A personagem lucrecia em caes da provincia (1)

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A personagem Lucrécia dentro da obra “Cães da Província” de Assis Brasil Dentro do livro “Cães da Província” de Luiz Antonio de Assis Brasil, a personagem Lucrécia viveu momentos de amor, religiosidade, liberdade, dor e sofrimento. Sobre as atitudes e comportamentos desta personagem, que mais adiante na obra recebe um sobrenome “Bórgia”, ficam os olhares de Eusébio e Qorpo Santo. No primeiro capítulo dessa obra, a personagem é apresentada como “Filha da Terra – de pai castelhano e mãe índia, a qual estudou em um colégio na Aldeia dos Anjos” e que sabia ler, escrever, bordar, tecer, cozinhar, “rezar as horas” (p. 21-22). Segundo sua mestra, tinha certo gênio, porém, era uma pessoa boa e podia ser uma excelente esposa. Lucrécia era jovem, quando se casou com Eusébio Gomes Cavalcante, tornou-se uma dona de casa “com virtudes intocáveis”, não faltava às novenas, dava esmola, cantava nas missas, em suma, era uma pessoa piedosa. Seu marido dava-lhe tudo o que pedia. No entanto, Eusébio era um homem que temia que se revelasse o verdadeiro sangue bugre, castelhano de Lucrécia, era ciumento, possessivo, orgulhoso, fazia de tudo para manter sua reputação, sua honra. Com o passar do tempo, Lucrécia muda seu comportamento, começa a ralhar com as escravas, ironizar os cabelos brancos de Eusébio. E também, não vai mais à igreja e nem nas viagens com o marido. Além disso, começou a escrever longas cartas direcionadas a um homem,

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A personagem Lucrécia dentro da obra “Cães da Província” de Assis Brasil

Dentro do livro “Cães da Província” de Luiz Antonio de Assis Brasil, a

personagem Lucrécia viveu momentos de amor, religiosidade, liberdade, dor e

sofrimento. Sobre as atitudes e comportamentos desta personagem, que mais adiante na

obra recebe um sobrenome “Bórgia”, ficam os olhares de Eusébio e Qorpo Santo.

No primeiro capítulo dessa obra, a personagem é apresentada como “Filha da

Terra – de pai castelhano e mãe índia, a qual estudou em um colégio na Aldeia dos

Anjos” e que sabia ler, escrever, bordar, tecer, cozinhar, “rezar as horas” (p. 21-22).

Segundo sua mestra, tinha certo gênio, porém, era uma pessoa boa e podia ser uma

excelente esposa. Lucrécia era jovem, quando se casou com Eusébio Gomes

Cavalcante, tornou-se uma dona de casa “com virtudes intocáveis”, não faltava às

novenas, dava esmola, cantava nas missas, em suma, era uma pessoa piedosa. Seu

marido dava-lhe tudo o que pedia. No entanto, Eusébio era um homem que temia que se

revelasse o verdadeiro sangue bugre, castelhano de Lucrécia, era ciumento, possessivo,

orgulhoso, fazia de tudo para manter sua reputação, sua honra.

Com o passar do tempo, Lucrécia muda seu comportamento, começa a ralhar

com as escravas, ironizar os cabelos brancos de Eusébio. E também, não vai mais à

igreja e nem nas viagens com o marido. Além disso, começou a escrever longas cartas

direcionadas a um homem, supostamente seu amante, o fornecedor de queijos

Raimundo, mas não sabemos se são realmente escritas para ele, Pois, em nenhum

momento fica explicito na obra a quem se destinam as cartas. Lucrécia, algumas vezes,

foi surpreendida por Eusébio, mas não se incomodava com a presença do marido, e com

certa autoridade, mandava-o sair. Eusébio sempre saia e não lhe dizia nada.

Como se pode perceber, temos aqui um detalhe importante e que não podemos

deixar de analisar, que é quando Lucrécia escreve as cartas. Momento este, em que ela

vai para o seu quarto e mesmo sem ter a aprovação de Eusébio, começa a escrever, e a

expressar-se. E esta mulher, a Lucrécia não sente vergonha e nem medo, pelo contrário

ela só se “liberta”, só consegue dizer o que sente quando escreve. Diferente do seu

marido – o qual é atormentado dia e noite por seus medos ora por perder o amor de

Lucrécia ora por ver sua honra jogada ao chão.

