A Missao Niemeyer

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1. Aigumas características da economia brasileira durante a década de 20; 2. As crises do café e de Wall Street e a economia brasileira; 3. A Missão Niemeyer; 4. Uma visão critica da abordagem "revisionista" à política econômica do Governo Provisório. Marcelo de Paiva Abreu** * Este artigo é uma versão revista do original mimeografado, publicado em inglês pelo Centro de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Cambridge como Working Papers n. 10. O autor, seguindo a tradição, ressalta que as .opiniões aqui expressas são de sua exclusiva responsabilidade. ** Estudante graduado de Clare Hall na Faculdade de Economia e Política da Universidade de Cambridge e membro do quadro técnico do Instituto de Planejamento Econômico e Social, Rio de Janeiro. R. Adm. Emp., Rio de Janeiro, O objetivo deste artigo é o estudo das origens, atividades e recomendações da missão financei- ra de Sir Otto Niemeyer no Brasil, em 1931. Esta missão foi importante tanto pela suposta in- fluência de suas recomendações sobre as deci- sões de política econômico-financeira durante os anos iniciais do regime Vargas, quanto como marco das relações financeiras anglo-brasileiras. Especial atenção será dedicada ao estudo da relação entre as recomendações da missão e as políticas realmente seguidas pelo governo bra- sileiro, pois a maioria das contribuições ao es- tudo da história econômica do período, publica- das recentemente, sugere que as políticas adota- das pelo Governo Provisório fOl'am "ortodoxas", contrariando, portanto, as conclusão da análise tradicional. Este artigo está dividido em quatro partes. A primeira trata de algumas das características mais relevantes da economia brasileira antes de 1929 e das atividades das missões precursoras de Montagu (1924) e D'Abernon (1929). Na se- gunda parte é considerado o impacto da depres- são sobre a economia brasileira. Na terceira, a análise concentra-se -no exame das atividades e recomendações da Missão Niemeyer, e na parte final discute-se em que medida as recomenda- ções da missão influenciaram as decisões rela- tivas à política fiscal do Governo Provisório. Essa parte inclui uma crítica aos argumentos revisionistas referentes à "ortodoxia" da políti- ca fiscal sob o governo Vargas - que seria res- ponsável pelo desempenho insatisfatório da economia nos primeiros anos da década de 30 - e à ausência de um viés pró-industrial na política econômica antes de 1934. O uso de fontes primárias oficiais limitou-se aos documentos do Foreign Office, depositados no Public Record Office em Londres. A destrui- ção dos arquivos anteriores a 1939 da Corpora- tion oi Foreign Bondholders e.;a política restri- tiva adotada por N.M. Rothschild & Sons, em relação ao acesso a seus arquivos, impediram o uso de documentação relevante. Não foram uti- lizados materiais provenientes de arquivos bra- sileiros ou norte-americanos. O uso quase ex- clusivo de fontes britânicas teve como resultado a ênfase no estudo das relações econômico-fi- nanceiras anglo-brasíleíras.' ' 1. ALGUMAS' CARACTERíSTICAS DA ECONOMIA BRASILEIRA DURANTE A DÉCADA DE 20 2 Uma característica marcante da economia bra- sileira antes da depressão era a sua dependência de substancial entrada de divisas associada à emissão de empréstimos públicos no mercado fi- nanceiro ínternacíonal." Entretanto, como po- de ser visto na tabela 1, a entrada líquida desses capitais foi positiva apenas durante a primeira década do século e no período imediatamente anterior à depressão. 14(4) : 7-28, jul./ago. 1974 A missão Niemeyer

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1. Aigumas características daeconomia brasileira

durante a década de 20;2. As crises do café e de

Wall Street e aeconomia brasileira;

3. A Missão Niemeyer;4. Uma visão critica da

abordagem "revisionista" àpolítica econômica do

Governo Provisório.

Marcelo de Paiva Abreu**

* Este artigo é uma versãorevista do original

mimeografado, publicado eminglês pelo Centro de Estudos

Latino-Americanos daUniversidade de Cambridgecomo Working Papers n. 10.

O autor, seguindo a tradição,ressalta que as .opiniões aqui

expressas são de suaexclusiva responsabilidade.

** Estudante graduado de ClareHall na Faculdade de Economia e

Política da Universidade deCambridge e membro do quadro

técnico do Instituto dePlanejamento Econômico e

Social, Rio de Janeiro.

R. Adm. Emp., Rio de Janeiro,

O objetivo deste artigo é o estudo das origens,atividades e recomendações da missão financei-ra de Sir Otto Niemeyer no Brasil, em 1931. Estamissão foi importante tanto pela suposta in-fluência de suas recomendações sobre as deci-sões de política econômico-financeira duranteos anos iniciais do regime Vargas, quanto comomarco das relações financeiras anglo-brasileiras.Especial atenção será dedicada ao estudo darelação entre as recomendações da missão e aspolíticas realmente seguidas pelo governo bra-sileiro, pois a maioria das contribuições ao es-tudo da história econômica do período, publica-das recentemente, sugere que as políticas adota-das pelo Governo Provisório fOl'am "ortodoxas",contrariando, portanto, as conclusão da análisetradicional.

Este artigo está dividido em quatro partes. Aprimeira trata de algumas das característicasmais relevantes da economia brasileira antes de1929 e das atividades das missões precursorasde Montagu (1924) e D'Abernon (1929). Na se-gunda parte é considerado o impacto da depres-são sobre a economia brasileira. Na terceira, aanálise concentra-se -no exame das atividades erecomendações da Missão Niemeyer, e na partefinal discute-se em que medida as recomenda-ções da missão influenciaram as decisões rela-tivas à política fiscal do Governo Provisório.Essa parte inclui uma crítica aos argumentosrevisionistas referentes à "ortodoxia" da políti-ca fiscal sob o governo Vargas - que seria res-ponsável pelo desempenho insatisfatório daeconomia nos primeiros anos da década de 30- e à ausência de um viés pró-industrial napolítica econômica antes de 1934.

O uso de fontes primárias oficiais limitou-seaos documentos do Foreign Office, depositadosno Public Record Office em Londres. A destrui-ção dos arquivos anteriores a 1939 da Corpora-tion oi Foreign Bondholders e.;a política restri-tiva adotada por N.M. Rothschild & Sons, emrelação ao acesso a seus arquivos, impediram ouso de documentação relevante. Não foram uti-lizados materiais provenientes de arquivos bra-sileiros ou norte-americanos. O uso quase ex-clusivo de fontes britânicas teve como resultadoa ênfase no estudo das relações econômico-fi-nanceiras anglo-brasíleíras.' '

1. ALGUMAS' CARACTERíSTICAS DAECONOMIA BRASILEIRADURANTE A DÉCADA DE 202

Uma característica marcante da economia bra-sileira antes da depressão era a sua dependênciade substancial entrada de divisas associada àemissão de empréstimos públicos no mercado fi-nanceiro ínternacíonal." Entretanto, como po-de ser visto na tabela 1, a entrada líquida dessescapitais foi positiva apenas durante a primeiradécada do século e no período imediatamenteanterior à depressão.

14(4) : 7-28, jul./ago. 1974

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As "disponibilidades cambiais" resultado dasoma dos saldos da balança comercial e da en-trada líquida de capitais relativa à dívida públi-ca, deveriam - se adicionadas à entrada de ca-pitais estrangeiros investidos diretamente noBrasil- - corresponder, grosso modo, à contra-partida dos pagamentos relativos à remessa delucros e dividendos, remessas de imigrantes, etc.Os saldos da balança comercial, entretanto, nãoapenas não aumentaram desde o início do sécu-lo, mas decresceram sensivelmente depois de1925, implicando modificação da composiçãodas "disponibilidades cambiais". A tendênciadecrescente dos saldos da balança comercial foicompensada por considerável aumento da emis-são líquida (de comissões e outras despesas) deempréstimos público entre 1926 e 1928.

O exame dos dados relevantes sugere que opróprio pagamento da divida pública externa jáexistente constituía razão suficiente para aemissão de novos empréstimos, em vista da in-capacidade demonstrada pela economia em ge-rar excedentes apropriados da balança comer-cial. Essa situação agravou-se no final da dé-cada com o reinício do pagamento em 1927 doserviço dos empréstimos incluídos no fundingloan de 1914, implicando pressões adicionaispara o aumento do influxo de divisas associadoà emissão de empréstimos públicos no exterior.

Os sucessivos esquemas de "valorização" docafé, em geral, dependiam também da emissãode empréstimos públicos brasileiros no exterior,cujo serviço era assegurado pela arrecadaçãode imposto-ouro sobre as exportações, que se

Tabela 1Serviço de dívida pública externa, "saldos da balança comercial" e "disponibilidades camblals"em milhões de libras esterlinas, 1891-95 a 1931*

Serviço Emissão "Saldo da Entrada líquida "Disponibili- Serviçoda dívida líquida de novos balança de capitais dades cambiais" da dívidapública empréstimos comercial" relativa à como proporçãoexterna dívida pública das "entradas

líquidas totais"em %

(A) (B) (O) (D)= (B)-(A) (E)= (C)-(D) (F)= (A)/[(B) -(C»)

1891-1895** 1,8 1,8 3,7 3,7 32,71896-1900 2,4 2,3 3,9 - 0,1 3,8 38,71901-1905 2,9 6,6 14,7 3,7 18,4 13,61906-1910 8,5 11,0 16,9 2,5 19,4 30,5H111-1915 11,2 10,7 11,6 - 0,5 11,1 50,21916-1920 10,2 0,6 15,8 - 9,6 6,2 62,21921-1925 9,4 7,5 15,2 - 1,9 13,3 41,41926-1929 14,3 18,9 9,6 4,6 14,2 50,21925 10,2 3,0 18,4 - 7,2 11,2 47,71926 11,6 25,8 14,4 14,2 28,6 28,91927 13,3 24,0 9,1 10,7 19,8 40,21928 16,9 23,5 6,7 6,6 13,3 56,01929 17,3 2,5 8,1 -14,8 - 6,7 163,21930 19,7 18,0 12,1 - 1,7 10,5 65,41931 20,4 18,4*" 23,7 - 2,0 21,7 48,41932 6,8 20,7 - 6,8 13,9 32,9

Fontes: Anuifrio EstaUshro do Brasil, 191,7. Rio de Janeiro, 1948; Finança. do Brasil. Uni4o, .stados • muniCípios, i938. Rio de Janeiro, 1938 e Fi-nanças do Brasil vol. XiX, Rio de Janeiro, 1955.* Por "saldo da balança comercial" entende-se aqui a diferença entre exportações F'OB e importações CIF. O resultado é menos ambíguo do que pc-deria parecer à primeira vista, pois a participaçi10 brasileira na oferta de serviços de transporte, seguros, etc. pode ser considerada desprez!vel duranteeste período. Pagamentos relativos à diferença entre importações CIF e importações FOIl variaram entre 11,9% e 13,.'í% do valor CIF para os anosnurmais atingindo 25,1% em 1917. O uso da definiçi10 normal de saldo da balança comercial implicaria. portanto, a obtenção de valores relativamentemaiores para 08 períodoa incluindo anos de guerra.** Valores r-sé-Iios de 1891-1895 e 1926-1929.••• Terceiro [undinç loan.

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supunha incidir basicamente sobre os consu-midores, em vista da baixa elasticidade-preçoda demanda por café. A solução temporária dasdífículdades causadas pela retenção da grandesafra cafeeira de 1927-28, pela emissão de umempréstimos internacional, constitui um exem-plo típico da importância do mercado financeirointernacional para assegurar a implementaçãosatisfatória da política cafeeira adotada pelogoverno brasileiro. A estreita dependência entreo sucesso da política de valorização e a conjun-tura financeira internacional foi encoberta até1928 pela superabundância de capitais em bus-

Revista de Administração de Empresas

ca de aplicação nos principais centros finan-ceiros.

Em vista da importância da entrada de ca-pitais estrangeiros, sob a forma tanto de em-préstimos públicos como de capital de "risco",para o runcíonamento satisfatório da economiabrasileira antes da depressão, torna-se necessá-rio o exame mais detalhado das característicasrundamentaís desses movimentos de capitais.

O investimento total britânico no Brasil au-mentou modestamente entre 1914 e 1930 -cerca de f: 27 milhões - enquanto o investi-mento norte-americano - que era de apenas

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~ 10,3 milhões em 1914 - aumentou cerca de~ 110 milhões durante o mesmo período. Naverdade, pode-se dizer que o aumento do in-vestimento estrangeiro total durante o períodoem questão foi conseqüência do notável aumen-to da entrada de capitais norte-americanos, en-quanto que o investimento total europeu decres-cia ligeiramente e earacterízava-se por impor-tantes modificações estruturais. Em 1930, entre-tanto, o investimento britânico total no Brasilainda correspondia a mais que o dobro do in-vestimento, total norte-americano.

Tabela 2Investimento nominal estrangeiro no Brasil,1914 e 1930, em milhões de libras esterlinas

1914 19ao

Grtt-Bretanhadiretotítulos

federaisestaduais e municipaiscafé

$54,3125,2129,190,638,5*

$81,6118,6163,0101,735,525,8

E8tados Unidosdiretotítulos

federaisestaduais e municipaiscafé

10,310,3

1$0,443,876,6ao, 139,37,2

França (francos-ouro e papel)diretotítulos

federaisestaduais e municipais

1$,4103,080,422,612,99,7**

12,410,22,2

Ouiroe paieee europeusdiretotítulos

café

30,030,0

80,9800 ***0;90,9

495,3242,4252,9142,077,033,9

Totaldiretotítulos

federaisestaduais e municipaiscafé

397,6245,9151,7103,548,2

Fontee: United Nations. op, cit., p, 17; Rippy, J. F. op. cit., passim; UnitedStates Department of Commerce. A new estimate o/ American Joreian in-.e.tment8 abroad. W••.•hington, 1931; Finanças do Brasil. Vários anos; eStock e"",hanue lIearbook. Vários anos.* Exclui os empréstimos de Belo Horizonte 1905 e Distrito Federal 1904.Inclui as debêntures da Cia. Cantereire como empréstimos de São Paulo.O montante em circulação de alguns empréstimos foi estimado com base eminformações sobre o seu serviço e a circulação em 31.12.1911.** Ohtido como resíduo, utilizando dados de United Nations, op. cit.;dados comparados com informações relativas à circulação em 1911, levandoem consideração as emissões entre 1911 e 1914.••• Inclui investimentos privados franceses. A estimativa é quase umaadívínhação ; parece, entretanto, mais razoável que 08 I 150 milhões suge-ridos em Normano, J. F., Evoluç40 econ6mica do Bra sil. São Paulo. 1939p. 281, pois é diffcil acreditar Que o investimento privado combinado dosEstados Unidos e da Grã-Bretanha correepondeese a apenas 50% do inves-timento privado estrangeiro no Brasil em 193C.

