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1 UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Rodrigo Cesar Portela A RADIOLOGIA ODONTOLÓGICA E A IMAGINOLOGIA COMO BASE NA GERAÇÃO DE PROVAS EM AÇÕES JURÍDICAS CURITIBA 2011

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Rodrigo Cesar Portela

A RADIOLOGIA ODONTOLÓGICA E A IMAGINOLOGIA COMO

BASE NA GERAÇÃO DE PROVAS EM AÇÕES JURÍDICAS

CURITIBA

2011

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A RADIOLOGIA ODONTOLÓGICA E A IMAGINOLOGIA COMO

BASE NA GERAÇÃO DE PROVAS EM AÇÕES JURÍDICAS

CURITIBA

2011

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Rodrigo Cesar Portela

A RADIOLOGIA ODONTOLÓGICA E A IMAGINOLOGIA COMO

BASE NA GERAÇÃO DE PROVAS EM AÇÕES JURÍDICAS

Monografia de Conclusão de Curso, apresentado ao Curso de Especialização em Radiologia Odontológica e Imaginologia da Faculdade de Odontologia da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para a obtenção do título de Especialista em Radiologia Odontológica e Imaginologia, sob orientação MSc. Profª Dra. Ana Claudia Galvão de Aguiar Koubik.

CURITIBA

2011

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TERMO DE APROVAÇÃO

Rodrigo Cesar Portela

A RADIOLOGIA ODONTOLÓGICA E A IMAGINOLOGIA COMO

BASE NA GERAÇÃO DE PROVAS EM AÇÕES JURIDICAS

Esta monografia foi julgada e aprovada para obtenção do título de Especialista em Radiologia Odontológica e Imaginologia no Curso Especialização em Radiologia Odontológica e imaginologia da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba,17 de Junho de 2011.

________________________________________________

Curso de Especialização em Radiologia Odontológica e Imaginologia

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientador: Profª. MSc.Dra. Ana Claudia Galvão de Aguiar Koubik

PROPPE - Universidade Tuiuti do Paraná)

Profª. Dra.Lígia Aracema Borsato

PROPPE - Universidade Tuiuti do Paraná)

Profª. Dra. Tatiana Maria Folador Mattioli

PROPPE - Universidade Tuiuti do Paraná)

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Ao meu Pai;

Horacelino Barcelos Portela (in Memorian),

verdadeiramente o maior mestre que tive,orientador na

formação do meu caráter,me mantendo sempre no caminho

da retidão, garantindo meu aprendizado dentro dos

valores éticos e morais.

À mnha Mãe:

Regina do Rocio Portela, que sempre acreditou em mim,

dedicando seu tempo,sempre presente,como minha primeira

professora,orientadora dedicada nos primeiros passos de

meus conhecimentos.

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AGRADECIMENTOS

À Universidade Tuiuti do Paraná onde encontrei um ambiente acolhedor e com

ótima infraestrutura.

Á minha orientadora, Dra. Ana Claudia Galvão de Aguiar Koubik, pelo empenho,

paciência e credibilidade, obrigado por tudo.

À todos os professores, titulares e convidados, que com muita presteza contribuíram

para o nosso crescimento e com os quais pude aprimorar meus conhecimentos.

Á todos os funcionários desta Instituição de Ensino, mesmo que por muitas vezes

anônimos, que contribuíram direta e indiretamente com a nossa formação.

Aos Colegas de Curso, com os quais pude trocar várias experiências, pelas agradáveis lembranças que serão sempre guardadas no coração.

Ao Dr. Enzio Rovigatti, que além de professor, tornou-se um grande amigo e por sempre estender o seu braço nas horas de dificuldade, a minha imensa gratidão.

Ao Dr. Matheos Chomatas, pela oportunidade oferecida, pela confiança, que mesmo a distancia me incentivou, pelas conversas que muito me ajudaram neste trabalho, o meu muito obrigado.

À minha família, em especial a minha mãe Regina, irmã Ariane, ao cunhado Edson e sobrinho Heitor que sempre estiveram presentes ajudando e torcendo para a concretização deste curso, e por aceitar a minha ausência quando necessário.

À minha amada esposa Meiri, por ter sentido junto comigo, todas as angústias e felicidades, acompanhando cada passo de perto. Pelo amor, amizade e apoio depositados, além da companhia por todos esses anos, melhor convívio não poderia encontrar.

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“O ser humano vivência a si mesmo, seus pensamentos como algo

separado do resto do universo - numa espécie de ilusão de ótica de

sua consciência. E essa ilusão é uma espécie de prisão que nos

restringe a nossos desejos pessoais, conceitos e ao afeto por

pessoas mais próximas. Nossa principal tarefa é a de nos livrarmos

dessa prisão, ampliando o nosso círculo de compaixão, para que

ele abranja todos os seres vivos e toda a natureza em sua beleza.

Ninguém conseguirá alcançar completamente esse objetivo, mas

lutar pela sua realização já é por si só parte de nossa liberação e o

alicerce de nossa segurança interior.”

(Albert Einstein)

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XII

RESUMO

O presente trabalho trata de uma revisão da literatura que tem como finalidade vir de encontro às constantes mudanças no padrão legal, no que se refere às práticas odontológicas, relacionando o desenvolvimento histórico da odontologia e a formatação das diferentes condutas profissionais, norteadas pelos preceitos éticos e morais, com enfoque nos Códigos Civil, Penal, de Defesa do Consumidor e de Ética Odontologico, interpondo a imaginologia, parte integrante, obrigatória, da documentação odontológica, como fonte principal para geração de provas cabíveis e consistentes em possíveis ações cíveis, quando da solicitação da reparação e indenização de supostos danos ocasionados, presumidamente, por imperícia, imprudência ou negligência. Cabe ainda, com base na revisão literária mostrar a existência da real e concreta necessidade de uma correta elaboração do prontuário dos pacientes para a defesa dos Cirurgiões-Dentista em reclamatórias cíveis, pois conforme verificado, neste estudo, pelas jurisprudências, muitos profissionais acabam prejudicados pela falta da correta elaboração de documentos. Palavras- chave: Documentação Odontológica, Odontologia Legal, Radiologia Legal.

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XIII

ABSTRACT

This work is a literature review that aims to come against the constant changes in the legal standard in relation to dental practices, relating the historical development of dentistry and formatting the different professional conduct, guided by ethical and moral precepts , Focusing on Codes Civil, Criminal, Consumer Protection and Dental Ethics, filing an imaging, an integral, obligatory to the dental records as the main source for generating consistent and applicable evidence in possible civil suits, when the request reparation and compensation for alleged damages, presumably due to inexperience, recklessness or negligence. It is also based on the literature review show the existence of real and concrete need for a proper preparation of patients' medical records to the defense of Dental Surgeons grievance in civil cases, because as seen in this study by jurisprudence, many professionals gets hurt by the lack the correct preparation of documents. Key-words: Documentation Dentistry, Forensic Dentistry, Forensic Radiology.

