A Medida Provisória e o Direito Penal

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 A Medida Provisória e o Direito Penal  Antecedendo a Medida Provisória, existia o Decreto-Lei. Este último foi substituído pelo primeiro por ser considerado uma figura diversa no Processo Legislativo. A Constituição Federal de 1988, pelo art. 62º, substitui o decreto-lei pela medida provisória e, esta, não recebeu limites objetivos para sua edição e exigindo apenas uma certa “urgência e rel evância”, podendo ser baseada em princípios genéricos e pouco confiáveis.  Medida provisória é uma espécie de “lei delegada” condicionada à expressa aprovação do Congresso Nacional. Tal medida, por não ser considerada lei antes de sua aprovação pelo Congresso, não pode delinear o que seja crime ou pena criminal ( art. 5º, inciso XXXIX ).  Medida Provisória não é lei, mas mesmo admitindo-se ter ela força de lei, não é capaz de versar sobre matéria da importância e responsabilidade como é o Direito Penal, não podendo, portanto, criar tipos penais ou prescrição de penas.  Celso de Mello Filho coloca-se contra a possibilidade de edição de medida provisória em matéria penal, afirmando que:   “a privação, mesmo cautelar, da liberdade individual, a tipificação de novas entidades delituosas e a cominação de penas não podem constituir objeto de medidas provisórias, em face, até, da irreversibilidade das situações geradas por essa espécie normativa” 1[12]. Igualmente, Alberto Silva Franco afirma que:   “com tais carac terísticas, pode a medida provisória servir de instrumento normativo adequado à abordagem da disciplina penal? A resposta à indagação só poderá ser negativa. Tal como o decreto-lei, a medida provisória ocupa um lugar de inferioridade, em relação à lei em sentido estrito. Não se argumente com o fato de que o texto constitucional relativo à medida provisória não sofre nenhuma restrição em seu raio de incidência. O dispositivo não pode ser interpretado isoladamente, mas deve ser submetido a uma interpretação sistemática para a qual contribuem outros princípios constitucionais tais como o da legalidade e da separação de poderes” 2 12- MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo: Atlas, 1997.

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A Medida Provisória e o Direito Penal 

Antecedendo a Medida Provisória, existia o Decreto-Lei. Este último foi

substituído pelo primeiro por ser considerado uma figura diversa no Processo

Legislativo. A Constituição Federal de 1988, pelo art. 62º, substitui o decreto-lei

pela medida provisória e, esta, não recebeu limites objetivos para sua edição e

exigindo apenas uma certa “urgência e relevância”, podendo ser baseada em

princípios genéricos e pouco confiáveis. 

Medida provisória é uma espécie de “lei delegada” condicionada à

expressa aprovação do Congresso Nacional. Tal medida, por não ser considerada lei

antes de sua aprovação pelo Congresso, não pode delinear o que seja crime ou

pena criminal ( art. 5º, inciso XXXIX ). 

Medida Provisória não é lei, mas mesmo admitindo-se ter ela força de lei,

não é capaz de versar sobre matéria da importância e responsabilidade como é o

Direito Penal, não podendo, portanto, criar tipos penais ou prescrição de penas.  

Celso de Mello Filho coloca-se contra a possibilidade de edição de medida

provisória em matéria penal, afirmando que: 

 “a privação, mesmo cautelar, da liberdade individual, a tipificação de

novas entidades delituosas e a cominação de penas não podem constituir objeto de

medidas provisórias, em face, até, da irreversibilidade das situações geradas por

essa espécie normativa” 1[12]. 

Igualmente, Alberto Silva Franco afirma que: 

 “com tais características, pode a medida provisória servir de

instrumento normativo adequado à abordagem da disciplina penal? A

resposta à indagação só poderá ser negativa. Tal como o decreto-lei, a

medida provisória ocupa um lugar de inferioridade, em relação à lei em

sentido estrito. Não se argumente com o fato de que o texto

constitucional relativo à medida provisória não sofre nenhuma restrição

em seu raio de incidência. O dispositivo não pode ser interpretado

isoladamente, mas deve ser submetido a uma interpretação sistemática

para a qual contribuem outros princípios constitucionais tais como o da

legalidade e da separação de poderes” 2 

12- MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. São Paulo:

Atlas, 1997.