Apesar de o investimento total britânico ha-ver aumentado entre 1914 e 1930, o investimen-to direto britânico declinou cerca de ~ 7 milhõesdurante esse período.' O investimento privado

norte-americano - que aumentou cerca de~ 34 milhões - conseqüentemente correspondia,em 1930, a aproximadamente 20% do investi-mento estrangeiro direto no Brasil comparadoa menos de 5% em 1914. O investimento privadobritânico concentrava-se, em 1930, em estradasde ferro e serviços públicos; o capital norte-americano, por sua vez era relativamente maisimportante em novos campos de atividade, taiscomo indústria manufatureira, derivados de pe-tróleo e comércio, além de serviços públicos. 6

É evidente, entretanto, que a entrada de ca-pitais tanto britânicos quanto norte-america-nos, durante o período 1914-1930, resultou fun-damentalmente de movimentos de capitais pú-blicos que corresponderam a mais de 80 % daentrada total de capital dessas duas origens du-rante o período em estudo.

O fato de em 1930 o investimento britânicoainda corresponder a mais do dobro do investi-mento norte-americano é de importância crucialpara a compreensão da rivalidade anglo-ameri-cana no Brasil durante a década dos 30. En-quanto os norte-americanos tenderam a adotaruma política relativamente conciliatória emsuas negociações financeiras com o Brasil, e aenrijecer sua posição quando se tratava de ne-gociações comerciais, a Grã-Bretanha pareceuconvencer-se da inevitabilidade do declínio desua importância comercial no mercado brasi-leiro - linha consistente com os acordos de pre-ferência comercial em vigor a partir da con-ferência de Ottawa em 1932 - tentando maxi-mizar as transferências financeiras origináriasdo Brasíl."

E.'!ltremeados do século XIX e 1907, se al-guns empréstimos não-federais de menor im-portância forem excetuados, a Casa Rothschildmonopolizou a emissão de empréstimos públicosbrasileiros no mercado financeiro internacional.Suas dúvidas iniciais a respeito do sucesso doesquema de valorização em 1907 permitirem quebanqueiros, operando fora de Londres, partici-passem do lançamento de importantes emprés-timos brasíleíros.'

A posição de dominância da Grã-Bretanhanesse terreno, entretanto, não foi ameaçada an-tes do término da guerra de 1914-1918. Entre1918 e 1930 a emissão de empréstimos brasilei-ros federais relacionados à valorização do caféem Londres somou ~ 32,5 milhões, enquanto queempréstimos das mesmas categorias. colocados.em Nova York somaram ~ 43,5 milhões. A de-terioração relativa da posição britânica no casode empréstimos estaduais e municipais foi aindamais notável, pois as emissões em Londres fo-ram de ~ 21,8 milhões comparadas a ~ 43 mi-lhões em Nova York.8

De um ponto de vista muito especial, entre-tanto, a contribuição financeira britânica foidecisiva, pois em várias ocasiões os esforços bra-sileiros para captar recursos em Nova York, pa-ra financiar a acumulação de estoques de café,foram frustrados pela interferência do governo

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amerícano com base no argumento de que a"valorização do café feria a legislação antitrustenorte-americana e a única alternativa aberta aogoverno brasileiro havia sido lançar emprésti-mos em Londres.v A contribuição britânica aofinanciamento da retenção de café foi, de fato,consideravelmente maior do que a norte-ameri-cana, ~ 23,8 milhões comparados a ~ 7,2 mi-lhões.

Em 1930 o total do investimento público es-trangeiro no Brasil era de ~ 252,9 milhões: 103milhões correspondendo a empréstimos em li-bras, 76,6 milhões a empréstimos em dólares eo resíduo, quase integralmente, a empréstimosem francos franceses. Se os empréstimos rela-cionados ao café são excluídos, o influxo de ca-pital público estrangeiro entre o fim da guerrade 1914-1918 e 1930 concentrou-se em aplica-ções não-geradoras de divisas. Os empréstimosrelacionados à valorização do café, pode-se ar-gumentar, contribuíram para um aumento dovalor das exportações na medida em que permi-tiram a manutenção dos preços de café a ní-veis relativamente altos.

O período entre 1914 e o início da depressãomarcou também uma mudança decisiva na im-portância relativa da Grã-Bretanha e dos Esta-dos Unidos no comércio com o Brasil. As con-dições que caracterizaram o período de guerrae reconstrução possibilitaram um râpido cres-cimento da participação dos Estados Unidos nomercado brasileiro, às expensas dos tradicio-nais fornecedores europeus, 10

A Grã-Bretanha, apesar do declinio de suaimportância como fornecedora do mercado bra-sileiro, aumentou consideravelmente seu tradi-cional saldo na balança comercial com o Brasil,pois a queda no valor de suas exportações parao Brasil foi mais do que compensada pela que-da no valor de suas importações do Brasil. Oaumento substancial das exportações dos Es-

tados Unidos para o Brasil somado à relativaestabUidade das exportações brasileiras paraesse país, implicaram considerâvel redução dosaldo na balança comercial que o Brasil manti-nha tradicionalmente com o primeiro. O pa-drão triangular que caracterizava as relaçõescomerciais do Brasil sofreu, portanto, modifica-ções sensíveis - não, porém, fundamentais -com a emergência dessas novas tendências apósa eclosão da guerra de 1914-1918.11

Antes da guerra, pagamentos relacionados aoserviço de capitais estrangeiros investidos noBrasil, bem como de serviços tais como fretes eseguros, fluíam praticamente apenas entre oBrasil e a Grã-Bretanha em vista do amplopredomínio britânico em relação ao suprimentode capitais e transporte marítimo no mercadobrasileiro. Enquanto o fluxo de pagamentos defretes e seguros era nosentido Brasil - Grã-Bretanha, o fluxo financeiro liquido relativo aempréstimos públicos era favorâvel ao Brasil.

Entre o final da guerra e a depressão, os pa-gamentos financeiros entre o Brasil e os Esta-dos Unidos adquiriram importância crescente etenderam a somar-se ao saldo da balança co-mercial brasileira com os Estados Unidos emvista da rápida expansão dos investimentosnorte-americanos no Brasil, enquanto o saldolíquido relativo a empréstimos públicos contraí-dos em libras tornou-se possivelmente favorâvelà Grã-Bretanha. A relação triangular (incluin-do pagamentos comerciais e financeiros) entreo Brasil, os Estados Unidos e a Grã-Bretanha,que caracterizava as relações econômicas ín-ternacionais do Brasil no período anterior àguerra, apresentava-se assim, durante a décadade 20, de forma ainda mais pronunciada."

A dependência crescente do Brasil de umaentrada considerâvel de capitais públicos es-trangeiros aumentava a vulnerabUidade do go-verno brasileiro a pressões políticas por parte

Tabela 3Origem e destino das importações e exportações brasileiras, médias qüinqüenais, 1901-1905 a1926-1930, em %

1901-1905 1906-1910 1911-1915 1916-1920 1921-1925 1926-1930

10Importações

Grã-Bretanha 28,3 28,5 25,2 22,4 25,8 20,1Estados Unidos 11,5 12,4 17,4 48,7 27,7 28,0Alemanha 12,0 15,3 15,1 2,0 12,2 12.0França 8,7 9,3 8,6 5,4 6,9 5,9Argentina 10,8 9.5 8,8 14,8 13,3 11,4Outros países 28,7 25,0 24,9 6,7 14,1 22,6

Beportaçõe«.

Grã-Bretanha 16,8 17,5 13,2 10,2 6,7 4,8Estados Unidos 42,7 36,7 37,4 45,8 45,4 44,7Alemanha 15,0 15,5 11,1 1,8 7,4 9,6França 8,7 10,0 9,9 16,6 ·12,9 9,6Argentina 2,6 3,6 4,4 8,2 6,3 6,2Outros países 14,2 16,7 24,0 17,4 21,3 25,1

Fonu: Anuário E.tatúlico do Brasil. 19$9-1940. Rio de Janeiro. 1941. p. 1366-74.

Beviata de AdminutTaçáo de Empreaaa

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de interesses envolvidos na emissão de novosempréstimos. Essa vulnerabilidade era especial",mente evidente no caso dos empréstimos reque-ridos para as operações de "valorização" cafeei-ra. A posição de barganha do Brasil que era, dequalquer maneira, fraca no caso dos EstadosUnidos - em vista do volume das importaçõesamericanas de café - e poderia ser razoável nocaso da Grã-Bretanha - em vista do saldo fa-vorável do comércio britânico com o Brasil -enfraqueceu-se ainda mais, em particular, nasegunda metade da década de 20.

As nações credoras, na verdade, não hesita-ram em tentar obter concessões quando se tra-tava de considerar a possibilidade de concederempréstimos' ao Brasil. A evidência disponívelconfirma que chantagem política era algo queocorria tanto em Londres quanto em outrosmercados fínanceíros." Em 1926, por exemplo,quando o governo brasileiro tentou obter umempréstimo em Londres, as negociações fracas-saram em vista da oposição do Foreign ottice.Esta oposição devia-se à condenação britânicada posição adotada pelo Brasil na Liga das Na-ções 'em relação à admissão da Alemanha, comdireito a assento permanente no Conselho, pri-vilégiopleiteado em vão pelo Brasil desde a fun-dação da Liga, A crise havia resultado na saídado Brasil da Liga das Nações,>

A posição adotada por Sir Austen Chamber-lain, Secretário de Estado no Foreign Office,consistia em que "não gostaria de aparecercomo responsável pelo bloqueio da concessão doempréstimo, mas não ficaria satisfeito se o Bra-sil obtivesse algo da City neste momento"." ACasa Rothschild, informada de que sua colabo-ração no lançamento de um empréstimo brasi-leiro não seria vista com bons olhos pelo ForeignOffice, insistiu em que a posição deveria ser re-considerada, pois era provável que seus associa-dos norte-americanos concedessem o emprésti-mo sozinhos, o que seria prejudicial aos interes-ses britânicos no Brasil."

A recusa' de Sir Austen Chamberlain foi en-fática: " ... é somente em casos excepcionaisque o Foreign Office intervém proprj,o motu emcasos como esse e eu não pensei que esse casorequeresse minha intervenção voluntária: jáque a Casa Rothschild pede a minha opinião,sou obrigado a dizer que a atuação do Brasilem Genebra não foi conducente à promoçãoda paz, que penso ser o interesse primordial (dapolítica externa) britânica e, especialmente, ointeresse primordial da City de Londres; que,no momento, não há indicações que o Brasilmodificará sua atitude, .. ; ... a emissão de umempréstimo no momento seria considerada co-mo perdão ou mesmo aprovação da atitude bra-sileira e , .. não posso encorajá-la. Isso deve sercomunicado oralmente, e não por escrito, à Ca-sa Rothschild. Pode acrescentar-se que, em vis-ta do fato de que as condições oferecidas porLondres são sempre ... mais favoráveis do queas oferecidas em Nova York, penso que o Brasil

voltará de bom grado a servir-se do mercado deLondres quando o mercado de Londres estiverdisposto a atender suas necessidades financei-ras"."

Alfred de Rothschild, sabendo do veto deChamberlain, prometeu "respeitar seus desejoslealmente" e que ao comunicar a decisão ao go-verno brasileiro, a Casa Rothschild teria o cui-dado de encontrar uma fórmula que evitassequalquer referência ao Foreign otttce. 18

Este exemplo não é um caso isolado de pres-sões políticas relacionadas à negociação de em-préstimos brasileiros em Londres. Em 1924, oembaixador britânico no Brasil propunha que"antes que consintamos em conceder o emprés-timo de que o Brasil obviamente necessita ...(o governo brasileiro) deverá reconhecer as van-tagens que sempre obteve, relacionadas à nossaajuda (sic) ", tratando de maneira adequada ocapital (privado) britânico investido no país,>

No final da década, entretanto, mesmo os ra-dicais do Foreign Oflice reconheciam que "eracada vez mais óbvio... que o mercado finan-ceiro de Wall Street estava sempre preparado aemprestar. .. e que o velho argumento no qualtantas representações se haviam baseado nopassado, isto é, que capital britânico não seriainvestido a menos que algum problema especí-fico fosse solucionado, estava perdendo gradual-mente sua força"."

O fato de o Brasil depender de um fluxo con-tínuo de capitais estrangeiros oferecia justifi-cativa convincente para a visita de missões como objetivo - raramente explícito - de avaliara capacidade de pagamento do país e recomen-dar a implementação de políticas que assegu-rassem o pagamento regular do serviço da dí-vida externa .. ~ importante enfatizar que esseera em geral o objetivo real de tais missões, enão, como era comumente alegado pelo governobrasileiro e pelas casas bancárias interessadas,a recomendação de políticas que visavam a ace-leração do desenvolvimento econômico do país.As missões financeiras mais importantes quevisitaram o Brasil antes da guerra de 1939-1945eram geralmente originárias de Londres. OsEstados Unidos não recorreram tão intensa-mente a esse instrumento clássico de controlefinanceiro, possivelmente devido à relativa ir-responsabilidade de Wall Street durante a dé-cada de 20, bem como porque apenas duranteessa década os seus interesses financeiros noBrasil haviam aumentado consíderavelmente."

Como fim de analisar as atividades da missãofinanceira de 1931, não como um fato isoladonas relações anglo-brasileiras, mas como episó-dio de uma série contínua de tentativas britâ-nicas no sentido de influenciar a formulação depolítica econômica, é importante examinar ra-pidamente as atividades das missões que prece-deram a Missão Niemeyer: a Missão Montaguem 1923-1924,e a Missão D'Abernon em 1929.

A Missão Montagu, tal como a Missão Nie-meyer, tinha como objetivo avaliar a capacidade

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de pagamento do Brasil e a situação financeirado país. Ambas foram convidadas a visitar opaís como resultado de pressões dos Rothschild,depois de o governo brasileiro haver manifestadosua intenção de contrair novos empréstimos in-ternacionais. A Missão D'Abernon, por outro la-do, tinha objetivo distinto. A preocupação bá-sica, nesse caso, era com problemas de naturezacomercial e não com a capacidade de pagamen-to da economia. Além disso, seu interesse porproblemas brasileiros parece haver sido secun-dário em relação às importantes negociações co-merciais com a Argentina.

