua identidade.

Os relatos da Bíblia não são apenas história. Neles encontramos mensagens que

iluminam nosso futuro e dão um significado ao presente. O relato de Yaacov

readquiriu importância e significado por ser um relato “eterno”.

Yaacov tornou-se o vencedor do encontro noturno. Ele dominou a força de seu

adversário misterioso até ao amanhecer. Seu triunfo era inesperado, já que se

encontrava sozinho, débil e desarmado diante de um oponente treinado e poderoso.

Yaacov não se rendeu diante do adversário que o atacou na sombra da noite. Ele

atuou de maneira extraordinária, em contra toda consideração racional,

pragmática. Em outras palavras, atuou heroicamente. Yaacov, sozinho e indefeso,

foi para a luta com um inimigo poderoso. Yaacov não demonstrou força, mas sim

heroísmo e valor. O amanhecer o encontrou convertido em um vencedor solitário,

em um herói inesperado. O impossível e o evitável superaram o possível e o

racional. O heroísmo triunfou, em lugar da racionalidade.

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Por acaso é verdade que está incluso neste episódio, toda a história do povo Judeu

em sua luta pela sobrevivência durante milhares de anos?

O Fracasso Histórico dos Primogênitos Rabino Eliahu Birnbaum

Parashat Toldot –

“Certa vez, Yaacov havia cozido um guisado e Esav veio do campo, e ele estava

cansado. E Esav disse a Yaacov: ‘Enche minha boca, rogo-te, dessa coisa vermelha,

pois estou cansado’... E Yaacov disse: ‘Vende, tão claro como o dia, tua

primogenitura para mim’. E Esav disse: ‘Eis que caminho para a morte; de que me

servirá a primogenitura’? E Yaacov disse: ‘Então jura-me, de forma clara como o

dia’. E jurou-lhe, e vendeu sua primogenitura a Yaacov. E Yaacov deu a Esav pão e

o cozido de lentilhas; e ele comeu e bebeu, levantou-se e se foi; e Esav desprezou a

primogenitura”.

(Gênesis 25, 29-34)

Esta é uma das poucas parashiot que nos provem de detalhes biográficos acerca de

nosso patriarca Itzchak. O livro de Gênesis nos proporciona escassos detalhes sobre

sua vida. Não sabemos nada sobre sua infância e sua juventude, exceto a cena em

que se dirige junto com seu pai para o sacrifício.

Esta parashá nos relata um dos episódios mais dramáticos da vida de nossos

patriarcas. No centro do relato está Itzchak, o velho pai cujos olhos ficaram

nublados, fato que origina os dramáticos acontecimentos da luta entre seus dois

filhos Yaacov e Esav.

As figuras centrais desta parashá são os famosos gêmeos Esav e Yaacov.

Começando com o conflito que se revela entre ambos quando ainda estão no ventre

materno, e finalizando com a fuga de Yaacov para Harán com medo da fúria de seu

irmão, que havia decidido matá-lo por ter-lhe tirado, mediante uma artimanha, a

primogenitura que seu pai lhe prometera.

A história sobre Yaacov e Esav relatada em nossa parashá, constitui uma luta entre

a primogenitura e a escolha. O primogênito, que deveria ser o responsável pelo

aspecto espiritual, é na realidade um homem do campo, hábil ao caçar, um homem

de trabalho que se ocupa do alimento. Já Yaacov, o mais jovem, que deveria

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ocupar-se justamente dos assuntos materiais, era um homem aprazível, um

“morador de tendas”, um homem espiritual.

Um dia quando Esav voltou do campo, solicita de Yaacov que lhe proporcione

comida, e está disposto a entregar-lhe, em troca, o direito a primogenitura. Desde

então resulta a divisão: Yaacov se encarregará dos assuntos espirituais, enquanto

que Esav se preocupará dos assuntos materiais.

Este é o conflito entre primogenitura e escolha. A vantagem do direito de

primogenitura está reconhecida pelas leis dos povos e também pela Torá;

entretanto é justamente o filho menor o escolhido nos diferentes relatos bíblicos.

