A possibilidade de aplicação de multa ao condômino antissocial.

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Terça, 16 de Abril de 2013 05h45 ERIKA CASSANDRA DE NICODEMOS: advogada atuante na área cível, graduada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, especialista em Direito da Propriedade Intelectual pelo Centro de Extensão Universitária, em convênio com a Universidad Austral de Buenos Aires, pós-graduada em Direito Empresarial pela GVlaw, Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas, e mestre em Direito Internacional Privado pela Università Degli Studi di Roma - La Sapienza. Erika

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Terça, 16 de Abril de 2013 05h45

ERIKA CASSANDRA DE NICODEMOS: advogada atuante na área cível,

graduada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São

Paulo, especialista em Direito da Propriedade Intelectual pelo Centro de

Extensão Universitária, em convênio com a Universidad Austral de

Buenos Aires, pós-graduada em Direito Empresarial pela GVlaw,

Faculdade de Direito da Fundação Getúlio Vargas, e mestre em Direito

Internacional Privado pela Università Degli Studi di Roma - La Sapienza.

Erika

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A possibilidade de aplicação de multa ao condômino antissocial: análise e aspectos

legais e jurisprudenciais

Atualmente, é irrefutável que faz parte do dia-a-dia da maioria dos

indivíduos que vive em sociedade o estresse, o trabalho excessivo e desgastante, a

pressa, problemas familiares, a pressão e muitos outros fatores que tornam a vida, em

certo aspecto, um ambiente hostil. Evidentemente, este contexto cria uma propensão à

falta de tolerância e, consequentemente, ao conflito. Se esta tendência pode ser

verificada entre pessoas que mal se conhecem, como em situações no trânsito ou em filas

de banco, é indutivo que possa ser ainda mais facilmente atestada entre aqueles que

convivem diariamente ou dividem um bem comum, como é o caso dos condôminos que

habitam um mesmo condomínio edilício.

Em face desse quadro, é de conhecimento geral que os desentendimentos

entre condôminos são corriqueiros, uma vez que devem compartilhar áreas de uso

comum. Afinal, o pressuposto do instituto do condomínio edilício é que os condôminos

dividam alguns espaços, como quadras, churrasqueiras, halls de entrada e elevadores, e

usufruam destes respeitando as normas previstas em Lei, em convenção condominial e

regulamento interno. Na maior parte dos casos, eventuais conflitos são um ônus a ser

tolerado ou, ao menos, resolvido pacificamente entre os residentes do condomínio. É

natural, ou deveria ser, que os próprios moradores queiram viver em paz para evitar mais

um motivo de preocupação em seus cotidianos.

Contudo, há situações que, por serem graves, fogem à normalidade e não

devem ser suportadas. Afinal, é inegável que existem condôminos específicos que, por

reiterados comportamentos indevidos geram tamanha esfera de desarmonia em relação

aos outros moradores que a convivência torna-se insustentável.

Não indiferente à reincidência desse tipo de animosidade, envolvendo

condôminos antissociais, o Legislador buscou solução distinta das ordinariamente

previstas para sancionar descumprimento de outros deveres condominiais. Solução esta à

qual a jurisprudência vem tentando dar forma.

I. A LEGISLAÇÃO APLICÁVEL AO CONDÔMINO ANTISSOCIAL

O atual Código Civil regula expressamente a sanção a ser aplicada ao

condômino antissocial:

“Art. 1337. O condômino ou possuidor que não cumpre reiteradamente com os seus

deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos

restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até o quíntuplo do valor

atribuído para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração,

independentemente das perdas e danos que as apurem. Parágrafo Único. O condômino

ou possuidor que, por reiterado comportamento antissocial, gerar incompatibilidade de

convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser correspondente a

pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as

despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.”

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De acordo com esse dispositivo legal, se um condômino comportar-se,

reiteradamente, de maneira indevida, causando incompatibilidade de convivência

condominial, poderá pagar uma multa equivalente a dez vezes o valor das contribuições

relativas a despesas do condomínio. Enquanto isso, o descumprimento reiterado de

outros deveres condominiais enseja multa no valor de cinco vezes o valor da mesma

contribuição.

Com isto, é possível perceber que o Legislador atribuiu enorme

importância à convivência pacífica e harmoniosa entre os moradores de condomínios

edilícios, uma vez que previu a possibilidade de sanção bastante onerosa para aquele

que causa, reincidentemente, desgaste dessas relações. É de se considerar que esta

iniciativa deu-se até mesmo para inibir esse tipo de conduta e, com isto, diminuir inúmeras

contendas judiciais que abarrotam o Poder Judiciário.

