A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ......

23
7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade. 23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR) GT 9 – Comunidades Tradicionais e Territorialidades A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS Autora: Ana Aline Furtado Soares – Unifor Coautora: Francisca Ilnar de Sousa – Faculdade Ateneu FORTALEZA-CE 2012

Transcript of A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ......

Page 1: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

GT 9 – Comunidades Tradicionais e Territorialidades

A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA

COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS

Autora: Ana Aline Furtado Soares – Unifor

Coautora: Francisca Ilnar de Sousa – Faculdade Ateneu

FORTALEZA-CE

2012

Page 2: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO VIOLAÇÃO DE

DIREITOS HUMANOS.

Ana Aline Furtado Soares – Universidade de Fortaleza1

Francisca Ilnar de Sousa – Faculdade Ateneu2

RESUMO

O presente trabalho objetiva analisar o procedimento de demarcação da Terra Indígena Tapeba, no município de Caucaia no Ceará, em seus aspectos histórico, social, político e jurídico. A primeira reivindicação dos tapebas pelo seu direito à terra ocorreu em 1986 e ainda hoje não foi homologada. Em 2008, o procedimento foi anulado por decisão do Superior Tribunal de Justiça em decorrência do Mandado de Segurança n°5505/DF impetrado pelo município de Caucaia. A morosidade do Estado brasileiro em efetivar os direitos humanos dos tapebas tem trazido graves problemas para a vida desse povo. Para compreender as consequências trazidas por essa postura violadora de direitos realizamos pesquisa de campo que nos permitiu conhecer tanto os entraves jurídicos, políticos econômicos quanto as estratégias utilizadas pelos tapebas para o seu fortalecimento na luta por direitos.

Palavras - chave: Terra indígena Tapeba. Morosidade. Estado brasileiro. Violação. Direitos Humanos.

1 Bacharela em Direito, pela Universidade de Fortaleza. Atua como Advogada Popular junto ao Movimento Indígena no Ceará, através da Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos da Arquidiocese de Fortaleza. Endereço eletrônico: [email protected]

2 Socióloga, Profa. e pesquisadora do Centro de Treinamento e Desenvolvimento (CETREDE) da UFC e da Faculdade Ateneu. Atualmente desenvolve pesquisa financiada pelo CNPq relacionada ao envelhecimento de prostitutas de Fortaleza. Membro do Núcleo de Estudos da Mulher (NEM) da PUC/SP; membro ad hoc do Programa Pró-Equidade de Gênero da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República; membro do Grupo de pesquisa em Direitos Humanos da Universidade de Fortaleza.

Page 3: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO VIOLAÇÃO DE

DIREITOS HUMANOS.

Este trabalho é resultado de uma pesquisa monográfica realizada junto aos Tapeba3,

no ano de 2009, cujo objetivo foi analisar o procedimento de demarcação da Terra Indígena

Tapeba, no município de Caucaia no Ceará, em seus aspectos histórico, social, político e

jurídico. A primeira reivindicação dos Tapeba pelo seu direito a terra ocorreu em 1986 e

ainda hoje não foi homologada. Em 2008, o procedimento foi anulado novamente, por

decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em decorrência do Mandado de Segurança

n°5505/DF impetrado pelo município de Caucaia. A morosidade do Estado brasileiro em

efetivar os direitos humanos dos Tapeba tem trazido graves problemas para a vida desse

povo.

Para compreender as consequências dessa postura violadora de direitos, realizamos

pesquisa de campo que nos permitiu conhecer os entraves jurídicos, político-econômicos,

assim como as estratégias utilizadas pelos Tapeba para o seu fortalecimento na luta por

direitos. Para tanto, realizamos entrevistas com lideranças e pesquisa nos principais jornais

da cidade.

A história da ocupação e invenção do território cearense é marcada por grandes

conflitos entre aqueles que afirmavam ter “descoberto” o Ceará e os povos nativos, há

séculos habitantes desse território. Diversos destes conflitos tiveram como consequência o

completo extermínio de muitas etnias. No entanto, as populações indígenas resistiram e

lutaram por suas terras, logo, por sua sobrevivência.

Nesse contexto de resistências, como não conseguiram efetivar o extermínio completo

dessas populações indígenas, que viveram um longo período de silenciamento étnico, o

Estado cearense utilizou-se de diversas estratégias, dentre elas, o Decreto de 1863, que

afirmava: “Já não existem aqui índios aldeados ou bravios” e posteriormente a historiografia

cuidou da construção dos discursos fundamentando a inexistência indígena neste estado,

que serviram de base para uma política pautada na negação dessas populações.

3 Tapeba é um topônimo indígena oriundo da antiga língua da família Tupi-Guarany, que segundo Barreto Filho (2004), significa Pedra Chata, em referência à existência de uma grande e misteriosa pedra sagrada para o povo que também recebeu o mesmo nome.

Page 4: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

O curioso é que justamente com a promulgação da Lei de Terras, o Ceará foi a

primeira província brasileira a negar oficialmente a existência/presença de índios em seu

território e, como conseqüência, a primeira a promover a apropriação dos territórios

indígenas, conforme apresentação feita por Manuela C. da Cunha (1992 apud RATTS,

1996, p. 213-214) do aviso ministerial datado de 1850, que ordenava o sequestro e a

incorporação das terras indígenas por parte da Província:

Ainda hoje, no Ceará, o discurso da inexistência de presença indígena é muito forte é

também diretriz para a resolução de conflitos fundiários, pois, se não existe indígenas não

há que se falar em terra indígena; e assim vai se configurando um cenário que apresenta

neste estado uma população de aproximadamente 23.000 indígenas e apenas uma terra

indígena homologada.

Na década de 1980, a afirmação de suas identidades étnicas emerge como a principal

estratégia de luta política e de retomada de seus territórios tradicionais. Com o apoio da

Equipe de Assessoria às Comunidades Rurais da Arquidiocese de Fortaleza, a coletividade

dos Tapeba passou a reivindicar sua indianidade e, a partir daí, a retomada de terras para

garantir condições dignas de sobrevivência para seu povo.

Os Tapeba, sua organização social e a luta pela terra.

Os Tapeba estão localizados no município de Caucaia, na Região Metropolitana de

Fortaleza, distribuídos em 13(treze) comunidades, totalizando, segundo dados da Fundação

Nacional de Saúde (FUNASA 2008), uma população de 6.439 indígenas. Sobrevivem da

agricultura, do extrativismo, do artesanato, quando localizados na área rural do município; e

do comércio ambulante, dos pequenos negócios, do trabalho assalariado que tanto surge do

próprio Estado, como por exemplo, os professores indígenas e agentes indígenas de saúde,

quanto da iniciativa privada, algumas vezes – posseiros das terras Tapeba – como, por

exemplo, as cerâmicas, quando localizados no perímetro urbano.