A Missão Montagu foi organizada devido àrelutância dos Rothschild em envolver-seno lan-çamento de um empréstimo de ~ 25 milhões aogoverno" federal, sem informações adicionaissobre a situação financeira do país.22 A CasaRothschild a pedido do governo brasileiro pro-videnciou a publicação de um estranho comu-nicado na imprensa britânica explicando osmotivos da visita da missão: "O governo brasi-leiro, desejando implementar. .. um plano ge-ral de restauração financeira... organizou avisita ao Brasil de pessoas eminentes da indús-tria, das finanças, da economia e da literatura(britânica), tendo em vista que o conhecimentodo país (Brasil) por eles. .. resulte em aplica-ção mais livre do capital inglês e conseqüente-mente prosperidade da república"." Os termosde referência fornecidos à missão foram maisexplícitos: "Com a finalidade de acalmar a opi-nião pública no Brasil, o governo anunciaráoficialmente que convidou uma missão ... paraelaborar um estudo confidencial das condiçõeseconômicas e financeiras do país, possibilitandoa elaboração de um plano detalhado do investi-mento de capitais ingleses na exploração dasriquezas do país. .. O propósito real da missãoé fornecer informações que permitam aos ban-queiros ... decidir se será possível colaborar como governo brasileiro". 24

A opinião do Foreign Oftice era a de que asatividades da missão no Brasil não deviam res-tringir-se aos termos de referência. A visita damissão era considerada como mais uma oportu-nidade para pressionar o governo brasileiro pa-ra que tomasse providências no sentido de so-lucionar problemas relativos ao tratamento su-postamente inadequado de diversos interessesbritânicos no Brasil. Montagu - ao contráriode Niemeyer em 1931 - recusou-se a "lutar emfavor de qualquer companhia específica", ale-gando que tais gestões conflitariam com a suaposição de técnico de problemas rínanceíroa."

As principais recomendações do relatório damissão, incluídas na versão para consumo pú-blico, foram.:

a) o orçamento deveria ser equilibrado e, paraatingir-se esse objetivo, a administração orça-mentária deveria ser aperfeiçoada; o númerode funcionários públicos deveria ser reduzido eos salários aumentados para evitar-se corrução;

Revista de Administração de Empresas

b) O governo deveria vender algumas de suaspropriedades tais como ferrovias, empresas denavegação e o Banco do Brasil, com o fimde reduzir os seus encargos financeiros; a so-lução considerada ideal, do ponto de vista daaplicação de capitais britânicos no Brasil, sefaria em colaboração com capitais públicos eprivados brasileiros;c) não deveria ser permitido que qualquer pre-conceito resultasse em discriminação contra ocapital estrangeiro em vista de sua importânciapara o desenvolvimento econômico do pais;d) deveria ser organizada uma comissão mista(pública e privada) para estabelecer o nivel dastarifas ferroviárias - possibilitando, assim, asolução de problemas que constituíam fonte defreqüentes atritos entre interesses brasileiros ebritânicos;e) criticava-se a política governamental relati-va à "valorização" do café e ao minério deferro.26

As reações à visita da missão foram contra-ditórias. O embaixador britânico pensava que"uma prova da natural simpatia brasileira emrelação à Inglaterra é a relativa satisfação coma qual a missão financeira britânica foi rece-bida; é dificil acreditar que tal ocorresse emqualquer outro país"." De outro lado, a procla-mação dos "revolucionários" paulistas em julhode 1924 fazia referência explícita ao fato de queo governo federal havia aceito intrusão vergo-nhosa de estrangeiros nos assuntos internos dopais e publicado um relatório contendo insi-nuações a respeito da honestidade brasileiracomo documento oficia1.28

As considerações de Montagu sobre a capaci-dade de pagamento do Brasil impediram que osRothschild concedessem novo empréstimo aoBrasil. As razões são, contudo, desconhecidas,pois foram incluídas apenas no relatório priva-do que Montagu preparou para os banqueiros..A preocupação fundamental da Missão

D'Abernon em 1929 era estabelecer negociaçõescomerciais com o governo brasileiro, tendo comoobjetivo conter o sensível declínio do comércioanglo-brasileiro. D'Abernon chegou a um acor-do verbal com o governo brasileiro segundo oqual, em troca de algumas concessões, o gover-no britânico consideraria a possibilidade de re-visão do nível da tarifa que incidia sobre o café.As concessões brasileiras seriam: a) o LloydBrasileiro encomendaria navios a estaleiros bri-tânicos no valor de ~ 3 milhões e, no futuro,seria concedida prioridade - a preços iguais -à indústria britânica de construção naval; b)reembolso de tarifas pagas com relação a car-vão utilizado pelas companhias de navegação eisenção de certas taxas portuárias; c) ratifica-ção do contrato de 1926 com a Rio Improve-ments Company, o qual implicaria encomendasà indústria britânica no valor de 2 750000;

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d) modificações na legislação brasileira coma finalidade de evitar a ocorrência de falênciasfraudulentas. 29 -

Washington Luís assinou um decreto aumen-tando a subvenção federal ao Lloyd Brasileiro,removendo assim um dos obstáculos principaisà encomenda de navios, mas recusou-se a fazerqualquer outra concessão a menos que o gover-no britânico se comprometesse, em termos maisexplícitos, a eliminar a taxação sobre o café. aoO Foreign Office pressionou para que algumadecisão fosse tomada, mas as autoridades finan-ceiras recusaram-se a ir além da insistência nofato de que havia alguma possibilidade de seeliminarem, em futuro próximo, todas as tarifassobre produtos alimentares. Na verdade, a tari-fa sobre café não foi alterada pelo orçamentode 1930,o que levou o governo brasileiro a acre-ditar que havia sido deliberadamente enganadopor D'Abernon. 31 Isso tende a confirmar que aGrã-Bretanha atribuía prioridade relativamentebaixa à recuperação de sua posição no comérciobrasileiro, se comparada a outros objetivos -especialmente os de natureza financeira - desua política global em relação ao Brasil.

2. AS CRISES DO CAFÉ E DE WALLSTREETE A ECONOMIABRASILEIRA

A política econômica brasileira antes de 1930limitava-se, quase exclusivamente, à "valoriza-cão" do café e à estabilização da taxa cambial.Tanto objetivos quanto instrumentos de políti-ca econômica permaneceram inalterados a par-tir da primeira década do século, como resulta-do do contínuo quase-monopólio do poder polí-tico por parte da oligarquia cafeeira. Enquantoa política de "valorização" assegurava a manu-tenção dos preços internacionais do café a níveisconsiderados "remuneradores", a estabilizaçãoda taxa cambial - a níveis depreciados em re-lação aos vigentes no mercado cambial antes daestabilização - impedia o declínio da renda emmoeda nacional dos cafeicultores que resultariada valorização do mil-réis em relação à libra es-terlina. Como foi notado anteriormente, osrecursos necessários à operação do esquema decontrole de preços de café eram geralmente su-pridos pela emíssão de empréstimos no mer-cado financeiro internacional.

Apesar das dificuldades relacionadas à reten-ção da safra deI927-28, as .autoridades encarre-gadas da "valorização" obtiveram novo finan-ciamento no mercado internacional, sendo suatarefa facilitada, no ano seguinte, pela granderedução no volume da safra de 1928-29,causadapelo natural esgotamento das plantações. Nofinal da década de 20, o setor cafeeiro gozavade grande prosperidade, cuja continuidade pa-recia ser assegurada pela política de "valoriza-ção"."

As autoridades encarregadas da retenção deestoques de café, entretanto, além da sua inca-

pacidade de exercer controle eficiente sobre aárea cultivada, cometeram um erro grave emrelação aos métodos adotados para o financia-mento da grande safra de 1927-28.Ao invés dese financiar a produção à base dos recursos re-queridos pelos produtores para custear seus gas-tos correntes, decidiu-se que os adiantamentosaos produtores seriam baseados no valor comer-cial oferecido como garantia. Essa decisão resul-tou em expansão substancial da área cultivadae no desenvolvimento especulativo das ativida-des comerciais induzido pelo brusco aumentoda liquidez do sistema. O resultado dessa expan-são da área cultivada só se fez,sentir depois de1932, mas implicou considerável agravamentodas dificuldades causadas pelos excedentes deprodução durante a década de 30.~a

A floração da safra de 1929-30,em setembrode 1928, indicou que, ao contrário do que seantecipava, a safra seria ainda maior do que asafra de 1927-28e que apenas uma severa geada- similar à de 1918 - impediria o colapso doesquema de retenção de estoques de café, poisera duvidoso que o governo de São Paulo con-seguisse obter empréstimos no mercado inter-nacional suficientes para absorver a produçãoexcedente.

A geada não ocorreu e a safra de 1929-30foia maior da história cafeeira do Brasil. O Insti-tuto do Café de São Paulo foJ incapaz de obterrecursos suficientes para retirar a produção domercado, seja no país seja no exterior. Os mer-cados financeiros internacionais estavam desor-ganizados, pois os recursos existentes eramatraídos pelo boom em Wall Street e a políticade Montagu Norman de bloquear a emissão deempréstimos em Londres através de moral sua-sion ainda operava." Washington Luís recusou-se a empenhar recursos federais, provavelmenteavaliando incorretamente a gravidade da situa-ção. O preço do café começou a cair, quando "nasessão da manhã do dia 11 de outubro, na Bol-sa de Santos, o corretor ... do Instituto sentou-se em seu lugar e não fez nenhum lance". a"Nofinal do ano o preço estava abaixo de 15 centa-vos de dólar a libra-peso (Santos 4) comparadoa 22,5 centavos antes da crise.

O ponto importante a assinalar é que o co-lapso dos esforços de defesa do preço do cafénão foi uma conseqüência direta da crise deWall Street. A queda do preço do café coincidiucom os primeiros dias de pânico no mercadonova-íorquíno - na verdade, o dia 11 de ou-tubro precedeu de duas semanas a "quinta-feira negra". O colapso da política de "valoriza-ção", contudo, não resultou da crise financeirade 1929, mas de ocorrência contemporânea deuma safra recorde - cujo volume já era previ-sível ao final de 1928- e da impossibilidade deobter financiamentos internacionais, que eraconseqüência do boom, e não da crise de WallStreet. Depois do final de outubro, essas origens,independentes' da crise do café, foram obscure-cidas pelas conseqüências da crise financeira

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Missão Niemeyer

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norte-americana no mercado de matérias-pri-mas.

De qualquer modo, é ~ificil ~cr~ditar q~e,mesmo se a conjuntura tínanceíra íntemaeío-nal não se houvesse modificado desfavoravel-mente, o rápido aumento dos estoques de c!l-fénão se houvesse refletido em crescente relutan-cia por parte dos banqueiros. estrangeiro~ emcontinuar a financiar as atividades relacíona-das à defesa do café.

O governo de São Paulo conseguiu obter emabril de 1930 um empréstimo de ~ 20 milhõesem Londres e Nova York - o único empréstimoestrangeiro lançado em Londres em 1930. O re-sultado líquido desse empréstimo foi, entretan-to, de apenas ~ 8,5 milhões, pois o esta~o t~hainúmeros débitos de curto prazo a líquídar.Esse montante, evidentemente, não era sufi-ciente para resolver o impasse uma vez q~e :eo-dia custear a estocagem de apenas 8,5 milhõesde sacas de café. :i6

A brusca queda nos preços do café somada adecisão de Washington Luis em manter a pari-dade cambial do mil-réis, e à interrupção quasecompleta da entrada de capital estrangeiro oca-sionou rápida erosão das reservas brasileiras deouro e divisas. Vargas acusou o governo depostode haver malbaratado ~ 26,5 milhões paramanter a taxa de câmbio. A embaixada britânicaestimava que ~ 20 milhões haviam sido remeti-das em 1930. Em qualquer caso, as reservas quesomavam ~ 31,1 milhões em setembro de 1929caíram a 14,1 milhões em agosto de 1930 e desa-pareceram totalmente no inicio de 1931. 37

A gravidade da crise econômica foi, obviamen-te, uma razão importante para a queda de Was-hington Luís em outubro de 1930. O golpe foi en-tretanto, uma surpresa completa para os Esta-dos Unidos e não era previsto pelos interessesbrítânícos." A evasão de ouro e divisas que ca-racterizou o último ano do governo de Washing-ton Luis continuou sob Vargas. O Governo Pro-visório foi obrigado a remeter ~ 7,6 milhões adi-cionais e o Banco do Brasil, que já estava comum descoberto de ~ 6,5 milhões no começo de1931, foi forçado a obter um empréstimo a curtoprazo dos Rothschild com a garantia do gover-no federal.

O esgotamento das reservas indicava que oBrasil não conseguiria saldar seus compromissosinternacionais a menos que fosse obtido novoempréstimo extemo.v O exame dos dados refe-rentes ao balanço de pagamentos (ver tabela 1)sugere a inevitabilidade de uma moratória, es-pecialmente se for lembrado que a crise haviainterrompido a entrada de capitais privados es-trangeiros.

s. A MISSAO NIEMEYER

Tal como em 1924, a Casa Rothschild adotoucomo política condicionar a concessão de qual-quer assistência financeira ao Brasil à visita de

Revista de Administração de Empresa.s

perito financeiro britânico com o fim de estu-dar localmente a conjuntura econômica, bemcomo à adoção de suas recomendações relativasà política de estabilização cambial e à criaçãode um banco central. Washington Luis tinhaplena consciência da importância da questã~da organização do ~anco centr~l como pre-condição para a possível conces~a? de um e~:préstimo ao Brasil. 40 Qu~n~o JU~I~Prestes, jaeleito Presidente da Bepúblíea, VISItouo Ban-co da Inglaterra em julho de 1930, foi informa-do de que o Banco enviaria um perito ao Bra-sil se fosse convidado a fazê-lo.Na mesma época,mencionava-se no Brasil como possivel alterna-tiva o nome do Dr. Kammerer, perito norte-americano com considerável experiência latino-americana." É importante deixar claro que, aocontrário do que geralmente se supõe, as "ne-gociações" relativas à visita da missão financei-ra foram iniciadas antes do governo Vargas. 42Montagu Norman, concordou em pedir que SirOtto Niemeyer visitasse o Brasil d~sdeque ? co~-vite fosse "redigido de tal maneira qu~ ímplí-casse na aceitação de qualquer sugestoes quefossem sugeridas". 43 Norman pensava .que a or-ganização do banco central e:a P:OssIv~lmentea mais importante das questoes Incluídas naagenda da missão o que é coerente com os seuscontinuos esforço~ na década de 20 .n~ sentidode que tossem criados bancos centraís m.d~p~n-dentes de interferência governamental, ínícíal-mente na Europa e posteriormente em algunsdos países perírérícos.v

A intenção inicial do governo brasileiro eraindicar uma comissão de peritos composta derepresentantes dos Estados Unidos, Grã-Breta-nha e França. Entretanto; em vista do .estadoinsatisfatório das relações entre o Brasíl e osEstados Unidos imediatamente após a ascensãode Vargas, a idéia de incluir um repr~entant.enorte-americano foi abandonada. Isso impossi-bilitou a inclusão de um representante fran-cês, pois não seria convenient~ explicitar asdivergências com os Estados Unidos ~ E'esult?una indicação de Niémeyer.45 Essa decisão sa~IS-tez o Foreign Office, uma vez que as r~laç~scomerciais da Grã-Bretanha com o Brasíl "naoseriam expostas à mercê de um estrangeíro -o ubiquo Prof. Kammerer, por exemplo, nas pe-gadas de quem, em qualquer país da Américado Sul, pode-se geralmente encontrar um repre-sentante de Messrs. Hallgarten ou qualquer ou-tro dos comerciantes em títulos de segundaclasse de Nova York".46

Esse engano do Foreign Of!u:e, conf~ndindorelações financeiras e comercíais, pe:mIt~ umacompreensão mais clara das verdad~Iras mten-cões da visita de Niemeyer ao Brasíl do que asugerida pela imprensa ou por _comu~ic~dosoücíaís. Niemeyer, na verdad:, ~ao ~e lIm~toua recomendar políticas econômíco-nnanceírasao governo brasilei:o, mas est:ve ta~bém e~-volvido na negociaçao de questoes cuja soluçãobeneficiaria interesses britânicos especificos.47

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De acordo com os seus termos de referência,a Missão Niemeyer deveria recomendar ao go-verno brasileiro as reformas financeiras necessá-rias para que "se assegurasse a manutençãodo equilíbrio orçamentário: a estabilizaçãocambial e a reforma monetâria; a reconstruçãodo Banco do Brasil como um banco central ope-rando independentemente (de interferência go-vernamental); e a limitação do endividamentodireto e indireto do governo federal e dos esta-dos"." Os termos de referência deixam claroque a missão não trataria de selecionar umaentre várias políticas econômicas alternativas,mas limitar-se-ia a considerar as medidas es-pecíficas que deveriam ser adotadas para asse-gurar o sucesso da política econômica consi-derada aceitável pelos interesses britânicos.