Entretanto, apesar da boa-vontade do Legislador, a previsão legal não foi

perfeita. Em primeiro lugar, porque não resta claro o procedimento a ser adotado, nem o

quórum exigido para aplicação da sanção em assembleia geral de condôminos. Afinal, no

“caput” do artigo 1337, alude-se expressamente ao quórum de três quartos para

aprovação de aplicação de multa por reiterado descumprimento de outros deveres

condominiais. Entretanto, no parágrafo único, do mesmo artigo, que trata dos condôminos

antissociais, não se exige, de maneira mandatória, este quórum especial, o que poderia

levar ao argumento que essa sanção poderia ser aplicada mediante outro quórum previsto

em lei, por analogia, ou, ainda, por um quórum estabelecido em convenção condominial.

Quanto ao procedimento, o “caput” do artigo 1337 determina que a multa

deverá ser aprovada, primeiramente, pela assembleia geral de condôminos para que,

então, o síndico possa aplicá-la, enquanto o parágrafo único determina ordem inversa, ou

seja a aplicação da multa pelo síndico e ulterior deliberação assemblear. O texto

possibilita interpretação segundo a qual o síndico poderia aplicar a multa, logo que

verificada a reiteração, devendo esta ser ratificada em assembleia geral de condôminos.

Sendo este o entendimento, surge dúvida quanto à lógica e praticidade desse

procedimento. Afinal, se a multa deve ser ratificada, seria, sem dúvidas, mais célere e

garantidor de maior segurança se o síndico apenas pudesse aplicar a multa após decisão

assemblear e não o contrário.

Além disso, a negativa por parte da assembleia é capaz de minar a

autoridade do síndico, ainda que este tenha razão. Afinal, a prática mostra que atingir, em

uma assembleia condominial, o quórum de três quartos é, normalmente, bastante difícil,

uma vez que, cada vez menos, os proprietários e possuidores das unidades condominiais

preocupam-se em comparecer às reuniões. Com isto, cria-se uma situação que torna

improvável a iniciativa por parte do síndico. Na hipótese de tratar-se de um síndico não

profissional, para ele, não haveria benefício algum em indispor-se com um condômino, já

problemático, aplicando a multa, para, depois, não vê-la ratificada por falta de quórum,

inclusive, de comparecimento. E, para um síndico profissional, também não haveria

vantagem, já que poderia, até mesmo, colocar em risco o seu emprego em virtude de

conluio de poucos moradores que apoiassem o condômino antissocial.

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Adicionalmente, é relevante ressaltar que o parágrafo único do artigo 1337

utiliza-se de expressões demasiadamente abertas. Em primeiro lugar, não há qualquer

tipo de definição do que viria a ser um comportamento antissocial. Muitos

comportamentos poderiam ser considerados antissociais, desde agressões físicas e

verbais, até falta de cordialidade. A consequência dessa vagueza é dar uma grande

margem à subjetividade por parte do síndico, da assembleia e até mesmo do juiz.

Realmente, é difícil realizar essa definição. O que é perigoso é ultrapassar aquele ponto

em que a tolerância é necessária para possibilitar o bom convívio e taxar qualquer tipo de

comportamento como antissocial, causando proliferação de multas indevidas.

Também não resta claro, no referido parágrafo, como se constituiria a

reiteração. Quantos comportamentos antissociais seriam necessários para aplicação da

multa? Os comportamentos, para serem considerados antissociais, podem ser verificados

somente em relação a um proprietário ou possuidor de unidade condominial ou devem ser

dirigidos a mais de um? Seria necessária uma advertência ou notificação para configurar

um primeiro comportamento antissocial ou a mera verificação da reincidência seria

suficiente? O montante da multa também deve ser decidido em assembleia?

Ainda, o que viria a ser incompatibilidade de convivência é obscuro.

Poderia ser desde a iminência constante de discussões ou agressões físicas até um clima

de mal estar generalizado entre os moradores. Conforme se observa, a falta de clareza da

lei prejudica muito a aplicação da norma, gerando subjetivismo tendente a gerar flagrante

insegurança jurídica.

Por fim, nem o “caput”, nem seu parágrafo primeiro, preveem,

explicitamente, que deve ser seguido procedimento que possibilite o contraditório e a

ampla defesa do condômino supostamente antissocial. O contraditório e a ampla defesa

são direitos fundamentais previstos expressamente na Constituição da República, em seu

artigo 5º, inciso LV. Sendo assim, interpretar os aludidos dispositivos do Código Civil sem

considerar que esses princípios devem ser obervados, constitui ofensa à própria

Constituição da República.

Conclui-se, portanto, que caberá à jurisprudência, analisando casos

concretos, consolidar e uniformizar entendimentos quanto a essas questões derivadas do

texto do artigo 1337 e seu parágrafo único. Enquanto isso não acontece, para minimizar

eventuais subjetivismos, seria interessante que constasse, nas próprias convenções

condominiais, ao menos a título exemplificativo, o que seria considerado comportamento

antissocial e como seria verificada a sua reiteração, bem como a descrição do

procedimento a ser seguido para aplicação da multa, prevendo, explicitamente, o

contraditório e a ampla defesa e como esses direitos seriam assegurados. Dessa

maneira, poderiam os condôminos ter a noção exata de como não devem se portar.

