A Microhistória é Um Gênero Historiográfico Surgido Com a Publicação

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a micro-história opera com escala de observação reduzida, exploração exaustiva de fontes, descrição etnográfica e preocupação com a narrativa literária. Neste sentido, contempla, sobretudo, temáticas ligadas ao cotidiano de comunidades específicas referidas geográfica ou sociologicamente —, às situações-limite e às biografias ligadas à reconstituição de microcontextos ou dedicadas a personagens extremos, geralmente vultos anônimos, figuras que por certo passariam despercebidas na multidão A micro-história nos bastidores, privilegia o estudo do aparato conceitual empregado pela micro- história, a escolha de temas, a problemática da redução de escala na descrição densa, bem como a delimitação dos objetos de estudo em termos de espaço e de temporalidade A microhistória é um gênero historiográfico surgido com a publicação, na Itália, da coleção "Microstorie", sob a direção de Carlo Ginzburg e Giovanni Levi, pela editora Einaudi, entre 1981 e 1988. Vem sendo praticada principalmente por historiadores italianos, franceses, ingleses e estadunidenses, com ênfase no papel desempenhado pelos primeiros, na importância da revista "Quaderni Storici" e no sucesso da referida coleção "Microstorie". A sua proposição de análise histórica defende uma delimitação temática extremamente específica por parte do historiador (inclusive em termos de espacialidade e de temporalidade), mas não se reduz apenas a isto. Numa escala de observação reduzida, a análise desenvolve-se a partir de uma exploração exaustiva das fontes , envolvendo a descrição etnográfica e tendo preocupação com uma narrativa histórica que se diferencia da narrativa literária porque se relaciona com as fontes.

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a micro-história opera com escala de observação reduzida, exploração exaustiva de fontes, descrição etnográfica e preocupação com a narrativa literária. Neste sentido, contempla, sobretudo, temáticas ligadas ao cotidiano de comunidades específicas — referidas geográfica ou sociologicamente —, às situações-limite e às biografias ligadas à reconstituição de microcontextos ou dedicadas a personagens extremos, geralmente vultos anônimos, figuras que por certo passariam despercebidas na multidão

A micro-história nos bastidores, privilegia o estudo do aparato conceitual empregado pela micro- história, a escolha de temas, a problemática da redução de escala na descrição densa, bem como a delimitação dos objetos de estudo em termos de espaço e de temporalidade

A microhistória é um gênero historiográfico surgido com a publicação, na

Itália, da coleção "Microstorie", sob a direção de Carlo Ginzburg e Giovanni

Levi, pela editora Einaudi, entre 1981 e 1988. Vem sendo praticada

principalmente por historiadores italianos, franceses, ingleses e

estadunidenses, com ênfase no papel desempenhado pelos primeiros, na

importância da revista "Quaderni Storici" e no sucesso da referida coleção

"Microstorie".

A sua proposição de análise histórica defende uma delimitação temática

extremamente específica por parte do historiador (inclusive em termos de

espacialidade e de temporalidade), mas não se reduz apenas a isto.

Numa escala de observação reduzida, a análise desenvolve-se a partir de

uma exploração exaustiva das fontes, envolvendo a descrição etnográfica e

tendo preocupação com uma narrativa histórica que se diferencia da narrativa

literária porque se relaciona com as fontes. Contempla temáticas ligadas ao

cotidiano de comunidades específicas — geográfica ou sociologicamente —, às

situações-limite e às biografias ligadas à reconstituição de microcontextos

ou dedicadas a personagens extremos, geralmente figuras anônimas, que

passariam despercebidas na multidão.

Surgida a partir dos debates relacionados com os rumos que a chamada

Escola dos Annales deveria tomar, esta nova corrente historiográfica foi mal

compreendida, ora tomada como história cultural, ora confundida com a história

das mentalidades e com a história do cotidiano. Segundo o historiador

brasileiro Ronaldo Vainfas, também foi percebida como a expressão típica de

uma história descritiva, de viés marcadamente antropológico, que renunciou ao

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estatuto científico da disciplina e invadiu o território da literatura, rompendo de

vez as fronteiras da narrativa histórica com o ficcional.

