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RODRIGO CASSIMIRO DE FREITAS

A PRTICA DO FAIR TRADE EM GRUPOS DE

AGRICULTORES FAMILIARES: REFLEXES

CRTICAS SOBRE INOVAES SOCIAIS

LAVRAS MG

2014

RODRIGO CASSIMIRO DE FREITAS

A PRTICA DO FAIR TRADE EM GRUPOS DE AGRICULTORES

FAMILIARES: REFLEXES CRTICAS SOBRE INOVAES SOCIAIS

Dissertao apresentada Universidade Federal de Lavras, como parte das exigncias do Programa de Ps-Graduao em Administrao, rea de concentrao em Gesto Estratgica, Marketing e Inovao, para a obteno do ttulo de Mestre.

Orientador

Dr. Cleber Carvalho de Castro

Coorientadores

Dr. Daniel Carvalho de Rezende

Dr. Marco Antnio Villarta Neder

LAVRAS MG

2014

Ficha Catalogrfica Elaborada pela Coordenadoria de Produtos e Servios da Biblioteca Universitria da UFLA

Freitas, Rodrigo Cassimiro de. A prtica do fair trade em grupos de agricultores familiares : reflexes crticas sobre inovaes sociais / Rodrigo Cassimiro de Freitas. Lavras : UFLA, 2014.

157 p. : il. Dissertao (mestrado) Universidade Federal de Lavras, 2014. Orientador: Cleber Carvalho de Castro. Bibliografia. 1. Relaes interorganizacionais. 2. Anlise crtica de discurso.

3. Agricultura familiar. 4. Diagnstico rpido participativo. I. Universidade Federal de Lavras. II. Ttulo.

CDD 338.17373

RODRIGO CASSIMIRO DE FREITAS

A PRTICA DO FAIR TRADE EM GRUPOS DE AGRICULTORES

FAMILIARES: REFLEXES CRTICAS SOBRE INOVAES SOCIAIS

Dissertao apresentada Universidade Federal de Lavras, como parte das exigncias do Programa de Ps-Graduao em Administrao, rea de concentrao em Gesto Estratgica, Marketing e Inovao, para a obteno do ttulo de Mestre.

APROVADA em 28 de fevereiro de 2014.

Dr. Marcelo de Rezende Pinto PUC-MINAS Dr. Marcelo Mrcio Romaniello UFLA

Dr. Cleber Carvalho de Castro Orientador

Dr. Daniel Carvalho de Rezende

Dr. Marco Antnio Villarta Neder Coorientadores

LAVRAS MG

2014

A Deus, essa fora que rege a minha vida e tornou possvel que meus pequenos objetivos se concretizassem em planos e articulaes maiores.

Geni, minha me, por todas as horas de ansiedade, ao chegar e partir, pelo amor devotado, Selma, minha irm, pelo apoio incondicional e por mostrar alternativas em todas as horas de desespero, Karen e Karolina, minhas sobrinhas, pela compreenso e sorrisos to acolhedores. Ao Srgio (in memoriam) pela fora e incentivo, mesmo em seus ltimos momentos de vida.

DEDICO

AGRADECIMENTOS

A gratido uma medida de respeito minha trajetria, principalmente,

queles que cruzaram e os que permaneceram nela.

Agradeo, inicialmente, ao meu orientador, prof. Cleber Carvalho de

Castro, pela pacincia, pela compreenso, brilhante orientao e por

proporcionar segurana e liberdade investigativa para empreender novos voos.

Aos meus meninos e estagirios, Raphael de Morais e Bernardo de

Almeida Villela, pela dedicao pesquisa em todas as etapas, e Fernanda

Zanolla, nossa mascote.

Aos meus coorientadores, prof. Marco Antnio Villarta Neder, pelas

pulgas despertadas em cada conversa inquietante e prof. Daniel de Carvalho

Rezende por aceitar o desafio de colaborar na conduo deste trabalho.

Ao prof. Marcelo de Rezende Pinto pelas parcerias e por incentivar

minha entrada no mestrado. Agradeo, essencialmente, Coordenao de

Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES) pela bolsa de estudos

no Mestrado em Administrao.

Ao prof. Marcelo Romaniello pelas sugestes e conversas

esclarecedoras sobre essa pesquisa.

Ao prof. Thiago Assis que cedeu informaes e dados fundamentais

para o desenvolvimento metodolgico desta investigao.

Agradeo profa. Flvia Luciana Naves Mafra pelo despertar de uma

nova postura investigativa.

professora Clria Loureno por colaborar no desenvolvimento da

minha postura docente durante o mestrado.

Aos meus amigos da ps-graduao pelo suporte em todos os momentos

e pelas parcerias: Lilian Ferrugini, Bruna Hibib Cavazza, Smara Borges, Isabel

Silva, Lauisa Barbosa, Cintia Loos, Agda Prado, Valder Alcntara, Nivaldo

Oliveira, Lilia Paula Andrade, Janderson Vaz, Natlia Medeiros, Francylara

Miranda, Aline Sales, Ceclia Fakhouri, Isla Karla Azevedo, Marcela Barbosa

Faria, Marcondes Bicalho, Alex Macedo e Rafaella Campos.

Ao Departamento de Administrao e Economia e seus colaboradores:

Deila Pereira, prof. Luiz Marcelo Antonialli, os meus amigos membros do

colegiado do qual tive oportunidade de fazer parte, Dona Ftima e Dona Zez

e todos que direta e indiretamente contriburam para este resultado.

Aos meus amigos que me incentivaram em todos os momentos e

suportaram minha ausncia: Flvia Andrade, Henrique Nunes, Sandra Michelli

Gomes, Clayse Silva, Carlos Augusto Santos, Carol Benzaquen.

Agradeo, tambm, queles que me acolheram em Lavras: Anglica

Alves, Carolina Collela, Alessandro Garcia, Rafaela Garcia, Joo Vitor Lima

Barbosa, Jlio Csar, Mateus Eleutrio e Luan Eraldo por suportarem minhas

crises.

Agradeo aos membros do Grupo de Estudos em Redes Estratgia e

Inovao GEREI, como tambm queles do Grupo de Estudos em Marketing e

Comportamento do Consumidor GECOM/UFLA.

Agradeo, essencialmente, COOPFAM na pessoa do Clemilson

Pereira, da Daiana Tavares, da Vnia e do Lus Flvio pela colaborao, como

tambm a todos aqueles que concederam um fragmento de seu tempo para que

eu pudesse entrevist-los.

Trabalhava danadamente, dormindo pouco, levantando-se s quatro da manh, passando dias ao sol, chuva, de faco, passagens areas, gol pistola e cartucheira, comendo nas horas de descanso um pedao de bacalhau assado com um punhado de farinha.

Graciliano Ramos

RESUMO

Esta pesquisa fruto do esforo intelectual que pretendeu alinhar eixos tericos, considerando as relaes interorganizacionais relacionadas s inovaes sociais (mercadolgicas e de processos organizacionais) na realidade de pequenos agricultores familiares. Assim, objetivou-se identificar quais so e como se estabelecem, discursivamente, as principais relaes interorganizacionais, inovaes sociais e iniciativas de Comrcio Justo/ Sustentvel, desenvolvidas por pequenos produtores cooperados de alimentos orgnicos no sul de Minas. Para tornar isso possvel, os principais objetivos especficos foram: identificar e caracterizar as organizaes cooperativas de produtores familiares no sul de Minas Gerais; caracterizar as atividades e a forma de atuao dos principais grupos de pequenos produtores cooperados e as organizaes envolvidas no processo de inovao social; descrever os processos de cooperao e competio inter e intragrupal desses produtores cooperados e as principais alianas estabelecidas; e identificar e descrever a concepo simblica e discursiva dos grupos de pequenos produtores cooperados acerca dos conceitos de Fair Trade compreendidos como inovaes sociais. Para subsidiar essa discusso e alcanar os objetivos, na reviso de literatura foram privilegiados os seguintes temas: as Relaes Interorganizacionais, as Inovaes Sociais e a Anlise Crtica de Discurso. Sobre o percurso metodolgico, esclarece-se que a metodologia da pesquisa de natureza qualitativa e de abordagem exploratria descritiva, baseada no Diagnstico Rpido Participativo agregou entrevistas em profundidade, dirio de campo e observao participante. O trabalho de campo foi desenvolvido entre novembro de 2013 e janeiro de 2014. Foram coletadas 17 entrevistas que foram transcritas e, posteriormente, analisadas luz da Anlise Crtica de Discurso. Os principais resultados apontaram para mltiplos formatos de cooperao nos cenrios intra e interorganizacionais e para baixos ndices de competio interna. Foram evidenciadas, na anlise dos dados, distonias entre o conceito clssico de Fair Trade e a concepo e materializao nas vidas dos agricultores familiares entrevistados. As reflexes finais pontuaram aspectos gerais da pesquisa, como tambm foram detalhadas as principais implicaes tericas e gerenciais, as limitaes da investigao e as sugestes de agenda para futuras pesquisas.

Palavras-chave: Relaes Interorganizacionais. Anlise Crtica de Discurso. Inovaes Sociais. Fair Trade. Diagnstico Rpido Participativo.

ABSTRACT

This research is the fruit of an intellectual effort intending to align the theoretical axes of interorganizational relations related to social innovations (market scenery and organizational processes) within the reality of small family farmers. Thus, this work aimed at identifying which are and how are discursively established the main interorganizational relations, social innovations and Just/Sustainable commerce initiatives, developed by small organic food cooperated farmers in southern Minas Gerais, Brazil. To make this a possibility, the main specific objectives were: identifying and characterizing the cooperative organizations of family farmers in southern Minas Gerais; characterizing the activities and forms of action of the main groups of small cooperated farmers and the organizations involved in the social innovation process; describing the inter and intragroup cooperation and competition processes as well as the main alliances established; and identifying and describing the symbolic and discursive conception of small cooperated farmer groups regarding the concepts of Fair Trade understood as social innovations. In order to subsidize this discussion and reach the objectives, the literature review highlighted the following themes: The Interorganizational Relations, the Social Innovations and the Critical Discourse Analysis. The methodological path used was a research of qualitative nature and a descriptive exploratory approach based on the Rapid Participatory Diagnostics which aggregated interviews, field journal and participant observation. The field work was developed between November of 2013 and January of 2014. Seventeen interviews were collected, transcribed and, later, analyzed in light of the Critical Discourse Analysis. The main results point to multiple formats of cooperation in intra and interorganizational sceneries in addition to low internal competition indexes. The analysis data evidenced dystonias between the classical concept of Fair Trade and the conception and materialization in the lives of the interviewed family farmers. The final reflections punctuated the general aspects of the research and detailed the main theoretical and managerial implications, investigation limitations and the agenda suggestions for future researches.