Adicionalmente, os síndicos e as assembleias gerais de condomínio teriam parâmetros

mais claros de quando a multa, por comportamento antissocial reiterado, deve ser

aplicada e de qual procedimento devem seguir para sua apuração. Com isto, haveria

menos hesitação por parte dos síndicos para dar iniciativa a procedimentos que visassem

apurar o mau comportamento de morador e a sua repetição. E, finalmente, os supostos

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condôminos antissociais poderiam defender-se com mais eficácia e tendo seus direitos

constitucionais devidamente atendidos.

II. QUESTÕES JURISPRUDENCIAIS ENVOLVENDO O CONDÔMINO ANTISSOCIAL

II.1. O DIREITO AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA

Conforme aludido anteriormente, o contraditório e a ampla defesa são

direitos fundamentais que devem ser estritamente observados, inclusive, nos

procedimentos de aplicação de multa por comportamento antissocial. Não possibilitar que

o condômino acusado de antissociabilidade conheça os fatos a ele imputados e defenda-

se deles, significa, portanto, flagrante ofensa à Constituição da República. Este foi o

entendimento adotado pelo Segundo Grupo da Terceira Câmara de Direito Privado do

Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação 9082481-28.2004.8.26.0000, Cabreúva, Rel:

Des. Carlos Giuarusso Santos, julg. 03.08.2004):

“Com efeito, diante dos elementos dos autos, realmente, não há como se admi tir a

cobrança da multa aplicada, eis que, embora tratando-se de penalidade prevista no

Código Civil vigente, sua aplicação depende de estreita obediência às disposições legais,

entre elas o direito de defesa, como assinalado na r. sentença recorrida.”

No aludido acórdão, foi reconhecido expressamente o direito de defesa do

condômino supostamente antissocial. Isto significa que, para que lhe seja aplicada a

multa, deve ter direito a defender-se pelos mesmos meios em que foi feita a imputação

dos fatos, sendo-lhe garantido, inclusive, o mesmo tempo para pronunciar-se. Além disso,

para que sua defesa seja adequada, é necessário que tenha prévio conhecimento da

acusação e da realização da assembleia que, aliás, deve ser específica para discussão e

votação da multa.

Dessa maneira julgou a 4º Câmara de Direito Privado do Tribunal de

Justiça de São Paulo (Apelação0251824-05.2009.8.26.0000, São Paulo, Rel: Des. Natan

Zelinschi de Arruda, julg. 26.05.2011).

Declaratória de inexigibilidade de multa. Comportamento antissocial. Declaratória de

inexigibilidade de multa. Comportamento antissocial dos autores. Necessidade de

deliberação em assembleia geral, convocada com ordem do dia, abrangendo o assunto.

Comunicação prévia aos interessados. Condomínio réu impôs multa sem levar em

consideração o contraditório. Possibilidade de recurso é insuficiente para afastar o

cerceamento de defesa. Divulgação da multa, inclusive no elevador do edifício configura

publicidade do ocorrido. Danos morais não caracterizados. Coautora já tem precedentes

envolvendo o comportamento deselegante, o que não fora impugnado. Apelos

desprovidos.

O referido julgado deixou claro que nem mesmo a possibilidade de recurso

em sede administrativa condominial é capaz de afastar o cerceamento de defesa

verificado pela falta de comunicação prévia da acusação feita ao suposto condômino

antissocial. Também o julgado proferido pela 31ª Câmara de Direito Privado do Tribunal

de Justiça de São Paulo (Apelação 0101319-90.2009.8.26.0100, São Paulo, Rel: Des.

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Paulo Ayrosa, julg. 03.05.2011) determinou que “Não basta haver expressa disposição

regulamentar para que se possa reconhecer a legalidade da multa. Em obediência ao

princípio do devido processo legal, ao que os anglo americanos denominam due processo

f Law, assim como ao princípio da ampla defesa, constante no art. 5º, inciso LV, da CF, se

impunha que fosse instaurado um procedimento administrativo onde fosse facultado ao

acusado a ampla defesa, por meio do contraditório”.

Baseando-se nas aludidas decisões, pode-se concluir que é fundamental

que as convenções condominiais prevejam, explicitamente, e observem procedimento

administrativo que assegure o contraditório e a ampla defesa do acusado de conduta

antissocial. Com isto, evita-se que as multas aplicadas a estes moradores sejam anuladas

quando impugnadas via ação judicial e, consequentemente, ilidi-se a impunidade desses

condôminos, que causam tanta discórdia e conflito no âmbito condominial.