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SUMÁRIO

RESUMO............................................................................................................... XII ABSTRACT........................................................................................................... XIII 1. INTRODUÇÃO.................................................................................................. 11 1.1. OBJETIVOS................................................................................................... 13 1.1.1. Objetivo Geral............................................................................................. 13 1.1.2. Objetivos Específicos................................................................................. 13 2. REVISÃO DA LITERATURA............................................................................. 14 2.1. RELAÇÃO HISTÓRICA.................................................................................. 14 2.2. PRINCÍPIOS BIOÉTICOS............................................................................... 18 2.3. ASPECTOS JURÍDICOS................................................................................ 23 2.4. FUNDAMENTAÇÃODO DIREITO.................................................................. 23 2.4.1. Direito Civil e Direito Penal ......................................................................... 23 2.4.2. Avaliação de Atividade Meio – Atividade Fim ............................................. 33 2.4.3. Códigos de Ética Odontológico e de Defesa do Consumidor...................... 34 2.4.4. Geração de Provas ..................................................................................... 37 2.5. DOCUMENTAÇÃO DO PACIENTE................................................................ 38 2.5.1. Documentação de Prontuário ..................................................................... 39 2.5.1.1. Anamnese ................................................................................................ 39 2.5.1.2. Ficha Clínica ............................................................................................ 40 2.5.1.3. Exame Clínico / Odontograma ................................................................. 40 2.5.1.4. Orientações aos Pacientes ...................................................................... 41 2.5.1.5. Plano de Tratamento ............................................................................... 41 2.5.1.6. Prescrição de Medicamentos – Receitas ................................................ 42 2.5.1.7. Atestados Odontológicos ......................................................................... 42 2.5.1.8. Aviso de Abandono de Tratamento ......................................................... 42 2.5.1.9. Contrato de Prestação de Serviços ......................................................... 43 2.5.2. Exames Laboratoriais.................................................................................. 45 2.5.2.1. Radiografias, Fotos e Modelos ................................................................ 45 2.5.2.2. Documentação Digital .............................................................................. 52 2.6. DIREITO A DOCUMENTAÇÃO ODONTOLÓGICA........................................ 58 2.7. JURISPRUDÊNCIA........................................................................................ 63 2.7.1. Ação de Apelação Civil nº 439.360-4/3 SP ................................................. 64 2.7.2. Ação de Apelação Civil nº 240.541.4/4 SP ................................................. 65 2.7.3. Ação de Apelação Civil nº 2008.013496-5 SC............................................ 67 2.7.4. Ação de Apelação Civil nº 2004.064655-3 SC ........................................... 68 2.7.5. Ação de Apelação Civil nº 2006.044097-2 SC ........................................... 70 2.7.6. Recurso Inominado nº 71002274934 RS ................................................... 72 2.7.7. Ação de Apelação Civil nº 70027281856 RS .............................................. 74 3. DISCUSSÃO...................................................................................................... 76 4. CONCLUSÃO.................................................................................................... 80 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................... 81

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1. INTRODUÇÃO

Com o estudo da história da odontologia podemos observar uma relação

direta entre o direito (aspecto legal) e o Cirurgião Dentista, com grande ênfase à

limitação profissional, durante o desenvolvimento de um processo antagônico ao

crescimento tecnológico (CUNHA, 1952).

O aspecto legal acaba por ir em caminho avesso ao ideal da odontologia,

desencadeando a representatividade da atividade fim, objeto de pleno resultado,

estando evidente, já por caráter histórico, ser a odontologia uma prática voltada à

saúde, sendo relacionada à atividade meio, orientando ao profissional a completa e

correta aplicação de técnicas que visem à melhoria da saúde, que segundo a

Organização Mundial da Saúde (OMS) é descrita como “o estado de completo bem-

estar físico, mental e social”, não simplesmente a ausência de doença do paciente,

devendo, desta forma, ao profissional Cirurgião-Dentista a busca da compreensão

do paciente como um todo, não devendo, porém, oferecer a cura como completo

resultado (SOUZA, 2006; SOUZA, 2006; MANUAL, 2002).

A visualização do processo de ligação do direito jurídico pode ser evidenciado

pelo acompanhamento histórico da odontologia desde tempos remotos até o

presente, dando-nos, de certa forma, uma lógica explicação do motivo de um relativo

distanciamento da ciência médica, de uma relação profissional paciente mais

humana, com a aproximação de uma atividade produtiva, estritamente mercantilista,

estando, por muitas vezes, o Cirurgião-Dentista, ligado a remunerações ínfimas, em

decorrência de uma concorrência aviltante e/ou submetendo-se a tabelas

desonrosas ofertadas por planos de saúde, em serviços públicos ou privados, fatos

tais que acabam por levar a massificação no atendimento, descuido com as normas

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e preceitos éticos fundamentais da profissão e consequente redução na qualidade

de trabalho (CUNHA, 1952; SOUZA, 2006).

Os princípios, inicialmente citados, da relação direta entre a prática médica e

a odontológica, podem, em uma visão ampla ser considerados como forjadores da

odontologia moderna e das consequentes ações dos cirurgiões-dentistas no

presente. Entretanto quando se observa a profissão com uma visão global, percebe-

se que, mesmo tendo, a odontologia partindo de uma raiz comum, esta torna-se

diferenciada em diversas partes do mundo, com o reflexo direto nas atitudes dos

Cirurgiões-Dentista, o que cabe uma análise da diferenciação histórica nos

caminhos da profissão (CARMELO, 2003; GARBIN, 2002; GARBIN, 2006).

Este trabalho é a pesquisa da correta elaboração do prontuário e toda a

documentação clínica, confrontando com o aspecto histórico da Odontologia e a sua

utilização como base na geração de provas em litígios contra Cirurgiões-Dentista,

avaliando a legislação encontrada nos Códigos de Ética Odontológica, de Defesa do

Consumidor, Civil e Penal Brasileiros.

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1.1. OBJETIVOS

1.1.1. Objetivo Geral:

Mostrar de forma clara e objetiva por meio de revisão literária a importância

da correta elaboração do prontuário odontológico e o uso da radiologia e

imaginologia para a defesa do Odontólogo em ações judiciais.

1.1.2. Objetivos Específicos:

Indicar a importância da documentação odontológica.

Elucidar o uso da legislação vigente.

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2. REVISÃO DA LITERATURA

2.1. RELAÇÃO HISTÓRICA

Em uma caminhada pela história da odontologia podemos observar que esta

tem indícios de presença desde a pré-história, com a evidenciação de patologias

orais em ossadas encontradas em escavações, apresentando-se intimamente ligada

a medicina, quando da evidenciação da necessidade de cura de tais patologias,

praticada inicialmente por curandeiros, uma vez que acreditava-se na relação direta

das doenças e a presença de espíritos maus, seguindo a uma formatação de ofício,

praticado por profissionais ferreiros e barbeiros, aonde a excelência do atendimento

era dado tão somente por amenizar a dor, quase sempre, e porque não dizer,

sempre, causando ainda mais dor (LERMON, 1974).

No Brasil fica evidente esta separação entre a área médica e a prática

odontológica, sendo inicialmente, no século XVI, esta, exercida pelos “Sangradores

e barbeiros”, função desprezada pelos “Cirurgiões Médicos”, por acreditarem, ser

uma categoria de menor importância e que estariam sujeitos a perda de suas

habilidades por a praticarem. Os “sangradores e barbeiros” desenvolviam suas

práticas sem adequados instrumentos, com nenhuma higiene, estando limitados

somente a características como força, rapidez e impiedade, não necessitando para

tanto nenhuma instrução, sendo realizados, os procedimentos, por pessoas

consideradas de baixo coeficiente de inteligência (CARMELO, 2003).

Por volta de 1600 foi criada a licença para “Cirurgião Mor”, concedida a

Cirurgiões e Barbeiros, por determinação Régia, para aqueles que se encontrassem

na função por mais de dois anos, sendo fiscalizada a existência ou não da licença de

“tirar dentes”, punindo com multa os que não a possuíssem (CARMELO, 2003).

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A aplicação de técnicas mais aprimoradas e aparelhos menos rudimentares,

descritos inicialmente em publicações como a de Pierre Fauchar , em 1728, “Le

Cirurgion Dentiste au Traité dês Dentes” (CUNHA, 1952), tiveram seu início após

1808, com a criação da Escola de Cirurgia, por D. João VI, devido à grande

quantidade de relatos de imperícia contra os “Tira Dentes”, por muito decorrentes da

extração de dentes, em perfeito estado, contíguos aos dentes ruins, os quais

deveriam realmente ser extraídos.

