A PRODUÇÃO DE SENTIDOS NA SÉRIE DE ANÚNCIOS … · Lammel (o maior responsável por eu saber...
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Francesco Gomes Ferrari Ferreira
TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO
A PRODUÇÃO DE SENTIDOS NA SÉRIE DE ANÚNCIOS ABSOLUT
CITIES A PARTIR DA FOTOGRAFIA PUBLICITÁRIA
Santa Maria, RS
2015
2
Francesco Gomes Ferrari Ferreira
A PRODUÇÃO DE SENTIDOS NA SÉRIE DE ANÚNCIOS ABSOLUT
CITIES A PARTIR DA FOTOGRAFIA PUBLICITÁRIA
Trabalho Final de Graduação apresentado ao
Curso de Publicidade e Propaganda, Área de
Ciências Sociais, do Centro Universitário
Franciscano, como requisito parcial para a
conclusão do curso.
Orientadora: Profa. Me. Laura Elise de Oliveira Fabricio
Santa Maria, RS
2015
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Francesco Gomes Ferrari Ferreira
A PRODUÇÃO DE SENTIDOS NA SÉRIE DE ANÚNCIOS ABSOLUT
CITIES A PARTIR DA FOTOGRAFIA PUBLICITÁRIA
Trabalho Final de Graduação II (TFG II) apresentado ao Curso de Publicidade e Propaganda,
Área de Ciências Sociais, do Centro Universitário Franciscano, como pré-requisito para obtenção
de grau de bacharel em Publicidade e Propaganda.
___________________________________________________
Profa. Me. Laura Elise de Oliveira Fabricio - Orientadora (Centro Universitário Franciscano)
___________________________________________________
Profa. Dr. Graziela Frainer Knoll (Centro Universitário Franciscano)
__________________________________________________
Prof. Dr. Fernando Franco Codevilla (Centro Universitário Franciscano)
Santa Maria,RS, 25 de novembro de 2015.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente à minha família, meus pais Inael e Clóvis e meus irmãos
Leani e Giu, que está por vir, que me proporcionaram sempre o melhor que lhes foi possível.
Agradeço em especial à minha avó Ziza, às tias Éina e Sione e ao meu afilhado Miguel, por
me incentivarem e me apoiarem do início ao fim do processo. Também ao restante da minha
família, é claro.
Agradeço aos meus amigos e colegas, aos de fé que nunca deixaram na mão, ao
Cristian, ao PC, ao Germano, à Guta, ao trio (Andréia, Gabi, Mari); aos mochileiros Pablo,
Vitor, Davi, Sambô (foi mal, não consigo chamar de Guilherme) e ao Rasta (o Rasta Rodrigo
e vice-versa); às já formadas, Gi e Taís (a melhor redatora e a melhor atendimento da melhor
campanha barrada pelo cliente. Para mim, dominamos a arte de...), Lu e Ana (teu TFG foi
bem, bem... lido, thanks).
Agradeço aos meus professores da Gema, inspiradores durante esses quatro anos da
faculdade; à minha master mestre da direção de arte Janea Kessler, tenho o imenso prazer de
poder ter sido teu aluno e pupilo na Gema; à Daniela Pedroso, por tudo que pude aprender no
meu curto tempo de Gema; à Pauline, com quem ainda tenho o prazer de cruzar pelos
corredores e que sempre me recebe muito bem quando por algum motivo tenho que ir a
Agencia.
Agradeço a minha master, blaster, mega, ultra, power, mestre orientadora Laura
Fabrício.
Agradeço aos meus colegas de trabalho, de sétimo andar, Ericson, Clenilson, Erick,
Otávio, Márcio, Daniel, Felipe, Armando e Quintana. Ao Pedro, sempre o primeiro a chegar
no laboratório à tarde, ao Guilherme, sempre com assunto para pôr em dia, que sempre
começa em futebol e acaba em futebol. Aos meus colegas de laboratório, os profs Iuri
Lammel (o maior responsável por eu saber hoje diagramar um jornal), a Rosana, a Aurea, a
Daniela, a Luciana (que sempre traz bons debates para nossas tardes no Multijor) e o
Maurício, que está por dentro do meu assunto do TFG e sabendo mais que eu já.
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RESUMO
A fotografia possui um importante papel na construção da mensagem publicitária, auxiliando
textualmente, apresentando significantes, instigando e sensibilizando o leitor, criando nele a
vontade conhecer o produto, por vezes mais pelo impacto imagético que pelo próprio produto
anunciado. O presente trabalho propõe-se a compreender essa relação da geração de
significantes na fotografia publicitária dentro da série Cities, englobada na campanha Absolut
Perfection, da Absolut Vodka. Para isso, faz-se uso da teoria semiológica de Roland Barthes.
A partir disso, buscou-se encontrar e explicar os significantes presentes nos anúncios.
Palavras-chave: fotografia publicitária, Absolut Vodka, anúncios, significantes e cultura
ABSTRACT
The photograph possess an important role in building the advertising message, helping
verbatim, presenting significant, encouraging and sensitizing the reader, creating in him the
desire to know the product, sometimes by more imagistic impact by itself advertised product.
The present work aims to understand the relationship of generating significant in advertising
photography in the Cities series, encompassed within the campaign Absolut Perfection,
Absolut Vodka's. For this use is made of the semiotic theory of Roland Barthes. From this we
tried to find and explain the significant present in ads.
Keywords: advertising photography, Absolut Vodka, announcements, significant and culture
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
1 Figura 1 - A garrafa .......................................................................................................... 21
2 Figura 2 - Absolut 100 ....................................................................................................... 24 3 Figura 3 - Absolut 2001 ...................................................................................................... 24 4 Figura 4 - Absolut Achievemet .......................................................................................... 24
5 Figura 5 - Absolut 24th ...................................................................................................... 25 6 Figura 6 - Absolut Acessory ............................................................................................... 25
7 Figura 7 - Absolut Jacobs ................................................................................................... 26 8 Figura 8 - Absolut Warhol ................................................................................................. 26
9 Figura 9 - Absolut Tambella .............................................................................................. 26
10 Figura 10 - Absolut Brooklyn ............................................................................................ 28
11 Figura 11 - Série lançada em 2008 ..................................................................................... 28 12 Figura 12 - Absolut Buenos Aires ...................................................................................... 36 13 Figura 13 - Absolut Berlin .................................................................................................. 42
14 Figura 14 - Absolut Bangkok ............................................................................................. 47 15 Figura 15 - Absolut New York ........................................................................................... 52
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 8 2 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................................ 10
2.1 Semiologia e fotografia: a imagem estática como texto produtor de sentidos ................... 10
2.2 A marca Absolut e a publicidade ....................................................................................... 19
2.2.1 A garrafa ......................................................................................................................... 20
2.2.2 O nome ........................................................................................................................... 22
2.2.3 A publicidade .................................................................................................................. 23
3 METODOLOGIA .............................................................................................................. 30
3.1 Corpus e percurso metodológico ....................................................................................... 34
4 ANÁLISES ........................................................................................................................ 36
4.1 Anúncio um: Absolut Buenos Aires .................................................................................. 36
4.2 Anúncio dois: Absolut Berlin ............................................................................................ 42
4.3 Anúncio três: Absolut Bangkok ......................................................................................... 47
4.4 Anúncio quatro: Absolut New York .................................................................................. 52
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 57
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................ 59
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1 INTRODUÇÃO
A pesquisa que se apresenta é resultado de um profundo interesse pela fotografia
aliado a uma grande admiração pela produção publicitária da marca Absolut. A fotografia é
um dos pilares da produção publicitária na campanha Absolut Perfection, produzida pela
TBWA nova-iorquina. Essa campanha foi uma das mais longevas da história, sendo veiculada
ininterruptamente por cerca de vinte e oito anos, e compreendendo internamente uma
infinidade de séries, das quais destaca-se a série Cities, a qual apresenta anúncios que
impactam pela fotografia e pelo conteúdo cultural apresentado.
Esta é, entende-se, riquíssima em conteúdos e sensações a serem explorados neste
trabalho; não apenas por suas imagens, mas também por um conceito de propaganda
diferenciado da marca. A associação deste conjunto de aspectos, acredita-se, justifica a
importância dessa proposta de estudo para a área da comunicação, mas especialmente para a
Publicidade e para a fotografia. A seguinte pesquisa tem como tema a produção de sentidos na
série de anúncios Absolut Cities a partir da fotografia publicitária. O sucesso mundial da
marca está diretamente ligado à sua comunicação e à consolidação da silhueta da garrafa
como sua identidade registrada.
Com isso, realiza-se nesse estudo uma análise semiológica a partir dos elementos
culturais. Sendo assim, cada uma das imagens selecionadas é observada tanto pelo conteúdo
denotado, quando pelo conotado, identificando significantes e seus significados. Na série, a
fotografia expõe um conteúdo cultural, informativo e não apenas comercial, além do caráter
apelativo, inerente ao publicitário, e da sua capacidade vendável.
As peças ancoram seu conteúdo imagético no factual, no cotidiano, e apresentam um
contexto no qual podem ser percebidas características socioculturais dentro dos cenários
apresentados. Disto definiu-se o problema: como os elementos culturais apresentados nas
peças da série Absolut Cities são articulados nas fotografias publicitárias para gerar sentidos?
E quais são os sentidos produzidos a partir dos mesmos?
A fim de responder à problemática apresentada definiu-se como objetivo geral analisar
a produção de sentidos a partir dos elementos culturais presentes nas fotografias publicitárias
dos anúncios da série Absolut Cities. Para que este objetivo geral fosse possível, definiram-se
os seguintes objetivos específicos: descrever quais elementos culturais estão presentes nas
composições das fotografias publicitárias da série Absolut Cities; identificar os sentidos
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conotativos a partir dos elementos culturais presentes nas fotografias publicitárias nos
anúncios da série; e identificar os sentidos denotativos a partir dos elementos culturais
presentes nas fotografias publicitárias nos anúncios da série.
Com isso, o presente trabalho dividiu-se em quatro capítulos, nos quais se tratam
assuntos pertinentes à posterior análise. Segue a esta introdução o capítulo dois, destinado ao
Referencial Teórico, subdividido em duas partes. Em Semiologia e Fotografia Publicitária,
aborda-se a semiologia desde a sua constituição, seus pensadores e seus conceitos primordiais
evoluindo até os mais recentes. E a fotografia, primeiramente no âmbito histórico, mas
também o seu papel social, documental até se chegar à sua importância no processo da
comunicação e, então, sua ligação à publicidade. Fecha o capítulo a abordagem da história da
marca Absolut Vodka desde os primórdios na Suécia até sua expansão mundial, evoluindo até
então chegar ao seu envolvimento com a cultura e a publicidade.
Na sequência, o capítulo três é dedicado à apresentação da metodologia que se entende
pertinente para tal estudo, bem como sobre a constituição do corpus da pesquisa e as bases
para a futura análise. No capítulo quatro, estão reunidas as quatro análises a que este trabalho
de final de graduação de propôs. As considerações finais fecham o presente estudo,
procurando responder às indagações que o originaram.
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2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Semiologia e Fotografia Publicitária: A imagem estática como texto produtor de sentidos
O surgimento da semiologia remonta a Ferdinand Saussure (1857-1913), este que é
considerado um dos precursores do estudo da linguagem que serviu de base à linguística
moderna. Então professor da universidade de Genebra, Saussure iniciou um pensamento em
torno da linguagem e seus sistemas de signos que viria a provocar uma revisão da
“metodologia das ciências humanas”, segundo Hénault (2006).
Deve-se, então, pensar Saussure como um princípio, pois seus estudos servem de
alicerce para outros cientistas se aprofundarem nesse campo da compreensão dos signos na
linguagem. Saussure não detalhou o processo de significação propriamente dito, visto que não
deu início a nenhum processo analítico em profundidade. Sua maior contribuição é,
propriamente, o sistema de signos, base da semiologia, como evidencia Peruzzolo:
O contributo direto de Saussure à Semiologia é relativamente pequeno. Vai pouco
além de um projeto de teoria geral da linguagem e dos sistemas de signos, cujo
elemento básico para a nova ciência é, exatamente, o seu modelo de signo. Nesse
sentido, Saussure é mais precursor que fundador da Semiologia. Foram as
sistematizações realizadas principalmente por Barthes, Greimas, Hjelmslev,
Mounin, Prieto e Buyssens que, trabalhando sobre as propostas de Saussure,
organizaram a teoria semiológica. (PERUZZOLO, 2004, p. 35)
O autor também acrescenta que é considerado como “ato fundador da Semiologia
enquanto ciência, a constituição, por inspiração de Jakobson, do Círculo Parisiense de
Semiótica, em 1967 e do qual faziam parte Lévis-Strauss, Benveniste, Barthes e Greimas”
(2004, p. 36). Souza (2004) ratifica ao trazer que o livro de Sausurre, Curso de Linguística
Geral, publicado inicialmente em 1915, “abriu um caminho, cujo ponto alto terá sido a revista
Communications, onde colaboraram autores como os semiólogos Greimas e Barthes” (p.46).
A teoria pensada por Saussure consistia numa compreensão da linguagem na qual os
falantes eram vistos sob um olhar que desconsiderava os seus contextos pessoais como partes
da observação de sua linguagem. Segundo Peruzzolo, “Saussure propunha uma Linguística de
modelo abstrato, onde os falantes são despidos de suas características históricas, pessoais e
culturais, isto é, falantes sem psiquismo, sem inserção na sociedade e sem individualidade”
(2004, p.36). O autor acrescenta que, posteriormente, para resgatar tais aspectos, o linguista
propõe o estudo a partir de “pares dicotômicos”, ou seja: língua/fala, significante/significado,
denotativo/conotativo, sintagma/paradigma. Souza explica o pioneirismo de Saussure:
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[...] foi o primeiro a notar que um signo pode dividir-se em dois componentes, o
significante e o significado. O significante é a parte formal e física de um signo. O
significado é o conceito que o signo aporta, o seu conteúdo, o seu referente exterior
(designação de Sausurre). Por exemplo, a palavra “signo” é a componente física e
formal do signo “signo”. Mas a mesma palavra transporta o conceito de signo:
entidade total ou parcialmente portadora do conteúdo de uma mensagem. (SOUZA,
2004, p. 46)
Compreender o que é signo, pois, é determinante nessa discussão. Vários autores se
somam na busca por uma conceituação, conforme Epstein (1985), que os reúne ao discorrer
sobre o assunto no livreto O signo. Um dos pensadores que apresenta, o qual se verá
extremamente relevante para a compreensão do assunto, é Louis Hjelmslev:
Um signo é, de início e acima de tudo, signo de alguma outra coisa, particularidade
que nos interessa desde logo, pois parece indicar que um ‘signo’ define-se por uma
função. Um ‘signo’ funciona, designa, significa. Opondo-se a um não-signo, um
‘signo’ é portador de uma significação... (HJELMSLEV, 1975, apud EPSTEIN,
1985, p.19)
Em um outro olhar trazido pelo autor, são postuladas as relações que se estabelecem a
partir do signo, ou melhor, que o próprio signo configuraria:
Junto com Peirce, entendemos por signo algo que responde por outra coisa, que
representa outra coisa, e que é compreendido ou interpretado por alguém. Assim,
signo é uma relação de três membros, ou triádica, composta pelo signo como meio
(relação signo-meio M), pelo objeto designado (relação signo-objeto O) e pela
consciência interpretadora, o intérprete ou o signo interpretante (relação signo-
interpretante). O signo não é, pois, um objeto com propriedades, mas uma relação.