Keywords: Interorganizational Relations. Critical Discourse Analysis. Social Innovations. Fair Trade. Rapid Participative Diagnostics.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Enquadre da Anlise Crtica de Discurso ......................................... 60

Figura 2 Instalaes COOPFAM .................................................................... 89

Figura 3 Ptio interno da COOPFAM ............................................................ 90

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Contribuies tericas para Cooperao Organizacional ............... 33

Quadro 2 Tipologia das Alianas Estratgicas ............................................... 42

Quadro 3 Definies da Inovao Social ........................................................ 49

Quadro 4 Resumo dos mtodos ...................................................................... 82

Quadro 5 Organizaes de Pequenos Produtores no Sul de Minas ................ 86

SUMRIO

1 INTRODUO ................................................................................. 14 1.1 Problema de Pesquisa ........................................................................ 16 1.2 Objetivo Geral ................................................................................... 16 1.3 Objetivos Especficos ......................................................................... 16 1.4 Justificativa ........................................................................................ 17 2 REVISO TERICA ....................................................................... 21 2.1 Relaes Interorganizacionais: abordagens nos estudos em redes 21 2.1.1 Coeso nas redes: laos fracos e buracos estruturais ..................... 28 2.1.2 Cooperao interorganizacional e alianas estratgicas ................ 32 2.2 Inovaes Sociais: ampliando debates ............................................. 45 2.2.1 Fair Trade: concepes sobre Comrcio Justo e Sustentvel ......... 53 2.3 Anlise Crtica de Discurso como pilar de sustentao terica e

metodolgica ...................................................................................... 56 2.3.1 O Conceito de Discurso para Anlise Crtica de Discurso ACD ... 61 2.3.2 Gneros Discursivos .......................................................................... 64 2.3.3 Estilos de Discurso em ACD ............................................................. 65 2.3.4 A Modalidade no Discurso ................................................................ 66 2.3.5 Hegemonia e Ideologia ...................................................................... 67 3 METODOLOGIA .............................................................................. 69 3.1 Caracterizao e Tipologia da Pesquisa .......................................... 69 3.2 Objeto da Pesquisa ............................................................................ 71 3.3 O Diagnstico Rpido Participativo: posicionamentos

introdutrios ...................................................................................... 72 3.4 Instrumentos de Coleta de Dados ..................................................... 77 3.4.1 As Entrevistas em Profundidade planejamento e conduo ....... 78 3.4.2 O dirio de campo ............................................................................. 80 4 APRESENTAO DE RESULTADOS.......................................... 83 4.1 Anlise Crtica de Discurso: os dados, a anlise e os resultados. .. 83 4.2 Os Pequenos Produtores Familiares no Sul de Minas:

caracterizao, mapeamento e descrio das organizaes cooperativas ........................................................................................ 85

4.3 Um Breve Histrico - Contextualizando a Cooperativa dos Agricultores Familiares de Poo Fundo e Regio (COOPFAM) ... 88

4.4 As Atividades Produtivas e a Forma de Atuao dos Pequenos Produtores Cooperados ..................................................................... 97

4.5 Relacionamentos Interorganizacionais: cooperao, competio, coopetio e o estabelecimento de alianas estratgicas .................. 102

4.6 FAIR TRADE: desvelando a concepo simblica e discursiva materializada no cotidiano de pequenos agricultores ..................... 114

5 REFLEXES FINAIS: APONTAMENTOS GERAIS .................. 127 5.1 Implicaes Tericas e Estratgico-Mercadolgicas ...................... 130 5.2 Limitaes da Pesquisa ..................................................................... 132 5.3 Sugestes de Agenda para Pesquisas Futuras ................................. 133 REFERNCIAS ................................................................................ 135 APNDICES ...................................................................................... 144

ANEXOS ............................................................................................ 157

14

1 INTRODUO

Este trabalho fruto do interesse de pesquisa em compreender como se

estabelecem as principais relaes produtivas entre agricultores familiares do sul

de Minas Gerais integrados em uma cooperativa certificada no mercado Fair

Trade. Para tentar compreender a realidade dessas pessoas e os fenmenos que

as cercam, tomou-se como parmetro que o consumo uma atividade inerente

aos seres humanos e, considerando que a sobrevivncia est relacionada ao

atendimento bsico s necessidades fisiolgicas e sociais, acredita-se que

existem formatos produtivos e de consumo que sejam menos nefastas do ponto

de vista social, econmico e ambiental. Ao tratar do consumo, vale esclarecer

que interessa a esse trabalho as relaes comerciais justas baseadas em

processos produtivos ticos.

H consenso na teoria econmica e gerencial que o mercado permeado

por diversas disfunes e imperfeies, uma delas a impossibilidade de

concorrncia perfeita entre ofertantes. Isso se d por inmeras razes que

promovem a seleo dos produtores que sero includos no mercado em

detrimento daqueles que sero abandonados. Uma das razes apontadas a

capacidade das organizaes de utilizar seus recursos e ativos para influenciar na

dinmica mercadolgica associada ao seu poder de barganha. Vislumbram-se,

ento, as relaes de cooperao e aliana estratgica com a finalidade de

fortalecimento dos elos enfraquecidos.

Considerando que as relaes de cooperao, como sero discutidas nos

posicionamento tericos, podem ser estratgicas ou no, e que a possibilidade de

estabelecer parcerias estratgicas est intimamente ligada dimenso de cada

organizao, parece oportuno compreender os aspectos envolvidos no

estabelecimento de relacionamentos, prioritariamente, estratgicos.

15

Percebe-se que, diante de um cenrio de adversidade e fracasso, vrios

produtores encontram novas maneiras de acessar o mercado, por meio de

inovaes mercadolgicas e organizacionais, baseadas em relaes de

cooperao estratgica com significativo desdobramento social. Tais medidas

denominamos simplesmente de inovaes sociais.

O Comrcio Justo pode ser considerado um exemplo de inovao social,

por meio do qual se pretende organizar em uma lgica alternativa os produtores,

consumidores, poupadores, agentes de mercado, entre outros. Essa organizao

ocorre, basicamente, para atender a dois objetivos: criar espaos diferenciados

de mercado para produtores desfavorecidos pela dinmica mercadolgica e, ao

mesmo tempo, estimular a solidariedade entre membros por meio da prtica da

autogesto.

So formadas, ento, redes de integrao entre produtores,

consumidores, governo e universidades que, unidos territorialmente, utilizam os

recursos naturais, intelectuais, financeiros e mercadolgicos para alavancar

determinados setores produtivos por meio de inovaes sociais. As inovaes

sociais so formas de combinao inditas de recursos que promovem retornos

tecnolgicos, sociais, culturais e econmicos para a comunidade, como ser

argumentado no referencial terico.

Inicialmente, esta pesquisa pretendeu alinhar trs eixos tericos: as

relaes interorganizacionais, as inovaes sociais (mercadolgicas e de

processos organizacionais) e a abordagem da Anlise Crtica de Discurso.

Assim, pretende-se compreender as imbricaes que se estabelecem em

cooperativas de pequenos produtores de alimentos orgnicos no Sul de Minas

Gerais. Aspectos que sero esclarecidos ao longo das prximas sees.

Diante disso, o problema de pesquisa consistiu em alinhar esses fatores e

compreender os movimentos de encaixe e desencaixe interligados aos eixos

tericos da investigao e repousa na questo a seguir:

16

1.1 Problema de Pesquisa

Quais so e como se estabelecem discursivamente as principais relaes

interorganizacionais, inovaes sociais e iniciativas de Comrcio Justo/

Sustentvel, desenvolvidas por pequenos produtores cooperados de alimentos

orgnicos no sul de Minas?

1.2 Objetivo Geral

Concomitante ao problema de pesquisa o objetivo geral consistiu em:

Identificar quais so e como se estabelecem discursivamente as

principais relaes interorganizacionais e inovaes sociais em prticas de

comrcio justo/sustentvel desenvolvidas por pequenos produtores cooperados

de alimentos no sul de Minas.

1.3 Objetivos Especficos

Para atender o objetivo geral foram definidos os objetivos finalsticos

que operacionalizaram a conduo da pesquisa por etapas:

a) Caracterizar as atividades e a forma de atuao dos principais grupos

de pequenos produtores cooperados e as organizaes envolvidas no

processo de inovao social;

b) Descrever os processos de cooperao e competio inter e

intragrupal desses produtores cooperados e as principais alianas

estabelecidas;

17

c) Identificar e descrever a concepo simblica e discursiva dos

grupos de pequenos produtores cooperados acerca dos conceitos de

Comrcio Justo Sustentvel compreendidos como inovaes sociais.

1.4 Justificativa

O foco de pesquisa deste trabalho so as principais relaes

interorganizacionais e as inovaes sociais compreendidas na acepo de

Comrcio Justo/Sustentvel observadas pela lente da Anlise Crtica de

Discurso.

Os resultados das inovaes sociais podem ser percebidos em todos os

campos sociais. Essa categoria de inovaes est concebida em ideias

inovadoras que busquem responder s necessidades e demandas sociais no

atendidas pelas organizaes empresariais e governamentais (BIGNETTI, 2011).

Estudar este assunto se torna justificvel, em funo dos impasses que

pequenos produtores enfrentam tanto nas relaes de produo, como

dificuldades de acesso a financiamento, a tecnologia de ponta e alianas

estratgicas com parceiros importantes (PERROW, 1992), quanto nas relaes

comerciais como, por exemplo, acesso ao mercado.

Em face desses problemas, surgem inconsistncias sociais que so

enfrentadas diariamente por esses produtores baseadas em relaes assimtricas

de mercado. Surgem solues alternativas para essas inconsistncias com o

objetivo de gerar resultados efetivos, com base em novas maneiras de interpretar

a realidade e seus problemas, denominadas inovaes sociais. Essas formas de

inovaes se tornam expressivas em grupos e comunidades nos quais os

problemas sociais so mais intensos e agudos como situaes de vulnerabilidade

social e extrema pobreza (MULGAN; TUCKER; SANDERS, 2007).