Com o desenvolvimento de novas técnicas, o aperfeiçoamento daquelas já

existentes, bem como a incorporação de materiais e equipamentos, como o uso do

clorofórmio para anestesia, em 1849, com medidas aprimoradas de higiene, com a

criação da “Junta de Higiene Pública”, em 1850, até o decreto nº 8024-12/03 de

1881, que estipulava a regulamentação de exames para a função de Dentistas,

muitas mudanças ocorrem quanto à interpelação na qualidade dos serviços

ofertados pelos profissionais Dentistas (LERMON, 1974).

Afirmações como as acima citadas, denotam que pela falta de técnicas

adequadas, não somente no Brasil, os danos ocasionados aos usuários dos serviços

odontológicos apresentavam-se com grande evidência, sendo por muitas vezes,

orientadores para solicitações de punição aos seus praticantes; aliás, tais pedidos

podem ser citados em tempos mais remotos da história, como descrito no Código de

Hamurabi:

“Artigo 200º - Se alguém parte os dentes de um outro, de igual condição,

deverá ter partidos os seus dentes.” “Artigo 201º - Se ele partiu os dentes de um liberto deverá pagar um terço de mina.”

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Com representação também da estipulação de valores/preços aos

procedimentos, já caracterizando uma relação comercial da profissão, como

notamos, também já existir a preocupação com a punição e a reparação dos danos

causados pelo “profissional” (LERMON, 1974; CÓDIGO de Hamurabi).

Inicialmente as punições determinadas aos práticos, causadores de danos

físicos estavam relacionadas a se infringir ao causador do ato deletério as mesmas

dores suportadas pelo(s) “cliente(s)”, na sua maioria barbáries coletivas, podendo ou

não estar associada à pena pecuniária, conforme relato acima (LERMON, 1974).

Com o passar do tempo verificou-se que a aplicação do “Olho por olho, dente

por dente”, ato de vingança, como a forma mais efetiva de reparação do dano,

inexistindo a cogitação de indenização do agredido, observa-se que esta forma de

punição acabava por tornar-se mais danosa que o original, ao acarretar problemas

de grande proporção social e familiar, pois as mutilações ocorridas para reparação

da agressão, criavam dois mutilados com a necessidade de suporte familiar e

conseguinte redução da mão de obra, sobrando à sociedade a responsabilidade do

sustento de ambas as partes. Esta observação deu início ao processo de

legalização (Criação de Leis), concretizado posteriormente, com caráter punitivo,

baseado no ressarcimento por meio de penas pecuniárias ou restritivas de liberdade

(LERMON, 1974).

Entretanto, a grande mudança na área de saúde, e consecutivamente, na

odontologia, veio em decorrência da evolução tecnológica ocorrida no início e meio

do século XX, originária das grandes guerras, com aprimoramento das técnicas de

diagnóstico e tratamento. O desenvolvimento científico e tecnológico, acabou por

tornar a odontologia como referida profissão, com vistas à reparação e manutenção

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da saúde do indivíduo, com máxima redução do sofrimento, baseada em princípios

morais e éticos para a melhoria do bem estar físico e psicológico do ser humano

(LERMON, 1974; CUNHA, 1952; CARMELO, 2003).

Tais avanços deveriam resgatar a Odontologia e o Cirurgião-Dentista,

reaproximando-o cada vez mais, da sua ligação histórica com a área médica,

buscando em seus atendimentos um relacionamento mais humano, indo de encontro

à integralidade do paciente, atento não somente às necessidades imediatas,

perceptíveis do seu cliente, mas também investigando os fatores não relatados

(LERMON, 1974; CUNHA, 1952; CARMELO, 2003).

Pode-se, também, observar o desenvolvimento social formando duas

vertentes, de um lado o profissional baseado no desenvolvimento tecnicista, em uma

sociedade capitalista, com apego imensamente mercantilista dominado pelo ter, e

por outro lado os pacientes na busca de um atendimento mais pessoal e

individualista, com afloramento do desenvolvimento do direito, buscando a razão na

legalidade, dentro do aspecto não mais do ter, mas sim do ser (LERMON, 1974;

CUNHA, 1952; CARMELO, 2003).

Somando-se ao avanço tecnológico vimos o surgimento de uma população

mais exigente, em virtude de acesso maior e mais rápido as informações, com maior

conhecimento de seus direitos e prerrogativas, por muitas vezes sabendo

exatamente o que quer quando busca o atendimento de saúde, situação esta, aliada

a mudanças legais que acabam por implicar em uma defesa cada vez maior do

paciente, pois este é considerado hipossuficiente, a parte mais frágil numa relação

de consumo, acrescido ainda à despreocupação do profissional na correta

avaliação, programação e resolução das necessidades exigidas pelos pacientes, em

sua maioria, sem suportes legais adequados para comprovação negativa de

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possível culpabilidade, findam por levar, desta forma, o profissional Cirurgião-

Dentista, a tornar-se um “ALVO” fácil em ações de perdas e danos (LERMON, 1974;

CUNHA, 1952; CARMELO, 2003; SOUZA, 2006).

2.2. PRINCÍPIOS BIOÉTICOS

Durante o processo de relação profissional/paciente é de grande valia que o

Cirurgião-Dentista não limite-se tão somente na orientação de um plano de

tratamento direcionado ao orçamento, mas que, acima de tudo, desenvolva uma

busca plena nas possibilidades diagnósticas, principalmente daquelas não visíveis,

as quais, mesmo não relatadas, não totalmente aparentes, são de responsabilidade

do profissional, cabendo orientação de negligência em posteriores situações de

maiores danos (MELANI, SILVA, 2006; SOUZA, 2006).

Para tanto os profissionais devem utilizar-se da tecnologia disponível, cada

vez mais presente, baseando-se em recursos de imagem, para correto levantamento

de patologias possivelmente obscuras, como recurso fundamental para melhor

planejamento e escolha do modelo de tratamento, bem como ferramenta para

cobertura de forma segura em possíveis ações de reparação de danos (FALCÃO,

SARMENTO, RUBIRA, 2003; SOUZA, 2006).

Esta estruturação, é claro, depende também de um correto conhecimento da

destinação diagnóstica para adequada escolha e solicitação do exame mais indicado

para cada situação, assim como é vital um conhecimento adequado das condições

anatômicas normais para identificação dos processos de doença, estando aí o

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Radiologista como grande aliado ao correto atendimento do paciente mesmo que a

distância (COSTA et al., 2008).

Barbieri (2008), assim descreve: “ A bioética tem como objetivo o estudo

interdisciplinar da conduta humana dentro da relação médico-paciente sob o prisma

da ética, tendo como fim à vida, a saúde e a dignidade do equilíbrio, com

observação dos princípios da beneficência, não-maleficência, autonomia e justiça”;

sendo justiça a equidade na distribuição de bens e direitos; a não

maleficência/beneficência a ocupação na busca do bem estar do paciente, evitando

danos na medida do possível; e a autonomia o reconhecimento do domínio do

indivíduo sobre a própria vida.

O desenvolvimento ténico-científico deve originar profissionais Cirurgiões-

Dentistas mais interligados na busca de melhores qualidades do atendimento, com

enfoque de um todo, na percepção dos anseios e particularidades de cada indivíduo

como preceito fundamental de uma correta relação de sucesso no tratamento

(GARBIN et al., 2002).

Os princípios fundamentais da bioética, acima citados, norteadores do

relacionamento humano, determinante respectivamente da igualdade na distribuição

dos benefícios na saúde, na busca do bem estar do paciente, evitando-se dano

dentro das possibilidades e preservando o direito individual de cada um pela própria

vida, respeitando, é claro, o preceito ético básico, aonde o paciente conhece e

reconhece todas as possibilidades envolvidas em seu tratamento, diagnóstico, plano

de tratamento e prognóstico, bem como possíveis intercorrências, registrado de

maneira formal sua conformidade em aceitá-lo, por meio de consentimento livre

esclarecido (GARBIN et al., 2002; SOUZA, 2006; BARBIERI, 2008).

