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CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE MINAS GERAIS DEPARTAMENTO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO MESTRADO EM EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA ELIVANE AMARAL DE SOUZA ASSIS A MAIÊUTICA E A ERÍSTICA NO ENSINO DE GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA E TECNOLOGIA BELO HORIZONTE – MINAS GERAIS 2009

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CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE MINAS GER AIS

DEPARTAMENTO DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO

MESTRADO EM EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA

ELIVANE AMARAL DE SOUZA ASSIS

A MAIÊUTICA E A ERÍSTICA NO ENSINO DE GRADUAÇÃO EM

CIÊNCIA E TECNOLOGIA

BELO HORIZONTE – MINAS GERAIS

2009

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ELIVANE AMARAL DE SOUZA ASSIS

A MAIÊUTICA E A ERÍSTICA NO ENSINO DE GRADUAÇÃO EM

CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação Tecnológica do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais como requisito básico para obtenção do título de mestre. Orientador: Dr. Fábio Wellington Orlando da Silva

BELO HORIZONTE – MINAS GERAIS

2009

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ELIVANE AMARAL DE SOUZA ASSIS

A MAIÊUTICA E A ERÍSTICA NO ENSINO DE GRADUAÇÃO EM

CIÊNCIA E TECNOLOGIA

Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Educação Tecnológica do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais – CEFET-MG, em ____/____/2009, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação Tecnológica, aprovada pela Banca Examinadora constituída pelos professores:

___________________________________________________________ Prof. Dr. Fábio Wellington Orlando da Silva – CEFET-MG – Orientador

___________________________________________________________ Prof. Dr. ................................................................................... – Instituição

___________________________________________________________ Prof. Dr. ................................................................................... – Instituição

___________________________________________________________ Prof. Dr. ................................................................................... – Instituição

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DEDICATÓRIA

Ao meu pai, Raimundo de Souza , nascido

filósofo e astrônomo, fonte de inspiração e exemplo

de vida para mim;

À minha mãe, Lenita Amaral de Souza (in

memorian), com quem aprendi persistência,

determinação, superação de desafios e

amorosidade;

E aos meus filhos, Bruno Amaral Assis e

Diana Amaral Assis, para os quais também

gostaria de deixar fontes de inspiração, pois eles

sempre me incentivaram e apoiaram em minha

trajetória acadêmica e em suas implicações em

nosso cotidiano, com respeito, afeto, compreensão e

companheirismo.

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AGRADECIMENTOS

À vida e às suas oportunidades de crescimento.

À minha família, pelo respeito, amor, companheirismo, generosidade,

compreensão, apoio, incentivo, celebração, espírito investigativo, bom humor e

graça.

À Santuza Abras que me incentivou e apoiou com alegria e entusiasmo,

fortalecendo-me, principalmente nos momentos mais difíceis, alimentando minha

confiança para realizar o meu propósito.

Ao Prof. Dr. Fábio Wellington Orlando da Silva por me dar um voto de

confiança, ao me aceitar como sua orientanda e me desafiar com uma proposta de

pesquisa em epistemologia que resultou neste trabalho.

Aos professores da FaE/CBH/UEMG e aos professores do CEFET/MG que

contribuíram, com sua ajuda para execução da parte empírica deste trabalho.

Aos alunos da FaE/CBH/UEMG e do CEFET/MG que participaram, com

curiosidade e compromisso da parte empírica deste trabalho.

Aos mestres que, na minha trajetória escolar, ensinaram-me a refletir, ter

curiosidade e acreditar em uma forma de ensinar e educar de modo criativo e

dinâmico.

Aos colegas, à direção da FaE/CBH/UEMG, à Universidade do Estado de

Minas Gerais, à FAPEMIG, pela oportunidade de tornar essa pesquisa realidade.

Ao professor Jerônimo Coura Sobrinho, pela leitura e apreciação do primeiro

projeto deste trabalho.

Ao Professor Vicente Parreiras pela disponibilidade em ler o abstract deste

trabalho.

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Aos meus colegas do FICITEC, nosso grupo de estudo, pelas trocas de

informações, de conhecimentos, de apoio e de companheirismo.

À Soraia Cardoso, Heloisa de Azevedo Branco, Marisa Andrade Chaves,

Cláudia Eliza das Graças, David José Tierro, Profª. Maria Aparecida Silva, Josué

Lopes, Geraldo F. C. A. de Lima, pela amizade entusiasmo com que sempre se

referiram a esta pesquisa.

Aos professores, coordenadores e funcionários do Mestrado em Educação

Tecnológica, pela alegre e desafiadora convivência e ao Colegiado do Conselho de

Pesquisa e Pos Graduação, pela oportunidade.

Ao Secretário do Mestrado, Fábio Vasconcelos, sempre gentil,

compromissado e competente no atendimento a todos, indistintamente.

Aos autores que deixaram suas valiosas contribuições sobre as quais pude

refletir e ressignificar conhecimentos.

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O que não conheces em teu próprio corpo,

Não conhecerás em nenhum outro lugar.

Merleau Ponty

Que canção que fale de mim posso cantar

apenas com palavras que levem

o encanto além da melodia?

A maravilha que encontro

na vida a meu redor

não tem explicação.

E tudo o que toco e vejo

afeta a minha sensibilidade.

Facilmente... sublimo a

minha consciência, até estar

cheia de energia; e a luz

e a sombra do sol são minhas.

Não preencho a minha cabeça

com pensamentos cheios de ansiedade,

já segurei o desespero nas mãos e

segurarei de novo.

Aqui e agora, a minha alegria

existe, está viva.

Preciso do ritmo do tempo

para usá-la.

Sabendo que o cuidado

é permitido,

ele não pode ser poupado

para o meu

amanhã.

Rosalie Andrews

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RESUMO

Este estudo investiga como os diálogos socráticos e os estratagemas de Schopenhauer podem ajudar professores e alunos a perceber argumentos enganosos, capciosos, a desenvolver pensamento crítico e compreender o processo de desenvolvimento da ciência como uma estrutura rica e dinâmica. Procurou-se mostrar que também a Erística pode ser usada como forma de preparação para entender o processo de pesquisa e do discurso científico, a detecção de falhas de pensamento, e não apenas como uma arte de disputar. A pesquisa teve como informantes alunos de ciências exatas e de ciências humanas. Foram realizados estudos exploratórios para a coleta de dados e aprofundamento posterior do trabalho. Os resultados desses estudos exploratórios, realizados em novembro e dezembro de 2008, propiciaram elementos para elaboração do Estudo de Caso. Utilizando-se o método de Estudo de Caso, foi ministrado um curso aos alunos da área de ciências exatas, no período de março a abril de 2009, com carga horária total de 8 horas/aula, divididas em quatro módulos de 2 horas/aula cada. Concluiu-se que basta dar a oportunidade aos alunos, pois eles estão prontos e motivados para um ensino reflexivo, relacionado com a prática. Concluiu-se também que ciências exatas e ciências humanas são campos complementares e que o ensino de ciência e tecnologia pode se tornar mais produtivo, interessante, rico, dinâmico e criativo, indicando possibilidades de desenvolvimento de um tecnohumanismo que traga contribuições promissoras para a sociedade humana contemporânea.

Palavras chave: Maiêutica, Erística, estratagemas, ciência, tecnologia, diálogos socráticos, falácias, dialética.

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ABSTRACT

This study is an investigation of how the Socratic dialogues and the Schopenhauer’s stratagems can help teachers and students to see deceiving, and misleading arguments and to develop a critical thinking as well as understand the process of science development as a rich and dynamic structure. It is also argued that the eristic can be used as a way to prepare to understand the research process and scientific discourse; it is a way to notice thinking failures, and not only as the art of dispute. The research included students from the exact and human sciences in an exploratory study as an approach for data collecting and analysis. In November and December of 2008, the results of these studies provided elements to elaborate a case study. Using the case study methodology, an eight-hour class was administered to the students of exact sciences during March and April of 2009. The conclusion was that if students are given the opportunity, they will be ready and motivated for a more reflexive teaching and more related to the practice. It also showed that exact and human sciences complement each other, so the teaching of science and technology can be more productive, creative, rich, interesting and dynamic; with possibilities to develop a tecnohumanism that can bring promising contributions to the contemporary human society.

Key words: Maieutics, Eristic, stratagems, science, technology, Socratic dialogues, fallacies, dialectic.

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LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Motivação para ir à palestra ............................................................. 61

Gráfico 2 - Argumentos apresentados pelo autor............................................... 62

Gráfico 3 - Concorda ou discorda com as idéias do autor.................................. 63

Gráfico 4 - Motivação para ir à palestra ............................................................. 64

Gráfico 5 - Argumentos apresentados pelo autor............................................... 65

Gráfico 6 - Concorda ou discorda com as idéias do autor.................................. 66

Gráfico 7 - Texto 1 - 23/03/09............................................................................. 68

Gráfico 8 - Texto 1 - 01/04/09............................................................................. 69

Gráfico 9 - Texto 2 - 23/03/09............................................................................. 71

Gráfico 10 - Texto 3 - 01/04/09........................................................................... 72

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO..................................................................................................... 5

2 Dialética socrática e dialética erística de Schopenhauer................................... 10

3 O LUGAR DO DEBATE NO ENSINO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA............... 30

4 METODOLOGIA ................................................................................................ 47

4.1 Delineamento experimental ............................................................................... 47

4.2 Coleta de dados................................................................................................. 52

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ......................................................................... 59

5.1 Entrevista com os professores de biologia ........................................................ 59

5.2 Análise dos questionários aplicados na turma de Ciências Exatas ................... 61

5.3 Análise dos questionários aplicados na turma de Ciências Humanas............... 64

5.4 Curso: a erística e a falácia no discurso pseudocientífico ................................. 67

6 CONCLUSÃO .................................................................................................... 79

7 REFERÊNCIAS ................................................................................................. 82

8 APÊNDICES...................................................................................................... 84

9 ANEXOS............................................................................................................ 88

10 ÍNDICE REMISSIVO.......................................................................................... 92

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1 INTRODUÇÃO

Quem se dedica à filosofia põe-se à procura do homem, escuta o que ele diz, observa o que ele faz e se interessa por sua palavra e ação, desejoso de partilhar, com seus concidadãos, do destino comum da humanidade.

(Karl Jaspers).

O objetivo desta pesquisa é investigar uma possível contribuição da dialética

socrática e da dialética erística de Schopenhauer ao ensino de ciências, ajudando

professores e alunos a perceberem argumentos enganosos ou capciosos, a

desenvolverem o pensamento crítico e a compreenderem o processo de

desenvolvimento da ciência como uma estrutura rica e dinâmica, e não apenas

cálculos e resultados apresentados de modo descontextualizado do processo de

pesquisa. Aprendendo a reconhecer regras de inferência, aprende-se a raciocinar a

partir da premissa até à conclusão, desenvolvendo o pensamento lógico dedutivo e

indutivo, tão necessários nos processos de pesquisa.

Há quem afirme que já viu vários candidatos, a professor de física chegarem

à sua classe com um conhecimento limitado da natureza da ciência. Isso não

surpreende, pois no modelo de ensino atual utilizam-se livros que exibem as

conclusões do trabalho e os conceitos científicos prontos, deixando de fora as

discussões ocorridas ao longo do processo, o contexto, as motivações, as

reviravoltas, os erros e as decisões que explicam como o cientista chegou àquela

conclusão. Isso também deveria ser ensinado aos candidatos a professores,

preparando-os para educar de forma eficaz seus alunos, com maior

desenvolvimento do pensamento crítico, da percepção e compreensão do processo

de pesquisa no ensino de física (1, p. 1).

Há uma tendência atual de reaproximação entre história, filosofia e ensino de

ciências, desencadeada pela largamente documentada crise do ensino de ciências.

A inclusão de história e filosofia da ciência em vários currículos nacionais como, por

exemplo, na Inglaterra, na Holanda e em outros países, poderia tornar as aulas de

ciência mais desafiadoras e reflexivas, permitindo, desse modo, a superação da

“falta de significação” e contribuindo para o desenvolvimento do pensamento crítico

(2, p. 2).

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Melhorar a formação do professor é fundamental, é importante auxiliar o

desenvolvimento do ensino de uma epistemologia da ciência, mais rica e mais

autêntica, que permita a compreensão da estrutura das ciências bem como do

espaço que ocupam no sistema intelectual. Conferências internacionais, artigos e

livros publicados, a partir de 1989, mostram o interesse cada vez maior por essa

temática.

Em muitas pesquisas realizadas no Brasil e nos EUA, diversos pesquisadores

como Carl Wenning, Mathews e Dascal vêm encorajando seus alunos a conduzir

“diálogos socráticos” e sugerem, em seus artigos, que professores de ciência

também o façam.

Os alunos sempre estão envolvidos nas discussões em sala de aula, mas

geralmente só respondem e não fazem perguntas apropriadas. Por isso, os

professores deveriam desenvolver nos estudantes “a disposição e habilidade” para

fazer perguntas adequadas. Além disso, os professores têm a vantagem de saber o

que é questionamento convergente e questionamento divergente (1, p. 4).

As discussões podem ser divididas, basicamente, em duas classes,

dependendo dos objetivos e expectativas dos participantes: as discussões

persuasivas , em que os participantes são motivados a encontrar um acordo; e as

discussões adversárias , em que nenhum dos participantes espera persuadir ou ser

persuadido; pois pretendem continuar adversários e apresentam seus argumentos

com o objetivo de fazer o seu lado parecer bom, e o do oponente ruim. No primeiro

caso, poder-se-ia incluir o debate científico de bom nível, um trabalho colaborativo

em que se busca construir um discurso comum e coerente acerca da natureza (3, p.

1). O estudo da Maiêutica (Dialética Socrática) tem sido estimulado como um

instrumento para desenvolver essa habilidade.

No segundo caso, tudo o que importa é triunfar sobre o adversário. Para

ganhar uma discussão com sucesso, sua posição deve ser apresentada como se

fosse lógica e racional e, ao mesmo tempo, mostrar a do oponente como ilógica e

irracional. Neste trabalho são apresentadas diversas formas falaciosas de

inferências na argumentação usual que foram descritas por Schopenhauer (4) em

sua Erística, e hoje também são de uso corrente na mídia.

A Dialética Socrática é o método desenvolvido por Sócrates (5), filósofo grego

do século V a.C. (470-399 a.C.), que inaugura o chamado período antropológico da

filosofia grega. Sócrates fazia uma analogia entre o trabalho de sua mãe e o seu; ele

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dizia que ela era parteira e trazia ao mundo crianças e ele trazia ao mundo idéias,

por meio do diálogo como modo de parturição de idéias. Isso significa que ele

ensinava aos indivíduos, por meio do diálogo, a arte de raciocinar de modo

adequado, fazendo-lhes perguntas, estabelecendo relações entre idéias, para

chegar a conclusões, a soluções. A finalidade da maiêutica é de natureza ética e

educativa. Ela pode ser dividida em três momentos, segundo alguns autores: a)

ironia; b) refutação; c) maiêutica.

A ironia é o ponto de partida em que Sócrates utiliza-se de argumentação ou

estratagemas para testar a veracidade, a coerência e o conhecimento de seu

oponente; ela tem um caráter formal no método socrático.

A refutação das idéias do interlocutor tem a função de fazê-lo reconhecer as

falhas do próprio pensamento, sua ignorância, para em seguida encaminhá-lo para a

descoberta da verdade. Purificado do erro, o interlocutor é conduzido à etapa

seguinte.

A maiêutica é uma investigação na qual o interrogado busca, dentro de si

mesmo, a verdade, através da coerência lógica.

A interrogação verdadeira do verdadeiro mestre é, na realidade, um método

de ensino e de instrução, mas de uma instrução ativa que se exerce sem que o

pareça, como estímulo, guia e sugestão disfarçada (5, p. 59).

Percebe-se a maestria de Sócrates ao conduzir o interlocutor, através de

perguntas e argumentos, da simples opinião ao desenvolvimento do pensamento

crítico que lhe permite descobrir um saber que traz em si mesmo.

Sócrates representa, na história das concepções filosóficas do homem, no

ocidente, a inflexão decisiva que orienta até hoje o pensamento antropológico. Na

visão socrática, “o humano” só tem sentido e explicação quando referido a uma

dimensão de interioridade presente em cada homem, a psyché ou alma. Esse

conceito passará a influenciar toda a cultura ocidental, aliada ao conceito de areté

(virtude). A partir desses conceitos Sócrates introduziu a idéia de personalidade

moral, sobre a qual irão assentar-se os princípios da ética e dos direitos ocidentais

(6, p. 33).

Sócrates desenvolve o conceito de logos (razão, teoria) como inerente ao

homem, o que permitirá que a relação dialógica torne-se essencial nas relações

humanas e é um conceito importante, discutido pela filosofia e pela ciência, através

da história, fundamental nos debates filosóficos e científicos da contemporaneidade.

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O mesmo vale para o conceito de ética e da sua utilização nas produções

científicas e tecnológicas e sua contribuição sócio-histórico-cultural ainda se reflete

nos debates acalorados em defesa ou contra os benefícios e os malefícios da

ciência e da tecnologia.

A Erística foi desenvolvida pelo filósofo Schopenhauer (1788-1860), na qual

ele apresenta 38 estratagemas que podem ser estudados, compreendidos e

utilizados para reconhecer e desmontar as artimanhas do debate capcioso, aquele

que quer, apenas, confundir e desmoralizar o adversário.

A Erística de Schopenhauer estuda essencialmente a argumentação

desonesta, diferentemente de Aristóteles a quem faz várias referências. Para

Aristóteles, a dialética serve, também, secundariamente, para o treinamento escolar

e os debates públicos, mas Aristóteles advertia que não se deve dialetizar com

quem não conhece o assunto e as regras da argumentação válida, ou seja: quando

praticada a dois é um exercício do qual “só podem participar as pessoas informadas

e honestas, dispostas a encontrar a verdade e abandonar, no curso da disputa, as

opiniões que se revelem inconsistentes” (7, p. 55) – objetivo análogo ao da

maiêutica socrática.

Esta pesquisa admite como ponto de partida o seguinte:

[...] para muitos adultos, a experiência de se admirar e refletir nunca

exerceu nenhuma influência sobre suas vidas. Assim, esses adultos deixaram de questionar e de buscar significados de sua experiência e, finalmente [...] a proibição de se admirar e questionar se transmite de geração para geração [...] a filosofia é uma disciplina que inclui a lógica e, portanto, se ocupa em introduzir os critérios de excelência no processo do pensar para que os estudantes possam caminhar do simples pensar para o pensar bem (8, p. 214).

A parte empírica da pesquisa investigou os tipos de argumentos inválidos que

os alunos pesquisados são capazes de perceber no discurso científico. São alunos

de graduação em ciências humanas e em ciências exatas de duas escolas públicas

do município de Belo Horizonte. Partiu-se da hipótese de que eles não

compreendem regras mais elaboradas do pensamento analítico e da dialética. Esse

quadro poderia ser modificado pelo ensino da Dialética Socrática e da Dialética

Erística com finalidade ética e educativa, levando-os a reconhecer argumentos

falaciosos do discurso pseudocientífico, contribuindo para sua formação técnica e

científica de modo crítico. Isto porque um exercício contínuo e profícuo da dialética,

como aqui proposto, poderia contribuir para um ensino de ciência e tecnologia de

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modo significativo. Essa suposição foi corroborada pela pesquisa empírica, na qual

estudantes revelaram um desenvolvimento significativo do seu pensamento crítico e

reconheceram argumentos falaciosos que antes lhes passava despercebidos.

É importante lembrar que a cultura é o resultado do pensar e do agir humano,

do seu fazer: suas práticas, suas teorias, suas instituições, seus valores materiais e

espirituais. Esse fazer é coletivo e toma sentido pela linguagem e pelo diálogo

estabelecido a partir da linguagem. O homem tem necessidade de se expressar, de

se comunicar, e o faz através de diversos sistemas semióticos e pela faculdade da

linguagem.

Ciência e tecnologia são criações humanas; pseudociência, também. A

tecnologia, que é a técnica enriquecida pelo saber científico, modificou o habitat

humano e, provavelmente, continuará a fazê-lo. Contudo, há muita ambigüidade

nessas criações. Por isso é fundamental que esse fazer seja acompanhado de

reflexões sobre o próprio sujeito e o seu fazer, sobre as conseqüências desse fazer.

É fundamental que o ensino de ciência e tecnologia seja nutrido por reflexões

sobre a responsabilidade social dos cientistas e pela compreensão, por parte dos

professores e estudantes, das implicações desse fazer e também do processo como

ele se dá como pesquisa e como construção social.

A filosofia da ciência e da tecnologia tem um compromisso com a

investigação dos fins e das prioridades a que a ciência se propõe e com a

compreensão do processo de pesquisa e investigação científica e suas

conseqüências sociais. Por isso, filósofos da Escola de Frankfurt, por exemplo,

criticaram mitos da ciência (ou pseudociência?) e alertaram para o fato de que,

mesmo sendo produto da racionalidade humana, podem produzir efeitos irracionais

perversos.

Por isto é importante melhorar o ensino de ciência e tecnologia com o

desenvolvimento da reflexão que o pensamento dialético proporciona.

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2 Dialética socrática e dialética erística de Scho penhauer

“A vida que não é examinada não vale a pena ser vivida” (Sócrates)

“O tempo da vida humana não passa de um ponto, e a substância é um fluxo, e suas percepções embotadas, e a composição do corpo corruptível, e a alma um redemoinho, a sorte inescrutável, e a fama algo sem sentido. O que então, pode guiar o homem? Somente uma coisa, a filosofia.”

(Marco Aurélio)

Nas citações em epígrafe vê-se que a filosofia propunha à humanidade não

apenas um modo, mas uma arte de viver. Contudo, a filosofia moderna aparece,

em diversas experiências acadêmicas, apresentada com uma linguagem técnica

fora do alcance de compreensão dos estudantes. Os filósofos sempre usaram a

argumentação. Na tradição européia, por exemplo, vêem-se desdobramentos, os

quais serão abordados neste capítulo. Questiona-se, aqui, o ensino (ou o não-

ensino) de filosofia com linguagem técnica específica, altamente abstrata, que

estudantes não conseguem compreender; percebe-se que isso os induz à

desmotivação em relação ao estudo da filosofia, de modo geral. Por isto, autores

com Lipman (13) propõem adequação dos textos didáticos, aliados à prática da

argumentação socrática como modo de desenvolver atitude crítica.

Por este motivo faz-se necessário resgatar a importância da filosofia e,

sobretudo, da filosofia da ciência e tecnologia do ponto de vista do pensar bem, de

saber utilizar-se de argumentações apropriadas para a comunicação com o outro e

consigo mesmo.

Neste capítulo, pretende-se mostrar os fatos mais relevantes desse assunto,

de modo que constitua um contexto para a aplicação das idéias apresentadas a

seguir, tanto do ponto de vista teórico quanto dos resultados experimentais

apresentados nos capítulos Resultados e Discussão.

Uma contribuição fundamental que Sócrates deixou para a posteridade foi o

seu método: a maiêutica, que será tratada a seguir.

O filósofo grego Sócrates (470-399 a.C.) inaugura o chamado “período

antropológico” da filosofia grega, uma vez que ele volta o foco da filosofia para o

próprio sujeito, a necessidade de conhecer-se. Ele visa desenvolver nas pessoas a

consciência crítica, por meio de diálogos. Como ele nada escreveu, seus diálogos

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são retratados por um de seus discípulos, Platão (428-347 a.C.), e também por

Xenofonte. Sócrates foi considerado, por alguns de seus contemporâneos

(sobretudo políticos), como um elemento desestabilizador; a causa disso era sua

insistência em fazer perguntas consideradas “embaraçosas”. Por meio de suas

perguntas, ele acabava levando o interlocutor a perceber sua própria ignorância ou

a inconsistência de seus argumentos e, entre esses, alguns eram homens

importantes e poderosos da cidade de Atenas daquela época.