(BENSE; WALTER, 1975 apud EPSTEIN, 1985, p.20)
Como direcionamento natural deste trabalho, recorre-se à concepção do conceito de
signo atrelada ao contexto do processo da comunicação. É esse olhar – de que qualquer
elemento pode transformar-se em signo quando consegue transmitir informações aos
envolvidos no ato comunicativo – o que o trecho a seguir demonstra:
Qualquer objeto material, ou propriedade de tal objeto, ou um evento material
transforma-se em signo quando, no processo da comunicação, serve, dentro da
estrutura da linguagem adotada pelas pessoas que se comunicam, ao propósito de
transmitir certos pensamentos acerca da realidade, isto é, acerca do mundo exterior,
ou acerca de experiências interiores (emocionais, estéticas, volitivas etc.) de
qualquer das pessoas que participam do processo de comunicação. (SCHAFF, 1968,
apud EPSTEIN, 1985, p.19)
Poderia-se, então, ousar atribuir ao signo o caráter de catalizador dos processos de
significação, agindo como um caminho que leva aos significados contidos na mensagem que
se deseja compreender.
Quando se fala em “signo”, em geral subentende-se o veículo sígnico (Morris) ou o
significante (Saussure) ou a expressão (Hjelmslev). Tal uso é prático e costumeiro e
até na definição mais genérica de signo, como “algo que está por outra coisa”, pode
parecer subentendido que o signo equivale a esse “algo”. Quando, porém, pretende-
se estudar a classificação dos signos é indispensável entendê-los como uma
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correlação entre variáveis. Esta perspectiva (da função sígnica) pode iluminar e
facilitar o entendimento destas classificações da função sígnica. (EPSTEIN, 1985,
p.47)
Dentre teóricos que pensam sobre o signo, considera-se relevante destacar Louis
Hjelmslev, já citado anteriormente. O pensador traz como maior preocupação a ampliação de
certos pontos na obra de Saussure, e não, propriamente, a criação de novas hipóteses a
conduzir o estudo semiológico. Foi Hjelmslev o pioneiro do pensamento semiológico
aplicado ao não-verbal, configurando uma teoria de linguagem global, em que é importante
enxergar o indivíduo não apenas pela mensagem, bem como pelo seu contexto pessoal e
cultural, contrariando a abordagem dada anteriormente por Saussure.
Hjelmslev constitui um modelo de análise baseado em expressão e conteúdo, distinto
do modo de Saussure que usou significante e significado. A justificativa de Hjelmslev é de
que significantes necessitam de línguas naturais, enquanto expressões não, elas permitem
“ler” quaisquer linguagens. Com isso, ele apresenta o que posteriormente seria retomado por
Jakobson e Barthes, que viriam adotar sistemas similares para seus estudos interpretantes.
Segundo Santaella (2001), “uma semiótica explícita da imagem teve início nos trabalhos
sobre semiologia estrutural. Barthes (por exemplo, 1964c) desenvolveu sua própria semiótica
da imagem baseado em Saussure e Hjelmslev”. (p. 34)
Embora tanto a semiótica como a semiologia tenham se iniciado a partir dos estudos
linguísticos de Saussure, posteriormente há uma bifurcação entre estas classes de estudo. A
principal distinção entre as duas correntes é a forma com que abordam a leitura dos signos na
linguagem, enquanto a semiótica realiza uma leitura e atribuía categorias aos significantes,
vendo a mensagem de uma forma frasistica. A semiologia trata a mensagem de uma forma
integral, com a função contemplar um sentido global expressado no texto.
Dos pensadores que deram sequência às premissas de Saussure trazendo-as até a
atualidade, um tem especial importância para o presente estudo. Roland Barthes, a quem se
buscará abordar com maior aprofundamento a seguir, é fundamental por conseguir elucidar a
intersecção da linguística e da cultura no processo de significação, a partir da imagem
fotográfica. Considerando que este autor foi o primeiro pensador a colocar a fotografia como
linguagem a ser pensada como processo semiológico, em especial as fotografias jornalística e
publicitária.
O pensamento semiológico de Barthes tem forte influência de Saussure, porém
também observam-se claras distinções entre os pensamentos de um e outro, principalmente no
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que tange à linguagem imagética. Com relação a isso, percebe-se a relevância dos estudos de
Hjelmslev na construção do pensamento de Barthes, o que fica evidente em seu grande
interesse pela imagem e pela compreensão da mensagem expressa pela mesma.
O pensamento de Hjelmslev apresentava a expressão como um pilar, permitindo a
Barthes uma base para contemplar seus estudos imagéticos dentro da semiologia. Isso mesmo
sem a existência de uma língua natural na linguagem expressa pelas imagens. O domínio de
Saussure e Hjelmslev, conforme apontado por Santaella (2001), permitiu a Barthes não só
realizar seus ensaios sobre a linguagem imagética bem como a repensar bases para a
compreensão do estudo semiológico. A partir disso, Barthes coloca como pilares para o seu
processo de significação a denotação, composta do conteúdo textual superficial, e a
conotação, que abrange o textual que transcende a leitura superficial.
Uma peça de vestuário, um automóvel, um cozinhado, um gesto, um filme, uma
música, uma imagem publicitária, um conjunto de móveis, um título de jornal – aqui
estão alguns objectos aparentemente heteróclitos. Que poderão eles ter em comum?
Pelo menos isto: todos eles são signos. Quando me desloco na rua – ou na vida – e
encontro esses objectos, imponho, a todos, necessariamente sem me dar conta, uma
mesma actividade, que é a de uma certa leitura: o homem moderno, o homem das
cidades, passa o tempo a ler. Lê, em primeiro lugar e sobretudo, imagens, gestos e
comportamentos [...] (BARTHES, 1985, p149)
O que Barthes propõe nessa passagem é que em tudo que se observa diariamente
realizam-se diversas leituras, e que os signos servem de forma a categorizá-las, possibilitando
que possam ser posteriormente analisadas. Ao que o pensamento de Umberto Eco corrobora:
“Propomos definir signo tudo quanto, à base de uma convenção social previamente aceita,
possa ser entendido como algo que está no lugar de outra coisa.” (ECO, 1980, apud
EPSTEIN, 1985, p.20)
Pensando dessa forma, o cotidiano é uma leitura constante e podemos aferir
significantes a diversos acontecimentos vistos nele. Entendemos que a documentação destas
vivências por meio de registros visuais também devem ser assim compreendidas. E a
fotografia tem muito a ver com isso, a captura de um momento, e a eternização de alguns
signos presentes nele. A fotografia tem um papel de observatório em caráter temporal,
registrando fatos por meio de mensagens imagéticas, visto que ela tem como premissa a
documentação de momentos na história a cada captação que se realiza. A sua utilização, e seu
caráter documental, remontam ao século 19, como esclarece Souza.
A realização da primeira fotografia aconteceu em 1826 e o responsável foi Joseph
Nicéphore Nièpce. A princípio a fotografia era tida apenas como documento de
valor histórico, por sua precisão de reproduzir a natureza, depois foi também
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considerada um veículo de informação pela imprensa (SOUZA; CUSTÓDIO, 2005,
p.237).
A precisão da fotografia, descrita por Souza, provém de uma soma de processos.
Processos estes que envolvem diversos fatores como o enquadramento, a captação da luz, a
transformação deste quadro captado em imagem por meio do desenho da luz até chegarmos a
uma fotografia, com conteúdos específicos e significantes que, conforme o uso dessa imagem,
estarão repletos de sentidos também específicos. Para que se compreenda melhor como se dão
esses, até que possibilitem a obtenção dos resultados, Barthes também oferece subsídios para
que se entenda os processos fotográficos.
Tecnicamente, a fotografia está no entrecruzamento de dois processos inteiramente
distintos: um é de ordem química: trata-se da ação da luz sobre certas substâncias;
outro é de ordem física: trata-se da formação da imagem através de um dispositivo
óptico. (BARTHES,1984, p21)
Porém, não é suficiente a compreensão do processo de produção de uma fotografia,
considerando que neste trabalho o objetivo é refletir sobre a produção de sentidos advindos de
imagens fotográficas produzidas no campo comunicacional publicitário. Mas, sim, como se
desenvolve a mensagem fotográfica, a qual aqui se passará a chamar de texto fotográfico,
como apresenta Duarte. “O texto interessa enquanto objeto do sentido e significação. Daí por
que a primeira questão que este trabalho se propõe é pensar a natureza da fotografia”
(DUARTE, 2000, p168). Mais uma vez, é Barthes quem ajuda na interpretação da formação
deste texto no âmbito da imagem, parecendo necessário trazer suas palavras, o que justifica a
ampla citação abaixo.
A mensagem linguística será constante? Haverá sempre texto no interior, abaixo ou
à volta da imagem? Para encontrar imagens sem palavras, será, talvez, necessário
remontar a sociedades parcialmente analfabetas, isto é, uma espécie de estado
pictográfico da imagem; na verdade desde o aparecimento do livro, a vinculação do
texto a imagem é frequente, ligação que parece ter sido pouco estudada do ponto de
vista estrutural; qual é a estrutura significante da “ilustração”? A imagem duplica
certas informações do texto, por um fenômeno de redundância, ou é o texto que
acrescenta à imagem uma informação inédita? O problema poderia ser formulado
em termos históricos com relação à época clássica, que teve verdadeira paixão pelos
livros ilustrados (não se poderia conceber, no século XVIII, as Fábulas de La
Fontaine sem ilustrações), época em que autores , como Ménestrier , estudaram as
relações entre a imagem e o discursivo. Hoje, ao nível das comunicações de massa,
quer-nos parecer que a mensagem linguística está presente em todas as imagens:
como título, como legenda, como matéria jornalística, como legendas de filme,
como fumetto; como se vê, questiona-se hoje o que se chamou a civilização da
imagem: somos ainda, e mais do que nunca, uma civilização da escrita, por que a
escrita e a palavra são termos carregados de estrutura informacional. Na verdade, só
a presença da mensagem linguística é importante, pois, nem seu lugar, nem sua
extensão parecem pertinentes (um texto longo pode ter apenas um significado
global, graças a conotação, e é esse significado que se relaciona com a imagem).
Quais são as funções da mensagem linguística em relação à mensagem icônica
(dupla)? Parece-me que há duas relações: de fixação e de relais. (BARTHES, 1990,
p32)
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O exposto por Barthes neste texto convida ao questionamento sobre a mensagem
ilustrativa, seja ela qual for, desenho, pintura, gravura ou mesmo a fotografia. Barthes nos
leva ao século 18 para avalizar seu pensamento nos livros ilustrados que faziam sucesso
naquela época, contudo podemos ir mais longe, até a idade da pedra quando a escrita não
fazia parte dos domínios da humanidade e a forma de comunicar-se estava diretamente
relacionada às pinturas rupestres e suas significações. E mais, como Barthes também traz,
como poderiam abdicar do estudo dos sentidos das expressões gráficas fora à linguagem
escrita e falada se estas vêm de um alfabeto que surge justamente de uma maneira de
expressão em formas que descendem de desenhos. Dessa maneira, pode-se até pensar que a
linguagem primária é expressada pelo desenho e não pela escrita.
Porém imagem fotográfica como mensagem é uma compreensão posterior, e deve-se
muito deste entendimento ao jornalismo documental de guerra. O ambiente de batalha produz
muitos signos, e talvez a forma melhor de expressar as experiências vividas em uma guerra
seja a imagem, ela mesmo que triste, forte, feia, imponderável, é visceral como a própria
carnificina de uma guerra. A guerra proporcionou um aprimoramento técnico e prático a
fotógrafos e consequentemente a isso a captura de imagens ricas, e que diziam muito mais que
um texto literal jamais conseguiria retratar sobre dado fato. A guerra portanto atrelou
intimamente a fotografia à comunicação, inicialmente ao jornalismo, porém seu potencial de
verossimilhança a fazia muito sedutora à publicidade, devido à necessidade de vender algo e à
necessidade de para isso ter de demonstrá-lo e assim seduzir o seu cliente potencial.
O uso da fotografia para fins publicitários remonta ao início do século XX, como
ressalta Equizábal (2006): “los años 50 en Estados Unidos fueron años de uma nueva
prosperidad que, antes de la guerra, hubiese sido impossible ni siquiera imaginar” (p.28).
Durante o período de tréguas, entre a Primeira e a Segunda Guerras, foi quando começou a
manifestar-se, mesmo que ainda inicial, a presença da fotografia de criação na comunicação
publicitária. O que Equizábal agrega à discussão é
Quizá la publicidad estaba necesitada de esa dosis de autenticidad que la fotografia,
com su aparência de médio aséptico, le proporcionaba, pero a cambio corría riesgo
de reducir extraordinariamente las possibilidades que la misma fotografia le ofrecía
em el terreno de la imaginación, de la fantasía, del humor, del impacto y, em
definitiva de la creación. (EQUIZÁBAL, 2006, p.29)
Também, como característica inicial associada ao uso da fotografia pela publicidade, é
que a mesma foi adotada por esse campo com o intuito de prova e de representação de forma
a ser mais verossímil. Havia no senso comum uma visão de que a fotografia oferecia uma
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maior realidade e, mais que isso, que era uma forma menos corrompível de imagem visto que
o desenho e a ilustração eram produzidos de maneira manual. Então, como Equizábal
acrescenta, as agências passaram em enxergar na fotografia uma ferramenta para apresentar
seus produtos. Conforme o autor, iniciou-se uma revolução criativa, provocada e conduzida
por importantes profissionais de agencias como a DDB1.
Em los años sesenta algunos publicitarios americanos como David Bernbach eran
conscientes del pozo de mediocridad y de aburrimiento em que había caído la
publicidad y decidieron hacer algo. La revolución creativa que se inició esos años
abrió uma brecha em defensa de una publicidad llamativa, provocativa, incorrecta.
También la fotografia publicitaria (paralelamente a la fotografia creativa) se
contagió de esa corriente de aire fresco y desde agencias como DDB, se empezó a
praticar uma categoria de imagen que rompía com la monotonía impusta por
agencias aburridas, anunciantes muy conservadores y una tendencia a aferrarse al
dato procedente de la investigación que había hecho olvidar das ideas.
(EQUIZÁBAL, 2006, p29)
O que Equizábal chama de “revolução criativa” entende-se como a quebra do
paradigma do uso da fotografia como ferramenta da produção publicitária. Isso veio a causar
uma oxigenação na criação publicitária, que na época se encontrava em uma situação de
estagnação e monotonia criativa. Na fotografia, surte o efeito de um fato novo que acaba por
desencadear um novo ciclo de publicidades, com mais alternativas para a construção dos
anúncios. A então resistência à associação da fotografia a um produto ou a uma marca vem de
um tempo que a fotografia estava muito atrelada ao ambiente da guerra e, portanto, a suas
imagens com carga de dor e destruição. O receio em trazer a fotografia à publicidade resistia
na preocupação de acabar conectando a publicidade e, consequentemente, o produto ou a
marca, a tais sentimentos e situações desfavoráveis.