Um comunicado oficial publicado em 10 de ja-neiro de 1931 anunciava a visita de Sir Otto aoBrasil. A visita foi apresentada à opinião públicacomo resultado de convite voluntârio do governobrasileiro e, naturalmente, não como pré-condi-ção à eventual concessão de empréstimo britâ-nico ao governo federal. Alguns observadoresmais atentos foram, entretanto, capazes de su-gerir os motivos reais da visita da missão: TheNew York Times denunciou a missão como nãotendo sido convidada pelo governo brasileiro eenviada ao Brasil para defender o interesse dosRothschild. Roberto Simonsen, por outro lado,sugeriu que o objetivo fundamental da missãoseria a reorganização do sistema fiscal de tal for-ma que fosse possível a continuação das remes-sas relativas ao serviço da dívida externa.v

Antes da chegada da missão ao Brasil, tornou-se evidente a existência de contradições entrerepres-entantes de interesses financeiros e co-merciais britânicos no Brasil. Enquanto Ste-phany, representante dos Rothschild no Rio deJaneiro, aprovava a política de redução de im-portações através do aumento de tarifas, siste-ma de licenciamento prévio ou uso compulsóriode matérias-primas produzidas no país - quetenderia a facilitar os pagamentos relativos àdívidá externa - a Câmara Britânica de Co-mércio propunha que a concessão de qualquerempréstimo ao Brasil fosse condicionada à re-vogação de tarifas consideradas proibitivas. 60

Niemeyer verificou ser impossível obter noBrasil estatísticas fidedignas referentes às con-tas públicas, sendo obrigado a aceitar "estatísti-cas que considerava falsificadas ou baseadas emconceitos vagos". O Banco do Brasil foi conside-rado "inútil enquanto banco central, mal orga-nizado, mal administrado e sujeito a mudançasradicais de política a cada mudança de gover-no". Em compensação, o Ministro da Fazenda,Whitaker, "que a princípio estava muito assus-tado e não é um homem (de personalidade) for-te, embora razoável e maleável ... com Niemeyersegurando a sua mão ... parece haver ganho co-ragem e não ficar paralizado de pavor a cadavariação da taxa cambial"."

O relatório da missao, que foi publicado si-multaneamente em Nova York, Paris, Londrese Rio de Janeiro em 25 de julho de 1931, propu-nha basicamente dois grupos de medidas, pois,de acordo com Niemeyer, "a reconstrução finan-ceira do Brasil, como em outros países, requerduas bases: a) a manutenção do equilíbrio or-çamentárío por parte de todas as autoridadespúblicas ... b) a estabilização da moeda ... ".52

Q primeiro conjunto de recomendações consi-derava, portanto, as medidas a adotar para as-segurar o equilíbrio orçamentârio que era "umaquestão fundamental da qual tudo dependia ...pois a menos que (o equilibrío) possa ser alcan-çado e mantido será impossivel evitar pressõesinflacionârias adicionais com conseqüências im-previsíveis sobre os custos internos e a taxacambial"." Essa ênfase na necessidade de equi-librar os orçamentos das entidades públicas foitambém uma característica fundamental dasrecomendações de Niemeyer ao governo austra-liano em 1930, quando visitou o pais como en-viado do Banco da Inglaterra. Também nessecaso, a colaboração financeira de Londres foicondicionada à adoção de uma política orça-mentáría "ortodoxa".54

As principais recomendações do relatório re-ferentes ao orçamento foram:a) evitar a emissão de títulos públicos em paga-mento de dividas de entidades públicas;b) reorganizar os serviços postais, telegrâficose ferrovíáríos com o objetivo de tornâ-los auto-financiâveis;c) aumentar a taxação direta e, oportunamen-te, reduzir o imposto de importação;d) abolir as taxas de exportação incidentes so-bre o comércio interestadual e estabilizar as ta-xas de exportação para outros países;e) manter a unidade do orçamento evitando acriação de fundos vinculados;f) estabelecer novos sistemas de contabilidadee auditoria pública. 55

Niemeyer opunha-se ao aumento do impostode importação, mas tinha consciência de queseria difícil convencer o governo brasileiro a re-duzi-lo, apoiando, portanto, de forma cautelosa,os interesses financeiros britânicos em detri-mento dos interesses comerciais.56 N1emeyersu-punha erroneamente que havia convencido asautoridades brasileiras a não aumentar a par-cela do imposto de importação cobrâvel em ouroque redundaria, como resultado da depreciaçãodo mil-réis, em redução da proteção tarifâria. 51

Essa medida foi eventualmente adotada peloGoverno Provisório em setembro de 1931.

O segundo conjunto de recomendações refe-ria-se "ao estabelecimento de um banco centralem base ortodoxas" bem como à estabilização domil-réis e à questão da dívida externa. Essa par-te do relatório é importante para a compreensão

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correta da política britânica com relação aoBrasil no início da década de 30 e tem sido ne-gligenciada pelos historiadores econômicos in-teressados no estudo do período.

De acordo com o relatório, a "confiança nofuturo do Brasil dependerá basicamente da con-fiança, interna e externa, na estabilidade e efi-ciência do sistema monetário. É para criar e ali-mentar tal confiança que praticamente todos ospaíses mais importantes estabeleceram um sis-tema baseado em um banco central de reservas.Não é suücíente que um país organize um bancocentral. Deve ser um banco central autênticooperando exclusivamente como banco central...e não fundamentalmente como um banco co-mercial cumprindo apenas algumas funções deuma banco central"."

"Qualquer proposta para a organização de umbanco central no Brasil deve imediatamenteconsiderar duas alternativas: a) a conversão doatual Banco do Brasil em um banco central or-todoxo; b) a organização de uma instituiçãocompletamente nova que gozará do monopóliode emissões e cumprirá as demais funções deum banco de reservas. O atual Banco do Brasilé fundamentalmente um banque d'affaires en-volvendo-se em negócios comerciais que não sãoparte das funções de um banco central. Essa li-nha de atividades cumpre papel tão importan-te ... que obviamente não pode ser abolida ...sendo difícil imaginar de que maneira poderiaser transferida para qualquer outro banco co-mercial atualmente em operação. .. será, por-tanto, mais factível transferir as funções debanco central que o Banco do Brasil vem desem-penhando nos últimos anos para uma institui-ção especialmente organizada para esse fim". 59

Niemeyer apresentou uma proposta de esta-tutos do novo banco central como um anexo aoseu relatório. As principais sugestões incluídasnas proposta de estatutos foram as seguintes:a) a emissão fiduciária deveria ser unírícada=e confiada ao banco, sendo conversível à opçãodo banco em ouro ou divisas; o banco manteriauma reserva em ouro ou divisas correspondendoa pelo menos 30% do seu passivo incluindo opapel-moeda em circulação e "sua obrigaçãofundamental será manter estável o valor do pa-pel-moeda em termos de ouro"." A despeito daadoção do padrão-ouro "não é necessário oumesmo desejável que o banco mantenha reser-vas em ouro ... pois a troca de notas por âraitssobre praças que operem com ouro no exterior ...é para todos os efeitos equivalente à troca porouro";"

b) "apesar da necessidade de prover o bancocom capital adequado, o montante ... não deveser excessivo (pois) um capital excessivu requerlucros maiores para distribuição como dividen-dos e tende a criar a tentação de utilizar os fun-dos disponíveis de forma inapropriada ... 60 000contos de réis (aproximadamente 1: 1,1milhõesà taxa de 4,5 dinheiros por mil-réis) seria um

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montante adequado para o capital inicial dobanco de reservas"." O capital seria dividido em300000 ações de 200mil-réis cada uma, de modo"a colocar a subscrição do alcance de quase to-dos os brasíleíros"." As ações seriam subscritasem partes iguais pelo público (acionistas A) epelos bancos comerciais nacionais e estrangei-ros (acionistas B). Os bancos comerciais- subs-creveriam na proporção de seu capital, mas ne-nhum banco deveria subscrever mais do que3,3% do capital do banco de reservas ou 8% doseu próprio capital;"c) a diretoria do banco seria constituída de pre-sidente, vice-presidente e cinco outros diretores.O presidente e o vice-presidente seriam eleitosem assembléia geral de acionistas e teriam suaindicação confirmada pelo Presidente da Repú-blica..Os acionistas A elegeriam três diretoresenquanto os acionistas B elegeriam dois quedeveriam ser banqueiros e não necessariamen-te brasileiros. Nenhum diretor poderia sermembro do Congresso Nacional; AssembléiasEstaduais ou Câmaras de vereadores, pois "operigo de controle ou interferência estatal comas funções do banco central foi amplamentedemonstrado no último quarto de século"; 66

d) o banco responsabilizar-se-ia por todas astransações bancárias e depósitos de entidadespúblicas;e) a maior parcela dos depósitos do banco cor-responderia ao depósito compulsório de 10'X, dopassivo, a menos de 30 dias dos bancos comer-ciais; o banco não pagaria juros sobre quaisquerdepósitos e dedicar-se-ia à compra, venda, des-conto e redesconto de letras e duplicatas de ven-da referentes a transações comerciais a, no má-ximo, 90 dias (120 dias, se relacionadas a ativi-dades agrícolas); 117 o banco poderia adiantarfundos até 90 dias a uma taxa de juros pelo me-nos 2'}I" superior à taxa oficial de desconto, se asoperações fossem garantidas com ouro, títulosfederais negociáveis, letras de câmbio ou dupli-catas; operaria em câmbio, administraria umsistema de compensação; realizaria operaçõesde open market, utilizando títulos federaistransferidos ao banco como pagamento parcialda dívida do governo relativa à transferênciada responsabilidade pela emissão fiduciária doTesouro Nacional;f) "Em vista da natureza inovadora e delicadadas funções (do novo banco )e da conveniênciade manter-se um contato estreito com outrosbancos centrais, o banco de reservas deveria ...utilizar, durante o seu primeiro ano de existên-cia, os serviços de um conselheiro experimen ta-do em atividades de bancos centrais em outrasregiões do mundo";"g) "Antes que o novo banco possa cumprir asfunções de um banco central ortodoxo, O pesoem ouro do mil-réis deverá ser estabelecido porlei" e a "convertibilidade posta em prática omais cedo possível"; 69 se a reserva mínima caís-

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se abaixo de 30%, mas ainda estiver acima de28%, o banco pagaria ao Tesouro 4% ao ano so-bre a deficiência; se a reserva caísse abaixo de28%, o banco pagaria mais 29% sobre a deficiên-cia a cada 2% ou parte da diminuição da reser-va; no caso da reserva cair a menos de 30%, obanco também aumentaria sua taxa mínima dedesconto pelo menos da percentagem que deveriaincidir sobre a deficiência de reservas, tal comodefinida anteriormente; todas as restrições so-bre operações cambiais ainda em vigor quandoa convertibilidade total fosse decretada, deve-riam ser imediatamente abolidas; 70

h) o governo federal liquidaria imediatamentesua dívida relacionada à transferência de res-ponsabilidade pelas notas do Tesouro Nacionalem circulação, parte em divisas, parte em títulosapropriados à condução de operação de -openmarket e parte sob a forma de dívida nominalque não acumularia juros e seria gradativa-mente liquidada por: 1. participação federalnos lucros do banco no caso em que os lucrosdisponíveis para distribuição aos acionistas fos-sem superiores a 12% do capital, depois de sa-tisfeitas as provisões relativas à constituição deum fundo de reserva; 2. lucros relativos àcunhagem e braceagem; 3. vinte mil contosanuais provenientes de verba orçamentária. OBanco do Brasil liquidaria o débito relativo àsua circulação fiduciária por meio de transfe-rência imediata de ativos líquidos apropria-dos; 71

i) dos lucros líquidos anuais do banco 10% se-riam transferidos para um fundo de reserva atéque esse atingisse 20% do capital nominaldo banco; 5% dos lucros líquidos anuais até queo fundo de reserva correspondesse a 50 %do capital; do resíduo, um máximo de 12%ao ano seria distribuído aos acionistas; se hou-vesse algum resíduo após o pagamento de divi-dendo deveria ser dividido em proporções variá-veis, de acordo com o nível do fundo de reservaentre o aumento desse e a redução da dívida dogoverno federal com o banco; 72

j) a alteração dos estatutos não poderia ser pro-posta ao Congresso Nacional sem a aprovaçãode, pelo menos, 2/3 de cada grupo de acionistasdo banco=

O resultado da restrição da participação dosbancos comerciais na subscrição do capital' dobanco central - limitada a 8% do capital decada banco comercial ou 3,3% do capital dobanco central - seria redução da participaçãodo Banco do Brasil, que deveria ser de 5,4%(correspondente à participação do Banco doBrasil no capital agregado dos bancos comer-ciais) para 3,3% .74 A participação reduzida doBanco do Brasil parecia ainda mais estranhase fosse levado em consideração que a sua parti-cipação no capital agregado dos bancos comer-c~aisnão refletia a importância de suas opera-çoes. Em 1930, o Banco do Brasil detinha maisde 23% dos depósitos totais do setor bancário,

enquanto sua participação no capital agregadodos bancos comerciais era de apenas 10,8%.