Sócrates procurava o critério de verdade no homem e não fora dele, por

meio de seu método, denominado Dialética Socrática. Nesse método de

investigação, ele jamais fornecia a resposta pronta, as soluções. Ele se limitava a

fazer perguntas, como recurso para levar seu interlocutor a ser estimulado a

raciocinar de modo adequado, induzindo-o à análise para que, assim estimulado,

encontrasse a verdade dentro de si mesmo.

Entre os diversos diálogos de Platão, figura o Teeteto (9, p. 52-56: 149a-

151c), no qual ele demonstra o método socrático, tendo como tema do diálogo a

questão filosófica: o que é conhecimento? O problema posto é o seguinte: no que

consiste o trabalho do filósofo? Qual é o processo de investigação mais adequado

para alcançar a verdade? A tese: por meio de uma comparação célebre, entre o

trabalho de uma parteira e o de um filósofo, Sócrates sustenta que a tarefa do

sábio não é propor afirmações verdadeiras, mas favorecer o nascimento da

verdade na alma do interlocutor. Eis um trecho desse famoso diálogo:

SÓCRATES − oh, meu amigo! Nunca ouviste dizer que sou filho de uma parteira muito competente e forte, Fenarete? TEETETO − sim, já ouvi dizer. SÓCRATES − e não ouviste dizer que exerço a mesma arte? TEETETO − não, nunca! SÓCRATES − sabes, então, que é assim. Porém, não vás dizer aos outros. Eles não sabem, caro amigo, que eu possuo essa arte e, como não sabem, não a mencionam quando falam de mim, mas dizem, sim, que sou o mais extravagante dos homens e que só faço semear dúvidas. Também isso ouviste dizer, não é verdade? TEETETO − sim SÓCRATES − e queres saber o motivo? TEETETO − sim, de bom grado. SÓCRATES − procura entender como é esse ofício de parteira e compreenderás mais facilmente o que quero dizer. Sabes que nenhuma mulher, enquanto tiver condições de conceber e gerar, pode ser parteira de outras mulheres, mas somente aquelas que não podem mais gerar. TEETETO − é certo.

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SÓCRATES − Dizem que isso se deve a Artemisa, que foi destinada a proteger os partos, mesmo sendo virgem. Ela não permitiu que mulheres estéreis fossem parteiras, por ser a natureza humana muito fraca para exercer uma arte da qual não teve experiência; reservou então esse ofício às mulheres que não podiam mais gerar por causa da idade, honrando desse modo a semelhança que tinham com ela. TEETETO − É natural. SÓCRATES − E não é igualmente natural que as parteiras saibam reconhecer, melhor do que ninguém, se uma mulher está grávida ou não? TEETETO − Certamente. SÓCRATES − E não são as parteiras que, ministrando remédios ou praticando magias, podem provocar as dores ou atenuá-las, se assim quiserem, e facilitar o parto daquelas que estão em dificuldade, e até fazer abortar, se necessário, quando o feto ainda é imaturo? TEETETO − É verdade. SÓCRATES − E nunca observaste que elas também são muito hábeis em arranjar casamentos, experientes que são em conhecer que homem e que mulher devem unir-se para gerar filhos melhores? TEETETO − Não, isso eu não sabia. SÓCRATES − Então saibas que elas se orgulham mais dessa habilidade do que do corte do cordão umbilical. Pense um pouco: julgas que envolvam a mesma arte ou artes diferentes recolher com cuidado os frutos da terra e saber reconhecer em que terra a planta deve ser plantada e a semente semeada? TEETETO − A mesma arte, creio. SÓCRATES − É esse, portanto, o grande ofício das parteiras, embora menor do que o meu. Com efeito, às mulheres não acontece ora dar à luz fantasmas, ora seres reais, sem que se possa distingui-los: porque, se isso ocorresse, o mais importante e belo ofício das parteiras seria o de distinguir o verdadeiro do não-verdadeiro, não te parece? TEETETO − Sim, assim me parece. SÓCRATES − Ora, a minha arte de obstetra assemelha-se em tudo à das parteiras, da qual difere por ser exercida sobre os homens, e não sobre as mulheres, e por cuidar das almas parturientes, e não dos corpos. E a sua maior qualidade é que por meio dela consigo discernir se a alma de um jovem dá à luz um fantasma e uma mentira ou algo de vital e verdadeiro. E tendo isso em comum com as parteiras, também sou estéril... de sabedoria. É verdadeiro o que muitos censuram em mim, de questionar os outros, sem nunca me pronunciar sobre nada, por ser ignorante.

E assim procedo justamente porque o deus me força a ser parteiro, mas impediu-me de gerar. Portanto, nada tenho de sábio e tampouco trouxe à luz qualquer descoberta genial gerada pela minha alma. Entretanto, se entre aqueles que apreciam estar em minha companhia, alguns, de início, parecem totalmente ignorantes, convivendo comigo alcançam, se o deus assim permitir, extraordinário resultado: como podem ver eles mesmos e os outros.

É evidente que de mim não aprenderam nada e que somente em si mesmos encontraram as inúmeras coisas belas que geraram; mas ajudá-los a gerar, este sim, é mérito do deus e meu. E eis a prova. Muitos, desconhecendo essa contribuição, acreditavam que o mérito era exclusivamente deles e me olhavam com certo desprezo; um dia, antes da hora, afastaram-se de mim, seja por vontade própria, sejam instigados por outros; e, distantes de mim, pelo resto do tempo não fizeram mais do que abortar os resultados dos maus acasalamentos em que se envolveram, destruindo também, por defeituoso desmame, tudo aquilo que graças à minha ajuda deram à luz, dando maior valor às mentiras e aos fantasmas

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do que à verdade; e acabaram por se mostrar ignorantes a si mesmos e aos outros.

Existem aqueles que depois voltam a invocar minha companhia e para recuperá-la fazem coisas estranhíssimas; e o demônio que vive em mim me impede de aceitar alguns e me permite aceitar outros; e estes, como antes, fazem bom proveito. Ora, aqueles que convivem comigo padecem como as parturientes: por sentirem as dores do parto, e por estarem cheios de inquietação, dia e noite, muito mais do que as mulheres. E a minha arte tem o poder de, ao mesmo tempo, provocar e acalmar as suas dores. É assim que acontece com eles.

Porém, existem outros, Teeteto, que não me parecem prenhes; e, reconhecendo que não dizer, que com a ajuda do deus, consigo facilmente encontrar-lhes a companhia de que possam beneficiar-se. E foi assim que fiz com que muitos se unissem a Pródico, e muitos com outros homens sábios e divinos. Pois bem, meu excelente amigo, se me alonguei nessa história é porque suspeito que tu, como tu mesmo sabes, estejas prenhe e sintas as dores do parto. Entrega-te, pois, a mim, que sou filho de parteira e obstetra eu mesmo....

E se depois, ao examinar as tuas respostas, eu julgar que alguma delas é fantasma, e não verdade, e arrancá-la-ei de ti e deitá-la-ei fora, não te exasperes comigo como fazem pelos seus filhos as mulheres de primeiro parto. Já são muitos os que dedicam a mim tal hostilidade, tanto a ponto de morder-me se eu procuro extirpar deles alguma bobagem; e não crêem que faço isso por benevolência, longe que estão de saber que nenhum deus quer mal aos homens; e que eu tampouco procedo assim por malevolência, mas apenas porque não considero lícito aceitar o que é falso.

Em outro texto, denominado Apologia (10, p. 27:41a-42a), Sócrates

questiona os juízes que o condenaram à morte, após acusações feitas por seus

inimigos. O tema aqui discutido é o tema da morte. O problema é: para que vale a

pena viver? A morte do corpo implica o fim definitivo do indivíduo? Existe vida

depois da morte? Eis um pequeno trecho desse diálogo:

SÓCRATES − Se, no entanto, a morte é uma espécie de transmigração desta vida para outro lugar e sendo verdade o que se diz, que nesse lugar se reúnem todos os mortos, que bem maior do que esse haveria, senhores juízes? De fato, se alguém, chegando ao Hades, depois de se livrar desses que se dizem juizes, ali encontrasse os que o são de fato, vale dizer, Minos, Radamanto, Éaco, Triptólemo e outros semideuses que em vida agiram segundo a justiça, seria essa uma viagem sem importância? Quanto cada um de vós estaria disposto a pagar para encontrar-se com Orfeu, Hesíodo ou Homero?

Pois bem, senhores juizes, vós também deveis estar dispostos à esperança em relação à morte, pensando somente isso, que nenhum mal pode atingir o homem reto nem em vida nem depois de morto, e que suas ações não são indiferentes aos deuses.

Mesmo o que aconteceu comigo não aconteceu por acaso: isto já está muito claro para mim, que morrer agora e livrar-me de todas as fadigas era a melhor coisa. Por isso não me deteve um sinal divino, e de minha parte não guardo grande rancor contra aqueles que me condenaram e os meus acusadores.

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Todavia, eles me condenaram e me acusaram não com esse entendimento, mas na suposição de causar-me um dano, e por isso merecem uma justa censura.

Apesar disso, homens, vos peço: castigai os meus filhos quando chegarem à puberdade, atormentando-os do mesmo modo que eu vos atormentava, se vos parecer que eles cuidam mais da riqueza ou de qualquer outra coisa que não a virtude, e se eles acreditarem ter um valor que na verdade não possuem; repreendei-os como eu vos repreendi, por não se aplicarem às coisas que valem a pena, e por acreditarem que contam muito quando não contam nada. Se fizerdes isso, teremos recebido de vós a justiça, eu e os meus filhos.

Mas é chegada a hora de partir: eu para a morte e vós para a vida. Quem de nós se encaminha para o melhor destino, todos nós ignoramos, exceto o deus.

Como pode ser visto nos trechos dos dois diálogos, Sócrates interpelava as

pessoas dizendo-se ignorante, e fazia perguntas aos que se julgavam muito sábios

ou julgavam entender profundamente de determinado assunto. Esse momento é

denominado, por muitos historiadores, como ironia. Em seguida, por meio da

refutação das idéias dos oponentes, acabava levando-os a reconhecer a própria

ignorância ou as falhas da própria argumentação. O momento seguinte é

denominado Maiêutica, centrada na investigação sobre os conceitos.

O mais importante não era chegar, necessariamente, a uma conclusão. O

fundamental era desenvolver a reflexão, a investigação dos conceitos por meio do

raciocínio lógico bem encadeado e reconhecer os argumentos enganosos ou

falaciosos.

É importante lembrar o ideal grego de educação descrito como Paidéia.

Essa palavra aparece no séc. V a.C e indica uma educação ampla que visa formar

o homem como cidadão e torna-se o ideal educativo clássico: a essência de toda

a verdadeira educação ou paidéia é a que dá ao homem o desejo e a ânsia de se

tornar um cidadão perfeito e o ensina a mandar e a obedecer, tendo a justiça como

fundamento (11).

Os gregos desse período são os primeiros a problematizar a educação,

tanto na tragédia quanto na comédia. Mas o conceito de educação alcança seu

status como questão filosófica com Sócrates, Platão e Aristóteles. Paidéia designa

o processo educativo que se prolonga por toda a vida, permitindo o desabrochar de

todas as virtualidades do homem.

O objetivo de Sócrates, em seu método, por meio dos diálogos, era

desmascarar e levar o sujeito à busca da verdade. Sua preocupação era ética e

educativa. Isto é perceptível, por exemplo, no diálogo Teeteto (9), do qual foi

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transcrito um pequeno trecho neste trabalho. Autores como Modolfo (5) também

observam esse cuidado ético e educativo que aparece nos diálogos platônicos.

Filosofia é filosofar, é exercitar essa atitude por ele ensinada. Seu

conhecimento não é erudição, mas é vivo e em processo contínuo de se fazer, e

tem por base a experiência cotidiana de si mesmo, de sua relação com o outro, do

contexto no qual está inserido.

Percebe-se a maestria de Sócrates ao conduzir o interlocutor, por meio de

perguntas e argumentações, da simples opinião ao desenvolvimento do

pensamento crítico, o qual permite ao interlocutor descobrir um saber que traz em

si mesmo, mas que até então ignorava.

A dialética socrática permite ir ao centro interno, subjetivo, para desenvolver

a habilidade da auto-observação, do autoconhecimento, aprendendo a reconhecer

e lidar com os próprios enganos ou autoenganos. Também prepara o interlocutor

para o diálogo e a construção que este possibilita. Permite, também, reconhecer o

adversário maldoso, capaz de utilizar artimanhas e argumentos falaciosos para

vencer o debate a qualquer custo.

Por isso, este trabalho optou por desenvolver, também, com os estudantes,

em sua pesquisa, os fundamentos da Dialética Erística de Schopenhauer.

Aos 31 anos de idade Schopenhauer publica sua principal obra: O Mundo

como Vontade e Representação, na qual ele apresenta seu sistema filosófico. Esta

obra permaneceu como a linha mestra de todo o seu pensamento, ao longo de sua

vida. Segundo Carvalho esta obra de Schopenhauer reflete [...] “esforço de

autojustificação de um certo sentimento de mundo, no qual o filósofo parece ter

vivido imerso desde a infância “ (7, p.29) e:

O próprio Schopenhauer, ao delimitar sua técnica, procura esclarece-la por aproximação e contraste com a dialética de Aristóteles, mas, interpretando esta última não no espírito de Aristóteles e sim apenas no de seus próprios objetivos, deixa as coisas um tanto obscuras para o leitor. (7, p.33)

A Dialética Erística é o nome dado a uma obra póstuma do filósofo Arthur

Schopenhauer (1788-1860). Ela contém 38 estratagemas que podem ser

estudados, compreendidos e utilizados para ensinar a reconhecer e desmontar as

artimanhas do debate capcioso. Nesse tipo de debate, o que se pretende é apenas

confundir, enganar e desmoralizar o adversário.

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Segundo alguns historiadores, esse pequeno tratado foi escrito,

provavelmente, por volta de 1830-31. O manuscrito, sem título, em um total de 44

páginas encadernadas, pertence ao legado do filósofo. Diversos autores relatam

que, após ter contado a gênese do seu interesse pelo tema, Schopenhauer indica

motivos para não publicar o manuscrito:

Reuni os artifícios desonestos mais recorrentes nas controvérsias e

representei claramente cada um deles na sua peculiaridade, ilustrando-o com exemplos e atribuindo-lhe um nome; por fim, acrescentei também os meios a serem utilizados contra tais artifícios, por assim dizer as defesas contra tais simulações; o resultado foi uma verdadeira dialética erística... porém, na revisão ora empreendida desse meu trabalho passado, acho que um estudo tão exaustivo e minucioso das vias indiretas e dos truques de que se vale a natureza humana comum para ocultar seus defeitos não é mais conforme ao meu temperamento e, por isso, deixo-o de lado (12, p. 54).

Em consequência disso, autores diferentes publicam a Dialética Erística de

Schopenhauer com títulos variados, com comentários ou não.

Eis os 38 estratagemas que, aqui, aparecem identificados pela letra “E” e o

número correspondente a cada um deles.

E1 Ampliação indevida: levar a afirmação do adversário para além de seus

limites naturais; tomá-la no sentido mais amplo possível e exagerá-la. Exemplo: “ A

diz: A paz de 1814 restituiu a independência a todas as cidades hanseáticas

alemãs. D replica: Com aquela paz, Danzig perdeu a independência que Napoleão

lhe havia concedido. A se salva assim: Eu disse todas as cidades hanseáticas

alemãs; Danzig é uma cidade hanseática polonesa” (7, p.126).

E2 Homonímia sutil: usar a homonímia para ampliar a afirmação colocada

para aquilo que pouco ou nada tem em comum com o assunto em questão.

Exemplo: “A: ‘O senhor ainda não foi iniciado nos mistérios da filosofia kantiana’. B:

“Ora, o que é cheio de mistérios não me interessa em nada” (4, p.20).

E3 Mudança de modo: a afirmação que foi apresentada em modo relativo é

tomada como se tivesse sido apresentada em modo absoluto, ou pelo menos é

compreendida em um sentido totalmente diferente, sendo refutada com base neste

segundo contexto. Exemplo: “Numa conversação sobre filosofia, reconheci que

meu sistema defendia e elogiava os quietistas. Pouco depois surgiu uma conversa

sobre Hegel e afirmei que grande parte dos seus escritos não tem sentido [...]. Meu

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adversário não tentou refutar esta crítica, mas se contentou por formular: eu havia

elogiado os quietistas e estes escreveram também muitas coisas sem sentido.

Aceitei este fato, mas corrigi sua afirmação dizendo que não elogiara os quietitas

como filósofos e escritores, e, portanto, não por suas realizações teóricas, mas

somente como pessoas, por seus atos, apenas sob um ponto de vista prático. Mas

no caso de Hegel, tratava-se, ao contrário, de realizações teóricas. Deste modo o

ataque cessou” (7, p.133, 134).

Obs.: Os três primeiros estratagemas são afins.

E4 Pré-silogismos: se queremos chegar a uma certa conclusão, devemos

evitar que essa seja prevista, e atuar de modo que o adversário, sem percebê-lo,

admita as premissas uma de cada vez e dispersas sem ordem na conversação; do

contrário, ele buscará toda a sorte de argúcias.

E5 Uso intencional de premissas falsas: para comprovar nossas

proposições, fazer antes o uso de premissas falsas, se o adversário não quiser

aceitar as verdadeiras, ou porque não as conhece como tal ou porque percebe que

delas a tese será deduzida como consequência imediata. Podemos também refutar

teses falsas do adversário por meio de outra tese falsa que ele aceite como

verdadeira. Exemplo: se ele for militante de alguma seita com a qual não estamos

de acordo, podemos adotar contra ele as máximas dessa seita.

E6 Petição de princípio oculta: ocultamos esta petição ao postular o que

desejamos provar, usando nome distinto. Exemplo: “boa reputação” em vez de

“honra”, ou ainda usando conceitos intercambiáveis: animais de sangue quente,

em vez de animais vertebrados, ou: afirmar a incerteza da medicina, postulando a

incerteza de todo o conhecimento humano.

E7 Perguntas em desordem: também chamado de método erotemático,

que significa método de perguntas e respostas ou “método socrático”; trata-se de

uma inversão do método socrático destinada a confundir o adversário, e não a

levar ambos os contendores a uma intuição da verdade. Fazer de uma só vez

muitas perguntas pormenorizadas e assim ocultar o que, na realidade, queremos

que seja admitido. Em contrapartida, expor rapidamente a própria argumentação,

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pois aqueles que são lentos de compreensão não conseguem acompanhar, com

exatidão, e deixam passar as eventuais falhas e lacunas da argumentação.

E8 Encolerizar o adversário: provocar a cólera, para que, em sua fúria, ele

não seja capaz de raciocinar corretamente e perceber sua própria vantagem.

Exemplo: Fazer-lhe algo injusto, ofender sua honra, tratando-o com insolência.

E9 Perguntas em ordem alterada: não seguir a ordem exigida pela

conclusão, fazer perguntas com transposições de todos os gêneros. Tal

estratagema é análogo ao E4, pois trata-se de mascarar o nosso modo de

proceder.

E10 Pista falsa: Quando percebemos que o adversário responde

propositadamente com negações às perguntas cuja resposta afirmativa poderia

confirmar nossas proposições, então devemos perguntar o contrário da proposição

que nos serve, como se quiséssemos sua aprovação; ou colocar as duas à

escolha, de modo que não perceba qual delas queremos afirmar.

E11 Salto indutivo: se fazemos alguma indução e o adversário admite os

casos particulares em que esta se baseia, não devemos perguntar-lhe se admite

também a verdade geral que deriva desses casos; devemos introduzi-la desde

logo, como se já estivesse estabelecida e aceita, pois às vezes ele poderá crer que

a admitiu, e o mesmo pode acontecer aos ouvintes, já que recordarão as muitas

perguntas feitas sobre os casos singulares, que não podem deixar de levar à

conclusão.

E12 Manipulação semântica: quando o discurso é sobre um conceito geral

que não tem um nome próprio e que deve ser designado figurativamente por uma

metáfora, é preciso escolher a metáfora que mais favoreça a nossa tese. Exemplo:

Se o adversário propôs uma transformação, a chamaremos de “subversão” porque

esta é uma palavra hostil e atuaremos de modo inverso se formos nós que

fizermos a proposta.

E13 Alternativa forçada: para que o adversário aceite uma tese, devemos

apresentar-lhe também a contrária e deixar que ele escolha, ressaltando essa

oposição com estridência, de modo que ele, se não quiser ser contraditório, tenha

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de se decidir pela nossa tese que, em comparação a outra se mostra muito mais

provável. Exemplo: desejamos que ele admita que um homem tem que fazer tudo o

que seu pai lhe ordena, então perguntamos: Deve-se obedecer ou desobedecer

aos pais em todas as coisas?

E14 Falsa proclamação de vitória: depois de o adversário responder a

muitas perguntas sem que as respostas sejam adequadas à conclusão que

tínhamos em mente, declaramos e proclamamos triunfalmente demonstrada a

conclusão que pretendíamos, ainda que de fato não se siga de suas respostas. Se

o adversário for tímido ou tolo, se tivermos boa dose de descaramento e uma bela

voz, este golpe poderá funcionar.

E15 Anulação do paradoxo: quando apresentamos uma proposição

paradoxal e temos dificuldade para prová-la, proporemos ao adversário que a

aceite ou a recuse, uma proposição correta, mas cuja exatidão não seja totalmente

evidente, como se dela quiséssemos construir a demonstração. Se ele,

suspeitando de alguma coisa, a recusar, faremos a redução ao absurdo e

triunfaremos; se ele a aceitar, então já teremos dito alguma coisa de razoável e

poderemos protelar a conclusão. Ou aplicaremos o estratagema anterior. Para isso

é preciso uma grande dose de descaramento.

E16 Várias modalidades do argumentum ad hominem : se o adversário

faz uma afirmação, devemos perguntar-lhe se não está, de algum modo, em

contradição com algo que anteriormente disse ou aceitou, ou com os princípios de

uma escola ou seita que ele elogia ou aprova. Exemplo: Para alguém que defende

o suicídio, logo gritamos: por que você não se enforca?

E17 Distinção de emergência: se o adversário nos acossa com uma prova

contrária à nossa, poderemos nos salvar mediante alguma distinção sutil, na qual

não havíamos pensado anteriormente, caso a questão admita dupla interpretação

ou dois casos diferentes.

D18 Uso intencional de mutatio controversiae : se percebemos que o

adversário adotou uma argumentação que nos derrotará, devemos interromper,

afastar ou desviar a tempo o andamento da disputa, a fim de conduzi-la a outras

questões.

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E19 Fuga do específico para o geral: se o adversário solicita que

apresentemos alguma objeção contra um ponto concreto de sua tese, mas não

encontramos nada apropriado, devemos enfocar o aspecto geral do tema e atacá-

lo assim. Exemplo: Se temos de dizer por que uma determinada hipótese física não

é crível, falaremos da incerteza geral do saber humano, ilustrando-a com toda a

sorte de eventos.

E20 Uso da premissa falsa previamente aceita pelo a dversário: se já

interrogamos o adversário acerca de nossas premissas e ele as aceitou, não

devemos perguntar-lhe mais nada, mesmo que ainda esteja faltando uma ou outra

premissa; nós a presumiremos como aceita e tiraremos a conclusão.

E21 Preferir o argumento sofístico: quando nos vemos diante de um

argumento adversário que é meramente aparente ou sofístico, podemos liquidá-lo

ao desvendar seu caráter capcioso e ilusório, melhor ainda se o combatemos com

um argumento igualmente sofístico e aparente. Porque aqui não se trata da

verdade, mas da vitória.

E22 Falsa alegação de petitio principii: se o adversário exigir que

admitamos algo do qual derivariam imediatamente o problema em discussão, nos

recusaremos a fazê-lo, considerando tal exigência uma petitio principii. Desse

modo, subtrairemos a ele seu melhor argumento.