II.2. A NECESSIDADE DE REITERAÇÃO DA CONDUTA

De acordo com decisão provinda da Trigésima Terceira Câmara de Direito

Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação 9150392-81.2009.8.26.0000, São

Paulo, Rel: Des. Sá Moreira de Oliveira, julg. 24.05.2010), reiteração de conduta significa

que deve haver uma repetição de comportamentos indevidos. Sendo assim, ainda que a

conduta antissocial seja dirigida a uma coletividade de indivíduos, não há configuração de

comportamento reiterado. Nesse caso, pretendia-se aplicar a multa em virtude de ofensas

proferidas, pelo condômino, à síndica e ao zelador. Ocorre que se considerou que, por

tratar-se de ações praticadas no mesmo contexto fático, não estaria caracterizada a

reiteração.

Compactuou deste entendimento a Nona Câmara de Direito Privado do

Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação 9243559-94.2005.8.26.0000, São Paulo, Rel:

Des. José Luiz Gavião de Almeida, julg.13.04.2010), que estabeleceu que uma conduta

isolada não dá ensejo à aplicação de multa por conduta antissocial. Afirma-se, na referida

decisão que, nessa hipótese, seria cabível apenas a devida ação reparatória para

ressarcimento de prejuízos eventualmente causados. Isto é, em se tratando de discórdia

isolada entre moradores, entendeu-se que a contenda entre estes deveria ser resolvida

sem que fossem envolvidos os demais condôminos e o próprio condomínio.

Contudo, nenhum dos citados julgados esclarece se seria necessária uma

advertência prévia, ou outra forma de registro ou notificação, para configurar uma primeira

infração para, somente depois de uma segunda conduta indevida, ser iniciado o

procedimento legal previsto para aplicação da penalidade ou se somente seria exigida a

mera constatação da reincidência. Contudo, a solução para essas questões pode ser

encontrada em outros julgados. Em decisão proferida pela Trigésima Sexta Turma do

Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação1229801005, São Caetano do Sul, Rel: Des.

Romeu Ricupero, 16.04.2009) entendeu-se que não seria necessária advertência prévia

para aplicação da multa por comportamento antissocial, uma vez que a convenção

condominial deixaria ao critério de corpo diretivo a advertência prévia ou aplicação direta

da multa.

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Este julgado poderia levar à compreensão errônea de que a dispensa de

uma advertência prévia, relativa a um primeiro comportamento antissocial, apenas

deixaria de ser exigível se houvesse expressa dispensa em convenção condominial.

Contudo, em contínua análise a outros julgados, pode-se concluir que a advertência ou

notificação em relação a uma primeira conduta é desnecessária. Basta, portanto, a

verificação de reincidência por qualquer meio para que se possa dar início ao

procedimento administrativo previsto legalmente.

Afinal, a Vigésima Sétima Câmara do Quarto Grupo do Tribunal de Justiça

de São Paulo (Apelação 9164972-58.2005.8.26.0000, Cabreúva, Rel: Des. Beatriz Braga,

julg. 02.05.2006) proferiu julgamento em que não foi exigida qualquer forma de

advertência prévia, aplicando-se a multa pela mera constatação de reincidência de

conduta antissocial causadora de incompatibilidade de convivência e da observância do

quórum assemblear legalmente exigido. No mesmo sentido entendeu a Décima Segunda

Câmara do Sexto Grupo do Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação 9141517-

35.2003.8.26.0000, Cabreúva, Rel: Des. Zélia Maria Antunes Alves, julg. 02.09.2004), que

manteve a aplicação da multa pela plena observância dos requisitos legais, sem

necessidade de multa ou advertência para configuração de uma primeira conduta

antissocial.

II.3. DO QUÓRUM DE APROVAÇÃO

Ao que parece, a jurisprudência tem se manifestado de forma uníssona no

sentido de que o quórum de aprovação seria aquele mesmo previsto no “caput” do artigo

1337, ou seja, três quartos dos possuidores ou proprietários das unidades condominiais.

Dessa forma foi o posicionamento no acórdão, já citado, proferido pelo Segundo Grupo da

Terceira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação

9082481-28.2004.8.26.0000)

“Além disso, exige a lei, ainda, que, se não houver previsão de penalidade na convenção

condominial para o tipo de infração praticada, deve haver, necessariamente, em

assembleia, com participação de três quartos dos condôminos restantes, deliberação não

só quanto à aplicação da multa, mas também quanto ao seu valor, como expressamente

previsto no art. 1.337do CC/2002, já referido, que exige também que o reiterado

comportamento antissocial gere incompatibilidade de convivência com os demais

condôminos.”

Na mesma linha de entendimento, manifestou-se a Trigésima Primeira

Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (0191245-

19.2008.8.26.0100, São Paulo, Rel: Des. Adilson de Araújo, julg. 08.11.2010). No acórdão

proferido, decidiu-se, inequivocamente, pela aplicação do mesmo quórum previsto no

“caput” do artigo 1.137.

Esta compreensão prejudica bastante a aplicação da multa a condôminos

por comportamento antissocial. Afinal, como já se salientou, alcançar o quórum de três

quartos é bastante improvável. É certo que a multa máxima para esse tipo de conduta

prevista na Lei é de valor consideravelmente alto. Contudo, também é verdade que esse

valor máximo apenas será aplicado em caso de constatação de sucessivas reincidências.