Talvez possamos afirmar sobre esta base que o primogênito é o possuidor do direito

humano e o filho mais novo do direito Divino. Desde o ponto de vista biológico, o

filho primogênito é o primeiro, porém por alguma razão a Torá escolhe e prefere o

filho mais novo, atribuindo-lhe funções que, na realidade, correspondem ao mais

velho.

O começo deste drama está relacionado com a época de Adam (Adão), com o que

aconteceu com os primeiros dois irmãos da humanidade: Cain e Abel. Ambos

tinham diferentes ocupações: Cain, o mais velho, trabalhava a terra e Abel, o mais

jovem, era pastor. Cain é o primeiro a trazer uma oferenda diante de D-us fazendo

com que seu irmão ficasse em segundo. Entretanto, D-us aceita a oferenda do

irmão menor, Abel. É possível entender deste fato que é D-us quem elege a Abel e

rechaça a primogenitura de Cain.

Mais adiante, no livro de Gênesis, Abraham expulsa seu primogênito Ishmael e

escolhe Itzchak. Itzchak abençoa a Yaacov em vez de Esav, Yaacov passa a

primogenitura de Reuven a Yosef.

Yaacov abençoa a Efraim com sua astúcia, em vez de abençoar a Menashe. Dos

irmãos Moshe e Aharon, Moshe, o mais jovem, é escolhido para liberar o povo do

Egito. O profeta Shmuel escolhe em missão Divina a David, o mais jovem da família

de Ishay para que seja rei de Israel e David elege a Shlomo para que o herda como

rei, apesar de não ser o primogênito.

Todas as histórias bíblicas com respeito a maioridade revelam uma certa

regularidade em suas leis. Qual é a razão? Por que sempre o primogênito é

rechaçado e não consegue cumprir com sua função? Por que o primogênito cumpre

apenas com sua função biológica e não consegue exercer, igualmente, sua função

espiritual?

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Na maioria dos casos, entre os irmãos, o primogênito é o líder que guia aos demais.

Do ponto de vista psicológico, pelo fato de ser o mais velho, ajuda na criação de

seus irmãos, o que lhe outorga uma certa responsabilidade, originando

habitualmente, uma personalidade mais madura e seria.

Entretanto, no Tanach as coisas sucedem de outra maneira, até mesmo, às vezes,

de maneira oposta a estas leis naturais e psicológicas. No Tanach não existe o

conceito do “Destino”, essa sentença predeterminada que irá ocasionar os sucessos

na vida da pessoa, sem que se conheçam as razões para isso. Ao invés, o Tanach

nos mostra outro conceito, que se refere a um fenômeno que existe ainda antes do

nascimento da pessoa, e que é a função espiritual que certo personagem possui

ainda antes de nascer. O primogênito não nasce traçado num destino de

primogenitura. O fato de ter nascido primeiro entre seus irmãos não lhe confere um

destino privilegiado em comparação com os demais irmãos. A lição que nos quer

ensinar o Tanach, quando rechaça o primogênito, nesta parashá como em outras, é

que a superioridade de uma pessoa está determinada por suas ações e não pelo

momento em que nasce.

Na história da venda da primogenitura temos destacado não apenas o fato de que

Yaacov tenha adquirido a primogenitura, senão também, a anulação da

primogenitura por Esav. Yaacov representa o ensinamento Divino de que a partir

desse momento, o valor de uma pessoa não depende da herança, mas sim, de seu

valor pessoal e sua superioridade espiritual.

No mundo pagão existia a crença de que o primogênito era possuidor de uma força

Divina relacionada com a fertilidade humana. Os egípcios converteram seus

primogênitos em deuses, razão que explica porque D-us os eliminou na última das

dez pragas. A Torá anulou a instituição da primogenitura, mantendo para o

primogênito apenas um privilégio: receber tudo em dobro.

Esta parashá nos ensina, portanto, sobre a anulação da primogenitura como

instituição que proporciona ao filho mais velho uma série de privilégios espirituais.

Estes privilégios serão outorgados ao homem, apenas baseando-se em suas boas

ações e não no lugar de seu nascimento dentro de sua família.

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