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13- MUÑOZ CONDE, Francisco. Introducción al Derecho Penal.

Barcelona: Bosch, 1975. 

 Natureza Jurídica e Aplicação 

Tema bastante discutido é da natureza jurídica da medida provisória.

Alguns autores como, Ives Gandra da Silva Martins, Eros Roberto Grau e

Clèrmerson Merlin Clève, afirmam ser ato legislativo, tendo em vista suadisposição na Constituição Federal de 1988 no art. 59, que trata do

processo legislativo.

Esse entendimento deve ser avaliado, uma vez que entra em contradição

com o art. 62, “caput” da CF, onde dispõe que a medida provisória tem

força de lei, portanto não é lei. Para complementar tal raciocínio, nos

termos do disposto no § 3º, do mesmo artigo, compete ao Congresso

Nacional converter a medida provisória em lei, evidenciando que somente

após sua conversão, que deverá ser tratada com tal.

Alguns autores que concordam não ter a medida provisória natureza

legislativa, classificam-na como ato normativo do Poder Executivo, dotado

de juridicidade precária, ou ainda, que se trata de um ato político, degoverno.

O art. 62 da CF atual introduziu a medida provisória, análoga ao decreto-

lei, sacrificando a segurança jurídica, uma vez que não deixa claro qual lei

estará em vigor durante a discussão da medida no Congresso, além de não

ter rol definido de matérias.

Inicialmente, as medidas vigiam provisoriamente por trinta dias, que ao

final deste prazo se perdia a eficácia ex-tunc, cabendo ao Congresso dispor

sobre os atos praticados durante a vigência da medida, causando incerteza e

insegurança jurídica. Depois, contrário à disposição constitucional, e com o

fim de solucionar esse problema, mas apenas protelando-o, passou-se a

reedição de medidas que perdiam a eficácia diante da não-aprovação peloCongresso.

Segundo Amaro (2008, p. 170), a EC n. 32/01 implementou as seguintes

modificações em uso até o momento: a) vedou o uso das medidas

provisórias em algumas matérias; b) deixou expresso que, na instituição ou

majoração de impostos sujeitos ao princípio da anterioridade, a medida

provisória deve ser convertida em lei, até o último dia do exercício de sua

edição, sob pena de não ser eficaz no exercício seguinte àquele; c) ampliou

a vigência para sessenta dias e previu prorrogação automática para igualperíodo, não contando o prazo do recesso do Congresso.

Editada a medida ela vigora como lei, passados os 60 dias prorrogáveis pormais 60 e não for convertida em lei, perde a eficácia e fica aguardando sem

efeito durante 60 dias, findos os quais, caso o Congresso não se pronuncie,ela se restabelece afirmando efeitos definitivos.

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Dispõe Amaro (2008, p 171) sobre o cabimento em matéria tributária das

medidas provisórias, especialmente no diz respeito à criação ou aumento de

tributo. Encontrando-se no rol dos que não acham cabível medida

provisória em matéria tributária: Misabel de Abreu Machado Derzi, Ives

Gandra da Silva Martins, Roque Carrazza, Paulo de Barros Carvalho e JoséEduardo Soares de Melo, e pronunciando-se a favor tem-se Leon Fredja

Szklarowsky, Walter Ferreira Jardim, Adilson Rodrigues Pires, Marco

Aurélio Greco.

Há ainda alguns autores que admitem o uso das medidas provisórias em

matéria tributária, apenas para criação de impostos extraordinários deguerra e empréstimos compulsórios.

Pelo exposto, se conclui a natureza jurídica da medida provisória não é

legislativa, contudo esse fato não impede sua aplicação em matéria

tributária, até mesmo por disposição constitucional EC 32/01, contudo

devem-se analisar os princípios específicos da área tributária em conjuntocom os pressupostos da medida provisória para se afirmar ou negar seucabimento.