18

Dadas as manifestaes de inovaes sociais em diversas organizaes,

considerando que todo problema organizacional envolve uma relao entre

agentes sociais, surpreendente que, no cenrio acadmico nacional, pouca

ateno tem sido observada por parte dos estudiosos sobre o tema em face da

realidade brasileira (MULGAN; TUCKER; SANDERS, 2007; BIGNETTI,

2011; MUMFORD, 2012). Em um estudo bibliomtrico, realizado por Bignetti

(2011), foram identificados apenas dois trabalhos que tratam da temtica nos

anais do Encontro Nacional da Associao de Ps-graduao e Pesquisa em

Administrao EnANPAD no perodo de 1997 a 2009.

Mulgan, Tucker e Sanders (2007), Bignetti (2011) e Mumford (2012),

em seus trabalhos, demonstram que o tema, ainda, tem sido insuficientemente

abordado, o que motivou a criao de peridicos especficos para tratar do

assunto, alm de institutos e associaes de estudiosos para estudar o fenmeno,

no cenrio internacional. Na Amrica do Norte citam-se, por exemplo, o Centre

de Recherche sur les Innovations Sociales CRISES no Canad e, na Europa, o

projeto EMUDE (Emerging User Demands for Sustainable Solutions), o

Consumer Citzenship Network, o Creative Communities for Sustainable

Lifestyles e o Inovation and Social Entrepreneurship in Social Services - ISESS.

No Brasil, a organizao que se interessa pela temtica o Instituto de

Tecnologias Sociais - ITS.

Alm disso, acredita-se que importante investigar as relaes de

cooperao e colaborao entre esses atores, considerando a finalidade de suas

inovaes, a estratgia para alcan-las, a disseminao de informaes e o

compartilhamento dos benefcios e resultados dessas inovaes sociais. Deve-se

levar em conta que elas possuem caractersticas distintas da atual orientao

mercantil (BIGNETTI, 2011).

O ponto de partida para o surgimento da categoria de inovaes sociais

se baseia nas potencialidades das relaes cooperativas entre atores e

19

organizaes produtivas que buscam equacionar problemas que assolam

determinada coletividade (MULGAN; TUCKER; SANDERS, 2007;

BIGNETTI, 2011; MUMFORD, 2012).

Observa-se que o Comrcio Justo pode ser compreendido nesta pesquisa

como uma inovao social, ou seja, como prticas mercadolgicas e/ou

organizacionais alternativas e inovadoras em relao ao sistema econmico

convencional. A relevncia da investigao amparou-se em compreender como

essas ideias sobre novos formatos de relacionamentos entre atores podem

promover resultados que beneficiam a sociedade.

Nos campos tericos e empricos das pesquisas sociais, pode-se inferir

que a relevncia deste trabalho est fundamentada na possibilidade de

entrecruzar perspectivas investigativas de forma inter e transdisciplinar, pois

parte de perspectivas que so herdadas de tradies das cincias administrativas,

lingusticas e sociais. Nas Cincias Administrativas, os temas aderentes s reas

de estudos organizacionais, estudos em redes, estratgia e marketing esto nos

limites das relaes interorganizacionais e das inovaes sociais. No campo da

lingustica destaca-se a orientao terico-metodolgica da Anlise Crtica de

Discurso. E no campo das Cincias Sociais, mais especificamente nas escolas de

interacionismo simblico, apresenta-se a perspectiva do Diagnstico Rpido

Participativo (DRP) como postura investigativa do trabalho.

Esclarece-se que a postura intelectual e metodolgica de compreenso

dos fenmenos sobre o tema abordado requer direcionamentos crticos no

ingnuos na leitura das relaes ideolgicas envolvidas na concepo dos

relacionamentos interorganizacionais e das inovaes sociais baseadas em

prticas de Comrcio Justo. Para atender a essas demandas, relevante a

utilizao da perspectiva da Anlise Crtica do Discurso ao considerar que

existem imbricaes que precisam ser reveladas para compreender

profundamente o objeto de interesse da pesquisa.

20

Parte-se do pressuposto de que a construo das relaes ideolgicas

sobre inovaes sociais Fair Trade - baseia-se na intersubjetividade das

pessoas (FAIRCLOUGH, 1991). Considera-se, ento, que, para desvendar e

compreender essas imbricaes, a escolha por mtodos de pesquisa abertos se

justifica diante de categorias simblicas que emergem do campo em dilogo

constante entre a teorizao e empiria.

Nesse sentido, a metodologia do DRP se torna apropriada para essa

pesquisa, ao proporcionar interlocues flexveis entre as diversas concepes

dos temas trabalhados ao mesmo tempo em que atende aos objetivos do trabalho

e postura metodolgica. Em outras palavras, essa orientao proporciona

dilogo entre a ao e a reflexo, ou seja, entre o que se realiza nas prticas de

pequenos produtores de alimentos orgnicos e as principais reflexes

acadmicas no que concerne ao Comrcio Justo/Sustentvel.

Adicionado a isso, acredita-se que o crescente interesse sobre esses

temas so oportunidades significativas de investigao para os estudos

acadmicos e para intervenes e aperfeioamento do campo.

21

2 REVISO TERICA

A reviso de literatura foi organizada em trs eixos temticos que

trataram das Relaes Interorganizacionais, das Inovaes Sociais com subsidio

da Anlise Crtica de Discurso. Essa diviso se fundamentou em facilitar o

entendimento de cada eixo temtico e seus pontos de interseo.

2.1 Relaes Interorganizacionais: abordagens nos estudos em redes

Compreender a dinmica na qual determinadas organizaes se integram

em redes e quais so as relaes interorganizacionais envolvidas tm despertado

interesse na comunidade acadmica e no ambiente organizacional como um

todo. A adoo da abordagem de rede, os processos que estimulam o seu

surgimento, a estrutura, o contedo das relaes, a gesto de relacionamentos, o

poder, a interdependncia, as vantagens e desvantagens dessa perspectiva e os

resultados prticos alcanados so temas que vm recebendo ateno de estudos

tericos e empricos sobre esse constructo (GRANOVETTER, 1973; POWELL,

1990; BURT, 1992; NOHRIA, 1992; PERROW, 1992; GRANDORI; SODA,

1995; HATCH, 1997; TIGRE, 1998; BENGTSON; KOCK, 1999; EIRIZ, 2001;

BRITTO, 2002; BARNEY; HESTERLY, 2004; MA, 2004; BALESTRIN;

VARGAS; FAYARD, 2005; NORDIN, 2006; PEREZ; MARTINEZ, 2006;

LIMIEUX; OUIMET, 2008; VALE; LOPES, 2010; AHUJA; SODA; ZAHEER,

2012; LACOSTE, 2012).

Os estudos convergem para os fundamentos bsicos das relaes

interorganizacionais do ponto de vista filosfico, terico e histrico-

paradigmtico. O eixo comum desses estudos est direcionado para a busca de

compreenso das principais dimenses das relaes interorganizacionais e suas

implicaes prticas no campo intelectual e no campo organizacional. Existem

22

imbricaes entre os estudos de Barney e Hesterly (2004), Hatch (1997) e Tigre

(1998) que so significativamente complementares ao analisar os principais

fundamentos das relaes interorganizacionais, ou seja, como e com que

finalidade elas se relacionam, apesar da complexidade de colocar todas as

abordagens em uma mesma esteira de anlise, pois os estudos partem de

perspectivas argumentativas distintas.

Por exemplo, no mbito da economia, as teorias ortodoxas apontam que

os comportamentos nas organizaes so pautados pela racionalidade perfeita,

baseada em uma anlise estrutural das relaes de mercado e nos autoajustes. No

entanto, pelo que se percebe, o campo dos estudos organizacionais tem recebido

contra-argumentaes que refutam essas teorias e que existem outros fatores que

no so contemplados na anlise funcionalista (BARNEY; HESTERLY, 2004).

Em Hatch (1997), a relao entre organizao e ambiente pode ser

interpretada, considerando vises modernas, simblicas ou ps-modernas. Em

uma perspectiva moderna e estruturalista, a realidade, o ambiente organizacional

e seus fenmenos esto determinados por foras estruturais que definem as

relaes que sero estabelecidas. Ou seja, mesmo com base no mesmo foco (o

fundamento das relaes interorganizacionais), a autora discute essas relaes do

ponto de vista da evoluo do pensamento em uma perspectiva mais histrico-

filosfica.

Apesar de vrias teorias se orientarem para objetivos distintos aqui

levantados em alguns artigos, suas descobertas tocam comumente nas

imbricaes das relaes interorganizacionais em redes e o questionamento

sobre seu propsito de surgimento, desenvolvimento e dissoluo.

Grandori e Soda (1995), por exemplo, revisam e organizam a vasta

literatura sobre redes interorganizacionais, com objetivo de avaliar os principais

e atuais formatos de rede, os mecanismos de suporte e as principais variveis

que tm interferido no seu surgimento e nos seus moldes. Os mesmos autores

23

orientam-se para uma reviso no campo das cincias sociais, baseada nas

abordagens sociolgicas e psicossociais, com a finalidade de compreender

comportamentos e relaes nas redes, ao contrrio da pauta puramente de

transaes de bens e mercadorias, discutidas, por exemplo, pelo trabalho de

Barney e Hesterly (2004).

O interesse da reviso observar as formas adotadas para organizar as

atividades econmicas por meio da coordenao e cooperao

interorganizacional. O foco da anlise so as organizaes como unidades

coordenadas e interdependentes em redes com mecanismos de integrao

(GRANDORI; SODA, 1995).

As redes interorganizacionais, para Grandori e Soda (1995), consistem

em uma forma de regulao da interdependncia entre organizaes pela

coordenao e cooperao, com a finalidade de alcanar resultados por meio das

condies de mercado. Os atributos dessas redes so prioritariamente

processuais e estruturais.