A criação a partir da fotografia faz com que haja uma preocupação maior pela pré-
produção e captação fotográfica. Tudo isso a fim de que o resultado desta seja cada vez mais
fidedigno ao que projetado anteriormente. Mas essa pré-produção desfaz o caráter da
fotografia em detrimento a fotografia não intencional? O que Duarte traz é que:
Na fotografia “intencional”, em que o fotografado sabe ou solicita a foto, ele
prepara-se para sua produção. Há, no mínimo, a intenção de imitar a si próprio. Fica
portanto, às vezes, difícil ignorar e distinguir esse processo, que também é de
produção de significação do texto fotográfico, que tão bem o registra; encenação das
imagens, aqui a ficção alcança e até mesmo ultrapassa a realidade. (DUARTE, 2000,
p. 168)
1 DDB Worldwide Communications Group Inc., conhecido internacionalmente como DDB (Doyle Dane Bernbach), é uma agência de publicidade de atuação mundial, com mais de 200 escritórios em mais de 90 paises. Pertence a Omnicom Group Inc , um dos maiores grupos publicitários do mundo. No Brasil, é sócia da agência DM9DDB - o outro sócio é o brasileiro Grupo Ypy de Comunicação, de Nizan Guanaes e Guga Valente.
17
Deve-se observar dentro da fotografia o fator da intenção relacionada aos processos de
geração de sentidos, quais os seus porquês e para quê. Compreendê-las como uma categoria
dentro da fotografia e não desprezá-las por apresentarem caráter intencional. Essas imagens,
consistem de uma abordagem diferente da até então usada. Nesse contexto, a mensagem deve
ser observada partindo de um prévio entendimento de suas funções primárias, as quais, no
caso deste estudo, são as fotografias publicitárias, e a produção de sentidos incluída em suas
mensagens comunicacionais.
Mesmo contando estes fatores, e o envolvimento direto ou não do produtor da
fotografia (o fotógrafo) deve ser levado em conta que o processo da fotografia propriamente
dita (homem máquina) se mantém inalterado. Portanto, o caráter de autoridade do fotografo
sobre o material captado também se mantém, incorrendo assim no exercício de alguma
intenção por parte do fotógrafo em relação à fotografia, como aborda Duarte, “há, no mínimo
a intenção de imitar a si próprio”. O que Duarte nos ajuda a compreender é que mesmo que a
fotografia publicitária tenha por trás dela uma campanha e uma diretriz a ser seguida, o
fotógrafo sempre terá um estilo próprio, e apresentará este de alguma forma.
E assim, consequentemente, fica evidente que sempre há uma influência do fotógrafo
sobre as mensagens apresentadas nas imagens e, relacionando-as sempre com a forma como
os referentes são apresentados, podem levar o consumidor ao ato da compra, estando ele no
papel de receptor desta mensagem. Algo que Equizábal auxilia a compreender pelo trecho a
seguir:
Todo está al servicio del objeto; la composición, el cromastismo, la iluminacion. El
objeto de promoción se convierte em sujeto protagonista de um discurso construído
para servirle mejor. Todo es exaltación y el objeto aparece sin tachas ni defectos,
embellecidobajo el maquillaje de los filtros y los trucos hasta adquirir uma entidad
casi sobrenatural que a veces se ve confirmada bajo la iluminación celestial.
(EQUIZÁBAL, 2006, p. 182)
A fotografia publicitária, ferramenta comunicacional utilizada pelo campo da
publicidade, realiza sua produção por meio de mensagens repletas de sentidos, construídas a
partir de elementos diversos e específicos de grupos alvos e suas culturas e estéticas
igualmente ímpar. Equizábal coloca que desde o início da produção fotográfica publicitária é
possível notar uma preocupação com a estética, de manifestar os traços estilísticos do
fotógrafo a retratar a imagem. Essa questão é observada nos anúncios que fazem parte do
corpus desta pesquisa, sendo a estética apresentada na forma das vivências culturais de cada
cidade, por elementos e situações cotidianas que as compõem. E a partir dos elementos que
18
compõem as fotografias publicitárias, tanto a língua como a fotografia quanto o conteúdo
comunicacional, organizam-se e produzem os sentidos da mensagem.
No caso da campanha Absolut Perfection, este objeto do qual trata Equizábal é a
garrafa, não propriamente por sua presença física, mas sim pelo espaço reservado a sua forma,
que nessas peças tem como papel referendar a presença da marca sendo esse o único elemento
visual de identificação da fotografia à marca. Quanto aos truques aos quais Equizábal também
se refere, nessas peças pode-se pensar que estes são além de uma ferramenta para a exposição
do produto. São também um recorte do contexto onde o produto aparece posto, colocando-o
em contraponto ao que se apresenta em seu redor, sendo especificamente isso o que se propõe
a debater este trabalho, onde a produção de sentidos é organizada por fases.
A fotografia publicitária está inserida no contexto da criação publicitária. E para que
compreendamos melhor a criação de mensagens da publicidade, primeiro será necessário
entendê-la como processo. A publicidade é sempre uma mensagem seja ela visual ou não. A
mensagem publicitária se diferencia por seu caráter mais sintético e pelo uso de suportes
variados, sendo aplicável ao texto impresso, digital, sonoro e imagético. Como Barthes
esclarece no trecho a seguir:
Toda a publicidade é uma mensagem: com efeito, ela comporta uma fonte de
emissão, que é a firma a quem pertence o produto lançado (e gabado), um ponto de
recepção, que é o público, e um canal de transmissão, que é, precisamente, aquilo a
que se chama o suporte de publicidade; e como a ciência das mensagens é, hoje em
dia, muito moderna, podemos tentar aplicar à mensagem publicitaria um método de
análise que nos veio (muito recentemente) da linguística; para isso, é preciso adoptar
uma posição imanente ao objecto que queremos estudar, quer dizer, abandonar
voluntariamente qualquer observação relativa à emissão ou a recepção da
mensagem, e colocarmo-nos ao nível da própria mensagem [...] (BARTHES,1985,
p165)
No que tange a publicidade e a mensagem produzida por ela, o que Barthes coloca que
se pode compreendê-la estando diretamente no nível dela. Visto que uma mesma mensagem
publicitária pode estar sujeita a mais de um suporte, seria mais fácil tratá-la diretamente como
linguagem e não por seu caráter apelativo inerente à atividade publicitária, pois há um texto
maior armazenado na forma sintética da linguagem publicitária. O mesmo, posteriormente,
sugere que se imagine este texto maior contido nessas mensagens.
Quanto a essa linguagem apelativa própria do meandro publicitário, compreende-se
que a semiologia seja a ciência linguística mais adequada para uma análise por tratar da
expressão geral e não sobre específicas, pois a mensagem e a intenção foram feitas a fim de
serem assimiladas como um conjunto de signos para um significante comum na mensagem.
19
2.2 A marca Absolut e a publicidade
O surgimento da marca Absolut remonta ao século 19, especificamente no ano 1879. A
marca surgiu na Suécia pelas mãos do empresário Lars Olsson Smith, que também era
conhecido como “The King of Vodka”. Smith ficou assim conhecido por, aos 14 anos de
idade, já possuir empresas que fabricavam e revendiam o produto, obtendo um terço do
mercado sueco de vodca na época. Com o lançamento da marca Absolut, Smith pretendia
conquistar o consumidor mais exigente, com uma vodca produzida sob um novo processo
industrial que prometia um produto absolutamente puro. O diferencial do processo era
propiciar que a vodca fosse destilada por mais de cem vezes, ampliando sua purificação,
enquanto que o processo comum tinha de três a quatro destilações apenas.
Inicialmente toda produção era feita na destilaria de Smith, que ficava nas
proximidades de Estolcomo. O processo chamava-se Absolut Rent Branvin e disto vem o
nome de batismo como Absolut Vodka. Porém, Smith teve problemas para comercializar o
produto em Estocolmo, pois existia um monopólio de venda de bebidas destiladas instalado
na cidade e, se Smith desejasse comercializar por lá, deveria ter a autorização dos mesmos.
Smith se recusou a aceitar tal condição, o que fez com que abrisse uma loja ao lado de sua
fábrica, na ilha de Reimersholme. Localizava-se próximo, mas fora dos limites da cidade de
Estocolmo. Com sua grande vocação para a venda fez com que criasse a alternativa de
disponibilizar a travessia até a ilha de forma gratuita a seus clientes.
A loja de Smith foi sucesso, algo que incomodou Stockholm, detentora do monopólio
de Estocolmo. Foi o estopim para uma guerra comercial, com direito a alguns disparos de
armas de fogo. Porém, Smith novamente optou por uma saída mais pacífica. Expandiu o seu
investimento e direcionou a ampliação do seu território, mas voltou suas atenções ao mercado
da região sul da Suécia, então conhecida pela sua produção de vodca devido ao grande
potencial de produção de álcool de suas lavouras de trigo, respondendo pela produção de mais
da metade do álcool de toda a Suécia. O avanço de Smith para o sul fez com que barateassem
seus custos de produção e ainda lhe permitiu entregar um produto de melhor qualidade em
relação aos seus concorrentes.
No final do século 19, Smith começou a exportar seus produtos entre os países do
norte europeu. Seu processo de expansão internacional foi muito exitoso inicialmente,
tornando-o um dos homens mais ricos da Suécia na época. Fortuna essa que se esvaiu, voltou
a surgir e por fim perdeu-se novamente. Em 1913, Smith morreu, pobre, deixando como
20
herança apenas dívidas, rascunhos e ações judiciais. Porém, o deixou de importante foi o
conceito de Absolut Vodka, seu modelo de negócios, seu marketing e seus conhecimentos
técnicos sobre a produção de uma vodca de extrema pureza. Então, em 1970, Lars Lindmark,
presidente da V&S Vin & Spirits AB e um profundo admirador de Smith e de suas técnicas,
decidiu retomar a antiga empresa e modernizá-la.
Com a aproximação do aniversário de 100 anos do processo Absolut Rent Branvin,
Lindmark tomou a decisão de exportar a nova vodca. Com a tecnologia atual ele conseguiria
produzir uma vodca dentro dos padrões de 100 anos, manter seu grau de pureza, mas fazendo
isso em uma escala muito maior que a do passado. Então, ele recrutou uma equipe de
marketing a fim de chegar a um novo posicionamento para o seu produto. Foi então decidido
que a marca se posicionaria no mercado como uma bebida premium, de longa tradição, pois o
consumo de bebidas premium estava aumentando enquanto o das demais estava baixando nos
EUA. Essa foi a primeira vez que a Suécia exportava uma bebida alcoólica em escala tão
ampla na sua história.
2.2.1 A garrafa
O processo de exportação, porém, também lhes levou a outra grande decisão. Como
embalar o produto? No início, as ideias de embalagem giravam entorno de temas da tradição
sueca e das origens da marca. Pensou-se em menções aos vikings, dizeres de rótulo como
“Royal Court Vodka” em uma garrafa fosca ou mesmo uma garrafa envolta em papel. Porém,
os estudos de marketing apontaram que para ingressar no mercado de vodcas premium o mais
adequado era apresentar o produto em embalagens de cores claras, que remetiam à pureza e à
qualidade. Isso ía de encontro à vontade de evocar tradições suecas densas como a dos
Vikings.
Então, foram chamados especialistas americanos que recomendaram o uso de uma
garrafa moderna, com algum elemento colorido que a fizesse destacar-se nas prateleiras. Eles
também recomendaram alguma referência que pudesse ser comparada às vodcas russas, as
quais muitas traziam imagens de personagens soviéticos. Por fim, destas consultas acabaram
dando-se conta de que as respostas poderiam estar no conceito criado por Smith, há cem anos,
na embalagem um velho remédio sueco do século 18. Isso foi descoberto por Gunnar Broman,
um dos marqueteiros contratados por Lindmark, enquanto passeava pela cidade velha de
Estocolmo e avistou, através da janela de um antiquário, o velho frasco de remédio. Surgia
um ícone, que permaneceu inalterado por mais de um século, que resultaria em uma garrafa
21
elegante, diferente, simples e com uma forte identidade sueca. Além disso, durante o século
17, as vodcas foram vendidas em farmácias na Suécia, sob a alcunha de curarem tudo.
Essa escolha acabou por se tornar uma ‘sacada genial’, formou-se então uma grande
equipe de desenhistas incumbidos de desenvolver os detalhes da garrafa final. Por eles, foi
definido que não deveria haver etiqueta para deixar o conteúdo da garrafa visível. Porém,
depois de várias reuniões, foi decidido que a garrafa, sim, precisava de algum tipo de
rotulação, optando por uma rotulação colorida. Para essa, optaram por usar a cor azul, por
julgarem ser a cor que melhor aliava atração e visibilidade. E essa cor é usada até hoje na
marca, que fica estampada no alto da garrafa, logo abaixo do gargalo.
O maior patrimônio da marca é a sua garrafa (Figura 1). Muito antes de qualquer
publicidade, a silhueta da garrafa de Absolut fazia com que o produto se destacasse nas
prateleiras. Como já exposto, a inspiração para o seu formado, que exibe um corpo robusto e
um gargalo bastante curto, foi baseada na embalagem de um remédio sueco do século 18,
descoberto por Gunnar Broman em um pequeno antiquário de Estocolmo. Frasco este que
auxiliou a Gunnar, juntamente com Hans Brindfors, a criarem a garrafa da marca, tida hoje
como um ícone não só da marca como do design contemporâneo.
Desde a concepção da garrafa, o adorno em forma de selo com a representação da
figura de Lars Olsson Smith também fazia parte da embalagem. A tampa inicialmente foi
projetada para ser feita em cortiça, porém foi necessária uma adaptação que levou ao formato
final em metal.
Figura 1: Formato da garrafa usada com embalagem pela marca.
22
2.2.2 O nome
Tomadas as decisões sobre sua embalagem, o próximo passo era nomear o produto
para que ele pudesse ser rotulado e colocado à venda. Quando ainda produzida por Smith, a
vodka era chamada de “Absolut Rent Branvin”. Desta vez, a ideia inicial era que seu nome
fosse “Pure Vodka Absolute”. Porém, esse nome não poderia ser registrado no país
americano, devido à palavra “absoluto” ser um adjetivo comum, não podendo ser usada como
nome de uma marca. Com isso, o “e” final foi removido, contornando o problema do registro
local de marcas e, agregando um ganho, acrescentou mais um toque sueco. A palavra “pure”
também teve problemas no registro. Foi, então, substituída pela expressão “Country of
Sweden”, enfatizando o orgulho por sua origem nórdica.
Quando a empresa buscou parceiros para efetivamente começar a exportar o produto
aos EUA, a recepção por parte das distribuidoras não foi nada animadora. Foram muitas
negativas até que Carillon Importers Ltd. acertou um acordo de importação. A empresa que
possuía sede em Manhattan contava com apenas um vendedor, Michel Roux, que tinha a
incumbência de desempenhar o papel de liderar todo o processo de distribuição e
comercialização de Absolut nos EUA. O crescimento da Absolut também acarretou no
crescimento da Carillon e fez com que Roux se tornasse o nome por trás desse caso de
sucesso. Ainda antes de sua comercialização, ajustes finais foram feitos a garrafa, como um
breve aumento no cumprimento do pescoço da garrafa e o acréscimo do hoje famoso selo que
leva o rosto de Lars Olsson Smith.
