A nova legislação de prevenção e combate a incêndio em porto alegre uma análise crítica

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE ENGENHARIA DANIEL TASSONI SOUZA A NOVA LEGISLAÇÃO DE PREVENÇÃO E COMBATE A INCÊNDIO EM PORTO ALEGRE: UMA ANÁLISE CRÍTICA PORTO ALEGRE 2014

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE ENGENHARIA

DANIEL TASSONI SOUZA

A NOVA LEGISLAÇÃO DE PREVENÇÃO E COMBATE A INCÊNDIO EM PORTO ALEGRE: UMA ANÁLISE CRÍTICA

PORTO ALEGRE

2014

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DANIEL TASSONI SOUZA

A NOVA LEGISLAÇÃO DE PREVENÇÃO E COMBATE A INCÊNDIO VIGENTE EM PORTO ALEGRE: UMA ANÁLISE CRÍTICA

Monografia apresentada como requisito para obtenção do grau de Especialista em Engenharia de Segurança do Trabalho da Faculdade de Engenharia da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

Orientador: Prof. Eng.º Cláudio Alberto Hanssen

PORTO ALEGRE

2014

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DANIEL TASSONI SOUZA

A NOVA LEGISLAÇÃO DE PREVENÇÃO E COMBATE A INCÊNDIO VIGENTE EM PORTO ALEGRE: UMA ANÁLISE CRÍTICA

Esta Monografia foi analisada e julgada adequada para a obtenção do título de Especialista em Engenharia de Segurança do Trabalho e aprovado em sua forma final pelo Orientador e pelo Coordenador do Curso na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.

BANCA AVALIADORA

________________________________

Prof. Orientador

Prof. Eng.º Cláudio Alberto Hanssen

________________________________

Coordenador

Prof. Msc. Laurence Ricardo Adorno

3

Dedico este trabalho à minha família, fonte de amor e apoio incondicionais.

4

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus pela vida e por tudo e por todos que tornam

belo este magnífico e paradoxal mistério da existência humana.

Aos meus pais, Jaime Roberto e Maria de Lourdes, meus maiores

professores e as duas pessoas a quem mais admiro e sou grato neste mundo. Meus

pós-doutores em virtudes como amor, entrega e caráter, de quem aprendi sobre

Deus e sobre valores nos quais hoje baseio minha vida e tento nortear meus passos.

Amo vocês do fundo do meu coração e com todas minhas forças. Sem vocês eu não

seria nada, absolutamente nada. Muito obrigado, este diploma é mais de vocês do

que meu.

Aos meus irmãos André e Felipe, as outras duas pessoas, juntos com meus

pais, mais importantes na minha vida. Obrigado pelo companheirismo, pela amizade

e pelo apoio ao longo da história que dividimos e escrevemos juntos. Amo-os muito

e tenho um grande orgulho de vocês. Vocês tem parte em quem sou hoje, pelo bem

que carregam e que me serve de exemplo. Divido este diploma com vocês também.

Contem sempre comigo.

À minha noiva Luana, pelo companheirismo, cumplicidade, apoio e confiança.

Obrigado pela força e pelo exemplo vivo de fé e confiança em Deus. Tu és parte

integrante do meu ser, e tens um lugar especial em meu coração. Esta vitória

também é tua. Te amo!

Aos amigos, cujo apoio foi fundamental não apenas nesta, mas também em

todas as outras conquistas ao longo da caminhada. Não teria chegado a lugar algum

sem o apoio e a amizade sincera de cada um. Obrigado de coração. Não poderei

citar nomes, pois não caberiam todos aqui, mas guardo-os todos em minha memória

e em meu coração, na certeza de que não esqueço ninguém. Sou muito grato a

Deus por vocês.

Ao competente arquiteto Neivaldo, proprietário da Prolog Projetos e Logística,

pelo apoio e pelo conhecimento compartilhado no direcionamento deste trabalho.

Ao 1º Sargento do Corpo de Bombeiros Militar do Rio Grande do Sul, Luis

Augusto Braatz, pelo apoio e pelo tempo gentilmente cedido para me atender e me

auxiliar na elaboração deste trabalho. Profissional de admirável competência e

solicitude.

E finalmente um obrigado em especial ao meu professor e orientador, Eng.º

Cláudio Alberto Hanssen, uma das maiores autoridades intelectuais em prevenção e

combate a incêndio do Brasil, pela orientação paciente, dedicada, atenciosa e

extremamente cordial. Um exemplo de profissional, que alia alta competência a uma

humildade e simplicidade que pouquíssimos alcançam, e que tornam sua sabedoria

ainda mais brilhante e evidente.

“Love all, trust a few, do wrong to none” (W. Shakespeare)

5

"O vosso amor seja sincero. Detestai o mal, apegai-vos ao bem. [...]

Abençoai os que vos perseguem; abençoai-os, e não os amaldiçoeis. Alegrai-vos com os que se alegram; chorai com os que choram.

[...] Não vos considereis sábios aos próprios olhos.

A ninguém pagueis o mal com o mal. [...]

Na medida do possível e, enquanto depender de vós, vivei em paz com todos.” (ROMANOS, cap 12, v. 9-18, Bíblia)

6

RESUMO

O presente trabalho propõe uma revisão crítica sobre os principais pontos da nova

legislação contra incêndio vigente em Porto Alegre (lei complementar estadual nº

14.376), apontando os principais pontos positivos e negativos da nova legislação em

relação à antiga lei complementar 420/1998 utilizada como referência na cidade.

Foram utilizados critérios técnicos para avaliar os novos padrões adotados para a

prevenção e proteção contra incêndio em Porto Alegre, analisando sua eficiência

prática e sua adequação à finalidade que se propõe. Os resultados apontam uma lei

mais atual em relação à precedente, porém ainda incompleta; carente de

regulamentação e de muitos ajustes e aprimoramentos.

Palavras-chave: Combate a incêndio. Lei. Legislação. Prevenção e proteção contra

incêndio

7

ABSTRACT

The present study proposes a critical review regarding the main points of the new fire

prevention law implemented in Porto Alegre (state law nº 14.376/2013), indicating the

main positives and negatives points of the new law, in comparison with the former

municipal law 420/1998 used as reference in the city. Technical criteria were used to

evaluate the new standards adopted for fire prevention and protection in Porto

Alegre, analyzing their practice efficiency and its suitability for its stated aim. The

results point to an upgraded law in comparision to its preceding, though still

incomplete, lacking regulation and many tweaks and enhancements.

Keywords: Fire fighting. Law. Legislation. Prevention and fire protection

8

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Incêndio no prédio Andraus, em São Paulo 13

Figura 2 - Interior da boate Kiss após o incêndio 14

Figura 3 - Triângulo e quadrado (tetraedro) do fogo 18

Figura 4 - Gases gerados na combustão de materiais combustíveis 20

Figura 5 - Mecanismo de ignição de um combustível sólido 21

Figura 6 - Mecanismo de ignição de um combustível líquido 22

Figura 7 - Mecanismo de ignição de um combustível sólido 23

Figura 8 - Propagação do calor por condução 25

Figura 9 - Propagação do calor por convecção 26

Figura 10 - Propagação do calor por radiação térmica 27

Figura 11 - Curva de evolução de um incêndio celulósico em uma

edificação 29

Figura 12 - Extintores portáteis e sobre rodas 39

Figura 13 - Representações gráficas indicativas de classes de fogo em

função do material combustível 39

Figura 14 - Carretel mangotinho horizontal 42

Figura 15 - Hidrante predial 43

Figura 16 - Diferentes tipos de sprinklers 44

Figura 17 - Sistema de água nebulizada em operação 44

Figura 18 - Exigências para edificações já existentes (Tabela 4 da lei

14.376/2013) 65

Figura 19 - Exigências para edificações com área menor ou igual a 750

m2 e altura menor ou igual a 12 metros (Tabela 5 da lei

14.376/2013) 69

Figura 20 - Determinação da carga de incêndio (qfi) (em MJ/m²), em

função do tipo de ocupação para edificações do grupo F 76

9

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 12

2 DESENVOLVIMENTO 16

2.1 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 16

2.1.1 Fogo 16

2.1.1.1 A química do fogo 17

2.1.2 Mecanismos de Ignição dos materiais combustíveis 20

2.1.2.1 Combustível sólido 21

2.1.2.2 Combustível líquido 21

2.1.2.3 Combustível gasoso 22

2.1.3 Temperaturas Características 23

2.1.4 Meios de propagação do fogo 24

2.1.4.1 Propagação do fogo por condução 24

2.1.4.2 Propagação do fogo por convecção 25

2.1.4.3 Propagação do fogo por radiação térmica (irradiação) 26

2.1.5 Fases e estágios de evolução de um incêndio 27

2.1.6 Classes de fogo 29

2.1.7 Agentes extintores 31

2.1.7.1 Água 31

2.1.7.2 Espuma 32

2.1.7.3 Gás 33

2.1.7.3.1 Gases inertes 33

2.1.7.3.2 Gases ativos 34

2.1.7.3.3 Gás Carbônico 34

2.1.7.4 Pó químico 34

2.1.8 Métodos de extinção do fogo 35

2.1.9 Medidas de proteção e combate ao fogo 37

2.1.9.1 Medidas de proteção passiva 37

2.1.9.2 Medidas de proteção ativa 37

2.1.10 Sistemas de extinção do fogo 38

2.1.10.1 Sistemas móveis 38

2.1.10.2 Sistemas fixos 41

10

2.1.10.2.1 Sistemas fixos sob comando 41

2.1.10.2.2 Sistemas fixos automáticos 43

2.1.11 Legislação 45

2.2 ESTUDO DE CASO: O CENÁRIO DA LEGISLAÇÃO CONTRA

INCÊNDIO EM PORTO ALEGRE

46

2.2.1 A Lei Complementar Municipal nº 420 de Porto Alegre 46

2.2.2 A nova Lei Complementar Estadual n° 14.376 48

2.2.2.1 Decreto para regularizar a Lei Complementar Estadual Nº 14.376 49

2.2.3 Melhorias e avanços proporcionados pela Lei 14.376/2013 51

2.2.3.1 Novas medidas de segurança contra incêndio 51

2.2.3.1.1 Obrigatoriedade de chuveiros automáticos em casas noturnas com

mais de 500 pessoas

53

2.2.3.1.2 Explanação sobre o sistema de combate a incêndio para eventos

em edificações das divisões F5, F-6 E F-8

54

2.2.3.1.3 Brigada de incêndio em locais de aglomeração de público 55

2.2.3.2 Maior rigor para licenças de funcionamento de estabelecimentos 56

2.2.3.3 A nova revisão da Norma NBR 12693/2013 (Dimensionamento de

extintores de incêndio)

56

2.2.4 Situações transitórias a serem resolvidas 59

2.2.4.1 Longo tempo para apreciação de PPCIs e APPCIs e

empreendimentos impedidos de operar

59

2.2.4.2 Projetos de edificações de Porto Alegre com início sob regência da

lei municipal 420/1988 e término sob vigência da atual lei

14.376/2013

61

2.2.4.3 Divergências entre os critérios que regem o código de edificação de

Porto Alegre e os critérios técnicos adotados pela lei 14.376/2013

62

2.2.4.4 Dificuldade de adequação das edificações antigas à nova lei

estadual

64

2.2.5 Análise crítica dos artigos a serem revisados na nova Lei

14.376/2013

66

2.2.5.1 Fragmentos do texto de lei estadual complementar passíveis de

reestruturação

67

2.2.5.1.1 Obrigatoriedade de alvará de prevenção e proteção contra

11

incêndios para residências em andar térreo de ocupação mista 68

2.2.5.1.2 Critérios para instalação do sistema de iluminação de emergência

não considera as características internas (layout) do ambiente

69

2.2.5.1.3 Não obrigatoriedade de instalação de sistema de hidrantes para

postos de combustíveis com área total menor do que 750 m2

70

2.2.5.1.4 Exclusão da possibilidade de apresentação de PSPCI para

edificações de risco médio

73

2.2.5.1.5 Referências incorretas/inexistentes e incorreções gerais de redação 75

3 CONCLUSÃO 78

REFERÊNCIAS 81

12

1 INTRODUÇÃO

A importância da prevenção e combate a incêndios no Brasil ganha cada vez

mais força no cenário contemporâneo, bem como a urgente necessidade de

reavaliação dos atuais padrões técnicos e legais. As recentes tragédias e incidentes

de grandes proporções que vem ocorrendo no estado do Rio Grande do Sul,

podendo-se citar os casos ocorridos na boate Kiss, em Santa Maria, e no Mercado

Público de Porto Alegre, no primeiro semestre de 2013, evidenciam o despreparo do

estado frente a este tema. Apesar dos avanços em relação às políticas de

prevenção e combate a incêndio no Brasil e no Rio Grande do Sul ao longo dos

últimos anos, ainda há muitos desafios a serem superados.

Uma das principais causas do atual despreparo do Brasil neste quesito foi o

boom das cidades e conglomerados urbanos, que cresceram em ritmo muito mais

acelerado do que suas respectivas tecnologias de prevenção e combate a incêndio.

Grandes aglomerações se formaram e muitas edificações verticais foram

construídas para alocar o comércio em expansão nos centros. Entretanto, muito

pouco foi feito para proporcionar ambientes seguros.

Nos grandes centros comerciais são utilizadas ainda muitas edificações

antigas e tecnicamente inseguras em relação a incêndio e pânico. Tais prédios

comportam, em muitos casos, centenas ou mesmo milhares de pessoas, mas

impõem dificuldades para a adaptação técnica necessária e compatível com sua

ocupação e grau de risco.

Aliado a isso, se pode citar a inoperância de muitos órgãos fiscalizadores, o

que resulta em um cenário de grave e iminente risco à vida humana. Deste modo,

não é exagero afirmar que muitos estabelecimentos são, em uma análise mais

rigorosa, verdadeiras “armadilhas silenciosas” humanas.

O Brasil já vivenciou tragédias que ficaram marcadas na história. A maior e

com mais vítimas fatais foi o incêndio criminoso do “Gran Circo Norte-Americano”,

deixando 503 mortos (sendo 70% crianças) na cidade de Niterói, Rio de Janeiro, em

1961. Em São Paulo, em 1972, um incêndio no edifício “Andraus”, localizado no

centro de São Paulo, vitimou 16 pessoas e deixou mais de 330 feridos, se

estendendo por mais de 7 horas (Figura 1). Em 1974, ainda em São Paulo, um

13

incêndio no prédio Joelma é um dos mais lembrados pelo alto número de mortos

(188) e feridos (mais de 340).

Figura 1 – Incêndio no prédio Andraus, em São Paulo

Fonte: (BOMBEIROSEMERGÊNCIA, [20--?])

No estado do Rio Grande do Sul, a primeira tragédia de grandes proporções

se deu em 1976, no centro de Porto Alegre, no prédio das lojas Renner, causando o

óbito de 41 pessoas e ferindo outras 60.

Apesar dos avanços obtidos a partir das décadas de 1970 e 1980, quando o

Brasil, impulsionado pelas tragédias recentes, se viu obrigado a olhar com mais

atenção para a prevenção e combate a incêndio, ainda há muito a ser aprimorado. A

defasagem das legislações frente à realidade do país, além da necessidade de uma

cultura global de combate a incêndio são uns dos muitos pontos a serem

trabalhados.

O estado do Rio Grande do Sul, apesar de ter aprovado recentemente uma

nova lei sobre prevenção e combate a incêndio, ainda precisa evoluir

consideravelmente. Segundo reportagem publicada no jornal Zero Hora do dia 7 de

setembro de 2013 (ANTI-INCÊNDIO..., 2013), há aproximadamente 150 mil

estabelecimentos em Porto Alegre que necessitam de alvará de prevenção contra

14

incêndio, dentre lojas, empresas, indústrias, escolas, teatros, igrejas, entre outros.

Deste total, a estimativa era de que apenas 28 mil possuíam alvará válido. Os outros

122 mil restantes seguiam operando mesmo sem o documento.

A maior tragédia deste estado foi o recente incêndio ocorrido em janeiro de

2013 na boate Kiss, em Santa Maria, vitimando 242 jovens e ferindo outros 140

(Figura 2).