Organizam-se de acordo com a ideia de soberania, para eles, sua organização social

é própria e ocorre de acordo com a definição de direitos e deveres internos, “lutam sempre

para que suas aldeias sejam contempladas nos programas de Estado”, para que seus

direitos possam ser efetivados, e contam, portanto, com a presença de importantes atores

no processo de “articulação do povo em busca de objetivos coletivos e direitos

constitucionais”, esses atores são professores, agentes indígenas de saúde, agentes

indígenas de saneamento. (Weibe Tapeba em entrevista realizada por Costa; Elânia, 2007)

Page 5: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

As bases da atual forma de organização social da/na luta pela terra nos levam a

afirmar sobre o imprescindível papel dos mais velhos que, através da história oral, puderam

repassar aos mais novos outras histórias, outros saberes e práticas, contribuindo para o

fortalecimento dos diferenciais étnicos e para a (re)criação de formas de manuseio dos

recursos naturais existentes na área, utilizando-se de seus conhecimentos e de sua relação

diferenciada com a terra, para dela retirarem o seu sustento.

Podemos perceber as mudanças que vêm ocorrendo ao longo desses anos, como o

aparecimento de novos atores e a articulação destes em torno da luta por direitos de uma

forma mais abrangente, na qual vão sendo pautados pelos Tapeba outros direitos como a

educação, a saúde, a cultura, etc.

Os novos atores são, na sua maioria, jovens que nasceram no processo de afirmação

étnica, portanto, frutos de um processo de luta, no qual os principais atores foram seus pais,

avós, tios e irmãos. São protagonistas de uma luta coletiva, iniciada muito antes de suas

próprias vidas, e somente foi possível pelo importante papel exercido pela memória oral, pelo

repasse dos mais velhos, que segundo Gomes e Vieira Neto (2007), permitiram através de

seus relatos o fortalecimento dos referenciais simbólicos e afetivos dos mais jovens que,

diariamente, vêm construindo seus próprios caminhos de uma forma mais autônoma, criando,

para tanto, suas próprias organizações, como podemos citar a Associação das Comunidades

Indígenas Tapeba (ACITA), responsável por conduzir e mobilizar internamente a luta política

nas aldeias.

No entanto, é preciso percorrer um caminho que antecede ao da atual fase de

organização social, para que possamos compreender como foi se constituindo essa

conjuntura de articulação e mobilização política da/na luta pela terra.

Durante muito tempo, estiveram os Tapeba submetidos à invisibilidade oficial,

permaneceram legalmente desconhecidos e desprotegidos porque não eram reconhecidos

pelo governo estadual, nem pelo órgão oficial indigenista, nem mesmo pela sociedade.

Fruto dessa não proteção, os Tapeba foram vítimas das mais diversas arbitrariedades,

que partiam tanto da polícia quanto dos “supostos” proprietários de terra, de forma que estas

experiências de conflitos, vivenciadas contra inúmeros “proprietários”, contribuíram

diretamente para que o receio de assumir uma identidade indígena, com o passar dos tempos,

fosse sendo alterado e transformado numa luta coletiva para reverter a situação na qual

viviam.

Page 6: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

Para isso, fazia-se necessário modificar a noção pejorativa que se tinha sobre essa

identidade indígena, como algo ruim e desabonador, para a noção de inclusão no conjunto

de direitos específicos. Por exemplo, a proteção do Estado e o direito às terras que

ocupavam, das quais estavam sendo expulsos.

Naquela época, a agricultura e a pesca ficavam prejudicadas porque as terras, muitas

vezes, estavam ocupadas por terceiros, e as lagoas cercadas, de forma que, caso os

indígenas quisessem plantar teriam que arrendar a terra dos posseiros para poder trabalhar

como meeiros, ou se quisessem pescar, seria muito mais difícil o acesso às lagoas.

Viviam em situação de pobreza extrema, conforme veiculação em jornais da época,

foram apresentadas as queixas dos Tapeba sobre a “falta de assistência dos órgãos

responsáveis pela preservação dos costumes e tradição de uma raça quase em extinção no

Brasil” e de estarem “perdendo suas terras desde que, há 20 anos, morreu o líder ou

cacique, ‘Perna de Pau’”. Considerando o fato de ser a reportagem de 1984, percebemos

que a luta dos Tapeba vem de muitos anos, antes mesmo de ser conquistada uma

visibilidade desta. (CENTRO..., 1984, p. 184)

Neste sentido, entendemos e reafirmamos o que Piovesan (1996) afirma acerca dos

direitos humanos como sendo estes, um “paradigma ético que aproxima o direito da moral”.

É exatamente neste mesmo período que os povos indígenas do Brasil lutam para serem

sujeitos possuidores de direitos, o maior direito passa a ser, adotando a terminologia da

Hannah Arendt, “o direito a ter direitos”. Direitos estes, assegurados na Constituição Federal

de 1988, portanto, direitos fundamentais.

Não há, por esse motivo, como separar a caminhada em busca de visibilidade,

reconhecimento, dignidade e respeito aos diferenciais étnicos da busca por melhores

condições de vida, pela efetivação de seus direitos humanos à dignidade humana, à terra, à

saúde, à educação, à comunicação, e como perceberemos, à vida.

Ressalte-se ainda que o baixo padrão de vida e o próprio termo Tapeba foram utilizados

durante muito tempo como estigma, sinal diferenciador entre aquelas pessoas que se

autodenominavam e eram denominadas Tapeba e as demais, de modo que, mais servia para

atribuir uma inferioridade aos Tapeba e justificar a discriminação, do que para dar visibilidade às

suas demandas e necessidades.

O significado que a terra assume para os Tapeba, assim como a ausência da terra e

dos frutos que lhes dão sustento, desperta nessas pessoas um sentimento muito forte de

pertencimento, de proximidade, de modo que a demarcação assume uma dimensão tanto

Page 7: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

objetiva quanto simbólica para estes indivíduos, como podemos observar na entrevista

realizada com Weibe Tapeba em Costa e Elânia (2007, p. 9)

Qual a importância da luta pela demarcação das terras indígenas?

R- A luta pela demarcação das terras indígenas não possui um caráter de apropriação, lutar pela posse da terra nada mais é do que lutar para ter de volta nossa identidade e nossa dignidade. Lutar pela demarcação é reaver nossos valores, é revitalizar nossa concepção de mundo e resgatar nossa estima ferida pela ação materialista. Ter a terra em nossa posse é garantir a devolução de um filho a sua mãe, é reacender um fogo há muito tempo apagado, é fazer brotar numa terra nua a essência e o sagrado, é colher a esperança e a garantia de um mundo melhor, é transformar uma terra descaracterizada numa terra sem males.

O relato de Weibe Tapeba nos leva a ratificar o que afirmou Ramos (1994) sobre o

significado da terra para os povos indígenas, que vai além de um simples meio de

subsistência, pois, representa o suporte da vida social, possui relação direta com os

sistemas de crenças e conhecimento. Considera ainda que a terra não é apenas um recurso

natural – é tão importante quanto este – é um recurso sócio-cultural.

