A PERSPEGlVA PÓS-COlONIAl EM HOMI K. BHABA · um lugar híbrido que produz o significado cultural....

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A PERSPEGlVA PÓS-COlONIAl EM HOMI K. BHABA de Homi K. 8haba, The /ocafion of eu/fure. london, Routledge, 1994,285 p. POR IDILVA GERMANO Professora do Departamento de Psicologia do Universidode Federal do Ceará e doutorando em Sociologia no mesmo instituição. The Location of Culture de Homi K. Bhabha reúne uma série de 12 ensaios escritos pelo autor a par- tir de 1985, nove dos quais publi- cados anteriormente em revistas e coletâneas especializadas em lite- ratura e crítica cultural. A obra constitui-se um esforço de teori- zação da cultura ocidental a par- tir da perspectiva pós-colonial, onde a reflexão incide sobre as narrativas modernas e suas princi- pais categorias, entre as quais des- taca-se a de "nação". O ponto de vista pós-colonial refere-se à pers- pectiva de cultura fronteiriça e marginal que os desdobramentos contemporâneos do colonialismo originam. Analisando artistas e escritores com aguda sensibilida- de à questão do "transcultural" (Toni Morrison, Nadine Gordi- mer, Derek Walcott, joseph Con- rad), Bhabha observa grande am- bigüidade nas suas expressões de identidade nacional, étnica, sexual e cultural. A partir dessas e ou- tras análises, o autor oferece uma teoria do hibridismo cultural e da articulação das diferenças sociais, capaz de dar conta dos novos fe- nômenos contemporâneos de identificação e política cultural. Nesse sentido, os ensaios se inse- rem entre os estudos de política cultural contemporânea desen- volvidos por autores como Ed- ward Said, Gayatri Spivak e Terry Eagleton, os quais tomam como objeto de reflexão o que Steven Connor chama o " poder em re- presentação nas linguagens e ima- gens coloniais" (1992 p.187). O objetivo desses estudos é analisar os sistemas dominantes de ima- gens e linguagens (ocidentalistas, sexistas, racistas) que contribuí- ram para o silenciamento do Ou- tro (orientais, mulheres, negros, nações colonizadas), impedindo- os de se auto definir. Inspirado no Black Skin W7?ite Masks de Frantz Fanon (1952) so- bre a experiência da negritude num mundo opressivamente bran- co e nas obras de artistas e intelec- tuais da vanguarda contemporâ- nea, Bhabha examina o problema da construção da identidade cul- tural adotando a perspectiva de articulação entre as duas esferas tradicionalmente estanques: colo- nizador e colonizado. Para o au- tor, esses perfis não devem ser compreendidos como traços cul- turais definidos a priori e de for- ma a-histórica. Colonizador e co- lonizado são construídos num processo de negociação e troca constante de ações culturais que produzem um reconhecimento mútuo e rnutável da diferença cultural. Portanto, há uma ênfase sobre o caráter performativo e temporal da produção das diferen- ças étnicas e culturais. Desse mo- do, o espaço de engajamento das partes - seja no sentido de afilia- ção e consenso ou de antagonis- mo e conflito - é entendido como um lugar híbrido que produz o significado cultural. Esse espaço lirninar, observável nas metáforas de fronteira (viagem, ponte, esca- da, margem) das linguagens ordi- nárias e na arte contemporânea, passam a ser o foco da análise e da proposta teórica do autor. Na sua introdução, subintitu- lada" Locations of Culture", Bha- bha remete para as dificuldades atuais da teoria cultural, traduzi- 150 Revistode Ciências Sociais v.27 n.l/2 1996 das no incômodo uso do prefixo "pós", indicativo de uma certa de- sorientação com as noções tradi- cionais de igualdade/diferença, passado/presente, inclusão/ exclu- são. Sua intenção é pensar além dessas estratégias narrativas e ana- lisar os seus espaços de entremeio. São nesses interstícios que são criadas, por exemplo, as experiên- cias de ser nação ("nationess"). A partir das marcantes transforma- ções contemporâneas (mundiali- zação, crescente permeabilidade das fronteiras nacionais, grandes fluxos migratórios, mesclagem étnico-cultural), o autor pergun- ta pelas mudanças que delas po- dem advir nos modos de repre- sentação e de fortalecimento po- lítico das populações oprimidas. Há especificidades que merecem investigação e teorização. Como ilustração, temos por um lado a racialização da violência urbana nos conflitos recentes entre corea- nos, chicanos e afro-americanos nos Estados Unidos, de onde se poderiam esperar estratégias de colaboração e diálogo, já que his- toricamente essas comunidades compartilharam situações seme- lhantes de privação e discrimina- ção social. Por outro lado, na Grã- Bretanha, a partir dos efeitos trá- gicos dos Versos Satânicos de Sal- mon Rushdie e pondo de lado as diferenças de seus projetos, femi- nistas negras e irlandesas se uni- ram contra o que chamam de "ra- cialização da religião", o discurso dominante mediante o qual o Es- tado representa seus conflitos e lu- tas, independente da sua possível natureza secular ou mesmo "se- xual". Com efeito, o autor assina- la que as categorias teóricas tradi- cionais, marcadas por um cunho essencialista, escapam a essas pe- culiaridades, uma vez que "(...) A articulação social da di- ferença, a partir da perspectiva da