Giovanni Levi chama a atenção de que tais análises estão equivocadas,

pois apesar de produzirem resultados interessantes, o recorte em micro-história

deve ser temático e, mesmo assim, relacionado com um assunto mais amplo.

O autor assinala que a micro-história deveria servir como um "zoom" em uma

fotografia. O pesquisador observa um pequeno espaço bastante ampliado,

mas, ao mesmo tempo, tendo em conta o restante da paisagem, apesar de não

estar ampliada.

Entre os autores que se dedicaram à produção da micro-história citam-se:

Alain Corbin

Carlo Ginzburg (O Queijo e os Vermes) (1976)

Clifford Geertz

Emmanuel Le Roy Ladurie

Giovanni Levi (A herança imaterial: trajetória de um exorcista no Piemonte

do século XVII)

Jacques Revel

Natalie Zemon Davis (O retorno de Martin Guerre)

No Brasil, ainda são poucos os historiadores que se dedicam à reflexão

teórica ou mesmo à prática da microhistória. Destacam-se os nomes de

Ronaldo Vainfas (autor de Traição: um jesuíta a serviço do Brasil holandês

pocessado pela inquisição) e Boris Fausto (autor de O crime do restaurante

chinês: carnaval, futebol e justiça na São Paulo dos anos 30).

Sidney Chalhoub - Visões do paraíso

]

Tive meu primeiro contato com a micro-história ao ler o tão famoso e

mundialmente conhecido “O queijo e os vermes” do historiador Carlo Ginzburg. Onde

primorosamente este historiador consegue trazer à luz da historiografia um anônimo,

que poderia passar como muitos à margem da História. Ora, o que tem de extraordinário

na micro-história é que esse “instrumento historiográfico” consegue fazer o que os

primeiros historiadores da Escola dos Annales já idealizavam, uma história vista de

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baixo, onde muitos agentes históricos ficavam de fora. E mais do que isso, onde

geralmente a falta de fontes e documentos impossibilitaria um trabalho, a micro-análise

feita através de indícios e rastros deixados por esse “anônimo” serve para reconstruir a

visão que se pretende ter de sua época, pois a micro-história busca relacionar o

individuo e sua época, como é o caso de “O queijo e os vermes” onde através da vida de

Menochio Scandella pode-se alcançar sua relação com o contexto da época.

O objetivo da micro-história tem sido a busca de uma descrição mais próxima do

comportamento humano, empregando um modelo de ação que possa fazer emergir

personagens anônimos que, de outra maneira, ficariam esquecidos.

A história não deve se limitar a grandes esquemas e modelos teóricos. A história estuda

as pessoas, as relações estabelecidas entre elas, suas aspirações, seus medos, sonhos,

idéias e convicções. A micro só enriquece a macro.

Nova história cultural e micro-história: uma breve reflexão de suas origens

Não é preciso ser um historiador muito atento (aliás, nem é preciso ser

historiador) para observar que a produção historiográfica produzida no Brasil,

principalmente nos últimos dez anos, passou por mudanças mui significativas. O

surgimento de revistas especializadas (no mínimo 3 títulos rivalizam-se nas bancas

mensalmente), a constante adaptação de textos de história para a televisão, o

lançamento de livros com temas nunca antes imaginados (como é o caso da obra de

Jean-Luc Hennig, Breve História das Nádegas, publicado pela portuguesa Terramar),

exemplificam essas mudanças.

Aqui, neste artigo, discutiremos uma nova forma de se abordar os eventos

históricos chamada Nova História Cultural. A escolha se justifica, uma vez que, dos

novos modelos historiográficos, é, justamente, a Nova História Cultural, que mais

consegue trazer novos ares ao trabalho do historiador.