Figura 2 – Interior da boate Kiss após o incêndio

Fonte: Campana (2013)

A casa noturna não possuía alvará de prevenção contra incêndio válido. Além

disso, a perícia técnica verificou que o estabelecimento não cumpria os requisitos

técnicos e legais para a operação. Dentre as muitas irregularidades, foi constatado o

uso de espuma comum para o isolamento acústico, uma espuma inflamável e que

libera gases letais como cianetos e monóxido de carbono, ao entrar em ignição. A

perícia médica apontou que 90% das mortes foi resultado da inalação da fumaça

tóxica liberada pelo material ignifico. A simples utilização de uma espuma

incombustível ou auto extinguível (que não propaga chama) já seria suficiente para

evitar a tragédia. Entretanto, seria demasiadamente simplista atrelar tal sinistro

unicamente ao uso da espuma inadequada, visto que muitos outros fatores se

somaram a este, fatores estes que, se estivessem em conformidade com os

15

requisitos técnicos, poderiam também ter evitado o início ou o alastramento do fogo,

minimizando ou mesmo evitando o trágico desfecho.

Em julho de 2013 Porto Alegre sofreu com a destruição de grande parte do

andar superior do Mercado Público, gerando grandes transtornos e passivos

financeiros para a cidade com a paralização das atividades. Este é outro caso que

pode ser utilizado para ilustrar o cenário atual da prevenção contra incêndio na

cidade e no estado: o centro comercial, mesmo sem ter alvará dos bombeiros e

plano de prevenção contra incêndio (PPCI) válido, funcionava normalmente. O

mercado está situado ao lado da prefeitura, com movimentação aproximada de 150

mil pessoas por dia. Ainda assim, não possuía métodos eficientes de combate a

incêndio. A edificação não possuía um sistema de sprinklers (chuveiros

automáticos), um eficiente sistema para debelar princípios de incêndio. O custo de

instalação dos sprinklers seria muito inferior ao gasto com a reforma e reconstrução

da parcela atingida, somando-se o prejuízo dos 38 dias de inatividade de muitas

lojas, bancas e restaurantes. Alguns comerciantes estimam prejuízos de 100 a 200

mil reais por semana de inoperação.

As causas para o quadro desfavorável em Porto Alegre e no restante do

estado neste quesito são diversas: legislação pouco clara e ainda insuficiente do

ponto de vista técnico (e de critérios); falta de fiscalização efetiva por parte do poder

público (devido ao reduzido quadro técnico do corpo dos bombeiros, que não possui

oficiais suficientes para atender à grande demanda); e falta de conscientização por

parte da sociedade.

Uma cultura global de prevenção e combate a incêndio que transcenda os

aspectos técnicos e legais é imperativa para a criação de ambientes profissionais e

de lazer mais seguros. Além da ação do poder público, é preciso que a população

seja parte atuante nesse processo. São necessárias mudanças de mentalidade e de

atitude da sociedade como um todo, promovendo ações efetivas para implantar uma

cultura de prevenção e combate a incêndio, de modo resguardar a vida humana e

preservar seu patrimônio.

16

2 DESENVOLVIMENTO

Uma cultura efetiva de prevenção e combate a incêndio engloba diferentes

elementos, como conhecimentos técnicos para dimensionamento de sistemas mais

inteligentes para antever, prevenir ou minimizar o seu risco de incidência;

legislações claras e de fiscalização efetiva; além de bons hábitos comportamentais

por parte da sociedade.

2.1 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Para compreendermos razoavelmente os fatores que envolvem um incêndio,

devemos primeiramente entender a complexa ciência do fogo e das variáveis que o

compõem, como geração, manutenção, propagação e os respectivos mecanismos

de prevenção, proteção e combate.

2.1.1 Fogo

A descoberta do fogo foi o mais importante avanço alcançado pela

humanidade na pré-história. A partir dele foram possíveis os avanços tecnológicos

obtidos pelo homem até os dias de hoje. A própria sobrevivência da humanidade se

deve a ele: através do fogo, o homem primitivo encontrava abrigo e proteção contra

animais selvagens, aquecimento em épocas gélidas, utilizava tochas rudimentares

para auxiliar na caça, entre outros.

Aos poucos, o homem passou a conhecer o poder do fogo e, gradualmente, a

controlá-lo. “Após a Segunda Guerra Mundial o fogo começou a ser encarado como

ciência; complexa, pois envolvia conhecimentos de física, química, comportamento

humano, toxicologia, engenharia, etc.” (SEITO et al., 2008, [p. 7]). O fogo segue

sendo fundamental para a humanidade, sendo uma excelente fonte de energia,

propiciando diversos usos e aplicações. Entretanto, seu controle ainda não é de

17

domínio pleno e satisfatório do homem, e sua ocorrência pode ser de extremo perigo

à vida humana e ao seu patrimônio.

Sob o ponto de vista de segurança de uma edificação, o fogo é uma calamidade imprevisível capaz de causar enormes danos materiais e perdas de vidas humanas. Para se fazer a prevenção ou o combate a incêndios de uma forma eficiente, deve-se conhecer a mecânica do fogo em todos seus aspectos: causas, formação e suas consequências. (BRENTANO, 2005, p. 15).

2.1.1.1 A química do fogo

Quimicamente, o fogo pode ser definido como uma reação de oxidação

altamente exotérmica de um substrato (combustível) com o oxigênio (comburente),

resultando em gás carbônico (CO2) e água (H2O), além da liberação de energia na

forma de calor e de luz (na maioria dos casos). Para que a reação de combustão

aconteça, são necessários três componentes básicos: combustível, comburente e

calor. Com esta tríade formada, basta apenas uma fonte de ignição (como uma

faísca, por exemplo) para que inicie a reação. Entretanto, caso a temperatura do

sistema atinja o “ponto de ignição” (também chamado de “temperatura de

autoignição” ou simplesmente “temperatura de ignição”) do combustível, a reação

ocorre espontaneamente, mesmo sem a presença de uma fonte ignitora.

Após o início da reação, o calor gerado pela combustão é utilizado pelo

sistema para ativar e desencadear mais reações das demais partículas combustíveis

presentes no sistema, promovendo a manutenção do fogo através de uma reação

em cadeia que se perpetuará até que o substrato combustível se esgote ou que a

reação seja extinta por ação externa (serão apresentados na sequência deste

trabalho os diferentes mecanismos existentes de ação extintora). A Figura 2 ilustra a

tríade e o tetraedro do fogo com os elementos necessários para se iniciar e se

manter uma a reação de combustão.

18

Figura 3 – Triângulo e quadrado (tetraedro) do fogo Fonte: (BRENTANO, 2005, p. 15)

Sobre os componentes do fogo:

a) combustível: toda matéria suscetível à queima (normalmente substratos

ricos em carbono), podendo estar nos estados sólido, líquido ou gasoso;

b) comburente: Substância que reage com o combustível, produzindo o fogo,

sendo o oxigênio (O2) o comburente mais comum (presente no ar

atmosférico);

c) calor: energia necessária para o início e manutenção do fogo, sendo

gerada também na própria combustão;

d) reação em cadeia: elemento que torna a queima autossustentável

enquanto houver os três demais componentes (combustível, comburente e

calor). O calor gerado aquece o material combustível, desprendendo

partículas (pirólise) e propiciando novas reações com o comburente, que

por sua vez irão gerar mais calor, gerando mais reações em um ciclo que

irá se perpetuar até que um dos componentes (combustível, comburente

ou calor) se esgote ou seja removido do sistema.

Apesar da combustão se manifestar em materiais combustíveis de diferentes

estados de agregação (líquido, sólido ou gasoso), a reação, a nível molecular, se dá

sempre no estado gasoso. Em materiais sólidos e líquidos, o calor inicial aquece o

material e libera vapores combustíveis, até o ponto em que a proporção

estequiométrica é atingida. A partir de então, com o sistema aquecido e com os

gases reagentes em contato, é necessária apenas uma fonte ignitora para o início

da combustão. Conforme citado anteriormente, caso o sistema atinja a temperatura

de autoignição do material, não é necessária uma fonte de ignição para que o fogo

seja iniciado.

19

O fogo para ser iniciado e se manter no material combustível sofre influência de vários fatores tais como: estado da matéria (sólido, líquido ou gasoso), massa específica, superfície, calor específico, calor latente de evaporação, ponto de fulgor, ponto de ignição, mistura inflamável (explosiva), quantidade de calor, composição química, quantidade de oxigênio disponível, umidade, etc. As diferenças do comportamento dos materiais combustíveis na ignição e na manutenção do fogo podem ser explicadas por meio desses fatores. (SEITO et al., 2008, p. 36).

Em incêndios, a reação de combustão (principalmente em substratos sólidos)

nuca será completa, gerando diversos resíduos como subprodutos, tais como

cinzas, fuligem, vapores e gases de diferentes tipos, dependendo da composição do

material combustível. Os gases, a fuligem e os vapores gerados são os subprodutos

mais perigosos à vida, principalmente quando o incêndio ocorre em locais fechados

e/ou com exaustão insatisfatória. A fumaça (mistura de fuligem, vapores e gases) é

um elemento asfixiante, podendo ser tóxica e levar a óbito em um breve intervalo de

tempo, sendo a principal causa de mortes em sinistros deste tipo. Em adição, a

fumaça atrapalha a visibilidade, promovendo confusão espacial no interior do prédio,

acentuando o pânico e dificultando a evacuação do local.

Os produtos gerados na reação de combustão, segundo Brentano (2007),

podem ser variados, dependendo da composição dos substratos combustíveis,

podendo haver formação de:

a) vapores: produtos gerados na combustão e que apenas se mantém no

estado gasoso enquanto aquecidos, vindo a se condensar ou a se

solidificar após o resfriamento. Pode causar a morte dependendo das

seguintes variáveis: toxicidade do vapor, concentração, tempo de

exposição e características das pessoas expostas;

b) gases: são substâncias liberadas na combustão que se mantêm na forma

gasosa mesmo após o resfriamento do ambiente. Os gases, da mesma

forma que os vapores, dependendo da concentração, do tempo de

exposição e das características das pessoas expostas, podem levar a

óbito rapidamente. Entre os gases liberados na combustão, o mais

perigoso é o monóxido de carbono (CO), gerado quando há combustão

incompleta (quantidades/proporções estequiométricas insuficientes de

reação entre o comburente e o combustível). O monóxido de carbono é

20

um agente asfixiante altamente perigoso por ser incolor, inodoro e

insípido, chamado de “assassino silencioso”;

c) fumaça: é constituída por três elementos: vapores, gases e fuligem

(partículas sólidas finamente divididas e extremamente leves, de

assentamento demorado). Sendo uma mistura dos demais produtos, a

fumaça é fator que pode a representar maior risco à vida humana em

ambientes pouco ventilados. Além da toxicidade combinada de seus

componentes, a fuligem dificulta a visibilidade, acentuando o pânico e

dificultando a evacuação. As fumaças mais densas e perigosas são as

oriundas de incêndios onde há pouca oferta de oxigênio, configurando

combustão incompleta e gerando fuligem (fumaça negra), monóxido e

carbono e outros subprodutos perigosos Já fogos em ambientes bem

ventilados geram menor volume de fumaça.

A Figura 4 apresenta os gases mais comuns gerados na combustão de

materiais ignifico, bem como seus efeitos e suas respectivas toxicidades (SEITO,

1996, apud BRENTANO, 2007, p. 94).

Figura 4 – Gases gerados na combustão de materiais combustíveis

Fonte: (SEITO, 1985, apud BRENTANO, 2007, p. 94)

2.1.2 Mecanismos de Ignição dos materiais combustíveis

21

Os materiais combustíveis possuem diferentes mecanismos de ignição,

dependendo do seu estado de agregação (sólido, líquido ou gasoso).

2.1.2.1 Combustível sólido

O combustível sólido, quando exposto a um determinado nível de energia (na

forma de calor, transmitido ao sistema por condução, convecção ou radiação), sofre

pirólise, um processo de decomposição térmica que gera produtos gasosos (gases e

vapores). Esses produtos, em contato com o oxigênio do ar, formam uma mistura

inflamável e muitas vezes explosiva, dependendo das condições de temperatura,

umidade do ar e proporções estequiométricas entre os componentes. A mistura

inflamável, na presença de uma fonte ignitora (como uma chama ou mesmo uma

faísca, por exemplo), gera fogo (SEITO, 2008). A Figura 5 apresenta os mecanismos

de ignição para um combustível sólido.

Figura 5 – Mecanismo de ignição de um combustível sólido

Fonte: (SEITO, 2008, p. 37)

Após o início da reação, se o calor se mantiver em um patamar favorável,

ocorrerá uma reação em cadeia que dará continuidade à combustão, até que o

sistema se esgote (naturalmente ou por ação externa) em algum dos reagentes ou

seja resfriado por ação externa.

2.1.2.2 Combustível líquido

O combustível líquido é de ignição mais fácil em relação aos combustíveis

sólidos, pois não necessitam de um grau de energia tão alto para gerar a mistura

22

inflamável. Os combustíveis líquidos não sofrem pirólise, e sim evaporação, gerando

a mistura inflamável a uma temperatura bem mais baixa que os materiais sólidos.

Após a mistura inflamável atingir uma proporção estequiométrica favorável, a reação

de combustão é desencadeada na presença de uma fonte ignitora. A Figura 6

apresenta o mecanismo de combustão de combustíveis líquidos.

Figura 6 – Mecanismo de ignição de um combustível líquido Fonte: Seito (2008, p. 37)

A taxa de evaporação de um líquido é proporcional ao seu aquecimento,

sendo uma característica intrínseca do líquido. Isso permite, nos líquidos

inflamáveis, a determinação dos seus respectivos pontos de fulgor e ponto de

combustão (SEITO, 2008).

Os líquidos ignificos são classificados em dois grupos: inflamáveis e

combustíveis. Segundo a norma regulamentadora 20 (NR 20) do Ministério do

Trabalho e Emprego (MTE), são considerados líquidos inflamáveis os líquidos que

possuem ponto de fulgor (ver item 2.1.1.3) menor ou igual 60º C; ao passo que

líquidos combustíveis são aqueles cujo ponto de fulgor é maior do que 60º C e

menor ou igual a 93º C (BRASIL, 2012).

2.1.2.3 Combustível gasoso

Um elemento é considerado gasoso quando se apresenta na forma gasosa à

temperatura ambiente. Este tipo de combustível é o de maior facilidade de

combustão. Ao se misturar com o ar, forma-se a mistura inflamável (ou explosiva),

entrando em ignição ao entrar em contato com uma fonte de ignição. O mecanismo

para combustíveis gasosos é apresentado na Figura 7.

23

Figura 7 – Mecanismo de ignição de um combustível sólido

Fonte: Seito (2008, p. 37)

De modo geral, os combustíveis gasosos são compostos pelas frações mais

leves do petróleo. Entretanto há combustíveis conhecidos que não se originam do

petróleo, como hidrogênio, monóxido de carbono, amônia e dissulfeto de carbono,

entre outros (SEITO, 2008 p. 38).

Segundo a NR 20 (BRASIL, 2012), são classificados gases inflamáveis os

gases que, em mistura com o ar, inflamam a uma temperatura de 20º C e a uma

pressão padrão de 101,3 kPa.

2.1.3 Temperaturas Características

Nos mecanismos de ignição e combustão de materiais combustíveis, três

temperaturas características específicas merecem atenção especial (BRENTANO,

2007, p. 92):

a) ponto de fulgor (flash point ou “temperatura de inflamação”): temperatura

mínima na qual um material combustível (sólido ou líquido), apresenta

liberação de vapores em quantidade suficiente para formar uma mistura

vapor-ar que, ao entrar em contato com uma fonte de ignição, gera um

“lampejo” (“flash”) de chama, porém sem manutenção de fogo devido à

quantidade dos vapores combustíveis liberados serem insuficientes para

tanto. Assim o ponto de é caracterizado pela formação de uma chama de

curta duração (menor do que 5 segundos). Quando menor o ponto de

fulgor, menor a temperatura que os vapores começam a ser liberados,

tornando o material mais suscetível à ação das fontes de ignição. Em

combustíveis sólidos, a formação de vapores se dá por pirólise, ao passo

que em líquidos os vapores são gerados por efeito da evaporação;

24

b) ponto de combustão (“fire point” ou “temperatura de combustão”):

corresponde à temperatura mínima em que um material combustível

começa a liberar vapores em volume suficiente para a formação de uma

mistura de vapor e oxigênio atmosférico inflamável e que se manterá em

combustão após o início da reação, mesmo retirada a fonte ignitora inicial.

O ponto de combustão se encontra um pouco acima do ponto de fulgor

(alguns graus mais alto);

c) ponto de ignição (temperatura de auto inflamação, ignição, ou

autoignição): corresponde à menor temperatura, à pressão atmosférica

normal, em que os vapores desprendidos de um material, sólido ou

líquido, entram em combustão ao entrarem em contato com o oxigênio do

ar, mesmo sem qualquer fonte de ignição. O ponto de ignição é muito

mais alto que os pontos de fulgor e de combustão.