A luta pela terra assume uma dimensão objetiva na medida em que produz resultados

práticos na vida das pessoas, como, por exemplo, a conquista de um direito específico como

a educação, mas também produz uma dimensão simbólica quando fortalece a identidade, e

contribui para o respeito da dignidade.

O direito fundamental do povo Tapeba à terra

O direito à terra, entendida como espaço de vida e liberdade de um grupo humano, é a reivindicação fundamental dos povos indígenas brasileiros e latino-americanos. [...] um povo sem território, ou melhor, sem o seu território, está ameaçado de perder suas referências culturais e, perdida a referência, deixa de ser povo. (SOUZA FILHO, 1998, p. 119-120)

Há muitos séculos que o direito à terra é tema jurídico no Brasil. A legislação brasileira

trata do conceito de direitos indígenas sobre as terras que ocupam desde 1680, ainda com o

instituto do indigenato, o qual tratava destas terras como “originalmente reservadas”, isto é,

as terras pertenciam aos indígenas com base no direito à reserva, que tanto servia para

designar os direitos dos índios às terras que possuíam, quanto para designar “aquelas que o

Poder Público achava melhor para aldear povos indígenas, na idéia de integração cidadã”,

motivo que explica a expressão “reserva indígena”, tão utilizada ainda hoje para se referir às

terras indígenas. (SOUZA FILHO, 1998, p.126).

O fato de estar presente na legislação durante todo esse tempo como tema jurídico

não significa que ocorreu de maneira tranqüila e pacífica, pelo contrário, dificultosas foram

as tentativas de legislar sobre o assunto, e isso é facilmente notado, à medida que

Page 8: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

verificarmos as expressões “reservadas” tão utilizadas para tratar das terras indígenas, bem

como das finalidades atribuídas a elas.

Dessa forma, o direito dos indígenas à terra ficou durante muitos anos invisibilizado,

haja vista o fundado receio por parte dos legisladores em tratar da questão, pois

acreditavam que no direito brasileiro o direito de propriedade não vigorava sobre aquelas

terras.

Os fundamentos constitucionais

Em 1934, foram asseguradas – pela primeira vez – garantias constitucionais sobre

terras indígenas, o que as caracterizou como categoria jurídica, e fundamentou a proteção

da posse de terras, foi quando o indigenato se constitucionalizou. Daí em diante, a situação

jurídica das terras indígenas se manteve, com exceção de 1967, quando os militares

“fizeram incluir” as “terras ocupadas pelos silvícolas” entre os bens da União. Assim, a idéia

jurídica do que seriam as terras indígenas foi ganhando forma de “propriedade pública da

União, posse permanente, intransferível e intocável”. (SOUZA FILHO, 1998)

Para tanto, não consideramos os direitos como meras concessões estatais, mas como

fruto de lutas, conforme afirma Ignacy (1998 apud PIOVESAN, 2005, p. 34):

[...] não se insistirá nunca o bastante sobre o fato de que a ascensão dos direitos é fruto de lutas, que os direitos são conquistados, às vezes, com barricadas, em um processo histórico [...] por meio do qual as necessidades e as aspirações se articulam em reivindicações e em estandartes de luta antes de serem reconhecidos como direito.

Sendo assim, afirmamos que o direito dos povos indígenas à terra, assegurado na

Constituição Federal de 1988, é fruto das lutas políticas das etnias de todo o país, reflexo do

crescente levantar da etnicidade no Brasil, e resultado da tendência mundial de

reconhecimento e proteção dos direitos das minorias étnicas, que desde 1966 já havia

estabelecido através da Convenção n° 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)

orientações sobre o respeito à cultura, usos, costumes, organização tribal e terras

indígenas.

A afirmação dos direitos indígenas à terra como direitos originários no Brasil, só foi

introduzido no nosso ordenamento jurídico com a Constituição de 1988, conforme podemos

verificar no artigo 231 que prevê: “São reconhecidos aos índios sua organização social,

costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que

tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os

seus bens”.

Page 9: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

Como podemos observar, esse dispositivo não traz inovações no sentido da criação

de novas áreas indígenas, apenas reconhece o direito já existente à terra tradicionalmente

ocupada pelos povos indígenas.

Por outro lado, a afirmação desse direito como originário representa a

reconceitualização dos direitos dos povos indígenas, pois, segundo Oliveira (1998), “o direito

dos índios é originário” porque decorre de sua conexão sociocultural com povos pré-

colombianos que aqui habitavam, tal direito não precede do reconhecimento do Estado,

pois, como o próprio nome indica, o reconhecimento se dá de algo já existente, e o seu não

reconhecimento não anula sua condição de direito.

Não resta dúvida de que, tal dispositivo constitucional demonstrou a importância que

teve o movimento indígena organizado para o reconhecimento desses direitos. No entanto,

garantir a inclusão destes no texto constitucional representou apenas um primeiro passo,

diante dos vários outros que seriam dados, pois os interesses políticos, econômicos e

sociais existentes, em relação ao reconhecimento e a demarcação de terras indígenas, são

diferentes e antagônicos, como podemos verificar no descumprimento dos prazos

estabelecidos no art. 67 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da

CF/88, que fixou o prazo de demarcação das terras indígenas em cinco anos.

O direito à terra indígena na Constituição brasileira é um direito sui generis, sendo

competência da União demarcar e proteger, uma vez que essa compõe seu patrimônio. Aos

índios fica assegurada a posse permanente, bem como o usufruto exclusivo das riquezas

naturais nelas existentes, conforme o art. 231 e os parágrafos abaixo citados (BRASIL, 2009

on line):

§ 2º - As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.

[...]

§ 4º - As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.

Conforme Souza Filho (1998), podemos afirmar que foi criada uma situação especial

para as terras indígenas na legislação, pois, a Constituição Federal diferenciou posse e

propriedade, uma vez que esta é pública e estatal, e àquela, privada, mas coletiva, não

identificável individualmente.

A definição de terra indígena, segundo Oliveira (1998), não diz respeito a uma

definição sociológica, mas sim a uma definição jurídica, que se encontra materializada tanto

Page 10: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

na Constituição Federal, quanto na legislação específica – Lei 6.001 de 1973, conhecida

como Estatuto do Índio.

No entanto, vale ressaltar que, esse conceito jurídico de terra indígena decorre da

realidade construída dia-a-dia pelos próprios indígenas, qual seja a ocupação da área pelo

povo indígena fez com que a posse passasse a ser um atributo jurídico, conforme consta na

Constituição brasileira vigente, quando reconhece o direito originário sobre as terras que

tradicionalmente ocupam. (SOUZA FILHO, 1998)

Devemos observar também, de acordo com Souza Filho (1998), que o conceito de

território não se confunde com o conceito de propriedade, tipicamente civilista, uma vez que

território é jurisdição sobre um espaço geográfico, e propriedade da terra é um direito

individual garantido pela jurisdição.

Motivo pelo qual foi instituída a titularidade dessas terras à União como “terras

públicas”, impossibilitando assim qualquer tipo de apropriação individual, além disso, é

vedado ao Estado brasileiro tanto utilizar quanto dispor destas terras, ficando assegurado

tão somente o uso do próprio povo indígena, de acordo com suas tradições e costumes.