É difícil encontrar outra razão para a suges-tão dessa cláusula restritiva que não fosse a in-tenção de minimizar a interferência governa-mental na gestão do novo banco, pois o governofederal detinha o controle acionário do Bancodo Brasil. Esta interpretação é consistente coma preferência demonstrada por Niemeyer pelaorganização de um banco totalmente novo, re-jeítando à alternativa de reorganizar o Bancodo Brasil. Esta preocupação em evitar qualquerinterferência governamental - que violaria asregras básicas de boa conduta de um bancocentral formuladas por Montagu Norman - su-gere uma interpretação talvez mais realista pa-ra a ênfase colocada por Niemeyer na necessida-de de o capital do novo banco não ser "excessi-vo", pois um capital inicial "excessivo" implica-ria quase certamente participação substancialdo governo na sua subscrição. As recomendaçõesde Niemeyer nesse terreno indicam que o seuobjetivo era assegurar que 'o futuro banco cen-tral, sendo privado e "cosmopolita", colaboraria1ealmente com os demais bancos centrais deacordo com o modelo "neutro de pressões políti-cas" proposto por Norman."

É interessante assinalar que o temor de Nie-meyer com relação aos perigos de interferênciaexterna na operação do novo banco parecia li-mitar-se ao Banco do Brasil e ao governo brasi-leiro e não incluía ínteresses ligados ao capitalestrangeiro que, por hipótese, não conflitavamcom a política do banco central que melhor ser-visse aos interesses da economia nacional. A re-comendação explicita de que os diretores eleitospelos acionistas B não deveriam ser obrigatoria-mente brasileiros e a sugestão de que fosse con-tratado um perito estrangeiro especialista emassuntos relativos à operação de um banco cen-tral confirmam essa interpretação.

A cláusula que submetia qualquer modifica-ção dos estatutos do banco à aprovação de pelomenos 2/3 de cada grupo de acionistas permitiaque uma pequena minoria de acionistas, contro-lando apenas 1/6 das ações bloqueasse qualquertentativa de aiterá-los."

Em estreita relação com suas recomendaçõesreferentes à estabilização do mil-réis e conse-qüente liberalização das operações cambiais,Niemeyer analisou a situação cambial do mo-mento. Na sua opinião, a preoéupação geral coma taxa cambial era excessiva, pois o saldo da"balança comercial" vinha 'aumentando conti-nuamente desde 1928. Além disso, pensava quea opinião pública brasileira freqüentemente es-quecia-se de levar em consideração as "expor-tações invisíveis" - isto é, a entrada de capitaisestrangeiros - quando analisava o balanço depagamentos: "como é o caso de quase todas asnações em desenvolvimento. .. é normal que oBrasil apresente um balanço de pagamentosdesfavorável que é neeessartamente equilibradopor crescente investimento estrangeiro" . .. Dís-

li'

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to decorria que não era "necessário ser pessimis-ta a respeito do futuro balanço de pagamentos,desde que se persiga uma política de investi-mentos sadia - algo que depende do Brasil".Essa análise é errônea, pois da existência deconsiderável saldo na "balança comercial" de-corre obrigatoriamente que a contribuição lí-quida do capital estrangeiro, do ponto de vistado balanço de pagamentos, seja negativa. Asrecomendações de Niemeyer, portanto, destina-vam-se a tentar assegurar a continuação da en-trada de capitais estrangeiros para que fossepossível manter intatas as remessas de lucros,juros e amortizações relativas ao capital estran-geíro público e privado investido no Brasil. Aoconsiderar a entrada de capitais estrangeiroscomo mera função do bom comportamento dogoverno brasileiro, Niemeyer demonstrou totalfalta de compreensão do verdadeiro impacto dadepressão no movimento internacional de capi-tais."

As recomendações específicas do relatório emrelação à política a ser adotada para assegurara continuação da colaboração de capitais es-trangeíros constituem, na verdade, uma versãoempobrecida das recomendações incluídas norelatório Montagu de 1924e, mais uma vez, nãolevam em conta as profundas alterações ocorri-das na conjuntura econômico-financeira mun-dial desde 1928-29.A recomendação específicamais razoável - que a concessão de emprésti-mos estrangeiros a governos estaduais 'e muni-cipais deveria depender de autorização do go-verno federal - era ociosa, pois em julho de1931nenhum "investidor" estrangeiro em plenogozo de suas faculdades mentais considerariaseriamente a' alternativa de comprar qualquertítulo público brasileiro. Em uma demonstraçãoadicional de sua dificuldade em compreender aseriedade das repercussões da crise sobre a eco-nomia brasileira, Niemeyer sugeriu que, comodemonstração de suas boas intenções, o governobrasileiro deveria regularizar a situação da dí-vida de alguns es.tadose muncípíos que há mui-to não pagavam o serviço de seus empréstimos."Retrospectivamente, essa sugestão parece aindamais desligada da realidade, pois o pagamentodo serviço da maior parte dos empréstimos ex-ternos federais foi suspenso decorridos apenasdois meses após a publicação do relatório.

Talvez pareça difícil compreender como Nie-meyer sentiu-se à vontade para propor a esta-bilização do mil-réis com base em um retornoà convertitiilidade em divisas (gold exchangestandard) quando a situação financeira inter-nacional claramente indicava que tal iniciativaseria inviável. Niemeyer, entretanto, não de-monstrava mais do que a falta de realismo tí-pico da maioria dos círculos financeiros inter-nacionais, em especial britânicos, a respeito docomportamento futuro do sistema monetáriointernacional: o abandono do padrão-ouro pelaGrã-Bretanha, em setembro de 1931, realmentesurpreendeu esses círculos financeiros.

Revista de Administração de Empresas

A inabalável confiança de Niemeyer no pa-drão-ouro implicou sua sugestão, já menciona-da, em que a adoção de um gold exchange stan-dard equivaleria, para todos os efeitos, a um sis-tema genuinamente baseado no padrão-ouro eque não seria mesmo desejável que o novo ban-co central mantivesse as suas reservas em ou-ro.> Os comentários do relatório sobre essaquestão sugerem que a preocupação básica deNiemeyer não parecia ser a solução do problemacambial brasileiro, mas a inclusão do novo ban-co central na comunidade de bancos centraisde tal modo que não houvesse qualquer reper-cussão desfavorável na reserva-ouro dos princi-pais bancos centrais, em especial do Banco daInglaterra.

Para que o banco central a ser criado dispu-sssse de reservas adequadas em divisas, seria ne-cessário providencíar o lançamento de um em-préstimo externo que, na opinião de Niemeyer,deveria ser da ordem de E 1'6milhões. "Com acooperação dos principais países supridores decapital e com um orçamento equilibrado noBrasil, deveria ser possível captar recursos sufi-cientes para um plano de estabilização se o go-verno brasileiro continuar a adotar as medidasnecessárias à reconstrução de suas finanças in-ternas e à manutenção do serviço de seus em-préstimos externos"."

Parece claro que a questão da estabilização domil-réis e da criação do banco central não foi se-riamente considerada pelas autoridades brasi-leiras que percebiam - com realismo aparente-mente maior que o de Niemeyer - que não ha-via possibilidade de se obterem recursos no mer-cado financeiro internacional mesmo para fi-nalidades menos incertas do que a 'estabilizaçãodo mil-réis. O objetivo das autoridades parecehaver sido extrair a aprovação de Niemeyer paraa idéia de obter-se um funding loan. Niemeyer,todavia, opunha-se tenazmente a essa sugestão:o insucesso na negociação do funding loan re-sultou em suspensão unilateral do serviço dadívida externa por parte do Brasil em setembro/outubro de 1931.O funding loan foi eventual-mente negociado ex post em 1932.81

O relatório concluía com algumas observa-ções de caráter geral quanto à excessiva depen-dência da economia brasileira em relação aocafé. A "valorização" do café era criticada e su-geria-se que "após a liquidação da atual posição,nenhuma medida envolvendo responsabilidadegovernamental pela manutenção de preços decafé, ou visando interferir com o processo deajustamento e transferência de capital para ou-tras indústrias que resultaria dessa política, de-vera ser implementada." Essa· recomendação éresultado da crença - detectável a cada passona leitura do relatório - de que apenas umaviolenta deflação poderia evitar um agravamen-to progressivo da crise econômica e ilustra demaneira exemplar a superficialidade dos esfor-ços de Niemeyer em compreender os problemasespecíficos da economia brasileira. Sua absoluta

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falta de familiaridade com as condições do paisnão foi disfarçada por estratagemas tais comofazê-lo visitar fazendas de café em São Paulo,"não com a expectativa de aprender muito, maspara prevenir-se contra críticos que poderiamargumentar que não era possível opinar a res-peito do Brasil sem haver visitado São Paulo einvestigado a posição do problema cateeíro","

A parte substantiva do relatório não diferedas recomendações que NiemeyeI sugeriu emoutros países que visitou, seja antes, seja depoisde sua experiência brasileira. Seu papel é o decatequista pregando o evangelho segundo Mon-tagu Norman, e não o de analista objetivo dosproblemas econômicos dos países que visitou.

As recomendações ortodoxas incluídas no re-latório podem ser contrastadas com os argu-mentos incluídos no relatório MacMillan publi-cado na mesma época. Ali era reconhecido queos países produtores de matérias-primas enfren-tavam uma situação "extremamente difícil" da-do o desequilíbrio entre sua capacidade de pro-dução que havia sido expandida durante ouimediatamente após a guerra de 1914-18 e a evo-lução da demanda, o que acarretava influênciasdepressivas, sobre os preços de exportação e, con-seqüentemente, sobre o balanço de pagamen-to.'I Reconhecia-s-e também o caráter instáveldessas economias (especialmente em relação à"grande fricção" causada pelo processo de ge-ração de divisas necessárias para o pagamentoda dívida pública externa), bem como as defi-ciências da análise tradicional que implicava agarantia de que movimentos espontâneos de ca-pitais seriam suficientes para restabelecer oequílíbrto do sistema a novos preços relativos,no caso de ocorrer alguma "perturbação"."

É clara, também, a falta de confiança nos re-médios ortodoxos como meio de assegurar a re-cuperação das atividades econômicas e, algunsmembros do comitê, sob a influência de J. M.Keynes, assinaram um anexo que se opunha aocorte de salários como solução para a críse."Entretanto, o fato de a maioria dos membros docomitê ter-se recusado a assinar o anexo confir-ma a interpretação de que as recomendações deNiemeyer constituíam reflexo fiel das opiniõessobre política econômica em voga tanto na Cityde Londres quanto nos círculos oficiais britâ-nicos.

É algo surpreendente que as reações da im-prensa brasileira tenham sido, em geral, tão co-medidas. O Jornal do Commercio não conseguiuencontrar nas propostas de Niemeyer nada "quepossa ferir as nossas suscetibilidades". Váriosjornais, entretanto, entre os quais O Globo, ANoite e o próprio Jornal do Commercio, discor..•davam da recomendação segundo a qual o ban-co central devia ser completamente indepen-dente do Banco do Brasil. O Jornal do Commer-cio de 31 de julho de 1931 argumentava que nãoseria recomendável que um banco de importân-cia tão notável devesse permanecer fora do con-trole do governo enquanto o Correio da Manhã

de 29 de julho sugeria que o capital do novobanco parecia insuficiente. Os críticos concen-travam sua atenção sobre a ação precipitada dogoverno ao "aceitar" as recomendações do rela-tório, sem ouvir a opinião púbííca,v

As recomendações do relatório relativas à or-ganização de um banco central independente eortodoxo não foram seguidas, e somente em1945 uma versão primitiva de banco central' veioa ser constituída como departamento do Bancodo Brasil. As recomendações superficiais do re-latório relativas à política cafeeira também nãoforam observadas pelas autoridades que opta-ram por uma política de sustentação de preçosaté 1937. Algumas das recomendações referen-tes a detalhes de política orçamentária foramadotadas. O governo federal adotou como polí- .tica a redução e eventual abolição das taxas deexportação. Porém, tanto essa decisão quantoa limitação da capacidade de endividamentodas autoridades públicas não-federais devem servistas como parte integrante da estratégia po-lítica varguista que se baseava no fortalecimen-to do governo federal e conseqüente enfraqueci-mento das oligarquias políticas estaduais, e jáhaviam sido publicamente mencionadas pelochefe do Governo Provisório antes da chegadade Niemeyer ao Brasil. 88 O governo federal tam-bém esforçou-se em aumentar a importânciarelativa da taxação direta. A arrecadação do im-posto de renda aumentou 145% entre 1930 e1934, comparada a um aumento de 45% na ar-recadação do imposto de consumo e de 34 % naarrecadação do imposto de importação. O declí-nio da importância do imposto de importaçãocomo proporção da arrecadação federal, todavia,resultou da queda no valor e volume das impor-tações ocorridas após 1929, e não da implemen-tação de uma política fiscal que tivesse comoobjetivo reduzir sua importância em relação aototal da receita federal.

É impossível julgar até que ponto as recomen-dações do relatório Niemeyer relativas à políticafiscal foram adotadas pelo Governo Provisóriosem um exame de controvérsia recente sobre aspolíticas econômicas adotadas na primeira me-tade da década de 30. Esse será o objetivo daquarta parte.