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O preceito da autonomia deve ser levado em conta, quando do real poder

pleno de suas faculdades mentais, tanto o preceito do direito no que se refere à

maioridade legal, cabendo, quando se faça impossibilidade destas prerrogativas, aos

pais, tutores, cuidadores ou outros responsáveis assumir o consentimento dos

processos envolvidos no tratamento do incapaz ou menor, sendo de necessidade

por parte de o profissional dispensar a atenção devida aos mesmos, lembrando que

deles caberá o auxílio para sucesso do tratamento (GARBIN et al., 2002; SOUZA,

2006).

Pela definição da Encyclopedia of Bioethics (1982), a bioética caracteriza-se

pelo estudo amplo da conduta humana, com enfoque na saúde, sendo que seus

valores estão baseados em preceitos morais, buscando a humanização na

prestação da atenção em saúde, com promoção dos direitos individuais, pela

aplicação direta dos princípios da benevolência, da justiça e autonomia.

As soluções jurídicas, tão presentes na ciência moderna, estão relacionadas

principalmente aos preceitos éticos, aplicada a casos concretos, conflitivos e

particulares (GARBIN et al., 2002).

A autonomia explicita a liberdade de opiniões e escolhas, sendo livre ao

indivíduo a determinação de suas atitudes, sem interferência de outras, desde que

não existam prejuízos a terceiros (GARBIN et al., 2002).

Quando não notificado aos pais ou responsáveis por menor/incapaz, antes do

tratamento, dando-lhes orientação e esclarecimento sobre os procedimentos que

serão realizados, observou-se a ocorrência em grande número dos profissionais

apurados na pesquisa (49,5% - conforme pesquisa realizada pela Universidade de

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Campina Grande–PB) (MACIEL, 2003), estamos concordando na restrição do

princípio da autonomia, quando cabe ao paciente, neste caso, menor/incapaz, aos

responsáveis a livre escolha da realização ou não dos procedimentos propostos.

O consentimento, acima de um critério legal, estando fundamentado em

preceitos morais, caracteriza a base do relacionamento profissional/paciente, o

sucesso do tratamento através da confiança; esta gerada pelo diálogo, da discussão

de todo o processo envolvido no atendimento, desde o diagnóstico até a conclusão

do tratamento (diagnóstico, plano de tratamento, alternativas, consequências,

possíveis sequelas e custas), de forma clara e de fácil entendimento ao paciente

e/ou dos representantes legais (GARBIN et al., 2002).

Faz-se importante, conforme a idade e/ou condição de compreensão da

criança ou incapaz, a orientação direta, as explicações do caso, com intuito da

consolidação de um vínculo benéfico ao tratamento, porém a decisão final quanto à

execução de qualquer procedimento é dada por meio de consentimento esclarecido

do responsável, sendo passível de infração ética, contido no Código de Ética

Odontológica, no capítulo V, artigo 6 e inciso VI, que restringe o início do tratamento,

em menor sem o consentimento dos pais, responsáveis ou representantes legais,

exceto somente em casos de urgência e emergência (GARBIN et al., 2002).

Além de infração ética, o não consentimento formal, em caso de menor pode

ser motivo decorrente de ação civil, com solicitação de responsabilidade por

negligência profissional (GARBIN et al., 2002).

Falhas na orientação do paciente e/ou de seus responsáveis, com a não

conformação do consentimento livre esclarecido, em consequência, desvio dos

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preceitos éticos, podem acarretar, de maneira desagradável, uma propensão maior

a erros de comportamento para com seus pacientes, pela não preservação de forma

plena os direitos do paciente e familiares, tendo como resultado uma maior

possibilidade de representação jurídica para esclarecimentos (GARBIN et al., 2002).

A existência da necessidade de informações plenas, cientificando os

pacientes de forma a obter o esclarecimento total de suas dúvidas quanto aos

procedimentos que serão realizados, não dando margem a possíveis negativas da

ciência do tratamento, prevalecendo desta forma, dentro do princípio da bioética, o

direito da autonomia, que exprime a razão pelo consentimento ou não do tratamento.

Recomenda-se que para tanto sejam expostos de maneira clara e em linguagem

compreensível ao paciente e seus responsáveis, evitando-se linguagem técnica,

todo o diagnóstico, plano de tratamento, alternativas de tratamento e seus

respectivos custos, consequências do tratamento, possíveis resultados e sequelas

decorrentes de cada procedimento, isentando-se do surgimento de possíveis

dúvidas que não possam ser debeladas em juízo (BARBIERI, 2008; FENELON,

2003).

Caso ocorra possível falha no tratamento, desvio no planejamento proposto,

danos não previstos, mudança de valores no decorrer do atendimento, ou qualquer

outra intercorrência, podem ser desencadeadoras de ações de reivindicação de

responsabilidade por negligência, imperícia e/ou imprudência. Neste ponto, ressalta-

se o já anteriormente exposto, a expressão máxima do auxilio de uma

documentação adequada, usando-se da imaginologia para corroborar os

procedimentos realizados pelo Cirurgião-Dentista (MELANI, SILVA, 2006).

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2.3. ASPECTOS JURÍDICOS

Dadas a considerações acima, podemos afirmar que a odontologia apresenta-

se amplamente envolvida no caráter jurídico, estando o Cirurgião-Dentista incumbido

de uma rede de aspectos legais diante de toda e qualquer conduta na relação

profissional/paciente, sendo, desta forma, de máxima importância, não somente o

conhecimento técnico científico, mas também o conhecimento das bases jurídicas

que regulamentam o exercício profissional, com suporte nos Códigos de Ética

Profissional, Civil, Penal e de Defesa do Consumidor, com finalidade de se

resguardar da possível condenação em pleitos indenizatórios (SOUZA, 2006;

ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001).

2.4. FUNDAMENTAÇÃO DO DIREITO

2.4.1. Direito Civil e Direito Penal

Em situações onde o paciente se sinta prejudicado por acreditar na existência

de erro por parte do profissional, Cirurgião-Dentista, responsável por seu

atendimento, e que em decorrência disto busque a justiça com a finalidade de

reparação do dano, existe a necessidade do cumprimento de um preceito jurídico

básico, que se dá pela caracterização de “nexo causal”, uma relação direta entre

causa e efeito, realizando-se a comprovação de que o ato praticado foi o

desencadeador do dolo ao paciente, cabendo resposta por responsabilidade civil

e/ou criminal (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001).

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Diz-se responsável, conforme definição do Dicionário Aurélio, “de quem deve

cuidar de algo ou alguém, ou de quem deve realizar certa tarefa” e segundo o

mesmo dicionário, a responsabilidade é a “condição jurídica de quem, sendo

considerado capaz de conhecer e entender as regras e leis e de determinar a

própria vontade e ações, pode ser julgado e punido por algum ato que cometeu”,

em detrimento do aspecto legal vigente, com imputabilidade da obrigação da

reparação em caso de dano, conforme o Código Civil, em seu capítulo IX, da

Responsabilidade Civil, no artigo 927, “aquele que por ato ilícito (art. 186 e 187),

causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”, dando a visão plena da

responsabilidade civil (FERREIRA, 2008; FIGUEIREDO, 2002; CONSTANTINO,

GOMES, 2008).

Segundo MOREIRA e FREITAS (1999), a responsabilidade civil se

caracteriza como sendo “a obrigação que incumbe todo agente dotado de liberdade,

de responder por seus atos ante a autoridade competente”.

Considerando os aspectos legais da responsabilidade civil, podemos concluir

estar fundamentada em dois pontos: o primeiro denota a obrigação profissional de

assumir a responsabilidade e a de estar sujeito as consequências que venham em

decorrência de seus atos; a segunda, de que os atos praticados, quando

considerados ilegais e/ou danosos, frente à legislação vigente, são passíveis de

respostas, com satisfação da reparação, caso evidenciado erro, inclusive com

estipulação pecuniária, a fim de ressarcimento aos prejuízos sofridos pelo paciente

(ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001).