Grandori e Soda (1995) abordam, em seu trabalho, os principais

antecedentes sobre as relaes interorganizacionais. Complementarmente,

Barney e Hesterly (2004) apresentam os principais antecedentes de formao das

redes, com isso discutem as limitaes da economia industrial ao tratar, de forma

incompleta, das estratgias de organizao empresarial em formatos

verticalizados e horizontalizados. Como tambm tratam das abordagens

explicativas sobre os regimes tecnolgicos voltados para: economias de escala e

escopo, liberdade de ao, especializao e experincia; para as falhas de

mercado associadas incerteza e s dificuldades de controlar e manter uma

dimenso de desempenho; na unio de perspectivas econmicas e sociolgicas

para compreender as redes com base na hibridizao de abordagens prescritivas

e descritivas; nos estudos organizacionais sobre a formao de aliana e

distribuio de poder nas redes.

24

Adicionalmente, Grandori e Soda (1995), assim como Barney e Hesterly

(2004), relatam que os principais mecanismos de coordenao e formao de

rede so: os mecanismos de comunicao, deciso e negociao; mecanismos de

coordenao e controle; os mecanismos de integrao de papeis e unidades; os

mecanismos de relaes hierrquicas e autoridade; os mecanismos de

planejamento e sistemas de monitoramento, incentivo, seleo, informao e os

mecanismos de suporte pblico e infraestrutura (GRANDORI; SODA 1995).

Em relao aos formatos de redes interorganizacionais adotados e

tratados pelos autores, o que importa se eles esto formalizados ou no,

centralizados ou no, baseados em paridade de poder, como tambm a definio

dos principais mecanismos de coordenao organizacional (GRANDORI;

SODA, 1995). As principais abordagens descritas pelos autores so as redes

sociais, as redes burocrticas e as redes proprietrias.

As redes sociais podem ser entendidas como relacionamentos pessoais

que ocorrem, tambm, no mbito das redes interorganizacionais, a interferncia

desses relacionamentos podem definir a estrutura e os mecanismos de

coordenao que sero implementados. Sendo assim, argumenta-se que redes

sociais no interior das redes interorganizacionais incentivam manuteno das

relaes de confiana entre seus membros, ou seja, as normas do grupo podem

colaborar na definio das regras da rede interorganizacional onde existem

ambiguidades, ao passo que possibilita criar marcos norteadores para resolver

assuntos omissos, o que inibe comportamentos oportunistas (GRANDORI;

SODA, 1995).

Powell (1990), complementarmente, aborda com olhar antropolgico o

fenmeno da formao das redes e argumenta que elas podem ser

compreendidas como alternativas para as hierarquias empresariais e as estruturas

de governana baseadas no mercado. Para isso, o autor trata do assunto mais

prximo dos estudos e formatos de redes sociais apontados por Grandori e Soda

25

(1995). Powell (1990) acredita que as redes so essencialmente sociais e

intersubjetivas, nas quais os laos e vnculos so baseados em amizade,

interdependncia, altrusmo, compartilhamento de recursos, poder e informao

em relacionamentos de longo prazo. O mesmo autor afirma que esse formato de

relaes interorganizacionais em redes apropriado para economias regionais,

atividades artesanais, alianas e parcerias estratgicas, como tambm

desagregaes verticais. Diante disso, as contribuies de Powell (1990) se

adequam ao propsito desse projeto, no entanto, acredita-se que o fenmeno no

pode ser estreitamente abordado, considerando que a perspectiva antropolgica

no considera que essas organizaes e atores no esto isolados do ambiente

organizacional, em outras palavras, esses relacionamentos coexistem com

hiperdinamicidade econmica.

Diferentemente, as pesquisas sobre redes, na viso de Borgatti e Foster

(2003), so divididas em dimenses de anlise como, por exemplo, relaes de

causalidade que explicam os motivos de formao das redes, os nveis de anlise

dos laos (binrios ou mltiplos), os mecanismos micro e macro de anlise

estrutural e as metas explicativas que descrevem os resultados das redes.

Ao retornar a pergunta sobre os motivos das organizaes se

relacionarem, algumas respostas parecem obvias, mas Coase (1988) sugeriu que

nem todas as transaes econmicas ocorriam simplesmente por questes

racionais, do ponto de vista da mo invisvel de Adam Smith. Na realidade, na

argumentao de Coase (1988), algumas transaes so internalizadas no mbito

das organizaes com o fim de gerenciar o custo que elas sacrificam (BARNEY;

HESTERLY, 2004). Posteriormente essas ideias foram sistematizadas e deram

origem Teoria dos Custos de Transao, desenvolvida por Williamson, que

pode ser entendida como um esforo intelectual que preconiza a Teoria de Redes

de Organizaes.

26

Os mesmos autores apontam que a teoria dos custos de transao e a

teoria da agncia conseguem explicar por que as organizaes existem, mas no

conseguem explicar o porqu algumas superam as outras, nesse sentido que a

estratgia surge quando as organizaes adotam as mesmas diretrizes para

resolver os problemas de governana e de agncia, ou seja, essa postura no gera

vantagem competitiva sustentvel, pois podem ser imitadas facilmente.

Adicionalmente, a teoria neoclssica tentou explicar porque as

organizaes que se encontram acima do desempenho seriam protegidas por

barreiras artificiais, mas isso no suficiente para explicar por que algumas

superam as outras aglomeradas ou no. Em outras palavras, o fenmeno

diverso e tentar compreend-lo por apenas uma perspectiva altamente perigoso

considerando que vrios fatores atravessam o campo de estudos. O surgimento e

desenvolvimento dessas redes, para Ahuja, Soda e Zaheer (2012), devem ser

entendidos pelas dimenses dos processos microdinmicos de concentrao e

grupabilidade, pelos aspectos primrios como ns, laos e estrutura da rede, os

microfundamentos ambientais que promovem o seu surgimento e, finalmente, a

arquitetura da rede que envolve, por exemplo, a centralidade, as limitaes

geogrficas, o nvel de distribuio dos laos, a densidade e o nvel de

associatividade nas redes.

Ahuja, Soda e Zaheer (2012) desenvolvem, tambm, o argumento sobre

o papel do tempo no desenvolvimento das redes de colaborao e dos resultados

que podem ser observados em sries histricas. Esses autores apontam que

existem poucas pesquisas que relacionam os resultados da rede com a dimenso

do tempo, considerando que h, ento, significativa relevncia sobre o papel do

tempo nas relaes entre arquitetura e resultado nas redes. Na viso de

Granovetter (1973), um fator interessante seria investigar o papel do tempo na

gerao, dissoluo, fortalecimento e enfraquecimento dos laos e o seu impacto

na rede e se existiriam laos negativos do ponto de vista dos resultados.

27

Baseado nisso, surgem algumas perguntas: quais so os desdobramentos

de laos novos e antigos e da estrutura nos resultados e eficincia da rede? Esses

fatores (laos e arquitetura) se comportam de forma diferente? So os laos ou o

tamanho das organizaes que interferem nos resultados das redes de

colaborao?

Ao responder os primeiros questionamentos, Ahuja, Soda e Zaheer

(2012) consideram que, com o passar do tempo, os relacionamentos em rede se

tornam mais slidos e reforados, pois o tempo condutor da reproduo de

memrias na rede e de seus relacionamentos, do ponto de vista da estrutura e de

suas experincias. As memrias ativam dois mecanismos: primeiro possibilita

que os atores reconstruam as relaes estruturais, segundo possibilita que os

atores aproveitem as informaes acumuladas, ou seja, contedo relacional.

O contedo relacional acumulado consiste no conhecimento e nas

informaes, com base na noo de capital intelectual, valores e normas que

incluem confiana, obrigaes e reciprocidade que moldam futuras aes e

relaes. No entanto, o que acumulado como fragmentos do passado tanto tem

o poder de ativar e influenciar, quanto de restringir as aes dos atores em rede

(AHUJA; SODA; ZAHEER, 2012).

Sobre o ltimo questionamento, Perrow (1992) vai defender que o

tamanho da organizao importante, mas se torna instvel e disfuncional com a

inexistncia dos laos entre as organizaes, ou seja, aglomerados de atores no

significam que esto vinculados necessariamente em redes, pequenos ofertantes

podem competir ferozmente e dividir as migalhas que grandes organizaes

deixam no mercado e, dessa forma, adotar comportamentos de explorao.

Tendo em vista o que j foi discutido sobre os relacionamentos em

redes, ser que redes intensivamente integradas e coesas so mais exitosas? Para

responder a essa pergunta, o prximo tpico aborda outras argumentaes que

ampliam a discusso sobre o fenmeno.

28

2.1.1 Coeso nas redes: laos fracos e buracos estruturais

Os estudos de Granovetter (1973) e Burt (1992) se interessam,

inicialmente, em explicar, considerando o campo terico, os fenmenos de rede

e aqueles aspectos que, do ponto de vista estrutural, poderiam ser considerados

como imperfeies de uma rede coesa, mas podem ser amplamente explorados

como oportunidades de vantagem competitiva por determinados atores.

A anlise de redes utilizada como instrumento de observao de

processos de relaes micro e macroprocessuais, quantidade de ligaes que

podem ser didicas ou mltiplas, fora e intensidade dos laos, logo, as

dinmicas desses vnculos interferem diretamente na realidade de um grupo ou

comunidade. Gronovetter (1973) demonstra que os estudos que se concentram

nas dinmicas de pequenos grupos esto amparados, principalmente, na

Psicologia Social. Em geral os laos entre os atores podem ser fortes, fracos ou

ausentes, segundo o mesmo autor.

A noo de fora de um lao pode ser compreendida como uma

combinao de tempo, intensidade emocional e intimidade (confidencialidade

mtua) e servios recprocos caracterizados nos laos. Cada aspecto tem sua

importncia e peso na anlise, ainda que estejam intimamente relacionados

(GRANOVETTER, 1973). Para o mesmo autor um lao forte pode ser definido

da seguinte forma,

Most intuitive notions of the strength of an interpersonal tie should be satisfied by the following definition: the strength of a tie is a (probably linear) combination of amount of time, the emotional intensity, the intimacy (mutual confiding), and the reciprocal services which characterize the tie. Each of these somewhat independent of the other, though the set is obviously highly intracorrelated. (GRANOVETTER, 1973, p. 1361).

29

O autor argumenta que, quando determinados laos diticos so fortes,

os intermedirios tendem a ser fracos ou ausentes. Laos fortes envolvem

relacionamentos contnuos e o que fortalece o lao o tempo gasto em sua

manuteno e as relaes de amizade entre indivduos mais similares. Dessa

forma o inverso torna um lao fraco, ou seja, quando os vnculos no so

constantes e intensos.