194. UMAVISAOCRíTICA DE ABORDAGEM

"REVISIONISTA" A POLíTICAECONôMICA DO GOVERNO PROVISóRIO

A maior parte das pesquisas publicadas recen-temente tende a criticar a interpretação tradi-cional de vários aspectos da política econômicaimplementada nos primeiros anos da adminis-tração de Getúlio Vargas. Uma das .criticas su-gere que a política econômica do Governo Pro-visório foi "ortodoxa", prejudicando, portanto,a recuperação das atividades econômicas a par-tir de 1931. Como conseqüência da inadequaçãoda política econômica - argumentam os revi-sionistas - a economia não se expandiu com a

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aceleração sugerida pela interpretação tradicio-nal. Outros autores criticam a interpretaçãotradicional de que as políticas econômicas deVargas, em geral, beneficiaram QS interesses in-dustriais em detrimento dos interesses agríco-las, em especial da oligarquia careeíra,»

Há uma semelhança clara entre os revisoresda interpretação tradicional da história econô-mica do Brasil durante o primeiro período degoverno de Vargas - especialmente Peláez - eas contribuições de Diaz-Alejandro para a análi-se do caso argentino, se bem que os sofismassejam de melhor linhagem no caso argentino.Ambos classificam como "ortodoxas" e/ou "forada moda" as políticas econômicas adotadas porVargas e Perón, elogiando, em geral implicita-mente, a política econômica da oligarquia no'Brasil antes de 1930 e na Argentina antes de1943.90

De acordo com alguns dos críticos -da inter-pretação tradicional, os líderes do Governo Pro-visório adotaram as recomendações de Niemeyerreferentes à política fiscal porque acreditavamerroneamente que a recuperação das atividadeseconômicas dependia exclusivamente da adoçãodessas recomendações. Nenhum esforço é feitono sentido de avaliar o verdadeiro papel damissão como irtstrumento de' pressão políticacujo objetivo principal - a proteção dos inte-resses de banqueiros e tomadores de títulos bra-sileiros - conflitava com a implementação daspolíticas mais desejáveís do ponto de vista es-tritamente nacional. Deve-se-ia admitir que atática do Governo Provisório - desfrutando depoder político ainda algo precário e enfrentandouma crise de balanço pagamentos extremamen-te séria - não podia ser outra senão tergiver-sar, assegurando banqueiros e tomadores de tí-tulos das boas intenções do Brasil mesmo quenão houvesse, desde o início, intenção ou possi-bilidade de colocar em prática as sugestões deNíemeyer."

A sugestão de que a política fiscal do GovernoProvisório foi "ortodoxa" baseia-se parcialmen-te na análise de pronunciamentos de vários deseus líderes sobre política econômíca,» Bebemque seja verdade que um número incontável dediscursos, relatórios e entrevistas possa sermencionado, defendendo o equilíbrio orçamen-tário, essa abordagem não é particularmente es-clarecedora. Mais importante do que analisar ospronunciamentos de formuladóres de políticaeconômica é analisar que políticas econômicasforam realmente implementadas.

A parte substantiva do argumento baseia-sena análise dos balanços federais. A compatíbllí-zação do argumento revisionista com a evidên-cia apresentada na tabela 4 é extremamenteproblemática.

Além disso, como foi notado por Fishlow, osâeticits - pelo menos a partir de 1933 - resul-taram de despesas reais superiores às despesasorçadas e não de. superestimativas de receitas'orçadas indicando política consciente de ma-

Revista de Administração de Empresas

Tabela 4Brasil. Balanços federais, 1929-1934, em milhõesde mil-réis

Receita Despesa Deficit.(C)/(A)(A) (B) (C)

1929 2 201 2422 221 10,0%1930 1 678 2511 853 50,8%1931 r 753 2 047 294 16,7%1932 1 751 2860 1 109 63,3%1933 2 078 2 392 314 15,1%1934 2520 3050 530 21,0%

Fonte: Anuário Estatístico do Brasil. 1939-1940. Rio de Janeiro, 1941,p, 1268, 1410.

nutenção de dejicits por parte do governo,« Ba-sear-se nos dejicits relativamente "reduzidos" de1931 e 1933 para argumentar que a política fis-cal era ortodoxa, como faz Peláez, é extrema-mente ilusório, pois os consideráveis dejicits de1930 e 1932 impuseram restrições à dimensãodos deficits em anos "normàis". 94 O mesmo au-tor sugere que em 1932 o Governo Provisóriofoi "salvo" da ortodoxia fiscal pela' eclosão dainsurreição paulista que implicou despesa adi-cional da ordem de. 450 milhões de mil-réis. Odeficit de 1932, entretanto, correspondeu a maisdo dobro dessa cifra e o resíduo não parece po-der ser integralmente explicado por um declí-nio da arrecadação. Em qualquer caso, o argu-mento baseia-se no que poderia haver ocorridoem 1932 se a insurreição paulista não houvesseocorrido e, como toda ficção histórica, repousaem fundamentos extremamente frágeis.

A recuperação do nível de atividades é vistapor esse ramo da escola revisionista como resul-tado não de políticas anticíclicas, mas de "fa-tores externos" que proporcionaram grande ex-pansão do saldo na balança comercial. Esse te-ria sido o caso, realmente, se a contração do ní-vel de importações houvesse sido autônoma. Oaumento do saldo na balança comercial resul-tou, entretanto, da introdução de um sistema decontrole cambial que dificultava ou impedia aimportação de determinados produtos com oobjetivo de gerar divisas suficientes para man-ter os pagamentos relativos ao serviço da dívidapública externa e às remessas de lucros e divi-dendos de capitais estrangeiros investidos noBrasil."

Essa linha de argumentos revisionistas éacompanhada, geralmente, da afirmativa deque a interpretação tradicional exagera a im-portância da expansão da economia na décadade 3fr. Tal afirmativa foi posta em dúvida com arecente publicação de índices setoriais e de no-vos índices para o PIB. (ver tabela 5). De rele-vância especial é a constatação de que a produ-cão industrial atingiu o ponto de máximo de-clínín em 1930, crescendo contínua e acelerada-damente até 1935, e que a crise relacionada àdepressão - além de iniciar-se em 1928 - nãofoi mais intensa do que a crise de 1922-26.

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Tabela 5Brasil. índices do PIB e índices setoriais (1939 100)

PIB Agricultura Indüstria Governo Transporte Energia Comércioelétrica

1920 48 59 41 46 37 24 471921 48 61 40 45 35 24 471922 53 63 48 49 38 25 531923 54 64 48 52 45 26 531924 55 64 48 47 52 30 531925 55 62 49 50 59 33 541926 56 62 50 53 56 38 591927 61 68 55 58 63 42 641925 67 76 58 65 67 46 641929 67 77 56 72 71 48 631930 66 79 52 7'} 59 47 601931 65 75 55 7:3 47 47 621932 68 79 56 85 57 48 631933 74 89 61 76 61 53 701934 80 93 68 87 64 60 761935 83 92 77 82 71 6.7 821936 92 100 91 80 78 74 941937 9"5 100 93 90 85 80 961938 98 102 96 96 92 87 981939 100 100 100 100 100 100 100

Fonte: Fishlow op, cito p. 556-9.

A critica à interpretação tradícíonat, negandoque o Governo Provisório haja adotado incons-cientemente -e possivelmente em oposição àssuas reais intenções - uma política anti-reces-siva de importância considerável paraassegu-rar uma retomada relativamente rápida do ní-'vel das atividades econômicas não parece, por-tanto, ser confirmada. pelo exame dos fatos.

A luz desses argumentos, que sugerem que asrecomendações do relatório Niemeyer relativasà política fiscal não foram adotadas pelo gover-no brasileiro, a Missão Niemeyer deve ser con-siderada como um fracasso. Nenhuma de suasrecomendações mais importantes foi adotada, eas recomendações de menor importância que fo-ram adotadas já faziam parte do programa deVargas antes da chegada de Sir Qtto.

Na verdade, mesmo do ponto de vista dos in-teresses estrangeiros e, em particular, britânicosoperando no Brasil, não é claro que a adoção dapolítica deflacionária proposta no relatório fos-se resultar, no curto ou longo prazos, em maiordisponibilidade de divisas para o serviço da dí-vida pública externa, ou remessas de lucros decapital estrangeiro investido diretamente noBrasil. Poderia parecer surpreendente que osinteresses britânicos tenham sido incapazes deretirar vantagens das dificuldades temporáriasentre o Brasil e os Estados Ui1dios,enviando aoBrasil um perito financeiro que fosse incapaz delibertar-se de suas idéias preconcebidas sobreequilíbrio orçamentário e estabilização cambial,procurando entender as peculiaridades da situa-ção enfrentada pela economia brasileira emmeio à crise." Isto, entretanto, suporia erronea-mente uma completa identidade de Interessesentre a Grã-Bretanha, enquanto país, e a City deLondres, especificamente a Casa Rothschild,

que não existia. As sugestões de Niemeyer de-vem ser consideradas como uma tentativa fra-cassada de certos interesses financeiros britâni-cos de assegurar' a continuidade da sua influên-cia ao nível de tomada de decisões de políticaeconômica no Brasil."

Resta analísar as características da situaçãobrasíleíra que. possibilitaram, seja no contextodas relações internacionais do Brasil, seja nocontexto político interno, que Vargas não ado-tasse as medidas propostas no relatório Nie-meyer.

No contexto das relações internacionais doBrasil, isso pode ser explicado pelo enfraqueci-mento da posição de barganha dos interessesbritânicos no Brasil. Uma vez que se tornou cla-ro que o fluxo de capital estrangeiro havia sidointerrompido, a Grã-Bretanqa, ao mesmo tem-pó, perdeu um instrumento clássico de pressãopara extrair concessões do governo brasileiro etornou-se vulnerável à interrupção do paga-mento do serviço de capitais investidos no Bra-sil, pois não podia retaliar na esfera comercialem vista do saldo favorável de seu comércio como Brasil.

Os Estados Unidos, que estavam na posiçãode impor condições ao Brasil, não estiveramenvolvidos nas negociações financeiras de1931-32pelos motivos já expostos e, em todo ca-so, qualquer pressão ameaçando a imposição deacordo bilateral de compensação conflitariacom a política global norte-americana em favorda universalidade de aplicação da cláusula denação mais favorecida.

Não é de aplicação geral o argumento de quea depressão teve como conseqüência importan-te o enfraquecimento do poder de barganha dospaíses credores como resultado do aprofunda-

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mento das rivalidades interimperialistas, que érelevante no caso brasileiro. O caso da Argenti-na, por exemplo, ilustra as limitações do argu-mento, indicando uma possível reação do gover-no brasileiro, dado um clima político e uma es-trutura de comércio exterior dístíntos.w

No contexto político interno, as razões para aatitude do Governo Provisório devem ser procu-radas à raiz de suas bases políticas objetivas,que o forçavam a buscar uma solução internapara a crise que não resultasse em deflação,que na prática resultou em beneficiar relativa-mente os interesses ligados à indústria domés-tica

Esta interpretação é posta em questão aindapor outro ramo.da escola "revisionista". A revis-são nesse caso refere-se à identificação dos gru-pos sociais que apoiaram a insurreição de 1930e cujos interesses foram, conseqüentemente, fa-vorecidos pela política econômica posta em prá-tica pelo novo regíme.«

A evidência apresentada por Fausto provaconclusivamente o caráter não-industrial dosgrupos sociais que apoiaram a insurreição. Aparte mais importante de seu argumento, entre-tanto, põe em dúvida a interpretação tradicio-nal de que a política econômica de Vargas tenhafavorecido os interesses industriais. Do fato deque certos interesses apóiem ou não uma mu-dança inconstitucional de governo, não decorreautomaticamente que seus interesses sejam pro-tegidos ou afetados desfavoravelmente pela no-va ordem. Talvez os interesses industriais fos-sem contrários a Vargas e à Aliança Liberal,mas é provável que tenham obtido do GovernoProvisório tratamento mais generoso do que po-deriam esperar de Júlio Prestes.

Fausto considera problemático afirmar que ogoverno de Vargas haja perseguido coerente-mente a industrialização nos anos iniciais dadécada de 30.100 De maneira ainda mais decisi-1; a do que no caso dos defensores da tese revisio-nista relativa à política fiscal do Governo Pro-visório, .seu argumento repousa na análise dedefinições de política econômica por parte delíderes do governo sob a forma de discursos, en-trevistas, manifestos, etc. Como foi mencionado,esse nível de análise é insatisfatório, pois con-funde intenções com fatos. É fundamental dis-tinguir entre políticas realmente implementa-das e declarações de princípios freqüentementedestinadas a apaziguar a opinião púbüca.t=

A parte substantiva do argumento de Faustorepete afirmações contidas no livro de WarrenDean para mostrar que a adoção simultânea em1931 de cobrança integral dos direitos em ouro,redução de 20% da tarifa geral e 35% para osprodutos importados de países com os quais oBrasil havia assinado acordos comerciais, in-cluindo a cláusula de nação mais favorecida,

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resultou em reduzida proteção à indústria do-méstíca.i= Esta interpretação é equivocada, poisa afirmação de Dean parece originar-se de Ban-deira de Mello que aplica o desconto de 35% ànova tarifa geral e não à antiga tarifa como dis-punha o decreto 20 380 de 8 de setembro de193V°:! A tarifa geral introduzida em 1931 eraaproximadamente 25% superior à tarifa geralanterior. A pauta mínima que seria aplicada aprodutos provenientes de países com os quais oBrasil houvesse assinado acordo incluindo acláusula de nação mais favorecida era aproxi-madamente equivalente à tarifa em vigor atésetembro de 1931. Além disso, as reduções napauta de preços oficiais, base para o cálculo datarifa devida, foram marginais, o que impli-cava, em vista da queda do preço dos produ-tos importados decorrente da crise internacio-nal, um aumento da tarifa como proporção dopreço das importações no Brasil.

De qualquer maneira, é difícil compreender arazão da ênfase colocada por Dean e Fausto noexame do nível da proteção tarifária, pois até1934 operava um sistema de controle cambialque racionava o suprimento de divisas para aimportação de certos bens e que resultava, emmuitos casos, em proteção absoluta da produçãodoméstica desses bens. Pode-se argumentar queisto não era parte de uma política conscientede proteção à indústria nacional, mas do fatode que uma política não seja consciente nãodecorre que seja ínerícas.v-

Düiculdades relativas ao balanço de paga-mentes justificaram - no entender dos formu-ladores de política econômica - a introduçãoem 1931-32 de outras medidas destinadas a li-mitar as importações protegendo, conseqüente-mente, a indústria nacional: mistura compul-sória de carvão, álcool de cana e mandioca acarvão, gasolina e farinha de trigo importados;proíbíção de importação de equipamentos paraindústrias consíderadas em estado de "super-produção (isto é, com grande capacidade ocio-sa), afetando as indústrias de tecidos, calçados,chapéus, açúcar, fósforos e papel; aumento detarüas sobre vários produtos têxteis, louça e be-bidas alcoólícas,

Até mesmo a política cafeeira, que tem sidoapresentada pelos críticos da interpretação tra-dicional como prova da preocupação quase ex-clusiva do Governo Provisório com a agricultu-ra, deve ser considerada não apenas como con-cessão aos interesses cafeeiros, mas como deter-minante fundamental da manutenção da de-manda efetiva dos bens produzidos pela indús-tria doméstica.