A primeira remessa de exportação da marca foi produzida na destilaria de Ahus, no dia
17 de abril de 1979, e foi colocada à venda, pela primeira vez em solo americano, dois meses
depois, na cidade de Boston. Até os dias atuais, cada gota consumida de Absolut vem do
mesmo lugar, as destilarias de Ahus, no sul da Suécia. Isso devido à garantia de conseguir
manter a mesma qualidade a cada garrafa envasada. A destilaria de Ahus, foi criada em 1906
e atualmente combina o melhor da destilação tradicional ao melhor das tecnologias atuais. A
pequena cidade do sul da Suécia, de população aproximada de 10 mil habitantes, produz
vodka e carrega navios diariamente com milhões de litros de vodca Absolut, que são
exportados para o mundo inteiro.
23
2.2.3 A publicidade
O investimento em publicidade da marca, porém, só aconteceria a partir do inicio do
seu processo de exportação. Este viria a ocorrer em 1979, com a entrada da marca no mercado
americano, até então dominado pelas vodcas russas. Na época, a marca russa Stolichnaya que
detinha 80% de participação no mercado do país. Um mercado difícil e muito exigente, porém
muito estratégico para a marca devido à exposição midiática e à influência do american
lifestyle como desejo de consumo para boa parte da porção ocidental do mundo. Inicialmente,
por uma questão logística e estratégia, a marca chegou primeiramente a Boston,
posteriormente a Nova York, Chicago, Los Angeles e San Francisco. Até consolidar-se e
conseguir uma base sólida que a possibilitasse expandir para todas as regiões do país.
A atitude da marca foi de uma enorme ousadia, afinal chegar a um mercado tão grande
e concorrido como o americano, vindo da Suécia, um país até então desconhecido no exterior
por sua indústria da vodca, é uma atitude que incorre em certo risco. Pode-se considerar a
garrafa até como um agravante de dificuldade, tendo em vista seu formato bem distinto ao
apresentado como embalagem pelas marcas concorrentes e associando isso a um país de
origem sem tradição na produção de vodca. A solução para estes possíveis entraves na
aceitação do novo público ao produto foi encontrada na publicidade. Já no primeiro ano, a
marca conseguiu vender um volume de mais de 80 mil litros no mercado americano.
A publicidade possui um papel preponderante para o sucesso da marca, não só nos
EUA como em sua posterior expansão global. E a garrafa serviu como âncora para a
comunicação da empresa. O ponto de partida para essa descoberta, ocorreu logo na chegada
aos EUA, quando na necessidade de divulgar a marca e a qualidade do seu produto. O
fotógrafo Steven Bronstein produziu as fotos para a primeira peça publicitária da marca em
solo americano, focando na garrafa. Essa foi referência para a criação de uma das campanhas
mais longevas da história da propaganda mundial, que surgiria na sua sequência.
24
As primeiras peças produzidas por Bronstein (Figura 2) possuíam um caráter
simplista, em que era claramente perceptível uma produção fotográfica em estúdio, onde a
garrafa foi disposta sob uma mesa, com luz direta em fundo branco. Para o pós edição cabia
apenas dispor o letreiro feito sempre na tipografia padrão da marca, Futura XBlack
Condensed, com o quo se desejasse comunicar no anúncio. Como anteriormente citado, ainda
é possível perceber como este primeiro anúncio continua sendo relido, remodelado e mantém-
se como uma comunicação contemporânea e, por que não, diferenciada. Deve-se, claro,
ressaltar a criatividade expressada sobre essa “tela em branco” criada pela própria marca.
Figura 2: Anúncio Absolut 100
Figuras 3 e 4: Anúncios Absolut 2001 e Absolut Achievement
25
Em 1980, já projetando a sua expansão mundial, a V&S & Sprit AB, proprietária da
marca Absolut procurou a agencia nova-iorquina TBWA ChiatDay para a produção de uma
campanha completa e de maior apelo, culminando na criação do conceito onde a garrafa era o
centro de tudo. “A heroína é a garrafa. A garrafa é a estrela”, disse Richard Lewis, o
representante mundial para a conta. (Absolut: Arte na Garrafa, por Daniel Campos). A criação
da campanha é um dos marcos da relação da marca com a publicidade. A campanha possui
um conceito simples, inteligente, leve e sofisticado além de ser flexível, adaptando-se a
diversos contextos. No ano seguinte ao surgimento da campanha, incorporou-se a ela e suas
peças o slogan “The Absolut Bottle” que corrobora perfeitamente ao seu conceito visual.
Inicialmente a campanha foi veiculada em outdoors espalhados por Manhattan e por
vans que circulavam por Nova Iorque, posteriormente sendo publicada em revistas de moda,
cultura e comportamento. Essa vocação a associar-se à cultura se acentuaria com o tempo, o
vínculo foi se estreitando devido a tendência da garrafa em se tornar um ícone pop. O sucesso
de Absolut Perfection, está diretamente vinculado ao caráter polivalente de seu conceito e seu
poder de produzir incontáveis anúncios nas mais diversas formas, línguas e aplicações. Ao
longo do tempo a garrafa foi popularizando ao ponto de ser replicada em formatos de óculos,
estampas de vestidos e até piscinas. A garrafa tornou-se celebridade e como tal passou a
conviver em um círculo famosos estilistas, músicos, modelos, atores e atrizes.
Isso deu origem a projetos como Absolut Fashion, onde estilistas consagrados como
Giani Versace, Helmut Lang, Jean Paul Gaultier, Stella McCartney, Manolo Blahnik, Marc
Figuras 5 e 6: Anúncios Absolut 24th e Absolut Acessory
26
Jacobs e Anna Molinari fizeram parte do projeto que teve início em 1989, gerando uma série
de coleções de anúncios retratando suas criações sob sua ótica em relação a marca.
Como dito por Lewis, na criação do conceito de Absolut Perfection, ela tornou-se a
imagem da marca e o objeto desse desejo. Talvez a maior prova disso seja a afeição criada
entre Andy Warhol2 e a garrafa da marca sueca, dando origem ao que batizou como “Absolut
Art”. Este fato mostra o quão presente a marca já se encontrava no âmbito cultural. Desde
então houve uma série de peças, campanhas e eventos que associaram a marca ao design, a
vanguarda e a inovação no que tange a comunicação.
2 Artista (pintor e escultor) norte americano. Tornou-se ícone do movimento da Pop Art (Movimento
que se preocupa em retratar a massificação cultural promovida pelo capitalismo), suas obras ficaram muito conhecidas pelas formas e pelas cores.
Figura 7: Peça da série Absolut Fashion (1989)
Figuras 8 e 9: Anúncios Absolut Warshol e Absolut Tambella
27
Cinco anos depois do ingresso no mercado americano, a marca já havia expandido sua
presença a outros dezoito países ao redor do mundo, tornando-se uma marca de presença
global. Em 1985, a seis anos após a entrada nos EUA, a marca já havia atingido a liderança do
mercado local de vodca. Nessa época, aproveitando-se do momento e do status adquirido
perante o consumidor americano, a marca resolveu transformar o drink mais popular do país,
o Bloody Mary, na primeira vodca saborizada do mundo. A ideia foi um sucesso, não só entre
o público, mas também entre os bares que produziam o drink. O sucesso foi tanto que a marca
seguiu criando outros sabores desde frutas clássicas até misturas exóticas.
O fim da veiculação da campanha Absolut Perfection ocorreu em 2007, após quase 27
anos de campanha, foram mais de 1.500 anúncios, categorizados dentro de diversas séries,
uma delas a série Cities, originária de um souvenir de aeroporto. A série de anúncios que
retrata cidade teve início a partir da criação de mini garrafas de Absolut comercializadas em
duty frees de aeroportos, inicialmente nos EUA, nas cidades de Boston, Nova York, Chicago,
Los Angeles e San Francisco, e posteriormente também para outras famosas cidades do país
como por exemplo New Orleans e Miami. A estratégia porém foi tão certeira que foi aplicada
em outros países como México e Brasil. Inicialmente os anúncios fixados nos próprios
aeroportos e eram diretamente ligados a existência de uma oferta de venda no local, porém
com o tempo a série transcendeu até mesmo isso e tornou-se um passaporte para o ingresso
em novos mercados.
A série de anúncios de Cities foi ativa até o final da campanha Absolut Perfection em
2007. Em março de 2008 a marca foi adquirida da V&S & Sprit AB pela gigante do ramo de
bebidas Pernod Ricard S. A. por 8,7 bilhões de dólares. Assim logo foi criada uma empresa
subsidiaria, a The Absolut Company, que a partir de então ficou responsável pela produção
distribuição e pelo marketing da marca. Aliando o poder que a marca já possuía então, com a
experiência em logística, comunicação e a injeção financeira da nova proprietária francesa a
marca consolidou sua presença na América Latina, Ásia e Leste Europeu.
A série Cities contida dentro da campanha Absolut perfection, tinha como mote inserir
a famosa garrafa dentro de um contexto visual e cultural que remetesse a cada uma das
cidades e dos países das cidades retratadas. Foi uma coleção extensa de anúncios, veiculados
sem uma periodicidade definida, visto que os anúncios datam desde a década de 80 até os
anos 2000. Na série produziu-se e veiculou-se mais de 100 anúncios retratando 80 cidades de
quatro continentes, Américas, Europa, Ásia e Oceania.
28
Houve um relançamento da série Cities, mas com uma nova abordagem ligando as
peças diretamente à existência de produtos com o mesmo nome, com sabores que remetiam às
cidades. Suas embalagens, consequentemente, também remetiam às cidades e suas
características, com a exceção de Nova York, onde o famoso bairro do Brooklyn (figura 10)
foi que recebeu tal deferência, tanto no design da embalagem como no nome da mesma.
Enquanto as demais (Figura 11) retratavam San Francisco, Los Angeles, Boston, New
Orleans, Miami e a cidade canadense de Vancouver uma visão mais abrangente sobre a
cultura local. Além do marketing, esta iniciativa tinha uma contrapartida social, onde a cada
unidade vendida a empresa doava um valor a uma instituição de caridade envolvida em
projetos sociais na cidade. Esta é atuante somente nos EUA e no Canada até dado momento.
Figura 10 (acima): Absolut Brooklyn Figura 11 (abaixo): série lançada em 2008
29
Posteriormente a isso, ainda houve outras edições especiais, sempre usando a silhueta
da garrafa como plataforma para criar. É importante citar séries limitadas como Absolut
Masquerade, uma garrafa envolta em uma capa de lantejoulas, clara referência aos bailes de
máscaras. Absolut Disco, um globo de espelhos em forma de garrafa de Absolut, inspirada na
dance music dos anos 80. Absolut Vodka Rock, uma garrafa envolta por uma capa de couro
com rebites expostos, como uma referência ao Rock n’ Roll. Absolut Glimmer, uma garrafa
forjada sob o molde de corte de cristais.
A garrafa passou de uma embalagem, a uma imagem da marca, a uma modelo para a
publicidade e acaba por se tornar um meio de fazê-la, como as mais recentes séries tem
mostrado. A partir de 2012, as edições limitadas lançadas pela marca passaram a ter um
diferencial, todas as garrafas eram diferentes entre si. Com na série Absolut Unique lançada
em 2012, feita sobre 51 padrões, criados a partir de armas de paint-ball usando 38 cores. Em
2013 a marca lançou a coleção Absolut Originality onde foi adicionada uma faixa azul
cobalto, cor da identidade visual da marca, essa faixa era fundida junto ao vidro fazendo com
que fossem produzidas cerca de 4 milhões de garrafas únicas. Em 2013 houve uma
reformulação nas embalagens da linha de sabores da marca, trazendo um padrão diferente,
perdendo a tipografia em marca d’água tradicional da marca e acrescentando desenhos
geométricos para criar uma representação geométrica para cada fruto. As embalagens também
passaram a usar o vidro transparente em detrimento ao fosco anteriormente usado.
30
3 METODOLOGIA
O presente estudo se realiza a partir de um conjunto de abordagens metodológicas. São
elas a pesquisa bibliográfica, a semiologia e a semiótica como ferramentas metodológicas e a
análise de imagem. A seguir, passamos a enfocá-las em particular.
De início, levou-se à frente uma pesquisa bibliográfica. É a partir dela que se estrutura
o estudo, que se busca conceituações e se encontra os subsídios que permitem a constituição
do referencial teórico e, até mesmo, a fundamentação que permite identificar os caminhos
metodológicos a serem trilhados. Neste caso, em específico, vale reiterar que a pesquisa
bibliográfica serviu de estofo para que se entendesse os estudos da significação das imagens,
o que, na sequência, assegurou subsídios e embasou a etapa de análises.
É Stumpf quem esclarece sobre a importância da pesquisa bibliográfica para o
processo.
Pesquisa bibliográfica, num sentido amplo, é o planejamento global inicial de
qualquer trabalho de pesquisa que via desde a identificação, localização e obtenção
da bibliografia pertinente sobre o assunto, até a apresentação de um texto
sistematizado, onde é apresentada toda a literatura que o aluno examinou, de forma a
evidenciar o entendimento do pensamento dos autores, acrescidos de suas próprias
ideias e opiniões. (STUMPF,2008, p51)
Ainda conceituando, a autora diz que pesquisa bibliográfica é “um conjunto de
procedimentos para identificar, selecionar, localizar e obter documentos de interesse para a
realização de trabalhos acadêmicos de pesquisa, bem como técnicas de leitura e transcrição de
dados que permitem recuperá-los”. Sintetizando, ela aponta quatro etapas a serem seguidas:
Identificação do tema e assuntos, Seleção de fontes, Localização e obtenção do material, e
Leitura e transcrição dos dados.
Stumpf também coloca é que “a revisão da literatura é uma atividade continua e
constante em todo o trabalho acadêmico e de pesquisa” visto que é procedimento que
acompanha todo o desenvolvimento de um trabalho de pesquisa acadêmica. E chama a
atenção para o potencial desse contato com o material bibliográfico:
À medida que o indivíduo vai lendo sobre o assunto de seu interesse, começa a
identificar conceitos que se relacionam até chegar a uma formulação objetiva e clara
do problema que irá investigar. De tudo aquilo que leu, muitas ideias serão
mantidas, enquanto outras poderão ser abandonadas. Este descarte pode ser
momentâneo; por isso, não convém jogar fora as anotações feitas. Elas podem servir
para novas investigações. (STUMPF, 2008, p.53)
Ao enfatizar a relevância da seleção de fontes para a pesquisa, Stumpf atesta que “a
primeira fonte para indicar a bibliografia pertinente ao tema escolhido é o orientador”. Sugere,
31
também, que o pesquisador precisa ir além, tendo por meta ampliar as indicações recebidas e
empenhar-se em encontrar atualizações para a temática estudada. Como principais fontes de
informação bibliográfica secundária, a autora relaciona bibliografias especializadas, índices
com resumos, portais, resumos de teses e dissertações, catálogos de bibliotecas e catálogos de
editoras.