O que nos leva a afirmar, com base na própria legislação, que é vedado o exercício do

direito de propriedade dentro das terras indígenas, uma vez que estas não são passíveis de

serem apropriadas por particulares de forma individual, conforme podemos verificar no art.

62, do Estatuto do Índio (BRASIL, 2009, on line):

Art. 62 - Ficam declaradas a nulidade e a extinção dos efeitos jurídicos dos atos de qualquer natureza que tenham por objeto o domínio, a posse ou a ocupação das terras habitadas pelos índios ou comunidades indígenas.

§ 1º. Aplica-se o dispositivo neste artigo às terras que tenham sido desocupadas pelos índios ou comunidades indígenas em virtude de ato ilegítimo de autoridade e particular.

§ 2º. Ninguém terá direito a ação ou indenização contra a União, o órgão de assistência ao índio ou os silvícolas em virtude da nulidade e extinção de que trata este artigo, ou de suas conseqüências econômicas.

Embora a legislação específica assegure a nulidade e extinção dos efeitos jurídicos de

qualquer natureza, que tenham como objeto o domínio, a posse ou a ocupação das terras

habitadas pelas comunidades indígenas, o que ocorre na prática é o oposto: os magistrados

insistem em julgar de acordo com uma tradição civilista, não considerando a situação

especial e diferenciada na qual está inserida a terra indígena.

Ademais, as argumentações utilizadas para o convencimento dos magistrados, em

muitos casos, são retiradas do próprio Estatuto do Índio, que traz algumas nomenclaturas e

Page 11: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

conceitos já ultrapassados, servindo muitas vezes para fundamentar a tese de terceiros não

indígenas, posseiros das terras indígenas, que utilizam a definição do que é ser indígena do

próprio Estatuto, diferenciando indígenas isolados de indígenas em via de integração, como

se seguindo uma ordem hierárquica de acesso à direitos.

Essa diferenciação, no caso dos Tapeba, é muito prejudicial, a situação deles,

conforme Barreto Filho (1994) é diferente, uma vez que “os Tapeba são produto de um

processo histórico de individuação étnica de frações de diversas sociedades indígenas

nativas reunidas na Aldeia de Nossa Senhora dos Prazeres de Caucaia - que deu origem ao

município de mesmo nome, na região metropolitana de Fortaleza”, como já apontado no

primeiro capítulo.

Porém, quando a CF/88 reconhece os direitos originários sobre as terras

tradicionalmente ocupadas e as define respeitando os usos, costumes e tradições dos povos

indígenas, isto é, observando características como a habitação em caráter permanente, a

imprescindibilidade destas para a preservação dos recursos ambientais necessários ao

bem-estar, e à reprodução física e cultural, está determinando que é a ocupação tradicional

o fator que delimita a existência do fenômeno jurídico conhecido como terra indígena.

Com essas mudanças na legislação, os Tapeba, que já estavam mobilizados e

organizados para buscar melhores condições de vida, intensificaram ainda mais suas lutas e

passaram a reivindicar na via legal o seu direito fundamental à terra. E a partir disso, iniciou-se

um diálogo com o Estado através de órgãos oficiais indigenistas, objetivando com isso a

demarcação da Terra Indígena Tapeba.

O procedimento demarcatório da Terra Indígena Tapeba

A demarcação das terras indígenas no Brasil acontece de uma forma bastante peculiar

– lenta e demorada – podendo um procedimento demarcatório passar por várias gerações,

significando ainda, para os povos indígenas, um percurso feito à custa de muito sangue,

suor e resistência.

Desse modo, para entendermos a situação da (não) demarcação da Terra Indígena

Tapeba, faz-se necessário inicialmente definir o que é o procedimento de demarcação, como é

feito e quais suas implicações. Segundo definição da FUNAI, órgão estatal responsável pela

demarcação das terras indígenas, o procedimento de demarcação “é o meio administrativo para

explicitar os limites do território tradicionalmente ocupado pelos povos indígenas”, haja vista que,

expressamente a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 231 caput, afirma o

reconhecimento dos direitos originários dos povos indígenas sobre as terras tradicionalmente

Page 12: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

ocupadas por eles, competindo à União, demarcar, proteger e fazer respeitar todos os seus

bens.

Sendo assim, após a Constituição Federal de 1988, o reconhecimento dos territórios

tradicionalmente ocupados pelos índios ficou explícito no próprio texto constitucional, não

sendo necessário um reconhecimento prévio por parte do Estado, pois as determinações

legais são por si só, suficientes para garanti-lo, independente de sua demarcação física.

Embora, consideremos, assim como Souza Filho (1998), a demarcação como mero

processo administrativo, uma obrigação que o Poder Executivo tem de formalizar e tornar

pública que aquelas são áreas indígenas, obrigação esta que sequer vem sendo cumprida,

pois, passaram-se mais de 20 anos e há, pelo menos, uma centena de casos em que as

áreas já comprovadas como territórios indígenas não tiveram seus processos de demarcação

concluídos.

Por outro lado, não podemos pensar que a ação demarcatória é desnecessária, pois

esta é de fundamental importância e urgência enquanto ato governamental de

reconhecimento, visando a precisar a real extensão da posse indígena a fim de assegurar a

proteção dos limites demarcados e permitir o encaminhamento da questão fundiária

nacional.

Outro aspecto que merece atenção diz respeito à utilização do termo demarcação,

pois, embora seja utilizado como sinônimo do processo de regularização das terras

indígenas, esta é apenas uma das fases administrativas do procedimento, que possui várias

fases, conforme veremos a seguir.

O Decreto 1.775, de 1996, “dispõe sobre o procedimento administrativo de

demarcação das terras indígenas”, (BRASIL, 1996, on line) estabelecendo para tanto, as

fases e os prazos para a demarcação das terras indígenas. As fases estabelecidas são:

identificação e delimitação, demarcação física, homologação e registro de terras indígenas.

O Estudo de Identificação é a primeira fase do procedimento, nela é formado um

Grupo de Trabalho composto por vários técnicos especializados que realizarão um estudo

antropológico de identificação da terra indígena, no qual pesquisarão sobre a história da

etnia, geografia, meio ambiente do local e o levantamento jurídico necessários à

delimitação. Ao final desta pesquisa, será elaborado um relatório para a FUNAI, que deverá

conter toda a caracterização da terra indígena.

Page 13: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

O relatório deverá ser finalizado no prazo determinado na portaria que cria o Grupo de

Trabalho, para em seguida passar por apreciação do Presidente da FUNAI, que publicará o

seu resumo no Diário Oficial da União e do Estado, no prazo de 15 dias, contados da data

do recebimento. Após a publicação deste resumo no Diário, poderão os Estados, Municípios

e demais interessados manifestar-se e apresentar ao órgão federal suas razões instruídas

das provas necessárias para pleitear indenização ou para apontar os possíveis vícios, totais

ou parciais, do relatório. Esta fase de contestações inicia-se desde o início do procedimento

demarcatório até 90 dias após a publicação.