E23 Impelir o adversário ao exagero: a contradição e a luta impelem a

exagerar as afirmações. Devemos provocar o adversário, contradizendo-o, e

induzi-lo assim a exagerar para além do que é verdade uma afirmação que, em si e

em certo contexto, pode ser verdadeira. Refutando o exagero, o reconduzimos aos

limites da nossa afirmação com um “até aqui foi o que eu disse, e nada além”.

E24 Falsa reductio ad absurdum : da proposição do adversário tiram-se à

força, através de falsas consequências e distorções dos conceitos, outras

proposições que não estão ali contidas e que não correspondem à sua opinião; e

que na verdade são absurdas e perigosas. Como parece que tais proposições, que

estão em contradição entre si ou com verdades geralmente admitidas, fazem parte

do raciocínio do adversário, elas passam como uma refutação indireta, apagogia: é

um novo emprego da fallacia non causae ut causae.

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E25 Falsa instância: a instância é um caso de aplicação da verdade geral

sob cujo conceito é preciso assumir algo com respeito ao qual aquela verdade não

é válida, por conseguinte fica completamente demolida. Mas neste raciocínio pode

haver também enganos. Por isto, quando no debate o adversário faz uso da

instância, é preciso ter em conta o seguinte: 1. se o exemplo é conforme a

verdade; se realmente entra no conceito da verdade apresentada; se está

efetivamente em contradição com a verdade apresentada: muitas vezes isto é

assim só em aparência. Exemplo: a proposição “todos os ruminantes têm chifres” é

demolida pelo único exemplo do cavalo.

E26 Retórcio Argumenti: quando o argumento que o adversário quer usar

em seu favor pode ser mais bem utilizado contra ele. Exemplo: “é uma criança.

Não devemos levá-la tão a mal.” Retórcio: “Justamente por se tratar de uma

criança, devemos castigá-la, a fim de que não persevere em seus maus hábitos”

(4, p. 37).

E27 Provocar a raiva: se o adversário inesperadamente se zanga diante de

um argumento, devemos insistir energicamente nele, para provocar-lhe a ira, pois é

de supor que tenhamos tocado o lado fraco do seu raciocínio.

E28 Argumento ad auditores: utilizado geralmente quando uma pessoa

culta discute com um auditório inculto. Exemplo: o adversário diz: “Na formação da

crosta rochosa primária, a massa que mais tarde se cristalizou para formar o

granito e outros tipos de rochas era líquida por efeito do calor e, portanto, fundida.

A temperatura tinha de ser por volta de 250 ºC. A massa cristalizou-se sobre a

superfície marítima que a cobria.” (7, p.159) Replicamos que a tal temperatura, e

até mesmo muito antes, aos 100 ºC, o mar teria estado fervendo e teria se

evaporado no ar. Os ouvintes riem. Para vencermos, o adversário terá de

demonstrar que o ponto de ebulição não depende só do grau de calor, mas

também da pressão atmosférica, e esta, assim que apenas a metade da água dos

mares tivesse se evaporado, aumentaria até o ponto em que nem mesmo aos 250

ºC poderia ocorrer a ebulição. Mas isto ele não consegue demonstrar, porque, para

ouvintes sem conhecimentos de Física, seria preciso expor todo um tratado.

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E29 Desvio: se percebemos que vamos ser derrotados, recorremos a um

desvio, isto é, começamos de repente a falar de algo totalmente diferente, como se

fosse pertinente à questão e constituísse um argumento contra o adversário.

Exemplo: Schopenhauer elogiou o fato de na China não existir uma nobreza

hereditária e de os cargos serem preenchidos tão somente na base de examina.

Seu adversário afirmou que a erudição capacitava tão pouco para exercer cargos

quanto os méritos de nascimento (que ele tinha em certa conta), mas saiu-se mal.

Imediatamente fez um desvio dizendo que, na China, cidadãos de todas as classes

são punidos com castigos corporais, e associou isto com beber muito chá,

reprovando nos chineses ambas as coisas.

Qualquer discussão entre pessoas comuns mostra como este estratagema

é, por assim dizer, instintivo. Exemplo: se um debatedor lança ao outro

reprovações pessoais, este não responde com uma refutação, mas sim com

reprovações pessoais ao primeiro, deixando subsistir os lançados contra ele e,

portanto, quase os admitindo.

E30 Argumentum ad verecundiam : dirigido ao sentimento de honra.

Usamos como fundamento citação de autoridades segundo os conhecimentos do

adversário. Exemplo: Diz Sêneca: cada um prefere crer a julgar. Portanto, o jogo

nos é mais favorável quando temos de nosso lado uma autoridade respeitada pelo

adversário. As pessoas comuns têm profundo respeito ante os especialistas de

todo gênero; e são as autoridades que o adversário não entende aquelas que,

geralmente, mais efeito obtém. “São as ovelhas que vão atrás do carneiro-guia

aonde quer que as leve. Para elas, é mais fácil morrer do que pensar” (4, p. 42).

E31 Incompetência irônica: quando não se sabe opor nenhum fundamento

aos do adversário, pode-se declarar com a alegação irônica de incompetência: “O

que você diz ultrapassa minha débil capacidade de compreensão; pode estar certo,

mas não posso compreendê-lo e renuncio a todo julgamento” (4, p. 46). Podemos

utilizar este estratagema somente quando estamos seguros de que, ante os

ouvintes, gozamos de estima superior à que têm pelo adversário. Exemplo um

professor frente a um estudante. Isto corresponde ao estratagema anterior e é um

modo especialmente malicioso de se valer da própria autoridade em lugar de

razões.

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E32 Rótulo odioso: um modo rápido de eliminar ou de tornar suspeita uma

afirmação do adversário é reduzi-la a uma categoria geralmente detestada, ainda

que a relação seja pouco rigorosa e tão só de vaga semelhança. Exemplo: “Isso é

maniqueísmo”, “é idealismo”, “é naturalismo”, “é misticismo”.

E33 Negação da teoria na prática: “Isso pode ser verdade em teoria, mas

na prática é falso”. Com este sofisma, aceitam-se os fundamentos, mas negam-se

as consequências.

E34 Resposta ao meneio de esquiva: se o adversário não dá nenhuma

resposta ou informação direta a uma pergunta ou a um argumento, mas esquiva-se

por meio de outra pergunta ou de uma resposta indireta, ou mesmo por meio de

algo que não pertence ao tema e demonstra querer tratar de um assunto

totalmente diferente, isso é sinal seguro de que atingimos (às vezes sem saber) um

ponto frágil da parte dele. Devemos, portanto insistir.

E35 Persuasão pela vontade: se puder ser utilizado, tornará supérfluos

todos os demais: em vez de fornecer razões ao entendimento, influi-se com

motivações na vontade, e o adversário, do mesmo modo que os ouvintes quando

têm um interesse em comum com ele, são subitamente ganhos para nossa opinião,

mesmo que esta tenha sido tomada de empréstimo num manicômio, pois na maior

parte das vezes pesam mais umas migalhas de vontade que uma tonelada de

compreensão e persuasão. Exemplo: um proprietário de terras afirma a excelência

da mecânica na Inglaterra, onde uma máquina a vapor realiza o trabalho de muitos

homens. Fazemo-lo observar que logo também os veículos serão arrastados por

máquinas a vapor; com isso cairá o preço dos cavalos de seus numerosos

estábulos; e vermos o que ele diz. Em tais casos a reação mais frequente é: “com

que rapidez sancionamos uma lei que vai contra nós!” (7, p. 177).

E36 Discurso incompreensível: desconcertar, aturdir o adversário com um

caudal de palavras sem sentido. Exemplo: [“Normalmente o homem, ao escutar

apenas palavras, acredita que também deve haver nelas algo para pensar”

(Goethe, Fausto)] (p. 179) . Podemos impressioná-lo oferecendo, com ar grave, um

absurdo que soe como algo douto e profundo, face ao qual careça de vista, ouvido

e pensamento e apresentá-lo como uma prova incontestável de nossa própria tese.

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E37 Tomar a prova pela tese: se o adversário tem de fato razão e,

felizmente escolheu, para defender-se, uma prova ruim, será fácil refutarmos essa

prova e daremos isto como uma refutação da tese mesma. Exemplo: esta é a

forma pela qual, bons advogados, perdem uma causa boa. Querem defendê-la

com uma lei que não é aplicável e aquela que é aplicável não lhes vem à mente.

E38 Último estratagema: quando percebemos que o adversário é superior

e que acabará por não nos dar razão, então nos tornamos pessoalmente

ofensivos, insultuosos, grosseiros. É um ataque pessoal. É um apelo desde as

forças do espírito às do corpo, à animalidade. Esta regra é muito popular. Ter muito

sangue frio pode ser de enorme utilidade nessas ocasiões, se, quando o

adversário passa aos ataques pessoais, respondemos com calma que isso não

tem nada a ver com o tema discutido e retornamos rapidamente a este e

continuamos a demonstrar que objetivamente o adversário não tem razão, sem

prestar atenção às suas ofensas:

Em síntese, a única regra contrária e segura é aquela que Aristóteles já indicava: “Não disputar com o primeiro, com o melhor de todos, mas somente com aqueles que conhecemos e dos quais sabemos que possui juízo suficiente para não apresentar coisas tão absurdas a ponto de serem expostos a humilhação; e que sejam capazes de disputar com fundamentos e não com decisões autoritárias, e de escutar fundamentos e de aceita-los, e, por fim, que prezem a verdade, gostem de ouvir bons fundamentos, mesmo quando provêm da boca do adversário, e possuam a quantidade necessária de equidade para suportar a perda da razão quando a verdade permanecer do outro lado. Consequentemente, de cem pessoas, talvez haja uma com quem valerá a pena disputar. Aos restantes, deixemos falar o que bem entenderem” (12, p. 55).

Em todo caso, a controvérsia é, com frequência, útil para os dois lados,

permitindo retificar os próprios pensamentos e também adquirir novos pontos de

vista. Mas os dois contendores devem ser similares em cultura e inteligência.

O adversário que utiliza argumentos capciosos para vencer o debate a

qualquer custo visa neutralizar a diferença qualitativa que era “nossa” superioridade

e visa nos vencer por expedientes simples como: “reúne meia dúzia de comparsas e

nos esmaga pela força do número” somente um longo aprendizado “habilita o

homem a sair imune dessas controvérsias, de modo a poder retornar, sempre que

queira, àquele centro de si mesmo [...] para quem não esteja seguro de possuir essa

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via de retorno, os combates de argumentos são uma dispersão fatal no

mundanismo” (7, p. 20).

Schopenhauer é um dos raros casos de “precocidade filosófica”: aos trinta e

um anos publica a exposição completa de seu sistema Die welt als wille und

vorstellung (O mundo como vontade e representação) e “até o final de sua longa

vida tudo quanto escreve são acréscimos que em nada alteram as linhas mestras de

seu pensamento filosófico” (12, p. 71).

O breve tratado contendo os trinta e oito estratagemas só foi publicado quatro

anos após sua morte, por iniciativa de seu amigo e discípulo Julius Trauenstädt com

o título Eristik.

Embora Schopenhauer cite, várias vezes, Aristóteles, filósofo grego do século

V a.C., sua erística é bem diferente e, inclusive, não tem objetivo ético e educativo

como a de Aristóteles, a qual visa a mais honesta das investigações.

Para Schopenhauer “só existiam dois modos de pensar: a lógica, caminho

rigoroso da demonstração da verdade, e a dialética, arte de argumentar

independentemente da verdade” (7, p. 53). A verdade objetiva de uma proposição é

diferente da sua validade na aprovação dos contendores e ouvintes. A esta última é

que a dialética se refere.

A dialética pode satisfazer a natural prepotência humana, sua vontade de

sempre “obter razão, independentemente de tê-la: para Schopenhauer, a dialética é

siso, e nada mais. Eis a razão para a denominação do seu pequeno tratado,

dialética erística [...]” (12, p. 51).

O diálogo filosófico representa uma experiência intelectual compartilhada que

possibilita a criação de uma comunidade de investigação; com aprimoramento

superlativo das habilidades do pensamento. Além disso, permite a disciplina de

saber falar e ouvir adequadamente e melhora o poder de raciocínio e o respeito

mútuo.

Tais argumentos permitem afirmar que, ao reconhecer isso, os professores

poderiam se conscientizar desses aspectos e, então, considerar valioso empregar

planos de discussão em sala de aula. Evidentemente, para que isso ocorra, é

necessário criar um ambiente “intelectualmente provocativo” que permita discussões

abertas, de temas que interessem aos debatedores.

Como, geralmente, as escolas repetem o modelo cultural, é fundamental

desenvolver consciência e motivação para ressignificar a cultura docente e discente,

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fornecendo novas “ferramentas conceituais”. Por isso, autores diversos como

Wenning (1), Dascal (17) e Lipman (13) defendem o uso dos diálogos socráticos

como meios de desenvolvimento dessas habilidades e superação da rigidez

curricular.

Outro ponto levantado neste trabalho é o de que não basta ler textos, ouvir

histórias sobre heróis, decorar princípios éticos; é necessário engajar-se em

investigação ética, ou seja: não adianta receber ferramentas, receber a informação

de para que servem, sem aprender a utilizá-las na prática.

São idéias como essas, levantadas neste trabalho que levam,

necessariamente, ao reconhecimento da necessidade de revisão curricular, de rever

todo o conteúdo programático e a ordem seqüencial das matérias.

O texto secundário [...] é uma barreira entre a criança e a sua herança humanística, assim como cursos de “metodologias” são barreiras entre professores e as disciplinas acadêmicas [...] quando uma disciplina tenta se despir de seus pressupostos éticos, lógicos, estéticos e epistemológicos [...] porque estes são “contestáveis” ou “controversos”, elimina as verdadeiras características. (13, p. 41)

Isto impede que os estudantes as vejam formar um todo com as demais

disciplinas acadêmicas.

A introdução à filosofia nos currículos tende a reduzir a fragmentação no

processo de aprendizagem. Isto acontece por que desenvolve uma compreensão

crítica e discernimento para respostas que são ou não apropriadas e maior

discernimento para distinguir “certo” e “errado”.

É por tudo isso e mais que surgem autores que defendem que se ensine,

desde cedo, às crianças, a introdução à filosofia. A psicologia, hoje, valoriza o

metacognitivo, a importância do pensar sobre o pensar. Pondera que o

metacognitivo torna possível a autocorreção, o automonitoramento da mente. Ora,

ao aprender a cultivar tal hábito, o sujeito cognoscente raciocinará melhor, do

mesmo modo que “não raciocinarão melhor se não puderem raciocinar como elas

raciocinam” [...] “à luz dessas justificativas para a forma educacional, as apreensões

de Platão sobre a abordagem educacional dos sofistas devem ser reavaliadas” (13,

p. 45).

Evidentemente, Platão questionava o uso que, naquela época, passou-se a

fazer dos sofismas, da retórica como panacéia, em Atenas; o que ocorre ainda nos

dias de hoje.

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Eis porque, este trabalho discute, neste capítulo, a importância atual do

ensino, hoje, da dialética socrática e da dialética erística de Schopenhauer, no modo

como aqui proposto.

É importante lembrar que, ao longo de todo este trabalho, são colocadas as

diferenças entre habilidades e critérios que devem ser estabelecidos como

condições para o desenvolvimento adequado, no processo ensino-aprendizagem, da

análise crítica e da reflexão, que permitem, ao estudante, o desenvolvimento da

verdadeira capacidade de analisar e compreender a cultura escolar, o seu papel

nela e as consequências socioculturais desse processo.

A importância disso é lembrar que a história da educação moderna e

contemporânea faz lembrar um mito grego: o de Sísifo; esse fora condenado a rolar

uma pedra montanha acima, diariamente; mas ao chegar lá ela caía, rolando

novamente, em direção ao chão, pela própria lei da gravidade. O mito ilustra bem os

esforços vãos que tantas vezes têm sido feitos, em todos os níveis da educação. A

história da educação, no Brasil, revela para olhos analíticos, críticos, como,

repetidas vezes, os currículos são alterados, mas não se atinge aquilo que, neste

trabalho, é considerado essencial: o mais importante não é saber sobre história das

ciências, mas filosofar sobre a ciência, isto é: “[...] o que é importante não é tanto

‘saber ciências’ quanto ‘pensar cientificamente’”. (13, p.87) Sagan indaga: “na sala

de aula, nos jornais e na televisão, porque não usamos os esportes para ensinar

ciências.” (15, p. 416)

Contudo, é importante lembrar que um dos mais importantes papéis da

filosofia é justamente lidar com “problemas”, com “questões” não resolvidas, e o

problemático parece inesgotável do ponto de vista sociocultural, relacional. Mas a

filosofia lida com o controverso, desarticula artimanhas, aponta falácias e

pensamentos lícitos e ilícitos, desmascara estratagemas.

Neste trabalho procura-se mostrar como a filosofia e a filosofia da ciência e da

tecnologia podem desvelar o que é estéril e superficial na educação e fornecer um

modo/modelo para o processo educacional como um todo.

O ponto mais importante em relação à discussão entre dialética socrática e

dialética erística de Schopenhauer é compreender algumas possibilidades, como:

• A dialética socrática permite: melhorar a comunicação; melhorar o

discurso acadêmico; desenvolver atitude questionadora; desenvolver

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disposição e a habilidade para fazer perguntas; dialogar; reconhecer a

diferença entre discurso convergente e discurso divergente; fazer

perguntas apropriadas;

• A dialética erística de Schopenhauer permite: reconhecer argumentos

falaciosos, sofismas, estratagemas; usar arsenal apropriado para se livrar

das artimanhas do adversário, nas disputas e controvérsias; utilizar os

próprios estratagemas para desarticular o adversário; diferenciar

discussões persuasivas de discussões adversárias.

É necessário saber utilizar tarefas principais na argumentação como:

transformar colocação adversária em uma representação significativa para ser

usada, mais tarde, no processo. O argumentador perde a razão se não relacionar o

conteúdo de sua afirmação com o conhecimento do mundo e com a estrutura da

discussão como um todo; decidir qual deve ser sua reação mais apropriada; decidir

qual de suas reivindicações iniciais irá defender ou qual reivindicação do oponente

irá atacar; o argumentador deve demonstrar seu conhecimento e capacidade de

raciocínio para produzir evidência adequada e usar uma linguagem natural, no nível

apropriado dos detalhes e dirigida para alcançar os objetivos do argumentador (14,

p. 4).

A importância do que é discutido neste capítulo é, sobretudo, que entrar em

uma discussão requer vários tipos de conhecimentos de como deve ser o raciocínio

e como se deve arguir e discutir.

O valor pedagógico e educacional do que aqui é apresentado é inestimável,

pois permite, também, superar crenças e opiniões equivocadas, encontrar novos

significados.

Os estudantes aprendem a ampliar o aprendizado, no processo do diálogo, no

reconhecimento de como agir e reagir nas controvérsias e nas disputas, e isso

permite construção de conhecimento. Permite também superar aquela visão de que

os estudantes são passivos, não sabem fazer perguntas adequadas ou são

desmotivados.

Pode-se perceber, nesse ponto, a importância de os professores ensinarem

aos estudantes sobre o processo de geração de perguntas, de questionamentos.

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Esse saber torna a sala de aula torna um local atrativo, cheio de desafios que

instigam a curiosidade e a capacidade de investigação.

Uma maneira de se fazer essa geração de perguntas é através da “Caixa de

ferramentas” (1, p. 5): são questões de amostra colocadas no quadro, na frente da

sala de aula, diante de todos os alunos. A caixa é composta de notas pré-laboratório

(no ensino de física), sumário dos resultados, gráficos, representações matemáticas,

notas pós-laboratório, soluções finais e soluções alternativas. Cada estudante é

responsável por trazer sua “caixa de ferramentas” para a aula, todos os dias. O

objetivo é que esse material seja utilizado para a discussão, em sala de aula,

propiciando aos estudantes o desenvolvimento das habilidades discutidas por todos

esses autores citados neste trabalho.

Quem utiliza os diálogos socráticos em sala de aula, para promover essas

habilidades, faz algumas recomendações necessárias para obter o engajamento dos

estudantes nos diálogos socráticos, permitindo-lhes sentirem-se confortáveis (1,

p.4):

• permita que o estudante apresente, sem ser interrompido;

• promova questionamento;

• mostre respeito pelas conclusões do estudante;

• ajude os estudantes a encontrarem pontos de acordo;

• mantenha uma atmosfera positiva;

• deixe que os estudantes pensem que a nova idéia é deles;

• faça com que os estudantes sintam como e quanto contribuíram para o

processo ocorrido em sala de aula e no processo de investigação como

um todo.

Desta forma, observa-se a convergência do pensamento de todos esses

autores, e deste trabalho, no sentido de que os estudantes devem perguntar,

questionar e desenvolver pensamento crítico como valiosa parte do processo

educacional.

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3 O LUGAR DO DEBATE NO ENSINO DE CIÊNCIA E TECNOLO GIA

Assim como as crianças tremem e têm medo de tudo na escuridão cega, também nós, à claridade da luz, às vezes tememos o que não deveria inspirar mais temor do que as coisas que aterrorizam as crianças no escuro.

(Lucrécio)

De Sócrates a Schopenhauer, Wenning, Flower, Bimbaum, Maxwell, entre

outros, pode-se ver o aspecto humano da ciência. Indivíduos com amplo

conhecimento sobre a natureza da ciência possuem conhecimento de sua

contextualização, de suas nomenclaturas científicas, habilidades do processo

intelectual, regras de evidência científica, postulados da ciência, disposições

científicas e dos maiores mitos sobre a natureza da ciência e da tecnologia.

Algumas práticas pedagógicas ajudam o aluno a fixar e obter o entendimento

requerido: leituras de apoio de livros e artigos que lidam com a natureza da ciência

podem ter um impacto significativo no entendimento dessa conceituação;

discussões de estudo de caso são excelentes fóruns para ampliar o entendimento

dos alunos; lições de averiguação (exames) são fontes de um excelente fórum de

aprendizado para o aluno em relação à natureza da ciência; laboratórios de

averiguação ajudam o estudante a aprender e entender o processo intelectual e as

habilidades do cientista; estudos históricos provam ser uma poderosa ferramenta

não somente para ensinar, mas também para colocar uma face humana na física e

aumentar o interesse do aluno pela matéria; tarefas múltiplas são componentes

importantes para ajudar o aluno a desenvolver um conhecimento mais profundo,

com apresentações, relatórios escritos e orais, questões de múltipla escolha e

questões abertas (de respostas livres) (1, p. 4).

Sagan afirma que:

A cultura comercial está cheia de informações errôneas e subterfúgios semelhantes à custa do consumidor. Não se devem fazer perguntas. Não pensem. Comprem. [...] Criam uma corrupção insidiosa das atitudes populares a respeito da objetividade científica. Hoje, existem até comerciais em que cientistas reais, alguns de considerável distinção, atuam como garotos-propaganda para as empresas. Eles nos ensinam que também cientistas mentem por dinheiro. Como afirmou Tom Paine, o fato de nos acostumarmos com mentiras cria o fundamento para muitos outros males (15, p. 239).

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Existem inúmeros casos de mentiras provadas ou presumíveis com efeito

catastrófico quando o governo e as sociedades perdem a capacidade de pensar

criticamente (15, p.240).

Por isso, para exercitar o pensamento crítico, uma solução é recorrer às

ferramentas de um “kit” (15, p. 241-242):

� Sempre que possível, deve haver confirmação independente dos “fatos”.

� Devemos estimular um debate substantivo sobre as evidências, do qual participarão notórios partidários de todos os pontos de vista.

� Os argumentos de autoridade têm pouca importância [...] na ciência não existem autoridades, quando muito especialistas.

� Devemos pensar em mais uma hipótese. Se alguma coisa deve ser explicada, é preciso pensar em todas as maneiras diferentes pelas quais poderia ser explicada. Depois devemos pensar nos testes que poderiam servir para invalidar sistematicamente cada uma das alternativas. O que sobreviver, a hipótese que resistir a todas as refutações [...] tem uma chance muito melhor de ser a resposta correta [...]

� Devemos tentar não ficar demasiado ligados a uma hipótese, só por ser a nossa [...]