A necessidade de um controle social das ações individuais, a fim da

preservação do direito humano, denota a aplicação de regras de responsabilidade

25

civil, desde o princípio da civilização, com a formação dos primeiros agrupamentos

familiares, por meio de justiça coletiva, onde praticavam-se a vingança, em grupo,

contra um agressor (ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001).

O desenvolvimento de tais práticas acabou por demonstrar a sua ineficiência,

percebendo-se que a reparação do dano estará, ao contrário da vingança, assistindo

de maneira mais eficaz ao indivíduo e toda a sociedade, cabendo ao poder público

instituído, a determinação do ônus indenizatório, podendo ser dado em espécie ou

em bens materiais, buscando-se para tanto a elaboração de normas e condutas,

com a referência inicial em costumes e práticas sociais, sendo posteriormente

editado em leis, com parâmetros limitados e definidos, consolidando o Estado de

Direito, determinante dos valores jurídicos individuais e dos Poderes Públicos

(ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001).

Neste ponto passou-se ao Estado o direito e o dever do julgamento e

determinação dos processos legais, com orientação em normas definidas, com

preceitos éticos, morais e de justiça (ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001).

Durante o processo jurídico, para que possa ser evidenciada a

responsabilidade do profissional, é necessária a observação presente de condições

básicas explícitas de maneira conjunta (ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001).

Conforme descrito pelo Dr. Neri T. C. Souza (2006), em seus artigos

“Odontologia e Responsabilidade Civil” e “Da Responsabilidade Civil em

Odontologia”, em primeiro lugar, é necessária a presença do profissional

devidamente habilitado, responsável pela ação geradora da responsabilidade

jurídica, aqui determinado AGENTE; este desenvolvedor de atitudes devidamente

26

regulamentadas em dispositivos específicos – “ATO PROFISSIONAL”; tal ação deve

ser em conformidade com doutrinas éticas e morais a terceiros, dando orientação da

AUSÊNCIA DE DOLO, podendo, quando da sua existência, ser caracterizado como

imperícia, imprudência ou negligência.

Quando ocorre procedimento considerado ilegal o profissional poderá ser

responsabilizado civilmente, caso venha a ser constatado que de tal ato originou fato

prejudicial ou danoso ao paciente, tipificando-se desta forma a EXISTÊNCIA DE

DANO, porém, só se pode caracterizar o dano atribuído ao profissional se houver

ligação direta entre o agente e a consequência danosa, não sendo relacionado fato

que não decorre de ação ou omissão do profissional para com o cliente, dando-se a

este a determinação de NEXO CASUAL (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE,

DARUJE JR, 2001).

Observa-se que em decorrência do atendimento odontológico, o profissional

que por ventura venha a executar ação em dissonância com os preceitos éticos ou

morais, bem como atentar contra os códigos legais vigentes, causando dano a

terceiros, estará executando ato ilícito, cabendo, a este, a obrigação de repará-lo.

Tal ato dá-se em decorrência tanto da ação praticada, quanto da omissão em fazê-lo

quando necessário, sendo sua reparação dada, não mais como no passado, quando

recaía-se esta sobre a pessoa, mas sobre o patrimônio do agressor, preservando-se

desta forma a ética e o valor da vida humana (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE,

DARUJE JR, 2001).

Durante o atendimento odontológico, quando uma ação ou omissão, mesmo

que involuntária, acarreta prejuízo a outra parte, podemos considerar a ação

culposa, originada de negligência, imperícia ou imprudência, determinando reações

27

previstas no Código de Ética Odontológica, prescritas em seu artigo 36, desde uma

advertência confidencial até a cassação do exercício profissional, segundo os itens

I,II,III,IV e V, podendo o mesmo profissional estar sujeito a sanções embasadas nos

Códigos Civil, Penal e de Defesa do Consumidor, conforme a consequência do ato

praticado, variando de acordo com estes, sanção penal específica, imposta pela

sociedade, representada pelo poder Público, e/ou de interesse privado, podendo ser

o Cirurgião-Dentista, imputado de pena, nas duas esferas (SOUZA, 2006;

ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001).

Cabe aqui uma observação, que quando devidamente comprovado o ato

ilícito, na esfera criminal, fica automaticamente estipulado o dolo no âmbito civil, não

havendo necessidade de posterior comprovação jurídica da culpa, sendo analisado

tão somente o valor e forma de indenização (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE,

DARUJE JR, 2001).

Somente diante da apresentação de um DANO, estando este enquadrado

como material, psicológico, físico, funcional ou moral, ligado ao aspecto jurídico

como supressão ou redução de bens materiais e/ou imateriais, pode-se considerar a

evidenciação de responsabilidade (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE, DARUJE

JR, 2001).

No âmbito jurídico o dano pode ser classificado conforme sua ação, podendo

estar associado sobe um ganho financeiro, DANO EMERGENTE, LUCROS

CESSANTES, estando relacionado ao impedimento do crescimento financeiro e

especificamente moral, relacionado às necessidades intímas do indivíduo, por

mágoa ou dores não necessárias, a não ser pelo próprio ser humano, podendo gerar

agravo psicológico e emocional (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR,

2001).

28

Diante da acusação de dano originado de conduta odontológica, cabe uma

ação de responsabilidade civil, a comprovação, por meio de solicitação de provas, a

estipulação de quantia pecuniária justa à reparação do referido dano, seja ele

material ou não, com a finalidade de ressarcimento da condição inicial, antes da

ação ou ao menos mais próxima possível, devendo o condenado, após ação

transitado e julgado, arcar com todas as despesas para o retorno da condição

normal (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001).

Durante o processo civil, cabe ao agente judiciário a determinação dos

valores indenizatórios, solicitando, se necessário, de acordo com a complexidade do

caso, apoio pericial, resguardando-se de assumir como justos os valores que por

ventura venham a gerar enriquecimento injustificado, nem tão pouco determinação

de instituição de deveres médicos (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE, DARUJE

JR, 2001).

O aspecto da determinação da indenização, quando referido a danos morais,

acaba por ser fator complicador no julgamento, pois diferente dos bens materiais,

dificilmente pode ser quantitativo, cabendo ao judiciário, com o apoio de leis

relacionadas em outros códigos, como exemplo o de telecomunicação ou imprensa,

a decisão do montante a ser ressarcido, observando, como dito anteriormente, o não

enriquecimento injustificado, mas que sirva como advertência a não repetição do

erro (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001).

Podemos observar que a responsabilidade civil baseia-se nas determinações

do Código Civil Brasileiro de 1916, nos artigos 159 e 1545 (correspondente,

respectivamente, aos artigos 927 e 951 do Código Civil - 2002), que relatam

respectivamente:

29

“Artigo 159: aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano”,

“Artigo 1545: os médicos, cirurgiões, farmacêuticos, parteiras e dentistas são obrigados a satisfazer o dano, sempre que da imprudência, negligência ou imperícia em atos profissionais, resultar morte inabilitação de servir ou ferimento.”

Sendo do ordenamento jurídico, no mesmo código, determinante quanto ao

patrimônio do profissional, em seu artigo 942:

“Artigo 942: os bens do responsável pela ofensa ou violação dos direitos de

outrem, ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se tiver mais de um autor da ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação.”

Fica claro que a reparação do dano deverá ser executada após comprobatória

da ação, e esta decorrer do profissional, sendo tal alegação também fundamentada

no Código de Defesa do Consumidor, art. 14 § 4º: “a responsabilidade pessoal dos

profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa” (SOUZA, 2006;

CÓDIGO, 2003; CONSTANTINO, GOMES, 2008; FIGUEIREDO, 2002; ANTUNES,

DARUJE, DARUJE JR, 2001).