Em Granovetter (1973), outra acepo para esses vnculos denomina-se

de pontes, que so laos fracos que interligam pontos ou atores, sem que

necessariamente existam laos intensos, ou seja, podem ser relaes de

intermediao pontuais, por exemplo, na presena de buracos estruturais.

Considerando as dinmicas das redes em relao ao tempo, os laos podem ser

fortalecidos, enfraquecidos, alterados ou removidos.

A tese que a remoo de laos fracos pode promover mais danos

transmisso de informao diversificada comparada a um lao forte, pois a

distncia, para difuso de informao, pode se tornar maior, considerando que a

informao se torna acessvel, para os membros mais prximos, ao passo que

inibe as atividades inovativas nas redes de colaborao e estimula a redundncia

de informaes (GRANOVETTER, 1973).

Embora os estudos sociomtricos sejam importantes, h, em geral,

desconsiderao da importncia dos laos fracos nas redes, pois o fenmeno de

difuso de informao fica comprometido, ou seja, as pontes como laos fracos

configuram uma alternativa para difuso de informao na rede entre contatos

no coesos e no so mensuradas e identificadas em estudos puramente

estruturais.

Para Gronovetter (1973), nos sociogramas, a transitividade se d em

funo das escolhas de contatos e laos entre os atores. Por outro lado,

argumenta-se que eles no conseguem explicar o potencial de transitividade

inerente aos laos fracos.

30

Granovetter (1973) indica que, do ponto de vista da inovao, os atores

marginais tm obtido destaque em detrimento daqueles que so centrais e

intermedirios, tambm, destacam-se aqueles que adotam uma inovao

primeiramente, curiosamente, apontando os marginais. Uma explicao para isso

seria que os atores centrais teriam uma reputao a ser assegurada e recebem

determinadas inovaes tardiamente; por outro lado, os marginais, tambm,

podem incorrer em nunca conseguir difundir uma inovao exitosamente por

causa de sua reputao. Na mesma esteira, uma inovao constrita a atores

ligados por laos fortes corre o risco de jamais sair daqueles crculos, no atingir

amplitude e abrangncia maior de seus resultados. O autor relata que as

pesquisas em redes sociais demonstraram que so os laos mais fracos que

interconectam maior nmero de atores. Assim como Granovetter (1973), Burt

(1992) vai argumentar que redes mais dispersas geram mais benefcios de

informao, ou seja, h multiplicidade maior de informaes.

Eklinder-Frick, Eriksson e Halln (2012) questionam se os laos fortes,

densidade e comunidades coesas geram resultados eficazes e eficientes nas

redes. Os autores vo argumentar pela interpretao de Granovetter e Burt que

os laos fracos e a distncia entre ns podem diminuir a redundncia no fluxo

informaes das transaes nas redes, como dito anteriormente. E, ao mesmo

tempo, considera que as redes necessitam de laos fortes em funo de

transformaes e relacionamentos mais profundos e laos fracos para

diversificar e abrir estradas para novos conhecimentos e recursos.

Considerando as inovaes sociais, esse aspecto parece ser mais

impactante, ao considerar que o que determina essa classificao a

possibilidade de provocar impactos na sociedade ou na comunidade estudada.

A perspectiva de comunidade ajuda a compreender melhor alguns

fenmenos em laos e difuso de informao, mas nem sempre essas

comunidades so eficazes em funo da cultura, estrutura e das posturas dos

31

atores. Outros fatores intervenientes devem ser considerados como a confiana,

os lderes nas redes e seus papeis em aglutinar pessoas nas comunidades.

Adicionado a isso, outro fator a ser considerado a existncia dos

buracos estruturais nas redes de colaborao. Burt (1992), por exemplo,

argumenta que os buracos estruturais nas redes so reconhecidos como lacunas

entre contatos, que podem ser explorados como vantagem competitiva e gerao

de valor por intermedirios nas redes.

Mas, o ponto central da discusso do autor se refere aos buracos

estruturais que so lacunas existentes entre contatos, que, possivelmente,

relacionam-se como membros em comum e esto dispostos na mesma rede ou

em outras redes. Burt (1992) assevera que redes coesas geram contatos

redundantes e que os buracos estruturais promovem diversos benefcios como,

por exemplo, ampliam a quantidade de contatos no repetitivos, aumenta o

volume de informao, estimula a diversidade, amplia a exposio de

informao diversificada. Alm disso, h a possibilidade de determinado ator

utilizar o buraco estrutural para se beneficiar de informaes de parceiros no

conectados que possuem informaes diversas. Com base nessa situao, cria-se

vantagem competitiva por essas informaes. Esse fenmeno denominado

como a ao de um terceiro no buraco estrutural.

Mas, para essa pesquisa, qual seria a relevncia desses conceitos? Ao

considerar que os relacionamentos nas redes de pequenos produtores de

alimentos orgnicos so permeados por inovaes sociais, tanto do ponto de

vista mercadolgico quanto do ponto de vista dos processos organizacionais,

diante das dificuldades impostas pela conjuntura econmica e pelo tamanho

desses atores, frente ao acesso aos desenvolvimentos tecnolgicos, logo sero as

caractersticas dos laos que influenciaro a qualidade dos resultados da rede e

da implementao de filosofias produtivas diferenciadas.

32

As metodologias e abordagens colaboram, nesta pesquisa, ao orientar

como podem ser conduzidas empiricamente pesquisas sobre redes

interorganizacionais, por meio de 3 vetores: antecedentes intelectuais para

formao do campo de pesquisa, os mecanismos de coordenao organizacional

baseado em processos de cooperao e os formatos de redes interorganizacionais

demonstrando a aplicabilidade desses mecanismos.

Alm disso, essas abordagens e metodologias de pesquisa podem ser

utilizadas, para desenvolver modelos comparativos e testveis sobre a

coordenao organizacional de redes interorganizacionais, ao passo que colabora

com o estado da arte no campo de pesquisa das redes de colaborao.

Adicionado a isso, os autores, tambm, apontam para os aspectos que

interferem nos comportamentos cooperativos nas redes e, principalmente, para

gerao de confiana ao longo do tempo (AHUJA; SODA; ZAHEER, 2012),

assuntos que sero tratados na seo seguinte.

2.1.2 Cooperao interorganizacional e alianas estratgicas

Vrios estudiosos se interessaram em compreender as relaes de

cooperao entre organizaes. O histrico desse interesse no recente, alguns

trabalhos seminais ganharam vulto e corporificaram o que se denomina hoje por

relaes interorganizacionais de cooperao, o trabalho de Granovetter

colaborou sobremaneira para esse campo de estudos (VALE &LOPES, 2010).

Ainda, segundo Vale e Lopes (2010), vrias teorias podem ser apontadas

como colaboraes genunas para o campo de estudos, embora algumas delas

estivessem preocupadas com outros processos organizacionais. Discutem-se,

detalhadamente, os pontos de convergncia, as abordagens das teorias militares;

teoria dos jogos; teoria dos custos de transao; posicionamento e poder de

mercado; abordagem das redes sociais; teoria baseada em recursos; abordagem

33

do aprendizado com o campo de estudos da cooperao organizacional. Os

autores sinalizam para a contribuio, processo estratgico e viso de ambiente

de cada uma das teorias, conforme quadro 1: contribuies tericas para

Cooperao Organizacional.

Quadro 1 Contribuies tericas para Cooperao Organizacional

Fonte: VALE; LOPES (2010)

34

Ao que parece, a lgica dos comportamentos empresariais esteve

historicamente marcada por uma orientao e viso mercantil econmica, em

sua maioria. Em geral, os jogos competitivos de soma-zero so corriqueiramente

implementados nesses relacionamentos, nos quais a competitividade a palavra

de ordem.

No entanto, existem organizaes que optam por relacionamentos

cooperativos que possuem, em sua maioria, retornos no econmicos e

imediatistas para atuar setorialmente e/ou globalmente, que alcanam outros

modelos de comportamento baseado em ganhos mtuos. nesse sentido que

essa seo abre discusses sobre o que garante os comportamentos cooperativos

em redes de colaborao empresarial e quais so as principais alianas que so

desenvolvidas baseadas em uma orientao estratgica

Em geral, o desenvolvimento da cooperao entre empresas inicia-se em

uma relao entre duas e se espalha pelas demais. Por outro lado, a cooperao

realizada por iniciativas explcitas de empresas que buscam benefcios mtuos

ou tambm para ampliar o crescimento econmico de determinada rea

produtiva (EKLINDER-FRICK; ERIKSSON; HALLN, 2012).

Na viso dos mesmos autores, prope-se que o desenho estratgico de

uma rede pode estimular o crescimento regional por meio de polticas

governamentais, as quais podem ser feitas com parceria entre governo, empresas

locais e instituies acadmicas, chamadas de colaborao em hlice trplice.

Se por um lado existem trabalhos que analisam como esses processos

so desenvolvidos, descritivamente, do ponto de vista regional, por outro lado,

h uma dificuldade em criar um quadro terico que oriente prescritivamente

como o desenvolvimento tecnolgico regional pode ser feito, como criar redes

com essas propostas, como direcionar e mant-las e, principalmente, como

liderar a complexa poltica nas redes, como o caso da proposta de pesquisa

oferecida neste trabalho. Dessa forma, esta seo da reviso atende a uma

35

agenda discursiva dos principais aspectos sobre cooperao interorganizacional

em redes de colaborao.

O trabalho de Eiriz (2001) esclarecedor, ao discutir os aspectos da

cooperao entre firmas, principalmente, considerando as alianas estratgicas.

Argumenta-se que existem vrios antecedentes que podem ser apontados como

incentivadores para relacionamentos de cooperao entre organizaes, tanto em

cenrios horizontais quanto verticais. Ou seja, cooperao entre atores

relacionados em um mesmo nvel da cadeia produtiva, como tambm relaes

entre fornecedores e compradores.

Brito (2002), Lacoste (2012) e Ma (2004) exploram profundamente as

dimenses dos comportamentos cooperativos e competitivos, cada qual com a

sua finalidade de apresentar uma abordagem para retratar como esses fenmenos

se desenvolvem no ambiente organizacional.