2.1.4 Meios de propagação do fogo

Os mecanismos físicos que possibilitam a propagação do fogo estão ligados

às formas de transmissão do calor, sendo elas a condução (contato direto), a

convecção e a radiação.

2.1.4.1 Propagação do fogo por condução

O calor propagado pelo meio condutivo, como o próprio nome diz, é a

transferência associada ao contato direto, propagado através de um meio físico. Em

um incêndio, o calor pode se transferir por condução através dos materiais, que se

aquecem e vão aquecendo os outros materiais em contato direto; ou por contato

direto da chama, que pode alcançar outros andares e mesmo outros prédios

adjacentes (dependendo da distância entre eles), através de janelas ou outras

aberturas, incendiando cortinas ou outros materiais, propagando o fogo pela

25

edificação (BRENTANO, 2007, p. 98). A Figura 8 apresenta um exemplo de

propagação do fogo por condução.

Figura 8 – Propagação do calor por condução

Fonte: (BRENTANO, 2007, p. 98)

2.1.4.2 Propagação do fogo por convecção

A transmissão de calor por convecção é dada pelo movimento do fluido

aquecido (ar, gases ou vapores) que circula pelo ambiente fechado, aquecendo os

materiais que entram em contato com a massa quente, elevando os componentes

inflamáveis até seus pontos de combustão. A massa aquecida circula por toda a

edificação, passando através de aberturas e propagando o fogo para os demais

ambientes e cômodos através do aquecimento dos materiais combustíveis

presentes. No caso de vento externo, além do aumento das chamas pela

oxigenação do fogo, ainda há o risco da transferência de fagulhas e partículas

incandescentes para outros cômodos, acelerando ainda mais a propagação do

incêndio (BRENTANO 2007, p. 98). A Figura 9 apresenta um exemplo de

propagação de fogo via convecção em uma edificação.

26

Figura 9 – Propagação do calor por convecção

Fonte: (BRENTANO, 2007, p. 99)

2.1.4.3 Propagação do fogo por radiação térmica (irradiação)

A propagação do calor via radiação térmica (ou irradiação) se dá por meio

eletromagnéticos (radiações de calor), não necessitando meios materiais, podendo

acontecer no vácuo. A terra, por exemplo, é aquecida pelo sol (energia solar) via

radiação, que atravessa o vácuo e chega até nós, sendo absorvida na forma de

calor. As ondas eletromagnéticas associadas à radiação térmica estão na faixa do

infravermelho (IV), e são liberadas por todo corpo que possui em si um pouco de

energia (calor). Corpos com temperaturas mais altas irradiam em maior intensidade,

ao passo que corpos menos aquecidos liberam menor radiação. Em um incêndio,

grande parte da energia é propagada na forma de radiação térmica, que em muitos

casos é suficiente para aquecer objetos e componentes da edificação até entrarem

em combustão. A emissão de energia radiante depende da carga térmica existente

no incêndio e da área de fogo exposta, bem como a absorção dessa energia

depende das propriedades e características (cor, forma geométrica, rugosidade,

etc.) do material que está recebendo a radiação. A Figura 10 apresenta um exemplo

de propagação de calor via irradiação.

27

Figura 10 – Propagação do calor por radiação térmica

Fonte: (BRENTANO, 2007, p. 99)

Segundo Brentano (2007), normalmente um incêndio envolve a combinação

das três formas de propagação.

O comportamento do fogo é complexo e sua propagação, muitas vezes, imprevisível. As propagações do fogo e do calor podem ocorrer nas três formas citadas, são geralmente concomitantes, embora em determinados momentos uma delas possa predominar sobre as demais. A proximidade entre edificações é um fator muito importante a ser considerado no projeto, e o isolamento adequado entre elas evita a possibilidade da geração de novos incêndios. (BRENTANO, 2007, p. 100).

2.1.5 Fases e estágios de evolução de um incêndio

28

São muitas as variáveis e fatores que determinam o início e o

desenvolvimento de um incêndio, bem como o comportamento do fogo, alterando

sua velocidade, sua intensidade e sua propagação, tornando seu estudo complexo.

Deste modo, pode-se afirmar que nenhum incêndio é igual a outro, pois a

combinação entre as variáveis são praticamente infinitas.

Podem-se citar fatores como (SEITO 2008, p 43):

a) forma geométrica e dimensões da sala ou local. b) superfície específica dos materiais combustíveis envolvidos. c) distribuição dos materiais combustíveis no local. d) quantidade de material combustível incorporado ou temporário. e) características de queima dos materiais envolvidos. f) local do início do incêndio no ambiente. g) condições climáticas (temperatura e umidade relativa) h) aberturas e ventilação do ambiente. i) abertura entre ambientes para propagação do incêndio. j) projeto arquitetônico do ambiente ou edifício. k) medidas de prevenção de incêndio existentes. l) medidas de proteção contra incêndio instaladas.

Segundo Seito (2008) evolução do incêndio possui três fases distintas,

compreendendo quatro estágios. Na primeira fase (compreendendo o estágio de

pré-ignição), o incêndio é “embrionário”, de início normalmente lento. Após o

aquecimento do ambiente até certa temperatura, inicia-se a segunda fase, que é

caracterizada pela ignição e pelo desenvolvimento do fogo (estágios de “crescimento

do incêndio” e “incêndio desenvolvido”). Na segunda fase, ao ambiente atingir a

temperatura de flash over (em média 600ºC), haverá inflamação generalizada, com

o ambiente sendo tomado por grandes labaredas. A terceira fase, correspondendo

ao estágio de “extinção do fogo”, é caracterizada pelo abaixamento gradual da

temperatura do ambiente, ocasionada pelo esgotamento do material combustível. A

Figura 11 apresenta um exemplo de curva de evolução de um incêndio.

29

Figura 11 – Curva de evolução de um incêndio celulósico em uma edificação

Fonte: (Adaptado de ISO/TRE3814:1989(E) apud SEITO (2008, p. 44), grifo nosso)

2.1.6 Classes de fogo

O fogo pode ser classificado em seis classes, de acordo com o material

combustível, sendo elas: “A”, “B”, “C”, “D”, “K” e “I”:

a) classe A: os tipos de fogo integrantes da classe A ocorrem em materiais

sólidos comuns e que deixam resíduos, como papéis, madeiras, tecidos,

plásticos, entre outros. Os materiais desta classe queimam em superfície

e profundidade. Quando a queima atinge níveis mais internos do material,

a oferta de oxigênio diminui, ocasionando combustões incompletas e

gerando, assim, resíduos como cinzas, fuligem e brasas. Pelo fato destes

materiais não serem incompatíveis com a água, a extinção do fogo para

estes materiais dá pelo resfriamento gerado pela sua adição. Além da

Fase 1 Fase 2 Fase 3

30

água, o abafamento pode ser utilizado como complemento (ação

secundária) na extinção (CASAOLIVETI, [201-?]);

b) classe B: este tipo de fogo se dá em líquidos (combustíveis ou inflamáveis,

como óleos combustíveis, álcool, gasolina, etc.) e em gases inflamáveis

(como gás natural, gás liquefeito de petróleo, acetileno, hidrogênio, entre

outros). A combustão nestes materiais, por se dar em gases e em líquidos

(a queima ocorre somente na superfície), normalmente não deixa resíduos

(devido à boa oferta de oxigênio, não há queima incompleta). Nestes

materiais, a extinção se dá por abafamento, pela quebra da reação em

cadeia, e/ou pela remoção do material combustível. Para a Classe B, os

agentes extintores podem ser produtos químicos secos, gases inertes,

água sob forma de neblina, líquidos vaporizantes e espuma mecânica,

sendo esta última o agente mais eficiente (BRENTANO, 2007, p. 101);

c) classe C: os fogos desta classe são os que ocorrem em equipamentos

elétricos energizados. Nestes casos o agente extintor não deve ser

condutor de eletricidade. Exemplos de agentes extintores para a classe C

são gases (como o gás carbônico, amplamente utilizado), pó químico seco

e líquidos vaporizantes (BRENTANO, 2007, p. 101);

d) classe D: esta classe de fogo compreende os metais pirofóricos, como

magnésio, selênio, antimônio, lítio, potássio, alumínio fragmentado, zinco,

titânio, sódio, urânio e zircônio (CASAOLIVETI, [201-?]). Esses metais

devem ser manuseados e estocados em atmosfera inerte ou em óleos

minerais, evitando o contato com a água ou com o ar, se este possuir

teores elevados de umidade ou de hidrogênio. Alguns metais reagem

violentamente com estes componentes, podendo entrar em entrar em

ignição instantaneamente, podendo provocar incêndios e explosões. A

extinção em fogos e incêndios nestes materiais é feita através do

isolamento do metal da atmosfera reativa e através de resfriamento

(PROTEGE, 2006);

e) classe K: esta classe de fogo se em óleos, gorduras, graxas e banhas

utilizados para fritura em cozinhas residenciais e industriais. Neste caso, a

extinção do fogo se dá por abafamento, através do uso de agentes

químicos alcalinos, como bicarbonato de potássio (ou bicarbonato de

31

sódio “Pós BC”), que reagem com o óleo em uma reação de

saponificação, gerando a espuma que abafará o fogo (PROTEGE, 2006);

f) classe I: fogos da classe I ocorrem em equipamentos que utilizam

materiais radioativos. Neste tipo de incêndio são necessárias ações e

abordagens de extinção diferenciadas, em função dos riscos da radiação

no local.

2.1.7 Agentes extintores

Existem muitos tipos de agentes extintores. Cada agente atua de maneira

especifica sobre a reação de combustão, através de uma ou mais formas de

extinção/controle.

Os agentes extintores devem ser utilizados de forma criteriosa, observando a sua correta utilização e o tipo de classe de incêndio, tentando sempre que possível minimizar os efeitos danosos do próprio agente extintor sobre materiais e equipamentos não atingidos pelo incêndio. (CORPO DE BOMBEIROS MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, [2008?], p. 24).

Os agentes extintores mais utilizados são água, espuma, gás e pó químico.

2.1.7.1 Água

A água é considerada o agente extintor "universal" devido a sua abundância e

pela elevada gama de formas de emprego, podendo ser aplicada em diversas

classes de fogo. Além da facilidade de obtenção, a água possui a vantagem de não

ser, na maioria dos casos, quimicamente incompatível com os materiais em que é

posta em contato, tornando-a uma alternativa eficiente e viável em diversas ocasiões

(CORPO DE BOMBEIROS MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, [2008?]).

32

A água age, como agente de extinção, basicamente por resfriamento e por

abafamento, podendo ainda, adicionalmente, agir por emulsificação e/ou por

diluição, de acordo com a maneira como é empregada.

Para incêndios em fase inicial, com fogo baixo, o jato sólido de água se

mostra um bom método de extinção. Entretanto, para incêndios já estabelecidos as

formas mais eficientes de aplicação da água são sob as formas de neblina e de

“chuveiro” (CORPO DE BOMBEIROS MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO,

[2008?]).

Apesar de historicamente, por muitos anos, a água ter sido aplicada no combate a incêndio sob a forma de jato pleno, hoje sabemos que a água apresenta um resultado melhor quando aplicada sob a forma de jato chuveiro ou neblinado, pois absorve calor numa velocidade muito maior, diminuindo consideravelmente a temperatura do incêndio, consequentemente extinguindo-o. (CORPO DE BOMBEIROS MILITAR DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, [2008?], p. 24-25). A água na forma de neblina apresenta o máximo de superfície em relação ao conteúdo líquido que a compõe. Disso resulta a máxima capacidade prática para absorção do calor. A quase totalidade de água assim empregada no combate a incêndios é transformada em vapor, que continua agindo por abafamento, quando aumentando dessa forma o poder extintor da água, sobretudo quando em locais confinados (FERREIRA, 1987, apud SEITO, 2008, p. 233). A água aplicada na forma de neblina possibilita o máximo de utilização da capacidade de absorver o calor (cerca de 90% da água se transforma em vapor). No sistema de hidrantes e de mangotinhos, o emprego do jato em forma de neblina é eficiente tanto na extinção de incêndio confinado com na extinção de incêndio aberto e em líquidos inflamáveis. (SEITO, 2008, p. 233)

2.1.7.2 Espuma

A espuma é composta por um aglomerado de bolhas de ar ou gás (CO2)

constituídas de películas de água resultantes da adição de um agente espumante. O

mecanismo de formação da espuma visa gaseificar a água, diminuindo sua

densidade, de modo que flutue sobre outros líquidos. Dentre os principais métodos

de produção de espuma destacam-se o químico e o mecânico.

33

Método químico: o extintor contém soluções de bicarbonato de sódio e sulfato

de alumínio, quando invertida sua posição proporciona a mistura dessas soluções na

presença de um elemento estabilizador, permitindo a geração de espuma

proveniente desta reação. Atualmente este método encontra-se em desuso.

Método mecânico: baseia-se no processo de Venturi, consistindo na

passagem de água em alta velocidade por um dispositivo (Venturi) de modo a criar

uma pressão negativa e propiciar o arraste do agente espumígeno pelo tubo de

Pitot, sendo assim misturado à água. Esse composto quando lançado sobre uma

tela produz a denominada espuma mecânica.

Quanto ao mecanismo de ação da espuma no combate ao fogo, pode-se

afirmar que atua primordialmente como agente extintor, eliminando o fogo por meio

de abafamento (eliminação do oxigênio do meio reacional). Adicionalmente, verifica-

se que a presença da água em sua composição proporciona resfriamento.

A espuma deve ser utilizada em incêndios da classe "B", entretanto deve-se

observar que tratando-se de incêndios em presença de álcool e acetona (entre

outros) exigem um tipo especial de espuma, a fim de evitar transbordamentos.

Ressalta-se que: “[...] a espuma por ser um composto aquoso não deve ser

aplicada em incêndios da classe "C" sob risco de eletrocussão do usuário do

extintor.” (EGEFAZ,[20--?], p. 9).

2.1.7.3 Gás

Este agente pode ser classificado em três tipos básicos: gases inertes; gases

ativos e gás carbônico.

2.1.7.3.1 Gases inertes

Os gases inertes (gases não reativos em situações normais) são utilizados no

combate a incêndios com a finalidade de promover a redução da concentração de

oxigênio presente no ar. Esses gases costumam ser compostos de argônio e

34

nitrogênio, e estão disponíveis no mercado por produtos como “Argonite”, “Argon” e

“Inergen”. A utilização de gases inertes deve ser feita com cuidado, afim de não

deixar o ambiente com uma concentração de oxigênio abaixo do mínimo

recomendado para a respiração humana. (SEITO et al., 2008, p. 280).

2.1.7.3.2 Gases ativos

O princípio de funcionamento dos agentes ativos na eliminação do fogo

baseia-se na redução/eliminação da energia térmica (calor) por meio de sua ação de

resfriamento e na interrupção da reação química em cadeia (reação de combustão)

pela inibição da reação química entre combustível e comburente. Os citados gases

podem ser constituídos por diversos grupos químicos (não restringidos no Protocolo

de Montreal (1987)), apresentando-se na forma de misturas de elementos químicos

não asfixiantes. (SEITO, 2008, p. 280).

2.1.7.3.3 Gás Carbônico

O CO2 é um gás inodoro e atóxico, que conduz eletricidade e não gera

resíduos corrosivos. Trata-se de um gás frequentemente utilizado em extintores

(portáteis e industriais) para a proteção de ambientes e/ou equipamentos na

presença de geradores/fontes de energia elétrica, laminadores, máquinas,

equipamentos, tanques de óleo, fornos, dutos, líquidos inflamáveis, entre outros. O

gás carbônico atua reduzindo os níveis de oxigênio do ambiente a ser protegido,

extinguindo o fogo por abafamento (SEITO, 2008, p. 281).

2.1.7.4 Pó químico

35

Existem diversos tipos de pós utilizados na eliminação do fogo, sendo o mais

usual composto de bicarbonato de sódio finamente pulverizado. Sua atuação baseia-

se primordialmente na eliminação/mitigação do oxigênio (abafamento). O pó químico

seco combina-se com os radicais livres da combustão de modo a suspender o

processo de reação em cadeia, impedindo a retroalimentação da combustão. Possui

ainda uma ação secundária: o resfriamento, promovido pela produção de CO2 e

vapor d'água resultantes da queima do bicarbonato (EGEFAZ, [20--?]).

O pó químico pode ser utilizado para combater incêndios das classes "A","B"

e "C". Entretanto, sua eficiência é mais significativa nas classes "B" e "C" (EGEFAZ,

[20--?]).