Depois disso, a FUNAI terá um prazo de 60 dias para elaborar um parecer com as

razões e provas apresentadas, e encaminhar juntamente com o respectivo procedimento ao

Ministro de Estado da Justiça, que terá 30 dias para expedir portaria, declarando os limites

da área e determinando a sua demarcação física; solicitar a realização de diligências, ou

seja, a produção de mais provas, a serem cumpridas em mais 90 dias; não aprovar a

identificação, e publicar sua decisão fundamentada no artigo 231, § 1º, da Constituição

Federal.

A Demarcação Física é a segunda fase do procedimento, e inicia-se após o prazo para

a realização das diligências ou depois da expedição da Portaria pelo Ministro da Justiça,

cujos limites indicados no relatório são reconhecidos, e demarcados fisicamente pela

FUNAI. Enquanto isso, o INCRA, órgão federal responsável pela Reforma Agrária,

reassentará com prioridade os ocupantes não índios e indenizará apenas as benfeitorias

dos proprietários, ou seja, as melhorias realizadas no imóvel.

A Homologação é a terceira fase, na qual o Presidente da República homologa, ou seja,

torna válido, o procedimento de demarcação através de decreto. Após este, a terra indígena,

demarcada e homologada, será registrada num Cartório de Imóveis e no Serviço de Patrimônio

da União, no prazo de 30 dias, assim resta finalizado o procedimento demarcatório.

Histórico do procedimento jurídico-administrativo dos Tapeba: entraves jurídicos e/ou

políticos?

No Ceará, o caso dos Tapeba representa bem essa realidade em que a morosidade

do Estado brasileiro prevalece quando o assunto é demarcação das terras indígenas, pois,

ainda na década de 1980, iniciou-se a busca dos Tapeba pela demarcação da sua terra

indígena, e por isso são conhecidos como sendo os primeiros a “levantar aldeia” aqui no

Estado, haja vista que esse momento foi marcado pelo envio de um abaixo-assinado ao

Presidente da República, à FUNAI e ao Ministro da Reforma Agrária, expondo todos os

conflitos territoriais que vinham enfrentando e exigindo medidas de proteção.

Page 14: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

Este abaixo-assinado, datado de maio de 1985 e encaminhado por 70 Tapeba pedindo

“terra pra nós índios” e “um posto médico”, é considerado o “documento original” do

Processo FUNAI/BSB/1986/85, que trata da identificação e delimitação da Terra Indígena

Tapeba, que teve seu levantamento antropológico e fundiário realizado em 1986, pela

comissão formada com base na Portaria n° 30/CTI-MIRAD, responsável por esses estudos

preliminares ao processo de regularização fundiária. (BARRETO FILHO, 2004).

O levantamento antropológico e fundiário foi realizado, na época, por um Grupo de

Trabalho Interministerial (GTI), também conhecido como “grupão”, estabelecido pelo

Decreto 88.118/83, que atribuía competência a este “grupão” para apreciar os pedidos de

demarcação de Terras Indígenas realizados pela FUNAI.

Em 1987, o Decreto 88.118/83 foi alterado pelos decretos 94.945/87 e 94.946/87, os quais

ampliavam a órbita de interferência militar e diferenciava os tipos de terras indígenas com base

no seu maior ou menor grau de aculturação. O grupo responsável pela elaboração dos

relatórios preliminares à demarcação era composto por representantes de vários setores do

Governo, dentre os quais ressaltamos a participação da Secretaria Geral do Conselho de

Segurança Nacional. Além desta equipe técnica, a proposta de demarcação elaborada deveria

ser submetida ao Grupo de Trabalho Interministerial, e, em seguida, deveria ser aprovada pelos

Ministros da Agricultura e do Interior, e em se tratando de faixa de fronteira, deveria passar

também pelo Secretário Geral da Secretaria de Assessoramento da Defesa Nacional.

(LACERDA, 2004)

Não bastassem todas essas fases citadas acima, em que para ser aceito o estudo de

identificação e delimitação – a primeira fase do procedimento – fazia-se necessário o aval

de várias instâncias e pessoas, os Tapeba enfrentaram, no ano de 1987, muitos conflitos

contra os posseiros das terras, que resistiam passiva e ativamente às vistorias do estudo de

identificação e delimitação, haja vista os inúmeros posseiros que surgiram dentro da área,

todos portando seus supostos títulos de propriedade registrados em cartório.

Configurava-se, assim, uma prévia do que viria a ser o procedimento administrativo

demarcatório da terra indígena Tapeba, de forma que atingiria a diversos interesses, motivo

pelos quais muitos conflitos deveriam ser enfrentados pelos Tapeba, tanto por meio de via

judicial quanto extrajudicial, com ameaças e negações, mas também com arquivamentos e

paralisações, sendo a primeira delas em 1988, quando o “grupão” arquivou por dúvidas

quanto à etnia dos “remanescentes”. (BARRETO FILHO, 2006). Fato este que, segundo o

autor, mobilizou tanto os Tapeba, quanto diversos setores da sociedade, desde

Page 15: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

organizações de apoio à Procuradoria Geral da República do Estado. A partir dessas

mobilizações e reivindicações, o processo foi reaberto em 1989.

No ano de 1993, antes de ser emitida a portaria autorizando a demarcação da área

pela FUNAI, Esmerino Oliveira Arruda Coelho peticionou nos autos do processo

administrativo, o qual foi prontamente atendido pelo Ministro Maurício Corrêa, nestes

termos:

Tendo em vista a representação feita pelo Ilustre Senador Suplente pelo Estado do Ceará, Esmerino Oliveira de Arruda Coelho, cuja juntada determino, com fundamento no art. 2°, § 10, do decreto 22, de 04 de fevereiro de 1991, devolvo o processo à FUNAI para reexame, considerando os fundamentos da representação e acolhendo, se possível, a indicação para que seja instituído Grupo de Trabalho do qual faça parte um representante do Município de Caucaia-CE (FUNAI/BSB/1115/93, fls. 1570, vol. 7). (BRASIL, 1998, on line, grifos nossos)

Além de suplente de senador, Esmerino Oliveira Arruda Coelho era também

proprietário de uma parte da área identificada, “como se depreende da sentença proferida

nos autos da ação cautelar que propôs contra a União e contra a FUNAI perante a 3ª Vara

Federal da Secção Judiciária do Ceará”.