A natureza deste estudo indicou as escolhas metodológicas. Iasbeck (2008, p.193), ao
refletir sobre o método semiótico, diz que “a prática metodológica é inerente à semiótica,
ciência que se dedica a estudar a produção de sentidos”. E completa, evidenciando que a
semiótica não é a única alternativa, mas “talvez seja um dos poucos que têm na linguagem seu
objeto privilegiado de análise”. Sobre o emprego do termo ‘linguagem’, ele explica se referir
à linguagem como todo sistema organizado de sinais convencionais, o que se aplica às
linguagens humanas não-verbais, às linguagens dos animais e da natureza.
Na contramão dos métodos que escravizam, há métodos que libertam. A semiótica é
uma ciência que propõe metodologias para pesquisa em todas as ciências, sem
agredir ou contestar os paradigmas de cada uma delas. Uma das características mais
marcantes dessa parceria é o respeito e a inclusão produtiva de sistemas de
organização e sistematização do conhecimento em formatos por vezes imprevistos
porque multiplaneares e multidirecionais. O resultado costuma ser uma ampliação
de possibilidades exploratórias do objeto. (IASBECK, 2008, p.194)
Seguindo na explicação do método, Iasbeck diz que a semiótica não se refere
diretamente à realidade, mas o faz por meio do signo e do texto. Explicitar tais conceitos,
pelas palavras do autor, é o justifica o amplo trecho a seguir:
O signo – conceito base da semiótica do norte-americano Charles Peirce – é tudo
aquilo que nos chega da realidade, que nos é dado perceber e que, portanto, não é a
realidade inteira, mas uma parcela dela, uma parte ou uma dimensão que representa
o todo, na impossibilidade de que ele apareça em sua plenitude. Traduzindo em
miúdos, o signo é todo sinal de realidade, toda marca que representa algo que está
fora dele, mas de que, em alguns casos, ele é parte. Assim, os nomes não são as
coisas nem as pessoas, mas as representam na ausência; os símbolos representam
outros sentimentos, fenômenos e objetos que jamais caberiam inteiramente naquele
sinal/símbolo; alguns signos são marcas de seus objetos (como as nuvens negras que
prenunciam chuva, as pegadas que sinalizam a presença física de alguém). Todos
nós conhecemos signos e nos referíamos sempre a eles quando falamos de
significado ou significação. Ou seja, tudo o que é signo quer dizer algo, tem um
significado. Temos de admitir que tudo tem significado, mesmo quando não
sabemos dizer qual é. Portanto, tudo é signo.
O texto é também um conceito básico da semiótica à medida em que traduz aquilo
que poderíamos chamar de o ambiente do signo. O texto é uma descoberta da
semiótica russa do início do século passado e corresponde a um conjunto que
Charles Peirce (que não conheceu os semioticistas russos) configurava como sendo
um conjunto composto do fundamento do signo, das marcas que ele carrega do
objeto que representa e dos demais signos que o acompanham, que o interpretam.
Assim, quando nos referimos a uma cidade como São Paulo ou Coromandel, não há
apenas uma marca a representar a realidade desses “objetos-cidades”, mas um
conjunto de marcas que já vêm junto com o nome da cidade. Esse conjunto pode ser
um misto de sentimentos, lembranças, paisagens, notícias e símbolos que não
aparecem de maneira diferenciada, mas, com certeza, estão contidas na
32
representação quando se utiliza o nome dessas cidades. Isso nos leva a concluir que
todo sinal (signo) contém de forma condensada uma série de outros sinais (também
signos) capazes de dar consistência à representação da realidade. Essa consistência
pode aparecer de forma ubíqua ou ambígua, o que não desmerece nem
descaracteriza a autenticidade representativa do signo. (IASBECK, 2008, p.194-195)
Iasbeck ainda ressalta que recomendar o uso da semiótica em trabalhos acadêmicos
não é atitude generalizada. Tal escolha, portanto, precisa estar embasada em “a natureza do
objeto, as intenções de abordagem do pesquisador e, sobretudo, o propósito de ampliar
possibilidade de enfoque”. E o autor complementa: “pensar semioticamente não quer dizer,
necessariamente, pensar em profundidade, afunilando verticalmente o pensamento para
indutivamente processar conclusões válidas e definitivas” (p. 203).
Nesta pesquisa, o signo e a geração de sentidos são abordados por meio do estudo
semiológico de Roland Barthes, fundamentado a partir de Ferdinand Saussure. Assim,
percebe-se como relevante pensar a semiologia e semiótica como ferramentas metodológicas,
conforme abordaram Codato e Lopes, que constroem a reflexão a partir da conceituação de
semiologia e semiótica.
Podemos considerar duas definições de semiologia: 1. “Ciência que estuda a vida no
seio da vida social” (F. Saussure); 2. “Ciência que estuda os sistemas dos signos
(línguas, códigos, sinalizações etc.)” (Petit Robert), e cujo “objetivo é reconstruir o
funcionamento dos sistemas de significação diversos” (R. Barthes). Ambas
consideram como seu objeto de estudo, por extensão, o universo geral dos signos.
(...) No dicionário Petit Robert, encontra-se duas acepções do termo semiótica:
“Teoria geral dos signos e de sua articulação no pensamento (> lógica). Teoria dos
signos e do sentido, e de sua circulação na sociedade (> semiologia)”. A delimitação
das definições diz respeito à origem das concepções distintas da expressão
semiótica. (CODATO; LOPES, 2008, p. 206)
Após apontamentos históricos sobre os antecedentes nas duas vertentes, os autores
concluem: “a semiologia se apresenta como a disciplina cujo método de trabalho serve para
formular hipóteses sobre os sentidos possíveis das mensagens, das formas e das práticas
significantes”. (CODATO; LOPES, 2008, p. 207)
A sequência deste estudo será viabilizada a partir da análise da imagem, sendo que se
pretende buscar a compreensão dos significados contidos na imagem por meio do estudo da
fotografia e da mensagem contida dentro desta. O que Iasbeck traz sobre o signo corrobora a
investigação da imagem em busca de seus dizeres, a qual aborda Coutinho em:
O termo imagem remete ao latim imago, cujo sentido é o de toda e qualquer
visualização gerada pelo ser humano, seja em forma de objeto, de obra de arte, de
registro foto-mecânico, de construção pictória (pintura, desenho, gravura) ou até de
pensamento (imagens mentais). (...) Para os estudiosos da comunicação, e qualquer
pesquisador que se proponha a realizar análise de imagem é necessário uma
concepção mais precisa do objeto a ser investigado, “fechar o foco”, expressão que
faz referência a um dos elementos definidores de toda e qualquer imagem.
(COUTINHO, 2008, p. 330)
33
Quando o autor fala em fechamento de foco em um elemento do rico âmbito da
fotografia é onde aponta-se, neste estudo, a referência aos sentidos de caráter cultural
expostos nas imagens analisadas. A fotografia é produzida de pessoa para pessoas e esse é o
interesse essencial para a construção desta análise, o que a pessoa produz e como ela pretende
ser lida a partir da imagem. Coutinho também coloca:
É precisamente essa capacidade das imagens de comunicar uma mensagem que
constitui o aspecto principal de sua análise. Em outras palavras, interessa à Análise
da Imagem compreender as mensagens visuais como produtos comunicacionais,
especialmente aquelas inseridas em meios de comunicação de massa: fotografias
impressas em jornais, anúncios publicitários, filmes, imagens difundidas pela
televisão ou ainda disponíveis na Internet. (COUTINHO, 2008, p. 330-331)
No ponto que toca Coutinho, coloca-se o interesse em descobrir como uma fotografia
de anúncio, a qual tem como premissa a venda, trabalha a exposição de seu produto. O que
justificaria se colocar a ponto de não apresentá-lo diretamente e, sim, de uma forma que o
receptor se encarrega de sublimá-lo dentro da imagem que está posta. Ao mesmo tempo,
apresenta uma série de referências culturais com significados a serem decifrados por esse
mesmo receptor.
Poderíamos considerar que a Análise da Imagem poderia ser utilizada em três
grandes grupos de estudos. Uma das linhas de investigação considera a imagem
como documento (1). Outra propõe a análise desta como narrativa (2) e ainda há os
que defendem a necessidade de se realizarem Exercícios do Ver (3), como Martín-
Barbero e German Rey (2001). (COUTINHO, 2008, p. 331)
A imagem possui o papel primordial nesses processos de significação devido à carga
de realidade que contém por ser fotográfica. Isso lhe traz um peso maior, e também corrobora
a isso trazendo aspectos capazes de referenciar estes elementos culturais nelas contidos. Por
isso, é preciso considerar um caráter documental da ferramenta fotográfica, mesmo neste caso
ela sendo de origem publicitária, pois acaba por conservar um cerne documental por meio
destas referências culturais que apresenta, podendo por meio delas servir como um referente a
momentos da história.
É também de Coutinho que se busca referências com relação a etapas e procedimentos
fundamentais na condução de estudos de análise de imagem. A autora traz que o percurso
metodológico para analisar uma imagem compreende três passos: a leitura, a interpretação e a
conclusão (ou síntese). Ela ressalta que um dos desafios que se coloca “seria a necessidade de
uma espécie de ‘tradução’, isto é, a transposição de códigos visuais em signos linguísticos”.
Também chama a atenção para outro aspecto importante de ser destacado com relação à
análise de qualquer tipo de imagem: a diferença entre percepção e interpretação.
34
A primeira, inata, estaria relacionada aos registros e reações do sistema visual de
cada indivíduo, que localizaria e interpretaria certas regularidades nos fenômenos
luminosos, como explica Aumont (1993, p.22): “(...) essas regularidades referem-se
a três características da luz: sua intensidade, seu comprimento de onda, sua
distribuição no espaço”. (COUTINHO, 2008, p. 335)
A autora ainda afirma que “o ponto de vista metodológico privilegia o princípio da
permutação para a distinção dos diferentes componentes de uma mensagem visual”. Ou seja,
“o analista da imagem teria como pontos de partida as relações oposição e segmentação. Na
sequência, propõe a abordagem de categorias que estabeleçam um percurso para a análise de
imagem. Após resgatar posicionamentos divergentes entre os estudiosos deste método,
Coutinho intenta identificar uma possível direção para o olhar do analista,
Entre os aspectos destacados estariam o enquadramento, a perspectiva, a relação
fundo/figura, a composição da imagem, a utilização de luz e cores, a relação entre os
objetos representados e a função da mensagem visual. Desta forma, a imagem como
texto visual a ser lido, seria marcada pela presença de diferentes maneiras de
significa. (COUTINHO, 2008, p. 336)
3.1 Corpus e percurso metodológico
O corpus deste estudo compreende quatro anúncios em forma de imagens contidos na
série Cities, da campanha Absolut Perfection da Absolut Vodka. Tal série consiste na
apresentação de fotografias que retratam uma relação do produto e da marca ao contexto das
localidades retratadas nos anúncios.
Vários critérios balizaram a seleção das peças para a análise, cujo universo inicial
compreendia cerca de 120 anúncios. Ao se estabelecer um recorte para definição do corpus de
análise, procurou-se contemplar os quatro continentes que são abarcados na série: América
(com duas peças), Oceania, Europa e Ásia.
Os anúncios escolhidos foram Buenos Aires, Berlim, Bangkok e New York. Em
comum a todos, pode-se elencar o contexto cultural distinto de cada uma das cidades
escolhidas, a qualidade técnica do anúncio, isto é, considerando a sua direção de arte, e a sua
riqueza de detalhes e referentes. Procurou-se ter rigor nas avaliações prévias para que a
qualidade das análises realizadas produzisse um conteúdo de boa valia, visto que se entende
que a qualidade e a riqueza do retratado nas peças encontra-se diretamente ligadas ao que
delas se pode extrair na análise.
Outro fator importante na seleção dos anúncios foi o meio utilizado para chegar ao
resultado final. Previamente, os anúncios foram separados em três categorias, tais como:
35
produzidos, desenhos e plausíveis. O que se elencou para chegar a estas categorias foi a
capacidade de produção, ou seja, a viabilidade dos acontecimentos retratados ocorrerem em
situações no ambiente real, o fato e a capacidade de captá-lo por meio de fotografia. Buscou-
se os mais palpáveis de serem realizados de maneira orgânica, mesmo tendo consciência de
que por mais orgânicos que fossem ainda apresentariam alguma manipulação.
Visto isso, peças que traziam uma produção de estúdio foram descartadas.
Posteriormente, as que apresentavam desenho, ou animação 3d como totalidade também
foram desconsideradas. Ficando assim com os anúncios plausíveis, então nestes foi realizada
uma busca mais profunda por representações marcantes de suas cidades. Foi-se separando-as
por regiões de origem, Europa, América do Norte, Central e do Sul, Ásia e Oceania,
chegando-se às mais relevantes por região. Naquelas em que havia mais de uma decidiu-se
por fatores de técnica aplicada. Como, por exemplo, com o que ocorreu na decisão de
América e de Europa, em que se tinha mais de duas peças contemplando os itens anteriores da
seleção. Com relação à Ásia e à Oceania não se teve problemas, visto não serem muitos
anúncios nesses continentes, uma vez que na parte ocidental a campanha foi mais forte.
Pretende-se, a partir do reconhecimento dos conceitos de autores como Hjelmslev e
principalmente Barthes, compreendê-los e assimilá-los para poder posteriormente em domínio
dos seus pensamentos, realizar a análise. Busca-se, nestes diferentes anúncios, por signos que
referenciem a tais localidades, de maneira a atentar a sua visão perante ao mundo, a sua
cultura, história, costumes e povo, e de que forma estes itens são apresentados em dadas peças
publicitárias. Busca-se, sempre tomando como apoio a semiologia, trazer à tona estes sentidos
contidos e a maneira com que conversam com a marca. Assim, tem-se como meta encontrar a
intersecção entre estes referentes culturais e a marca, compreendendo, assim, a valoração real
da cultura local no anúncio publicitário da Absolut Vodka.
A análise parte de uma descrição detalhada das peças, seguindo para uma análise
empírica. Neste passo, a intenção é extrair as percepções do pesquisador, identificando tudo
que a percepção julgue importante na imagem e destacando-as. O passo seguinte será buscar
os traços não evidenciados nas imagens para, então, adentrar-se na leitura destes signos, neles
sempre buscando seus significantes e suas comprovações perante ao contexto da imagem a
qual se aplicam.
37
A imagem do anúncio um é uma fotografia em preto e branco. Nela se apresentam em
primeiro plano uma mesa, de toalha branca, sobre a qual há uma xicara sobre um pires, ambos
brancos e de porcelana. Ao seu lado há um copo de vidro transparente com um líquido
igualmente incolor, representando água. Logo após, percebe-se uma ampla janela, na qual
podemos notar umidade em forma de vapor, lembrando baixas temperaturas, e distinção de
temperaturas entre o ambiente externo e o interno. Fato é que esta umidade faz com que essa
janela haja de forma a refletir características tanto do local internamente quanto a transparecer
o externo.
É possível notar a presença de luminárias de parede na parte interna, assim como a cor
clara das paredes do recinto. Na parte externa, percebe-se uma silhueta feminina de cabelos
longos, que aparenta espiar às suas costas, pois a mesma se encontra com o rosto e o pescoço
levemente virados para trás. Ainda na janela há uma parte não embaçada, onde aparece
desenhada a silhueta de uma garrafa de vodca da marca Absolut. Por último, sobre a janela, há
a clara inscrição das palavras bar e café, ambas em letras de forma e mesmo tamanho. Este
ambiente retratado na peça que se apresenta faz parte da série Absolut Cities a qual é parte da
campanha Absolut Perfection, veiculada na Argentina, e faz clara referência à cultura dos
cafés urbanos, muito presentes na capital portenha.