Além do mais, e conforme dispõe Moraes (2005, p. 602), a medida

provisória sendo espécie normativa definitiva e acabada, apesar de seu

caráter de temporariedade, estará sujeita ao controle de constitucionalidade,

como qualquer outra lei ou ato normativo, que é possível tanto em relação à

disciplina dada à matéria tratada pela mesma, quanto aos próprios limitesmateriais e aos requisitos de relevância e urgência.

 2.4.1.2. Pressupostos Constitucionais

A CF/88 prevê pressupostos formais e materiais para a existência e para a

validade das medidas provisórias. Em relação ao primeiro são dois

pressupostos de validade exigidos, um diz respeito à legitimidade ativa e ooutro trata da necessária e imediata submissão da medida provisória editadaao Congresso Nacional, conforme previsto no art. 62.

A legitimidade ativa para edição de medidas provisórias é conferida aoPresidente da República, contudo esse aspecto não é ponto pacífico na

doutrina quanto à possibilidade dos governadores de Estado e prefeitos

exercerem tal edição.

Os autores que são contra alegam que o instrumento da medida provisória

 já caracteriza uma exceção, e, portanto, deve ser interpretadorestritivamente, ao passo que legislar é atividade do legislativo.

Outros admitem que governadores e prefeitos editem medidas provisórias,

desde que haja previsão na Constituição Estadual ou na Lei OrgânicaMunicipal, no mesmo sentido seguiu o Supremo Tribunal Federal.

Sobre esse assunto Carrazza apud Moraes (2005, p. 606) afirmou que:

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“nada impede, porém, que exercitando seus poderes constituintes

decorrentes, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal prevejam a

edição de medidas provisórias, respectivamente, estaduais, municipais e

distritais. A elas, mutatis mutandis, devem ser aplicados os princípios elimitações que cercam as medidas provisórias federais”. 

A CF, em relação aos pressupostos formais ainda, exige que a medida

provisória seja submetida, de imediato, ao exame do Congresso Nacional,caracterizando assim, a excepcionalidade e a precariedade dessa figura

legislativa, já que poderá perder a eficácia, desde a edição, se não forconvertida em lei no prazo de sessenta dias prorrogado por igual período.

Diante do exposto no art. 62 da CF, além dos requisitos formais para

aplicação da medida provisória, quais sejam: legitimidade ativa, submissão

ao Congresso, tem-se ainda os requisitos materiais, quais sejam: relevânciae urgência.

Esses requisitos podem ser analisados separadamente por uma opção

didática, mas têm entre si relação para caracterização de validação dos

pressupostos, como por exemplo, os requisitos da relevância e da urgênciacondicionam o exercício do poder do Presidente da República de editar

medidas provisórias, e devem ser invocados para controle da legitimidade

do exercício do excepcional poder conferido ao Chefe do Governo, emqualquer caso, inclusive de leis tributárias.

A ressalva feita pela Constituição é que a deliberação do legislativo sobre o

mérito das medidas provisórias depende de juízo prévio sobre oatendimento dos pressupostos constitucionais, não havendo nenhuma

especificidade dos tributos que os incompatibilizem com medidasrelevantes e urgentes.

A Constituição dispensa até mesmo o princípio da reserva legal emalgumas situações extremamente urgentes, como é o caso dos tributos cujas

alíquotas podem ser alteradas por ato do Executivo, respeitados os

parâmetros legais. Não se pode alegar que apenas nesses casos poder-se-ia

utilizar a medida provisória, até porque, nem se precisaria, pois oExecutivo poderia dispor de outro instrumento, além desta ter sido criadapara atuar como sucedâneo da lei.

Devem ser observados aqueles tributos submetidos ao princípio da

anterioridade da lei, que não poderiam ser instituídos através de medidasprovisórias, posto que estaria ausente o pressuposto da urgência, mas que

apesar disso, e sob o argumento de que a arrecadação dos recursos

correspondentes já no ano seguinte seria urgente e relevante, não podendo

aguardar o lento processo legislativo, podem ser utilizadas.

Apesar de toda discussão doutrinária relativa ao uso das medidas

provisórias em matéria tributária, elas têm sido utilizadas em matérias

reservadas às leis ordinárias, com consentimento do Congresso e dosTribunais.

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