Brito (2002), por exemplo, trabalha suas anlises nas redes de empresas,

diferenciando entre as empresas em rede e as redes de indstrias. Para isso

exploram-se os conceitos de redes nas cincias exatas e sociais para,

posteriormente, apresentar a acepo desse conceito na teoria econmica que

est pautado por relaes de mercado entre empresas. Dessa forma, a mesma

autora apresenta uma alternativa em forma de um quadro terico que analisa

vrias tipologias de redes, nas quais os comportamentos cooperativos se

estabelecem por objetivos diferenciados e categoriza essas formas de alianas

em: Redes de Subcontratao, Distritos/Aglomerados Industriais e Redes

Tecnolgicas que se aproximam do conceito de alianas estratgicas nas redes

interorganizacionais, assunto apresentado no tpico seguinte.

Outro aspecto levantando se refere gerao da confiana nas redes de

colaborao ao longo do tempo. Perrow (1992) aponta que a gerao de

confiana no facilmente demonstrada e ilustrada, pois ela no poderia ser

criada intencionalmente, dessa forma, ela gerada por contextos e estruturas que

36

podem ser deliberadamente criados, encorajando a confiana ainda que essa

ltima no possa ser deliberadamente criada.

Perrow (1992), apesar disso, argumenta que existem formas de

incentivar comportamentos confiantes e inibir interesses puramente particulares

como, por exemplo: partilhar e discutir informaes de mercado, ter

experincias de ser ajudado por outra empresa, desenvolver relacionamentos de

longo prazo com muitos contatos, reduzir as diferenas entre poder, tamanho e

posio estratgica na rede, executar o giro da liderana na representao das

organizaes e implementar recompensas similares entre as organizaes

consorciadas e seus colaboradores.

Em cenrios horizontais de cooperao interorganizacional, os fatores

que estimulam a gerao de confiana, em tese, podem ser mais bem explorados,

considerando que os atores no esto posicionados inicialmente em relaes

assimtricas tanto em relao diviso de recursos quanto de autoridade e

poder.

Nesse cenrio, Ahuja, Soda e Zaheer (2012) vo complementar

argumentando que o contedo relacional, nas redes de cooperao, acumula e

solidifica conhecimentos e informaes, com base na noo de capital

intelectual, alm de valores e normas que incluem principalmente confiana,

obrigaes e reciprocidade que moldam futuras aes e relaes, com destaque

para o aspecto temporal.

Alm disso, conceituar relaes cooperativas demanda um esforo

intelectual para definir quais so as dimenses desses comportamentos. Um

questionamento recorrente pousa sobre a interlocuo de comportamentos

cooperativos em cenrios hipercompetitivos, ou seja, como esses

comportamentos podem coexistir e solidificar as relaes de confiana?

Lacoste (2012) argumenta que existem hibridizaes entre

comportamentos colaborativos e competitivos coexistindo nas redes

37

interorganizacionais verticais ao destacar o surgimento da Coopetio. O termo

Coopetio surgiu na dcada de 1980, ao debruar-se nos estudos sobre

relacionamentos que envolviam comportamentos cooperativos e competitivos

entre organizaes, porm o crescimento dos estudos que abordam esse

fenmeno se tornou mais expressivo somente aps o trabalho de Brandenburger

e Nalebuff (1995), com a Teoria dos Jogos remodelada, que insere novos

aspectos nos cenrios de incerteza empresarial. Tomando as relaes entre

pequenas organizaes, a relao vertical poderia ser compreendida nos vnculos

entre produtores e consumidores e os principais intermedirios.

Lacoste (2012) explana que, na chave para a combinao de ambas as

perspectivas, existe um problema srio mencionado, o tempo, em outras

palavras, existe o dilema sobre as relaes de longo prazo e de curto prazo. Ou

seja, relacionamentos pontuais, em tese, impossibilitariam a coexistncia desses

comportamentos, o papel do tempo nas relaes de coopetio to

significativo quanto aquelas ditas puramente de cooperao.

Lacoste (2012) demonstra e esclarece sobre as razes que levam

empresas consumidoras intermedirias a coopetir com seus fornecedores, a

anlise se baseia na cooperao como forma de otimizar a criao de valor

empiricamente entre consumidores e fornecedores, na qual existem relaes

assimtricas permeadas por poder.

A pauta do estudo pesquisar relacionamentos a fundo e no condies

de equilbrio das relaes na rede, ainda que os estudos em redes priorizem a

viso polarizada, a autora abandona essa perspectiva e desafia deliberadamente a

postura normativa desses estudos. Lacoste (2012) aponta que outro fator

determinante para desequilbrios significativos entre os comportamentos

competitivos e cooperativos se d em funo daquilo que est em jogo, ou seja,

o objeto da relao.

38

Dessa forma, os vnculos estabelecidos entre os atores tanto em cenrios

horizontais quanto verticais possibilitam compreender como so construdas as

principais relaes de cooperao e as principais alianas construdas.

Adicionalmente, Barney e Hesterly (2004) argumentam que as formas de

cooperao mais comuns entre as firmas so os acordos implcitos e as alianas

estratgicas.

As alianas estratgicas surgem como forma de cooperao

economicamente vivel entre as organizaes, mas no apresentam reduo do

bem estar social, ao contrrio dos cartis. Os tipos mais comuns de alianas

estratgicas so contratos e joint ventures. Se a aliana contratual para Barney e

Hesterly (2004) consiste em uma relao regida e gerenciada por contrato com

objetivo de desenvolver, projetar, produzir, comercializar ou distribuir produtos

ou servios, o objetivo das alianas estratgicas, novamente ao contrrio dos

cartis, aumentar a atividade socioeconmica e no reduzi-la. Joint ventures,

por exemplo, possuem os mesmos objetivos destacados, porm elas envolvem a

criao de uma nova firma para gerenciar a relao interorganizacional, o que

no ocorre nas alianas estratgicas (BARNEY; HESTERLY, 2004).

As alianas podem ser uma resposta estratgica para mitigar e

administrar incertezas competitivas e recursos interdependentes. Alm disso, as

alianas particulares so uma funo da posio das organizaes nas redes de

relacionamentos em perodos anteriores. Vista dessa forma, Barney e Hesterly

(2004) e Eiriz (2001) concordam que o tamanho das organizaes define a

qualidade das alianas estratgicas. Em outras palavras, organizaes maiores

estabelecem relaes com parceiros adequadamente posicionados, o tamanho

delas tanto do ponto de vista das operaes quanto financeiro-econmico,

tambm, designa quem orienta e conduz os relacionamentos.

Diante disso, outro questionamento que se faz : como pequenos

produtores de alimentos orgnicos poderiam acessar o mercado e quais alianas

39

estratgicas podem ser consideradas de boa qualidade reconhecendo o poder de

barganha calcado nas dimenses da empresa e os principais estmulos para

cooperar com os parceiros?

Os incentivos para cooperar por meio de alianas estratgicas resumem-

se em explorar fontes complementares pela economia de escala, entrada com

custo reduzido em novos espaos, entrada com custo reduzido em novos

segmentos ou ramos, aprender com a concorrncia, administrar incertezas

estratgicas, administrar custos e partilhar riscos, facilitar cartelizaes tcitas

(BARNEY; HESTERLY, 2004).

Por outro lado, os incentivos para trapacear em alianas estratgias

consistem em trs formas bsicas: a) trapaa por seleo adversa, na qual a

aliana superavaliada; b) trapaa por risco moral na qual uma das partes no

integraliza a sua parte de contribuio na aliana; e a c) trapaa por roubo na

qual uma parte explora a outra. Vale considerar que as formas para inibir esses

comportamentos esto baseadas na confiana e governana. Em relao

governana, quanto maior for a possibilidade de incentivo trapaa, melhor

elaborada deve ser a estrutura para inibir essa trapaa e, consequentemente, ser

mais custoso economicamente trapacear. Com o tempo, os parceiros

desenvolvem confiana e as formas elaboradas e dispendiosas de governana

podem ser abandonadas.

O que se percebe que vrias estradas foram abertas cada uma com um

direcionamento nico que colaborou na compreenso das dimenses de como as

organizaes surgem e se comportam, como umas superam as outras, como

estabelecem relaes cooperadas, no entanto, poucas interlocues entre as

estradas foram traadas, ainda que uma tenha se pautado nas limitaes daquela

que a precedeu. Embora no exista conciliao entre economistas e cientistas

organizacionais, os resultados de suas pesquisas so profcuos, ao despertar

questes em um campo explorado, mas com interlocuo terica incipiente.

40

Para Perrow (1995), o modelo no qual existem vrias pequenas

empresas produtoras com significativo contingente de fornecedores e

consumidores e vrios canais e laos no comum. O enquadre terico de Burt

(1992) explica isso empiricamente; no plano ideal capitalista melhor que

existam poucos concorrentes e empresas em um determinado setor do mercado,

sendo assim, os fornecedores e consumidores seriam obrigados a negociar com

uma firma x ou suas poucas concorrentes, ou seja, no h alternativas para

monobra e o poder de barganha se torna restrito (denominado cintura fina de

canais e conexes, pois nmero de fornecedores e consumidores de uma

empresa maior que amplitude da concorrncia). Por outro lado, amplo nmero

de organizaes em determinado setor (cintura ampla de canais e conexes),

tanto consumidores quanto fornecedores possuem maior nmero de alternativas

de negociao. Essa ltima relao de mercado a base para a cooperao e

evita enganos e explorao de fornecedores e consumidores em um cenrio

vertical de mercado e promove benefcios como flexibilidade do setor, estimula

a inovao e maximiza as solues para problemas setoriais.

Complementarmente, Eiriz (2001), considerando as abordagens sobre o

tema cooperao, avana na discusso das alianas estratgicas, ao posicionar

que, embora algumas correntes acreditem que qualquer tipo de relao de

cooperao consiste em uma aliana estratgica, essa ltima tem contornos

bastante especficos.

O conceito de aliana estratgica preconiza, de fato, uma relao de

cooperao, na qual uma ou mais organizaes aliam esforos e recursos para

alcanar determinados objetivos (EIRIZ, 2001). Entretanto, essa relao

necessariamente requer direcionamento estratgico para ambas as partes

envolvidas. Em outras palavras, os atores que cooperam devem ter interesses

estratgicos em temporalidade diferente de uma transao pontual.