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Com isto, o montante de uma primeira multa estaria muito abaixo desse limite, sendo

pouco razoável que se exigisse um quórum tão elevado para aplicação de uma

penalidade de pouca monta.

II.4. DO COMPORTAMENTO ANTISSOCIAL E DA INCOMPATIBILIDADE DE

CONVIVÊNCIA

Pela análise jurisprudencial, é possível, ao menos, chegar-se a algum

parâmetro para o que se tem entendido por comportamento antissocial que causa

incompatibilidade de convivência. O acórdão proferido pelo Oitavo Grupo da Trigésima

Sexta Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação 9149738-

36.2005.8.26.0000, Agudos, Rel: Des. Romeu Ricupero, julg. 26.08.2006), por exemplo,

considerou antissocial a conduta de condôminos por, reiteradamente, estacionarem seus

respectivos automóveis em local distinto do determinado em sorteio de vagas realizado

em assembleia condominial. De acordo com o referido acórdão, deve haver tolerância e

compreensão, devendo a vontade da maioria prevalecer sobre a vontade da minoria.

Ressaltou-se, adicionalmente, no aludido julgado que, caso isso não aconteça, haverá

revolta e indignação de outros moradores, o que poderá desestabilizar a organização

condominial.

A trigésima quarta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de

São Paulo (9226809-80.2006.8.26.0000, São Paulo, Rel: Des. Levada Soares, julg.

01.08.2011) manifestou-se no sentido de que é antissocial a conduta contrária à boa

educação e ao bem viver entre os vizinhos. Nesse caso, o condômino teria, entre outros

comportamentos, rasgado circulares a serem entregues aos outros habitantes do

condomínio.

Segundo a Vigésima Sétima Câmara do Quarto Grupo do Tribunal de

Justiça de São Paulo (Apelação 9164972-58.2005.8.26.0000, Cabreúva, Rel: Des. Beatriz

Braga, julg. 02.05.2006), configura comportamento antissocial a inadimplência reiterada

das contribuições referentes às despesas condominiais. Alega-se, no referido julgado, que

esse comportamento levaria a um gravame a todo microcosmo condominial, a ser

suportado, indevidamente, por todos os demais moradores.

A Décima Segunda Câmara do Sexto Grupo do Tribunal de Justiça de São

Paulo (Apelação 9141517-35.2003.8.26.0000, Cabreúva, Rel: Des. Zélia Maria Antunes

Alves, julg. 02.09.2004) considerou antissocial a conduta de criar tumultos na portaria do

condomínio.

A Décima Sétima Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Rio

Grande do Sul (Apelação70040098600, Porto Alegre, Rel: Des. Liege Puricelli Pires, julg.

09.03.2006) considerou antissocial e incompatível com o convívio comum a utilização das

áreas comuns de maneira prejudicial ao sossego, à salubridade e à segurança de outros

possuidores. No caso em questão, o condômino acusado permitia e alimentava gatos no

pátio do condomínio, tendo sido frustradas várias tentativas de solução amigável. A

mesma Câmara (Apelação70040658544, Porto Alegre, Rel: Des. Liege Piricelli Pires, julg.

08.09.2011) entendeu por antissocial o comportamento de, reiteradamente, causar

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barulho excessivo, o que teria ocasionado evidente desconforto e incômodo aos demais

moradores.

Pela análise de referidas decisões, a conduta antissocial que acarreta a

multa é aquela que causa uma indignação e intolerância massiva entre os condôminos.

Aqueles comportamentos que geram tamanho incômodo, insalubridade, perigo ou mal

estar que inviabilizam completamente a convivência harmônica no condomínio.

Entretanto, há decisões no sentido de que, para que possa ser aplicada a

multa por conduta antissocial, seria necessário que o ato praticado pelo condômino

estivesse previsto na convenção condominial ou no regulamento interno como infração,

ao menos, em tese. É o caso da decisão proferida pela Oitava Câmara do Quarto Grupo

do Tribunal de Justiça de São Paulo (Apelação 9201067-58.2003.8.26.0000, Cabreúva,

Rel: Des. Rocha de Souza, julg. 14.04.2004). Também acórdão proferido pela Primeira

Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (Agravo de

Instrumento 0228927-75.2012.8.26.0000, Santo André, Rel: Des. Eliot Akel, julg.

05.03.2013) foi de acordo com o entendimento de apenas admitir-se a aplicação da multa

pelo síndico, caso houvesse previsão expressa dessa possibilidade na convenção

condominial, bem como a descrição da conduta como infração neste documento.