Ressalta-se atentar para o fato de que o pó químico jamais deve ser aplicado

sobre equipamentos elétricos, eletrônicos, computadores, motores mecânicos,

carburadores, entre outros, visto que, devido sua penetrabilidade e seu elevado

poder corrosivo danificariam o equipamento, tornando-o definitivamente inoperante

(EGEFAZ, [20--?]).

2.1.8 Métodos de extinção do fogo

Visto que o fogo é iniciado e mantido pelo tetraedro combustível-comburente-

calor-reação em cadeia, para que possamos extingui-lo basta que consigamos

interromper a reação em cadeia ou que removamos qualquer um dos demais

elementos (reagentes ou calor), o que, em muitos casos, não é simples de ser

executado.

Os principais agentes extintores do fogo são a água, espuma aquosa, gases

inertes e pós químicos secos. Já os métodos de extinção do fogo são:

a) extinção por isolamento (retirada do combustível): dependendo da

situação e da configuração do sistema, é possível extinguir o fogo pela

remoção do combustível, como em casos onde o fogo é mantido, por

exemplo, pelo vazamento de combustível em uma linha de gás, onde

fechando-se a válvula que abastece o foco do incêndio, extingue-se o

mesmo. Ou em incêndios na superfície de poças de óleo diesel, onde a

36

remoção do óleo pela drenagem possibilita a extinção do fogo

(BRENTANO, 2007, p. 102);

b) extinção por abafamento (remoção do comburente): outra forma de

extinção é o método de abafamento, que consiste em minimizar a oferta

de oxigênio do ar que chega ao material em combustão. É um método de

difícil execução em incêndios de grandes proporções, sendo possível

apenas em incêndios internos e/ou de baixas proporções. O abafamento

pode ser realizado através do uso de espuma aquosa; fechamento do

local e através do uso de gases inertes, como o dióxido de carbono (CO2).

O fechamento do local ocasiona a redução da concentração de oxigênio

no ambiente, que se consome na reação e, não havendo entrada do

comburente no ambiente, a reação se extingue. Já os agentes “espuma

aquosa” e “gás inerte” atuam literalmente abafando o combustível,

ocupando o espaço do ar que estava em contato com o combustível,

cobrindo-o e assim os separando (BRENTANO, 2007, p. 102);

c) extinção por resfriamento (quebra da reação em cadeia pela retirada do

calor): a extinção por resfriamento é o método mais comum utilizado em

edificações, sendo a água o agente extintor mais utilizado. O agente de

resfriamento absorve o calor do sistema, diminuindo a temperatura do

material combustível. Assim, a geração de gases e de vapores oriundos

dos materiais combustíveis é reduzida, diminuindo a concentração da

mistura inflamável. Assim, com a diminuição da atmosfera reativa pela

interrupção da reação em cadeia (o calor gerado no fogo passa a ser

absorvido pelo agente de resfriamento ao invés de ser absorvido pelo

material, que para de emitir vapores e gases), o fogo começa a ser

controlado até sua total extinção (BRENTANO, 2007 p. 102);

d) extinção química (quebra da reação em cadeia pela ação química): este

método consiste no lançamento de determinados agentes químicos

extintores ao foco de incêndio. Os agentes, pela ação do calor, se

dissociam, gerando íons que se combinam com os componentes da

mistura inflamável, gerando uma nova mistura inerte, interrompendo, deste

modo, a reação em cadeia (BRENTANO, 2007, p. 102).

37

2.1.9 Medidas de proteção e combate ao fogo

As medidas de proteção contra incêndio são dividias em dois grupos básicos:

Medidas passivas de proteção - Medidas preventivas que devem ser

implementadas desde as fases de projeto e construção da edificação; e Medidas

ativas de proteção – Medidas combativas que englobam a ação concreta de

extinção do incêndio, agindo na detecção, alarme e extinção do fogo.

2.1.9.1 Medidas de proteção passiva

A proteção passiva contra incêndio é constituída por mecanismos de proteção

incorporados à edificação no momento de sua construção, não exigindo nenhum tipo

de acionamento para o seu funcionamento em casos de incêndio. Os mecanismos

de proteção passiva possuem usos que atendem às necessidades dos usuários em

situação normal de funcionamento da edificação, porém possuem especial

importância em situações de incêndio, retardando o crescimento/alastramento do

fogo, impedindo ou minimizando emissões de fumaça, possibilitando evacuação

rápida e segura para os ocupantes do prédio, entre outras finalidades. Alguns

exemplos de proteção passiva são: controle de materiais de acabamento e

revestimento, proteção das rotas de fuga, compartimentação e isolamento de riscos

(SEITO, 2008, p. 169).

2.1.9.2 Medidas de proteção ativa

As medidas de proteção ativa possuem a função de complementar as

medidas de proteção passiva, sendo compostas basicamente de equipamentos e

instalações prediais que apenas são acionadas, manual ou automaticamente, em

caso de emergência, não exercendo nenhuma função em situação normal de

funcionamento da edificação (SEITO, 2008, p. 130).

38

As principais medidas de prevenção ativa em combate a incêndios são:

detecção e alarme (manual ou automático); extinção (manual e/ou automática);

Iluminação e sinalização de emergência; e controle de movimento de fumaça

(SEITO, 2008, p. 130).

2.1.10 Sistemas de extinção do fogo

Os sistemas de extinção de incêndios podem ser fixos ou móveis:

a) sistemas móveis: extintores clássicos de incêndio e obrigatórios em todas

as construções. Possuem acionamento manual e podem ser portáteis ou

sobre rodas;

b) sistemas fixos: constituídos por rede de canalizações fixadas na

edificação, possuindo a água como agente extintor. Podem ser divididos

em sistemas de acionamento manual (sob comando): hidrantes e

mangotinhos; e sistemas de acionamento automático: sistema de

sprinklers e sistema de água (bicos nebulizadores).

2.1.10.1 Sistemas móveis

Conforme supracitado, os sistemas móveis de combate ao fogo são

compostos por extintores de incêndio.

Extintores são equipamentos básicos de proteção contra fogo e obrigatórios

em qualquer edificação ou área de risco. São utilizados para debelar princípios

de incêndio, uma vez que se tornam ineficazes quando o incêndio toma grandes

proporções. Um extintor é constituído basicamente de um cilindro de aço contendo

em seu interior o agente extintor e o agente expelente. Seu acionamento é manual,

por gatilho (BRAATZ, 2013).

Extintores são classificados quanto à sua massa total. Extintores portáteis

são equipamentos de até 20 kg e que podem ser carregados e operados por uma

única pessoa. Já os extintores sobre rodas são extintores com peso superior a 20

39

kg, sendo montados sobre rodas para viabilizar o translado e operação. Extintores

sobre rodas podem necessitar mais de uma pessoa para sua operação. A Figura 12

apresenta exemplos de extintores portáteis e sobre rodas.

Figura 12 – Extintores portáteis e sobre rodas

Fonte: (EXTINPAG [20--?])

A classificação dos extintores segue a classificação dos tipos de fogo, de

acordoo com a natureza do material combustível (ver seção 2.1.6). A Figura 13

apresenta algumas classes de fogo e suas respectivas representações gráficas

indicativas para utilização de extintores.

Figura 13 – Representações gráficas indicativas de classes de fogo em

função do material combustível

40

Fonte: (KIDDE, [20--?])

Os agentes de extinção utilizados em extintores são: água; Pó para extinção

de incêndio; espuma mecânica; gás carbônico; e halogenados. A carga de agente

pode ser expressa em unidades de massa (kg) ou volume (litros) (SEITO, 2008).

A capacidade extintora de um extintor é a medida do poder de extinção do

fogo de um extintor, obtida em ensaios práticos normalizados (ASSOCIAÇÃO

BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS, 2013).

Segundo Seito (2008), os seguintes os fatores devem ser considerados os

seguintes fatores na seleção de extintores de incêndio, tanto portáteis quanto sobre

rodas:

a) Classe de fogo que com mais frequência possam ocorrer no local a ser protegido pelo extintor. b) Tamanho do princípio de incêndio que possa ocorrer e seu desenvolvimento de calor e fumaça. Esse último é um fator muito importante para a escolha de extintor de maior capacidade extintora e alcance do agente extintor. c) Tipo de risco da edificação, que é classificado em: baixo, médio ou alto. (SEITO, 2008, p. 227).

Segundo a norma NBR 12693 (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS

TÉCNICAS, 2013), a capacidade extintora mínima para que um extintor portátil

possa ser considerado uma “unidade extintora” é:

a) carga d’água: extintor com capacidade extintora de no mínimo 2-A b) carga de espuma mecânica: extintor com capacidade extintora de

no mínimo 2-A:10-B c) carga de dióxido de carbono (CO2): extintor com capacidade

extintora de no mínimo 5-B:C d) carga de pó BC: extintor com capacidade extintora de no mínimo

20-B:C e) carga de pó ABC: extintor com capacidade extintora de no mínimo

2-A:20-B:C f) carga de halogenado: extintor com capacidade extintora de no

mínimo 5-B:C.

Em casos de extintores sobre rodas, a norma NBR 12693 estabelece os

seguintes critérios para:

a) carga d'água: extintor com capacidade extintora de no mínimo 10-A

41

b) carga de espuma mecânica: extintor com capacidade extintora de no mínimo 6-A:40-B:

c) carga de dióxido de carbono (CO2): extintor com capacidade extintora de no mínimo 10-B:C:

d) carga de pó BC: extintor com capacidade extintora de no mínimo 80-B:C:

e) carga de pó ABC: extintor com capacidade extintora de no mínimo 6-A: 80-B:C. (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉNCNICAS, 2013).

2.1.10.2 Sistemas fixos

Os sistemas de fixos de combate a incêndio são subdivididos em dois grupos,

conforme seu tipo de acionamento: “sob comando” (manuais) e “automáticos”.

2.1.10.2.1 Sistemas fixos sob comando

Sistemas fixos sob comando são divididos em “sistema de mangotinhos” e

“sistema de hidrantes”:

a) sistema de mangotinhos:

O sistema de hidrantes e de mangotinhos é um sistema fixo de combate a incêndio que funciona sob comando e libera água sobre o foco de incêndio em vazão compatível ao risco do local que visa proteger, de forma a extingui-lo ou controlá-lo em seu estágio inicial. Dessa forma, esse sistema possibilita o início do combate ao incêndio pelos usuários antes da chegada do corpo de bombeiros, além de facilitar os serviços dele quanto ao recalque de água e, em especial, em edificações altas. O sistema de hidrantes e de mangotinhos para combate a incêndio em edificações e áreas de risco diferem dos sistemas de hidrantes urbanos em relação à forma de abastecimento. Os sistemas urbanos apresentam pontos de tomada de água providos de dispositivos de manobra (registros) e uniões de engate rápido, ligado à rede pública de abastecimento de água, podendo ser emergente (de coluna) ou subterrâneo (de piso) enquanto que os sistemas prediais de hidrantes e de mangotinhos apresentam pontos de tomada (PEREIRA (2004)). Para melhor desempenho desse sistema é essencial que os usuários do edifício estejam familiarizados com o sistema, confiantes e motivados a utilizá-lo na ocorrência de um sinistro. Uma das características básicas do sistema de mangotinhos é a facilidade de operação pelos

42

usuários em função das pequenas vazões e diâmetros das mangueiras, propiciando mais agilidade e facilidade às ações de combate ao fogo na fase inicial. (SEITO, 2008, p. 234).

A Figura 14 apresenta um exemplo de mangotinho em carretel:

Figura 14 – Carretel mangotinho horizontal Fonte: (DAMAEQ, c2011)

b) sistema de hidrantes: é constituído por tomadas de incêndio nas quais há

uma (simples) ou duas (duplo) saídas de água. São formadas por válvulas

angulares com seus respectivos adaptadores, tampões, mangueiras de

incêndio e acessórios. A Figura 15 apresenta um hidrante predial.

43

Figura 15 – Hidrante predial

Fonte: (BBEL, 2013)

2.1.10.2.2 Sistemas fixos automáticos

Sistemas fixos automáticos são sistemas utilizados normalmente em

edificações de risco alto, que possuem grandes áreas, alturas elevadas, e/ou altos

riscos inerentes do processo ou de sua configuração. São sistemas cujo

acionamento independe da ação humana, possuindo rápido acionamento e boa

eficiência. São divididos em Chuveiros automáticos (também chamados de

Sprinklers) e em Sistemas de água nebulizada (ou water spray).

a) chuveiros automáticos (Sprinklers): são sistemas distribuídos regularmente

por toda edificação. Possuem acionamento através do calor do fogo, pelo

rompimento da ampola colorida (Figura16), que contém um líquido de fácil

vaporização. Se a temperatura do ambiente atingir o ponto de vaporização

do líquido da ampola, a pressão do líquido rompe a mesma, liberando a

água pressurizada. A forma dentada do difusor do sprinkler faz a água se

espalhar uniformemente em um raio de ação determinado. As pressões e

o alcance dos jatos dispersos de água são determinados em norma, de

acordo com o grau de risco.

44

Figura 16 - Sprinklers com diferentes temperaturas de acionamento

Fonte: (NR29 SEGURANÇA DO TRABALHO, 2013)

b) Sistema de água nebulizada (water spray):

O Sistema de Água Nebulizada (Water Spray), de média ou alta velocidade, aplica a água na forma de um chuveiro ou cone em expansão, com gotas finas em média ou alta velocidade. Três princípios de extinção são empregados no sistema: emulsificação, resfriamento e abafamento. [...] Esses sistemas utilizam basicamente projetores, instalados em tubulações secas, em que o fluxo de água é controlado manual ou automaticamente por uma válvula de controle, disparada pela ativação de um detector de fumaça ou de calor. Os projetores que descarregam jatos cônicos - água nebulizada em média ou alta velocidade e em densidade uniforme - extinguem o incêndio pelo processo de resfriamento ou emulsificação. (CONAUT, [20--?]).

Figura 17– Sistema de água nebulizada em operação

Fonte: (EXTINLÂNDIA, 2011)

45

2.1.11 Legislação

Até o dia 26 de dezembro de 2013, a legislação pertinente à prevenção e

combate a incêndio, sob o âmbito municipal, competia à Lei Complementar nº 420,

do município de Porto Alegre. A partir de 26 de dezembro de 2013, impulsionada

pela tragédia na boate Kiss, foi sancionada a Lei Complementar Estadual 14.376,

que tem por objetivo estabelecer critérios mais rigorosos e ajustar critérios para

aperfeiçoar a efetividade da segurança, prevenção e combate a incêndios no estado.

Com a sanção da lei estadual 14.376, a antiga lei municipal 420 deixou ser exigida

em Porto Alegre como referência para a elaboração e execução de Planos de

prevenção contra Incêndio (PPCIs). Apesar da LC 420 não ter sido revogada, a nova

lei estadual fica como principal base técnica e legal.

Além das leis complementares, são utilizados Decretos, Resoluções

Técnicas e Instruções Normativas do Corpo de Bombeiros de Porto Alegre, além das

normas técnicas brasileiras (NBRs) compreendidas nas suas resoluções. Segundo o

Primeiro Sargento da Divisão Técnica de Prevenção de Incêndio e Investigação do

Comando do Corpo de Bombeiros (CBMRS), Luis Augusto Braatz, integrante da

divisão contra incêndios e investigação, no futuro as resoluções técnicas dos

bombeiros substituirão as NBRs utilizadas como base técnica para aplicação das

determinações legais (BRAATZ, 2014e).

46

2.2 ESTUDO DE CASO: O CENÁRIO DA LEGISLAÇÃO DE PREVENÇÃO E

COMBATE A INCÊNDIO EM PORTO ALEGRE

O presente trabalho tem por objetivo lançar uma análise crítica da legislação

de prevenção contra incêndio vigente e aplicada em Porto Alegre. Serão traçados

paralelos e comparações entre a antiga Lei Complementar Municipal Nº 420 de

Porto Alegre, sancionada em 1998 e aplicada como critério de Planos de Prevenção

e Combate a Incêndio (PPCI) até dezembro de 2013; e a Lei Complementar

Estadual Nº 14.376, sancionada em 26 de dezembro de 2013 e atualmente utilizada

como referência para elaboração e execução dos PPCIs no município.

Serão apontadas as principais alterações da nova legislação estadual em

relação à antiga lei complementar municipal, sendo apresentados os pontos

positivos (melhorias) e os pontos negativos, além das questões que não foram

claramente abordadas na antiga lei que e seguem sem resolução na nova

legislação.

Serão avaliados alguns pontos da nova legislação vigente e suas implicações

práticas, bem como a eficácia dos critérios e padrões técnicos exigidos.