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A PERSPEGlVA PÓS-COlONIAlEM HOMI K. BHABA

de Homi K. 8haba,The /ocafion of eu/fure.london, Routledge, 1994,285 p.

POR IDILVA GERMANOProfessora do Departamento de Psicologia doUniversidode Federal do Ceará e doutorando emSociologia no mesmo instituição.

The Location of Culture de HomiK. Bhabha reúne uma série de 12ensaios escritos pelo autor a par-tir de 1985, nove dos quais publi-cados anteriormente em revistase coletâneas especializadas em lite-ratura e crítica cultural. A obraconstitui-se um esforço de teori-zação da cultura ocidental a par-tir da perspectiva pós-colonial,onde a reflexão incide sobre asnarrativas modernas e suas princi-pais categorias, entre as quais des-taca-se a de "nação". O ponto devista pós-colonial refere-se à pers-pectiva de cultura fronteiriça emarginal que os desdobramentoscontemporâneos do colonialismooriginam. Analisando artistas eescritores com aguda sensibilida-de à questão do "transcultural"(Toni Morrison, Nadine Gordi-mer, Derek Walcott, joseph Con-rad), Bhabha observa grande am-bigüidade nas suas expressões deidentidade nacional, étnica, sexuale cultural. A partir dessas e ou-tras análises, o autor oferece umateoria do hibridismo cultural e daarticulação das diferenças sociais,capaz de dar conta dos novos fe-nômenos contemporâneos deidentificação e política cultural.Nesse sentido, os ensaios se inse-rem entre os estudos de políticacultural contemporânea desen-volvidos por autores como Ed-ward Said, Gayatri Spivak e TerryEagleton, os quais tomam como

objeto de reflexão o que StevenConnor chama o " poder em re-presentação nas linguagens e ima-gens coloniais" (1992 p.187). Oobjetivo desses estudos é analisaros sistemas dominantes de ima-gens e linguagens (ocidentalistas,sexistas, racistas) que contribuí-ram para o silenciamento do Ou-tro (orientais, mulheres, negros,nações colonizadas), impedindo-os de se auto definir.

Inspirado no Black Skin W7?iteMasks de Frantz Fanon (1952) so-bre a experiência da negritudenum mundo opressivamente bran-co e nas obras de artistas e intelec-tuais da vanguarda contemporâ-nea, Bhabha examina o problemada construção da identidade cul-tural adotando a perspectiva dearticulação entre as duas esferastradicionalmente estanques: colo-nizador e colonizado. Para o au-tor, esses perfis não devem sercompreendidos como traços cul-turais definidos a priori e de for-ma a-histórica. Colonizador e co-lonizado são construídos numprocesso de negociação e trocaconstante de ações culturais queproduzem um reconhecimentomútuo e rnutável da diferençacultural. Portanto, há uma ênfasesobre o caráter performativo etemporal da produção das diferen-ças étnicas e culturais. Desse mo-do, o espaço de engajamento daspartes - seja no sentido de afilia-ção e consenso ou de antagonis-mo e conflito - é entendido comoum lugar híbrido que produz osignificado cultural. Esse espaçolirninar, observável nas metáforasde fronteira (viagem, ponte, esca-da, margem) das linguagens ordi-nárias e na arte contemporânea,passam a ser o foco da análise eda proposta teórica do autor.