Depois disso, os autos foram devolvidos pela FUNAI com parecer do antropólogo

Henyo Trindade Barreto Filho. Contudo, o Ministro Maurício Corrêa, voltou a despachar

nestes termos:

A exposição (parecer) de fls. 305 a 313, do ilustre antropólogo Henyo Trindade Barreto Filho, trouxe aos autos valiosa colaboração, com argumentos consistentes e de base científica, contudo persistem situações de fato que motivaram o despacho de fls. 247, não cumprido integralmente. Assim, devolvo os autos à FUNAI, ainda com base no art. 2°, §10, do Decreto n° 22, de 4 de fevereiro de 1991, para que institua o Grupo de Trabalho, com representante do Município de Caucaia, CE, anteriormente indicado, na forma e para os fins previstos à fls. 226. (fls. 1641, vol. 7) (BRASIL, 1998, on line)

Desse modo, podemos perceber a mudança ocorrida de um despacho para o outro,

em que pesa o fato de, no primeiro, o Ministro utilizar a expressão “se possível” e, logo em

seguida, o que se apontava enquanto uma possibilidade passa a ser uma determinação,

“para que institua o Grupo de Trabalho, com representante do Município de Caucaia”. O que

fez com que isso acontecesse?

Desta vez, a FUNAI devolveu o processo sem cumprir a ordem do Ministro,

fundamentado em várias manifestações de órgãos técnicos, das quais podemos extrair a

seguinte ementa:

Page 16: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

Inserção incompatível com as regras estabelecidas pelo Dec. 22, de 04.02.91, que dispõe sobre o processo administrativo demarcatório das terras indígenas. Competência exclusiva da União Federal. Aplicação dos princípios da legalidade e da moralidade, insertos no art. 37 da Constituição. (BRASIL, 1998, on line)

Nessa época, assume um novo Ministro da Justiça, Alexandre de Paula Dupeyrat

Martins, que, à vista dos novos elementos juntados aos autos, determinou a elaboração de

um novo parecer pela Consultoria Jurídica do Ministério, no qual constava: “a demarcação

da terra em apreço se deu em consonância com o art. 231, da Carta Magna, Decreto n°

22/91 e a lei 6.001/73, sem quaisquer dissonâncias ou discrepâncias (fls. 1702, vol. 7).”

(BRASIL, 1998, on line)

Porém, outros dois ministros fizeram parte da administração do órgão, antes que o ato

da portaria 967/97 fosse praticado, de modo que a “ordem” do Ministro Maurício Corrêa

superada por atos posteriores, pelos Ministros da Justiça que o sucederam no cargo.

No ano de 1997, após oito anos de espera desde a última paralisação, com a

assinatura da portaria de nº 967/97, que declarava a Área Indígena Tapeba como território

tradicional indígena, o Município de Caucaia, por meio do Prefeito à época, José Gerardo

Arruda, impetrou, no Superior Tribunal de Justiça, Mandado de Segurança (nº 5.505/DF)

contestando a portaria declaratória com base na alegação de vício de procedimento, o qual

foi unanimemente acatado, anulando a portaria.

Dentre os argumentos utilizados pelo Município de Caucaia, além do vício de

procedimento que correspondia à ausência de um representante do Município no Grupo de

Trabalho, estava o de que “a área declarada de posse permanente dos índios Tapeba, pela

Portaria Ministerial n° 967 de 24 de setembro de 1997, fica em sua sede urbana, sitiando-a

[...] impedindo-a de crescer, atingindo interesse do Município”. (BRASIL, 1998, on line)

Argumento este reafirmado pelo Ministro Garcia Vieira em seu voto, o qual ainda se

utilizou dos mesmos argumentos apontados em 1988, quais sejam, o não preenchimento

dos requisitos que comprovassem a ocupação tradicional pelos índios.

O curioso disso tudo, é o fato de que o Decreto 1.775/96, sobre a composição do

Grupo de Trabalho dispõe em seu artigo 2° que:

A demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios será fundamentada em trabalhos desenvolvidos por antropólogo de qualificação reconhecida, que elaborará, em prazo fixado na portaria de nomeação baixada pelo titular do órgão federal de assistência ao índio, estudo antropológico de identificação

Page 17: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

§ 1°. O órgão federal de assistência ao índio designará grupo técnico especializado, composto preferencialmente por servidores do próprio quadro funcional, coordenado por antropólogo, com a finalidade de realizar estudos complementares de natureza etno-histórica, sociológica, jurídica, cartográfica, ambiental e o levantamento fundiário necessários à delimitação. (BRASIL, 1996, on line)

Razão pela qual nos questionamos sobre a participação de um representante do

Município no GT, assim também sobre qual seria o seu papel: informar quem é e quem não é

indígena? Apontar que terras não seriam de interesse do Município e autorizar a inclusão na

identificação?

As palavras “cerca, bloqueia, sitia, rodeia” aparecem com muita freqüência no voto do

relator, de forma que nos levanta dúvidas sobre os interesses que possam estar por trás de tal

argumentação, isso porque estamos acostumados a ouvir, segundo Araújo (2008), uma

“polêmica impregnada de argumentos falaciosos para confundir a população que desconhece

as peculiaridades jurídicas e os poderosos interesses econômicos envolvidos”, para isso é só

lembrarmos o prefeito da época, José Gerardo Arruda, e também procurarmos dentre a enorme

lista de supostos proprietários de tais terras, pois, curiosamente, a família Arruda, é uma delas.

O fato é que o Mandado de Segurança n° 5.505/DF representou, no procedimento

administrativo demarcatório da terra indígena Tapeba, um poderoso instrumento jurídico

contra os Tapeba, pois, ao anular a portaria 967/97, invalidou todos os atos oriundos desta,

o que significou para o procedimento demarcatório, “voltaria à estaca zero”.

Em 2003, foi expedida nova portaria (Portaria n° 97/2003) para o mesmo fim, sem,

contudo, que o vício fosse sanado, isto é, que o Município de Caucaia fosse incluído no

Grupo de Trabalho. Motivo pelo qual, no ano de 2007, mais uma vez o Município recorreu

ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio da Reclamação n° 2.651/DF, visando anular

a nova portaria, posto que esta repetiu a ilegalidade que havia impugnado a primeira,

caracterizando assim, “descumprimento e ofensa” à decisão do STJ.

Restou assim – em 11 de junho de 2008, através de decisão proferida pelo Superior

Tribunal de Justiça (STJ) – mais uma vez paralisado o procedimento jurídico-administrativo

demarcatório da Terra Indígena Tapeba, conforme podemos verificar na ementa a seguir:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO – DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO DOS STJ – REPETIÇÃO DA ILEGALIDADE IMPUGNADA ANTECEDENTEMENTE – NOVO ATO ADMINISTRATIVO (PORTARIA) CONTENDO O MESMO ERRO.

1. O STJ, no MS n 5.505/DF, declarou nula a Portaria 967/97 que determinou a demarcação de terras indígenas denominadas Tapeba, por não haver representação do Município de Caucaia/CE.

Page 18: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

2. Expedição de nova portaria de n° 97/2003, para o mesmo fim, sem a inclusão do município no grupo de trabalho.

3. Ilegalidade que se repete e ofende a decisão anterior do STJ.

4. Reclamação procedente. (Reclamação n°2.651/DF – 2007/0261207-3. Ministro Relator: José Delgado) (BRASIL, 2008, on line)

Para os ministros que julgaram a reclamação “ficou evidente que os sucessivos

equívocos de interpretação dos técnicos da Funai é que levaram à desobediência da

decisão proferida no mencionado mandado de segurança”. (Rcl. 2651-DF, Rel. Min. José

Delgado)

O fato é que independente de quem seja o suposto pela não demarcação da Terra

Indígena Tapeba, a morosidade e a burocracia, assim como, os entraves políticos e

jurídicos marcam esses longos anos de espera dos Tapeba pela efetivação do direito

fundamental à terra.