A aplicação de critérios errôneos (demasiadamente tolerantes ou omissos)

pode implicar riscos para a efetividade prática das medidas de prevenção e combate

a incêndio, colocando em risco a vida humana e seu patrimônio. Ainda, critérios

rigorosos em excesso podem gerar onerações desnecessárias na execução do

sistema de proteção e combate, o que pode desestimular ou mesmo inviabilizar

muitos empreendimentos na cidade, afetando a economia do município.

Os questionamentos que este trabalho objetiva levantar são:

a) a nova lei de fato é, na prática, mais restritiva e efetiva que a legislação

precedente em sua totalidade?

b) quais as principais melhorias?

c) há ainda pontos omissos a serem ajustados?

d) há casos em que a nova lei tenha retrocedido (ficado mais “permissiva”)

em relação à anterior?

2.2.1 A Lei Complementar Municipal nº 420 de Porto Alegre

47

A lei complementar número 420 do município de Porto Alegre, sancionada em

1998, instituiu o “Código de Proteção Contra Incêndio de Porto Alegre”.

Posteriormente, a referida lei foi alterada e complementada pela lei complementar

número 458/2000.

Os objetivos do antigo Código de Proteção contra Incêndio de Porto Alegre,

implementado pela Lei 420, são:

I– reduzir a possibilidade de incêndio; II – proteger a vida dos ocupantes de edificações em caso de incêndio e pânico; III – minimizar as possibilidades de propagação do incêndio; IV – reduzir os danos materiais provocados pelo incêndio. (PORTO ALEGRE, 1998).

A lei complementar 420/1998 de Porto Alegre não foi revogada, entretanto

não é mais utilizada pelos órgãos fiscalizadores como parâmetro legal e técnico para

elaboração de planos de prevenção contra incêndio, sendo substituída neste quesito

pela lei estadual 14.376.

A antiga lei 420/98, na época de sua regulamentação, significou um razoável

avanço no quesito prevenção e combate a incêndio, mas com o passar dos anos

tornou-se insuficiente, necessitando de ajustes e da revisão de seus dispositivos

legais. Ao longo dos 15 anos desde a sanção da lei 420, os muitos ajustes que se

mostraram necessários se deram através de resoluções técnicas, decretos e

portarias, sendo sempre efetuadas conforme a “necessidade”, gerando assim uma

gerando assim adaptações necessárias, com grande quantidade de fragmentos que

muitas vezes não se encaixavam. Esses muitos dispositivos legais “remediativos”

tornavam a legislação em muitos pontos confusa, além de não serem suficientes

para que pontos importantes fossem solucionados. Muitas lacunas seguiram,

permitindo situações de riscos à vida humana.

O caso da boate Kiss poderia ter acontecido em Porto Alegre, pois

estabelecimentos tão ou mais inseguros operavam na cidade, sem, inclusive,

possuírem alvará de prevenção contra incêndios, por omissão e responsabilidade

dos proprietários e por deficiência de fiscalização municipal.

48

2.2.2 A nova Lei Complementar Estadual nº 14.376

A lei complementar estadual nº 14.376 surgiu da necessidade de uma

legislação mais atual, mais rígida e mais efetiva, que se adequasse à realidade do

estado e que contemplasse casos omissos na legislação anterior. A redação e

sanção da lei 14.736 foram catalisadas pela tragédia na boate Kiss, em janeiro de

2013. O somatório de fatores que resultaram no sinistro na boate de Santa Maria

evidenciou a imensa lacuna que havia na legislação, entre critérios técnicos, prazos

demasiadamente longos para ajustes e uma fiscalização ineficiente. A tragédia foi a

“o motor propulsor” para que finalmente o estado tomasse providências efetivas

neste aspecto.

Os objetivos da Lei Complementar Estadual nº 14.376 são:

I - preservar e proteger a vida dos ocupantes das edificações e áreas de risco, em caso de incêndio; II - estabelecer um conjunto de medidas eficientes de prevenção contra incêndio; III - dificultar a propagação do incêndio, preservando a vida, reduzindo danos ao meio ambiente e ao patrimônio; IV - proporcionar meios de controle e extinção do incêndio; V - dar condições de acesso para as operações do Corpo de Bombeiros Militar do Estado Rio Grande do Sul - CBMRS -; VI - proporcionar a continuidade dos serviços nas edificações e áreas de risco de incêndio; VII - definir as responsabilidades e competências de legislar em âmbito estadual, respeitando as dos demais entes federados; VIII - estabelecer as responsabilidades dos órgãos competentes pelo licenciamento, prevenção e fiscalização contra incêndios e sinistros deles decorrentes; IX - definir as vistorias, os licenciamentos e as fiscalizações às edificações e áreas de risco de incêndio; X - determinar as sanções nos casos de descumprimento desta Lei Complementar. (RIO GRANDE DO SUL, 2013).

A nova lei complementar estadual foi baseada quase que integralmente na

legislação de São Paulo, sendo, na prática, uma cópia adaptada, o que é um fato

bastante positivo. A legislação de São Paulo é referência para o restante do Brasil e

está, no quesito proteção contra incêndios, sempre no mínimo três anos à frente de

Porto Alegre (e do Rio Grande do Sul), sendo, deste modo, uma ótima referência

para a nova legislação (HANSSEN, 2014).

49

O avanço de São Paulo frente ao nosso estado pode ser explicado pelo fato

do estado ter implementado a legislação há mais de uma década. Em 31 de agosto

de 2001, o então governador do estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, baixou o

decreto Nº 46.076, que viria futuramente a se tornar a principal referência no Brasil.

Esses quase 13 anos de trabalho propiciaram muitas avaliações e ajustes,

resultando na evolução da legislação de São Paulo no quesito proteção contra

incêndio.

Toda lei precisa de documentos de referência com instruções técnicas para

ser executada. A lei sanciona o que deve ser feito/seguido, enquanto as instruções

dizem como de ser feito.

No caso de São Paulo, junto com a publicação do decreto Nº 46.076, em

2001, trinta e duas instruções técnicas foram simultaneamente publicadas para

regulamentá-lo. Estas instruções técnicas foram fruto de um trabalho de um ano de

uma equipe de centro e cinquenta profissionais das mais diversas áreas de

intersecção com a proteção de incêndio, entre oficiais bombeiros, engenheiros, e

arquitetos e urbanistas, representantes dos sindicatos da construção civil, entre

outros. Foram constituídas dez comissões, que redigiram as instruções técnicas

baseando-se em normas e padrões internacionais, utilizando como base principal as

legislações da Espanha e Estados Unidos, e um pouco do Canadá (este último em

menor grau). Esse minucioso estudo possibilitou instruções técnicas adequadas e

bastante eficientes à legislação estadual de São Paulo (HANSSEN, 2014).

Hoje, em 2014, a legislação de São Paulo, após muitas revisões e ajustes, já

está obviamente muito mais evoluída do que a utilizada como base para elaboração

da lei complementar estadual do Rio Grande do Sul.

2.2.2.1 Decreto para regularizar a Lei Complementar Estadual Nº 14.376

No Rio Grande do Sul, passados mais de 90 dias após a publicação, a nova

lei 14.376 ainda não foi regulamentada por Decreto, o que constitui uma falha

legislativa muito grave, ao contrário do que aconteceu com São Paulo, que teve sua

regulamentação simultânea à sua publicação. Apesar de sancionada pelo

governador do estado em 26 de dezembro de 2013, até a presente data em que este

50

trabalho é redigido (20 de março de 2014), a lei segue sem regulamentação. Além

disso, segundo Brentano (2014), a regulamentação será um desafio: “Não será uma

tarefa fácil. São muitos detalhes das instalações preconizadas pela lei para serem

regulamentados em curtíssimo prazo.” (BRENTANO, 2014 apud SANTUCI, 2014).

A explicação para a sanção da lei 14.376 sem a publicação das suas

respectivas instruções técnicas está provavelmente associado a fatores políticos.

Era de interesse do estado, como “resposta” à população pelo incidente na boate

Kiss, que a lei fosse sancionada antes do primeiro aniversário da tragédia. O

resultado foi uma lei sancionada às pressas. O governo do estado conseguiu

sancioná-la, como pretendia, antes do primeiro aniversário da tragédia, e sua

sanção “encheu os olhos” e agradou a população. Entretanto, a lei não poderia ser

aplicada, pois não haviam sido lançados os critérios para sua execução.

Este “vácuo” durou de 26 de dezembro de 2013 (dia da sanção da lei) até 12

de fevereiro de 2014, quando o Comando do Corpo de Bombeiros do Estado lançou

a Instrução Normativa 001/2014 como medida temporária para possibilitar a

aplicação da nova lei. A Instrução Normativa 001/2014 determina as instruções

técnicas e normas de prevenção e proteção contra incêndio que devem ser

seguidas, provisoriamente, para aplicação da Lei Complementar nº 14.376, até que

ela seja devidamente regulamentada.

Art. 2º - As Normas têm por finalidade fixar os requisitos mínimos exigidos nas edificações, áreas de risco de incêndio e no exercício de atividades profissionais estabelecendo especificações para a segurança contra incêndios no Estado do Rio Grande do Sul, até regulamentação da Lei Complementar nº 14.376, de 26 de dezembro de 2013. (RIO GRANDE DO SUL, 2014).

A Instrução Normativa ainda reitera que as vistorias ficarão a cargo da

Brigada:

Art. 3º- A análise dos Planos de Prevenção e Proteção Contra Incêndio – PPCI e as vistorias das medidas de segurança contra incêndio serão realizadas pelo Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio Grande do Sul - CBMRS. (RIO GRANDE DO SUL, 2014).

Cabe ressaltar que mesmo a instrução normativa não resolve em definitivo a

situação, sendo necessária a regulamentação (via decreto, por parte do Governador)

o mais breve possível.

51

2.2.3 Melhorias e avanços proporcionados pela Lei 14.376/2013

Apesar da nova Lei 14.376 não estimular a importante participação dos

municípios, muitas melhorias e avanços foram obtidos com a sanção da nova

legislação estadual. A legislação antiga não era organizada, abrindo margens para

dúvidas e diferentes interpretações. Resolvia problemas através de resoluções, de

modo pontual, à medida que os problemas iam aparecendo (BRENTANO, 2014

apud SANTUCI, 2014).

A nova lei estadual prevê com mais rigor e maior detalhamento muitos casos

anteriormente omissos. Além disso, as alterações de algumas normas técnicas

utilizadas como critérios também vieram a contribuir com ações mais racionais e

efetivas.

Esta seção irá versar sobre as principais melhorias lançadas pela nova

legislação estadual.

2.2.3.1 Novas medidas de segurança contra incêndio

Um dos pontos mais salutares desta nova legislação é a inserção de novas

exigências de medidas de segurança contra incêndio.

Podemos começar salientando que a nova legislação está mais clara e direta

nas determinações das medidas de segurança. Enquanto a lei municipal 420

possuía, em sua Tabela 5, uma metodologia de códigos para determinação das

exigências das medidas de segurança contra incêndio. Cruzavam-se dados como

divisão segundo a ocupação, área total pavimento e altura da edificação. A

intersecção destes três parâmetros resultava em um código, que deveria ser

aplicado na Tabela 6, onde constavam as determinações das medidas obrigatórias

de proteção e contra incêndio. Tal sistema abria espaço para leituras equivocadas,

em que um código lido erroneamente poderia resultar no estabelecimento de

medidas incorretas, insuficientes e/ou incompatíveis com as necessidades reais.

52

Já a nova legislação complementar estadual prevê com mais clareza as

medidas obrigatórias de proteção contra incêndio, constando tais determinações

diretamente nas Tabelas 5 e 6, facilitando a consulta e minimizando erros de leitura.

Em relação às medidas de proteção propriamente ditas, a antiga legislação

municipal previa, segundo a Tabela 6 da lei 420/1998, a exigência, dependendo do

caso, das seguintes medidas de segurança:

a) extintores;

b) saídas alternativas;

c) sinalização de saídas;

d) iluminação de emergência;

e) sistema de hidrantes;

f) alarme acústico;

g) sistema de Sprinklers.

Entretanto, na lei municipal 420/1998 não era prevista a obrigatoriedade de

medidas importantes e que só agora foram incorporados à nova lei 14.376, como

controle de acabamento de materiais, brigada de incêndio, plano de

emergência, detecção e alarme, e controle de fumaça e gases. A antiga lei

complementar 420 não previa a obrigatoriedade de uso de materiais certificados

para o isolamento acústico, por exemplo, possibilitando a utilização de espumas

comuns de poliuretano, que liberam fumaças extremamente tóxicas, em muitas

casas noturnas de Porto Alegre.

O Artigo 36º da lei 14.376 estabelece que todo estabelecimento ou área de

risco deve possuir as seguintes medidas de segurança, que serão fiscalizadas pelo

CBMRS:

I - restrição ao surgimento e propagação de incêndio; II - resistência ao fogo dos elementos de construção; III - controle de materiais de acabamento; IV - detecção e alarme; V - saídas de emergência, sinalização, iluminação e escape; VI - separação entre edificações e acesso para as operações de socorro; VII - equipamentos de controle e extinção do fogo; VIII - proteção estrutural em situações de incêndio e sinistro; IX - administração da segurança contra incêndio e sinistro; X - extinção de incêndio; XI - controle de fumaça e gases; XII - controle de explosão. (RIO GRANDE DO SUL, 2013, p. 11-12).

53

A adição das novas medidas torna a nova lei extremamente rígida e efetiva

para casas noturnas. Este é um claro reflexo da tragédia na boate Kiss, em janeiro

de 2013. Este sinistro ficou marcado por inúmeros fatores. Além de ter sido a pior

tragédia do em uma boate em toda a história do país, o caso evidenciou a

gravíssima realidade da prevenção contra incêndio no estado. O infeliz sinistro

resultou de uma sequência absurda de falhas, ocasionadas pela legislação omissa;

pela fiscalização ineficaz; e por irregularidades no cumprimento das medidas legais

por parte dos proprietários do estabelecimento.

Se a legislação fosse mais restritiva nas medidas de segurança, como está

agora, e a fiscalização fosse efetiva e rigorosa, a tragédia certamente não teria

ocorrido. Após o ocorrido na boate Kiss, centenas de casas noturnas foram

interditadas por apresentarem condições análogas.

Os principais pontos a serem comemorados, sob o ponto de vista de

segurança para boates e casas de shows, são as medidas de segurança

envolvendo:

a) detecção e alarme, que possibilitarão diagnosticar e identificar focos de

incêndio em seu início, aumentando as chances de extinção e

proporcionando uma evacuação mais rápida, quando o primeiro indício de

fogo for detectado;

b) controle de materiais de acabamento: que obrigará o uso de materiais

certificados contra a propagação de chama e liberação de gases tóxicos;

c) controle e exaustão de fumaça e gases, que garantirão a exaustão de

gases e vapores tóxicos, prevenindo assim a asfixia, principal causa de

morte em incêndios. A remoção da fumaça também auxilia na evacuação

do local, uma vez que a presença dela prejudica a visão e o senso de

localização, acentuando assim o pânico.

As três medidas citadas acima (principalmente as duas últimas) são medidas

que, se cumpridas em sua plenitude, reduzirão quase que por completo os sinistros

e óbitos em locais de aglomeração de público, principalmente em casas noturnas.

2.2.3.1.1 Obrigatoriedade de chuveiros automáticos em casas noturnas com mais de

500 pessoas

54

Outra determinação da nova lei estadual complementar que tornará as casas

noturnas mais seguras é a obrigatoriedade de instalação de sistemas de chuveiros

automáticos para estabelecimentos pertencentes à divisão F-6 (Clubes sociais,

boates e similares) com lotação superior a 500 pessoas e com carga de incêndio de

risco médio ou alto. A Tabela 5 do Anexo B da lei 14.376 determina: “Para lotação

superior a 500 pessoas, do grupo F-6 com Carga de Incêndio de Risco Médio e Alto

será exigido sistema de chuveiros automático – podendo a reserva ser para 30

minutos.” (RIO GRANDE DO SUL, 2013, p. 34).

A ressalva para edificações ou áreas de risco com cargas de incêndio de risco

médio ou alto são válidas e muito pertinentes, para não onerar desnecessariamente

estabelecimentos de classe baixa de risco, onde tal sistema não é necessário. Como

a grande maioria das casas noturnas se encaixa em classes de risco médias e altas

devido às suas características construtivas, a medida agregará mais uma efetiva

medida de combate para tais estabelecimentos.

2.2.3.1.2 Explanação sobre o sistema de combate a incêndio para eventos em

edificações das divisões F5, F-6 E F-8

Outra medida que também merece destaque é a obrigatoriedade de, em

edificações das divisões “F-5” (Cinemas, teatros e similares); “F-6” (Clubes sociais,

boates e similares) e “F-8” (Restaurantes) com áreas superiores a 750 m2 ou altura

superior a 12,0 m, o proprietário expor ao público presente, antes do evento, os

sistemas de combate a incêndio presentes no local, apontando a localização das

saídas de emergência e das demais medidas de combate, como extintores e/ou

hidrantes.