Na sua introdução, subintitu-lada" Locations of Culture", Bha-bha remete para as dificuldadesatuais da teoria cultural, traduzi-

150 Revistode Ciências Sociais v.27 n.l/2 1996

das no incômodo uso do prefixo"pós", indicativo de uma certa de-sorientação com as noções tradi-cionais de igualdade/diferença,passado/presente, inclusão/ exclu-são. Sua intenção é pensar alémdessas estratégias narrativas e ana-lisar os seus espaços de entremeio.São nesses interstícios que sãocriadas, por exemplo, as experiên-cias de ser nação ("nationess"). Apartir das marcantes transforma-ções contemporâneas (mundiali-zação, crescente permeabilidadedas fronteiras nacionais, grandesfluxos migratórios, mesclagemétnico-cultural), o autor pergun-ta pelas mudanças que delas po-dem advir nos modos de repre-sentação e de fortalecimento po-lítico das populações oprimidas.Há especificidades que mereceminvestigação e teorização. Comoilustração, temos por um lado aracialização da violência urbananos conflitos recentes entre corea-nos, chicanos e afro-americanosnos Estados Unidos, de onde sepoderiam esperar estratégias decolaboração e diálogo, já que his-toricamente essas comunidadescompartilharam situações seme-lhantes de privação e discrimina-ção social. Por outro lado, na Grã-Bretanha, a partir dos efeitos trá-gicos dos Versos Satânicos de Sal-mon Rushdie e pondo de lado asdiferenças de seus projetos, femi-nistas negras e irlandesas se uni-ram contra o que chamam de "ra-cialização da religião", o discursodominante mediante o qual o Es-tado representa seus conflitos e lu-tas, independente da sua possívelnatureza secular ou mesmo "se-xual". Com efeito, o autor assina-la que as categorias teóricas tradi-cionais, marcadas por um cunhoessencialista, escapam a essas pe-culiaridades, uma vez que

"(...) A articulação social da di-ferença, a partir da perspectiva da

·minoria, é uma complexa e con-tÍnua negociação que busca auto-rizar hibridismos culturais queemergem em momentos de trans-formação histórica. (... )Os en-gajamentos fronteiriços da dife-rença cultural freqüentementepodem ser tanto consensuaisquanto conflitivos; eles podemconfundir nossas definições detradição e modernidade; reali-nham os limites usuais entre o pri-vado e o público, alto e baixo; edesafiam expectativas normativasde desenvolvimento e progresso."(1994:2)

Para Bhabha, as grandes narra-tivas que conectam capitalismo eclasse dirigem os mecanismos dareprodução social, mas não ofe-recem em si mesmas uma moldu-ra teórica capaz de dar inteligi-bilidade aos modos de identifica-ção cultural e afiliação políticaque se formam em torno da sexua-lidade, raça, feminismo, do mun-do dos refugiados e migrantes oudo destino social da AIDS.

Bhabha opta por utilizar a des-construção derridadiana aliada àpsicanálise lacaniana como mé-todo de crítica à falsa oposição en-tre teoria e prática política. Con-tra aqueles que acreditam que osreferenciais e modelos teóricoseuropeus são constructos que ne-cessariamente omitem a políticade desigualdades entre o Primei-ro e o Terceiro Mundo, o pensa-dor defende que a crítica não podeescolher entre teoria e prática: ateoria é uma prática narrativa e,portanto, política; não é só repro-dutora, mas também produtora derealidades. O desafio da críticagira em torno das possibilidadesde superação ideológica da teoria:

"O que exige mais discussão ése as "novas" linguagens da críti-ca teórica (semiótica, pós-estrutu-ralista, desconstrutivista e o res-

to) apenas refletem aquelas divi-sões geopolíticas e suas esferas deinfluência. São os interesses dateoria "Ocidental" necessariamen-te coniventes com o papel hege-mônico do ocidente como umbloco de poder? A linguagem dateoria é meramente uma outra tra-ma de poder da elite ocidentalculturalmente privilegiada a fimde produzir um discurso do Ou-tro que reforça sua própria equa-ção poder-conhecimento?" (Ibi-dem:21)