No ano de 2010, mais uma vez, foi constituído Grupo Técnico para a realização de

novos estudos, novo processo, tudo iniciando por mais uma vez, desta vez garantindo a

participação do Munícipio de Caucaia neste processo. A portaria de n°1.226/2010 que

nomeou o novo GT foi publicada no Diário Oficial da União em setembro de 2010.

Nesse processo de entraves jurídicos e políticos, é importante contextualizar que a gestão

municipal foi mudada nas eleições de 2008 com uma intensa articulação dos indígenas de

Caucaia em resposta à anulação do procedimento de demarcação.

Considerações Finais

Faz-se necessário que entendamos a morosidade do Estado brasileiro não só como

um entrave jurídico, mas também como um entrave político que envolve interesses

econômicos, conforme Mascaro (2002, p. 8-9), precisamos observar o fato de que:

Um direito universal esconde no fundo a sua grande perversão: a luta por dizer que todos são iguais perante a lei acaba com o antigo privilégio absolutista, mas esconde as diferenças de fundo que são o eixo de estrutura da sociedade moderna. Ao tratar igualmente um mundo cindido, a filosofia do direito moderna determina o império da lógica burguesa. A diferença entre exploradores e explorados, o conflito de classes e a desarmonia latente somem perante a concórdia promovida pelo direito. [...] Inauguram-se, numa superfície político-jurídica de iguais, a cidadania, a liberdade formal e os direitos civis, e enterram-se longe das vistas da sociedade as desigualdades da vida econômica do homem.

Pensavam os povos indígenas que, com a Constituição de 1988, e os seus direitos à

terra, à organização social, aos seus usos, costumes e tradições assegurados na esfera

Page 19: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

constitucional estavam à salvos da lógica assimilacionista do Estado brasileiro, e com isso

ficariam também protegidos dos interesses de particulares não indígenas, porém, passados

mais de vinte anos, seus direitos ainda não foram efetivados.

Pelo contrário, o que se renovam diariamente são as estratégias jurídicas contrárias

aos direitos territoriais indígenas, em um dia se consolidam as condicionantes que já servem

como precedente para as demais demarcações, e agora, a mais recente ameaça, um

Projeto de Emenda Constitucional – PEC n°215, que tem o claro propósito de dificultar a

regularização das terras indígenas.

Esta realidade traz um clima muito intenso de insegurança jurídica para os povos

indígenas, principalmente no Ceará, que só possui uma única terra demarcada e

homologada, demonstrando assim que muitos são os casos não resolvidos pelo Estado,

cabendo lembrar ainda o que Balza já afirmava (2009) a morosidade da Justiça como fator

sempre contrário aos interesses dos indígenas, pois, enquanto a Justiça não decide, os

invasores de terras indígenas constroem, plantam, colhem, ganham dinheiro, os indígenas

continuam vivendo em condições de vida precárias.

Ora, o fato é que, para os Tapeba, o conhecimento de seus direitos se deu não pelo

acesso a estes, ao contrário, pela sua violação, pela ausência de tais direitos. Então a falsa

aparência de harmonia promovida pelo direito, nunca foi uma realidade para os Tapeba, haja

vista que estes sempre tiveram que enfrentar os conflitos latentes, a desarmonia advinda da

própria situação de proteção de seus direitos específicos, pois foi a partir do momento que se

perceberam sujeitos de direitos e da luta por direitos que se tornaram uma ameaça para os

posseiros.

Percebemos em alguns momentos do procedimento jurídico-administrativo de

demarcação que os motivos que embasavam algumas decisões eram políticos e não jurídicos

como possam pensar alguns, o que nos leva a afirmar que o direito serve como instrumento de

manutenção da ordem, assim como ela se põe, e resultado disso “os povos encontram-se

enredados nos mecanismos de injustiça social cuja expressão é a forma da lei” (MASCARO,

2002, p. 10).

Por esse motivo, os povos indígenas não podem ficar reféns dessa justiça que se

utiliza de um discurso de igualdade para todos, quando o que se tem é uma realidade de

desigualdades, na qual uns não sofrem por serem “iguais”, pois estão nas instâncias de

poder e utilizam-nas a seu favor.

Page 20: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

Exatamente por isso, os Tapeba tiveram que no decorrer desses longos anos de

espera e de conflitos fundiários, nos quais perderam significativos territórios, que buscar

outros mecanismos de proteção de sua terra, qual seja a retomada de terras se apresenta

como um instrumento de luta, e também como o exercício do direito de resistência pelos

Tapeba, uma vez que, as retomadas são a resposta dos Tapeba à morosidade do Estado.

Com a pesquisa constatamos que Estado com o passar do tempo garantiu alguns

direitos como educação, saúde, mesmo que de uma forma, muitas vezes, não satisfatória; e

por outro lado, a morosidade do Estado brasileiro em demarcar a Terra Indígena Tapeba,

retrata de que forma a sua omissão em efetivar esse direito pode ser compreendida como

uma ameaça à sua própria sobrevivência, visto que não garante a reprodução física e

cultural desse povo. E com isso, o Estado que deveria garantir, está violando os direitos

humanos, haja vista que para os Tapeba ter a terra demarcada é ter a vida garantida.

Referências Bibliográficas

BALZA, Guilherme. STF analisa 22 ações envolvendo terras indígenas; especialistas temem adoção de condicionantes do caso Raposa Serra do Sol. Disponível em: <http://noticias.uol.com.br/cotidiano/2009/04/29/ult5772u3745.jhtm>. Acesso em: 29 abr. 2009.

BARRETO FILHO, Henyo Trindade Identidades emergentes, soluções heterodoxas: o caso da (não) demarcação da Terra Indígena Tapeba, 2000. Boletim Anual do GERI, 4/4. Disponível em: <http://www.unb.br/ics/dan/geri/boletim/barretto_2000.pdf>. Acesso em: 28 out. 2008.

______. Invenção ou renascimento? gênese de uma sociedade indígena contemporânea no nordeste. In: OLIVEIRA, João Pacheco. (Org.) A viagem da volta: etnicidade, política e reelaboração cultural no nordeste indígena. 2. ed. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2004.

______. Tapeba, 1998. Disponível em: <http://www.isa.org.br/epi/tapeba/tapeba.htm>. Acesso em: 20 out. 2008.

______. Tapebas, tapebanos e pernas-de-pau: etnogênese como processo social e luta simbólica. Rio de Janeiro, UFRJ, 1992, 203p. Dissertação (Mestrado – Programa de Pós Graduação em Antropologia Social). Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1992.