� Devemos quantificar [...] há certamente verdades a serem buscadas nas muitas questões qualitativas que somos obrigados a enfrentar, mas encontra-las é mais desafiador.

� Se há uma cadeia de argumentos, todos os elos da cadeia devem funcionar (inclusive a premissa) – e não apenas a maioria deles.

� A Navalha de Occam. Essa maneira prática e conveniente de proceder nos incita a escolher a mais simples dentre duas hipóteses que explicam os dados com igual eficiência.

� Devemos sempre perguntar se a hipótese pode ser, pelo menos em princípio, falseada [...].

Inúmeros exemplos de falácias muito comuns na nossa cultura e de domínio

público exemplificam a afirmação de que é, em parte, por causa da falta

disseminada de conhecimento sobre a detecção de mentiras que a indústria e a

mídia enganam e a credulidade mata (15, p. 252).

Refletindo sobre tais afirmações percebe-se a possibilidade de se servir aos

impostores, aos charlatães quanto aos sujeitos que queiram defender-se de tais

artimanhas. Há imposturas que são praticadas sem a finesse, o requinte do

verdadeiro trapaceiro; contudo, também elas têm seus efeitos destrutivos.

A impostura científica apresenta conotações positivas, apesar de,

inicialmente, pensar-se mais ou somente nos aspectos pejorativos. Um biólogo

carente de publicidade, “Peter Duesberg afirma, contra toda evidência, que a causa

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da Aids não é o HIV, ele semeia confusão de maneira perigosa [...] trata-se,

evidentemente, de uma impostura potencialmente nociva” (16, p. 19).

Tão importante quanto combater as imposturas é compreender as razões de

seu sucesso – esse aspecto foi trabalhado com os alunos no curso A Erística e a

Falácia do Discurso Científico e que gerou, nos estudantes, grande curiosidade e

motivação.

Outro importante ponto a observar é a constatação de que a ciência e a

técnica não fizeram recuar as crenças irracionais e parecem até favorecê-las.

Na mídia, o sucesso de séries como “Arquivo X”, filmes como “A Bruxa de

Blair”, “Sexto Sentido” e que são apenas ilustrações de “uma tendência maciça que

demonstra, a golpes de efeitos especiais, a ausência do conflito, [...] entre universo

high tech e sobrenatural” (16, p. 29). Ou seja: os mecanismos de adesão à

impostura colocam em risco ou em jogo nossa relação da verdade e o erro,

dificultando distinguir entre autêntico e simulacro.

Surgem consequências socioculturais graves de tudo isso, como por exemplo:

ao seu modo, os impostores apontam muito sobre o nosso modo de pensar, nossa

visão de mundo, nossos valores; há o risco dessa impostura científica tornar-se

norma intelectual; o real se enfraquece sob o impacto da mensagem sobre o

conteúdo; que vários cientistas traiam o ideal da objetividade (16, p. 27).

Um exemplo citado em obras diferentes é o de James Randi, que pratica com

Gerard Majx a desmistificação das performances sobrenaturais;” eu quero muito ter

o espírito aberto, mas não ao ponto de ter um buraco na cabeça” (16, p. 28). E ele

ensina, em dez lições, como se pode fazer pseudociência; para cada capítulo dá um

título, como se segue:

1. As verdadeiras perguntas, farás. 2. O seu nicho, com cuidado escolherás. 3. A Ciência oficial, achincalharás. 4. A Mídia, com arte usarás. 5. Os fatos, manipularás. 6. A História, reescreverás. 7. Deus e seus santos, honrarás. 8. Espíritos e Demônios, invocarás. 9. Das armadilhas da linguagem, abusarás. 10. Algo refutável, jamais enunciarás.

Filosofia e ciência cresceram de seu mútuo diálogo e a reflexão filosófica não

deve ser indiferente à ciência e tecnologia, no ensino, atualmente. Estamos cientes

de que as “novas” filosofias da ciência ou “novas epistemologias” também exibiram

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seus problemas. Mas não é justamente isso que permite constante reflexão,

ressignificação e reconstrução/renovação do conhecimento humano?

Contudo, seu efeito contextual é inegável: compreender o trabalho que efetiva

em contextos de investigação, em regras próprias em relação às condições de

aplicação – é algo sempre lembrado.

Os embates aí desenvolvidos permitem, outrossim, introduzir professores e

estudantes no horizonte das discussões filosóficas geradas pela ciência atual. É

importante lembrar que essas discussões são ricas por delinearem um quadro

marcado por diversificadas tendências.

Contudo, isso talvez só seja possível pelo confronto crítico entre abordagens,

projetos, metodologias, objetivos, disciplinas, teorias e cientistas individuais ou

grupos de cientistas. É possível compreender, historicamente, como é complexa

essa discussão entre “coletivo” e “público” e como isso nos leva a refletir sobre o

papel do conflito e do diálogo na construção da ciência, desde a elaboração de

critérios, das tomadas de decisão até as implicações de seus resultados.

Nossas reflexões estarão comprometidas com uma visão de uma nova

racionalidade e do papel essencial do espaço dialógico e das controvérsias

científicas na produção do saber científico e nas decisões políticas.

É importante lembrar que a competição, e não apenas a cooperação,

desempenha um papel fundamental na construção coletiva do saber científico.

Nesse sentido, o mais adequado é falar de “dialética” da construção desse saber,

pois a ciência é uma construção na qual as controvérsias têm importante papel já

que começa com uma questão bem definida e rapidamente se expande horizontal e

verticalmente; além disso, seu objetivo é a persuasão, o lance preferido é o

argumento e o encerramento ideal é a resolução. Seus lucros cognitivos são

clarificação da divergência, conciliação dos opostos, emergência de idéias

inovadoras (17, p. 21).

“A ausência de um método de decisão como a prova, que termina o debate

obrigando os participantes a aceitarem a solução por ela ditada, é justamente uma

das características definitórias da controvérsia” (17, p. 23).

A diferença entre controvérsia, disputa e discussão é que a controvérsia tem

papel especial no programa do conhecimento científico; elas explicam o que se

chama de “folga epistêmica”, a qual “facilita a compreensão das relações íntimas

entre controvérsia e inovação” e:

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Uma vez iniciada, uma controvérsia não tem limites fixados de modo a priori quanto a onde deveremos para o questionamento de crenças entranhadas, conceitos, métodos, modos de interpretação, dados, critérios de relevância, normas de formulação, aceitação e rejeição de hipóteses e outros componentes do empreendimento científico e da atividade crítica a ele inerente. Tal irrestrito questionamento pode levar a uma situação de abertura radical em um dado campo, que, por sua vez, cria condições que são favoráveis – e talvez essenciais – à emergência de uma inovação radical (17, p. 25).

Essas afirmações remetem à idéia de que desenvolvimento e progresso são

interligados e indissociáveis da idéia de construção do conhecimento. As questões

ligadas à ciência e à tecnologia remetem-nos, também, à Escola de Frankfurt, ao

esforço dos epistemólogos modernos e contemporâneos para despertar a

consciência do sujeito que elabora discursos. Suas reflexões mostram como o

pensamento de Sócrates e de Schopenhauer são atuais e, utilizados de modo

didaticamente apropriados, podem ajudar alunos e professores na construção de um

modelo/modo de ensino de ciências inteligente e eficaz, na relação teoria-prática.

Afirmações como essas permitem compreender como o objeto desta pesquisa

é atual e de relevância para o estudo e o ensino de ciência e tecnologia.

Dialética Socrática e Dialética Erística são aqui utilizadas como forma de

preparação para entender o processo de pesquisa e do discurso científico, o qual

exige lógica, imaginação, explicações e previsões.

Parte-se dos pressupostos que

a. o debate seja uma construção complexa e fundamental para apresentação

das próprias idéias e descobertas; e também para perceber idéias

convergentes e divergentes no seu próprio discurso e no discurso do seu

oponente;

b. os professores devam utilizar esses recursos ao ensinar a natureza da

ciência;

c. os professores e estudantes devem ter conhecimento de como os

cientistas agem para alcançar suas conclusões e quais são suas

limitações, pois é isso que permite a constante renovação das ciências.

São apresentados a seguir alguns motivos pelos quais o desenvolvimento da

ciência e da tecnologia pressupõe a necessidade de uma teoria do conhecimento.

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Quando as pessoas sabem como os cientistas agem e alcançam suas

conclusões científicas e quais são as limitações de tais conclusões, elas pensam

melhor sobre o dito e não vão rejeitar a idéia imediatamente, nem aceitá-la sem

crítica. A mídia está repleta de pessoas fazendo afirmações e suposições sobre

várias coisas, sendo que algumas têm fundamento e outras não. Então, um

estudante que possui um bom entendimento do conteúdo da natureza da ciência

terá, supostamente, maior facilidade em distinguir evidência de propaganda,

possibilidade de certeza, crenças racionais de superstições, ciência de folclore,

teoria de dogma.

Ao analisar tais discursos percebe-se que, mesmo em busca de

previsibilidade e da necessidade da relação causal ou mesmo quando, no

empirismo, a causa é associada à função, permanece a dificuldade dos

autores/pesquisadores em conceituar ciência e metodologia científica. Por isso

recorrem a epistemólogos como Popper (1902-1994), Kuhn (1922-1996) e outros,

para indicar os debates que são suscitados nesta área, sobre essa temática, pois os

epistemólogos estabelecem uma organização lógica, indicando passos ou etapas,

segundo seu estilo pessoal, segundo seus confrontos nessa área.

De Bacon (1561-1626) a Feyerabend (1924-1994), os filósofos afirmam que,

quanto maior a provisoriedade de suas construções, mais o ser humano se

empenha em busca do sentido através da construção do conhecimento científico:

[...] a ciência é um enigma que renasce, uma solução que cria um problema [...] a ciência propõe-nos um existencialismo pela ação enérgica do ser pensante [...] filosoficamente, toda fronteira absoluta proposta à ciência é a marca de um problema mal posto [...] (18, p. 25).

Esses sujeitos pensantes constituem a sociedade e: “[...] A sociedade tem

direito ao conhecimento, do qual a ciência e a tecnologia fazem “perigosamente”

parte [...] e filosofia e história devem voltar a ser centrais no projeto educativo, pois

levam à análise e à reflexão” (19, p. 21).

Nesta pesquisa reconhece-se o valor do quanto é importante fornecer

incentivos que motivem os alunos e lhes proporcione um conjunto de hábitos de

trabalho que permita combinar suas inclinações criativas e imaginativas com seus

próprios “desejos de pensar de uma maneira disciplinada e ordenada a respeito do

mundo” (20, p. 54).

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Por isso propõe que, desde cedo, se ensine às crianças esse modo de

pensar, que tem suas raízes na dialética socrática. Isso traria benefícios por meio do

desenvolvimento de habilidades tais como: raciocínio, formação de conceitos de

investigação. A partir disso, quando forem jovens e adultos estariam mais habilitados

a pesquisarem e elaborarem soluções promissoras a partir da relação teoria-prática;

quando adultos não deixariam escapar a experiência de se admirar, de refletir, de

buscar significados de suas experiências, de questionar o que se transmite de

geração para geração. A filosofia é uma disciplina que inclui a lógica e, portanto, se

ocupa em introduzir os critérios de excelência no processo do pensar para que os

estudantes possam caminhar do simples pensar para o pensar bem.

A questão proposta nesta pesquisa é incentivar os professores a compartilhar

o que sabem sobre o processo de questionamento, de argumentação, de

identificação de afirmações falsas e verdadeiras, para manter a boa qualidade do

discurso na sala de aula e desenvolver, nos alunos, a habilidade do pensamento

crítico. “Pode ser útil se o professor falar sobre os procedimentos; a maioria dos

alunos poderá estar inclinada ou se sentir motivada a aprender mais sobre como

fazer perguntas apropriadas” (1, p. 3). A confirmação de tal idéia/hipótese será

apresentada no capítulo resultado e discussões.

As conseqüências do chamado analfabetismo científico são muito mais

perigosas em nossa época do que em qualquer período anterior. Grandes vultos

combateram e combatem a chamada PSEUDOCIÊNCIA. Segundo eles, essa é mais

fácil de ser inventada que a ciência, e seus padrões de argumentação, que passam por

evidência, são muito menos rigorosos (15, p.31). Portanto, se os estudantes não

aprenderem a desenvolver o pensamento crítico e compreender o PROCESSO pelo

qual a ciência se dá, dificilmente poderão perceber que estejam abraçando a

pseudociência, ficando susceptíveis de serem manipulados por mentes inescrupulosas.

Questões como essas foram levantadas pelas novas filosofias da ciência ou

“novas epistemologias”, as quais também esbarram em alguns problemas. Mas há

um ponto que permanece e tem-se robustecido em meio às críticas e às mudanças

nas visões de ciência e tecnologia: é o seu enfoque contextual:

[...] compreender o trabalho da comunidade e produção científica

passa a ser o trabalho que se efetiva em contextos de investigação – programas de pesquisa, constituição de campos (inter) disciplinares – com suas regras próprias, pelo menos no que concerne às condições de sua aplicação (17, p. 16)

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Questões como essas se impõem ao saber científico e filosófico

contemporâneo e suas discussões delineiam-se em um quadro que reflete diversas

tendências. Todas essas colocações levam à reflexão sobre a importância do papel

do conflito e do diálogo na construção da ciência e tecnologia, desde a elaboração

de critérios, das tomadas de decisões até as implicações de seus resultados.

Sociólogos e epistemólogos enfatizam a importância de se discutir, de modo

interdisciplinar, esse aspecto da ciência e tecnologia como trabalho coletivo.

Sem contradições e criticismo, não haveria motivação para mudarmos

nossas teorias, não haveria progresso intelectual? Tal questão traz à tona o aspecto

“crítico” onde, antes, era visto apenas o trabalho colaborativo. Significativo é lembrar

que, além de cooperativo e crítico, o saber da ciência e tecnologia apresenta a

competência como elemento necessário. Por isto vale lembrar a importância da

Dialética na construção coletiva desse saber, pois toda interação polêmica é uma

interação dialógica, na medida em que existem, pelo menos, dois lados, ou duas

instâncias enunciativas com posições opostas em relação a alguma questão e se

criticam mutuamente.

Além disso, aprender ciência não significa memorizar seus resultados mais

relevantes, nem suas realizações mais eminentes. Aprender ciência é, acima de

tudo, tomar conhecimento de seu “modus operandi”. Desse modo ocorre uma

alteração de comportamento, com conseqüências para a vida toda e para a

sociedade.

Considerando-se o ponto em que ciência e tecnologia chegaram,

pseudociência pode levar a perigos tecnológicos, indução de erros no uso da

tecnologia para atender a interesses pessoais e de grupos, como laboratórios de

remédios dos quais há inúmeros exemplos.

Hoje, existem até comerciais em que cientistas reais, alguns de

considerável distinção, atuam como garotos-propaganda para as empresas. Eles nos ensinam que também cientistas mentem por dinheiro. Como alertou Tom Paine, o fato de nos acostumarmos com mentiras cria o fundamento para muitos outros males. (15, p. 239)

Pergunta-se: a que interesses a ignorância serve?

A superstição e a pseudociência estão sempre se esquivando do exame

cético, oferecendo respostas fáceis, banalizando a experiência, “parecem usar os

métodos e as descobertas da ciência, embora na verdade sejam infiéis à sua

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natureza – frequentemente porque se baseiam em evidência insuficiente ou porque

ignoram pistas que apontam para outro caminho” (15, p. 45).

As vozes aqui citadas juntam-se a muitas outras que refletem sobre as

conseqüências da pseudociência em um mundo globalizado, onde tudo pode ser

visto em tempo real através dos meios de comunicação.

É característica da contemporaneidade o crescente uso de tecnologia no

cotidiano e o grau de sofisticação que ela vai atingindo. A própria LDB (Lei de

Diretrizes e Bases) propõe uma prática educativa adequada à realidade do mundo,

ao mercado de trabalho, à informação e ao conhecimento.

Uma das questões que surge é: como lidar, em sala de aula, com alunos que

navegam pela internet, recebem vultuoso volume de informações pela mídia,

estimulando a curiosidade e a sede de informações, através de uma forma de

comunicação mais sedutora que a escola?

A própria comunicação científica se faz por meio da linguagem e ajudada

pelos progressos da lógica da linguagem. No que se refere à realidade tecnológica,

de modo geral sabemos que há autores que se encantam com ela, enquanto outros

alertam para o uso e o risco da pseudociência, de suas motivações ilícitas e

inconfessáveis do ponto de vista moral: “semeamos os campos com trifosfato de

sódio e há muito mais gente com fome do que nunca [...] construímos escolas e o

analfabetismo floresce” (21, p. 212).

A literatura está repleta de exemplos de uso inadequado de conhecimentos

da ciência e tecnologia. Exemplo: em 1953, nos EUA, quando a pesquisa da

Fundação Sloan Keterring publicou os resultados alarmantes dos efeitos do uso do

cigarro, as indústrias de tabaco se reuniram virulentamente para publicar

“pesquisas” feitas em seus laboratórios que comprovavam o quanto o tabagismo é

inócuo! Em 1971, a Brown and Williamsom Tobbaco publicaram “pesquisa” que

garante que o fumar cigarro não causa câncer de pulmão e outras doenças. Outro

exemplo: o conhecido caso dos círculos que apareciam em plantações de trigo na

Inglaterra depois de muito sensacionalismo e especulações exóticas, dois britânicos

acabaram confessando à polícia inglesa que os círculos foram feitos por eles

(descreveram como), e não por seres extraterrestres (UFOS).

O pensamento analítico, crítico, aliado ao olhar antropológico, pode permitir

ao homem contemporâneo fazer inúmeras ressignificações, levar à compreensão de

que o real não se esgota no imediato e que a reflexão pode ser atributo de todos.

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É possível apontar para a possibilidade de que a conscientização e o

planejamento ainda possam controlar a questão das soluções tecnológicas, desde

que a mentalidade tecnológica não elimine de vez, das novas gerações, sua vida

interior, “lançando-as em um novo barbarismo” (21, p. 127).

A amplamente documentada crise de ensino contemporâneo de ciências,

indica como o ensino de ciências desenvolveu-se dissociado da história e da filosofia

da ciência; estas podem humanizar as ciências e aproximá-las dos interesses

pessoais, culturais, éticos e políticos da comunidade; podem tornar as aulas de

ciência mais reflexivas e, portanto, desafiadoras e contribuir para o entendimento

integral da “matéria científica” e sua significação.

Com este objetivo é que foi feita a inclusão da história e da filosofia da ciência

em currículos nacionais de países como País de Gales, EUA, e Holanda; indica os

resultados positivos de tal modificação curricular. Um exemplo é o do Conselho

Britânico de Currículo Nacional que afirma que os estudantes podem adquirir,

através da inclusão destas duas disciplinas, desenvolvimento de habilidades como:

- distinguir entre asserções e argumentos pautados em dados e provas científicas e os que não o são;

- considerar a maneira pela qual o desenvolvimento de uma determinada teoria ou pensamento científico se relaciona ao seu contexto moral, espiritual, cultural e histórico;

- estudar exemplos de controvérsias científicas e de mudanças no pensamento científico.

Cada vez mais surgem defensores da importância da inclusão dessas duas

disciplinas como modo de iniciação necessária porque “nenhuma parte da ciência

progrediu muito ou muito rapidamente antes de que essa educação convergente [...]

se tornasse possível” (22, p. 237).

Há evidências da importância do uso da filosofia para a melhoria do ensino,

dos textos didáticos e da elaboração dos planos de cursos e objetivos para os

cursos de ciência; devem começar por explorar os problemas que os professores

consideram importantes para o desenvolvimento de sua práxis educacional,

mantendo em vista, em seus cursos, o processo de pesquisa/descoberta pelos

cientistas.

Estas reflexões convergem para o fato de que ciência e tecnologia estão

sempre carregadas de valores morais, sociais e econômicos; por isso o

conhecimento gerado pela ciência pode ser apropriado, também, pelas estruturas de

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poder, inclusive institutos, universidades, mas também por governos e empresas

que pesquisam e desenvolvem produtos a serem comercializados.

Todos os pontos de vista apresentados neste trabalho convergem para a

necessidade de implementar currículos/cursos de ciência com visão reflexiva e para tal

é importante a contribuição da filosofia, tanto para os professores quanto para os

estudantes, para se evitar cair nas armadilhas do que se denomina pseudociência.

Por motivos como esses que aqui se discutem, é que epistemólogos

modernos e contemporâneos debatem a contradição entre a racionalidade científica

e a técnica e a liberdade humana, criticando, muitas vezes, a indústria do lazer que

massifica a cultura e indicando a necessidade de se desenvolver, cada vez mais, no

ensino de ciência e tecnologia, a análise, a reflexão, pois, sem dúvida, constata-se

que a tecnologia resolve alguns problemas, mas também acarreta outros.

Uma análise da importância cultural da História da Ciência no Cinema indica

Galileu como principal agente da revolução científica e o gênero que permite repensar,

constantemente, as relações entre ciência e sociedade, indica como “idéias filosóficas”

podem ser consideradas “perigosas” para a ordem vigente, uma vez que geram

reflexões e transformações. Por isto é que Galileu ainda é “emblemático”: porque suas

idéias e afirmações, além de terem sido levadas para a esfera político-social também

geraram uma expansão que fundamentava-se na certeza de uma “verdade” da ciência

que pudesse ser mostrada de modo indiferente dos valores culturais de então. Ele,

juntamente com outros pais da ciência moderna mostraram que a ciência “é uma

atividade que desvela o caráter obscuro da natureza [...] utilizando a experimentação e

a linguagem matemática [...]” (23, p. 106).

Esta defesa da necessidade de envolvimento do estudante em seu processo

de aprendizagem e do desenvolvimento de habilidades associadas ao processo de

investigação científica tem por objetivo que o estudante adquira uma visão ampla da

ciência e do modo como ela é construída e utilizada, através do seu ensino mais

adequado.

Quatro demandas fundamentais” “saber o quê”, “saber como”, “saber por que”, e saber quando e onde aplicar o conhecimento (IES, 1997) (p. 432). Essas demandas mobilizam “conhecimento declarativo”, “conhecimento procedimental”, “conhecimento esquemático” e “conhecimento estratégico”, visando aplicar seus conhecimentos em novas situações e problemas. Essas demandas, esse desenvolvimento de habilidades têm como objetivo “o produto do processo de investigação, gerando um modelo, já que isso é coerente com o processo de desenvolvimento científico (24, p. 432).

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O ponto de vista de que a sala de aula deve permitir estas práticas que visam

ao desenvolvimento de habilidades dos estudantes deve estar aliado ao fato de que

é importante que eles recebam o feedback quanto ao que fizeram e conseguiram

conquistar como aprendizado. Isto os auxiliará em seu desenvolvimento e também

no êxito em participação de programas de avaliação em massa, de diversos países

ou grupo de países: TIMSS (Third International Mathematics and Science Study

Technical/EUA), PISA (Programme for International Student Assessment/EUA),

NAEP (The NAEP guide: a description of the content and methods of the 1997 and

1998 assessments/EUA), ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio/Brasil). Tais

projetos têm, em comum, o objetivo de “evidenciar um panorama do atual processo

de desenvolvimento do conhecimento dos estudos e, com isso, subsidiar novas

propostas e apontar direções a serem tomadas no ensino” (24, p. 436).

Estudos indicam que há “dificuldade de avaliação de habilidades de

investigação, especialmente aquelas relacionadas às etapas de “elaboração de

modelo”, “análise” e “comunicação” do ciclo de investigação, apresentando poucas

oportunidades para a explicitação de conhecimentos a elas relacionados” (24, p.

447).