A atuação do Cirurgião-Dentista deve estar ligada sempre a prática digna

voltada a promoção de saúde individual e coletiva, por meios de técnicas

aprimoradas, conhecimentos científicos atualizados, diagnosticando, planejando e

tratando de maneira ética e moral, preservando a individualidade dos pacientes, não

direcionando suas ações apenas à mercantilização, nem tão pouco às atitudes

meramente mecânicas, conforme os preceitos do Código de Ética Odontológica,

descrito nos artigos 3º e 4º dos deveres e direitos (SOUZA, 2006; MANUAL, 2002).

30

Os preceitos éticos e morais são de extrema importância na prática

odontológica, com aplicação na humanização do atendimento, não devendo ser

confundido apenas com a ética profissional, esta adquirida com a graduação, na

prática simples da formação técnica, aquela adquirida desde os primeiros anos,

originária da vivência e convivência humana, sendo que quando esquecidos ou

aplicados de forma insuficiente durante a convivência com o paciente pode tornar a

relação deveras frágil, estando o Cirurgião-Dentista mais propenso a situações

geradoras de danos para com seus clientes (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE,

DARUJE JR, 2001).

Os danos causados podem, segundo o Código Penal Brasileiro, ser apurados

considerando a forma de sua prática, podendo ser originada por consciência e

vontade do agente, com o conhecimento do mal a ser gerado, caracterizando a

intencionalidade, com nomeação de ATO DOLOSO, ou quando decorrente da não

observância de preceitos básicos profissionais, por ação ou omissão, sem, no

entanto, a intenção do dano, ocorrendo normalmente por negligência, imperícia e

imprudência, denominado de ATO CULPOSO. conforme o artigo 18 do Código

Penal Brasileiro (CONSTANTINO, GOMES, 2008; FIGUEIREDO, 2002):

“Artigo 18: [...]

item I: doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo,

item II: culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia”.

Considerando uma definição quanto à culpabilidade do profissional, em face

das ações supracitadas, o Código Civil, em seu artigo 927, denota a obrigação de

reparação do dano por negligência ou imprudência, e a imperícia encontra-se

31

detalhada no artigo 154 do mesmo Código, cabe uma explanação sobre tais atos;

define-se aqui, segundo as indicações dos atos danosos, acima citados, como

negligência a inobservância das condutas e procedimentos envolvidos para

execução de determinada atividade, manifesta indolência, ato omisso ou falta de

diligência no agir. A imprudência pode ser observada quando, durante uma ação,

devia-se ter o cuidado da realização de ações específicas, com devidos

conhecimentos técnicos, porém, torna-se o ato falho, decorrente da precipitação no

agir, não analisar a melhor forma de executar, sem avaliação das possibilidades

positivas e negativas. Quanto à imperícia, esta caracteriza-se pelo desconhecimento

científico, inabilidade técnica, falta de conhecimento ou adequado preparo para

execução de específica técnica. Fica, então, claro que descaracterizado qualquer

das atitudes descritas, considera-se o procedimento odontológico apropriado, sendo

descabida a necessidade de indenizar e comprovada à inculpabilidade do

profissional (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001;

CONSTANTINO, GOMES, 2008; FIGUEIREDO, 2002).

O Código Civil em seu Artigo 932 caracteriza também a responsabilidade

solidária, que diz em seu caput: “são também responsáveis pela reparação civil”,

item III, “o empregador ou comitente por seus empregados, serviçais e prepostos, no

exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”, assumindo a

responsabilidade profissional pela característica, em fundamento jurídico, do “in

eligendo”, sendo responsável pela escolha de servidores ou prestadores

terceirizados e do “in vigilando”, assumindo a responsabilidade pela supervisão

contínua de seus prepostos (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR,

2001; CONSTANTINO, GOMES, 2008; FIGUEIREDO, 2002).

32

Em caso de força maior, exime-se a culpa, cite-se art. 393 do Código Civil:

“Artigo 393: O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles se responsabilizado.

Parágrafo único. O caso fortuito ou no fato de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não eram possível evitar ou impedir.”

Em processo de reparação de danos o profissional pode ser avaliado por

ação dolosa ou culposa, cabendo a obrigatoriedade de reparação do dano

independente da qualificação do grau do ato ilícito, sendo este apenas determinante

no valor indenizatório conforme natureza grave (próximo ao dolo), leve (poderiam

ser evitados), levíssimo (sutil, necessitando máxima atenção para evidenciação)

(SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001; CONSTANTINO, GOMES,

2008; FIGUEIREDO, 2002).

Posterior ao levantamento das provas, havendo a confirmação da culpa na

ação do profissional, cabe a designação da reparação do dano, este podendo ser

considerado material e/ou moral (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR,

2001).

Lembramos que o dano material somente pode ser comprovado, quando

objeto do pleito, por provas substanciadas, não sendo cabível por presunção ou

hipótese; comprovado somente por documentação real e verídica, uma vez que se

baseia em danos a um objeto palpável. O dano moral, porém, não podendo ser

mensurável, não apresenta necessidade de sua existência, lembrando, porém, estar

ligada a obrigação de um dano material (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE,

DARUJE JR, 2001).

Quando em julgado, o acusado, determinada a sua culpa, fica obrigado às

expensas do ressarcimento estando ligado a reparação do dano por arbitramento de

33

custas, estes por sua vez apresentam-se dentro dos princípios do MODERADO e do

EQUITATIVO, que prevê a impossibilidade de enriquecimento sem causa, “ Lucro

Capiendo”, acrescendo apenas valores justos pelos aspectos morais relacionados à

DOR, VERGONHA E CONSTRANGIMENTO (SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE,

DARUJE JR, 2001).

2.4.2. Avaliação de Atividade Meio – Atividade Fim

Devemos ainda acrescentar que os todos os prestadores de serviço

encontram-se margeados pelo mérito do dever de atividade-meio ou atividade fim,

nos quais se descrevem, respectivamente, as obrigações de realizar todos os

processos possíveis no intuito da realização do serviço, sem, no entanto, a

existência da obrigação do resultado; e a obrigação de resultado pleno quando da

conclusão do trabalho. Na área biológica, por não se tratar de ciência exata,

apresentamos possibilidade de insucesso no alcance do objetivo pleno, limitado por

variáveis independentes de nossa perícia, como na medicina. Devemos, porém,

salientar que a luz da justiça, por orientação, de maior parte, dos próprios

profissionais cirurgiões-dentistas, acaba-se por induzir, em juízo, a obrigação de

finalidade, uma vez que em virtude da anteriormente citada, mercantilização nos

atendimentos, os profissionais da área odontológica prometem resultados que por

muitas vezes não podem ser alcançados em decorrência da dependência de fatores

externos, levando o julgamento na obrigação de fim (SOUZA, 2006, Da

responsabilidade).

34

Dentro do Conselho Federal de Odontologia, pode-se observar pela

Resolução nº 63/2005, Consolidação das Normas para Procedimento nos Conselhos

de Odontologia, em seu artigo 39, a decisão de especialidades que se caracterizam

por obrigação de resultados, cite-se: implantodontia, prótese dentária, dentística,

odontologia em saúde coletiva, odontologia legal, patologia bucal e radiologia.

Em contra partida as especialidades em cirurgia e traumatologia, endodontia,

odontopediatria, disfunção temporo mandibular e dor orofacial, odontologia

para pacientes especiais, odontogeriatria e ortopedia funcional dos maxilares

configuram, pela mesma resolução, atividades meio (SOUZA, 2006, Da

responsabilidade; BRASIL, Resolução).

2.4.3. Códigos de Ética Odontológico e de Defesa do Consumidor

Baseado em preceitos legais, na defesa do cliente contradito ao profissional,

dado pela parte mais fraca na relação de consumo, podemos observar maior

evidência de tal fato, nos anos 90, com a promulgação do código de defesa do

consumidor, com crescente aumento dos processos cíveis contra Cirurgiões-

Dentista, ao contrário dos anos 70 e 80, conforme Rosa (apud MELANI, SILVA,

2006), não havendo a existência destes.