Tal determinação é dada pela Tabela 6F.3 (Notas específicas, item “c”):

Nos locais de concentração de público, é obrigatória, antes do início de cada evento, a explanação ao público da localização das saídas de emergência, bem como dos sistemas de segurança contra incêndio existentes no local. (RIO GRANDE DO SUL, 2013, p. 49).

55

2.2.3.1.3 Brigada de incêndio em locais de aglomeração de público

De acordo com o Artigo 18 (transcrito abaixo), a partir de agora é obrigatória a

presença de um bombeiro ou brigadista para eventos com mais de 200 pessoas.

Art. 18. Será obrigatória a constituição de Brigada de Incêndio nas edificações, levando em consideração um percentual da população fixa, estabelecido de acordo com o grupo e a divisão de ocupação, conforme Resolução Técnica do CBMRS ou normas técnicas vigentes. Parágrafo único. Os locais de eventos ou reuniões com mais de 200 (duzentas) pessoas ficam obrigados a dispor da presença de Bombeiro ou Brigadista, de acordo com Resolução Técnica do CBMRS. (RIO GRANDE DO SUL, 2013, p. 8, grifo do autor).

O novo artigo é algo extremamente positivo, entretanto necessita alguns

ajustes em seu texto, de modo a ser mais efetivo. Segundo Braatz (2014b), o trecho

do artigo 18º que diz “[...] estabelecido de acordo com o grupo e a divisão de

ocupação, conforme Resolução Técnica do CBMRS ou normas técnicas vigentes.”

pode causar confusão, em casos em que houver divergências entre a resolução

técnica e as normas técnicas aplicáveis.

A Lei prevê que a brigada de incêndio deverá atender a Resolução Técnica do CBMRS ou normas técnicas vigentes, ou seja, abre a precedência de usar um dispositivo legal ou outro. É um erro, pois poderá haver divergências nos critérios a serem adotados entre a Resolução Técnica e as normas técnicas vigentes, causando confusões. (BRAATZ, 2014b).

Além disso, Braatz (2014b) afirma ainda que a possibilidade de utilização de

um brigadista, segundo consta no parágrafo único do mesmo artigo, pode

comprometer a efetividade prática da ação, caso venha a ser necessária, devido às

diferenças na formação e na capacitação (horas/aulas) entre um bombeiro (militar ou

civil) e um brigadista comum:

Há uma grande diferença entre um bombeiro e um brigadista, é como se abríssemos um hospital e estabelecêssemos que as cirurgias seriam realizadas por um médico especialista ou por um técnico em enfermagem. Existe uma diferença considerada na formação de um

56

profissional e de outro, principalmente na carga horária (conteúdo estudado), sendo que o mesmo ocorre entre um bombeiro e um brigadista. (BRAATZ, 2014b).

Claro que mesmo um brigadista comum já é um avanço em relação à antiga

legislação, que não previa esta necessidade para locais com aglomeração a partir

de 200 pessoas. Entretanto, ressalta-se a retificação do texto do Artigo 18,

obrigando a presença de um bombeiro civil, de modo a tornar ainda mais forte e

efetiva a ação em casos de emergências.

2.2.3.2 Maior rigor para licenças de funcionamento de estabelecimentos

Eis aqui outro ponto positivo da nova lei. Pelo artigo 5º da lei 14.376, fica

proibida a expedição de quaisquer licenças ou autorizações provisórias de

funcionamento pelo município sem a apresentação do Alvará de Prevenção e

Proteção Contra Incêndios (APPCI) expedido pelo Corpo de Bombeiros do estado.

Art. 5. Fica proibida, no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, a expedição de quaisquer licenças e/ou autorizações precárias, provisórias e definitivas de funcionamento, pelo município no âmbito de suas competências, sem a apresentação, por parte do proprietário ou de seu procurador, ou pelo responsável pelo uso da edificação, do Alvará de Prevenção e Proteção Contra Incêndios - APPCI - expedido pelo Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio Grande do Sul - CBMRS. (RIO GRANDE DO SUL, 2013, grifo do autor).

Pela antiga lei municipal 420/1998, era facultada à edificação obter licença de

funcionamento provisório (ou habite-se, para prédios residenciais) caso o

estabelecimento/edificação tivesse encaminhando o pedido do alvará junto ao corpo

de bombeiros, podendo operar durante o período de tramitação e análise dos da

requisição.

Além disso, no Artigo 13º é reforçada a obrigação e responsabilidade do

proprietário do estabelecimento em manter as medidas de prevenção e combate a

incêndio em pleno funcionamento e condições de utilização. O referido artigo

também determina (parágrafo 2º) que, em casos de acordos extrajudiciais e/ou

termos de ajustamento de conduta (TAC), o corpo e bombeiros e o órgão municipal

57

responsável deverão ser notificados para fiscalizar o processo de adequação das

medidas pactuadas.

Art. 13. O proprietário ou o responsável pelo uso da edificação obriga-se a manter as medidas de segurança, prevenção e proteção contra incêndio, em condições de utilização, providenciando sua adequada manutenção. § 1.° O não cumprimento do disposto no “caput” deste artigo implicará nas sanções administrativas previstas nesta Lei Complementar, independentemente das responsabilidades civis e penais cabíveis.

§ 2.° Por ocasião da realização de acordos extrajudiciais e/ou termos de ajustamento de condutas, o CBMRS e o órgão municipal responsável deverão ser notificados para participar e acompanhar as deliberações, bem como fiscalizar o cumprimento das medidas pactuadas. (RIO GRANDE DO SUL, 2013, grifo do autor).

Tal dispositivo, se acompanhado de uma efetiva fiscalização dos órgãos

responsáveis, implicará em ambientes mais seguros, com medidas de proteção

adequadas nos estabelecimentos em operação (posteriormente será discutida a

capacidade de fiscalização do Corpo de Bombeiros do estado).

2.2.3.3 A nova revisão da Norma NBR 12693/2013 (Dimensionamento de extintores

de incêndio)

Outro ponto positivo a ser citado é, em setembro de 2013, a alteração da

norma da Associação Brasileira de Normas Técnicas, NBR 12693 (ABNT, 2013).

Apesar de não ser uma alteração da legislação em si, a referida norma tem grande

impacto prático no dimensionamento de extintores de incêndio nos estabelecimentos

e áreas de risco de Porto Alegre e do restante do Rio Grande do Sul, uma vez que é

utilizada como parâmetro de aplicação dos dispositivos legais da lei estadual

complementar 14.376.

A Instrução Normativa 001/2014 do Corpo de Bombeiros resolve, em seu

“Anexo A”, Artigo 6º:

58

[...] para edificações e áreas de risco de incêndio em que há exigência de extintores de incêndio conforme o “Anexo B” da Lei Complementar nº 14.376, de 26 de dezembro de 2013, deverá ser observado a ABNT NBR 12693. (RIO GRANDE DO SUL, 2014).

Esta norma era utilizada também na legislação anterior para determinar os

critérios e requisitos exigíveis para projeto, seleção e instalação de extintores de

incêndio em edificações e áreas de risco, indicando o dimensionamento do sistema

de extintores de incêndio em função da classe de risco da edificação ou área de

risco.

O problema era que, até a revisão de 2010, a NBR 12693 incluía nos seus

critérios para a classificação de classes de risco (itens 3.10, 3.11 e 3.12), limites

máximos para armazenagem de líquidos combustíveis na edificação. A norma

estabelecia, entre outros fatores, que, para que uma edificação se enquadrasse na

classificação de risco baixo, deveria necessariamente possuir um volume de líquido

combustível armazenado inferior a 3,6 litros. Para enquadramento em risco médio,

os limites variavam entre 3,6 e 18L. Já volumes superiores a 18L armazenados,

independente dos demais requisitos, faziam a classificação da edificação ou área de

risco subir para a classe de risco alto.

Abaixo, a transcrição dos itens 3.10, 3.11 e 3.12 da NBR 12693:

3.10 risco baixo edificações e áreas de risco com carga de incêndio específica até 300 MJ/m2 e líquidos combustíveis com volume menor que 3,6 L 3.11 risco médio edificações e áreas de risco com carga de incêndio específica acima de 300 MJ/m2 a 1200 MJ/m2e líquidos combustíveis com volume igual a 3,6 L até 18 L 3.12 risco alto edificações e áreas de risco com carga de incêndio específica acima de 1200 MJ/m2 e líquidos combustíveis com volume maior que 18 L. (ABNT, 2013).

Entretanto, não se especificava nenhum outro fator relativo aos líquidos e aos

volumes, permanecendo o volume bruto como critério único. Deste modo, por

exemplo, se alguma área ou edificação de risco baixo armazenasse 4 litros de

59

álcool para higienização, ainda que em acondicionados em compartimentos distintos

e mantidos em salas separadas, era automaticamente incluída na classe de risco

médio, pois extrapolava os 3,6 L máximos previstos na norma.

Assim, muitas edificações e áreas eram oneradas desnecessariamente, pois

eram obrigadas a arcar com os custos de implantação de um sistema de extintores

superestimado, não condizente com o risco real que edificação representava.

Na nova revisão da norma NBR 12693, em 2013, estes critérios foram

suprimidos, permanecendo apenas os critérios de carga de incêndio específica da

edificação para determinação da classe de risco, que inclusive estão em sintonia

com os critérios estabelecidos nas Tabela 3 e 3.3 do Anexo A da lei estadual

complementar 14.736.

2.2.4 Situações transitórias a serem resolvidas

Quando do início da utilização da lei complementar estadual 14.376/2013

como referência legal e técnica para elaboração de planos de prevenção e proteção

contra incêndio (PPCI) e liberação de alvarás de prevenção e proteção contra

incêndios (APPCI), inúmeras questões transitórias se impuseram como prioridade

para resolução. Tais situações demandam atenção dos órgãos responsáveis do

estado, sob pena de prejuízos à economia do Rio Grande do Sul como um todo.

2.2.4.1 Longo tempo para apreciação de PPCIs e APPCIs e empreendimentos

impedidos de operar

Com a nova lei estadual, o detalhamento e o número de critérios para

apreciação de PPCIS e APPCIs aumentou consideravelmente, demandando maior

tempo de apreciação aos oficiais do corpo de bombeiros do estado designados para

esta função.

Entretanto, o número de oficiais integrantes da divisão técnica do CBMRS,

que já era insuficiente com a legislação antiga, ficou ainda mais crítico frente à

60

grande demanda existente e ao processo técnico mais longo exigido pela nova

legislação.

Além disso, em Porto Alegre houve modificação no que diz respeito às

atribuições dos bombeiros. A nova legislação estadual confere ampliação das

atribuições do corpo de bombeiros militar do Rio Grande do Sul, ficando o CMBRS

incumbido do exame e da inspeção dos tipos de proteção implementadas nas

edificações, o que antigamente era realizado junto à Secretaria Municipal de

Urbanismo, com base no projeto arquitetônico.

Deste modo, a exigência expressa no Artigo 5º da Lei 14376/20113, que

proíbe aos municípios a emissão de alvarás de funcionamento para

estabelecimentos que não possuam o Alvará de Prevenção e Proteção contra

Incêndio emitido pelo Corpo de Bombeiros, gerou uma dificuldade administrativa e

fiscal, devido ao longo tempo necessário para liberação do documento e à

impossibilidade de operação enquanto o processo não é concluído.

Em Porto Alegre a estimativa é que o prazo para a apreciação dos planos de

prevenção contra incêndio triplicou, em comparação aos prazos de análise dos

planos segundo a lei municipal 420/1998.

O tenente-coronel Adriano Krukoski, comandante dos Bombeiros da Capital, diz que o tempo de espera é três vezes maior do que era no ano passado. Segundo ele, a média que era de 25 dias passou para 90. Já as vistorias, após a aprovação do plano, são realizadas dentro do esperado, 25 dias. (KRUKOSKI, 2014, apud MUGNOL, 2014, online).

Assim, o tempo total para que um estabelecimento em Porto Alegre esteja

apto a operar, segundo a legislação vigente, considerando-se o tempo do prazo de

apreciação e aprovação do Plano de Prevenção Contra Incêndio e do prazo para a

vistoria, é estimado em quase4 meses (115 dias).

Tal fato implica prejuízos à economia do estado como um todo, pois um

elevado número de estabelecimentos está inoperante em muitas cidades. Segundo

o jornal Diário de Canoas (PREFEITOS..., 2014), a estimativa era de que, na data de

19/03/2014, 961 empreendedores em Canoas aguardavam alvarás para seus

negócios. O prefeito da cidade, Jairo Jorge, afirma que o processo “está engessando

o processo e prejudicando o desenvolvimento econômico das cidades"

(PREFEITOS..., 2014).

61

É imperativo que mais recursos estaduais sejam destinados à área de

prevenção e combate a incêndio, e que o efetivo de oficiais integrantes do quadro

técnico seja ampliado de modo a suprir a demanda, garantindo um processo de

análise satisfatório e em tempo hábil. É impreterível também que sejam incluídos,

nos processos seletivos para oficiais do Corpo de Bombeiros, Engenheiros e

Arquitetos e Urbanistas, de modo a qualificar e enriquecer o quadro técnico da

corporação. Brentano (2014) afirma que:

Assim como no hospital da Brigada Militar tem um corpo médico e de enfermeiros; e na procuradoria da Brigada Militar tem procuradores e advogados, por que não ter um corpo técnico de Engenheiros e Arquitetos e Urbanistas para exercerem suas atividades nesta área importante que trata da segurança de nosso estado? (BRENTANO, 2014 apud SANTUCI, 2014).

2.2.4.2 Projetos de edificações de Porto Alegre com início sob regência da lei

municipal 420/1988 e término sob vigência da atual lei 14.376/2013

Outro ponto que está exigindo atenção dos poderes públicos é a necessidade

de flexibilização para os casos transitórios de edificações que tiveram início sob

regência da antiga lei 420/1998 e foram concluídas recentemente, já sob a vigência

da atual lei 14.376/2013.

Na construção de edificações de grande porte (mais de sete pavimentos),

tanto comerciais quanto residenciais, o tempo de construção, por rápido que seja o

processo, normalmente leva um tempo considerável até que o prédio seja finalizado

e pronto para receber o habite-se, podendo se estender a até dois anos. Assim,

muitos empreendimentos que agora estão sendo finalizadas iniciaram sua

construção sob vigência da lei municipal 420/1998, sendo a proteção contra incêndio

nestas edificações integralmente projetada à luz do antigo código de proteção contra

incêndio. Entretanto, o projeto de proteção contra incêndio é um documento final,

apenas apresentado para apreciação junto ao corpo de bombeiros ao final da

construção, com o prédio já pronto para entrar em operação. Apenas nesta etapa é

realizada a requisição do alvará de prevenção contra incêndio, documento

necessário para a emissão do “habite-se”. Isto é praxe, visto que muitos ajustes no

62

projeto arquitetônico são necessários durante a construção e finalização da

edificação, ficando a implementação do plano de prevenção contra incêndio para a

fase final (HANSSEN, 2014).

Entretanto, em 26 dezembro de 2013, com o início da vigência da nova lei

estadual 14.376, essas edificações, por estarem sendo inauguradas sob a regência

do novo código estadual, passaram a ter problemas com a aprovação dos seus

planos de prevenção contra incêndio, pois não cumpriam os critérios e requisitos do

novo código (HANSSEN, 2014).

Segundo o engenheiro Cláudio Alberto Hanssen, em 14 de março de 2013 um

encontro reuniu a secretaria municipal de urbanismo de Porto Alegre (SMURB);

profissionais e sindicatos da área da construção civil; a sociedade de engenharia do

estado do Rio Grande do Sul (SERGS) e o Corpo de Bombeiros Militar do Rio

Grande do Sul para debater uma solução para os empreendimentos que se

enquadravam neste cenário transitório (HANSSEN, 2014).

Neste encontro, foi proposto um prazo de seis meses, a contar de março de

2014, para que o corpo de bombeiros aceitasse projetos de prevenção contra

incêndio de edificações ainda de acordo com a antiga lei municipal 420/1988

(HANSSEN, 2014).

Deste modo, independentemente do tempo de construção ou finalização,

todos projetos que fossem submetidos e aprovados junto ao corpo de bombeiros até

setembro de 2014, poderiam ainda seguir a lei 420/1998, ficando apenas sujeitos à

nova legislação os projetos aprovados após o referido mês (HANSSEN, 2014).