O enquadramento se dá pela orientação vertical, que busca fazer com que haja uma
clara compreensão do conjunto de elementos que compõem essa fotografia. Faz, ainda, com
que todos os objetos apresentados na imagem interajam, organizados de forma que resaltem a
sua importância para produção da mensagem. Nesse enquadramento vertical, percebe-se uma
silhueta feminina, a silhueta da garrafa no vidro da janela e a mesa do ambiente fotografado,
fazendo com que a apresentação da cena descrita instigue o receptor da mensagem a
perguntar-se o que ocorre no local.
O plano apresentado neste anúncio é um grande plano, que, conforme Duarte (2000, p.
177), “... em que o corpo humano toma 1/3 do quadro fotográfico”, visto que a silhueta da
mulher está posta à margem, ao lado esquerdo da composição fotográfica, e em um ponto que
lhe permite interagir com os outros elementos. Dentre eles, a silhueta da garrafa de vodca,
contribui na percepção da narrativa, bem como na produção de sentidos da mensagem. A
posição física da mulher que aparece na imagem, com o rosto virado para trás ao contrário do
restante do corpo, que se direciona para frente, dá a ideia e a sensação de que ela ou está
passando pelo café e a silhueta da garrafa lhe chama a atenção, ou ainda, de que estava
naquele local e participou daquele momento, tendo sido responsável por desenhar a silhueta
38
da garrafa de vodca no vapor presente no vidro, deixando uma representação de um
sentimento, de uma vontade, um desejo ou uma lembrança.
A composição fotográfica deste anúncio faz o uso da razão áurea, a qual segundo
Präkel (2013, p.18) “...é uma divisão baseada na proporção do número de ouro e pode ser
usada como método de posicionamento do assunto na imagem ou de divisão da composição
em proporções agradáveis”. A partir dessa, pode-se enxergar os objetos mais relevantes de
maneira sequencial, gerando uma leitura em forma de espiral. Esta formatação permite com
que se leia a fotografia por meio de seus elementos mais latentes, de forma espiralada. Ou
seja, a composição faz com que os olhos do leitor, inicialmente, percorram da mesa à forma
feminina, dela até a garrafa e, enfim, ao espaço vago junto à mesa.
Percebe-se no ambiente fotografado uma iluminação difusa e de densidade baixa,
dando a sensação de aconchego em toda a cena, além de remeter a uma situação de pouca
iluminação, como se fosse uma imagem noturna, de pouca iluminação ou de luz suave,
pontual, não focal. Isso sugere uma estética que mais se aproxima a de uma fotografia antiga,
dos anos trinta ou quarenta, sensação essa auxiliada também pela opção no uso do preto e
branco. Conforme Medeiros (2008, p. 12), a luz difusa pode ser causada por todos os tipos de
acessórios fotográficos que contenham um pano difusor sobre a sua superfície, e o efeito
sempre será uma luz suavizada. Quando usados com apenas um ou três pontos de luz, acaba
por trazer à cena uma luz branda, podendo ser, por vezes, pontual.
A cor, e neste caso a ausência dela, possui uma importância fundamental na
construção do sentido da mensagem. Neste anúncio, a opção pelo preto e branco tem como
papel a criação de uma identidade da cidade de Buenos Aires, onde há muito da cultura
europeia. Nesse anúncio, é possível observar uma clara referência ao cinema francês e à
escola de cinema do film noir, em que o preto e o branco ajudam a emprestar a trama do
romance policial, o suspense e o drama. O padrão auxilia para dar ênfase aos detalhes da cena
e a instigar o receptor, para que, a partir disso, desvende a narrativa presente por trás dos
elementos. Para compreender a influência do noir nessa fotografia, conta-se com Mascarello:
[...] do ponto de vista narrativo e estilístico, é possível afirmar (grosso modo) que as
fontes do noir na literatura policial e no Expressionismo cinematográfico alemão
contribuíram, respectivamente, com boa parte dos elementos cruciais. Entre os
elementos narrativos, cumpre destacar a complexidade das tramas e o uso do
flashback (concorrendo para desorientar o espectador), além da narração em over do
protagonista masculino. Estilisticamente, sobressaem a iluminação low-key (com
profusão de sombras), o emprego de lentes grande-angulares (deformadoras da
perspectiva) e o corte do big close-up para o plano geral em plongée (este, o
enquadramento noir por excelência). E ainda a série de motivos iconográficos como
espelhos, janelas (o quadro dentro do quadro), escadas, relógios etc. - além, é claro,
da ambientação na cidade à noite (noite americana, em geral), em ruas escuras e
desertas. (MASCARELLO, 2006, p181)
39
A partir do que explica Mascarello, em relação ao film noir, também se pode elucidar
a importância de cada objeto no contexto da mensagem. Os objetos presentes na imagem
tornam-se evidências em relação a ações tomadas pela figura feminina, que transparece seu ar
furtivo na ação de dúvida de checar a suas costas. Percebe-se que o copo de água e a xícara
presentes na mesa parecem intocados. Por sua vez, a silhueta da garrafa de vodca, desenhada
por alguém no vidro, parece ter sido feita há pouco tempo, visto ainda estar preservada apesar
da umidade intensa.
Analisando os objetos presentes na imagem tem-se uma hierarquia: em que
primeiramente chama atenção a mesa, que traz sobre si um copo de água e uma xícara com
pires que parecem intocados. Logo após nota-se a garrafa desenhada no vidro úmido que se
encontra na posição de um dos integrantes da mesa, a mesmo no qual estão posicionados a
xícara e o copo, transformando-se numa dúvida para o receptor, principalmente ao perceber o
vulto feminino que observa às suas costas. Avista-se o “Café Bar3” sobre a janela, o que pode
ser associado ao contexto dramático da situação, da dúvida gerada. O principal significante
presente é o peso emotivo no contexto da imagem.
Para que se compreenda os aspectos culturais embutidos nesse anúncio é necessário
que se mergulhe um pouco na história da cidade. A capital da Argentina foi erguida às
margens do Rio da Prata, tornando-se, por meio de transações comerciais, porta de entrada a
diversas nações. O primeiro passo para tal processo de imigração data aos primeiros anos do
século XIX, como elucida Coggiola.
A Argentina moderna, no entanto, aquela que resultou da ocupação do seu território
atual, é um produto do século XIX, em especial do processo de imigração européia,
que levou ao país milhões de trabalhadores europeus - 160.000 estrangeiros lá
aportaram entre 1861 e 1870, e o número de imigrantes chegou a 841.000 de 1881 a
1890, e a 1.764.000 de 1901 a 1910. No total, de 1857 a 1930, o deserto argentino
recebeu 6.330.000 imigrantes, o que, levando-se em conta o retorno dos
trabalhadores sazonais (ou golondrinas), deixa um saldo de 3.385.000 imigrantes. A
Argentina contava, logo no seu primeiro recenseamento em 1869, com 1.737.000
habitantes. Isso demonstra o peso da imigração na formação da Argentina moderna,
através de uma transfusão de população que foi, em termos relativos, a mais intensa
do Novo Mundo (incluindo os Estados Unidos). (COGGIOLA, 1997)
Buenos Aires também pode creditar a seu importante porto a característica de ter sua
constituição populacional intimamente ligada à cultura europeia. Visto o destaque da
navegação tinha à época como alternativa de transporte de passageiros entre os continentes,
3 São ambientes que incluem parte da atmosfera dos bares e dos cafés, em um único espaço, ainda incluindo características de confeitarias, oferecendo tortas e doces, como tradicional alfajor. São muito difundidos na cidade de Buenos Aires, onde também não é incomum que alguns desses estabelecimentos tenha um amplo horário de atendimento e, por vezes, até fiquem abertos vinte e quatro horas.
40
pode-se identificar no porto a responsabilidade pelo gentílico “porteño4”, bem como a
constituição urbana e cultural da cidade. Constituição essa, a qual Coggiola, no trecho
seguinte onde trata da povoação da cidade.
No final do século XIX e início do XX, estamos em pleno período de formação da
Argentina moderna. Nessa conjuntura combina-se desde o triunfo dos grupos
liberais com a chamada `geração de 80' até a penetração do capital estrangeiro na
formação dos laços de dependência financeira através das pautas que fixam o novo
mecanismo de relação imperialista a nível internacional. Ao longo de todo esse
processo corre o impacto de uma imigração massiva (especialmente italiana e
espanhola), o boom de uma atividade cerealista como característica nova de uma
Argentina tradicionalmente saladeirista, e a formação industrial com o aparecimento
de oficinas e indústrias novas, o que implica o surgimento de um proletariado
urbano enquanto um novo tipo de fenômeno social na sociedade rioplatense.
(PLÁ,1973 apud COGGIOLA, 1997)
Essa caraterística culminou na chegada de imigrantes italianos, franceses, ingleses e
até nórdicos, juntando-se aos povos nativos e aos colonizadores espanhóis. A principal
influência dessa convergência étnica foi a apropriação de hábitos de diferentes povos
europeus na cultura local. Algo que se pode observar a partir do trecho de um jornal francês
citado aqui por Coggiola.
Metrópole em um país rural, cidade-país, segundo Borges, fictive et pour cela
fascinante Europe australe, de acordo com recente definição do jornal francês
Libération, talvez Buenos Aires não seja una, mas várias, como pretende Alvaro
Yunque:" Buenos Aires sempre foi uma cidade múltipla, feita de retalhos de povos
transformados em subúrbios." (COGGIOLA, 1997)
Os cafés portenhos não são simples cafés, mas sim uma junção da confeitaria italiana,
da cultura dos pubs ingleses e das artes e estilo franceses. Pois é a presença de tais
especificidades do ambiente cultural o que a marca mostra conhecer e pelas quais busca
conquistar o “porteño”. O anúncio claramente observa tais características, propondo-as como
estratégias de identificação e procurando comunicar ao morador de Buenos Aires que, sim, a
marca conhece a ele, a sua história e a seu estilo de vida. Algo que fica claro a partir das
palavras de Gayol,
En el interior de los cafés es dable constatar un despliegue de objetos y de prácticas
culturales tan heterogéneos como los rostros de los asistentes. El festival de
pertenencias diversas, dinámicas y cambiantes no hace más que coincidir con las
características de la población multifacética que visitará cotidianamente esos
espacios de sociabilidad. (GAYOL, 2000, p.147)
A passagem descrita por Gayol vem a corroborar a esse ambiente heterogêneo ao qual
se configuraram os cafés de Buenos Aires. Na grande mescla cultural da cidade portenha,
retratada e simbolizada por um local de convergência entre elas como configuram-se os cafés
bares da capital argentina. O anúncio propicia por meio deste que seja talvez a maior tradução
4 É um adjetivo vinculado as cidades que possuem porto, e seu uso habitual é como gentílico, a
aquele que vem do porto, que descende deste. No caso o morador da cidade portuária.
41
da vida portenha, a mostra de outros traços característicos da cidade, como as temperaturas
baixas, a arquitetura e a emotividade. Essa última, é muito presente na cena musical do tango,
o mais característico ritmo da cultura portenha. Tal emotividade está na peça significada por
um misto de melancolia e suspense.
Pode-se inferir que o anúncio não propaga somente o produto de Absolut, mas também
a cidade Buenos Aires. Isso fica latente ao se observar na imagem fortes traços da cultura
argentina, e especificamente a portenha. Traços estes que permitem por exemplo,
compreender de que lugar se trata mesmo sem que se precise do apoio da frase que assina o
anúncio. Este forte caráter cultural intrínseco à peça, leva ao receptor não só um interesse ao
produto da marca, no caso a vodca, mas acaba por trabalhar também a serviço da cidade. A
marca não só aproxima a imagem do seu produto da praça onde ele é vendido, mas convida o
seu consumidor a vivenciar uma experiência com o produto no ambiente retratado no anúncio.
O que se pode dizer tratar-se de uma venda de experiência, porque quem conhece e viveu,
identifica-se, quem não conhece, vê-se instigado a tal.
43
A imagem do anúncio dois apresenta, em primeiro plano, um recorte de muro no qual
está aplicada a silhueta da marca. Ela aparece centralizada em um ambiente que remete a uma
exposição. Nesse recorde de muro existem diversas intervenções, dentre elas as mais notáveis
são a representação de uma forma humana completa, a representação de uma mão humana e a
inscrição “Steve”. Todas as intervenções aparentam terem sido desenhadas com tinta spray.
Em segundo plano, visualiza-se na parede à direita deste uma bandeira alemã com um
contorno de franjas douradas, a qual, até por apresentar tais franjas, remete a uma bandeira de
uso militar.
Já na parede a sua esquerda, observam-se duas placas de madeira com as inscrições
“Ausreise” e “Einreise”, que em alemão significam entrada e saída, acompanhadas de doze
carimbos distribuídos em grupos de quatro, sobre, entre e abaixo das referidas placas. Logo
após esta instalação, há uma porta que leva a um corredor. Sobre a porta há um aviso de saída
de emergência na cor verde. O ambiente possui paredes claras e piso em madeira, similar a
tacos parquet. No teto do espaço, há um trilho de lâmpadas focais, sendo que cada uma
encontra-se apontada para um dos objetos citados.
Na imagem, há uma clara referência à queda do muro de Berlim, ocorrida no fim da
década 80. O acontecimento histórico marcou a consolidação de um moroso processo de
reconciliação entre a Alemanha ocidental (capitalista) e a Alemanha oriental (socialista), as
duas parcelas germânicas divididas após o fim da Segunda Guerra Mundial. Divisão essa a
qual Schilling, aborda no seguinte trecho:
Berlim fora conquistada pelo Exército Vermelho em maio de 1945. De comum
acordo, acertado pelo tratado de Yalta e confirmado pelo de Potsdam, entre 1944-45,
não importando quem colocasse a bota ou a lagarta do tanque por primeiro na capital
do III Reich, comprometia-se a dividi-la com os demais aliados. Desta maneira,
apesar dos soviéticos tomarem antes a cidade, e também um expressivo território ao
seu redor, tiveram que ceder o lado ocidental dela para os três outros membros da
Grande Aliança, vitoriosa em 1945. Assim Berlim viu-se administrada, a partir de 8
de maio de 1945, em quatro setores: o russo, majoritário, o americano, o inglês e o
francês. Com o azedar da relação entre os vencedores, em 1948, as quatro zonas
reduziram-se a duas: a soviética e a ocidental. (SCHILLING, s/d)
Em tal contexto, Berlim tinha papel fundamental pois a cidade, definida como
pertencente à zona oriental, era novamente dividida entre a zona ocidental (capitalista) e a
oriental (socialista). Tal segregação fez com que, durante a guerra fria, a capital alemã se
tornasse o principal exemplo de uma divisão mundial, em que o ‘mundo’ ao leste do muro de
Berlim era de domínio capitalista, sob apoio dos EUA, e o situado ao oeste era de domínio
socialista, com apoio da União Soviética.