Para justificar essa afirmação, basta observamos o esgotamento das explicações

oferecidas por modelos teóricos globalizantes, com tendências à totalidade, nos quais

o historiador era refém da busca da verdade. Essas explicações globais, por sua

incapacidade de interpretar novos agentes históricos, passaram, portanto, a ser

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questionados. Outro dado que justifica nossa investigação, nos é dado por Sandra

Jatahy Pesavento (2002, p. 7/8), Segundo ela, a Nova História Cultural corresponde

hoje, a cerca de 80% da produção historiográfica nacional, expressa não só nas

publicações especializadas, sob forma de livros e artigos, como nas apresentações de

trabalhos, em congressos e simpósios ou ainda nas dissertações e teses, defendidas

e em andamento, nas universidades brasileiras.

Entremente, não ficaremos apenas na Nova História Cultural. Abordaremos

também, alguns aspectos da Micro-história, uma vez que esta é um desdobramento

teórico intimamente ligado ao surgimento da Nova História Cultural.

O arcabouço intelectual que vai dar origem à Nova História Cultural está

intimamente ligado ao surgimento, no final da década de 1920, na França, de uma

nova forma de se pensar as questões historiográficas, identificada como História das

Mentalidades.

Essa nova forma de se interpretar os fatos históricos, buscava fugir da história

historicizante: uma história que se furtava ao diálogo com as demais Ciências

Humanas, a antropologia, a psicologia, a lingüística, a geografia, a economia, e,

sobretudo, a sociologia.

No lugar desse tipo de manejo dos fatos históricos, era preciso adotar, segundo

Vainfas (2002, p. 17):

uma história problematizadora do social, preocupada com as massas anônimas,

seus modos de viver, sentir e pensar. Uma história com estruturas em movimento,

com grande ênfase no mundo das condições de vida material, embora sem qualquer

reconhecimento da determinância do econômico na totalidade social, à diferença da

concepção marxista da história . Uma história não preocupada com a apologia de

príncipes ou generais em feitos singulares, senão com a sociedade global, e com a

reconstrução dos fatos em série passíveis de compreensão e explicação.

Entretanto, muitas críticas vão se insurgir contra os defensores da História das

Mentalidades. A mais comum e corrosiva dessas críticas é de que a História das

Mentalidades torna multi-fragmentado o seu objeto de estudo. Isto é, "a chamada

História das Mentalidades abriu-se de tal modo a outros saberes e questionamentos

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que, no limite, pôs em risco a própria legitimidade da disciplina", conforme assegura

Vainfas (Idem, p. 55/56).

Acuada por críticas de diversas formas, a História das Mentalidades refugia-se

na chamada Nova História Cultural. Se utilizamos a expressão Nova História Cultural é

para separá-la daquilo que convencionou-se chamar de Velha História Cultural.

Segundo Pesavento (2004, p. 14/15), na Nova História Cultural.

Foram deixadas de lado concepções de viés marxista, que entendiam a

cultura como integrante da superestrutura, como mero refluxo da infraestrutura, ou

mesmo da cultura como manifestação superior do espírito humano e, portanto, como

domínio das elites. Também foram deixadas para trás concepções que opunham a

cultura erudita à cultura popular, esta ingenuamente concebida como reduto do

autêntico. Longe vão também as assertivas herdeiras de uma concepção da belle

époque, que entendia a literatura e, por extensão, a cultura, como o sorriso da

sociedade, como produção para o deleite e a pura fruição do espírito.

A Nova História Cultural, portanto, está trazendo uma nova forma da história

tratar a cultura. Ainda segundo Pesavento (Idem, p. 15):

Não mais como uma mera história do pensamento, onde estudava-se os grandes

nomes de uma dada corrente ou escola. Mas, enxergar a cultura como um conjunto de

significados partilhados e construídos pelos homens para explicar o mundo.