Tal medida resolveria o impasse das construções cujos alvarás encontram-se

impugnados. Entretanto, até a presente data, tal determinação ainda está pendente,

necessitando ser formalizada (via decreto do prefeito de Porto Alegre) e oficialmente

divulgada para que possa ter validade (HANSSEN, 2014).

2.2.4.3 Divergências entre os critérios que regem o código de edificação de Porto

Alegre e os critérios técnicos adotados pela lei 14.376/2013

Um outro ponto que necessita adequação sob pena de gerar novos impasses

na aprovação de projetos arquitetônicos são os diferentes critérios adotados pela lei

63

14.376 e o código de edificações Porto Alegre. A nova legislação estadual

complementar 14.376/2013 adotou algumas instruções e parâmetros técnicos da

legislação de São Paulo, de modo a viabilizar a sua aplicação no estado, pelo fato

de não possuirmos aqui os respectivos documentos técnicos para implementar

integralmente os dispositivos constantes na atual lei.

Entretanto, tal artifício resultou em um conflito: enquanto a legislação de São

Paulo está baseada no Código de Edificações de São Paulo, em Porto Alegre os

projetos da construção civil são regulados pela Secretaria Municipal de Urbanismo

(SMURB), órgão responsável pela aprovação, licenciamento e vistoria (entre outras)

das edificações da cidade, que segue o Código de Edificações de Porto Alegre

(lei complementar municipal Nº 284).

Todo projeto arquitetônico em Porto Alegre passa pela aprovação da SMURB,

sendo analisados detalhadamente segundo o referido Código de Edificações (o que

muitas vezes leva meses, chegando até um ano, até que se ajustem todos os

parâmetros segundo os critérios estabelecidos no respectivo código).

Haverá aí então um grande conflito, pois ou se conseguirá cumprir o código

de edificações de Porto Alegre ou se cumprirá a lei 14.376, posto que a mesma foi

baseada em instruções técnicas que tem critérios baseados em um código de

edificações diferente do nosso (HANSSEN, 2014).

O construtor, para ter seu projeto de edificações aprovado terá que cumprir ao

código municipal de edificações, mas não conseguirá o alvará de prevenção e

proteção contra incêndio, uma vez que os bombeiros cobrarão integralmente os

parâmetros previstos nas respectivas instruções técnicas da legislação de São

Paulo, já que foram transcritas para a lei estadual 14.376 (HANSSEN, 2014).

Alguns itens ou características técnicas que são diferentes nas legislações de

Porto Alegre e São Paulo, e que invariavelmente demandarão ajustes e

modificações na metodologia dos Projetos de Proteção Contra Incêndios nos

prédios, de modo a viabilizar novos empreendimentos, são:

a) dimensionamento de escadas, corredores e descargas;

b) compartimentações e áreas de refúgio;

c) classificação de ocupações;

d) projetos para instalação de extintores, de sistemas de hidrantes;

e) exigências em função das alturas dos prédios (HANSSEN, 2014).

64

2.2.4.4 Dificuldade de adequação das edificações antigas à nova lei estadual

Eis outro ponto da nova lei crucial para a economia de Porto Alegre e do Rio

Grande do Sul: o tratamento das legislações antigas quanto à adequação à nova lei.

Segundo Braatz (2014d), esta questão está sendo uma das maiores dificuldades

que os profissionais ligados a segurança contra incêndio estão se deparando, após

a entrada em vigor da lei complementar estadual 14.376. O principal problema são

os critérios técnicos exigidos pela referida lei, que não faz distinção entre edificações

já existentes e as novas edificações, que tiveram ou terão ou terão início após a

sanção da lei.

Ao contrário do que ocorreu em outros estados, em que houve preocupação

com as limitações técnicas das edificações já existentes, no estado do Rio Grande

do Sul a legislação estadual trata com o mesmo rigor edificações novas (a serem

construídas após a sanção da nova lei) e edificações existentes (construídas antes

da nova Lei entrar em vigor).

Medidas de segurança contra incêndio simples como extintores de incêndio, iluminação e sinalização de emergência são perfeitamente adaptáveis, porém, medidas diretamente ligadas a estrutura da edificação serão quase impossíveis de serem adequadas a nova Lei, sem que a edificação sofra uma grande reforma. (BRAATZ, 2014a).

O inciso XVII do Artigo 6º, Capitulo II – Dos Conceitos e das Definições,

define edificação e área de risco existente:

XVII – edificação e área de risco existente é a construção ou área de risco construída ou regularizada anteriormente à publicação desta Legislação, com documentação comprobatória, desde que mantidas a área e a ocupação da época e não haja disposição em contrário dos órgãos responsáveis pela concessão de alvarás de funcionamento e de segurança contra incêndio, observados os objetivos desta. (RIO GRANDE DO SUL, 2013).

A Tabela 4 do Anexo B do atual Código Estadual de Segurança Contra

Incêndio (apresentada na Figura 18, abaixo), apresenta as exigências para

edificações existentes.

65

Figura 18 – Exigências para edificações já existentes (Tabela 4 da lei

14.376/2013) Fonte: (RIO GRANDE DO SUL, 2013)

Do exposto acima, percebe-se que nenhuma ressalva foi feita para

edificações já existentes, que deverão cumprir as determinações apresentadas nas

as mesmas tabelas: Tabela 5 (para edificações com área menor ou igual a 750 m2 e

altura menor ou igual a 12 metros) e Tabela 6 (para edificações com área maior do

que 750 m2 altura maior do que 12 metros).

Segundo Braatz (2014a), já as legislações de muitos estados, como Minas

Gerais, São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul foram mais racionais e flexíveis

neste quesito, apresentando maneiras alternativas (mas não necessariamente

menos rigorosas) para adequação de edificações já existentes.

Alei ainda determina o prazo máximo de cinco anos para adequação das

edificações existentes:

“Art. 55. As edificações já existentes deverão adaptar-se às disposições

desta Lei Complementar no prazo de até 5 (cinco) anos, contados da sua

publicação.” (RIO GRANDE DO SUL, 2013, grifo nosso).

Assim toda edificação (comercial ou residencial multifamiliar) que, no prazo

máximo de cinco anos (contatos a partir de dezembro de 2013) não se adequar

completamente aos critérios na nova legislação, terá que fechar suas portas,

cessando a atividade comercial ou sendo evacuada, no caso de ocupação

residencial.

66

Para contornar esta situação enquanto a regulamentação da lei estadual

complementar não é decretada, o corpo de bombeiros lançou, no parágrafo 1º do

Artigo 20º da Instrução Normativa 001/2014:

§ 1º – As edificações e áreas de risco de incêndio existentes que comprovarem inviabilidade técnica através de laudo técnico elaborado por profissional legalmente habilitado, para a instalação das medidas de segurança contra incêndio exigidas, deverão encaminhar projeto alternativo com medidas compensatórias de segurança contra incêndio e pânico compatíveis com a finalidade para o qual se destina o sistema que será substituído, para apreciação e aprovação do CBMRS. (RIO GRANDE DO SUL, 2014).

Entretanto, sabemos que a Instrução normativa 001/2014 é uma medida

temporária, que perderá validade no instante da regulamentação da nova legislação.

Assim, é imperativo que tal questão seja observada na regulamentação da lei

estadual complementar 14.376, sob pena de trazer um grande prejuízo à economia

do estado como um todo. Há centenas de milhares de estabelecimentos antigos

operando em Porto Alegre, considerando-se edificações comerciais e residenciais

multifamiliares. Não se poderia medir o grande impacto se grande parte destas

edificações fosse simplesmente impedidas de funcionar.

Além disso, a demanda de trabalho por parte do corpo técnico do corpo de

bombeiros do Rio Grande do Sul (que operam em número reduzido) irá aumentar

consideravelmente, visto que, além da apreciação dos projetos novos, será preciso

revisar todas as edificações e áreas de risco já existentes.

2.2.5 Análise crítica dos artigos a serem revisados na nova Lei 14.376/2013

Apesar de ser uma lei mais atual e mais evoluída em sua concepção, pois foi

baseada na legislação do estado de São Paulo, a nova lei complementar estadual

traz em sua redação situações novas e ainda não aplicadas em projetos específicos

e sistemas instalados no Rio Grande do Sul. A nova Lei certamente receberá críticas

e sugestões, que deverão ser objeto de apreciação pelos técnicos dos Corpos de

Bombeiros Militares e pelo no Conselho Estadual ainda não instalado. Alguns pontos

67

Alguns profissionais atuantes na área de prevenção e combate a incêndios já

expressaram suas posições perante a nova legislação. O 1º Sargento do Corpo de

Bombeiros Militar do Rio Grande do Sul, atuante na Divisão Técnica de Prevenção

de Incêndio e Investigação, Luis Augusto Braatz (2014b), considera a nova lei

errônea em muitos pontos, e afirma que:

A Lei Complementar nº 14.376, de 26 de dezembro de 2013, foi concebida para ser uma Lei clara, justa e moderna, mas agora com o uso tem se mostrado bem diferente disto. Alguns artigos são muito superficiais e não esclarecem absolutamente nada, há erro de ligação entre as partes da Lei, há citações de tabelas e anexos que nem se quer existem na Lei, sem contar que alguns critérios técnicos adotados com relação às medidas de segurança contra incêndio, tornaram a Lei mais branda do que a legislação anterior. (BRAATZ, 2014b).

O vereador de Caxias do Sul Mauro Pereira é outro crítico da nova legislação.

A seu ver, a nova lei é falha e deve, inclusive, ser revogada. No dia 3 de março de

2014, Mauro entrou com um pedido de anulação imediata da lei junto à Promotoria

Pública do estado do Rio Grande do Sul (DUTRA, 2014).

Esta seção versará sobre os principais pontos em que a nova legislação

apresenta fragmentos de redação e/ou critérios que demandarão atenção, revisão e

ajustes.

2.2.5.1 Fragmentos do texto de lei estadual complementar passíveis de

reestruturação

O texto da nova lei estadual complementar 14.376 de 26 de dezembro de

2013 traz muitos pontos passíveis de revisão e que certamente receberão ajustes

em um futuro próximo. Alguns fragmentos, talvez mal redigidos ou mal adaptados da

fonte original, geram inconsistências em determinados dispositivos da lei, que

resultam em critérios confusos ou determinações equivocadas. Os próximos itens

desta subseção apontarão erros de redação e/ou de critérios presentes no texto da

lei complementar estadual vigente.

68

2.2.5.1.1 Obrigatoriedade de alvará de prevenção e proteção contra incêndios para

residências em andar térreo de ocupação mista

Um exemplo claro de erro de redação/critério é a obrigatoriedade, segundo a

redação da lei 14.376, de residências situadas em andar térreo de ocupação mista

apresentar alvará de prevenção contra incêndio. No Artigo 4º é expresso:

Art. 4.º As edificações e áreas de risco de incêndio deverão possuir Alvará de Prevenção e Proteção Contra Incêndio - APPCI -, expedido pelo Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Rio Grande do Sul - CBMRS.

Parágrafo único. Estão excluídas das exigências desta Lei Complementar: I - edificações de uso residencial exclusivamente unifamiliares; II - residências exclusivamente unifamiliares, localizadas no pavimento superior de ocupação mista com até dois pavimentos, e que possuam acessos independentes. (RIO GRANDE DO SUL, 2013, grifo nosso).

Segundo o inciso II do parágrafo único do Artigo 4º, as residências

unifamiliares que estiverem localizadas em ocupações mistas de até dois

pavimentos apenas ficam isentas da obrigatoriedade de alvará de prevenção e

proteção contra incêndio (APPCI) quando estiverem no andar superior da

edificação.

Deste modo, segundo a determinação expressa na lei (que deve ser clara e

evitar mais de um tipo de interpretação), se uma família ocupar o andar inferior de

uma ocupação mista, necessariamente deveria apresentar Alvará de Prevenção e

Proteção e Contra Incêndio, o que implicaria na elaboração de um PPCI, com

instalação de extintores de incêndio.

Claramente este é um ponto equivocado, em que a redação do texto da lei

não condiz com o objetivo da mesma, devendo ser ajustado e reeditado na

regulamentação da lei 14.376 ou na próxima revisão da legislação. Entretanto,

enquanto tais eventos não ocorrem, as famílias que se incluam no exemplo acima

ficarão em situação “irregular” perante a lei, se não apresentarem APPCI.

69

Tal ponto gera um paradoxo sob o ponto de vista legal: embora não tenha

cabimento cobrar alvará de prevenção e proteção contra incêndio de uma residência

unifamiliar, unicamente por se enquadrar em uma determinação claramente errônea

da legislação, o agente fiscalizador (bombeiro) tem a obrigação ética, profissional e

moral de se fazer cumprir a lei.

2.2.5.1.2 Critérios para instalação do sistema de iluminação de emergência alheios

às características internas (layout) do ambiente

A nova lei 14.376/2013 não leva em conta a configuração interna (layout) para

a determinação da necessidade ou não de instalação do sistema de iluminação de

emergência. A Tabela 5 (Anexo “A” da lei), que determina os critérios de uso desta

medida de segurança, é apresentada abaixo (Figura 19):

Figura 19 – Exigências para edificações com área menor ou igual a 750 m2 e

altura menor ou igual a 12 metros (Tabela 5 da lei 14.376/2013) Fonte: (RIO GRANDE DO SUL, 2013, grifo nosso)

70

Nas “Notas específicas” da Tabela 5 da lei 14.376, apresentada acima, são

determinadas as seguintes ressalvas para os números de rodapé utilizados:

1 – Somente para as edificações com mais de 2 pavimentos; 2 – Estão isentos os motéis que não possuam corredores internos de serviços; 3 – Para edificação com lotação superior a 50 pessoas ou

edificações com mais de dois pavimentos. (RIO GRANDE DO SUL,

2013).

Deste modo, do expresso na Tabela 5 e em suas respectivas notas

explicativas, fica determinado, em relação à necessidade de instalação do sistema

de iluminação de emergência:

a) para ocupações dos grupos A, C, D, E, G, H1, H4, H6, I e J, apenas é

obrigatório o sistema de iluminação de emergência se a edificação possuir

três ou mais pavimentos;

b) para ocupações F-1, F-2, F-3, F-4, F-5, F-6, F-7, F-8, F-9 e F-10, apenas

será necessária a instalação de iluminação de emergência se a edificação

possuir três ou mais pavimentos ou alocar mais de 50 pessoas.

Ou seja, a determinação independe do layout interno da edificação. A título de

exemplo, se uma determinada edificação com dois pavimentos possuir uma

organização interna ruim, com escadas mal posicionadas, obstáculos em corredores

e localização interna confusa, ainda assim não será obrigatória a instalação de

iluminação de emergência. Em caso de incêndio ou pânico em edificações como

esta, a ausência de tal medida retardaria a evacuação do local, acentuando o pânico

e colocando em risco a vida de seus ocupantes (BRAATZ, 2014c).

2.2.5.1.3 Não obrigatoriedade de instalação de sistema de hidrantes para postos de

combustíveis com área total menor do que 750 m2

Uma falha da nova legislação de segurança contra incêndio e pânico do

Estado do Rio Grande do Sul apontada por alguns profissionais da área é dispensa

71

da obrigatoriedade de sistemas de hidrantes para postos de combustíveis com

menos de 750 m2 e altura menos do que 12 metros.

A nova legislação toma como critérios primários a área e a altura para

determinação das medidas obrigatórias de segurança contra incêndio. Segundo a

Tabela 6G.2 da nova lei estadual, as medidas de segurança contra incêndio nela

determinadas são aplicáveis para edificações da divisão G-3 (que inclui postos de

abastecimento de combustíveis) e da divisão G-4 (Oficinas de conserto de veículo,

entre outros) que possuam área total maior do que 750 m2 ou altura maior do que

12 metros. Deste modo, fica excluídos desta obrigação qualquer posto de

combustível com área e altura menores do que as previstas.

Além disso, o Artigo 31º, no inciso IV, determina que postos de combustível

não sejam mais computados como área construída para fins de dimensionamento de

sistemas de prevenção e proteção contra incêndio:

Art. 31. Para fins de aplicação desta Legislação, no cálculo da área a ser protegida com as medidas de segurança contra incêndio, não serão computados: I - telheiros, com laterais abertas, destinados à proteção de utensílios, caixas d'água, tanques e outras instalações desde que não tenham área superior a 10m2 (dez metros quadrados); II - platibandas e beirais de telhado até 3m (três metros) de projeção; III - passagens cobertas, com largura máxima de 3m (três metros), com laterais abertas, destinadas apenas à circulação de pessoas ou de mercadorias; IV - coberturas de bombas de combustível e de praças de pedágio, desde que não sejam utilizadas para outros fins e sejam abertas lateralmente; V - reservatórios de água; VI - piscinas, banheiros, vestiários e assemelhados, no tocante a sistemas hidráulicos, alarme de incêndio e quadras esportivas com cobertura e sem paredes; VII - escadas enclausuradas, incluindo as antecâmaras; VIII - dutos de ventilação das saídas de emergência. (RIO GRANDE DO SUL, 2013, grifo nosso).