Todavia, este entendimento não deve prosperar. Não seria razoável limitar

o direito dos condôminos de punir moradores que colocam em risco a convivência

pacífica, assegurado em Lei, quando esta não faz essa ressalva. De forma alguma o

Código Civil exige que, para que se possa aplicar a multa, as condutas devem estar

previstas na convenção condominial, no regulamento interno ou na própria Lei. Nesse

ponto, o texto legal é bastante congruente. Afinal, seria impossível prever todas as

condutas indevidas passíveis de causar incompatibilidade de convivência. Seria injusto

que a multa não pudesse ser aplicada ainda que verificada conduta muito mais grave que

as reguladas nos documentos regulatórios do condomínio.

II.5. O VALOR DA MULTA

Assim como sua aplicação, a multa deve ter o seu valor determinado pelo

síndico. Posteriormente, deve ser ratificado pela assembleia geral de condôminos.

Contudo, é possível que haja limitação desse montante pela própria convenção

condominial. Nesse caso, os condôminos renunciariam, voluntariamente, ao valor máximo

previsto no artigo 1137, parágrafo único, do Código Civil. Isto é possível graças ao

princípio da autonomia de vontade consagrado na legislação civilista. Com isto, podem as

partes atenuar penalizações previstas em Lei, desde que não haja ofensa a normas de

ordem pública. Assim determinou a já citada apelação proferida pela Décima Sétima

Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

(Apelação 70040098600). Referido acórdão não admitiu aplicação da multa por conduta

de condômino antissocial superior ao limite estabelecido para este tipo de infração na

convenção condominial. Dessa maneira, fez prevalecer a autonomia de vontade dos

condôminos que, em convenção de condomínio, decidiram impor, para penalizar conduta

antissocial, sanção de valor menor que o estabelecido no Código Civil.

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Por outro lado, de acordo com decisão proferida também pela Décima

Sétima Câmara de Direito Civil do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

(Apelação 70011885472, Porto Alegre, Rel: Des. Alzir Felippe Schmitz, julg.09.06.2003),

para fixação da multa, é necessária também a observância de outros parâmetros além

dos legais, com finalidade de garantir a equidade e o equilíbrio. Segundo o acórdão, o

montante atribuído, a título de multa, deve refletir a realidade social e condominial. Sendo

assim, conclui-se que, em um condomínio de baixa renda, a aplicação da multa no valor

máximo previsto pela Lei pode ser considerada abusiva e, consequentemente, poderia ser

reduzida pelo magistrado para que se tornasse mais justa e adequada.

II.6. A POSSIBILIDADE DE EXPULSÃO DO CONDÔMINO ANTISSOCIAL

A jurisprudência não é uniforme no que se refere à possibilidade de

expulsão do condômino antissocial, uma vez que a lei admite somente a aplicação da

multa para inibir eventuais comportamentos que causem, reiteradamente,

incompatibilidade de convivência. Algumas decisões tem admitido a expulsão. Assim foi o

julgado, já citado, proferido pela Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de

Justiça do Estado de São Paulo (Agravo de Instrumento 0228927-75.2012.8.26.0000).

Entendeu-se, no referido acórdão, que a expulsão do morador é possível, contudo, desde

que haja elementos seguros de convicção que atestem que houve, de fato, repetição de

conduta indevida.

Outra decisão, proferida pela 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de

Justiça de São Paulo (Apelação 0081763-09.2012.8.26.0000, Campinas, Rel: Des. Vito

Gugliemi, julg. 17.05.2012) também admitiu a expulsão do morador por comportamento

antissocial. Todavia, exigiu que houvesse previsão dessa possibilidade em convenção

condominial, devendo esta estabelecer o quórum necessário para efetivar a exclusão.

Por outro lado, há muitas decisões que não admitem a expulsão do

condômino justamente em virtude da falta de previsão legal. É o caso de acórdão

proferido pela 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo

(Apelação 9220040-22.2007.8.26.0000, São Paulo, Rel: Des. J. L. Mônaco da Silva, julg.

16.01.2013). Haveria, dessa maneira, impossibilidade jurídica do pedido, o que

inviabilizaria, inclusive, o conhecimento da ação. No mesmo sentido, foi proferido acórdão

pela 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo

(Apelação 0318734-14.2009.8.26.0000, Barueri, Rel: Des. Maia da Cunha, julg.

01.10.2009). Na referida decisão, foi ressaltada a possibilidade jurídica da aplicação da

multa, sem prejuízo da cobrança de indenização por perdas e danos por aqueles

moradores que sofreram consequências negativas em virtude da conduta praticada pelo

condômino antissocial.