A Nova História Cultural, por tudo que foi acima mencionado, vai fazer ressalvas

(sem no entanto negá-lo) ao conceito de mentalidades por classificá-lo ambíguo e

excessivamente vago. No entanto, a Nova História Cultural não nega a aproximação

com as outras Ciências Humanas, admite o conceito de longa duração e aceita os

temas do cotidiano. Conforme assegura Vainfas (2002, p. 56):

Os historiadores da cultura (...), não chegam propriamente a negar a relevância

dos estudos sobre o mental. Não recusam, pelo contrário, a aproximação com a

antropologia e demais ciências humanas, admitem a longa duração e não rejeitam os

temas das mentalidades e do cotidiano.

Além disso, a Nova História Cultural quer também se aproximar das massas

anônimas. Podemos, portanto, afirmar que a Nova História Cultural revela uma

especial afeição pelo informal, por análises historiográficas que apresentem caminhos

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alternativos para a investigação histórica, indo onde as abordagens tradicionais não

foram.

E foi neste mar de possibilidades novas que vários historiadores passaram a

navegar. Um dos mais importantes e que, primeiramente, merece destaque é o italiano

Carlo Ginzburg, que em 1976 lança uma obra ímpar da Nova História Cultural (e por

que não dizer, da Micro-História também), intitulada "O queijo e os vermes". Nela, o

autor discorre sobre um moleiro condenado como herege pela Inquisição Papal no

século XVI. Podemos considerar essa obra uma obra-síntese, uma vez que foi nela

que Ginzburg abandonou o conceito de mentalidades (as razões, já discutimos acima)

e adotou o de cultura, definindo-a como "o conjunto de atitudes, crenças, códigos de

comportamento próprios das classes subalternas em um certo período histórico"

(GINZBURG, 1986, p. 16).

Decorre desta definição ser possível, agora, recuperar o conflito de classes em

uma dimensão sociocultural, deixando-se entrever no campo das discussões teóricas

aquilo que o historiador italiano chamou de circularidade cultural, conceito que se opõe

ao velho paradigma cultura popular X cultura erudita.

Outro pensador da Nova História Cultural que nos chama atenção é Roger

Chartier. Este, pertencente a uma geração contemporânea do declínio das

mentalidades na França. Chartier concorda com as discussões lançadas por Ginsburg

por também rejeitar a visão dicotômica cultura popular X cultura erudita em favor de

uma visão, digamos, mais abrangente, que, no limite, valoriza o dimensionamento da

cultura em termos de classes sociais. Para tanto, ele propõe um conceito de cultura

como prática, e sugere para seu estudo as categorias de representação e

apropriação.

Representação analisada como algo que permite ver uma coisa ausente e que,

segundo Chartier seria mais abrangente que o conceito de mentalidades, uma vez que

o ausente em-si não pode mais ser visitado. Segundo Pesavento (2004, p. 40):

Representar é, pois, fundamentalmente, estar no lugar de, é presentificação de

um ausente; é um apresentar de novo, que dá a ver uma ausência. A idéia central é,

pois, a da substituição, que recoloca uma ausência e torna sensível uma presença.

Se o objetivo central do conceito de representação é trazer para o presente o

ausente vivido e, dessa forma, poder interpretá-lo, o de apropriação, segundo Chartier

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(1990, p. 26), é "construir uma história social das interpretações, remetidas para suas

determinações fundamentais" que são o social, o institucional e, sobretudo, o cultural.

Como o objetivo desse artigo não é, claro, o de fechar questão em torno de

nada, gostaríamos de salientar que, tanto na sua vertente italiana quanto na sua

vertente francesa, a proposta da Nova História Cultural seria o de decodificar a

realidade do já vivido por meio das suas representações, desejando chegar àquelas

formas pelas quais a humanidade expressou-se a si mesmo e o mundo.

Para o historiador da cultura, isso é muito importante ressaltar, o passado só

chega aos dias atuais por meio das representações. Afirmando com Pesavento (2004,

p. 42):

"a rigor, o historiador [da cultura] lida com uma temporalidade escoada, com o

não-visto, o não-vivido, que só se torna possível acessar através de registros e sinais

do passado que chegam até ele".