O enquadramento da imagem se dá pela orientação vertical privilegiando a
apresentação visual do fragmento do muro o qual possui mais altura que largura, dessa forma
44
vê-se mais eficiente o uso deste, considerando-se que é isso que se busca evidenciar na
imagem do anúncio. É possível ainda, percebe-se uma leve alternância de nitidez entre o
objeto central os demais que compõe o quadro fotográfico.
O plano usado na peça é um plano geral onde o muro é o objeto central, e este vê-se
em cheio no quadro fotográfico. Pode-se perceber ainda o cuidado do fotografo em evidenciar
a representação humana representada no muro, ela é a primeira intervenção que se nota na
superfície do muro, talvez possa-se considerá-lo como o ponto central, segundo o que aponta
Präkel (2013, p.36): “Esse é o ponto virtual no “centro de gravidade” óptico da área de tom”.
O que Prakël nos explica também é como o ponto pode conduzir na leitura da fotografia,
como em “A posição do ponto em uma imagem pode ter grande impacto sobre o modo como
ela é lida pelo espectador” (2013, p36). O desenho da luz leva dele direto às placas de madeira
e os carimbos dispostos ao lado esquerdo do mencionado fragmento. Dessa forma,
direcionando a leitura da imagem pelo receptor.
A composição trabalha de forma com que o objeto posicionado no centro seja o de
leitura primária e os apresentados em segundo plano os de leitura complementar a esse.
Portanto, há uma hierarquia baseada na proporção posta. É possível fazer a leitura dos objetos
significantes de maneira linear pois vemos a bandeira que denota a localidade, o muro o
momento histórico, e as placas que abrem o caminho para a mensagem conotada. Pode-se
interpretar as inscrições entrada e saída como um passaporte para uma nova Berlim, e para
uma nova Alemanha. A passagem de um para outro momento é visível pela composição dos
objetos perante ao receptor.
A iluminação in loco é toda artificial, não há a presença de luz externa natural no
espaço usado como cenário. A iluminação não natural e amarelada traz consigo uma aura
melancólica ao local. Ainda é possível notar-se que há um spot de luz que está diretamente
focado sobre a parte superior do muro, sobre a representação da figura humana, desviando a
atenção do receptor a figura e expressão da mesma.
No que tange à cor, há uma forte presença de tons quentes na foto, dado notado
principalmente pela iluminação basicamente amarela do local. A iluminação age como um
filtro de cor. Sobre o fragmento do muro nota-se que as expressões visuais nele apresentadas,
tanto desenhos como as inscrições, usam as cores da bandeira alemã, cuidadosamente disposta
ao lado.
Ao se analisar os objetos mais importantes na imagem, são em primazia o fragmento
de muro, seguidos das tábuas inscritas compostas com os carimbos e a bandeira da Alemanha
unificada, ambos dispostos aos lados do muro, respetivamente à esquerda e à direita dele.
45
Nesse fragmento de muro estão expostas uma evidente representação de figura humana além
inscrições de nomes, nessa figura humana ainda é possível que se perceba que um de seus pés
parece estar preso, existem também duas perfurações na parte superior do muro, similares a
marcas de tiros por armas de fogo.
Quanto aos aspectos culturais é importante que se conheça a história alemã e
principalmente o papel da mesma no contexto político, econômico e social mundial dos anos
70 até os 90, quando esteve em pé o muro de Berlim. Sobre o muro, sua constituição e seus
impactos na população berlinense Schilling nos coloca os seguintes fatos:
Durante 28 anos, de 1961 a 1989, a população de Berlim, ex-capital do Reich alemão,
com mais de três milhões de pessoas, padeceu uma experiência ímpar na história
moderna: viu a cidade ser dividida por um imenso muro. Situação de verdadeira
esquizofrenia geopolítica que cortou-a em duas partes, cada uma delas governada por
regimes políticos ideologicamente inimigos. Abominação provocada pela guerra fria,
a grosseira parede foi durante aqueles anos todos o símbolo da rivalidade entre Leste e
Oeste, e, também, um atestado do fracasso do socialismo real em manter-se como um
sistema atraente para a maioria da população alemã. (SCHILLING, s/d)
Na década de 50, o mundo possuía duas grandes potências econômicas, a URSS
(União Soviética) simbolizada pela poderosa e gigantesca Rússia, pelo modelo econômico
socialista, e os Estados Unidos o qual erguia a bandeira do capitalismo. Havia uma disputa no
campo das ideias e das práticas, e uma grande indústria bélica em ambos os lados. Em 1961,
Berlim materializou a divisão ideológica do mundo e as desavenças ideológicas, a cidade
dividida desde a década de 40 entre ingleses, franceses e norte-americanos, do lado ocidental
capitalista, e pela União Soviética, do lado oriental, vivia sitiada porém em unidade. Naquele
ano, com o acirramento da disputas entre os socialistas e os capitalistas, e do movimento
migratório intenso de parte dos habitantes do lado socialista para o capitalista veio a ocasionar
o levante do muro que separou fisicamente a cidade.
O objetivo era deter o constante fluxo de gente para o lado ocidental, migração que
fizera com que, entre 1949 e 1961, bem mais de 2,6 milhões de alemães orientais
escapassem para a República Federal. De certa forma, isto se explica não só pela
diferença dos regimes, como também pelo fato de ter havido uma extraordinária
recuperação econômica do lado ocidental: o Wirtschaftwunde, o milagre econômico
dos anos 50/60. (SCHILLING, s/d)
Este muro foi erguido sem que fossem respeitados prédios ou casas. Ele tinha faces
para os dois lados e um corredor central patrulhado continuamente por guardas e cães, para
que não houvesse contato entre os lados. O muro permaneceu por mais de um quarto de
século separando a cidade de Berlim entre capitalista e socialista e, com isso, famílias ficaram
divididas e incomunicáveis. Até que, em 1989, a guerra fria já era uma realidade quase
ultrapassada e a pressão popular em prol da queda do muro era grande.
46
Pode-se notar, ao fazer a leitura do anúncio, uma referência aos momentos tristes
vivenciados. A presença da figura humana, mesmo com sua forma simplória, consegue
transparecer tristeza e angústia. A sensação é acentuada pelos nomes ao seu redor que fecham
junto a esse contexto de dor e segregação ocasionado pela divisão da cidade, e o seu
significado que transcendia a ela própria. O que também pode-se aferir é uma ideia de
transição entre o momento pré e pós queda do muro de Berlim, como um divisor de águas não
só para aquela cidade bem como para o mundo. A partir de tal ocorrido, abriu-se a porta para
discussão de outros temas nos âmbitos político e social, tanto da Alemanha, quanto na própria
união soviética, que viria e se desmembrar.
O que se pode inferir quanto à questão receptor e mensagem no dado anúncio, é que
de certa forma, a marca trabalha a serviço da história, não só no que tange ao cidadão
berlinense diretamente tocado pela imagem, mas também a qualquer um que tenha
conhecimento sobre tal ocorrido e suas consequências para o mundo. O que se pode também
interpretar é que a marca transmite a mensagem de que paradigmas foram feitos para serem
quebrados, e que as barreiras, por mais intransponíveis que possam parecer, podem ser
vencidas. Essa é uma mensagem que transcende aos diretamente envolvidos, ela vai adiante.
Assim como o próprio muro de Berlim. Ele não está mais lá, mas estará eternamente no
imaginário dos berlinenses, dos alemães e da história sócio-política mundial como um marco
de um mundo rachado que se vivenciou durante duas décadas, no qual não se permitiam nem
sequer intercâmbios mínimos entre os lados.
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A imagem do anúncio três apresenta um rio onde ocorre um mercado pluvial, diversas
embarcações com diferentes produtos. A disposição destas na água dão forma à silhueta da
garrafa da marca. É importante destacar a quantidade de frutas, legumes, verduras, flores e
especiarias dispostas em vasilhas de madeira nas diversas jangadas presentes no quadro,
também o fato de a maior parte das pessoas retratadas na fotografia vestir chapéus claros e
camisas azuis.
O enquadramento é dado na posição vertical privilegiando a posição da garrafa. É
perceptível uma captura em plongê pela posição e perspectiva presente na fotografia. O
quadro aqui tem como centro a silhueta, porém toda a ação ocorre ao seu redor, e é justamente
esse fato, o do seu contorno encontrar-se cheio de informação que faz com que, visto de longe
se enxergue só a garrafa, e de forma aproximada se perceba, que ela é justamente o que não
está contido na foto. O cuidado ao enquadrar parece ter sido em torno disso, fazer aparecer
algo que não está.
O plano usado é um grande plano geral, pois é possível identificar um ambiente
complexo em torno do mercado flutuante que se apresenta como o cenário para a fotografia
do anúncio. Existem tantas ações simultâneas, tantas cores e movimentos que o que vem a nos
chama a atenção é justamente o espaço onde isso não ocorre da imagem, e ali forma-se a
silhueta da garrafa. Em meio ao mercado pluvial, repleto de jangadas e produtos
multicoloridos, surge a silhueta da garrafa de Absolut.
A composição traz a silhueta da garrafa como foco central, auxiliando essa percepção
há, além da posição dos gondoleiros dando forma à silhueta, um leve desfoque presente fora
dela. Também é possível observar que as cores mais vibrantes estão as bordas da silhueta,
ajudando a hierarquização da leitura sobre a imagem. Auxiliando na orientação do contorno
da garrafa há sobras, jangadas, e a vibração das cores dos produtos carregados nas jangadas,
tudo a serviço de abraçar a silhueta e torná-la de fácil visualização pelo olhar do leitor.
A iluminação que transparece aos olhos do receptor é a natural, facilitada pelo fato de
a foto ter sido captada em ambiente aberto e em horário de incidência solar. O sol não é
percebido de forma direta, porém de forma indireta, sim, por meio dos seus reflexos na água e
nos chapéus dos canoeiros. Existe ainda a possibilidade do uso de rebatedores, que são
segundo Medeiros (2010, p.168), “qualquer superfície branca, prata ou dourada usada para
captar a luz e rebatê-la no ponto escolhido para eliminar ou suavizar sombras indesejáveis e
reduzir o contraste na cena ou no objeto fotografado”, para que a iluminação do local recebe-
se alguma compensação em termos de luz. Outro aspecto que também chama a atenção na
49
imagem é o uso de baixa velocidade na captação fotográfica, isso faz com que algumas das
jangadas apareçam como borrões no quadro.
A cor nessa imagem tem um papel fundamental na leitura da mensagem. É possível
notar quase que um degradê de tons de azul do claro para o escuro, de baixo para cima nas
camisas dos gondoleiros, o azul age de forma a circundar a silhueta da garrafa e apoiar a
visualização dela. Para além do azul das camisas dos jangadeiros, ainda há o uso de cores
mais vibrantes nos produtos das jangadas que circundam a silhueta da garrafa.
Nessa fotografia há uma vastidão de objetos e tantos detalhes que torna praticamente
impossível abordar de forma individual cada um destes. Alguns objetos não são possíveis nem
mesmo de serem identificados, isso também devido ao fato do uso de alguns recursos como o
desfoque e a captura em baixa velocidade. Contudo, o anúncio também direciona por meio
desse artifícios para que se atente ao que não se altera por meio deles, assim direcionando a
leitura, e fortalecendo a mensagem que se quer transmitir ao receptor.
A visualização da silhueta desde sua base permite que se observe que, ao abrir o
quadro, ganha-se perspectiva e noção do contexto cênico da imagem. Porém, para manter esse
contexto e também a mensagem que a marca deseja passar, a melhor alternativa encontrada
aparentemente foi o uso dos recursos da captura em velocidade baixa e do desfoque. Isso faz
com que a imagem tenha nitidez que permita que se distinga objetos com clareza somente até
pouco mais da metade do quadro.
Para que se compreenda o anúncio, é importante conhecer alguns aspetos culturais da
Tailândia bem como da própria cidade. Bangcoc5 é capital da Tailândia e uma das dez
maiores cidades do continente asiático, com mais de 8 milhões de habitantes e uma região
metropolitana de quase 15 milhões de pessoas. Além de ser a capital do país também é a
cidade de maior importância histórica do mesmo. A cidade é banhada pelo rio Chao Phraya,
que tem sua foz no golfo tailandês. E carrega, em suas águas, grande importância histórica na
constituição da cidade e do país.
Em Bangcoc, às margens do Chao Phraya, estão localizados vários museus, templos e
edificações históricas. A cidade foi se desenvolvendo ao redor do rio. Inicialmente, no século
XV, era basicamente constituída por fortes, entre eles o forte Amsterdã, controlado pelos
holandeses e usado por eles com intuito mercantil. Além disso, a cidade foi tida como ponto
estratégico para os próprios holandeses, para os ingleses, os portugueses, os franceses, devido
a sua localização privilegiada em relação a colônias sujeitas a essas coroas. Houve também
5 A grafia do nome da capital da Tailândia é aceita de diversas formas: Banguecoque, Bangcoc,
Bancoc e Bangkok.
50
uma tentativa em anexar territórios tailandeses a elas por parte dos mesmos, porém sem
sucesso. Além disso também haviam interesses por se tratar de um ponto entre as Índias e a
China, lugares de grande interesse por parte dos navegadores europeus para a busca de
especiarias e temperos.
A importância das águas na vida da capital tailandesa é marcante desde os primórdios,
porém no século 18 a cidade foi alterada com a criação de uma série de canais pluviais
chamados de Khlongs, para facilitar o transporte. Isso originou também os mercados
flutuantes e deu a cidade o apelido de “Veneza do Oriente” devido às semelhanças com a
famosa cidade italiana. Recentemente grande parte destes canais foram tapados para que
fossem transformados em alternativas para o transporte rodoviário, devido ao crescimento de
frota. Porém, alguns persistem, prova disso são os tradicionais mercados flutuantes, como o
Taling Chan e o Damnoen Saduak ambos aos arredores da capital tailandesa, como se-pode
compreender a partir do que explicam Trigueiro e Nery:
O mercado flutuante faz parte do dia-a-dia da Tailândia. Um dos locais mais
visitados é o Mercado Flutuante Damnoen Saduak, na província de Ratchaburi,
localizado cerca de 100 km de Bangkok. Este mercado é um labirinto de canais onde
vendedores ambulantes comercializam frutas, vegetais, carne, legumes e até alguns
utensílios domésticos em pequenos barcos. É tudo muito simples e colorido. Todo
dia às sete da manhã, os barcos começam a chegar. É uma diversidade
extraordinária. (TRIGUEIRO, 2011)
Existem dezenas de pequenos barcos de madeira, a maioria movidos a remo por
mulheres que vão até Damnoen Saduak para vender de tudo: Frutas, comida, peixes,
plantas, roupas, etc. Ao redor do mercado flutuante, a feira continua e não é um local
apenas para turistas. Os tailandeses compram aí e o turista é uma conseqüência.
(NERY, 2011)
Os autores mostram que o ambiente dos mercados flutuantes tailandeses, para os
nativos, é corriqueiro, não há nada de fora da rotina para o morador local ir a um mercado
destes, é como ir-se a uma feira. Não há uma montagem para que se privilegie o turista. Isso
faz parte do cotidiano do país e da cidade de Bangcoc.
É nesse mercado - que atrai gente do mundo todo - que o povo tailandês faz suas
compras. É um negócio que movimenta muito dinheiro. Quem trabalha nesse
mercado, vive às margens do rio. Em casas modestas, tipo palafitas. Enquanto as
mulheres vão para o mercado vender, os homens ficam em casa. É que, geralmente,
eles trabalham cedo, no campo, produzindo o que mais tarde elas vão negociar.