Resultados de pesquisas como os desses programas de avaliação confirmam

a necessidade de se melhorar o ensino de ciência e tecnologia e a importância da

utilização da filosofia da ciência para o desenvolvimento das habilidades propostas e

requeridas. Esses quatro programas avaliados no artigo citado fazem um papel

importante: desvelar que é fundamental que estudantes aprendam análise, reflexão,

para terem condições apropriadas de explicitar suas idéias, contextualizá-las e fazer

transferência de aprendizagem para novas situações-problema. E para que tais

programas venham a dar uma contribuição efetiva, cumprindo o propósito que eles

próprios estabelecem, faz-se necessário um novo percurso no ensino de ciência e

tecnologia, perguntar-se a que serve tal tipo de ensino e optar pela escolha de uma

visão de ensino que integre as possibilidades dos dois campos (hoje ainda

divididos): Exatas e Humanas.

Na atual sociedade da informação, as relações no processo educativo

pressupõem intercâmbio de papéis; suas relações são mais complexas e há

necessidade de “reaprender a conhecer, a comunicar-nos, a ensinar e a aprender, a

integrar o humano e o tecnológico, a integrar o individual e o grupal/social” (25, p. 9).

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Questão: onde está a escola nessas redes? De que redes a escola e os

sujeitos escolares participam?

Muitas vezes, essas práticas, nas escolas, são práticas vazias, premidas por

necessidades advindas de instituições administrativas e burocráticas. Acabam

resumindo-se em práticas como brincadeiras entre amigos, jogos, bate-papos e

festas, sem contribuição para vivências educativas e pedagógicas como seriam de

direito dos estudantes e dever dos profissionais da educação. “A tecnologia e a

pedagogia estão estremecidas” [...] ”A manipulação (tato), a visualização (vista), a

audição, bem como a relação sensível com a “máquina”, estimulam reações

corpóreas indispensáveis ao jogo dialético inerente à concepção e abstração dos

conhecimentos” (25, p. 35).

Logo, a escola deve utilizar-se dessas mesmas tecnologias como importantes

recursos pedagógicos. A questão continua a mesma: como fazê-lo dentro do atual

contexto?

“E nós, professores? Como ficamos em relação a essa realidade? Vamos nos

adaptando e adequando? Partimos da crença de que o sistema é forte e de que não

temos condições de reverter o quadro?” (26, p. 42).

Discutindo tais idéias, depara-se com conceitos socráticos, como esse

referente a valores. Não foi Sócrates, no séc. V a.C. quem conceituou tal palavra e

também ética? Tantos e tantos autores, como aqueles citados neste trabalho, falam

sobre a mesma idéia: o estudante como centro do processo, com seu potencial

criativo e possibilidades inúmeras, infinitas, no campo da ciência e tecnologia – mas

deve olhar, internamente, e refletir sobre as consequências de suas escolhas e atos.

É fundamental que a escola seja um lugar de compartilhar hábitos de estudos

e pesquisa para não se perder somente no uso dos recursos tecnológicos. Todos os

autores até aqui apresentados reforçam a idéia da necessidade de se proporcionar,

na educação, espaço para análises, discussões, reflexões, a socialização de

conhecimentos e de vivências pedagógicas como meio para o intercâmbio cultural e

social.

Alguns autores concluem reafirmando, a necessidade da “construção de

sentidos na escola, pela co-participação, pela valorização do outro, pela convivência

com a diferença, pela solidariedade. A esperança reside no estar junto para a

construção de sentidos e relações” (26, 50).

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Na sociedade contemporânea, as conquistas e os fracassos para defender e

afirmar as identidades estão diretamente ligadas às dinâmicas e aos bloqueios da

comunicação. As novas tecnologias desempenham “um papel de fragmentação no

habitat cultural, com a dissolução do horizonte cultural comum de uma sociedade.

Isso traz riscos para a sua unidade política e cultural” (27, p. 205).

Pelo que se viu, os meios de comunicação atuam como agentes de produção

de sentido – por isso devem ser discutidos pela comunidade escolar e pela família.

[...] as mídias entre jovens faz com que esses mudem seus padrões de referência, alterem suas relações consigo mesmos e com as circunstâncias sociais em geral, criando outras necessidades, envolvimentos, modelos de conduta e, por que não dizer, outros problemas que algumas escolas não estão preparadas para enfrentar (28, p. 14).

Por tais motivos é sugerido que se investigue, que se prossiga com pesquisas

sobre o cotidiano escolar e seus sujeitos em relação com o conhecimento,

analisando também as disciplinas permeadas pelas mídias presentes na cultura das

pessoas e que se refletem em sala de aula. “A cultura do conformismo e do

escapismo contribuía para a manutenção de situações problemáticas de ensino

vividas pela 5ª série, sem questionamento sobre mudanças necessárias” (28, p.

144).

Questiona se a tecnologia: ela faz mudar nossas visões do mundo e o próprio

mundo, do mesmo modo como nossa visão de mundo influencia nosso pensar

tecnológico (29, p. 27).

Pode-se perceber que a resposta já está implícita na própria pergunta, que é

mais um modo de se questionar o mesmo e atual problema: a relação homem-

mundo que é sempre marcada pela capacidade intrínseca do homem de

transcender. Por isso, não apenas filósofos, mas cientistas também debatem a

mesma questão em busca de uma resposta que resolva a angústia moderna e

contemporânea. Einstein já afirmava: “tornou-se chocantemente óbvio que a nossa

tecnologia excedeu a nossa humanidade”.

A tecnologia pode ser dirigida para atender as necessidades da sociedade,

sobretudo para o despertar daqueles que, no estabelecimento científico, se ocupam,

supostamente, da educação em ciências. Deve haver colaboração entre diferentes

pensadores de todos os campos, que se respeitem mutuamente, apesar de suas

diferenças, para mostrar os efeitos positivos e necessários da ciência e tecnologia,

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mesmo quando há muitos autores que falam mais de suas produções e

consequências catastróficas. [...] pode ter chegado o momento para um humanismo

novo, naturalista [...] melhor integração das capacidades racionais e emocionais, a

confiança das visões quantitativa e qualitativa do homem na natureza (30, p. 232).

Em fins de 1963, a National Science Foundation – NSF, dos EUA, realizou

uma reunião com cerca de duas dezenas de cientistas, com o objetivo de convencer

alguns deles a adotarem uma nova abordagem do ensino introdutório de Física. O

argumento foi importante e foi considerado que, para fazê-lo, a estratégia mais

adequada a ser adotada era o “pluralismo”. O desafio foi aceito e esse “foi o início do

projeto de física” (31, p. 22 e 24). Havia o interesse de colocar em prática alguns dos

conceitos de ciências discutidos e tentar colocar um modelo pluralista de ensino-

aprendizagem no próprio material do currículo. Foi tomada uma decisão pedagógica

baseada em uma filosofia da educação não comum à maioria, que atraísse um

público variado e motivado; foi considerado importante ter um curso que fosse

significativo sob vários aspectos, cada qual recompensado na prática. Também foi

considerado que o ethos já testado e efetivo do laboratório de pesquisa poderia ser

transmitido para a sala de aula.

Neste trabalho admite-se esse ponto de vista, que foi levado em conta ao montar

o curso ministrado e relatado no capítulo Metodologia e no capítulo Resultados e

Discussões. Outro aspecto considerado é que não se deve ter medo de experimentar

diferentes estilos de ensino e que é importante estar pronto para atualizar as idéias

pedagógicas, assim como se faz na pesquisa científica. Um aspecto fundamental neste

curso foi a visão humanística do mesmo e seu impacto social.

Outro aspecto importante levado em conta, a educação é diferente de

treinamento: a educação é alcançada transmitindo-se um ponto de vista que permite

generalização e aplicação numa grande variedade de circunstâncias em nossa vida,

desenvolvendo o que se denomina, em psicologia da educação, como transferência

de aprendizagem.

Este trabalho reconhece que a discussão aqui proposta, e embasada pelos

estudos exploratórios e o estudo de caso, também exigirá reflexão, práticas de

outros colegas que queiram testar, empiricamente, o que aqui se propõe.

Neste trabalho deduz-se que, à medida que isto for utilizado em novos

momentos, com novos grupos de estudantes, o que era inédito poderá se tornar

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uma contribuição para a prática de ensino, na graduação e, talvez, como o trabalho

realizado por Holton (30), também no ensino secundário.

Neste momento histórico em que tanto se estuda e se fala sobre a crise no

ensino de ciências, é importante lembrar que crises são chaves para a promoção de

mudanças e também para permitir que ocorram revoluções. Aqui é proposta uma

revolução no ensino de ciência e tecnologia.

Bachelard considera surpreendente “que os professores de ciência [...] não

compreendam que alguém não compreenda”, que basta repetir lição a lição para

que haja compreensão (31, p. 23). A questão aqui levantada, neste trabalho, é que é

necessário mudar a cultura da sala de aula, é necessário derrubar “os obstáculos já

sedimentados pela vida cotidiana” da sala de aula. “O educador não tem senso do

fracasso justamente porque se acha um mestre” (31, p. 23, 24).

Neste trabalho o que se quer mostrar é que é possível superar tais obstáculos

citados pelos autores aqui relacionados. Esses não passam de obstáculos iniciais

para a cultura científica que sempre pode ser modificada já que a marca do sujeito,

no mundo, é sua transcendência. É por isso que a cultura se modifica, a ciência se

renova e o ensino de ciência e tecnologia também pode renovar-se, tornar-se mais

dinâmico, analítico, criativo, gerando maior compreensão e construção de cultura

científica e compreensão e desenvolvimento de espírito científico.

“A filosofia científica deve ser essencialmente uma pedagogia científica. Ora,

para ciência nova, pedagogia nova [...] as fronteiras opressoras são fronteiras

ilusórias” (31, p. 26). Pode-se estabelecer uma analogia entre tal colocação e a da

proposta que aqui é feita para a cultura docente e discente no ensino de ciência e

tecnologia, na contemporaneidade.

Desta forma, pode-se perceber que a proposta deste trabalho é desafiadora e

inovadora; como se viu no capítulo anterior. A Erística de Schopenhauer tem grande

quantidade de títulos publicados e comentados, todos enfatizando o seu caráter de

possibilidade de uso para vencer debates a qualquer preço, usando-se os

estratagemas. Aqui, o que se ensina é como compreender o significado e o sentido

dos estratagemas de Schopenhauer para não se deixar enganar, distinguir

argumentos lícitos de ilícitos e buscar, como Sócrates, através da Maiêutica, idéias

convergentes, descobertas de novos caminhos e possibilidades.

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Dessa forma, os estudantes (e também professores) podem examinar ou

detectar o que é verdadeiro do que é falso, o que é ciência e o que é pseudociência.

Com o desenvolvimento do pensamento analítico, crítico, é possível mudar,

inclusive, o modo de perceber a relação ensino-aprendizagem. É possível

desenvolver o prazer de pesquisar, de conhecer algo profundo, compreender o

PROCESSO das descobertas, a importância da imaginação para a criação, para a

exploração empírica. Isto permite desenvolver uma nova postura que contribua,

pessoal e socialmente, para a construção de ciência e tecnologia no sentido de

trazer maior benefício para o bem-estar humano. Isto é muito importante, pois

vivemos em uma era complexa, cheia de contradições e ambivalências. Sujeitos

mais preparados, com melhor desenvolvimento de sua capacidade pensante, no

sentido discutido neste trabalho, são mais capazes para resolução desses

problemas do mundo contemporâneo.

O que aqui é proposto permite gerar novas idéias, invenção e criatividade,

sem as quais é impossível o exercício da liberdade do sujeito.

Liberdade não deve ser apenas um discurso, deve ser consciência de ser

sujeito, no mundo, e sobre ele agir de modo consciente, crítico, criativo, assumindo,

reflexivamente, seu papel de fazer cultura. Cada (e todos) estudante deve ter

consciência de seu papel como sujeito, de sua responsabilidade pessoal, ética,

sociocultural, política, econômica, espiritual. Deve-se inquirir sobre: que contribuição

quer dar à sua geração e que herança quer deixar para as gerações futuras?

Como prepará-los para essa conscientização de que eles são parte da

história e, portanto, construtores da mesma? Que eles não são seres passivos que

absorvem informações, mas podem fazer tudo o que foi dito acima? Eis o desafio

educacional aqui proposto para o ensino da ciência e tecnologia.

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4 METODOLOGIA

4.1 Delineamento experimental

Adotou-se o método/estratégia de Estudo de Caso (32) por ser um

instrumento que apresenta como uma de suas características a possibilidade de

coletar informações específicas e detalhadas, frequentemente de natureza pessoal,

envolvendo o pesquisador sobre um grupo de indivíduos em uma determinada

situação e durante um dado período de tempo.

É uma estratégia que ajuda a esclarecer uma decisão ou conjunto de

decisões, o motivo porque foi tomada; o modo como foi concretizada e os resultados

gerados.

Também é uma investigação empírica que permite investigar os limites entre

o fenômeno observado e o contexto no qual está inserido.

Permite, segundo Yin saber “como” ou “por quê”, o que é pertinente com as

questões propostas neste trabalho; não exige controle sobre eventos

comportamentais e focaliza acontecimentos contemporâneos:

O estudo de caso é a estratégia escolhida ao se examinarem

acontecimentos contemporâneos, mas quando não se podem manipular comportamentos relevantes [...], embora os estudos de casos e as pesquisas históricas possam se sobrepor, o poder diferenciador do estudo de caso é sua capacidade de lidar com uma ampla variedade de evidências – documentos, artefatos, entrevistas e observações – além do que pode estar disponível no estudo histórico convencional. (32, p. 27)

O estudo de caso é boa estratégia quando se parte de proposições teóricas

que norteiem a coleta e a análise dos dados.

Relembrando: a hipótese de partida desse trabalho é a de que os estudantes

não sabem reconhecer argumentos falaciosos nem estabelecer diferença entre

argumentos lícitos e ilícitos. Porém, essa situação pode ser modificada se lhes for

ensinado como reconhecê-los e utilizá-los, através de análise e reflexão, como

forma de construção de conhecimento.

Nesse tipo de estudo, a observadora pode utilizar como técnicas de pesquisa

e observação entrevista, estudos exploratórios preliminares e dados documentais. É

um meio de organizar dados sociais coletados, resguardando seu caráter unitário.

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Esta pesquisa adotou, inicialmente, a forma de estudos exploratórios como

possibilidade de coleta de dados para aprofundamento posterior do trabalho. Os

resultados desses estudos exploratórios realizados em novembro e dezembro de

2008 propiciaram elementos para elaboração do Estudo de Caso.

Autores comparam os diferentes tipos de pesquisa em relação aos estudos

exploratórios e citam alguns diferenciais (33, p. 36).

O diferencial do estudo exploratório em relação à pesquisa descritiva e à

pesquisa explicativa é que a meta da exploração é clarificar idéias, conceitos e

relações entre variáveis, com a finalidade principal de especificar hipóteses e

fundamentar novos estudos.

Esses “novos” estudos ocorreram após as férias escolares do final do ano

letivo de 2008, ou seja, no início do ano de 2009.

Enquanto nos estudos experimentais os procedimentos implicam controle

sistemático das variáveis, os estudos exploratórios não incluem tal exigência,

embora possam, em alguns casos, utilizar procedimentos relativamente sistemáticos

para a obtenção de observações empíricas e/ou para análise de dados.

Um outro diferencial é que, no caso desse período exploratório, o investigador

deve ir além de descrições quantitativas e/ou qualitativas, tentando conceituar as

inter-relações entre os fenômenos observados. Logo, o investigador deve tentar

organizar suas observações num quadro de referência teórico ou hipotético.

A análise baseou-se na observação das inter-relações entre os fenômenos

observados, isto é: os processos de subjetivação e objetivação dos estudantes

frente aos desafios que lhes foram propostos.

Esses desafios envolveram o teste de várias habilidades, tais como: análise,

reflexão, discurso, perspicácia, conhecimento dos temas, embasamento teórico,

diálogos, debates, redação de suas idéias/argumentos, interatividade no grupo e

com a professora/observadora, superação de timidez para estabelecer e manter

relação intersubjetiva, incentivação, motivação, contato face a face, resolução de

dilemas, entre outras.

Para análise dos resultados encontrados nas respostas dos estudantes, foram

utilizados os seguintes critérios: análise crítica, utilização de argumentação

apropriada, coerência na argumentação, incoerência na argumentação, aceitação

acrítica das idéias do autor, aceitação por mesma crença, não aceitação por crença

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diferente, percebimento de falácias / sofismas / estratagemas, crítica ou

questionamento à fala do autor baseados em senso-comum.

Esses critérios foram escolhidos tendo-se em conta os fundamentos da

dialética socrática e da dialética erística de Schopenhauer, ambas discutidas no

capitulo Dialética Socrática e Dialética Erística de Schopenhauer, sendo seus

resultados discutidos no próximo capítulo.

Por considerar a entrevista um instrumento de coleta de dados importante, ela

foi utilizada como instrumento inicial no processo de pesquisa, para delinear o

questionário a ser utilizado nas etapas seguintes deste trabalho.

Foram selecionados os seguintes textos: “Convite para ir à palestra do Dr.

Christiano P. da Silva”; “Charge sobre o tema criacionismo e evolucionismo” e “Por

uma nova biologia” (34, anexos a, b, c), também de autoria do mesmo autor Dr

Christiano, para aplicação na fase exploratória.

O texto “Por uma nova biologia” foi também denominado, neste trabalho,

como texto 1. Nele foram identificados, pelo menos seis estratagemas que podem

ser correlacionados à classificação do filósofo Schopenhauer. O termo estratagema

aparece, neste trabalho, identificado pela letra “E” mais o número do mesmo,

segundo a classificação do próprio filósofo citado.

O texto 1 - “Por uma nova biologia” tem como ponto de partida, ao que

parece, o que Schopenhauer classifica como E.13: Alternativa forçada que implica

em que, devemos também apresentar a tese contrária à que estamos defendendo,

ressaltando a oposição com estridência e deixar que ele escolha, de modo que ele,

se não quiser ser contraditório, tenha de decidir pela nossa tese que, em

comparação à outra, se mostra muito mais provável. Percebe-se isso em seu

discurso, no texto sobre Criação X Evolução, onde ele realça com “estridência” os

pontos que ele afirma que são negativos na teoria da evolução, como por exemplo:

“o macaco não tem culpa de tudo que acontece de errado no mundo”; ou: “a teoria

da evolução contraria também pressupostos filosóficos e científicos construídos pela

humanidade”; ou ainda: “os evolucionistas preferem manter-se alheios ao debate”.

Vale lembrar que a teoria de Darwin aparece em um contexto histórico sem a

preocupação de explicar o homem, especificamente; sua intenção é investigar toda

a vida, a possível evolução das espécies de todos os seres vivos.

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O autor faz afirmação equivocada ainda no primeiro parágrafo: “a evolução é

um fato e não uma tese, ensinam”. Sabe-se que é justamente o oposto: a teoria da

evolução é uma tese e não um fato – afirmação capciosa feita pelo autor.

O E 4: Pré-silogismo permeia todo o texto, pois o objetivo do autor é evitar

que o leitor, ou o ouvinte, perceba claramente a que conclusão se quer chegar. Para

tal, ele vai colocando, de modo disperso, algumas premissas sem ordem, no

desenrolar do texto, ocultando o jogo, com finalidade de induzir o leitor a aceitar a

conclusão que será colocada no final do texto, como modo de manipulação da

opinião pública.

Outro estratagema que aparece com frequência é o E 5: uso intencional de

premissas falsas . Aqui ele utiliza afirmações de conhecimento de domínio público,

mas sem o aprofundamento necessário que permitiria a reflexão e a réplica. Eis

alguns exemplos: “há um conjunto de provas rigorosamente científicas a demonstrar

que o homem jamais compartilhou com o macaco um ancestral comum”. Ora, a

negação do efeito não implica negar a causa. Ele afirma que não foram encontrados

fósseis que possam manter interesse na continuação da investigação pelos

cientistas. Isso é uma falácia, pois animais intermediários entre espécies já foram

encontrados, como dinossauros e mamutes.

Outro exemplo de E 4 e E 5: “contra o Criacionismo move-se atualmente uma

conspiração que tem o objetivo de lançar-nos no completo descrédito” – uma

afirmação de efeito, no início do segundo parágrafo, forçando o uso do exagero da

palavra “conspiração” quando deveria, se fosse coerente, argumentar com fatos já

que ele diz que os fatos é que são importantes e que se devem apresentar os

pontos fortes e fracos de cada teoria. No texto não aparece nenhuma apresentação

de algum ponto fraco do Criacionismo; apenas afirmações vagas e genéricas tais

como: “as pegadas deixadas na natureza favorecem o modo de pensar que se fia na

figura do Criador. Nada há de concreto a embasar a teoria da evolução” como se

pode perceber, ele não disse quais são as “pegadas” e nem o que há de “concreto”

no Criacionismo. Apenas continua criticando, com estridência, o evolucionismo, bem

ao estilo dos pré-silogismos, afirmações falaciosas, genéricas, aleatórias e também

se utilizando do E 3: Mudança de modo : usando o que é apresentado de modo

relativo como se fosse absoluto, induzindo a uma “compreensão” de sentido

diferente, como na seguinte afirmação: “e note-se que nunca se escavou tanto no

mundo como nos últimos 100 anos e o máximo que os darwinistas encontraram para

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sustentar sua teoria foram peças fragmentárias como restos de fêmures e

mandíbulas – alegação falsa como foi dito no início dessa análise.

É interessante notar como ele alia a esses estratagemas também o E 1:

Ampliação indevida e E 12: Manipulação semântica , mudando, inclusive o

sentido do conceito de ciência como tal: “o Criacionismo, por seu lado, não desafia

tais pressupostos e procura se ater às evidências verdadeiramente científicas [...]

algo assim como se de um ovo de serpente brotasse, de repente, um pássaro

emplumado. Pergunto-me, e aos pais e professores, se já não está passando da

hora de, num debate franco e aberto, colocar em dúvida este improvável método

científico”.

E concluindo observa-se o uso do E 32: Rótulo odioso : fazer afirmação que

gere dúvida e possa levá-la à categoria de detestada: “convenhamos que pedaços

de ossos são um alicerce muito frágil para se assentar sobre eles uma teoria que

nega Deus”, ou seja, fica explícito, de forma estridente, em seu texto, que

darwinismo é sinônimo de negação de Deus – outra falácia.

A questão agora é analisar as respostas dos estudantes para constatar, ou

não, se eles perceberam essas ou algumas dessas falácias que estão presentes no

texto.

É interessante observar como em um texto tão pequeno, uma página, o autor

usou seis estratagemas da Dialética Erística de Schopenhauer. Todos eles

adequados ao objetivo precípuo de convencimento do leitor, acerca do seu ponto de

vista.

Há estratagemas que não constam aqui, mas que, em situação face a face,

com outro(s) contra-argumentando, poderiam aparecer, desde que seu objetivo

fosse vencer a disputa, sempre. São os seguintes: E 8: Encolerizar o adversário ; E

31: Incompetência irônica ; E 9: Perguntas em ordem alterada : E 17: Distinção

de emergência ; E 23: Impelir o adversário ao exagero ; E 27: Provocar a raiva ; E

34: Perguntas ao meneio de esquiva : E 37: Tomar a prova pela tese .

Como os três textos selecionados eram da área de biologia, foram convidados

dois profissionais dessa área para realização de uma entrevista semi-estruturada,

mestres e professores de biologia em instituição pública de nível superior, em cursos

de graduação.

As entrevistas foram feitas individualmente, de acordo com a disponibilidade

de cada entrevistado.

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Foi considerada de grande importância a avaliação deles em relação aos

textos que seriam apresentados aos estudantes na fase exploratória realizada em

novembro e dezembro de 2008.

Ao longo da entrevista eles detiveram o maior foco da sua atenção sobre o

texto “Por uma nova biologia”.

Eles observaram que, no pé de página, havia uma nota informando que o Dr.

Christiano P. da Silva, à época da publicação do texto na Revista da Associação de

Pesquisa da Criação, era Professor de Matemática na Universidade Federal de

Viçosa e Presidente dessa Associação.

Juntamente com uma cópia desse texto, foi entregue, a cada professor, um

questionário semi-estruturado desenvolvido com o objetivo de coletar dados, o qual

foi respondido por apenas um dos entrevistados.