41

Dessa forma, [...] uma aliana estratgica uma forma de organizao

das atividades dos parceiros que envolve um maior grau de integrao do que

outras formas de cooperao (EIRIZ, 2001, p. 67). Isso quer dizer que aqueles

comportamentos cooperativos, desprovidos de interesse estratgico, no

poderiam ser considerados alianas estratgicas, logo, nem todo relacionamento

cooperativo consiste em uma aliana estratgica.

Ao posicionar o conceito de alianas estratgicas, o autor vai caminhar

para distino das principais tipologias de alianas estratgicas e define trs

dimenses bsicas para englob-las. Essas dimenses esto baseadas nos estudos

das relaes empresariais em redes (EIRIZ, 2001).

Diante disso, a tipologia apresentada divide as alianas estratgicas em

domnios de cooperao comercial, tcnico ou produo e financeiro que esto

subdividas em subcategorias. Sobre o domnio comercial, as atividades esto

concentradas em marketing e vendas, compras, distribuio e servios de ps-

venda, ou seja, o foco o mercado e suas relaes. Complementarmente, o

domnio tcnico relaciona-se com as atividades produtivas, recursos humanos e

pesquisa e desenvolvimento. No menos importante, o domnio financeiro

interessa-se pelas atividades que envolvem capital e as relaes de integrao

entre os atores (EIRIZ, 2001).

Esquematicamente, essas tipologias so apresentadas ao enaltecer tipo,

abordagem e principais caractersticas no Quadro 2: Tipologia das Alianas

Estratgicas.

42

TIPOLOGIA DA ALIANA

DOMNIO CARACTERSTICAS

Acordo de distribuio

Comercial

Estabelece-se geralmente entre uma empresa produtora de bens finais e outra empresa que possui domnio ou presena nas redes de distribuio do produto ao consumidor final. Neste caso, o distribuidor acede ao produto do produtor e este acede a um ou vrios canais de distribuio.

Acordo de investigao e

desenvolvimento

Tcnico/ Produo

Verifica-se, particularmente, em sectores onde a actividade de investigao e desenvolvimento de novos produtos e processos assume um peso muito importante. Essa importncia visvel na elevada percentagem de custos totais que so afectos actividade de investigao e desenvolvimento. Esses custos so, sobretudo, custos fixos e, por isso, as empresas desenvolvem este tipo de alianas para poderem repartir os custos fixos. Por outro lado, podem desenvolver competncias tcnicas mais facilmente e responder ao mercado mais adequada ou rapidamente com novos produtos.

Acordo de produo conjunta

Tcnico/ Produo

Verifica-se, quando duas ou mais empresas produzem conjuntamente os mesmos produtos, para satisfazer necessidades de mercado, s quais no conseguiriam responder individualmente por falta de capacidade. Este tipo de aliana estratgica distingue-se da subcontratao pelo facto das empresas desenvolverem as mesmas actividades e, por isso, estarem presente na mesma fase do sistema de negcios. Ou seja, as operaes desenvolvidas pelos parceiros so iguais.

Acordo de representao

Comercial

Verifica-se, quando uma empresa se torna a representante dos produtos e marcas da outra empresa para determinado mercado. O acordo de representao distingue-se da franquia porque envolve um menor nvel de integrao entre os aliados. Ou seja, ao contrrio da franquia, o acordo de representao nem sempre obriga exclusividade da marca e, por outro lado, pode incluir ou no a distribuio do produto.

Aquisio de empresa

Financeiro Ocorre quando uma empresa adquire uma posio maioritria no capital de outra empresa.

Quadro 2 Tipologia das Alianas Estratgicas

Fonte: EIRIZ (2001)

(...continua...)

43

Quadro 2, continuao

Assistncia comercial

Comercial

Ocorre quando uma empresa estabelece um acordo no sentido de poder externalizar a definio e, sobretudo, a implementao das suas polticas de marketing. Deste modo, a empresa concentra as suas competncias noutras actividades, como, por exemplo, a inovao tecnolgica dos processos de produo e desenvolvimento de novos produtos, deixando ao parceiro a tomada de algumas decises comerciais.

Central de compras

Comercial

A aliana estratgica estabelece-se por forma a facilitar o acesso das empresas participantes aos seus inputs fundamentais. Por norma, as empresas so do mesmo sector e possuem as mesmas necessidades de matria-primas ou outras. Por meio da cooperao na compra, elas podem desenvolver economias de escala e adquirir maior poder negocial junto dos fornecedores com repercusses no s em termos de preos, mas tambm qualidade, condies de pagamento e condies de entrega.

Consrcio Tcnico/

Produo

Esta modalidade estabelece-se entre duas ou mais empresas que possuem capacidades e competncias susceptveis de poderem ser complementadas no desenvolvimento de um projecto tcnico de grande envergadura e durao no tempo (por exemplo, construo de uma auto-estrada ou ponte). O consrcio pode ou no manter-se para alm da realizao de um projecto. Muitas vezes, o sucesso de um projecto motiva os parceiros para novos projectos e aprofundamento da relao.

Formao e/ou assistncia

tcnica

Tcnico/ Produo

Ocorrem com maior freqncia em sectores em que a base tecnolgica importante. Neste caso, estabelece-se um acordo entre duas ou mais empresas por meio do qual podero ser ultrapassadas determinadas lacunas tecnolgicas. Essas lacunas podem resultar da formao da mo-de-obra que no apresenta as qualificaes e competncias desejveis ou de dificuldades de desempenho no equipamento de produo ou nos produtos.

(...continua...)

44

Quadro 2, concluso

Franquia Comercial

Ocorre quando uma empresa (franqueador) concede a outra (franquiado) o direito de explorar uma marca, produto ou tcnica de sua propriedade num determinado mercado mediante determinadas condies contratuais. Estas condies envolvem contrapartidas financeiras e o cumprimento de procedimentos de gesto e polticas de marketing.

Fuso Financeiro Representa o grau mximo de integrao de duas ou mais empresas que decidem fundir as suas estruturas de capitais numa nica entidade.

Grupo de exportadores

Comercial

Conjunto de empresas do mesmo sector que cooperam entre si para desenvolvimento dos mercados externos. A cooperao d-se em diferentes atividades: realizao de estudos nos mercados externos, participao conjunta em feiras, publicidade, entre outras. Alm das economias de escala desenvolvidas, uma das suas principais vantagens a possibilidade do grupo poder oferecer uma gama de produtos mais larga.

Joint venture

Financeiro

Verifica-se, quando duas ou mais empresas constituem uma nova entidade. As joint ventures so alianas estratgicas do domnio financeiro porque, tratando-se da constituio de uma nova entidade, envolvem, entre outros recursos, a afectao de capital para a sua estrutura accionista. Contudo, o desenvolvimento deste tipo de aliana bastante comum para prosseguir objetivos comerciais ou de produo/tcnicos.

Licenciamento de patentes

Tcnico/ Produo

Aliana estratgica pela qual uma empresa (concessionria) concede a outra (licenciada) os direitos de explorao de uma patente, produto ou processo de fabrico mediante uma compensao geralmente de carter financeiro.

Participao minoritria em

empresa Financeiro

Verifica-se quando uma empresa adquire uma posio inferior a 50% do capital de outra empresa.

Subcontratao Tcnico/

Produo

um tipo de aliana estratgica pela qual uma empresa (contratante) subcontrata a outra (subcontratada) uma parte do seu processo de produo. Deste modo, as operaes desenvolvidas por cada um dos parceiros so diferentes.

45

Inspirado no quadro e nas consideraes do autor, uma aliana

estratgica genuna reuniria mais de uma dessas tipologias, pois, em geral, como

aponta Eiriz (2001), existem vrios interesses envolvidos e isso se reflete na

diversidade e no entrelace de domnios envolvidos.

Para esta pesquisa, essa categorizao se tornou fundamental, pois foi

possvel determinar os interesses envolvidos nas relaes entre os produtores e

seus principais parceiros intra e intergrupais. Ou seja, os estmulos e motivos

tornaram reais as alianas estabelecidas.

Alm disso, h vrias razes pelas quais pequenas redes de empresas

no se tornam integradas, no porque no so competitivas ou ambiciosas, mas

porque existe uma necessidade de inovao de processo e produtos mais

rapidamente e isso requer uma reduo da distncia entre concepo e execuo

de produto/processo, que essas empresas conseguem alcanar mais facilmente

Thus the small firm can react more quickly and fruitfully to change in

technology and markets (PERROW, 1992, p. 459).

Dessa forma, inspirado em Perrow (1992), pode-se pensar que, como

pressuposto, a agricultura orgnica em redes de pequenas cooperativas

produtores adota posturas de relacionamentos em alianas estratgicas com

pequeno nmero de parceiros. E isso pode ser compreendido,

fundamentalmente, com uma forma de reagir rapidamente s mudanas de

conjuntura socioeconmica, transformaes tecnolgicas e por questes

simblicas relacionadas s prticas de Consumo Justo e Sustentvel, aspectos

que sero descritos na seo seguinte da reviso de literatura.

2.2 Inovaes Sociais: ampliando debates

O marco discursivo sobre o conceito de inovao parte dos trabalhos de

Schumpeter e de seus seguidores. Esses trabalhos esto associados discusso

46

do desenvolvimento econmico das organizaes, incentivado pelas inovaes

tecnolgicas, materializadas em 5 dimenses: novos produtos, novos processos

de produo, novos mercados, novas fontes de matrias-primas e novas

estruturas de mercado. O conceito de inovao, para os estudiosos

Schumpeterianos, est diretamente relacionado ao desenvolvimento econmico e

tecnolgico. Ou seja, a inovao distinguida de uma inveno no momento em

que gera valor de mercado (FARFUS; ROCHA, 2007; BIGNETTI, 2011).

Comparativamente, as inovaes tecnolgicas, do ponto de vista dos

estudiosos schumpeterianos e neo-schumpeterianos, esto orientadas para

apropriao de valor e resultado econmico. Por outro lado, as inovaes sociais

esto preocupadas com a criao coletiva de valor e para questes sociais entre

os envolvidos.

Bignetti (2011), por exemplo, argumenta que, apesar das perspectivas da

inovao social e da inovao tecnolgica serem complementares, os avanos no

campo de estudo das inovaes sociais demonstram a existncia de aspectos

distintivos entre elas. Tal fato decorre em funo, por exemplo, da finalidade, da

estratgia, do lcus, do processo de desenvolvimento e da forma de

disseminao do conhecimento.