Neste ponto de nossa discussão, uma nova possibilidade de investigação

histórica surge como fazendo parte do elenco de mudanças epistemológicas que

acompanharam a emergência da Nova História Cultural. Estamos nos referindo ao

aparecimento da Micro-História. É nela, pois, que muitos historiadores da Nova

História Cultural, sentiram-se bastante a vontade para realizar suas pesquisas (como é

o caso do próprio Ginzburg, anteriormente citado).

Vejamos alguns aspectos de seu nascedouro. Segundo Vainfas (2002, p. 68):

o surgimento da Micro-História tem a ver com o debate intelectual e

historiográfico das décadas de 1970 e 1980. Tem a ver, também, com a questão da

crise do paradigma marxista e de outros modelos de história totalizante e com a

solução das mentalidades, que cedo se mostrou inconsistente no plano estritamente

teórico-metodológico.

Dessa forma, as finalidades da Micro-História movem-se no campo das

críticas à história das mentalidades (vejam a coincidência com a Nova História

Cultural), não deixando-se confundir com elas. Mas a pergunta mais importante que

devemos fazer é: onde a Micro-História contribui com a Nova História Cultural?

Do ponto de vista metodológico, a Micro-História avança nas pesquisas

historiográficas por romper com a prática calcada na retórica e na estética. O trabalho

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da micro-história tem se centralizado na busca de uma descrição mais realista

do comportamento humano, empregando um modelo de ação que possa dar voz

a personagens que, de outra maneira, ficariam no esquecimento. Segundo Levi

(1992, p. 136), a micro-história possui, portanto, um papel muito específico dentro da

chamada Nova História Cultural: "refutar o relativismo, o irracionalismo e a redução do

trabalho do historiador a uma atividade puramente retórica que interprete os textos e

não os próprios acontecimentos."

Outro historiador que nos alerta para a importância da Micro-História é Luís

Reznick (2002, p. 3), para quem:

O espaço local, alçado em categoria central de análise, constitui uma nova

possibilidade de estudo no quadro das interdependências entre agentes e fatores

determinantes de experiências históricas eleitas pela lupa do historiador. Nessa nova

concepção, cada aparente detalhe, insignificante para um olhar apressado ou na

busca exclusiva dos grandes contornos, adquire valor e significado na rede de

relações plurais de seus múltiplos elementos constitutivos.

Dessa forma, o historiador de orientação micro-histórica, amparado pelos

conceitos da Nova História Cultural discutidos anteriormente, pode "enxergar"

acontecimentos, fatos que a historiografia tradicional não "enxerga" e trazer à tona

dados que estavam adormecidos. Portanto, sua análise é mais criteriosa, justa e

democrática. Ainda segundo o pensamento de Reznick (2002, p. 3):

Ao eleger o local como circunscrição de análise, como escala própria de

observação, não abandonamos as margens (...), as normas, que, regra geral,

ultrapassam o espaço local ou circunscrições reduzidas. A escrita da história local

costura ambientes intelectuais, ações políticas, processos econômicos que envolvem

comunidades regionais, nacionais e globais. Sendo assim, o exercício historiográfico

incide na descrição dos mecanismos de apropriação — adaptação, resposta e criação

— às normas que ultrapassam as comunidades locais.

Dessa forma, é possível afirmar, conforme Levi (1992, p. 139), que "o princípio

unificador de toda pesquisa micro-histórica é a crença em que a observação

microscópica revelará fatores previamente não observados", o que não

aconteceria numa abordagem tradicional. A descrição micro-histórica serve para

registrar uma série de acontecimentos ou fatos significativos que, de outra forma,

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seriam imperceptíveis e que, no entanto, podem ser interpretados por sua inserção

num contexto mais amplo, ou seja, na trama do discurso cultural.