Voltando à história desta personagem, passa-se mais um tempo e ela foge com o

fornecedor de queijos. Diante desta situação, temos um primeiro conflito – a traição de

Lucrécia. Quando percebe a ausência da esposa, Eusébio fica transtornado a pensar na

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honra que para ele está perto do fim e Lucrécia ganha outro adjetivo só que agora num

tom mais ofensivo, cadela. Desesperado, Eusébio pede ajuda a seu amigo, Qorpo

Santo, que ao saber do acontecido, chama Lucrécia de adultera, assassina de homens

vivos, energúmena – a qual é chamada, mais adiante na obra, de Lucrécia Bórgia, a

envenenadora. E, propõe uma solução, uma libertação: primeiro, escrever uma petição

ao Delegado Dr. Calado, alegando que Lucrécia fugiu para São Leopoldo e está louca e,

segundo, criar uma peça de Teatro, cujo título é O HOMEM QUE ENGANOU A

PROVÍNCIA, contando o desaparecimento, a fim de manter a honra de Eusébio.

Além do sumiço de Lucrécia, tem o caso do Açougueiro e sua “esposa”, que são

suspeitos de matarem algumas pessoas e a partir dos corpos fazerem linguiça para ser

vendida em seu Açougue.

Diante dos boatos, e também, do desaparecimento de algumas pessoas

importantes para a Província, o delegado é levado a investigar a casa do Açougueiro. Ao

chegar lá, confirmam-se as hipóteses, e descobre no porão e no pátio da casa “um

verdadeiro cemitério”. O casal de assassinos é preso, e a noticia logo se espalha pela

Província. Esta notícia chega aos ouvidos de Qorpo Santo, que ao recebê-la, vai

imediatamente à casa do Açougueiro, já com segundas intenções, ao pensar em como

continuar sua peça de teatro e resolver o caso de Lucrécia. E é tamanha sua alegria, ao

saber que dentre os corpos encontrados, existe um cadáver de uma mulher, sem cabeça e

não identificada.

Logo após essa visita, Qorpo Santo e Eusébio vão à casa do Delegado Calado e

dizem que o corpo não identificado é o de Lucrécia – o que gera um final para a trama,

pois os três vão a Santa Casa, reconhecer o corpo e Eusébio afirma: “É sim, é a minha

Lucrécia”. Assim, acontece o enterro, o qual é digno de cortejo fúnebre, a falsa Lucrécia

é enterrada, e em sua lápide apenas jaze o nome inicial, sem nenhum sobrenome.

Eusébio recomeça sua vida, e passa sentir-se tranquilho, porém, sua

tranquilidade tem seus dias contados com a volta repentina de Lucrécia, que aparece de

noite em seu quarto, lhe dizendo que ali é o seu lugar. Eusébio a manda ir embora, mas

ela contesta e permanece.

A Lucrécia que voltou, não é mais a mesma, agora com uma cicatriz no pescoço,

com as unhas sujas, as mãos pesadas. Seu retorno provoca vários sentimentos

contraditórios em Eusébio, que acreditava que o pesadelo já havia passado. No entanto,

ele a matem presa em sua própria casa a fim de manter a mentira e também, sua honra.

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Os dias em que Lucrécia passou naquela casa acabaram gerando batalhas entre a

razão e a emoção, pois esta volta não mexeu apenas com a vida de Eusébio, embora o

foco na obra seja os sentimentos dele, mas ela, também, lutou para manter-se viva e

para isso ora se rendeu às ordens do marido, ora perdeu a razão e agiu que nem uma

“louca” e cortou seus pulsos várias vezes.

Por um tempo, Lucrécia foi agressiva, quebrava tudo o que encontrava pela

frente, gritava, mas com o passar dos dias e vendo que Eusébio não se importava com

seus ataques de raiva. Ela tornou-se submissa ao marido, feita um cão que atendia o

chamado de seu dono e já não reclamava mais apenas aceitava. Eusébio muitas vezes,

ria do estado de Lucrécia e chamava-a de louca, defunta, pois a mulher que ele

conheceu já não existia, havia morrido em seus pensamentos.

Com medo de enlouquecer junto com ela, Eusébio pensou em sem matar, porém

no final decidiu mata-la. Segundo o texto, era em um feriado, Eusébio deixou um

caixeiro na porta do seu comércio e subiu para o sobrado, dispensou seu escravo e lhe

pediu apenas que voltasse à meia noite daquele dia. Foi ao quarto de hóspedes, pegou

um pano e se dirigiu para o quarto em que estava deitada Lucrécia, lá ele a estrangulou e

deu um fim para os sofrimentos de ambos. Em suma, a verdadeira Lucrécia foi

enterrada no mesmo túmulo e novamente sem nenhum sobrenome em sua lápide.

Assim, a morte de Lucrécia já não passava mais de uma mentira, e o Homem que

enganou a Província acabava de dar fim a sua trama.