A legislação antiga, através do Artigo 9º, inciso III, do Decreto Estadual nº

37.380/1997), previa a determinação da instalação de sistemas de hidrantes,

independente da área construída:

Art. 9º - As edificações deverão ser dotadas de instalações hidráulicas de combate a incêndio quando: I - possuírem altura superior a 12 m;

72

II - não sendo residenciais, tiverem área total construída superior a 750 m2 (setecentos e cinqüenta metros quadrados); III - forem destinados a postos de serviço ou garagens com abastecimento de combustíveis, independente da área construída; IV - destinadas à residência, com área de pavimento superior a 750 m2 (setecentos e cinqüenta metros quadrados); V - servirem como depósitos de gás liqüefeito de petróleo, de acordo com a Portaria nº 27/96 do DNC; VI - Depósitos de líquidos inflamáveis e combustíveis, de acordo com a PNB nº 216/71 do extinto CNP e PNB 98 da ABNT. (RIO GRANDE DO SUL, 2013, grifo nosso).

Com esta nova determinação, a maioria dos postos do Rio Grande do Sul

(mesmos os grandes, com mais de 15 bombas de abastecimento) ficará excluída da

obrigatoriedade de uso de sistema de hidrantes, pois não possuem, em sua grande

maioria, áreas maiores do que 750 m2 e nem alturas maiores do que 12 metros

(BRAATZ, 2014e).

Segundo Braatz (2014e), apesar dos tanques de combustíveis dos postos de

abastecimento serem armazenados no subsolo e os postos serem classificados

como de risco baixo, são locais são de elevado risco de incidência de incêndio, uma

vez que durante o abastecimento ocorre a emissão de vapores inflamáveis de fácil

ignição. Assim, não são raros os incêndios em veículos durante o abastecimento,

visto que muitos automóveis não apresentam manutenção adequada e que, nestes

locais, muitas vezes uma simples fonte ignitora (faísca elétrica, por exemplo) pode

ser suficiente para que o incêndio se estabeleça. Nestas circunstâncias, o uso de

extintores pode não ser suficiente para debelar ou controlar completamente o fogo.

Supomos que um caminhão carregado de material de fácil combustão, ao abastecer ou quando estiver estacionado, simplesmente resolva pegar fogo junto às bombas de abastecimento ou próximo das salas de conveniência do posto, acredito que apenas o uso de extintores de incêndio, geralmente com capacidade extintora de 20-B (exigido para a proteção das bombas de abastecimento), não seria o suficiente para debelar as chamas e um incêndio de grades proporções poderá vir a ocorrer.

Já se o posto de abastecimento possuísse um sistema de hidrantes de combate a incêndio, as chamas seriam debeladas facilmente, desde que os funcionários do posto recebessem treinamento

adequado. (BRAATZ, 2014e).

73

Este é outro ponto da lei complementar estadual nº 14.376/2013 que está

sendo alvo de questionamentos, pois para postos de combustíveis o nível de

exigência ficou mais leve do que na antiga lei 420/1998.

2.2.5.1.4 Exclusão da possibilidade de apresentação de PSPCI para edificações de

risco médio

Outro ponto de questionamento em relação à nova lei é a exclusão da

aplicabilidade do Plano Simplificado de Prevenção e Proteção Contra Incêndio

(PSPCI) para edificações ou áreas de risco médio, como era feito na antiga

legislação. Com a nova legislação, apenas edificações com área de risco baixo

podem apresentar PSCI, ficando livres da obrigatoriedade de elaboração do PPCI

completo e do Projeto de prevenção contra incêndio (PrPCI), que o integra.

No Artigo 21º da lei 14.376/2013 são apresentados os critérios de

aplicabilidade do plano simplificado de prevenção e proteção contra incêndio:

Art. 21. O PSPCI destina-se às edificações que apresentem todas as características abaixo: I - de classe de risco de incêndio baixo, conforme Tabela 3 do Anexo A (Classificação); II - com área total edificada de até 750m² (setecentos e cinquenta metros quadrados); III - com até 2 (dois) pavimentos; IV – VETADO.

§ 1.º Excetuam-se do disposto neste artigo os depósitos e revendas de GLP a partir de 521 kg (quinhentos e vinte e um quilogramas), os depósitos de combustíveis e inflamáveis e as edificações com central de GLP.

§ 2.º Excetuam-se também o Grupo F, “Local de Reunião de Público” – edificações que possuam risco de carga de incêndio médio e alto - conforme Tabela 3 do Anexo A (Classificação) e instruídos com base na NBR 14.432/2000 “Exigências de resistência ao fogo de elementos construtivos de edificações” ou Norma Nacional vigente, bem como locais de elevado risco de incêndio e sinistro, conforme RTCBMRS.

§ 3.º Para as edificações e áreas de risco de incêndio que não estejam enquadradas na Tabela 3 do Anexo A (Classificação), aplica-se a regra de cálculo definida na NBR 14.432/2000

74

“Exigências de resistência ao fogo de elementos construtivos de edificações”.

§ 4.º São de inteira responsabilidade do proprietário ou do responsável pelo uso da edificação as informações prestadas para a instrução do PSPCI. (RIO GRANDE DO SUL, 2013, grifo nosso).

Deste modo, qualquer edificação ou área que se enquadre em risco

intermediário, independentemente de sua área ou atividade exercida no local,

deverá apresentar o plano de prevenção contra incêndio completo.

A antiga legislação municipal 420/1998 seguia a portaria Nº 138/EMBM/2002

para a aplicação planos simplificados de prevenção contra incêndio.

Art. 1º - Poderá ser apresentado Plano Simplificado de Prevenção e Proteção Contra Incêndios (PSPCI) para edificações que se enquadrem nos seguintes itens:

I - De classe de risco de Incêndio pequeno ou médio, conforme TSIB do IRB; II - Com área total edificada de até 750 m2; III - Com até três pavimentos; IV - Que exigirem prevenção apenas por Sistema de Extintores de Incêndio, Sistema de iluminação de Emergência, Sistema de Sinalização Básica e Complementar.

Parágrafo único - Excetuam-se do disposto no caput deste artigo os depósitos e revendas de GLP a partir de 521 Kg; as edificações com Central de GLP; depósitos de combustíveis e inflamáveis; divisões de F1 a F6 da ocupação F da NBR 9077/2001; e locais de elevado risco de incêndio e Pânico. (RIO GRANDE DO SUL, 2002, grifo nosso).

Tal dispositivo flexibilizava a aplicação do PSPCI, possibilitando ocupações

que, mesmo enquadradas como de risco médio, mas que necessitassem apenas de

medidas básicas de prevenção e combate, fossem amparadas por tal dispositivo.

Já pela nova lei estadual 14.376, qualquer edificação ou área de risco de

incêndio médio (um escritório de contabilidade, por exemplo), mesmo que possua

uma pequena área construída (10 m², por exemplo) e necessite basicamente de um

extintor de incêndio e uma placa de sinalização de saída (conforme determinações

da Tabela 5), necessitará também, obrigatoriamente, dos seguintes itens (BRAATZ,

2014b):

a) responsável técnico (Engenheiro ou Arquiteto);

b) projeto de prevenção e proteção contra incêndio – PrPCI;

c) emissão de Anotação de Responsabilidade Técnica – ART; e

75

d) emissão de Registro de Responsabilidade Técnica - RRT.

Tais determinações são rigorosas em excesso para casos de ocupação

“básica”, como escritórios de pequeno porte, que serão desnecessariamente

onerados, visto que tais itens possuem custos relativamente elevados comparados

ao porte destes estabelecimentos. Mesmo que tais edificações ou área de risco de

incêndio estejam enquadradas como microempresas (ou empresas de pequeno

porte), ficando isentas da necessidade da análise e vistoria do CBMRS, ainda

haverá necessidade de elaboração do projeto de prevenção contra incêndio (PrPCI)

e da assinatura de um profissional legalmente habilitado (BRAATZ, 2014b).

2.2.5.1.5 Referências incorretas/inexistentes e incorreções gerais de redação

Existem muitos outros artigos da nova lei estadual complementar que

carecem de ajustes, apresentando referências erradas ou inexistentes, ou mesmo

determinando consulta a anexos que sequer existem na nossa legislação. Abaixo

serão rapidamente citados alguns outros casos passíveis de ajustes na

regulamentação ou nas próximas atualizações.

a) artigo 6º, Inciso XI – Definição de capacidade de lotação:

(...) XI - capacidade lotação é a relação entre o conjunto de medidas necessárias que as edificações devem possuir, a fim de permitir o fácil acesso de auxílio externo para o combate ao fogo e a desocupação e a proteção da integridade física de seus ocupantes; (...). (RIO GRANDE DO SUL, 2013).

A definição para capacidade de lotação não foi estabelecida de modo

claro. É necessário que uma importante definição como esta seja baseada

em critérios técnicos e claros, a ser definidos pelo CBMRS ou pelas

instruções técnicas, quando da regulamentação da lei. Do modo

apresentado atualmente, não como se definir, menos ainda como ser

cobrado pelos órgãos responsáveis (BRAATZ, 2014b).

b) artigo 14º – Referência incorreta ao Artigo 41º

76

Art. 14. Compete ao órgão municipal responsável pela expedição do Alvará de Funcionamento da Edificação a fiscalização e a aplicação da sanção administrativa prevista no art. 41, inciso IV, desta Lei Complementar. (RIO GRANDE DO SUL, 2013, grifo nosso).

Este é um claro erro de redação/digitação, pois não existe inciso “IV” no

Artigo 41º da lei 14.376/2013. É provável que a intenção dos elaboradores

da lei tenha sido referir ao inciso IV do Artigo 40º (BRAATZ, 2014b).

Art. 40. As penalidades e as sanções administrativas a serem aplicadas pelo descumprimento desta Lei Complementar são: I - advertência; II - multa; III - interdição; e IV - embargo. (RIO GRANDE DO SUL, 2013).

c) tabela 3.1 – Referência a anexos inexistentes para o Grupo F

A Tabela 3.1 da lei 14.376 (Figura 20, abaixo), na sua quarta página, para

determinação do levantamento da carga de incêndio de ocupações do

Grupo F-10, dispõe que se adotem como referência os Anexos “B” ou “C”.

Figura 20 – Determinação da carga de incêndio (qfi) em MJ/m², em função do tipo de

ocupação para edificações do grupo F Fonte: (RIO GRANDE DO SUL, 2013)

Entretanto, não há nenhum anexo C na legislação estadual complementar n°

14.376/2013. Além disso, o “Anexo B” da referida lei não trata sobre a determinação

a carga de incêndio específica (isto está determinado na tabela 3.3), e sim das

medidas de proteção e combate a incêndio. Claramente esta foi um detalhe que

ficou sem correção na adaptação das normas de São Paulo (provavelmente da

77

Instrução Técnica nº 14/2011 do Corpo de Bombeiros do Estado de São) para a

nossa legislação.

Tal erro deve ser corrigido, pois gera confusão e dúvidas para a determinação

da carga de incêndio para atividades do grupo F-10 (“Exposições”) (BRAATZ,

2014c).

78

3 CONCLUSÃO

A ciência que rege o fogo é bastante vasta e complexa, bem como seus

mecanismos de propagação, previsão, prevenção e combate, como poder ser visto

na revisão bibliográfica deste trabalho. O fogo é um elemento cujo controle ainda

não é de total domínio do homem, e sua incidência pode trazer grandes prejuízos à

vida humana e ao seu patrimônio. Pode ter início de diversas maneiras e

propagação muitas vezes silenciosa e imprevisível, podendo ter como resultado

graves prejuízos à vida humana e ao seu patrimônio. Assim, deve ser desprendido

todo esforço possível em tecnologia e pesquisa para melhor compreensão do

sistema de variáveis que compreende um incêndio, de modo que se possa antever e

minimizar riscos, possibilitando a criação de ambientes mais seguros e funcionais.

Infelizmente a cultura de prevenção e proteção contra incêndio no Brasil é

pouco desenvolvida em comparação com muitos países do mundo, necessitando

maior interesse e maior incentivo por parte do poder público para que esta

importantíssima área se desenvolva. Enquanto isso não acontece, o custo pago pela

sociedade é alto: são inúmeras mortes e graves prejuízos financeiros nos últimos

anos ocasionados pela negligência e falta de preparo e iniciativa na prevenção e

combate a incêndio.

Há carência de legislações fortes, claras e concisas, além de uma ação de

fiscalização efetiva que garanta o cumprimento da lei. Apenas poucos estados

brasileiros, como São Paulo e Santa Catarina, dispõem de legislações um pouco

mais evoluídas.

Conforme apresentado no desenvolvimento deste trabalho, a legislação em

Porto Alegre e no estado do Rio Grande do Sul ainda carece de muitas melhorias.

Em Porto Alegre, mesmo com a substituição da antiga lei complementar municipal nº

420 de 1998 pela lei complementar estadual nº 14.376 de 2013 como referência

técnica e legal, muitos ajustes ainda são necessários.

A nova lei estadual nº 14.376, conforme versado ao longo do trabalho, possui

sua gênese na legislação de São Paulo, o estado mais desenvolvido no quesito

prevenção e proteção contra incêndio, sendo, portanto, mais avançada que sua

precedente.

79

Houve evolução em muitos pontos, como em relação às medidas de proteção

obrigatórias, com inclusão de importantes itens que não exigidos anteriormente. Tais

avanços tornam a legislação extremamente eficiente para casas noturnas e de

shows (“efeito Kiss”).

Entretanto, a nova lei, sancionada às pressas e sem ainda regulamentação,

apresenta inúmeras falhas e que a deixam em muitos pontos mais branda que a

legislação anterior de Porto Alegre. Além disso, incorreções de redação e adaptação

(da lei de São Paulo) a tornam confusa em muitos pontos. Foram apresentados ao

longo do desenvolvimento muitos dos artigos que necessitam atenção e ajustes.

Entretanto, não foi possível, e nem era intenção/escopo deste trabalho “dissecar” a

nova lei, apresentando todas as possíveis falhas da atual legislação, o que

demandaria um trabalho mais longo e extenso.

Para melhoria do cenário da prevenção e proteção contra incêndio em Porto

Alegre e no Rio Grande do Sul, como um todo, é necessário, primeiramente, que a

nova lei passe por uma revisão detalhada, com ajustes dos pontos inconsistentes.

Além disso, é imperativo que o corpo técnico dos bombeiros seja ampliado, de modo

a suprir a grande demanda de apreciação de projetos, vistorias e emissão de

alvarás. Atualmente temos sobrecarga do reduzido número de oficiais designados

para esta função no estado.

Também seria interessante a inserção de cadeiras de prevenção, proteção e

combate a incêndio na base curricular como matérias obrigatórias para cursos de

engenharia civil, arquitetura e cursos técnicos relacionados à área de edificações.

Finalmente, para que uma cultura “global” de prevenção contra incêndio seja

alcançada em nosso estado, é necessário a mobilização de toda a sociedade, não

apenas do poder público. São necessárias ações concretas, como instrução para

que as crianças, desde as séries iniciais, aprendam na escola sobre o perigo do fogo

e adquiram noções da importância de determinadas ações e medidas, para que

quando cresçam tenham essas convicções entranhadas em suas visões e condutas.

Assim como há ações importantes como conscientização ambiental junto às

crianças, é igualmente interessante e necessário que o mesmo ocorra com a

prevenção contra incêndio.

São necessárias mudanças de mentalidade e de visão. É necessário, por

exemplo, que os empresários sejam os primeiros a desejar que seus ambientes

sejam os mais seguros possíveis, e que não apenas cumpram por obrigação

80

determinações legais. Além de cumprindo com seu dever moral e ético ao cumprir a

lei e resguardar vidas, estarão também protegendo seu patrimônio e evitando

transtornos, interrupções e prejuízos em seus empreendimentos.

É preciso também que as pessoas que frequentam locais como casas de

shows ou boates cobrem o alvará e “fiscalizem” os ambientes, optando por aqueles

que estejam em situação regular perante a lei. Como outro exemplo, podemos citar

universidades e colégios, que organizam festas em casas noturnas, devem sempre

atentar e cobrar o alvará da casa no momento da escolha do local e da assinatura

do contrato (quando cabível).

81

REFERÊNCIAS

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84

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