A evidência disponível não confirma a inter-pretação que sugere que a política econômica doGoverno Provisório não favoreceu os interessesindustriais. Pelo contrário, tende a confirmar aslinhas gerais· da interpretação tradicional. O

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BIBLIOGRAFIA

Arquivos

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Revista de Administração de Empresas

1 O autor agradece o incentivo e as sugestões de or-dem formal e/ou substantiva de Roberto Abdenur,Alice Abreu, Albert Fishlow, Jorge Fodor, Pedro Ma-lan, Milton da Matta, ·Arturo O'Connell, AntonioCláudio Sochaczewsk1. Brian Van Arkadie e JOhn'Wells, em diferentes etapas da elaboração deste ar-tigo.

2 Nesta versão do artigo resume-se consideravelmen-te a primeira parte, pois a versão em inglês tinha. porobjetivo oferecer uma visão geral da economia brasi-leira na década de 20 e não apenas ressaltar suas ca-racterísticas mais relevantes do ponto de vista do te-ma aqui' abordado.

3 Por empréstimo público entende-se, neste artigo,qualquer empréstimo lançado em moeda estrangeira,geralmente no exterior, em benefício do governo fe-deral brasileiro, de governo estaduais, de municípiosou de autoridades responsáveis pela acumulação deestoques de café.

4 Informações sobre movimento de capitais estran-geiros neste período são éxtremamente insatisfatórias.As estimativas existentes sugerem que remessas de lu-cros e dividendos de capital estrangeiro na década de20 corresponderiam a cerca de ! 14 milhões anual-mente, enquanto remessas de imigrantes seriam daordem de 3-5 milhões. Ver Report submitted to BisExcellency tne President 01 Braza. By The Right Ho-nourable Ec:lw1nS. Montagu, 23.2.24; e League of Na-tions, Balance 01 pa1lments 1933. Geneva, 1934.

5 Ver Rippy, J. F. British investments in Latin .4me-rica, 1822-1949. A case stud1l in tne operations 01 pri-vate enterprtse in retarded regions. Minneapolis, 1959.Em 1929, de acordo com U.S. Departament of Oommer-ee, Bureau of Foreign and .Domestic Commerce, Ame-rican direct fnvestments in lareign countries, 1940,Economic Series n. 20, Washington, 1941, a distribui-cão do investimento direto norte-americano no Brasil-=- que totalizava U$ 194 milhões - era a seguinte: 46milhões na indústria manufatureira, 23 milhões nadistribuição de petróleo, 16 milhões em atividades dedistribuição em geral e 97 milhões em companhias deserviço público. Estimativas. de investimento não de-vem ser consideradas mais do que indicações grosseí-ras da posição real, pois existem problemas sérios tan-to em relação a cada estimativa de per si quanto àsua comparabUidade. Para a discussão de alguns des-ses problemas, ver United Nations, op, cito capo 1.

6 Este tema é tratado com mais detalhe pelo autorem trabalho recente sobre a dívida pública externabrasileira: Brazilian public loreign debt pOlicy, 1931-1943. Oambrtdge, 1973, mímeog.

7 A importância dos empréstimos brasileiros comoproporção dos negócios da Casa Rothschild era subs-tancial. Um cálculo grosseiro indica que os emprésti-mos brasileiros corresponderam a pelo menos 10% dototal das emissões dos Rothschild entre 1824 e 1904.Ver Ayer, J ..A. centuru ot finance, 1804-1904, the Lon-âon House 01 Rothschild. London, 1905.

S A deterioração do balanço de pagamentos britânicofoi o principal motivo de contração do volume de em-préstimos emitidos em Londres, Ver Moggr1dge, D.British monetary policy 1924-1931. The Norman con-quest 01 $ 4,86. Cambridge, 1972~sobre o uso de moralsuasion como instrumento para racionar a emissão deempréstimos estrangeiros em Londres durante a dé-cada de 20.

o Em 1912 uma ação judicial foi impetrada pelo De-partamento de' Justiça norte-americano contra o co-mitê de valorização nos Estados Unidos com base emsuposta violação 'do Sherman Act. Um acordo fora dotribunal resultou em. rápida liquidação dos estoques

Page 19: A Missao Niemeyer

acumulados nos Estados Unidos e na retirada da. açãojudicial. Em 1925o Departamento de Estado informoucertos banqueiros nova-iorquinos que não aprovaria aemissões de empréstimos em beneficio do estado deSão Paulo. Ver Williams, B. H. Economk loreign poZqot the Untted States. Nova York, 1929,p, 94, 400-3.

ro A guerra causou importante reorientação do cO-mércio dos Estados Unidos: entre 1913 e 1925 as im-portações norte-americanas de paises não-europeusaumentaram de 51,8% para 70,7% das importaçõestotais, enquanto que as exportações para países não-europeus passaram de 39,6% para 47% do total dasexportações. Ver Phelps, C. H. The loreign expanstonot American banks. American bank branching abroad.Nova York, 1927,p. 113. Alguns produtos norte-ameri-canos gozaram de tarifa preferencial no Brasil até1923.

li Sobre o triângulo "invertido" que caracterizava asrelações econômicas internacionais da Argentina, verJorge Fodor e Arturo O'Connell, La Argentina y la eco-nomia atlântica en la primera mitad deI síglo xx. De-sarrollo Económico, v. 13, n. 49, abro [un. 1973.Ao con-trário do triângulo argentino - resultado de um saldofavorável na balança comercial com a Grã-Bretanhae um saldo desfavorável no comércio com os EstadosUnidos - o triângulo brasileiro era "bem comporta-do", pois os Estados Unidos tinham um saldo comer-cial favorável com a Grã-Bretanha. A Grã-Bretanhaperdeu, depois da guerra, sua posição de dominânciano Brasil tanto na esfera comercial como na esferafinanceira. '0 único ramo de atividades no qual a suadominância mantinha-se durante a década de 20 eraem transporte marítimo. Em 1926 navios britânicosnas rotas brasileiras transportaram o dobro da tone-lagem transportada por navios alemães, seus concor-rentes mais próximos. Ver Manchester, A. K. Brtttshpreeminence in Brasil. tts rtse and declines a stud71inEuropean expansion. Nova York, 1972 (reprínt) , p, 336.

12 Essa generalização seria possivelmente enfatizadacom inclusão de movimentos de capitais privados, poiso movimento líquido de capitais privados britânicostornou-se desfavorável ao Brasil - e os capitais já in-vestidos no país continuavam a gerar lucros e divi-dendos - enquanto o investimento privado norte-americano estava em franca expansão.

13 Existe, entretanto, considerável literatura suge-rindo que, ao contrário de outros centros financeiros,o mercado de Londres operava totalmente livre depressões políticas. Ver, por exemplo, relatório de Mon-tagu Norman, Governador do Banco da Inglaterra0920-1944), ao Committee ot Treasury do Banco daInglaterra em 1929,citado por Clay, H. Lord Norman.London, 1957,p, 287; e Einzig, P. Th~ fight for iinan-ciaZ supremacy. London, 1931, passim. Para referên-cias à importância de considerações políticas no mer-cado de Nova York, ver nota 9.

14 Brazil. Annual Report 1926. p. 4, F.O. 3.71:11967,A2932/2932/6.

15 Chamberlain para Alston, 1.4.26, F.O. 371:11115,A2075/G.

16 Sir Victor Wellesley, minuta, 19.4.26,F.O. 371:11115,A2075/G.

11 Sir Austen Chamberlain, minuta, 19.4.26, F.O.371:11115,A2075/G.

18 Sir Victor Wellesley, minuta, 20.4.26,F.O. 371:11115,A2075/G.

19 Tilley to Curzon, n. 14, 18.1.24, F.O. 371:9508,A896/70/6.

20 Brazü, Annual Report 1927, p, 5, F.O. 371:12744,A 1687/1687/6.

U Kemmerer, o notório perito norte-americano, visi-tou o Brasil em 1923 em missão sem grande reper-cussão. Ver Seidel, :6.N. America'n. reformers abroad:the Kemmerer Missions in South America, 1923-1931.Journal 01 Economic History, 1972.

22 Brazil, .Annual .Report 1923. p, 9 F.O. 371:9516,A2168/2168/6. A missão elaborou dois' relatórios: umpara consumo popular e outro para consumo exclusi-vo dos Rothschild. A cópia dessa versão nos arquivosdo Foreign ottice parece haver-se extraviado. Vercarta de Lionel de RothschUd para Sir William Tyr-rell, 154.24, F,O. 371:9508, A2427/70/6.

23 Telegrama 62 (R), Foreign Ol/ice para Tilley (Riode Janeiro), 27.11.23, F.O. 371:8430, A7012/818/6.

24 Terms ot reference (Montagu Mission), anexo àcarta de Rothschild para Sperling, 12.12.23, F.O.371:8430, A7294/818/6.

25 Com relação à recusa de Montagu em intercederem fltvor da Great Southern Brazilian Railway verTilley para MacDonald, n.37, 15.2.24., F.O. 371:9513,A1529/270/6. Mencionando as dificuldades relaciona-das ao contrato entre a Rio and São Paulo TelephoneCompany e a Prefeitura do Distrito Federal, Tilleyobservou que, enquanto seus esforços haviam sido emvão, talvez. Montagu pôde interessar-se pelo caso, poísdispunha de "melhores meios de persuasão". Ver Bm-zil, Annual Report 1923. p. 14-5, F.O. 371:9516A2168/2168/6.

21; Montagu op. cito passim.

21 Brazil Annual Report 1923. p. 5., F.O. 371:9516,A2I68/2168/6.

28 Anexo a Tilley para MacDonald, n. 160, 19.7.24,F.O. 371:9511, A4877/87/6.

29 Telegrama 46, Birch para Foreign otttce (D'Aber-non para Board of Trade) , 18.9.29, F.O. 731:13469,A6297/6239/6.

30 Telegrama 52 (R), Birch para Foreign Offici;(D'Abernon para Board of Trade), 20.9.29, F.O.371:13469, A 6296/6239/6 e telegrama 1, D'Abernonpara Board of Trade, 21.9-29, F.O. 371:13469, A6297/6239/6.

31 Hopkins (Treasury) para Subsecretário de Estado,Foreign Olfice, 15.3.30, F.O. 371:14205, A1989/727/6. Ogoverno COlombiano sofreu desaponto similar, poistambém nesse caso o Foreign Office havia asseguradoque a redução da tarifa sobre café seria estudada com"cuidado e simpatia" se o governo colombiano resol-vesse favoravelmente algumas reivindicações de inte-resses britânicos. O governo colombiano, de fato, re-solveu favoravelmente o caso Colombia Mining Co.sem concessão recíproca do governo britânico. Memo-rando de Broad, minutas de Craigie e Kelly, F.O. 25371:15060,A4110/182/6.

32 Sobre política de "valorização" do café, ver espe-eíalmente Rowe, J. W. F. London and Cambridge Eco-nomíc Service, Special Memorandum n. 35, Studies inthe a\rtificial control of raw materiaIs n. 3. BraziZiancottee. London, 1932 Edminster , L. e Wallace, B. tn-ternationaZ control ot raw materials. Washington,1930,capo 5.

33 Ver Rowe. op. cito p. 39-44.

31 Ver Moggridge. op. cito p. 20-19.

35 Ver Rowe, op. cito p, 53.

36 Mesmo assim, a menos de 50% do preço internacio-nal. O governo federal começou a comprar café COI!'recursos internos em 1931.

Missão Nie.meyeT

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37 Lomax para Irving, n. 99, 29.12.30. F.O. 371: 15059,A804/73/6; Vargas, Getúlio. A nova política do Brasil.Rio de Janeiro, 1938, v. 1, p, 183, discurso de 3.10.31; eNormano, J.F. op. cito p. 267.

3S O encarregado de negócios britânico antecipou cor-retamente "a vitória manipulada do Dr. Júlio Prestt;s,seguida de possível derramento de sangue", mas naopensava que uma ruptura definitiva fosse ocorrer.Despachos de embaixadores britânicos anterioresdescreviam Vargas quando Ministro da Fazenda comouma non-entily e um joguete nas mãos de Was-hington Luís. Em 1930,contudo, já se percebia na em-baixada britânica que esse juízo era incorreto. Steelpara Henderson, n. 18, 14.2.30., A1776/106/6 e SteeIpara Henderson, n. 43,27.3.30, A2845/106/6, ambos emF.O. 371: 14199. Ver capítulos 32 e 33 de Bandeira,Moniz, Presença ,dos Estados Unidos no Brasil (Doisséculos de história). Rio de Janeiro, 1973, para umadescrição da reação norte-americana do golpe ..

39 Essa era a opinião de observadores estrangeirostais como os representantes no Rio dos Rothschild ede Lazards .. Ver Lomax para Irving, n. 99, 29.12.3l.F.O. 371:15059, A804/73/6.

.0 Ver memorando de Rothschild de 17.12.30, F.O.371:14206, A8229/2833/6 e tel~rama de WashingtonLuís para Júlio Prestes, 19.6.30citado por Silva, Hélio.1930,a revolução traída. Rio de Janeiro, 1966,p. 840.

Seeds para Henderson, n. 135, 16.9.30, F.O.371: 14206, A6070/2833/6.

26.

<" Esse fato é escamoteado por Whitaker. J. M., emA administração financeira do Governo Provisório de4 de novembro de 1930 a 16 de novembro de t931. SãoPaulo, 1931, p. 55, que afirma explicitamente que o"convite" havia sido iniciativa do Governo Provisório.A parte do livro relativa ao relatório da Missão Nie-meyer é notável tanto pela quantidade de informaçõesincorretas que contém, quanto pela evidente simpatiapelo ponto de vista dos interesses britânicos.

•, Norman para Vansittart, 7.l.31, F.O. 371:14206 ememorando de Rothschild citado na nota 40. Sir OttoNiemeyer era, na época, comptroller do Banco da In-glaterra e diretor do Banco Nacional do Egito, da Vi-ckers-Armstrong e da Agricultural Mortgage Corpora-tion. Havia sido funcionário do Tesouro entre 1906 _primeiro lugar no concurso para o CivU Service noqual J. l\~. Keynes havia obtido o segundo - e 1927.

H " ••. um banco central que seja tão dominado porseu próprio governo, que não tenha independência ouiniciativa, ou mesmo direito a protestar, não pode de-sempenhar o seu papel, seja internamente, seja emcooperação com outros bancos centrais". Citado porSir Henry Clay, op, cito p. 290.Ver na mesma fonte ou-tras referências às idéias de Montagu Norman sobreo funcionamento correto de bancos centrais. Ver tam-bém o capo 2 de Strange, Susan. Sterling anã Britishpolicy a pOlitical study 01 an international currencyin decline. London, 1971.