Em "The commitment totheory", o autor afirma que divi-dir a tarefa de crítica social entre"teóricos" e "ativistas" obscureceo fato de que ambos representamformas de discurso político e quea diferença entre eles reside emsuas qualidades operacionais. Umpanfleto de greve tem uma carac-terística expositiva temporaria-mente presa ao evento; um textode teoria da ideologia contribuino plano das idéias e princípiospolíticos subjacentes ao direito degreve. Não há uma hierarquia oumesmo um caráter de "níveis"entre as duas formas: elas são maiscomo os lados de uma folha depapel. Também entre teoria e po-lítica, reside um espaço liminar detensão que produz ambigüidade.Esse terceiro espaço é o espaçofronteiriço ocupado pelo sujeitodo enunciado e o sujeito da enun-ciação e que representa tanto ascondições gerais da linguagemquanto a implicação do discursonuma estratégia performativa einstitucional específica. Essa pers-pectiva de interpretação culturaltem um efeito de romper com alógica de "sincronicidade e evolu-ção" presentes na tradição de aná-lise da cultura que acaba produ-zindo conceitos unitários e "mo-no líticos". Ela ataca prin-cipalmente o senso de tem-poralidade e, com isso, o "senso

de identidade cultural históricacomo uma força integradora epadronizadora, legitimada peloPassado original e mantido vivona tradição nacional do Povo."(Ibidem p.37). Para Bhabha, otempo percebido de forma pós-colonial é um tempo disjuntivo,não continuista, defasado. Em so-ciedades onde coexistem situa-ções díspares de ultra-moder-nidade tecnológica e opressãoneo-colonial devidas à divisãomultinacional do trabalho, a sen-sação é de se estar habitando umintervalo de tempo ("time-Iag")que provoca atitudes contraditó-rias em relação à modernidade: deum lado, resistência e conflito; deoutro, o desenvolvimento de umacondição híbrida que reinscreveo imaginário social da moderni-dade. Só quando se compreendeque as proposições culturais sãoconstruídas nesse espaço contra-ditório de enunciação é que se po-de entender porque as reivindica-ções hierárquicas de originalida-de e pureza cultural são insusten-táveis. A mudança cultural podeser, portanto, investigada nos dis-cursos híbridos de agentes em situ-ação socialliminar, que expressama vivência de um novo "tipo" detempo, um tempo descontínuo detradução e negociação da diferençacultural, não mais apoiado nas cons-tâncias da tradição nacionalista. Es-sas idéias têm um grande impactonas formas do debate político so-bre a questão colonial, que devepassar a considerar o dinamismo -ou a "dialética" - da construção dasidentidades nacionais:

"O intelectual nativo que iden-tifica o povo com a cultura nacio-nal verdadeira ficarão desaponta-dos. O povo agora é o próprioprincípio da "reorganização dia-lética" e ele constrói sua culturaa partir do texto nacional tradu-zido para formas ocidentais mo-

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dernas de tecnologia da informa-ção, linguagem, roupa. O localpolítico e histórico da enuncia-ção, agora mudado, transforma ossignificados da herança colonialem sinais libertários de um povolivre do futuro." (Ibidem:38)

Em "The Other question: ste-reotype, discrimination and thediscourse of colonialism", Bhabhaexplora o discurso colonial atra-vés de urna análise dos processosde subjetivação possibilitados pe-los seus estereótipos. Parte daidéia de que é necessário evitarurna posição moralista ou nacio-nalista que identifica estereótipose os elabora num discurso de afir-mação da origem e da unidade daidentidade nacional. Volta suaatenção, portanto, para o sistematextual que constrói as diferençase os sentidos de "mestiçagern","impureza" etc. que permitem acirculação e a proliferação da al-teridade racial e cultural. O este-reótipo, principal estratégia dis-cursiva colonial, é um discursocontraditório para os dois lados,tanto para o dominador quantopara o dominado. Bhabha faz urnaleitura psicanalítica do estereóti-po colonial em termos de feri-chismo. O estereótipo, corno ofetiche sexual, é produzido cornouma negação ou proibição da di-ferença. No caso da libido, o re-conhecimento da diferença sexu-al é negado pela fixação num ob-jeto que mascara aquela diferençae restaura uma presença originá-ria. Por sua vez, o estereótipo co-lonial expressa urna vacilação es-trutural entre urna afirmação ar-caica de similaridade ("Todos oshomens têm a mesma pele/raça!cultura") e a ansiedade associadaà falta e à diferença ("Alguns ho-mens não têm a mesma peleiraça! cultura"). Assim, no interiordo discurso, o fetiche representaum jogo entre a metáfora como