Observa-se, portanto, que, em face da ausência de previsão legal,

aumenta a relevância de elaboração de convenções condominiais que admitam a

expulsão de moradores em situações de extrema gravidade ou reiteração exagerada de

condutas inapropriadas para o convívio pacífico no condomínio. Afinal, é inegável que há

casos em que, ainda que sejam aplicadas e pagas as multas, o mal estar gerado por

determinado indivíduo é tão latente que a convivência simplesmente torna-se impassível

Page 11: A possibilidade de aplicação de multa ao condômino antissocial.

de retornar à normalidade. Sob essa perspectiva, não é justo que condôminos que

sempre cumpriram seus deveres e agiram amigavelmente sejam obrigados a tolerar

moradores que são, comprovadamente, causadores de problemas em potencial. Não é

certo que tenham que viver na iminência de um futuro conflito. Todavia, como já se

ressaltou, muitas vezes, o Poder Judiciário encontra-se de mãos atadas em face da falta

de previsão legal e convencional para expulsão. Por isso, é preciso que os condôminos

fiquem atentos e tenham uma atitude mais ativa em relação à elaboração e modificação

de regulamentos internos e convenções condominiais de seus próprios condomínios. Com

isto, não estarão restritos a sancionar os condôminos antissociais apenas nos limites

estabelecidos pela Lei.

CONCLUSÃO

Conforme já se ressaltou no presente artigo, foi louvável a iniciativa por

parte do Poder Legislativo em reconhecer, no âmbito dos condomínios edilícios, um

problema recorrente e buscar uma solução legal para diminuição de conflitos entre

moradores. Entretanto, a eficácia dessa iniciativa foi limitada, uma vez que elaborado

dispositivo legal demasiadamente vago e, por conta disso, de difícil aplicação. Em face

desse contexto, tem sido a jurisprudência a responsável por conferir à Lei seus exatos

contornos e forma de aplicação.

Em primeiro lugar, pacificou-se entendimento segundo o qual, para

aplicação da multa na esfera administrativa condominial, é necessário que tenham sido

estritamente observados o princípio do contraditório e da ampla defesa. Isso significa que

o condômino acusado de praticar conduta antissocial tem direito de conhecer,

previamente e em seus exatos termos, a imputação que lhe é atribuída. Somente dessa

maneira, poderá preparar-se, produzir provas e defender-se com eficácia. Além disso,

deve ser garantido a este tempo suficiente para manifestar-se na assembleia geral de

condôminos convocada com finalidade de aplicação da multa. Caso contrário, restará

configurado o cerceamento de defesa e, na hipótese de ação judicial, dificilmente, será

mantida a penalidade. Consequentemente, todo o dispêndio de tempo e dinheiro para

convocação da assembleia, sua realização e distribuição de atas terá sido em vão. Por

isso, é importantíssimo que as convenções condominiais descrevam devidamente o

procedimento a ser adotado para a aplicação da multa por comportamento antissocial,

assegurando, em respeito à Lei e á Constituição da República, o direito ao contraditório e

à ampla defesa.

Quanto à necessidade de reiteração da conduta para aplicação da multa,

conclui-se que não se exige que haja qualquer forma de advertência ou notificação em

relação a um primeiro comportamento antissocial para que uma segunda conduta

indevida configure a reincidência. Isto quer dizer que, verificado mais de uma ação ou

omissão que se enquadre como antissocial, é possível adotar o procedimento para

penalizar o condômino. Entretanto, deve-se ressaltar que os comportamentos devem ser

constatados em contextos fáticos distintos. Portanto, se em um mesmo contexto, o

condômino pratica várias condutas antissociais, ainda assim, considera-se esta uma

conduta isolada.

Page 12: A possibilidade de aplicação de multa ao condômino antissocial.

É fato que a Lei exige a reiteração da conduta antissocial para que se

possa sancionar o morador por esse motivo. Por outro lado, também é verdade que, se a

ação ou omissão for descrita em convenção de condomínio ou regulamento interno como

infração e for estabelecido procedimento e quórum para aplicação de uma multa por esse

ato ou omissão, nada impede que o condômino seja punido se cometida essa única

conduta. Por exemplo, se a convenção condominial estabelecer que agressão física a

outro morador ou funcionário constitui infração administrativa e cominar pena de multa a

esta conduta, nada impede que esta seja aplicada. Com isto, a partir de qualquer outra

conduta passível de ser considerada antissocial, prevista ou não como infração na

convenção de condomínio, seria possível adotar-se o procedimento legal para aplicação

da multa por comportamento antissocial, o que pode ser eficaz para inibir outras ações do

mesmo gênero, dada sua onerosidade.

Em relação ao quórum exigido, em assembleia geral de condôminos, para

aprovação da multa, a jurisprudência parece ser pacífica em adotar o mesmo quórum do

“caput” do artigo 1337. Contudo, cumpre salientar que este quórum, somado à previsão

de iniciativa da aplicação da multa por parte do síndico, tende a dificultar muito a

ocorrência dessa sanção na prática. Afinal, ao tomar a iniciativa, o síndico corre grande

risco de não conseguir a ratificação da penalidade em assembleia, principalmente, em

virtude de falta de quórum de comparecimento. Situações como esta são passíveis de,

indubitavelmente, minar a autoridade e representatividade do síndico perante os outros

condôminos o que, para ele, é claramente indesejável. Por isso, é bastante improvável

que um síndico, efetivamente, tome essa iniciativa, o que torna a aplicação da penalidade

rara de ser verificada na prática.