O segundo entrevistado ofereceu um livro sobre o tema “evolucionismo” para

possível aprofundamento no conhecimento do mesmo.

A seguir foi-lhes solicitado que fizessem uma análise crítica do texto que lhes

havia chamado mais atenção “Por uma nova biologia”, observando possíveis falhas

na argumentação. Um dos entrevistados apresentou sua análise por escrito e o

outro a fez verbalmente.

Os resultados dos questionários respondidos pelos entrevistados, os dados

coletados na entrevista e a análise crítica que fizeram do texto foram analisados e

relacionados aos estratagemas de Schopenhauer. O mesmo questionário foi

aplicado aos alunos de Ciências Humanas e de Ciências Exatas, posteriormente.

Esses dados coletados, posteriormente, com os alunos, foram analisados

com base nos seguintes critérios: a) concordam ou discordam sem reconhecer

argumentos falaciosos; dão opiniões; b) defendem o ponto de vista do autor em

alguma das três questões baseados em crenças e opiniões; c) analisam uma ou

mais afirmações com argumentação superficial, fazendo comentários vagos.

4.2 Coleta de dados

O estudo prosseguiu da seguinte forma: foi realizado em novembro e

dezembro de 2008 e o universo pesquisado envolveu graduandos de duas

faculdades públicas.

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Inicialmente, o universo pesquisado era composto por uma turma de

ciências exatas e quatro turmas de ciências humanas, devido à abertura de alguns

professores, que se dispuseram a colaborar com a pesquisa. Entretanto, das

quatro turmas de ciências humanas selecionadas e que concordaram em

responder o questionário e assinar o termo de livre consentimento, apenas uma

turma o respondeu com número significativo para amostragem.

Devido a esse fato, a concretização empírica dessa etapa do trabalho ficou

constituída por uma turma da área de ciências exatas (turma mista, com maior

número de homens) e outra da área de ciências humanas (turma

predominantemente feminina, com a presença de apenas um homem). As turmas

foram escolhidas por se tratarem de estudantes de instituições públicas de ensino

superior onde eles têm, entre outros conhecimentos, os de biologia, matemática e

filosofia contidos no currículo escolar.

A amostra selecionada foi composta por uma turma com 20 estudantes, da

área de Ciências Exatas e a outra com 19 estudantes, da área de Ciências

Humanas, ambas do quarto período da graduação.

A aplicação dos questionários ocorreu no final de novembro e início de

dezembro de 2008, nas duas turmas selecionadas. Os estudantes assinaram,

espontaneamente, termo de consentimento livre e esclarecido (APÊNDICE A) que

lhes foi entregue antes da distribuição do questionário. Este era composto por

quatro questões para os três textos propostos igualmente para ambas as turmas,

que responderam por escrito, na presença dos seus professores, utilizando em

média 20 minutos para cada uma das turmas.

Para realização dessa etapa foram aplicados, para os alunos, os três textos

que apresentavam falácias, as quais foram identificadas e reconhecidas

previamente neste trabalho, como estratagemas na categorização da Dialética

Erística de Schopenhauer.

Em seguida, utilizou-se o mesmo questionário respondido por um dos

professores entrevistados, na etapa anterior (APÊNDICE B), visando identificar,

nas respostas dadas pelos alunos, se eles reconheceriam tais falácias e se

saberiam argumentar sobre as mesmas.

Os questionários foram recolhidos e analisados com base nos critérios já

descritos, buscando identificar nas respostas dos estudantes pistas sobre a

hipótese de partida.

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A partir dos resultados obtidos com a análise dos questionários, decidiu-se

elaborar um curso sobre o tema “a erística e a falácia no discurso

pseudocientífico”.

O objetivo foi observar a receptividade dos estudantes e confirmar a

hipótese inicial de que, se lhes fossem ensinadas práticas de dialética socrática e

de dialética erística, eles aprenderiam a detectar as falhas de argumentação, os

argumentos enganosos, melhorar sua capacidade de análise critica e de redigir,

com melhor propriedade, os seus argumentos discursivos.

Em seguida, utilizando-se o método de Estudo de Caso elaborou-se um

curso ministrado somente aos alunos da área de ciências exatas, no período de

março a abril de 2009, com carga horária total de 8 horas/aula, divididas em quatro

módulos de 2 horas/aula cada.

O curso foi aprovado pelas coordenações de curso da instituição, na qual já

havia realizada a etapa anterior (fase exploratória) desse trabalho, em novembro

de 2008.

Ele foi divulgado pelas coordenações em seus respectivos sites, bem como

em visitas a todas as turmas explicando a sua finalidade e a motivação para fazê-

lo. As inscrições foram feitas nas secretarias dessas coordenações, limitando-se a

trinta o número de vagas.

O curso teve boa aceitação, com 38 inscrições, mas apenas 30 alunos foram

selecionados, de acordo com o número de vagas previsto.

No primeiro encontro os alunos assinaram o termo de consentimento livre e

esclarecido. Estiveram presentes 26 alunos; no segundo encontro quatro alunos

que não puderam estar presentes na aula anterior justificaram sua ausência, e

compensaram a carga horária com prorrogação do horário previsto. No terceiro e

quarto encontros estiveram presentes 25 alunos, os quais participaram de todos os

encontros e atividades dos mesmos. Por este motivo, foram considerados apenas

as atividades destes 25 alunos para posterior análise dos resultados.

Foi elaborada uma apostila, especialmente para esse curso.

Iniciou-se o curso com uma introdução, onde foi apresentado seu objetivo:

despertar, nos participantes, o interesse pela reflexão e capacitá-los a distinguir

afirmações e argumentos lícitos de ilícitos, levando-os a reconhecer os argumentos

falsos do discurso pseudocientífico, contribuindo para sua formação técnica e

científica.

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Foi observada a motivação deste trabalho no sentido de dar sua contribuição

para que os estudantes desenvolvessem pensamento crítico, análise e reflexão e

pudessem aplicar tais habilidades a todas as áreas de trabalho, em seus contextos

específicos ou em situações do cotidiano.

Colocou-se a importância de se discutir as circunstâncias culturais que

permitiram que alguns discursos tidos como científicos alcançassem grande

reconhecimento, apesar de não o serem, e não foram desmascarados,

adequadamente, mesmo dentro das academias.

Fez-se a contextualização histórica, mostrando como, desde a Grécia

antiga, era observado esse cuidado com a reflexão. Hipócrates, pai da medicina,

cujo juramento ainda é feito atualmente, nas formaturas nessa área, já

recomendava: “não deixem nada ao acaso. Não percam nenhum detalhe.

Combinem as observações contraditórias. Não tenham pressa”.

Foi lembrado que aprender ciência não significa memorizar resultados mais

relevantes, nem suas realizações mais eminentes. Aprender ciência é, acima de

tudo, tomar conhecimento de seu “modus operandi”. Aí sim, ocorre uma mudança

de comportamento com consequências para a vida e para a sociedade. Esse curso

pretendeu ser uma contribuição nesse sentido.

Os temas foram tratados na seguinte sequência: introdução, os fundamentos

da Dialética Socrática e fragmentos de dois diálogos socráticos para que os

estudantes pudessem acompanhar melhor a linha de raciocínio ali engendrada.

Com isso, ocorreu uma preparação para a apresentação dos fundamentos da

Dialética Erística de Schopenhauer, de forma sucinta, com seus 38 estratagemas.

Os conceitos discutidos, até então, permitiram a discussão seguinte, a respeito de

Pseudociência e o ensino de ciência e tecnologia na contemporaneidade.

Na parte prática foram utilizados os estratagemas, em forma de exercícios e

grupo de discussão com os estudantes. O objetivo era estabelecer uma relação

entre teoria e prática, ensinando aos estudantes o exercício da dialética socrática e

da dialética erística aqui propostas.

Foi esclarecido, aos estudantes, que a bibliografia, no final da apostila,

ficava como indicação e possibilidade de pesquisa e estudo para aqueles que,

aguçados em sua curiosidade, quisessem aprofundar a temática desenvolvida

nesse curso.

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Nas páginas 26 e 27 da apostila foi colocado um quadro, retirado de um site

que apresenta tipos de falácias, mas com categorização diferente da de

Schopenhauer. Para permitir uma atividade significativa durante o curso, foi-lhes

sugerido que consultassem o site, o qual afirmava que a importância de

reconhecer as falácias é poder se esquivar ou evitar tantas armadilhas!

Discutiu-se, ainda, através do conteúdo da apostila, que reconhecer

pseudociência é fundamental para desmascarar artigos, livros, propagandas,

pesquisas que mantêm a aparência de ciência, mas são pseudociência; e que ela

tem algumas características comuns: abuso reiterado de conceitos e terminologia

provenientes da matemática e da física; falar abundantemente de teorias científicas

das quais só se tem idéias confusas; usar conceitos da ciência nas ciências sociais

e humanidades sem nenhuma justificação conceitual ou empírica; ostentar

erudição superficial; manipular frases e sentenças que são, inclusive, carentes de

sentido; e tudo isso feito de modo intencional.

Nas considerações finais foi exposto, na apostila, que essa contribuição

visava levar os estudantes à compreensão de que debater temas interessantes

desenvolve prazer de estudar, de pesquisar, de fazer sua própria investigação, de

se motivar a continuar a treinar seu espírito investigativo como uma forma de

construção pessoal e também coletiva do saber. Permite, também, a superação da

visão simplista de progresso como acumulação e reconhecê-lo como processo

indissociável da construção do conhecimento.

Os procedimentos metodológicos escolhidos para o desenvolvimento do

curso foram:

a. avaliação prévia com alunos: um teste = foram usados dois textos (Texto

1 e Texto 2) com falhas na argumentação científica, solicitando a análise

crítica e a identificação das falhas de argumentação dos mesmos.

Objetivo: verificar se os alunos percebiam tais falhas;

b. fundamentação: trabalhar a Dialética Socrática e a Dialética Erística de

Schopenhauer com os estudantes. Objetivo: diferenciar argumentação

convergente de argumentação divergente para verificar se eles

reconheciam argumentação inválida, sobretudo no discurso científico;

c. avaliação – foi usado o texto 1 e um texto novo (Texto 3). Objetivo:

houve mudança de comportamento? A capacidade de avaliar

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inconsistências melhorou? Reconheceram falácias e estratagemas? O

objetivo foi atingido?

No primeiro encontro foram entregues o texto 1 e 2 com a devida orientação

sobre a atividade referente aos mesmos, e solicitado que fossem entregues sem a

elaboração de comentários sobre eles. Foi explicado aos participantes que o “não

fazer comentários” sobre aquela atividade naquele momento era importante para

que eles viessem, posteriormente, a compreender o processo do que

experienciariam naqueles quatro encontros. A orientação que acompanhou os dois

textos foi a seguinte:

“ANALISE CADA UM DOS TEXTOS, SEPARADAMENTE. ELABORE UMA

CRÍTICA OU DEFESA DE CADA UM DELES, UTILIZAND0-SE DE UMA ANÁLISE

OU REFLEXÃO BEM ELABORADA, RACIOCÍNIO LÓGICO BEM ENCADEADO”.

No segundo encontro, houve aula expositiva sobre os conceitos de Dialética

Socrática e de Dialética Erística de Schopenhauer, utilizando-se apostila distribuída

aos alunos com a devida contextualização histórica, deixando bem clara a diferença

entre dialética socrática, que se utiliza dos diálogos, e dialética erística de

Schopenhauer que esclarece bem como é o uso de estratagemas nas disputas e

como defender-se deles. Discutiu-se a importância das seguintes perguntas: por

quê? para quê? como? no processo de construção do conhecimento. Esclareceu-se

a diferença entre três tipos de interações polêmicas: disputa, discussão e

controvérsia; e entre pensamento lógico e pensamento dialético. Foi realizada uma

dinâmica usando-se um exemplo clássico, contido na apostila; em seguida era-lhes

solicitado que o transpusessem, analogamente, para exemplos do cotidiano. No final

dessa atividade, foi sugerida, como atividade extraclasse, que os estudantes

analisassem os estratagemas das páginas 26 a 28 da apostila distribuída no curso

(retirados de um site da internet) e em seguida os relacionassem com os

estratagemas de Schopenhauer apresentados nas páginas de 13 a 20 da mesma

apostila.

O terceiro encontro iniciou-se com a partilha oral da atividade proposta

extraclasse, a partir da formação de um grupo de discussão. A seguir passou-se à

atividade de relacionar teoria e prática, por meio da seguinte dinâmica: uma dupla de

estudantes começava um diálogo ou disputa e a turma identificava qual era o tipo de

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interação polêmica que estava ocorrendo, explicando com argumentos apropriados

a intenção de cada um deles (se havia falácia ou sofisma). Em situações de impasse

para a dupla, era perguntado aos demais: “quem pode dar um argumento ou uma

saída estratégica para essa situação?”

Essa dinâmica permitiu aos estudantes a compreensão e identificação

gradual do processo do diálogo e o processo da disputa - o como, o porquê, o para

quê, ou seja, a finalidade de cada debatedor. Quando uma disputa era identificada,

os estudantes identificavam também os argumentos inválidos, as falácias, os

estratagemas, justificando com argumentação apropriada. Quando um diálogo era

identificado, os estudantes apontavam o objetivo daquela dupla, naquele momento,

através de argumentação apropriada, isto é: a) encontravam solução para o

problema proposto; b) chegavam a um consenso sobre verdadeiro ou falso em

relação a alguma afirmação usualmente utilizada pela cultura; c) geravam

aprendizado novo através da clarificação de idéias e conceitos.

No quarto e último encontro foi-lhes proposto realizar uma atividade

extraclasse semelhante à do segundo encontro, neste momento de forma individual

e por escrito, solicitando aos estudantes que relacionassem, pelo menos, dois

estratagemas de Schopenhauer aos estratagemas sugeridos no quadro das páginas

26 a 28 da apostila. Após essa atividade, foi entregue, novamente, o texto 1,

juntamente com o texto 3 para serem analisados. Desta vez, a proposta para os dois

textos era:

“LEIA, ATENTAMENTE, O TEXTO E VERIFIQUE SE HÁ PRESENÇA DE

FALÁCIAS E ESTRATAGEMAS NO MESMO. SE HOUVER, IDENTIFIQUE-OS, SE

POSSÍVEL”.

As respostas à proposição acima foram analisadas qualitativa e

quantitativamente e os resultados serão demonstrados no capítulo seguinte.

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5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.1 Entrevista com os professores de biologia

Na análise do texto 1, feita pelos professores, foram apontadas falhas na

argumentação como:

O autor é ferrenho defensor do Criacionismo e opositor do Evolucionismo. Ele

nega que a teoria evolucionista seja científica com fundamentação nas pesquisas de

Darwin, na genética e na bioquímica e afirma que o Criacionismo é científico, pois

Deus criou tudo e o gênesis prova isto. Contudo, a ciência considera a bíblia como

não científica, produto de revelações e de foro religioso.

Na teoria Criacionista cada espécie foi criada separadamente por um artífice

inteligente. Ocorreu em curto espaço de tempo (sete dias). Idade da terra de

aproximadamente 10.000 anos, embora James Ussher (1581-1656), bispo irlandês

houvesse calculado a idade dos profetas e dito que a criação do mundo ocorreu no

dia 23 de outubro de 4004 a.C., um domingo no calendário juliano, assim como a

expulsão de Adão e Eva do paraíso ocorreu em 10 de novembro de 4004, uma

segunda feira. Logo, explica a origem da terra e da vida levando em conta escritos

sagrados; explica a origem atribuindo a constituição das coisas à ação de um sujeito

criador. A mais conhecida versão criacionista, no mundo ocidental, foi instituída

pelas religiões judaico-cristãs. No criacionismo bíblico Deus criou a terra em sete

dias: no primeiro construiu o universo e a terra; no segundo e no terceiro

estabeleceu os céus, as terras e os mares do mundo; nos dois dias seguintes

apareceram os primeiros seres vivos e a separação do dia e da noite; no sexto e

último dia surgiram os demais animais e o homem. No sétimo dia Ele descansou.

A teoria Evolucionista é aceita pelos cientistas. A evolução é aceita diante de

evidências de fósseis que identificam estágios gradativos da evolução e ocorreu ao

longo de milhões de anos. Hoje, o darwinismo não explica tudo, os cientistas

buscam outras respostas para as questões da origem.

A ação da seleção natural tem como consequência a sobrevivência dos

indivíduos portadores das melhores variações adaptativas em relação ao meio em

que vivem. Tais variações são transmitidas de uma geração para outra. O acúmulo

de variações, ao longo de inúmeras gerações, altera de tal forma os indivíduos que

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se chega a um estágio no qual surgem descendentes diferentes de seus ancestrais,

e que formam uma nova espécie.

Darwin não conseguiu explicar como as variações ocorrem, apenas diz que

elas ocorrem e são transmitidas; por isso a ciência continua pesquisando, a partir

das idéias de Darwin, e tem acrescentado novos conhecimentos como seleção

natural e incorpora noções de genética, mutação, recombinação gênica, isolamento

reprodutivo, explica como as variações hereditárias ocorrem e sua transmissão de

uma geração para outra.

Variações hereditárias ocorrem: pela recombinação genética que ocorre

durante a produção dos gametas e quando gene de um indivíduo combina com gene

de outro durante a fecundação, resultando novos arranjos de genes e gerações com

características diferentes que serão selecionadas; pelas mutações que são

variações espontâneas dos genes. Genes mutantes determinam novas

características nos organismos e podem ou não ser favoráveis aos indivíduos que os

possuem, face ao ambiente em que vivem. Quando favoráveis prevalecem, são

transmitidas aos descendentes, acumulando-se e contribuindo para o aparecimento

de novas espécies.

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5.2 Análise dos questionários aplicados na turma d e Ciências Exatas

Todos responderam ao questionário (APÊNDICE A) e alguns fizeram

perguntas, demonstrando curiosidade sobre este trabalho. As respostas serão

apresentadas a seguir. Os exemplos citados abaixo respeitam a grafia e pontuação

utilizada pelos respondentes. Nos exemplos utilizou-se letras maiúsculas para

identificar respostas dadas pelos alunos.

Sobre a pergunta de nº 1 (Justifique sua motivação para ir à palestra

recebendo “este” convite), 0% fez argumentações adequadas, sendo que 20% dos

estudantes responderam com argumentos superficiais e 80% fizeram comentários

vagos e deram opiniões, conforme demonstrado no GRAF.1.

Fizeram argumentação

apropriada0%

Responderam com argumentos

"superficiais"20%

Fizeram comentários

vagos e deram opiniões

80%

Gráfico 1 - Motivação para ir à palestra

Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como

comentários vagos e opiniões:

A – análise a ser feita é que a palestra será algo relacionado com a e- volução da humanidade. Não me sentiria motivado por ser apresentado dessa forma, dando a impressão de algo antigo ou algo parecido.

B – esta capa demonstra a “passagem” de conhecimento. O conhecimento e o ensino ao longo da evolução humana. Um homem sem identidade tendo um papel direto no ensino. Não me sentiria motivado, já que as figuras não são bem explícitas.

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Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:

C – o autor está querendo passar uma idéia de evolução, como várias teorias afirmam que o homem é uma evolução dos macacos, ele exibe um macado com capacidade humana, que é dar aula. Não iria na palestra pois o tema não me interessa hoje, e o cartaz não me despertou interesse.

Sobre a pergunta de nº 2 (Qual é a teoria defendida pelo autor), 100%

responderam criacionismo, reconhecendo o ponto de vista do autor.

Sobre a pergunta de nº 3 (Analise os argumentos apresentados pelo autor),

0% fez argumentações adequadas, sendo que 20% dos estudantes responderam

com argumentos superficiais e 80% fizeram comentários vagos e deram opiniões,

conforme demonstrado no GRAF. 2.

Fizeram argumentação

apropriada0%

Responderam com

argumentos "superficiais"

20%

Fizeram comentários

vagos e deram opiniões

80%

Gráfico 2 - Argumentos apresentados pelo autor

Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como

comentários vagos e opiniões:

A – o autor coloca argumento que o macaco é um ancestral comum e de que tudo há de errado no mundo não é culpa dele.

C – os argumentos do autor são bem explícitos e coerentes. Sendo que as idéias do criacionismo e do evolucionismo são bem discutidas, expondo os prós e os contras de cada teoria.

Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:

B – ele apenas criticou e questionou a teoria da evolução

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63

Sobre a pergunta de nº 4 (Justifique se concorda com ou discorda das idéias

do autor), 0% fez argumentações adequadas, sendo que 25% dos estudantes

responderam com argumentos superficiais e 75% fizeram comentários vagos e

deram opiniões, conforme demonstrado no GRAF. 3.

Fizeram argumentação

apropriada0%

Responderam com argumentos

"superficiais"25%

Fizeram comentários

vagos e deram opiniões

75%

Gráfico 3 - Concorda ou discorda com as idéias do a utor

Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como

comentários vagos e opiniões:

A – concordo quando ele fala que a evolução não é uma tese e sim um fato. E que essa evolução é conotante até os dias de hoje.

B – concordo com a teoria do autor, já que o criacionismo é mais comprovado cientificamente, sendo mais exata. Já o evolucionismo se baseia em idéias de filósofos. Sem ter algo a ver de concreto para se fundamentarem.

Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:

C – não, pois vários estudos também apontam o contrário, então não é uma coisa simples de entender e afirmar.

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64

5.3 Análise dos questionários aplicados na turma d e Ciências Humanas

Sobre a pergunta de nº 1 (Justifique sua motivação para ir à palestra

recebendo “este” convite), 0% fez argumentações adequadas, 16% dos estudantes

responderam com argumentos superficiais e 84% fizeram comentários vagos e

deram opiniões, conforme demonstrado no GRAF. 4.

Fizeram argumentação

apropriada0%

Responderam com argumentos

"superficiais"16%

Fizeram comentários

vagos e deram opiniões

84%

Gráfico 4 - Motivação para ir à palestra

Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como

comentários vagos e opiniões:

A – sim, porque apresenta uma chamada interessante, apesar de não sabermos do que exatamente será falado e por este motivo instiga nossa curiosidade.

B – parece tratar a evolução humana vista por um ser que não é humano. O layout não é convidativo, mas poderia me interessar pelo tema, não pela ilustração que, para mim, é negativa.

Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:

C – a imagem apresenta uma versão reversa da conhecida teoria da evolução. A palestra parece interessante, entretanto, o próprio palestrante não parece pensar assim já que ofereceu um pen-drive para chamar os alunos.

Sobre a pergunta de nº 2 (Qual é a teoria defendida pelo autor), 100%

responderam criacionismo, reconhecendo o ponto de vista do autor.

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Sobre a pergunta de nº 3 (Analise os argumentos apresentados pelo autor),

0% fez argumentações adequadas, sendo que 20% dos estudantes responderam

com argumentos superficiais e 80% fizeram comentários vagos e deram opiniões,

conforme GRAF. 5.

Fizeram argumentação

apropriada0%

Responderam com argumentos

"superficiais"20%

Fizeram comentários

vagos e deram opiniões

80%

Gráfico 5 - Argumentos apresentados pelo autor

Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como

comentários vagos e opiniões:

A – o autor coloca que os danos que a nossa população “evoluída” causam ao mundo não podem ser sinônimo de uma teoria de evolução.

B – acredito e concordo com os argumentos do autor não deveria passar esta matéria do surgimento com apenas modo científico, “cegando” os alunos sobre outras fontes e formas possíveis de surgimento humano.

Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:

C – não temos comprovação suficientes para acreditarmos no evolucionismo como verdade absoluta. Pensar a possibilidade de criação do mundo é algo inevitável. Precisamos nos ater a comprovações verdadeiramente científicas, mas há fatos que não podem ser explicados ainda.

Sobre a pergunta de nº 4 (Justifique se concorda com ou discorda das idéias do

autor), 0% fez argumentações adequadas, sendo que 5% dos estudantes

responderam com argumentos superficiais e 95% fizeram comentários vagos e

deram opiniões (GRAF. 6).