O processo do atendimento odontológico é descrito claramente no Código de

Defesa do Consumidor, a relação básica de consumo descrevendo em seu artigo 2º

que “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquiriu produto ou serviço

como destinatário final” e fornecedor, em seu artigo 3º:

35

“Artigo 3º: Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, publica ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”

E neste caso a consideração de produto, no mesmo artigo 3º, inciso 1º,

“qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial” e inciso 2º define serviço

“qualquer atividade fornecida no mercado de consumo mediante remuneração”

(CÓDIGO, 2003).

Cabe aqui, uma ressalva, quanto ao prestador público, acaba-se criando uma

lacuna legal, se considerarmos o artigo acima, uma vez que não existe remuneração

direta, descaracterizando desta forma relação de consumo, sendo então, não

aplicável o Código de Defesa do Consumidor (MELANI, SILVA, 2006; CÓDIGO,

2003).

Na relação de consumo, em tratamento odontológico, não diferente dos

demais, ainda, no mesmo Código, em seu artigo 4º, o consumidor, no caso paciente,

é a parte mais facilmente lesada, é o elo mais fraco na cadeia de consumo, em face

do seu desconhecimento das especificações técnicas, procedimentos, materiais,

sendo respaldado, no artigo 6º, inciso VIII do mesmo código, à inversão do ônus da

prova, devido à hipossuficiência, cabendo ao Cirurgião Dentista a prova da correta

conduta (MELANI, SILVA, 2006; CÓDIGO de Defesa do Consumidor).

A configuração legal da geração de provas, por meio de documentação

substanciada, pode ser evidenciada, não somente no aspecto direto do direito

jurídico, mas averiguada de maneira clara segundo o Código de Ética Odontológico

em seu artigo 4º, inciso VI, que determina a documentação permanente do paciente,

sendo a sua liberação feita sem contestação, e o Código de Defesa do Consumidor,

artigo 72, que define como crime contra o consumidor impedir ou dificultar acesso

36

deste aos seus registros pessoais, fica determinado que quando o cliente apresenta

intenção da troca de profissional e/ou abandono de tratamento, a documentação

deve ser entregue quando solicitado, sem nenhuma exigência, fato este observado

em apenas 39% conforme pesquisa realizada na Universidade de Campina Grande-

PB (MACIEL et al., 2003) dos profissionais participantes desta pesquisa. Ressalta-se

a necessidade e importância do arquivamento de cópias para comprovação dos

procedimentos, realmente realizados, antes da mudança solicitada (MELANI, SILVA,

2006; CÓDIGO, 2003; Manual, 2002).

Cabe ao profissional, pelo embasamento ético-legal, a plena responsabilidade

sobre os procedimentos realizados no exercício da Odontologia, Medicina,

Farmácia, devendo assumir os erros contidos, apoiados na sua capacidade técnica

e esclarecimento adequado de todo o tratamento (MELANI, SILVA, 2006).

O conhecimento técnico é básico e fundamental para a conduta de execução

do tratamento dos pacientes, principalmente dado a evolução técnica-científica,

porém o aumento do conhecimento acaba por criar uma incorreta desvinculação da

evolução do saber com as características naturais do ser humano, como, por

exemplo, a emocional, a física e a mental (MELANI, SILVA, 2006).

Esta desvinculação acaba por afastar o profissional da adequada relação

profissional/paciente, distanciando de uma adequada concordância nos resultados a

serem alcançados no tratamento, diminuindo o resultado real (MELANI, SILVA,

2006).

O distanciamento da preocupação do profissional pelo paciente como um todo

leva o Cirurgião Dentista a um descuido com o correto e completo preenchimento do

37

prontuário, que deveria contar com todas as expectativas, queixas e procedimentos

realizados, intervenções, com a concordância e consentimento do paciente por meio

de sua assinatura. É com esta documentação que será embasada a sua defesa em

caso de ação por insatisfação do paciente pelo tratamento, não havendo dificuldade

de prova na orientação de correta conduta clínica no tratamento comprometido

(MELANI, SILVA, 2006).

O que se nota, nos tribunais, atualmente, é o detrimento judicial, em caso

concreto de reparação de danos, a clara inversão do ônus da prova, com a

caracterização da obrigação de resultado, cabendo, desta forma, ao profissional

Cirurgião-Dentista, a comprovação integral da não ação de imperícia, imprudência

e/ou negligência, somente negado por caso fortuito ou força maior, a

responsabilidade exclusiva do paciente pelo insucesso do tratamento (MELANI,

SILVA, 2006; SOUZA, 2006; ANTUNES, DARUJE, DARUJE JR, 2001).

2.4.4. Geração de Provas

A determinação do juntamento de provas faz-se delegada pela determinação

do tribunal constituído, emanando direito do Código de Processo Civil Brasileiro, em

seu artigo 130, “caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as

provas necessárias à instituição do processo indeferindo as diligências inúteis ou

meramente protelatórias”, evitando impedimento e prejuízo às partes

(CONSTANTINO, GOMES, 2008; FIGUEIREDO, 2002; ANTUNES, DARUJE,

DARUJE JR, 2001).

38

2.5. DOCUMENTAÇÃO DO PACIENTE

O prontuário tem sua fundamentação como importante instrumento legal, não

somente na adequação nos procedimentos de diagnóstico e tratamento, mas como

suporte na identificação humana post mortem, como produção de provas para apoio

jurídico em ações de reparação de danos, obtenção de dados em trabalhos

científicos, epidemiológicos, entre outros. Segundo a literatura vários documentos

devem fazer parte do prontuário, sendo encontrados durante o trabalho, como

cópias carbonadas de receituários, atestados, orientações, encaminhamentos,

solicitações de exames complementares e termo de consentimento para a utilização

de dados do paciente em situações extra-consultório (COSTA et al., 2008).

Todos os documentos gerados estão ligados ao profissional no que diz

respeito a sua responsabilidade ética/legal, devendo apresentar-se sempre de forma

clara e entendível, devidamente preenchido para a sua finalidade sejam eles laudos,

receitas ou atestados; aliás, este último com definição exata da finalidade a que se

destina e período de validade, com assinatura do paciente em prontuário da mesma

forma que os demais atendimentos (COSTA et al., 2008).

A falta de clareza, a impossibilidade de adequada leitura dos documentos

produzidos, bem como o seu incorreto arquivamento, podem ser geradores de ações

de danos morais ou a impossibilidade de defesa nas mesmas (COSTA et al., 2008).

Segundo Normativa do Ministério da Saúde é de obrigação do profissional de

saúde o adequado preenchimento do prontuário com todos os documentos

39

necessários assinados, carimbados e legíveis, anexo aos exames complementares

(COSTA et al., 2008).

A incorreta elaboração do prontuário, erros de documentação, ausência de

exames ou dados complementares, inutiliza o prontuário como prova jurídica, tanto

na identificação humana, ou quando de sua solicitação em processos civis, sendo,

muitas vezes, negligenciado pelos profissionais por a caracterizarem como atividade

burocrática desnecessária ou por alegação de falta de esforço ou tempo (COSTA et

al., 2008).

A documentação produzida poderá ser ligada diretamente ao cuidado do

profissional para com o paciente, desde o correto diagnóstico até a conclusão do

tratamento; este descaso com a formação adequada do prontuário pode caracterizar

falta de atenção para com o paciente, com aparente falta de respeito e claro

descumprimento aos princípios éticos e legais na relação profissional/paciente

(COSTA et al., 2008).

2.5.1. Documentação de Prontuário

2.5.1.1. Anamnese:

Possui a finalidade do conhecimento do estado clínico geral do paciente, para

associação de suas implicações com relação ao tratamento clínico a ser aplicado; o

correto preenchimento da anamnese constitui o primeiro passo para a adequada

elaboração do prontuário, devendo neste estar contido inicialmente o nome, data,

local de nascimento, endereço, profissão, identificação do responsável (se menor),

40

sexo, documentos pessoais (RG, CPF...), seguido de um detalhado questionário

sobre as condições gerais de saúde do paciente, devendo este questionário ser

preenchido de próprio punho pelo cliente, confrontando em um segundo tempo para

maiores esclarecimentos (COSTA et al., 2008; AORP, 2010; JORNAL, 2005).