No que se refere à determinação de quais seriam os comportamentos tidos

como antissociais e capazes de gerar incompatibilidade de convivência, a jurisprudência

reconhece as mais diversas formas de ação e omissão. Seriam antissociais desde

comportamentos grosseiros até agressões físicas. Considerou-se antissocial até mesmo a

falta de pagamento reiterada de valores referentes a contribuições condominiais. O

importante é que a conduta seja realmente capaz de criar toda uma atmosfera de

animosidade no âmbito do condomínio edilício que torne, realmente, insustentável o

convívio.

Há decisões no sentido de que, para ser considerada antissocial, a

conduta deveria ser prevista, ao menos em tese, em convenção condominial ou

regulamento interno, como infração. Todavia, essa posição não deve ser acatada. Afinal,

é absolutamente impossível que se preveja, nesses documentos, toda e qualquer forma

de comportamento passível de tornar a convivência incompatível. Seria injusto

impossibilitar a aplicação de multa por repetição de uma conduta gravíssima

simplesmente por esta não estar prevista em convenção ou regulamento como infração. A

própria Lei não realiza essa definição e, em nenhum de seus dispositivos, delega-a aos

condôminos.

Em se tratando do valor da multa a ser aplicado, resta claro que o limite

máximo é o previsto em Lei, ou seja, o décuplo do valor atribuído à contribuição relativa

às despesas condominiais. Consequentemente, não poderia ser estabelecido, em

Page 13: A possibilidade de aplicação de multa ao condômino antissocial.

convenção condominial ou regulamento interno, valor superior a este montante. Por outro

lado, tais documentos condominiais poderiam, sim, prever uma sanção menos onerosa

que a prevista em Lei. Assim, em caso de eventual ação judicial que visasse questionar o

valor da penalidade, o juiz ficaria adstrito ao disposto em convenção condominial ou

regulamento interno, pois deve respeitar a autonomia de vontade das partes, ou seja, dos

condôminos.

Também há entendimento no sentido de que os limites legais e

convencionais não são os únicos a serem observados. Há julgados em que se afirma que

a multa deve respeitar a realidade condominial e social. E, de fato, pode ser considerado

injusto e não razoável aplicar o mesmo limite máximo para todos os tipos de condomínio e

classes sociais. Por um lado, é verdade que valor da sanção é variável de acordo com o

valor das contribuições condominiais e que é possível pressupor que populações de baixa

renda vivam em condomínios onde essas despesas sejam inferiores. Por outro lado,

também é verdade que, ainda assim, o valor da multa aplicada em seu máximo para um

morador carente poderia ter impactos muito mais sérios e devastadores, inclusive em

relação à sua subsistência, que para indivíduos abastados, moradores de condomínios

luxuosos.

Quanto à possibilidade de expulsão do condômino antissocial, também

existe divergência jurisprudencial. Grande parte dos julgados é no sentido de não admiti-

la, tendo em vista a falta de previsão legal. Restaria, assim, aos condôminos prejudicados

a aplicação da multa prevista em Lei, sem prejuízo das perdas e danos sofridos. Em

sentido oposto, há acórdãos que admitem a expulsão, desde que haja convicção de que,

realmente, houve reiteração de condutas graves. Por fim, há um posicionamento

intermediário, de acordo com o qual seria possível a exclusão do condômino antissocial

caso houvesse previsão expressa em convenção condominial admitindo-a e regulando-a.

Por fim, conclui-se que, diante da dissonância jurisprudencial em face de

várias questões relativas ao parágrafo único do artigo 1137 do Código Civil, as

convenções condominiais e regulamentos internos tornaram-se documentos fundamentais

para regular a matéria em âmbito interno. Uma convenção condominial que descreva, de

forma exemplificativa, as infrações, que regule o procedimento para a aplicação da multa

de forma adequada e que preveja, expressamente, a possibilidade de expulsão do

condômino antissocial tende a cumprir muito bem diversas funções. Em primeiro lugar,

podem inibir, com eficácia, comportamentos indevidos, uma vez que os condôminos terão

ciência de quais são as condutas a serem evitadas. Em segundo lugar, garantem

segurança e previsibilidade no tocante ao procedimento adotado, garantindo direitos

fundamentais. Em terceiro lugar, impossibilitam subjetivismos relativos ao montante a ser

aplicado a título de sanção. Com isto, diminui-se a chance de emergirem motivos que

acarretem demandas judiciais que, quando ajuizadas, geram ainda mais custos e

desarmonia entre os condôminos o que contraria, de maneira flagrante, os próprios

objetivos da Lei.

Page 14: A possibilidade de aplicação de multa ao condômino antissocial.

Fonte: NICODEMOS, Erika. A possibilidade de aplicação de multa ao condômino antissocial. Análise de

aspectos legais e jurisprudenciais. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3579, 19 abr. 2013. Disponível

em: <http://jus.com.br/artigos/24232>. Acesso em: 19 jun. 2014.

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