O surgimento da perspectiva da inovao social toma a realidade social

como incentivo para o desenvolvimento de abordagens alternativas. O cenrio

mundial demonstra que tanto as estruturas empresariais quanto as

governamentais no conseguem responder eficazmente s mazelas da populao

Ou seja, as inovaes concebidas na viso Schumpeteriana, baseadas no

desenvolvimento econmico, no equacionaram problemas sociais que solapam

o desenvolvimento do ponto de vista social, ambiental e econmico (FARFUS;

ROCHA, 2007; BIGNETTI, 2011).

47

[...] a realidade requer a utilizao de metodologias adequadas, processos sistematizados, alianas estratgicas, sistemas efetivos de disseminao, entre outros fatores, que conduzam criao e incorporao de inovaes que contribuam para o desenvolvimento sustentvel no tecido socioeconmico-cultural. (FARFUS; ROCHA, 2007, p.18).

Esses questionamentos se tornam campos frteis para o desenvolvimento

de discusses sobre a funo social das inovaes no mbito organizacional

concebidas, neste trabalho, como inovaes sociais.

O conceito de inovao social o sustentculo para as discusses

seguintes. Para este estudo, as inovaes sociais so definidas:

[...] as new ideas (products, services and models) that simultaneously meet social needs and create new relacionships or collaborations. In other words, they are innovations that are both good for society and enchance societys capacity to act. (CHALMERS, 2012, p.19).

Outra definio interessante para inovao social acredita que ela :

[...] definida como o resultado do conhecimento aplicado a necessidades sociais atravs da participao e da cooperao de todos os atores envolvidos, gerando solues novas e duradouras para grupos sociais, comunidades ou para a sociedade em geral. (BIGNETTI, 2011, p. 04).

O mesmo autor complementa ao afirmar que,

A inovao social geralmente o resultado de novas combinaes ou da hibridizao de elementos existentes, e no da composio de elementos integralmente novos. Alm disso, a sua colocao em prtica se d ultrapassando fronteiras organizacionais, setoriais ou disciplinares. Por fim, a inovao social deixa como resultante novas relaes sociais entre indivduos e grupos anteriormente separados, contribuindo para a difuso e a perpetuao da inovao e alimentando novas solues sociais (BIGNETTI, 2011, p. 10).

48

Similarmente, Mumford (2012) assevera que as inovaes sociais esto

calcadas em novas ideias, nas quais as pessoas organizam atividades

interpessoais e/ou interaes para atingir determinados objetivos e/ou ultrapassar

obstculos sociais. Considerando esse pressuposto, as outras formas de inovao

resultam em algum tipo de inovao social (MULGAN; TUCKER; SANDERS,

2007).

Os conceitos de inovao social so reformulados constantemente desde

o seu surgimento na dcada de 70. Principalmente depois dos anos 2000 alguns

aspectos foram incorporados, o que demonstra a dissociao do campo da

inovao tecnolgica, como destacado anteriormente. O quadro 3 demonstra a

evoluo do termo.

49

Autor Conceito

Taylor (1970) Formas aperfeioadas de ao, novas formas de fazer as coisas, novas invenes sociais.

Dagnino e Gomes (2000, in Dagnino et al., 2004)

Conhecimento intangvel ou incorporado a pessoas ou equipamentos, tcito ou codificado que tem por objetivo o aumento da efetividade dos processos, servios e produtos relacionados satisfao das necessidades sociais.

Cloutier (2003) Uma resposta nova, definida na ao e com efeito duradouro, para uma situao social considerada insatisfatria, que busca o bem-estar dos indivduos e/ou comunidades.

Standford Social Innovation Review (2003)

O processo de inventar, garantir apoio e implantar novas solues para problemas e necessidades sociais.

Novy e Leubolt (2005)

A inovao social deriva principalmente de: satisfao de necessidades humanas bsicas; aumento de participao poltica de grupos marginalizados; aumento na capacidade sociopoltica e no acesso a recursos necessrios para reforar direitos que conduzam satisfao das necessidades humanas e participao.

Rodrigues (2006) Mudanas na forma como o individuo se reconhece no mundo e nas expectativas recprocas entre pessoas, decorrentes de abordagens, prticas e intervenes.

Moulaert et al. (2007)

Ferramenta para uma viso alternativa do desenvolvimento urbano, focada na satisfao de necessidades humanas (e empowerment) por meio da inovao nas relaes no seio da vizinhana e da governana comunitria.

Mulgan et al. (2007)

Novas ideias que funcionam na satisfao de objetivos sociais; atividades inovativas e servios que so motivados pelo objetivo de satisfazer necessidades sociais e que so predominantemente desenvolvidas e difundidas por meio de organizaes cujos propsitos primrios so sociais.

Phills et al. (2008)

O propsito de buscar uma nova soluo para um problema social que mais efetiva, eficiente, sustentvel ou justa do que as solues existentes e para a qual o valor criado atinge principalmente a sociedade como todo e no indivduos em particular.

Pol e Ville (2009) Nova ideia que tem o potencial de melhorar a qualidade ou a quantidade da vida.

Murray et al. (2010)

Novas ideias (produtos, servios e modelos) que simultaneamente satisfazem necessidades sociais e criam novas relaes ou colaboraes sociais. Em outras palavras, so inovaes que, ao mesmo tempo, so boas para a sociedade e aumentam a capacidade da sociedade de agir.

Quadro 3 Definies da Inovao Social

Fonte: Adaptado de Bibnetti (2011)

50

Diante das diversas concepes sobre o termo, adota-se, para esta

pesquisa, o significado de inovao social que consiste na gerao de novas

ideias, novos processos organizacionais ou relacionamentos mercadolgicos.

Tem-se a finalidade de atender e responder a demandas sociais reprimidas e/ou

problemas sociais no resolvidos por meio de relaes cooperativas entre

indivduos e/ou organizaes.

Em relao ao corte analtico, para esta pesquisa, optou-se pela

abordagem de Mulgan, Tucker e Sanders (2007), com base nas combinaes de

novos modelos e ideias, nas principais fronteiras tericas, metodolgicas e

empricas, e nas relaes sociais (interorganizacionais) adicionadas s mudanas

sociais.

Entremeio a essa relao, organizaes e instituies sociais podem ser

criadas, para o desenvolvimento de novas ideias sobre o governo ou sobre

movimentos sociais, que atendam necessidade de uma coletividade

(MUMFORD, 2012) como, por exemplo, cooperativas de produtores de

alimentos orgnicos.

Vale considerar que, para esses aspectos, uma inovao social pode

envolver a criao de novos processos e procedimentos para estruturar relaes

de trabalho colaborativas. Em outras palavras, podem-se conceber novas prticas

no grupo ou at desenvolvimento de novas prticas de negcios (MUMFORD,

2012).

Para o Instituto de Tecnologia Social ITS, uma inovao social

preconiza o atendimento dos seguintes requisitos: 1. inovao com compromisso

com a transformao social; 2. criao de um espao de descoberta de demandas

e necessidades sociais; 3. relevncia e eficcia social; 4. sustentabilidade

socioambiental e econmica; 5. organizao e sistematizao; 6. acessibilidade e

apropriao das tecnologias; 7. processo pedaggico para todos os envolvidos; 8.

51

dilogo entre diferentes saberes; 9. difuso e ao educativa e 10. processos

participativos de planejamento, acompanhamento e avaliao.

Observa-se que pouca ateno tem sido devotada a esses estudos sobre

inovaes sociais, pois existe dificuldade em determinar o que seriam de fato

inovaes sociais estritamente. Os primeiros pargrafos dessa seo tentam

esclarecer essa ideia, uma vez que o fenmeno difuso e envolve interao entre

mltiplos aspectos da inovao, entre perodos histricos e do processo criativo

(MULGAN; TUCKER; SANDERS, 2007; FARFUS; ROCHA, 2007;

MURRAY; MULGAN; CAULIER-GRICE, 2009; MURRAY; CAULIER-

GRICE; MULGAN, 2010; BIGNETTI, 2011; MUMFORD, 2012).

Porm, possvel compreender as inovaes sociais diante de suas

caractersticas. Por exemplo, a necessidade do surgimento de relacionamentos e

interaes interpessoais, para resolver um determinado problema, que, alm de

atender necessidades e demandas sociais, desdobre impactos coletivos,

considerando a diversidade e a unidade humana com a finalidade de promover a

igualdade na sociedade considerando, tambm, as orientaes do ITS (FARFUS;

ROCHA, 2007).

emblemtico considerar que, para Mumford (2012), durante os

ltimos anos, os estudos em inovaes sociais levaram pesquisadores a

descrever o papel da situao econmica, cultural e social na formao da

mudana social. Esse conceito est intimamente relacionado ao trabalho de

Fairclough (2003), que compreende mudanas sociais com o objetivo de

transformao social discursiva. Chalmers (2012, p. 19) afirma que a literatura

sobre inovaes sociais concentra-se, principalmente, [...] on the processes and

outcomes that change the basic routines, resources and authority flows and

beliefs of the any social system.

Em outras palavras, os autores concordam que as inovaes sociais

preconizam mudanas tanto do ponto de vista mercadolgico, econmico ou de

52

processos organizacionais e refletem impactos sociais em determinada

coletividade o que sustenta a concepo adotada para este trabalho.

Mumford (2012) assevera, apesar das dificuldades metodolgicas e

substantivas, que existem trs linhas de trabalho que podem colaborar para as

definies do campo de pesquisas. Para esse autor, a primeira orientao parte

das histrias de vidas de pessoas que contriburam para o desenvolvimento de

inovaes nos espaos sociais ou polticos; a segunda linha de trabalho,

paralelamente, trabalha com aspectos da liderana, porm amparados nas

capacidades desses lderes para resolver problemas organizacionais; a terceira

linha trata do processo de desenvolvimento, introduo e adoo de inovaes

nas organizaes industriais, o que inclui processo como tambm produtos

tecnolgicos inovadores.

Sobre a terceira linha, Chalmers (2012) vai argumentar que a literatura

tem migrado do conceito de inovaes tecnolgicas para as inovaes sociais,

considerando a figura do empreendedor social, o que pode ser assemelhado s

duas linhas iniciais de trabalho apontadas por Mumford (2012) em sua

investi