4" Sir Victor Wellesley, minuta de entrevista com oembaixador da França em Londres, 11.2.31, F.O.37l: 15062, A988/283/6; telegrama 363, Lindsay paraForeign Ol/ice, 25.10.30 e telegrama 546 (R), ForeignOf/ice para Lindsay, 28.10.30,ambos- em F.O. 371: 14201,A6293/106/6. e Brazil, Annual Report 1930. p. 11, F.O.371:15067, Al849/1849/6. Ver também nota 38.

47 Isto ocorreu no caso de:a) dívidas da Cia. COsteira: telegrama 51 (R), FO-reign Olfice para Seeds, 8.4.31, F.O. 371:15067A2221/1809/6.b) dívidas da Central do Brasil: telegrama 71, Seedspara Foreign otttee, 30.7.31. F.O. 371: 15 O6 7,A4682/1547/6.c) interesse da firma britânica Marconi na possívelreorganização dos serviços postais e telegráficos reco-mendada por Niemeyer em seu relatório: telegrama69Seeds para Foreign Of/ice, 22.7.31, A4455/3530/6;teÍegrama 77, Seeds para Foreign ottiee, 18.7.31,A4926/3530/6; telegrama 83, Foreign Oflice paraSeeds, 17.7.31,A4313/3730/6, todos em F.O. 371:15068.

48 The Niemeyer Report to the Brazilian govern-ment. Rio de Janeiro, 4 jul. 1931, (citado em no~posteriores como Report ... ) § 19. Como o autor naoteve acesso a uma cópia da versão brasileira oficial,foi obrigado a utilizar a versão em inglês.

49 The New York Times, citado por Normano, op,cito p. 270; e Simonsen, Roberto. A indústria em laceda economia nacional. São Paulo, 1937, p. 117. Asopiniões de Simonsen podem haver sido influencia-das pelo fato de que era um sócio de Murray &Slmonsen firma que representava os interesses deLazard B~others no Brasil. Essa casa bancária lon-drina manifestou em diversas ocasiões o seu ress~n-timento com relação ao que considerava a conivel!--cía de Niemeyer, relativa ao tratamento. desfavora-vel dos empréstimos nos quais estava ll~teressad~,nas sucessivas negociações destinadas a nxar o m-vel e a distribuição do serviço da dívida pública bra-sileira entre 1931 e 1943. Ver memorando de Lazards,17.6.43, F.O. 371:33661, A5978/473/6.

50 Seeds para Henderson n. 8, 13.l.31, A732/283/6; eLomà.x para Henderson, Overseas Trade BOO), 9.1.31,A1291/283/6, ambos F.O. 371:15062.

5.. Extrato de memorando de Irvingpara Seeds, 4.4.31F.O. 371:15063,A2659/283/6.

5:! Report... § 59

[,~ Report... § 39

54 Ver Schdevin, C.B. Australia and the great de-pressiono A study 01 economic deveZopment andpolicy in the 1920 and 1930. Sydney, 1970, p. 181-3;e o pronunciamento de Sir otto Niemeyer ~a C~n-ferência de Melbourne, jul. e ago. de 1930 incluídoem Shann, E.O.G. & Copland, D.B. The crists inAustralian finance, 1929-31. Sydney, 1931, p. 18-29.

cs Report ... § 49 a 14.

56 ,Ver nota 50.

57 Memorando de Irving, 15.5.31 F.O. 371:15063,A3593/283/6.

58 Report ,«, § 15.

;:9 Report ... § 16.

uo Três tipos de notas circulavam na époçá: nota doBanco do Brasil .•.da Caixa de Estabilização e do Te-souro Nacional.

61 Report ... § 17 e estatutos e notas aos estatutos.,,; Brazil, Annual Report 1930. F.O. .371:15067,A1849/1849/6. 62 Report... notas aos estatutos: art. 37.

Revista de Administração de Empresas

Page 21: A Missao Niemeyer

••a Report ... § 17 (a). Essa justificativa é pratica-mente idêntica à apresentada para limitar o capitaldo Banco de Reservas da índia a 50 milhões de rúpiaspelo Report of the Royal Commission on Indian Cur-rency and Finance 1926, § 91, incluido em BepCJll'tsotCurrency Committees, Calcutta, 1931.

••4 Report... notas aos estatutos, arts. 59 e 69.

••5 Report... estatutos, art. 69 e minuta de decreto,art. 12. No caso de a subscrição pública não cobrir50% do capital inicial do banco, o governo federalsubscreveria o resíduo de ações.

6'" Report... § 18. É interessante comparar essasrecomendações com as de Niemeyer ao governo deNova Zelândia, referentes à criação de um banco dereservas em 1930. A insistência na necessidade degarantir o funcionamento de banco central indepen-dente de qualquer ingerência governamental nãoimpediu que Niemeyer recomendasse que o governa-dor e o vice-governador deveriam ser nomeados peloGovernador-Geral da Nova Zelândia. Niemeyer,portanto, não parecia ser contra a ingerênciade qualquer governo na gestão de bancos cen-trais. As suas propostas foram, de qualquer modo,profundamente modificadas quando o Reserve Bank01 New Zealand Act de 1933 foi aprovado, pois oEstado assegurou o direito de nomear vários dos di-retores. Ver Tocker, A.H. New Zealand Banking andCurrency. The Niemeyer Report, Economic recordo1931 e Sutch W.B. secent economic changes in NewZealand. Wellington, 1936.

67 Letras relativas a atividades agrícolas não pode-riam constítúír mais do que 25% da carteira de letras'nternas.«s Report... § 18.

61) Repori ... 24. Notas aos estatutos, art. 36.

70 Report ... estatutos, arts. 41 e 42; e minuta dedecreto, art. 10.

71 Report... minutas de decreto, arts. 39 a 99.

7:! Report ... estatutos, art. 47.

7a Report... estatutos, art. 53.

74 O capital do Banco do Brasil era de 100000 contosE o capital total do setor bancário de 918000 contosem 1930. Depósitos no Banco do Brasil eram no mes-mo ano de 1331031 contos comparados com 5 731000contos em todo o setor bancário. Anuário Estatísticodo Brasil 1947. p. 225, e Statesman's Year-book 1931.

<fi Ver em Moreau, Emile. Souvenirs d'un gouver-neur de la banque de [rance. Paris, 1954, um inte-ressante relato das contradições entre os principaisbancos centrais.7ü J. M. Whitaker aparentemente não partilhavado temor manifestado por alguns críticos do rela-tório quanto à possibilidade de interferência estran-geira: "os receios de açambarcamento por parte deelementos estrangeiros deviam ser considerados ex-cessivos, diante das cautelas tomadas pelos estatutos,para preveni-los, não só no parcelamento do capitalsocial, como na forma de constituição da Diretoria doBanco". Whitaker, op. cito p. 57-8.'j'j Reporto.. § 25 e tabela 1.7S Report ... § 30.j!) Repori ... notas aos estatutos. art. 37.80 Report ... § 28.81 Ver nota 6.~2 Report ... § 31.

83 Memorando de Irving, São Paulo, 15.5.31, F.O.371:15063, A3593/283/6.

84 No caso do Brasil, estas dificuldades, que haviamsido ao menos parcialmente evitadas com a "valoriza-ção" do café, tornaram-se subitamente visíveis em1929.

85 (MacMillan) Committee on finance and industry,Report. London, 1931, §§ 136-7, 175-8 e 183-5.

80 Id. anexo I, § 52.

87 Anexo a Seeds para Henderson, n. 140, F.O.371:15063,A4981/283/6.

88 Vargas, Getulio. A nova política do Brasil. Rio deJaneiro, 1938. v. 1, p. 93-103, discurso de 23.2.31.

89 Para as várias interpretações revisionistas, verLeff, N. Long-term Brazilian economic development.Jourtuü ot Economic History, 1969; Dean W. The in-dustrialization ot São Paulo, 1880-1945. Austin, 1969;Fausto, B. A revolução de 1930. História e histor~o-grafia. São Paulo, 1970; e vários artigos publicados porPeláez, C.M. na Revista Brasileira de Economia entre1968 e 1972. A interpretação tradicional clássica éapresentada por Furtado, C. Formação econômica doBrasil. Rio de Janeiro, 1963, capo 30-3. Deve-se ressal-tar que as críticas às "revisões" da 'interpretação tra-dicional incluídas nesta parte não pretendem de modoalgum ser completas. Sua inclusão decorre da necessi-dade de demonstrar que o Governo Provisório nãoadotou políticas econômicas ortodoxas, especialmentea partir de 1931, não aceitando, assím.. as recomenda-ções do relatório Niemeyer e de examinar as razõesque determinaram essa decisão.

"" Diaz-Alejandro, C.F.Essays on the economic his-toru ot the Argentine Republic. New Haven, 1970. Pa-ra uma crítica de algumas das teses de Diaz-Alejan-dro, ver Fodor, J. Peron's policies towards agricultu-re and exports, 1946-48; dogmatism or common sen-se?, a sair em D. Rock, ed., Modern Argentina.

91 Durante o primeiro ano do Governo Provisório, ofato de o Ministro da Fazenda ser J. M. Whitaker, li-gado à oligarquia cafeeira paulista e interesses britâ-nicos, está possivelmente relacionado ao caráter niti-damente ortodoxo dos pronunciamentos governamen-tais sobre problemas econômicos. Em um exemplo tí-pico de oportunismo político relacionado às recomen-dações da missão, Aranha, no final de 1933, quando ogoverno pretendia convencer os credores estrangeirosa aceitar redução do serviço contratual da dívida pú-blica externa, desenterrou o cadáver da missão e su-geriu que o Brasil oportunamente adotaria as reco-mendações de Niemeyer. Ver entrevista de OswaldoAranha a A Noite, 27.10.33, mencionada em Seeds eSimon n. 254, 3.11.33. F.O. 371:16551, A8587/670/6.

"" Por exemplo: "manter uma administração de rigo-rosa economia, cortando todas as depesas improduti-vas e suntuárías - único meio eficiente de restauraras nossas finanças e conseguir saldos orçamentáriosreais", discurso de Getúlio Vargas, 3.11.30.A nova po-lítica do BrasiZ, Rio de Janeiro, 1938,V. 1, p. 73; ou en-trevista de Oswaldo Aranha à imprensa em 15.12.31.mencionada em Seeds a Simon, n. 233, 19.12.31, F.O.371: 15805, A573/308/6.

27

!lO Ver Fishlow, A. Orígíns and consequences ofimport substitution in Brazil (prova tipográfica) asair em L. Di Marco, ed., InternationaZ'economics anddevelopment.

94 Ver Peláez, C. A balança comercial, a grande de-pressão e a industrialização brasileira. Revista Brasi-leira de Economia, 1968.

95 Ver Fishlow, A. op, cito p. 529; e tabela 1.

Missão Niemeyer

Page 22: A Missao Niemeyer

96 Se a alternativa de convidar o Dr. Kammerei' emlugar de Niemeyer houvesse ocorrido é improvável quesuas recomendações fossem mais liberais a julgar porsuas atividades em outros países Iatíno-amerícanos.Ver Seidel. op, cito

97 Thompson, do Foreign otttce, demonstrou conside-rável poder de previsão, mas escasso contato com arealidade política brasileira ao comentar, antes queNiemeyer apresentasse seu relatório, que "algum pro-gresso pode ocorrer enquanto Sir Otto Niemeyer esti-ver no Brasil - quando ele partir, entretanto, as au-toridades vão retomar os seus bad old ways, a menosque um perito residente britânico seja nomeado"; mi-nuta, 24.7.31, F.O. 371: 15063, A2659/283/6. A visita deNiemeyer permitiu, entretanto que estabelecesse con-tatos que foram de grande utUldade nas futuras nego-ciações relativas à dívida externa brasileira.

98 No seu relatório de 1933sobre a criação de um ban-co central na Argentina, por exemplo, Niemeyer in-cluiu muitas das suas sugestões relativas ao caso bra-sileiro: ênfase na natureza independente do bancocentral, limitações do direito de voto do Banco de laNación <cujo capital correspondia a mais de 25% docapital total do sistema bancário, mas detinha apenas10% das ações do banco central) e indicação de dire-tores de bancos estrangeiros que operavam na Argen-tina. Estas propostas foram apenas parcialmente mo-dificadas pelo Congresso conservando-se as caracte-rísticas de "banco de banqueiros". Ver The Review otthe River Plate, 7.4.33, p. 13-31; e 29.3.35, p. 16-22.Agradeço a Jorge Fodor por haver chamado minhaatenção para as atividades de Niemeyer na Argenti-na.09 Fausto. Opa citalQO Id. p. 48.101 Compare-se, por exemplo, "rever o sistema tribu-tário, de modo a amparar a produção nacional, aban-donandoo protecionismo dispensado às indústrias ar-tificiais, que não utUlzam matéria-prima do país emais contribuem para encarecer a vida e fomentar ocontrabando", discurso de Getúlio Vargas, 3.11.30, op.cít, p. 73, com: "De outro lado, impõe-se-nos, comomedída de defesa econômíoa, única ao nosso alcance,a redução da importação ... devemos aceitar, comopostulado cívico, o compromisso de ampliar as nossaslavouras e aperfeiçoar as nossas indústrias, de formatal que passe a ser considerado deslize de patriotismoalimentarmo-nos, ou vestirmo-nos com tecidos ou gê-neros importados", discurso de Getúlio Vargas, 23.2.31.op. cito p. 97.

102 Fausto. op, cito p. 48; e Dean. op. cito p. 196.

103 Ver Mello, A. Bandeira de. Política commercial doBrasil. Rio de Janeiro, 1933, p. 100-1, e decreto 20380de 8.9.31.

28 104 A política comercial do Governo Provisório tam-bém é considerada "ortodoxa" por Peláez. Essa suges-tão é surpreendente, pois o autor limita-se a mencio-nar o fato de que, de acordo com a teoria das vanta-gens comparatívas, a distribuição de recursos duranteesse período não foi a mais eficiente possível e que em-pecilhos ao comércio resultaram em declinio de em-prego no exterior e redução "no número e variedadedos bens disponíveis no mercado brasileiro ... Istp é, apolítica comercial do Governo Provisório .foi "ortodo-xa" porque não respeitou os postulados da teoria or-tcdoxaí, Ver Péláez C. As conseqüências eeonômícasda ortodoxia monetáría.. cambial e fiscal no Brasilentre 1889 e 1945, Revista Brasileira de Economia,1971. Seria interessante saber. em que país os formu-ladores da política econômica decidiram não aumen-tar a proteção à indústria doméstica durante a déca-da de 30 para evitar desrespeitar os postulados da teo-ria pura do comércio internacional. Ver Robinson, '1.The new mercantilismo Cambridge, 1966.

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