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Responderam com argumentos

"superficiais"5%

Fizeram argumentação

apropriada0%

Fizeram comentários

vagos e deram opiniões

95%

Gráfico 6 - Concorda ou discorda com as idéias do a utor

Exemplos de respostas dadas pelos alunos nessa questão classificadas como

comentários vagos e opiniões:

A – concordo, na escola realmente por não ser passado outra informação, acreditamos no método evolutivo, mas quando crescemos e tomamos consciência e criamos nossa opinião, temos acesso a outras informações, podemos ter um conceito novo sobre o assunto, por isso seria importante temos acesso a todas as informações.

B – concordo com a teoria da criação, mas penso que nem tudo pode ser explicado pela ciência. Os alunos devem ter a possibilidade de pesquisar suas teorias e não chegarem com explicações prontas que não tém comprovação. Achei interessante o ponto de vista e mais aceitável que o evolucionismo.

Exemplo de resposta dada classificada com argumento superficial:

C – talvez ele esteja se empolgando com os conceitos. Dizer que evoluimos dos macacos refere-se a uma característica biológica. As atitudes que temos são de caráter psicológico, o que não, pelo que eu saiba, é possível de comparação com aqueles mamíferos.

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5.4 Curso: a erística e a falácia no discurso pseu docientífico

Iniciado o ano de 2009, em fevereiro foi planejado o curso que possibilitaria

a utilização da estratégia/método de estudo de caso. A amostra escolhida foi

aquela relatada no capítulo Metodologia.

O curso iniciou-se com os alunos de graduação em ciências exatas, de

uma escola pública; apresentaram-se com atitude curiosa e tímida, vários deles

recusaram-se a colocar seus nomes nos dois textos que analisaram e

entregaram.

Seguiu-se aula expositiva. Um estudante manifestou-se dizendo que

buscara, no google, o significado de “erística”; outro perguntou se o tema e o

conteúdo do curso tinham a ver com “persuasão”.

À medida que os conceitos foram apresentados e correlacionados com o

cotidiano dos estudantes e com seu contexto sócio-histórico-cultural e temporal

(são jovens estudantes com expectativas típicas de sua faixa etária, um código

de linguagem comum), eles foram fazendo perguntas, expressando curiosidade e

busca de entendimento do conteúdo ministrado. Isso se reflete nos gráficos (de 7

a 10), quando se compara o texto 1 apresentado na aula do dia 23 de março e o

mesmo texto apresentado no dia 01 de abril.

No texto 1, distribuído aos estudantes em 23/03/09, 60% criticaram ou

questionaram a fala do autor; 84% não perceberam o uso de falácias, sofismas e

estratagemas, 16% foram capazes de perceber o uso de falácias, sofismas e

estratagemas pelo autor; 16% não aceitaram os argumentos do autor por terem

crenças diferentes; apenas 4% dos estudantes aceitaram a argumentação do

autor por possuírem a mesma crença; 20% tiveram uma aceitação acrítica dos

argumentos do autor, 28% argumentaram de forma incoerente; 72%

apresentaram coerência na argumentação, baseada no senso comum; 60%

fizeram uso de argumentação apropriada com base no senso comum; e 80%

fizeram uma análise crítica do texto, também baseados no senso comum,

conforme demonstrado no GRAF. 7.

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20

15

18

7

5

1

4

4

21

15

0 5 10 15 20 25

Análise crítica

Uso de argumentação apropriada

Coerência na argumentação

Incoerência na argumentação

Aceitação acrítica do autor

Aceitação por mesma crença

Não aceitação por crença diferente

Percebimento de falácias / sofismas / estratagemas

Não percebimento de falácias / sofismas / estratagemas

Crítica ou questionamento a fala do autor

Gráfico 7 - Texto 1 - 23/03/09

Exemplos de respostas dadas pelos alunos:

A – a crítica à forma com que a teoria darwinista é aceita nos meios científicos e acadêmicos, exposta no texto de Christiano Pinto da Silva Neto, é válida, uma vez que essa teoria não está concretamente comprovada. Contudo, a posição desse autor a favor do ensino das idéias criacionistas nas escolas é controversa, polêmica e inválida. Ao defender a substituição da teoria darwinista pela idéia de que Deus criou a vida, no ensino de Biologia, Christiano não leva em consideração os efeitos das idéias criacionistas em pessoas que não acreditam em Deus ou seguem religiões diferentes do catolicismo. Além disso, como adepto do criacionismo, ele ignora os conflitos existentes na relação entre ciência e religião.

B – o texto 1 (Por uma nova Biologia) aborda a questão da crítica ao ensino cego da Teoria da Evolução nas Escolas. De fato, é de interesse dos educadores o desenvolvimento da capacidade de crítica dos alunos e não seria má idéia a introdução da Teoria do Criacionismo no plano de curso de Biologia, já que outra teoria também é comentada: a teoria da origem da vida na Terra a partir de seres extraterrestres. O conhecimento de mais teorias e o confronto e a análise de suas idéias instigam a capacidade de crítica dos estudantes [...] A abordagem poderia ter sido feita de modo menos agressivo à outra linha de pensamento, já que sua certeza é tamanha a favor do criacionismo.

C – concordo com o ponto de vista do autor do texto, visto que o evolucionismo de Darwin é concebido como um fato, uma constatação, e não uma teoria. E toda teoria pode ser refutada a qualquer momento, desde que se tenha uma comprovação científica para tal. É difícil aceitar que nós, a raça humana, tenhamos sido concebidos do puro acaso, sem que tenha havido uma força maior e misteriosa. Pode-se adotar uma concepção que concilie o criacionismo e o evolucionismo, como se Deus tivesse usado os meios que a ciência explica para criar o que somos hoje. Algo que a ciência explica os caminhos, mas sem excluir a vontade do Criador.

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No mesmo texto 1, distribuído aos estudantes em 01/04/09, 100% deles

criticaram ou questionaram a fala do autor utilizando argumentação apropriada, todos

(100%) perceberam as falácias, sofismas e estratagemas, não houve aceitação ou não

aceitação das idéias do autor por crença; todos os estudantes (100%) tiveram coerência

na argumentação, fizeram uso de argumentação apropriada e analisaram o texto de

forma crítica e reflexiva, conforme demonstrado no GRAF. 8.

25

25

25

0

0

0

0

25

0

25

0 5 10 15 20 25

Análise crítica

Uso de argumentação apropriada

Coerência na argumentação

Incoerência na argumentação

Aceitação acrítica do autor

Aceitação por mesma crença

Não aceitação por crença diferente

Percebimento de falácias / sofismas / estratagemas

Não percebimento de falácias / sofismas / estratagemas

Crítica ou questionamento a fala do autor

Gráfico 8 - Texto 1 - 01/04/09

Exemplos de respostas dos alunos (observação: grifos são feitos pelos

alunos, respeitando transcrição literal):

A – o texto apresenta argumentos falaciosos e é possível identificá-los como estratagemas, segundo a dialética erística de Schopenhauer. No trecho “Estou convencido – e centenas de pesquisadores sérios em todas as partes do mundo [...]”, o autor faz uso de argumento de autoridade e de número para induzir a aceitação do leitor. É possível identificar o estratagema 13 alternativa forçada, usado pelo autor na quarta linha do segundo parágrafo. Para o que o leitor aceite sua tese, o autor induz a chegar a uma resposta ideal para os seus questionamentos. O estratagema 19, fuga do específico para o geral, também está presente no texto. Para demonstrar que a teoria darwinista não é crível, o autor faz uso da incerteza geral do saber humano, exemplificando com falhas da teoria evolucionista.

B – no texto há muitos argumentos falaciosos. O primeiro que pode ser citado é o uso intencional de premissas falsas. O autor alega comparações científicas que não existem, como por exemplo, a prova de que o homem não possui ancestrais comuns com os macacos, quando na verdade o

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oposto é demonstrado. Em segundo momento, pode-se notar que o autor faz uso de rótulo odioso, ao afirmar que o ensino da Teoria da Evolução é feito por razões obscuras. Assim, o autor faz uso de uma palavra pejorativa ao questionar a situação, o que também indica que há manipulação semântica. O autor tenta persuadir os leitores a exigir o ensino da Teoria criacionista fazendo uso de persuasão pela vontade. Já no segundo parágrafo faz uso de falsa reductio ad absurdum, alegando persuasão pela vontade ao apelar para os educadores.

C – este texto não pode ser considerado um texto científico, pois sua forma de argumentos não é válida. Falácias e estratagemas percorrem o texto e invalidam sua argumentação. Vou listar e comentar abaixo alguns exemplos. Ele, o autor, afirma que há várias provas rigorosamente científicas que demonstram que o homem e o macaco não compartilham ancestral comum. Ora, se tais provas existem, onde estão? Como encontrá-las? O que sabemos da comunidade científica é que mais de 98% dos genes são contemplados tanto no DNA humano quanto no do chimpanzé, um macaco. Outra falha nessa mesma afirmação é o fato de ele atribuir tal mentira como fala de cientistas, autoridades no tema. Este é um estratagema utilizado quando nos esquivamos ou nos isentamos da responsabilidade do que está sendo dito e transferimos para um grupo o respaldo. [...] se existem tantos cientistas que desacreditam e derrubam a teoria da evolução, ela certamente já teria sido extinta ou transformada [...] ele propõe aqui: E 13: alternativa forçada. [...] Quando ele diz que os evolucionistas se mantém “alheios aos debates”, ele faz uso de E12 manipulação semântica, pois ele quer dizer que os evolucionistas não freqüentam muitos debates mas alheio faz jus a ignorância, desprezo de informação, alienação. E ainda postula o que será descoberto! Quanta ousadia!

O mesmo ocorreu com a atividade relacionada aos textos 2 e 3 aplicada neste

curso.

No texto 2, de Jacques Lacan, distribuído aos participantes do curso em

23/03/09, 60% não responderam, alegando ser o texto incompreensível, 44%

criticaram ou questionaram a fala do autor, baseados em senso comum; 100% não

perceberam o uso de falácias, sofismas e estratagemas, não houve aceitação ou

não aceitação das idéias do autor por crença; 16% tiveram uma aceitação acrítica

dos argumentos do autor, 0% argumentou de forma incoerente; 40% apresentaram

coerência na argumentação baseado em senso comum; 36% fizeram uso de

argumentação apropriada com base no senso comum; e 36% fizeram uma análise

crítica do texto, também baseados no senso comum (GRAF. 9).

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9

9

10

0

4

0

0

0

25

11

15

0 5 10 15 20 25

Análise crítica

Uso de argumentação apropriada

Coerência na argumentação

Incoerência na argumentação

Aceitação acrítica do autor

Aceitação por mesma crença

Não aceitação por crença diferente

Percebimento de falácias / sofismas / estratagemas

Não percebimento de falácias / sofismas / estratagemas

Crítica ou questionamento a fala do autor

Não responderam alegando ser o texto incompreensível

Gráfico 9 - Texto 2 - 23/03/09

Exemplos de respostas dos alunos:

A – discordo de Jacques Lacan. o texto diz muito e significa pouco, pois suas idéias por mais diversas que sejam, estão totalmente desconexas no texto, o que impossibilita a coerência. O autor colocou grande quantidade de informações no texto no intuito de passar imagem para o leitor de um texto rico em significado, tentando assim intimidar o leitor para convencê-lo da validade de sua posição.

B – Jacques Lacan em sua tese apresentada no texto 2, faz uso de uma linguagem e lógica tão complicada que chega a prejudicar seu entendimento por completo. Tentar ligar os fatos com um objeto aparentemente não demonstra nenhuma lógica, já que no início do texto ele começa falando de perdas e de como elas afetam o sujeito.

C – o autor diz que a estrutura neurótica é um toro, mas sua linha de raciocínio confusa mal deixa abertura para questionamentos. Não concordo nem discordo de Lacan, pediria um outro exemplo.

No texto 3, também de Jacques Lacan, distribuído aos estudantes em

01/04/09, 100% deles criticaram ou questionaram a fala do autor utilizando

argumentação apropriada, todos (100%) perceberam as falácias, sofismas e

estratagemas, não houve aceitação ou não aceitação das idéias do autor por crença;

todos (100%) os estudantes tiveram coerência na argumentação, fizeram uso de

argumentação apropriada e analisaram o texto de forma crítica e reflexiva, conforme

demonstrado no GRAF. 10.

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25

25

25

0

25

0

0

25

0

25

0

0 5 10 15 20 25

Análise crítica

Uso de argumentação apropriada

Coerência na argumentação

Incoerência na argumentação

Aceitação acrítica do autor

Aceitação por mesma crença

Não aceitação por crença diferente

Percebimento de falácias / sofismas / estratagemas

Não percebimento de falácias / sofismas / estratagemas

Crítica ou questionamento a fala do autor

Não responderam alegando ser o texto incompreensível

Gráfico 10 - Texto 3 - 01/04/09

Exemplos de respostas dos alunos:

A – o zero não é um número irracional, como ele diz. No cálculo diferencial e integral nós vemos que o tender a zero é irracional. É um número muito pequeno, que não é zero, ele passa perto de zero. A definição de um número imaginário é a V-1=i. um número irracional é diferente dos imaginários. Os irracionais geralmente são usados a partir de sinais. Como por exemplo o π. Nesse texto Lacan usa o E 36 porque muitas pessoas que não sabem matemática, podem pensar que é verdade. Além disso, tem o E29, pois ele tenta misturar matemática com psicologia.

B – E 36 – discurso incompreensível: o autor utiliza uma linguagem de difícil compreensão a fim de desconcertar e aturdir o adversário. E 11 – salto indutivo: o autor conclui apressadamente que todo número irracional é imaginário. Argumento falso, pois os números irracionais são aqueles que não podem ser representados por uma fração e os números imaginários são aqueles representados pelo eixo y cartesiano. E 11 – salto indutivo: o autor conclui apressadamente que, por não serem intuitivos, os números imaginários não correspondem a algo de real. Os números imaginários possuem várias aplicações na engenharia.

C – Jacques Lacan usa em seu texto uma certa dose de manipulação semântica (E 12) ao escolher a metáfora “...a vida humana poderia ser definida como um cálculo no qual o zero seja irracional”, pois esta metáfora favorece a sua tese de uma maneira melhor do que qualquer outra. Há também, claro, uma certa dose de discurso incompreensível (E 36) durante todo o texto pois, para leigos, o texto não passa de um grande discurso técnico. Ora, para alguém que entende razoavelmente de matemática, o zero não é irracional, portanto essa afirmação é falsa. Percebe-se então que Lacan usa intencionalmente premissas falsas (E 20). Consequentemente, as conclusões do autor são feitas “à força” através de distorções de conceitos (E 24). É possível concluir que Lacan faz um discurso duplamente falacioso. Duplamente pois, em primeiro lugar há um discurso incompreensível para leigos e, em segundo lugar por usar de argumentos falsos durante todo o texto e sua conclusão se baseia nesses falsos argumentos.

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O objetivo foi cumprido: pôde-se perceber, claramente, que os informantes

aprenderam a identificar argumentos falaciosos, sofismas, estratagemas. O que no

dia 23 de março, primeiro dia de aula, identificavam como “algo errado ou esquisito”;

eles criticavam, mas utilizando-se de afirmações do senso-comum, embora

houvesse coerência em suas falas, em seus discursos – contudo, estavam longe de

manifestar uma argumentação apropriada no sentido de análise crítica ou reflexão;

dois alunos até usaram a palavra “inferência”, mas demonstrando que não

compreendiam o real significado da palavra e, portanto, não sabiam aplicar o

processo relacionado à inferência na argumentação.

No último dia do curso todos identificavam falácias, sofismas, estratagemas e

colocaram, espontaneamente, seus nomes e assinaturas nas atividades entregues,

sendo que lhes foi dada a opção, desde o primeiro dia, de usar pseudônimos, se

quisessem. Outro fator significativo: eles não apenas identificaram, mas também

colocaram o nome e o número dos estratagemas aos quais correspondiam as falhas

nos textos, ou seja: foram além do proposto, tal era sua motivação desenvolvida ao

longo desse curso.

Isso evidencia como a prática feita no segundo e terceiro encontros foi

motivadora para eles. O processo de incentivação funcionou: treinaram em duplas e em

grupo de discussão, juntamente com a professora. Gradualmente, foram relacionando

teoria e prática, estabelecendo relações com seu cotidiano escolar e extraescolar,

reconhecendo aplicabilidade do conteúdo ministrado.

No terceiro e quarto encontros chegaram animados, rindo, contando que, em

sala de aula da graduação, nas diversas disciplinas, um colega falava para o outro:

“olha, isso é E...” e divertiam-se com a curiosidade de seus colegas de turma que

queriam saber do que estavam falando.

Outra atividade dos estudantes que ultrapassou a expectativa foi o exercício

das páginas 26 e 27 da apostila: foi-lhes apresentado o quadro abaixo, retirado de

um site da internet com tipos de falácias, significado e exemplo, conforme exposto a

seguir:

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Latim / Tipos de Falácias Significado Exemplo

Argumentum ad Antiquitatem / Argumento Tradicional

Afirmar que algo é verdadeiro ou bom porque é antigo ou "sempre foi assim"

> "Se o meu avô diz que Garrincha foi melhor que Pelé, deve ser verdade."

Argumentum ad hominem / Ataque ao argumentador

Em vez de o argumentador provar a falsidade do enunciado, ele ataca a pessoa que fez o enunciado.

> "Se foi um burguês quem disse isso, certamente é engodo".

Argumentum ad ignorantiam / Argumento da Ignorância

Ocorre quando algo é considerado verdadeiro simplesmente porque não foi provado que é falso (ou provar que algo é falso por não haver provas de que seja verdade).Note que é diferente do princípio científico de se considerar falso até que seja provado que é verdadeiro.

> "Existe vida em outro planeta, pois nunca provaram o contrário"

Non sequitur / Não segue Tipo de falácia na qual a conclusão não se sustenta nas premissas. Há uma violação da coerência textual.

> "Que nome complicado tem este futebolista. Deve jogar muita bola!"

Argumentum ad Baculum / Apelo à Força

Utilização de algum tipo de privilégio, força, poder ou ameaça para impor a conclusão.

> "Acredite em Deus, senão queimará eternamente no Inferno."

Argumentum ad populum / Apelo ao Povo

É a tentativa de ganhar a causa por apelar a uma grande quantidade de pessoas.

> "A maioria das pessoas acredita em alienígenas, portanto eles existem."

Argumentum ad Verecundiam / Apelo à autoridade

Argumentação baseada no apelo a alguma autoridade reconhecida para comprovar a premissa.

> "Se Aristóteles disse isto, então é verdade."

Generalização Apressada / Falsa indução

É o oposto da Regra Geral Ocorre quando uma regra específica é atribuída ao caso genérico.

> "Minha namorada me traiu. Logo, as mulheres tendem à traição."

Composição (Tomar o todo pela parte)

É o fato de concluir que uma propriedade das partes deve ser aplicada ao todo.

> "Todas as peças deste caminhão são leves; logo, o caminhão é leve."

Straw man / Espantalho Consiste em criar idéias reprováveis ou fracas, atribuindo-as à posição oposta.

> "Meu adversário, por ser de um partido de esquerda, é a favor do comunismo radical, e quer retirar todas as suas posses, além de ocupar as suas casas com pessoas que você não conhece."

Tu quoque / Você também Se estabelece quando se usa os erros cometidos por outros para desconsiderar o argumento apresentado

> "Não aceito acusações de erros de português, pois você também erra muito"

Ad misericordiam / Apelo à pena

Justifica-se aceitação do argumento pelo uso de termos que procuram conquistar a simpatia ou a ligação emocional das pessoas com o objeto da conclusão, mesmo desconsiderando-se evidências em contrário.

> "Como você pode ser cruel e não destinar recursos internacionais à Etiópia? Pense em todos os homens, mulheres e crianças que estão morrendo de fome por lá!"

Ignoratio Elenchi / Falácia da diversão

É a introdução de material irrelevante ao ponto em discussão, em geral com o objetivo de desviar o argumento para outra conclusão, muitas vezes mais fácil de ser combatido.

> "Não acho que homens e mulheres devam ganhar o mesmo salário por funções iguais. Sou contra a igualdade entre os sexos. Em um shopping center, imagine o que aconteceria se os banheiros fossem unissex: tanto homens quanto mulheres se sentiriam desconfortáveis. Você não acha que tenho razão?"

Plurium interrogationum / Falácia da interrogação

A principal idéia é colocar uma questão que, não importa que resposta tenha comprometem o opositor .Quem for tentar responder a qualquer uma dessas perguntas,estará em apuros.

> "Onde foi que você escondeu o dinheiro que roubou?"

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Latim / Tipos de Falácias Significado Exemplo

False metaphor / Analogia imprópria

São muito úteis durante explanações difíceis de serem entendidas.

> "Funcionários são como pregos: freqüentemente precisamos martelá-los para ficarem mais firmes."

False dichotomy / Falso dilema

Este caso ocorre quando o argumentador propõe um número limitado de alternativas dentre todas as possíveis, em muitos casos já sugerindo, tendenciosamente, uma delas como verdadeira.

> "Se você não está a meu favor,então é porque você é contra mim."

Post hoc ergo propter hoc / Depois disso, então por causa disso

Consiste em dizer que, pelo simples fato de um evento ter ocorrido logo após o outro, eles têm uma relação de causa e efeito.

> "O Japão rendeu-se logo após a utilização das bombas atômicas por parte dos EUA. Portanto, a paz foi alcançada devido à utilização das armas nucleares."

Fonte; http://recantodasletras.uol.com.br/teoria literária/1022481

Foi acrescentado à frente de cada uma das linhas, uma coluna em branco,

para que eles pudessem, neste local, colocar pelo menos, um ou dois estratagemas

com o nome e o número de categorização de Schopenhauer (que é diferente em

nomenclatura e exemplos em relação à tabela apresentada).

O que surpreendeu foi que os estudantes colocaram vários e não apenas um

ou dois exemplos de correlação identificando a relação entre eles. Mais uma vez

eles mostraram seu aprendizado, registrando-o dessa forma, por escrito, na

atividade proposta.

Desse modo, percebe-se que a hipótese de partida foi confirmada na

estratégia do estudo de caso: ensinando-lhes a reconhecer o que são falácias,

sofismas, estratagemas, em textos científicos e explicando-lhes a importância do por

quê, do como e do para quê no estudo de Ciência e Tecnologia eles

compreenderam o processo de pesquisa e da construção nessa área de

conhecimento e manifestaram sua motivação em prosseguir no aprofundamento da

matéria.

Percebendo esses significados, o estudo nessa área adquire um sentido novo

que está além dos livros didáticos com suas respostas prontas e com fórmulas

aprendidas de modo desconectado do sentido de construção do conhecimento do

qual, tanto eles quanto os cientistas, podem e devem fazer parte.

Essa compreensão gera uma noção de perspectiva que, até então, os

estudantes não tinham. Estudar era só cumprir tarefas e, segundo eles, muitas

vezes desagradáveis e desmotivadoras .

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Nos textos 2 e 3 o autor relaciona sua percepção do sujeito neurótico com

exemplos matemáticos. No texto 2, muitos estudantes (15) negaram-se a responder;

alegaram ser impossível responder por que “o cara não falava nada com nada”, “que o

cara queria era aparecer”, “que o cara não sabia matemática”, entre outras afirmações

do gênero, como foram apresentados exemplos acima, juntamente com os gráficos.

No último encontro, no texto 3, do mesmo autor, os estudantes fizeram-lhe

críticas, algumas ferrenhas; demonstraram, por escrito, justificativa apropriada para

suas críticas, indicando quais eram e onde estavam os “erros de raciocínio” e que

“seu discurso era todo falacioso”. Os exemplos citados anteriormente, juntamente

com os gráficos, evidenciaram isso.

Está explicitado, nas análises, onde houve aceitação por mesma crença, onde

não houve aceitação por crença diferente, no primeiro encontro do curso. Já no

último encontro, houve análise crítica detalhada. A aceitação acrítica e incoerência

na argumentação desapareceram.