substituição (mascarando ausên-cia e diferença) e metonímia (queao mesmo tempo registra a faltapercebida). O fetiche e o estereóti-po, portanto, dariam acesso a urnaidentidade derivada tanto do po-der e do prazer, quanto da ansie-dade e da defesa, em suma, con-traditória em seu reconhecimen-to da diferença e repúdio dela. Osconflitos prazer/desprazer, domí-nio/ defesa, conhecimento/ nega-ção têm urna relevância crucialpara o discurso colonial: eles fa-zem do discurso estereotipadomais que urna falsa imagem a ser-viço de práticas discriminatórias,configurando-o corno um textomuito mais ambivalente de pro-jeção e introjeção, um lugar tan-to de fixidez e quanto de fantasia,tanto de culpa, quanto de agressi-vidade. Tanto colonizador quan-to colonizado estão presos a essetipo de discurso simplificado doOutro que lhes tolhem o reconhe-cimento da diferença - reconhe-cimento esse que permitiria aosignificante "pele/cultura" libe-rar-se das fixações das tipologiasraciais, das ideologias de domina-ção racial e cultural e teorias dadegeneração.

A perspectiva do terceiro espa-ço (e isso me lembra a metáforada terceira margem do rio, de Gui-marães Rosa, bem corno as con-siderações de Silviano Santiago so-bre o lugar "aparentemente vazio"- entre a obediência e a rebelião-ocupado pelo intelectual dos tró-picos) abre caminhos para a con-ceptualização de urna cultura in-ternacional (grifo do próprio au-tor), que não se funda no exo-tismo da diversidade cultural, masjustamente no seu hibridismo, noespaço de negociação do signifi-cado cultural.

A partir dessas premissas, Bha-bha revela seu projeto intelectu-al, que não se limita à questão donacionalismo, mas que investiga

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principalmente a certeza históri-ca e a natureza estabelecida daidéia ocidental de nação "cornouma forma obscura e onipresentede viver a localidade da cultura. "(Ibidem p.140) O autor examinaas complexas estratégias de iden-tificação cultural que funcionamem nome do "povo" ou da "na-ção", tornando-os os sujeitos ima-nentes de uma série de narrativassociais e literárias. Nem categoriasociológica empirica, nem entida-de cultural holista, a nação é en-tendida como "narração" ambí-gua que produz um contínuo des-lizamento de categorias corno se-xualidade, afiliação de classe, pa-ranóia territorial ou diferença cul-tural.

As críticas à Bhabha partemprincipalmente de urna posição"neo-iluminista" (na falta de urnaterminologia mais apropriada)que faz urna reflexão geral sobrea capacidade de mobilização po-lítica das estratégias retóricas dasteorias "pós". Quando as refle-xões de Bhabha assinalam a fragi-lidade dos princípios organizado-res dos movimentos nacionalistas,feministas e de negritude etc. (osquais se baseariam em categoriasestanques que a modernidade oci-dental criou), sua teoria corre orisco de desestimular as tentativasde auto-afirmação que fazem asrevoltas contra a exclusão e opres-são. A crescente preocupação aca-dêmica com o fim das grandesnarrativas e das utopias iluminis-tas acaba atrapalhando as lutasernancipatórias que necessitamdesses ideais moribundos. Maisprofundamente, Nelly Richardadverte para urna nova forma decolonialismo que se apresenta naprimazia dos conhecimentos"pós" do Ocidente: "O centro,embora alegue estar em desinte-gração, ainda opera corno centro:apartando de si todas as diver-gências ao incorporá-Ias a um sis-

tema de códigos cujos sentidos elecontinua a administrar, por di-reito exclusivo, tanto semânticacomo territorialmente." (ApudCONNOR, Steven (1992). Cultu-ra pós-moderna: introdução às teo-rias do contemporâneo. São Paulo,Loyola, :190).

Em resposta a esse tipo de cri-tica, Bhabha reafirma seu com-promisso com a teoria, alegandoque faz política, ao escrever aca-demicamente.

Os trabalhos de Homi Bhabhatêm obtido crescente receptivi-dade acadêmica que pode serconstatada pela quantidade de re-ferências às suas reflexões em te-ses e ensaios de crítica cultural,literatura comparada, política cul-tural e estudos interdisciplinaresdas áreas de Humanidades.

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