BASTOS, Núbia M. Garcia. Introdução à metodologia do trabalho acadêmico. 5. ed. Fortaleza: Nacional, 2008.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 10 maio 2012.

______. Decreto nº 1.775, de 8 de janeiro de 1996. Dispõe sobre o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas e dá outras providências. Diário Oficial

Page 21: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

[da] União, Brasília, DF, 8 jan. 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D1775.htm>. Acesso em: 20 maio. 2012.

BRASIL. Decreto nº 22, de 4 de fevereiro de 1991. Dispõe sobre o processo administrativo de demarcação das terras indígenas e dá outras providências. Diário Oficial [da] União, Brasília, DF, 5 fev 1991. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0022.htm>. Acesso em: 20 maio 2012

______. Lei nº 6.001, de 19 de dezembro de 1973. Dispõe sobre o Estatuto do Índio. Diário Oficial [da] União, Brasília, DF, 21 dez. 1973. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/leis/l6001.htm>. Acesso em: 20 maio 2012

______. Lei nº 601, de 18 de setembro de 1850. Dispõe sobre as terras devolutas do Império. CLBR, Brasil Império, 18 set. 1850. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LIM/LIM601.htm>. Acesso em: 20 maio 2012

______. Superior Tribunal de Justiça. Mandado de Segurança nº 5.505/DF, Primeira Seção, Relator: Ministro Garcia Vieira, Julgamento: 27 maio 1998. Diário da Justiça, Brasília, DF, 28 set. 1998. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=5505&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=3>. Acesso em: 20 maio 2012

______. Superior Tribunal de Justiça. Reclamação nº 2.651/DF, Primeira Seção, Relator: José Delgado, Julgamento: 11 jun. 2008. Diário da Justiça, Brasília, DF, 15 dez. 2008. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?processo=2651&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1>. Acesso em: 20 maio 2012

CENTRO ECUMÊNICO DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÃO. Povos indígenas no Brasil. São Paulo: Aconteceu, especial 15, 1984.

COSTA, Naara; ELÂNIA, Luzia. Entrevista realizada com Weibe Tapeba. In: GOMES, A. Oliveira; VIEIRA, João Paulo. Historiando os Tapeba; folheto de pesquisa histórica. Caucaia: Palavrandante, 2007.

FUNAI, Fundação Nacional do Índio. Como é feita a demarcação. Disponível em: <http://www.funai.gov.br/indios/terras/conteudo.htm#como>. Acesso em: 15 maio 2012

GOMES, A. Oliveira; VIEIRA, João Paulo. Historiando os Tapeba; folheto de pesquisa histórica. Caucaia: Palavrandante, 2007.

______. Museus e memória indígena no ceará: a emergência étnica entre lembranças e esquecimentos. In: PALITOT, E. Martins (Org.). Na mata do sabiá: contribuições sobre a presença indígena no ceará. Fortaleza: Secult/Museu do Ceará/Imopec, 2009.

LACERDA, Rosane. O Governo Lula e a visão dos povos indígenas como “potenciais de risco à estabilidade institucional”, 20 jun. 2004. Disponível em: <http://www.cimi.org.br/?system=news&action=read&id=320&eid=262>. Acesso em: 08 jun. 2009.

LUCCAS, Jaime. Índios em busca da própria terra. Cidade Nova, São Paulo, n. 9, p. 12-17, set. 2008.

Page 22: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

MALINOWSKI, Bronislaw. “Argonautas do Pacífico Ocidental”. Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural. 1978.

MANCHINERI, Sebastião. II Encontro Continental dos Povos Indígenas das Américas. 2004. Disponível em: <http://www.cimi.org.br/?system=news&action=read&id=501&eid=294>. Acesso em: 22 abr. 2009.

MASCARO, A. Leandro. O direito para a transformação social. In: ARIENTE, E. A. Fronteiras do direito contemporâneo. São Paulo: Imprensa Oficial de São Paulo, 2002.

OLIVEIRA, João Pacheco de. A viagem da volta: etnicidade, política e reelaboração cultural no nordeste. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, 2007.

______. Indigenismo e territorialização: poderes, rotinas e saberes coloniais no Brasil Contemporâneo. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, 1998.

PERROT, Michelle. As mulheres ou os silêncios da história. São Paulo: EDUSC, 2005.

PIOVESAN, Flávia. Ações afirmativas sob a perspectiva dos direitos humanos. In: SANTOS, S. Augusto (Org.). Ações afirmativas e combate ao racismo nas américas. Brasília: Ministério da Educação/Secretaria de Educação Continuada/Alfabetização e Diversidade, 2005.

PRESSBURGER, T. Miguel. Prefácio. In: ALFONSÍN, Jacques Távora; SOUSA FILHO, C. F. Marés. Negros e índios no cativeiro da terra. Rio de Janeiro: Instituto Apoio Jurídico Popular, 1989.

RAMOS, R. Alcida. Sociedades indígenas. São Paulo: Ática, 1994.

RATTS, J. P. Alecsandro. Fronteiras invisíveis: territórios negros e indígenas no Ceará. São Paulo, USP, 1996. Dissertação apresentada ao Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, 1996.

ROCHA, Osvaldo de Alencar. O negro e a posse da terra no Brasil. In: ALFONSÍN, Jacques Távora; SOUSA FILHO, C. F. Marés. Negros e índios no cativeiro da terra. Rio de Janeiro: Instituto Apoio Jurídico Popular, 1989.

SANTILLI, Marcos. Os brasileiros e os índios. São Paulo: SENAC. 2000.

SANTOS, Boaventura de Sousa. A demarcação dos territórios indígenas dos Tremembé e dos tapeba é urgente. Disponível em: <http://www.petitiononline.com/indigena/petition.html>. Acesso em: 20 maio 2009.

SANTOS, C. A. B. Plínio. Quilombo Tapuio (PI): terra de memória e identidade. Brasília, UNB, 2006. Dissertação em Mestrado – Programa de Pós Graduação em Antropologia Social. Universidade de Brasília, 2006. Disponível em: <http://biblioteca.universia.net/ficha.do?id=17532357>. Acesso em: 15 mar. 2009.

SOUZA FILHO, C. F. Marés. O renascer dos povos indígenas para o direito. (1998), 4. tir. Curitiba: Juruá, 2005.

TÓFOLI, Analu. Retomada de terras Tapeba: entre a afirmação étnica, os descaminhos da demarcação territorial e o controle dos espaços. In: PALITOT, E. Martins. (Org.). Na mata

Page 23: A NÃO DEMARCAÇÃO DA TERRA INDÍGENA TAPEBA COMO ... · COMO VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS ... Instituição Centro de Defesa e Promoção dos Direitos ... um processo de luta,

7º Encontro Anual da ANDHEP – Direitos Humanos, Democracia e Diversidade.

23 a 25 de maio de 2012, UFPR, Curitiba (PR)

do sabiá: contribuições sobre a presença indígena no ceará. Fortaleza: Secult/Museu do Ceará/Imopec, 2009.