No final do curso, ao entregarem o material, percebia-se a alegria, a

autoconfiança, a busca de confirmação, com a professora, de que estavam

entregando um trabalho no qual, eles próprios, reconheciam o avanço, suas

conquistas no aprendizado. Quiseram e fizeram, espontaneamente, uma avaliação,

por escrito, do curso, deles e da professora e indagavam sobre a possibilidade de

fazer novo curso, se seria oferecido outro curso desse e quando, que tanto eles

quanto vários de seus colegas gostariam que isso acontecesse.

Seguem-se alguns pequenos exemplos das autoavaliações espontâneas, no

final do quarto encontro: os alunos serão identificados por letras maiúsculas, uma

vez que suas identidades são preservadas, como observado no termo de

consentimento livre e esclarecido que assinaram no início do curso.

A – “quero deixar meus sinceros agradecimentos à palestrante pela tão singular oportunidade de aprender o conteúdo de importância crucial para que os alunos desenvolvam pensamento crítico e possam identificar as pseudociências rotuladas como verdade muitas vezes nos discursos de docentes acadêmicos. Um curso como esse é único. Poderia ter sido expandido pois com uma carga horária reduzida não é possível explorar com profundidade o conteúdo. Sugiro a difusão do curso em outras disciplinas e outras faculdades”.

B – “as aulas do curso “A Erística e a Falácia do Discurso Pseudocientífico” foram ministradas com qualidade de ensino de forma interessante, a partir de debates e exposição teórica. No geral, o curso foi válido, pois ajudou a aprimorar o meu senso crítico e a minha capacidade argumentativa. Extensões do curso serão muito bem vindas”.

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C – “considero o curso como um grande aprendizado e que este poderá ser de grande valia para a vida profissional, que está cercada de discursos falaciosos. Lamento a pequena carga horária de apenas 8 h, mas serviu para ajudar na leitura dos textos, artigos e opiniões de profissionais. Despertou também o interesse em continuar os estudos acerca do conteúdo”.

D – “o curso “A Erística e a Falácia do Discurso Pseudocientífico” tem grande validade didática, pois permite às pessoas desenvolverem habilidades que as capacite a manterem uma postura crítica frente ao conhecimento. É fundamental que o indivíduo tenha ferramentas que lhe permitam selecionar a relevância das informações obtidas a fim de obter um maior amadurecimento intelectual. Dessa forma a produção do conhecimento pode se dar de forma mais séria”.

E – “o curso é de grande valia, pois aumenta a capacidade de interpretação do aluno, aguça a análise crítica. Apesar de pouco tempo de curso aprendi bastante, pois ele foi ministrado de forma objetiva e de fácil compreensão. A mestranda que ministrou o curso se mostrou bem preparada para dar as aulas e simpática aos alunos, respondendo bem às perguntas e dando exemplos cabíveis. Espero mais cursos desse tipo...”.

F – “o curso de Erística e Falácia do Discurso Pseudocientífico mostrou-se importante para a formação acadêmica, uma vez que o papel de um graduando não é somente adquirir conhecimento, mas também questioná-lo a fim de torná-lo mais de acordo com a realidade observada. Interpretar o discurso falacioso faz parte de um desenvolvimento científico”.

É gratificante constatar que os resultados foram além das expectativas

iniciais, que a hipótese foi comprovada e que, portanto, é possível fazer algo para

contribuir para a melhoria da qualidade no ensino de ciência e tecnologia e dar essa

contribuição social, pedagógica, educacional, cultural, por meio da relação dos

conteúdos de ciência e tecnologia com a filosofia da ciência e da tecnologia.

A professora lhes disse que não é da área de exatas, mas, como eles

constataram, ela foi capaz de perceber argumentos falaciosos, ainda que não tenha

conhecimento específico, por exemplo, da área de matemática. Mostrou-lhes que

isso é possível graças ao processo que eles também puderam experienciar durante

o curso.

Ela fez referência a um termo que eles utilizaram em um de seus exemplos:

“Parabolóide”, dizendo: “mesmo não tendo noção do significado do termo, vocês não

conseguiram me enganar, percebi os argumentos falaciosos, lembram-se?”

Um estudante, espontaneamente, desenhou para a professora e explicou, em

uma folha de papel, o que é “Parabolóide” e com o esclarecimento de que podem

ser de dois tipos: o elíptico e o hiperbólico. Havia observações como: o primeiro tem

forma de “taça”, o segundo tem forma de “sela de montaria”. A turma ficou curiosa,

quis ver e todos foram complementando as explicações e relacionando com o tema

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e criticando, ainda mais enfaticamente, os dois textos de Lacan. Os estudantes eram

categóricos em afirmar, por unanimidade, que “o autor podia entender de

psicanálise, mas de matemática ele não sabia nada, só utiliza recursos enganosos e

ainda fazia afirmações completamente errôneas” e iam identificando e discutindo

afirmações sobre matemática, mostrando onde estava o erro e porque era erro e se

orgulhavam de mostrar seu conhecimento em matemática e física – o que, segundo

eles, o autor desconhecia.

Foi gratificante perceber o desenvolvimento dos alunos em um curso de

apenas quatro encontros.

Após o encerramento do curso a professora foi abordada, por diversas vezes,

pelos alunos que atenderam ao curso, para informar-lhe que, ao ler artigos, ouvir

palestras, assistir certos documentários, entre outras coisas, já conseguiam

identificar argumentos falaciosos, sofismas e, muitas vezes, qual o estratagema que

estava sendo usado. Informaram, também, que já conseguiam identificar uma

falácia, só não conseguindo, ainda, identificar o estratagema. Manifestaram vontade

de atender a um curso de extensão, para aprofundar mais esse tipo de

conhecimento.

Isso corrobora a hipótese de que basta dar a oportunidade aos alunos, pois

eles estão prontos e motivados para um ensino analítico, de maior relação com a

prática, através do exercício de reflexão. Mostra como ciências exatas e ciências

humanas são campos complementares e, que percebido isso pelos educadores, o

ensino de ciência e tecnologia pode se tornar muito produtivo, criativo, dinâmico e

interessante, contribuindo para melhor relação entre ciência, tecnologia e

humanismo ou tecnohumanismo de qualidade superior ao que se tem comprovado

até então.

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6 CONCLUSÃO

É um erro capital teorizar antes de ter os dados. Insensivelmente, começa-se a distorcer os fatos para adaptá-los às teorias, em vez de fazer com que as teorias se adaptem aos fatos.

(Sherlock Holmes)

O objetivo deste trabalho é investigar como a Dialética Socrática e a Dialética

Erística de Schopenhauer poderiam ajudar alunos e professores a perceber

argumentos enganosos, capciosos, a desenvolver pensamento crítico e

compreender o processo de desenvolvimento da ciência como uma estrutura rica e

dinâmica, e não apenas como cálculos e resultados apresentados de modo

descontextualizado do processo de pesquisa, investigação e conclusão dos

cientistas.

Na primeira parte da pesquisa empírica, com uma turma de ciências exatas e

uma turma de ciências humanas, de duas faculdades públicas, comprovou-se que

os alunos NÃO reconheciam falácias, estratagemas, sofismas; que utilizavam

respostas de senso comum quando lhes era solicitada uma análise crítica, uma

reflexão.

No curso ministrado para alunos de graduação de uma dessas duas

faculdades públicas onde foi realizada a primeira etapa da pesquisa, ficou

constatado, como foi relatado nos capítulos Metodologia e Resultados e Discussão,

o salto qualitativo empreendido por esses alunos após aprenderem, de modo teórico

e prático, a arte da argumentação apropriada, do reconhecimento de falácias,

sofismas, estratagemas. Também aprenderam como esquivar-se desses

estratagemas.

Perceberam o PROCESSO DE SUA APRENDIZAGEM e reconheceram a

importância de compreender, no ensino de ciência e tecnologia, o PROCESSO

desenvolvido pelo cientista para ir de uma hipótese inicial às conclusões e à

refutação de falsos caminhos.

Eles relataram, espontaneamente, que aprenderam COM PRAZER e, por isto,

quiseram ir e foram além do proposto pela professora/pesquisadora; relataram que

gostariam de ter um curso de aprofundamento sobre este tema: A Erística e a

Falácia do Discurso Pseudocientífico.

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Os resultados relatados às páginas 73 a 78 mostram que o objetivo foi

cumprido: o que no dia 23 de março era identificado como “algo errado ou esquisito”,

no dia 01 de abril já era identificado como argumentos falaciosos, identificavam os

estratagemas segundo a classificação do filósofo Schopenhauer; nos textos 2 e 3,

eles identificaram os erros de matemática e criticaram o autor do texto, identificando,

com conhecimento que possuem de física e matemática, os argumentos enganosos

do autor.

Quando lhes foi apresentado um quadro com 17 estratagemas com nomes e

classificação diferentes da classificação de Schopenhauer, e lhes foi solicitado que

identificassem, pelo menos, 2 ou 3 e fizessem a correlação com 2 ou 3 dos

estratagemas de Schopenhauer, eles foram além: quase cem por cento dos alunos

identificaram e fizeram correlação dos 17 estratagemas com os 38 apresentados por

Schopenhauer.

Desta forma, na estratégia do estudo de caso, os estudantes aprenderam a

reconhecer o significado e a aplicabilidade do por quê, do para quê, do como no

estudo de ciência e tecnologia; com isto aprenderam a reconhecer, em textos,

falhas/estratagemas na construção de pseudociência. Eles compreenderam o

processo de pesquisa e de construção nesta área de conhecimento e manifestaram

sua motivação em prosseguir no aprofundamento da matéria.

Os resultados desta pesquisa corroboram a hipótese de partida: é possível e

proveitoso modificar programas e currículos, adequando-os a uma maior

estimulação do pensamento crítico, da análise e da reflexão. Também mostram a

importância da contribuição da filosofia da ciência e tecnologia para um ensino de

qualidade, melhor formação de alunos e professores nesta área.

Desta forma, as aulas podem se tornar desafiadoras, criativas, reflexivas,

permitindo a superação da “falta de significação” da qual reclamam os alunos e

alertam alguns pesquisadores desta área. Contribui para despertar a consciência do

sujeito que elabora discursos.

Este trabalho mostra como o pensamento de Sócrates e de Schopenhauer

são atuais e, utilizados de modo didaticamente apropriado, auxiliam alunos e

professores na construção de um modelo/modo inteligente e eficaz de ensino de

ciências na relação teoria-prática.

Ficou evidenciado que basta dar oportunidade apropriada, com recursos

didáticos adequados, que os alunos se mostram motivados, ávidos por este ensino

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dinâmico e reflexivo, de maior relação com a prática, como foi descrito no capítulo

Metodologia.

Os resultados deste trabalho permitiram mostrar, também, que ciências

exatas e ciências humanas são campos complementares e podem e devem

dialogar. Uma vez percebido isso pelos educadores, o ensino de ciência e tecnologia

pode enriquecer, tornar-se instigante, estimulante, indicando possibilidade de

desenvolvimento de um tecnohumanismo que traga contribuições promissoras para

a sociedade contemporânea.

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7 REFERÊNCIAS

1 WENNING, C. J. Engaging students in conducting socratic dialogues: suggestions for science teachers. Illinois: University of the Illinois, 2006.

2 MATTHEWS, M. R. História, filosofia e ensino de ciências: a tendência atual de reaproximação. Nova Zelândia: departamento de educação da universidade de Auckland, 2007.

3 FLOWERS, M. et al. Art: adversary arguments and the logic of personal attacks. Yale: Yale University, 1982.

4 VOLPI, Franco. A arte de ter razão – Schopenhauer. São Paulo: Martins Fontes, 2005

5 MONDOLFO, R. Sócrates. São Paulo: Mestre Jou, 1972.

6 VAZ, H. C. L. Antropologia filosófica. Vol. I. São Paulo: Loyola, 1998.

7 CARVALHO, O. Como vencer um debate sem ter razão . Rio de Janeiro: Topbooks, 2003.

8 LIPMAN, M. O pensar na educação. Petrópolis: Vozes, 1995.

9 PLATÃO. Diálogos I: Teeteto (ou do conhecimento). São Paulo: Edipro, 2007.

10 PLATÃO. Apologia de sócrates. Coleção os Pensadores. São Paulo: Cia. Brasil Editora, 1980.

11 JAEGER. Werner. Paidéia – los ideales de la cultura griega. Mexico: Fondo de Cultura Economica, 1957.

12 VOLPI, Franco. A arte de ter razão – Schopenhauer. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

13 LIPMAN, M. A filosofia vai à escola. São Paulo: Summus, 1990.

14 FLOWERS, M. et al. Art: adversary arguments and the logic of personal attacks. Yale: Yale University, 1982.

15 SAGAN, C. B. O mundo assombrado pelos demônios. São Paulo: Cia das Letras, 2007.

16 PRACONTAL, Michel. A impostura cientifica em 10 lições. São Paulo: UNESP, 2002.

17 DASCAL, Marcelo. A dialética na construção coletiva do saber científico. In: REGNER, A. C e ROHDEN, L (org). A filosofia e a ciência redesenham horizontes . São Leopoldo, RS: Unisinos, 2005.

18 BACHELARD, G. A epistemologia. Lisboa: Edições 70, 2001.

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19 MAGALHÃES, G. Introdução à metodologia das pesquisas: caminhos da ciência e tecnologia. São Paulo: Ática, 2005.

20 LIPMAN, M. A filosofia na sala de aula. São Paulo: Nova Alexandria, 1994.

21 REGIS DE MORAES. Filosofia da ciência e da tecnologia. Campinas: Papirus, 2002.

22 KUHN, Thomas S. A Estrutura das revoluções cientificas. São Paulo: Perspectivas, 1987.

23 OLIVEIRA, Bernardo Jefferson de. (org.). História da ciência no cinema. Belo Horizonte: Argumentum / Scientia - UFMG, 2005.

24 MAIA, P. F; JUSTI, R. S. Desenvolvimento de habilidades no ensino de ciências e o processo de avaliação: análise da coerência. Ciência & Educação, v.14, n.3, p. 440-457, 2009.

25 PEREIRA, Marcos Vilela. Redes em construção; meios de comunicação e práticas educativas. São Paulo: JM, 2003.

26 PINTO, Carmen Lúcia Lascano; PRIETSCH, Daisi da Fonseca; SILVEIRA, Denise Nascimento; PORTO, Tânia Maria Esperon; REAL, Marlise Flório. No estar-junto, a construção do sentido e relações de pesquisa em educação, comunicação e formação docente. In: PEREIRA, Marcos Vilela. Redes em construção; meios de comunicação e práticas educativas. São Paulo: JM, 2003.

27 GOMES, Pedro Gilberto. Art: a televisão, a criança e o adolescente. In: PEREIRA, Marcos Vilela. Redes em construção; meios de comunicação e práticas educativas. São Paulo: JM, 2003.

28 PORTO, Tânia Maria Esperon. A televisão na escola. Afinal, que pedagogia é esta? São Paulo JM EDITORA, 2000.

29 PINHEIRO, Lília. Homem: o ser tecnológico. Rev. Filosofia, Ciência e Vida, p.27, n.27, 2009.

30 HOLTON, Gerald. A imaginação científica. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1979.

31 BACHELARD, G. A formação do espírito científico. Rio de Janeiro: Contraponto, 2003.

32 YIN, Robert K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Trad. Daniel Grassi. 3.ed. Porto Alegre: Bookman, 2005.

33 GOULART, I.B. Estudos exploratórios em psicologia e trabalho. In: _____. (org.) Psicologia organizacional e do trabalho; teoria, pesquisa e temas correlatos. São Paulo: Casa do Psicólogo. 2002.

34 SILVA, C. P. Anexos a, b e c.

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APÊNDICE A

QUESTIONÁRIO

1. JUSTIFIQUE SUA MOTIVAÇÃO PARA IR À PALESTRA RECEBENDO “ESTE”

CONVITE.

2. QUAL É A TEORIA DEFENDIDA PELO AUTOR?

3. ANALISE A CHARGE APRESENTADA SOBRE OS TEMAS CRIACIONISMO E

DARWINISMO

4. ANALISE OS ARGUMENTOS APRESENTADOS PELO AUTOR,

EXERCITANDO SUA REFLEXÃO, ATRAVÉS DE RACIOCÍNIO LÓGICO BEM

ENCADEADO.

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APÊNDICE B

A.1 = 23/03/2009 = TEXTO 2 DO CURSO

AUTOR: JACQUES LACAN

ADAPTAÇÃO: Elivane Amaral de Souza Assis (mestranda CEFET/MG)

JACQUES LACAN foi um dos mais influentes psicanalistas do século

XX. Ele também centra seu interesse na topologia, ramo da matemática que trata

(entre outras coisas), das propriedades dos objetos geométricos. A seguir eis uma

pequena transcrição de seu pensamento e de suas afirmações em um seminário:

J.L: Analogia com o quê? “S” designa algo que pode ser escrito

exatamente como esse S. E eu disse que o “S” que designa o sujeito é instrumento,

matéria, para simbolizar uma perda (loss). Uma perda que você apreende por

experiência própria como sujeito (e eu também). Em outras palavras, a separação

(gap) entre uma coisa que tem significados marcados e essa outra coisa que é meu

verdadeiro discurso, que tento colocar no lugar onde você está, você não como

outro sujeito, mas como pessoa capaz de me compreender. Onde está o análogo

[analagon]? Ou essa perda existe, ou não existe. Se existe, só é possível designar a

perda por um sistema de símbolos. Em todo caso, a perda não existe antes que esta

simbolização indique seu lugar. Isso não é analogia. É, na verdade, em alguma parte

das realidades, essa espécie de toro. Este toro realmente existe e é exatamente a

estrutura neurótica. Não é uma analogia; nem mesmo uma abstração, porque uma

abstração é alguma espécie de diminuição da realidade, e eu penso que isso é a

própria realidade. (Lacan, 1970, p. 195-196).

Obs: um toro é a superfície formada por um pneumático oco; sua palestra foi

editada, posteriormente, no livro The Languages of Criticism and the Science

of Man, pp. 186-200. Editado por Richard Macsey e Eugenio Donato.

Baltimore: John Hopkins Press.

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APÊNDICE C

A.4 = 01/04/2009 = TEXTO 1 DO CURSO

A ERÍSTICA E A FALÁCIA DO DISCURSO PSEUDOCIENTÍFICO

TÍTULO: POR UMA NOVA BIOLOGIA

AUTOR: PROF. DR. CHRISTIANO

ATIVIDADE: após ler e analisar, atentamente esse texto, identifique se

há argumentos falaciosos; é possível identifica-los como estratagemas, segundo a

dialética erística de Schopenhauer? Por quê? Explicite qual é (ou quais são) o(s)

estratagema(s) encontrado(s) e justifique sua resposta.

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APÊNDICE D

A.4 = 01/04/2009 = TEXTO 3 DO CURSO

A ERÍSTICA E A FALÁCIA DO DISCURSO PSEUDOCIENTÍFICO .

Adaptação de um texto de Jacques Lacan, feita pela mestranda

PROF. Elivane Amaral de Souza Assis

Se vocês me permitirem usar uma destas fórmulas que me ocorrem

quando escrevo minhas anotações, a vida humana poderia ser definida como um

cálculo no qual o zero seria irracional. Esta fórmula é apenas uma imagem, uma

metáfora matemática. Quando digo “irracional”, não estou me referindo a algum

estado emocional insondável, mas exatamente àquilo que é chamado número

imaginário. A raiz quadrada de menos um não corresponde a nada que esteja sujeito

à nossa intuição, nada de real - no sentido matemático do termo – e, no entanto

precisa ser mantida, juntamente com suas funções completas. (Lacan, 1977, pp. 28-

29, seminário realizado originariamente em 1959). Traduzido para o inglês e

publicado em 1977: Jacques Lacan. Desire and the interpretation of desire in

Hamlet. Yale French Studies 55/56: 11-52.

ATIVIDADE: após ler e analisar, atentamente, esse texto, identifique se

há argumentos falaciosos; é possível identificá-los como estratagemas, segundo a

dialética erística de Schopenhauer? Por quê? Explicite qual é (ou quais são) o

estratagema encontrado e justifique sua resposta.

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ANEXO A

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ANEXO B

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ANEXO C

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ANEXO D

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

A Maiêutica e a Erística no Ensino de Graduação em Ciências

Eu,_________________________________________________________, estudante da Graduação do CEFET/MG, concordo em participar do estudo acadêmico intitulado A Maiêutica e a Erística no Ensino de Graduação em Ciências, para uma dissertação de mestrado do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, e autorizo sua publicação nas condições abaixo. Resumo do estudo: O objetivo do estudo é investigar como a Maiêutica e a Erística poderiam ajudar professores e estudantes a desenvolver o pensamento crítico, a perceber argumentos falaciosos e, principalmente, a compreender o processo de desenvolvimento da ciência como uma estrutura rica e dinâmica. A Maiêutica é um método desenvolvido pelo filósofo grego Sócrates, que, ensinava por meio do diálogo, a arte de raciocinar de modo adequado, fazendo perguntas e estabelecendo relações entre idéias. A Erística foi desenvolvida pelo filósofo alemão Schopenhauer, em que ele demonstra 38 estratagemas ou regras explicitamente inválidas de inferência, usadas apenas para confundir e destruir o adversário. Pretende-se investigar o conhecimento dos estudantes de cursos de graduação em ciência e tecnologia a respeito dessas regras inválidas ou não e melhorar sua percepção crítica através do ensino da Maiêutica e dos estratagemas citados.

Procedimentos: O estudo envolverá a aplicação de questionários e entrevistas com os estudantes.

Desconforto e riscos: Não há.

Benefícios esperados: contribuição à aprendizagem.

Confidencialidade: Os registros de minha participação neste estudo serão mantidos em sigilo até onde é permitido por lei e todas as informações ficarão restritas à equipe responsável pelo projeto. Qualquer publicação não identificará nem o participante, nem a instituição a que ele pertence.

Desligamento: A participação neste estudo é voluntária. Sua recusa em participar ou seu desligamento não envolverá qualquer penalidade ou perda de benefício. Você poderá cessar sua participação a qualquer momento.

Compensação: Você não receberá qualquer compensação financeira por sua participação no estudo.

Consentimento: Li e entendi as informações precedentes. Este formulário está sendo assinado voluntariamente por mim, indicando o meu consentimento para participar do estudo até que eu decida o contrário. Belo Horizonte (MG), _____ de _____________________ de 2009 Assinatura do estudante: ____________________________________

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO CENTRO FEDERAL DE EDUCAÇÃO TECNOLÓGICA DE MINAS GER AIS

Mestrado em Educação Tecnológica

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INDICE REMISSIVO Aristóteles, 8, 24 ciência, 9, 10, 30, 32, 34, 35, 37, 39, 40, 45, 46, 52, 68, 75 dialética erística, 8, 15, 26, 27, 48, 51, 53, 54, 60 dialética socrática, 6, 8, 11, 26, 27, 48, 52, 54 dialética, 5, 6, 8, 24, 25, 33 ensino, 26, 30, 39, 41, 45, 46, 61, 68, 77 epistemologia, 5, 32 erística, 6, 8, 45, 66, 67, 77 estratagema(s), 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 48, 49 55, 58, 59, 60, 69, 70, 72, 73, 74, 75, 79 estudo de caso, 47, 50 falácia(s), 31, 56, 66, 69, 77, 79 filosofia, 5, 9, 14, 26, 32, 36, 39, 40 hipótese(s), 8, 36, 48, 78 impostura científica, 31, 32 maiêutica, 6, 14, 45 objetivo, 5, 51, 53, 73, 79 paidéia, 14 pedagógico(as), 28, 42, 44, 77 pesquisa, 5, 6, 8, 35, 39, 47 Platão, 10, 11 pseudociência, 9, 36, 37 Schopenhauer, 8, 15, 24, 34, 45, 48, 51, 58, 60 Sócrates, 6, 7, 10, 11, 12, 13, 14, 34, 42 tecnologia, 9, 10, 30, 34, 35, 37, 38, 39, 43, 45, 46, 75, 77 Wenning, 5, 30

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