(TRIGUEIRO, 2011)
Podemos aferir na relação da mensagem e receptor a intenção de retratar um traço
muito característico e peculiar da cultura local tailandesa e da cidade de Bangcoc. Traço esse
que a visão ocidental é tão diferente que se faz capaz de provocar o receptor a perguntar-se o
porquê disso e como funciona. A linguagem fotográfica desse anúncio perante ao leitor
ocidental age quase que de forma jornalística, pois lhe apresenta o fato, o que pode fazer com
51
que ele se interesse e procure confirmar a veracidade de tal. O que se pode também pensar é
que a marca Absolut traz aqui, o novo, e gera interesse sobre essa novidade e o que há de
diferente nesse novo. Fazendo um contraponto a própria marca, no contexto asiático, onde a
imagem é o consolidado, onde o conteúdo diferente é o uso publicitário de um traço
corriqueiro ao receptor, portanto a inovação e o choque pode estar tanto do lado do receptor
ocidental quando do oriental, há uma informação relevante, tanto para um, quanto para o
outro.
53
A imagem do anúncio quatro apresenta como cenário aberto uma movimentada rua. Logo em
primeiro plano já é possível perceber, em meio a um congestionamento, um agrupamento de
trinta e dois táxis formando a silhueta da garrafa. Também é notável a grande quantidade de
pedestres na imagem. Devido ao ângulo da fotografia, não é possível ver o céu, porém é
possível, perceber a presença de luz solar, devido ao reflexo dos carros em trânsito.
O enquadramento é na vertical, evidenciando a formação dos táxis que resulta na
silhueta da garrafa de Absolut. Também é notável que os táxis estão em amarelo, e são os
únicos elementos dessa cor presentes na imagem, e disso decorre essa sensação de isolamento.
A imagem usa um grande plano geral, captado em plongê, obtendo dessa forma uma
vista aérea do contexto caótico da cidade de Nova Iorque. A captura em plongê traz a
fotografia uma perspectiva e profundidade fazendo com que a garrafa salte aos olhos do
receptor. Os prédios e a calçada formam dois triângulos devido à perspectiva aplicada à
fotografia. Sobre isso, Präkel apresenta um conceito: “... as duas faixas paralelas ao longo de
uma estrada não se encontram no horizonte distante, mas, para criar a ideia de profundidade
em uma imagem é exatamente assim que nós as desenhamos” (2013, p.24). Isso faz com que
surja uma moldura em torno da silhueta da garrafa. Pois, se não houvesse a aplicação da
perspectiva, não se tería a impressão da forma como é possível pelo uso do plongê, isso por
que se cria um estreitamento na parte do gargalo da garrafa, tornando-a mais verossímel
perante o receptor.
Na composição da imagem, chama a atenção do receptor logo a silhueta da garrafa, em
que os táxis amarelos, característicos da cidade norte-americana, são os primeiros agentes da
ligação entre a cidade e a marca. Mas o restante da imagem tem o papel de consolidar ao
receptor que a fotografia representa a cidade de Nova Iorque. Dessa forma, é possível que se
visualize alguns objetos como pontos de ancoragem em relação à imagem que a indústria,
principalmente a do cinema, vende como imagem da cidade americana, conhecida como a
“Big Apple6”. Dessa forma, apresentam-se os prédios com arquitetura dos anos vinte,
janelões, colunas largas e acabamentos em pedras nobres. Assim como também as calçadas
largas e o movimento desenfreado, tanto de pedestres como de carros. A imagem da cidade é
corriqueiramente ligada ao caos urbano, sendo quase como um sinônimo desse.
6 Grande Maçã (em inglês: big apple) é um apelido da cidade americana de Nova Iorque que se popularizou na década de 1970. Não se sabe ao certo sua origem, mas acredita-se que a expressão data de 1921, quando foi usada numa coluna de corrida de cavalos em um jornal da cidade, o New York Morning Telegraph. A coluna foi escrita por John J. Fitzgerald, que creditou posteriormente, em 18 de fevereiro de 1924, a trabalhadores afro-americanos que trabalhavam em um estábulo em pista de corrida de cavalos, em New Orleans.
54
A iluminação natural está presente, pois apesar de não se visualizar o céu, os reflexos
nos carros deixa evidente a presença do sol. O desenho da luz na imagem faz com que fique
em aberto o possível uso de um rebatedor para o momento da captura da imagem, visto que
ela parece captada de uma altura além do solo e numa zona onde parece cercada de
edificações o que dificultaria a captura sem pelo menos um rebatedor para que se reverta a
luz. Com isso, a luz solar se distribui por toda a superfície da rua principal e da calçada ao
longo de toda a fotografia, enquanto se percebe que as ruas auxiliares aparentam estar
totalmente desassistidas de luz solar.
A cor que prevalece na imagem é o amarelo, isso devido ao uso do contraste que
favorece o amarelo. O contrate é bastante explorado aqui como um artificio para isolar o
grupo de táxis que da forma a silhueta da garrafa dos demais carros que transitam na via.
Estes carros que compõem o entorno da silhueta apresentam as cores da bandeira
estadounidense. Percebe-se que não há nenhum carro com qualquer tom que possa fazê-lo
brigar com os taxis. Além disso e também auxiliando a observação e identificação do desenho
da garrafa, é notável que não há espaços de asfalto livre nos lados da formação, sempre nesses
lugares estão carros estacionados, e esses são todos escuros. Porém, enquanto isso, na calçada
há espaços, o que cria um recorte claro, escuro, claro, onde o claro salta aos olhos do receptor.
Ao fazer a leitura semiológica dos objetos presentes na imagem é possível identificar
os traços utilizados para possibilitar a identificação da fotografia à cidade de Nova Iorque.
Primeiro, a partir dos táxis amarelos. Eles estão colocados em um ambiente de trânsito caótico
e em uma avenida com sete faixas. Ao buscar-se características mais fortes que possam
corroborar a estas, há de se ressaltar o ambiente fora do asfalto. Nota-se assim as calçadas
largas, os modelos dos semáforos e a arquitetura dos edifícios que rodeiam o espaço. Ainda é
possível que se perceba um prédio com muitas bandeiras, algo que remete diretamente a
alguma importância, mesmo que se trate de um hotel, não é um simples, mas algum de
relevância. Levando em conta todo esse contexto e todas as referências dos EUA e da cidade
que são difundidas pela mídia, e pela indústria cultural, emergem a certeza de tratar-se ali da
metrópole estadounidense.
A imagem tem um vínculo aos anos noventa, época muito forte da economia
americana e talvez ápice do “american way of life”, o estilo de vida baseado no sonho
americano. Para que se possa compreender melhor importância da cidade de Nova Iorque no
contexto do estilo de vida estadounidense, é preciso retornar à época da grande crise chamada
também de “A grande depressão”. Sobre o conceito do estilo de vida americano, Dieb explica:
55
O american way of life é um conceito criado na década de 1920 para definir o modo
de vida da sociedade e da política nos EUA amparado pela prosperidade econômica
dos Estados Unidos antes da crise de 1929. Houve uma melhora do nível de vida de
parte da população, alcançada graças à evolução da técnica, à organização do trabalho,
ao desenvolvimento das indústrias química, mecânica e elétrica, ao consumismo
acelerado e ao forte crescimento industrial, estimulado pelo protecionismo. Dizia-se
que o nível de felicidade de uma pessoa podia ser medido pela quantidade de bens que
ela conseguisse adquirir. Os filmes de Hollywood também ajudaram a difundir o
american way of life pelo mundo nas décadas seguintes. (DIEB, 2015, p. 51)
Os anos vinte nos Estados Unidos foram anos de muita prosperidade, era então o
maior produtor de trigo, de aço e de automóveis do planeta o que lhe fazia ostentar o fato de
ser a maior economia do mundo. Todos invejavam o estilo de vida americano, onde o
consumo era a base de tudo. Fato é que todo esse consumo tinha uma base, a importação, e ter
um comprador externo para escoar o produto, o mercado interno entrou em colapso a partir do
momento em que não havia mais demanda interna para os produtos e também não havia mais
para quem escoar este excedente.
A pessoas nos EUA investiram em massa na década de vinte, incentivadas pela
prosperidade econômica do país. O consumismo impulsionava as ações na bolsa de valores
que por sua vez geravam dividendos aos investidores. Porém em 1929 houve uma diminuição
do consumo, as pessoas não estavam lucrando, os produtos começaram a encalhar nas
prateleiras e o preços das ações a cair. Todos os que possuíam ações começaram a querer se
desfazer destas, porém não havia compradores para estas ações, havia oferta mas não procura.
Em 24 de outubro de 1929, a bolsa de Nova Iorque registrou o que seria a maior queda da
história até então.
A quebra resultou em demissões em massa, calotes, falências, milionários viram
fortunas desaparecerem em questão de horas. Isso abalou muito o estilo de vida americano
que até então era objeto de desejo do mundo, além de provocar uma onda mundial de quebras.
Nova Iorque foi cenário disso e também da retomada, quando a indústria bélica recolocou o
país na rota da prosperidade econômica durante a segunda guerra. Retomada essa que
Pontarolo deixa clara:
Após o desfecho da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que culminou com a
bomba atômica e a destruição das cidades japonesas de Hiroshima e Magasaki
(1945), os Estados Unidos assumiram de vez a dianteira na economia capitalista. De
acordo com o historiador Eric Hobsbawn, o pós-guerra marcaria o predomínio do
modelo político-liberal americano, levando ao grande sucesso econômico dos países
centrais do capitalismo no período de 1953-73. A chamada “Era de Ouro”
reconstruiu e reformulou o capitalismo através do avanço da globalização e da
internalização da economia. (PONTAROLO, 2009, p.135)
EUA voltou a ser o símbolo do capitalismo após o término da segunda guerra, durante
a guerra fria. Nos dias atuais, recolocou-se como uma das maiores marcas do capitalismo e
56
um dos mais poderosos centros financeiros do planeta, embora diferentemente da década de
vinte, divida seu status com outras cidades da Europa e principalmente da Ásia o papel de
principal metrópole do capitalismo.
O se pode aferir quanto à mensagem e à leitura da mesma pelo receptor é que há uma
megalomania intrínseca ao cenário nova-iorquino, tudo parece grande, embora ao mesmo
tempo tudo pareça minúsculo. O anúncio trabalha com isso fazendo a representação de um
objeto originalmente pequeno, em uma dimensão gigante. Ao mesmo tempo em que esse
objeto é formado por táxis, que por sua vez são objetos gigantes perante ao objeto por elas
replicado em tamanho expandido, a garrafa da Absolut Vodka. Essa confusão que o anúncio
gera no receptor nos parece de caráter proposital, afim de indaga-lo, o quê, realmente é
grande, o que é pequeno, e ao mesmo tempo lhe respondendo que essas definições dependem
do ângulo abordado, onde nem tudo que parece é.
57
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho teve como tema os anúncios da série Cities, pertencentes à
campanha Absolut Perfection. Propôs-se elucidar a produção de sentidos a partir dos
elementos culturais presentes nas fotografias e as leituras que podem ser realizadas a partir
destes, segundo a semiologia segundo Roland Barthes. O autor nos auxilia a compreensão do
texto imagético a partir dos significantes presentes na fotografia, utilizando a teoria
semiológica para atribuir possíveis significados a estes. Para realizar essas leituras e criar-se
tais hipóteses de significados, trabalhou-se com o que se apresenta denotado ou conotado.
Optou-se por quatro anúncios da série, os quais julgou-se merecer um olhar analítico.
Nas fotografias analisadas, foi possível perceber uma grande diversidade, pois mesmo
pertencendo a uma mesma série, o único traço gráfico que as une é a presença da silhueta da
garrafa. Porém indo além dos elementos gráficos e já se iniciando no texto imagético, pode-se
incluir nessa unidade de série o fator cultural. Esse não só está presente em todas as peças,
como é também o principal agente no processo da significação. A cultura se observa presente
em todos e de forma heterogênea, vezes por meio do ambiente, no cenário retratado, vezes
pela referência estilística usada na narrativa, outras pelos próprios costumes locais
apresentados. Não há a obrigatoriedade de se expressar o caráter cultural apenas de uma
forma, por vezes há a convergência de dois ou mais destes traços em um só anúncio,
conversando entre si, afim de melhor retratar a mensagem final e possibilitar a identificação
mais rápida do receptor.
Quanto aos aspectos técnicos, todos os anúncios apresentam enquadramento vertical.
Isso tem uma clara função que é o formato de mídia usado na veiculação dos anúncios, no
caso a mídia impressa (revistas). Seguindo nos aspectos técnicos, observa-se a distinção entre
as iluminações usadas nos anúncios, assim como as cores, visto que passamos desde anúncios
em preto e branco a complexas composições de cores. Nesse ponto, é necessário ressaltar as
grandes diferenças entre eles, por exemplo os anúncios de Buenos Aires e o de Bangcoc. O
primeiro faz uso do preto e do branco e constrói a narrativa atrelando diretamente a cor à
mensagem fotográfica, e o segundo também tem na cor uma das principais significantes,
porém trabalha com uma multiplicidade de cores. Portanto, enquadramento, cor e iluminação,
mesmo que não agindo de forma similar em todos anúncios, apresentam em todos um papel
de suma importância na leitura da mensagem imagética.
58
Quanto ao contexto cultural, visto que cada imagem tem como foco a representação de
um lugar, e que se optou por uma pluralidade cultural, escolhendo para a análise anúncios de
diferentes continentes, as distinções são latentes. O que fica claro ao realizar a análise é que
há sempre uma busca em aproximar o receptor à mensagem por meio de referências sólidas de
cada localidade. Portanto, ordenadamente, tem-se motes facilmente identificados em cada
anúncio, respectivamente os cafés, o muro, o mercado flutuante e os táxis. Por esses, é
possível identificar mais facilmente, pois estes direcionam aos objetos cujas conotações
possam levar a uma continuidade da mensagem.
Quando nos aprofundamos nas conotações destes objetos somos levamos até um
conceito mais interno, isso está presente em todas as peças. Em todas o primeiro mergulho
automaticamente nos leva a algo mais profundo. É com certeza a prova do quão estudada foi
cada cidade para que se criasse em cada anúncio uma capsula concentrada do espirito de cada
cidade. Com isso, percebeu-se que cada anúncio leva em si uma carga cultural muito maior
que a própria imagem, não que esta tome um caráter efêmero, mas que transcenda o seu
caráter publicitário e a transforme em um objeto de cultura, talvez não ém nível artístico,
porém também com certeza não em nível banal. As peças da série cities conseguem mesmo
sendo fotografias publicitárias, carregarem consigo um quê de documental, devido à carga
cultural que conseguem concentrar em uma página de revista.
Para o pesquisador, a campanha de Cities trata a fotografia da melhor forma possível.
Só lhe fez crescer ainda mais seu interesse pelo assunto bem como pela publicidade da marca.
Considera essa campanha e principalmente essa série uma das mais geniais produções de
fotografia para a publicidade. E enxerga como fascinante o fato de um anúncio vender
determinado produto sem em algum momento mostra-lo, trabalhando apenas com o formato
consolidado de sua embalagem.
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