2.5.1.2. Ficha Clínica:

É utilizada para o registro do estado clínico do paciente do inicio ao fim do

tratamento, com a finalidade do acompanhamento clínico e confrontação jurídica em

caso de identificação humana, quando solicitado; e também em possíveis

reclamatórias (COSTA et al., 2008; AORP, 2010; JORNAL, 2005).

2.5.1.3. Exame Clínico / Odontograma:

Devemos lembrar a importância de um segundo odontograma a ser

preenchido com os procedimentos realizados no decorrer do tratamento,

devidamente datada e com a assinatura de ciência do paciente, para possível

comparação em caso de solicitação judicial (COSTA et al., 2008; AORP, 2010;

JORNAL, 2005).

41

2.5.1.4. Orientações aos Pacientes:

As orientações ao paciente, da mesma forma que as prescrições, devem

apresentar os dados do profissional e do paciente, estando de forma concisa e clara,

com todas as informações relevantes ao tratamento. Relacionados à dieta,

questionário de saúde, pedido de exames, planejamento cirúrgico, cuidados pós-

cirúrgicos, cuidados com a higiene, entre outros (COSTA et al., 2008; AORP, 2010;

JORNAL, 2005).

2.5.1.5. Plano de Tratamento:

Nomenclatura dada ao não recomendado “orçamento”, sendo que existe a

possibilidade, por questão da resposta biológica individual, da mudança da

orientação inicial, apresentando-se com a finalidade do registro do diagnóstico,

terapêutica e prognóstico. Devendo ser registrada com detalhes os procedimentos

efetuados e possíveis intercorrências, sendo orientado o registro de todas as

possibilidades de tratamento. Cabendo ao paciente a decisão daquele que mais lhe

convier, estando ciente dos prós e contras existentes no tratamento escolhido

(COSTA et al., 2008; AORP, 2010; JORNAL, 2005).

42

2.5.1.6. Prescrição de Medicamentos – Receitas:

É importante a produção da cópia da prescrição com a ciência do paciente,

registrado em formulário próprio contendo, conforme norma do Código de Ética

Odontológica, o nome do profissional, profissão e número do CRO; avaliação de

prescrições médicas, documentos com destinação de autorização para aquisição de

medicamentos, devendo estar corretamente preenchidos, legíveis e com grau de

entendimento levando-se em consideração o nível de instrução do paciente,

fazendo-se constar o nome do medicamento, dosagem e período de uso, nome

completo do paciente e dados do profissional (nome, número de inscrição e

endereço) (COSTA et al., 2008; AORP, 2010; JORNAL, 2005).

2.5.1.7. Atestados Odontológicos:

Devem ser preenchidos de forma legível e clara, com determinação do fim a

que se destina, com as mesmas informações profissionais do atestado, sendo de

grande valia legal, considerando a sua finalidade (COSTA et al., 2008; AORP, 2010;

JORNAL, 2005).

2.5.1.8. Aviso de Abandono de Tratamento:

Para finalidade jurídica existe a necessidade da comprovação de ciência do

paciente quando do abandono do tratamento, decorrente de faltas consecutivas,

43

sem reagendamento, servindo para tal comprovação carta registrada, com

assinatura de recebimento, emitida com repetição após trinta dias sem retorno

(COSTA et al., 2008; AORP, 2010; JORNAL, 2005).

2.5.1.9. Contrato de Prestação de Serviços - segundo PRUX (1998):

“contrato é todo o conteúdo de manifestação de vontade que lhe é pertinente, encontram seus limites mais próximos na lei, mas devem respeitar também os demais princípios que integram o direito como um todo, de modo a apresentarem-se como instrumentos aptos a seus fins ideais”

Segundo ainda o ordenamento jurídico, escrito no Código Civil Brasileiro,

artigo 422, “os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do

contrato, como em sua execução os princípios da probidade e da boa fé”, sendo que

a relação profissional/paciente enquadra-se em uma relação de consumo,

direcionada e orientada em um contrato, com explanação baseada em acordo

escrito ou de vontades, deve estar adequadamente enquadrado na boa fé a fim de

proteger as legítimas e reais vontades de todas as partes envolvidas, com

características de obrigação de meio, em determinadas situações, em outras de fim

(SOUZA, 2006; CONSTANTINO, GOMES, 2008; FIGUEIREDO, 2002).

Como complementação da idéia de contrato, podemos ainda citar IDA T P

CABRIELLI (apud SOUZA, 2006, Da Responsabilidade) que diz ser a obrigação

contratual, entre profissional/paciente, uma relação que se considera concluído o

serviço compromissado (plano de tratamento estipulado), em determinadas

situações, considerando a atuação zelosa e diligente do profissional (obrigação de

meio), em outras situações, somente findado o contrato com o resultado pleno do

44

acordo afirmado (Compêndio de Odontologia Legal), acrescentando ainda, que a

realização de procedimentos seguindo as normas técnico-científicas é dever básico

e primordial do odontólogo, mas dando ênfase que os sofrimentos físicos ou morais,

decorrentes de tratamento dentário, mesmo que visualmente executado à luz da

moral, ética e ciência, se decorrente de suposta imperícia, negligência ou

imprudência, determinam obrigatoriedade legal de reparação do dano por meio de

indenização, caracterizando-se a responsabilidade civil, em virtude da presença de

culpa decorrente de sua atuação ficando caracterizado a quebra do contrato firmado,

cujo objeto jurídico implícita a atuação profissional com conhecimentos pertinentes e

atualizados, de maneira criteriosa e diligente.

Durante a prestação do serviço odontológico, como em qualquer outra prática

de consumo, conforme estipulado pelo Código de Defesa do Consumidor, em seu

artigo 50, fica claro a formação de um contrato, descrevendo que “a garantia

contratual é complementar à legal e será conferida mediante termo escrito”, tendo

este documento a regulamentação de normas e parâmetros, de um acordo pela

vontade de ambas as partes, sobre um objeto legal e real, com finalidade de

eliminar, criar, garantir ou informar sobre direitos e deveres das partes envolvidas,

devendo estar descrito de forma integral, sem rebuscamento da linguagem ou

termos excessivamente técnicos, claro e objetivo, repudiando possíveis cláusulas

que o tornem abusivo, corroborando com o referido código, em seus artigos 46 e 47,

onde fica explícito que serão os consumidores os favorecidos legalmente quando

existir a observância de cláusulas abusivas, ou não for contrato possível do

entendimento do consumidor (SOUZA, 2006; CONSTANTINO, GOMES, 2008;

FIGUEIREDO, 2002).

45

2.5.2. Exames Laboratoriais

Quando evidenciada a necessidade de uma avaliação sistêmica detalhada,

fundamentando-se em resultados de exames laboratoriais com hemograma,

bioquímica, enzimas entre outros, principalmente em processos cirúrgicos,

recomenda-se a guarda de uma cópia do levantamento efetuado a fim de se

comprovar as condições plenas de saúde ou não do paciente para realização do

procedimento proposto (AORP, 2010).

2.5.2.1. Radiografias, Fotos e Modelos

Quando do tratamento odontológico, os exames complementares revestem-se

de grande valia como meios auxiliares para determinação do correto diagnóstico

elaboração do plano de tratamento e melhoria nas possibilidades de orientação

prognóstica, sendo também de grande importância como elemento básico de prova

em ações judiciais (AORP, 2010).

Como destaque aos elementos complementares os modelos de estudo e as

radiografias, sejam elas intra ou extra-orais (AORP, 2010).

Os modelos fornecem uma visão tridimensional da situação do paciente,

sendo em algumas especialidades, como a ortodontia, a prótese (fixa ou móvel) e a

implantodontia, fundamentais para avaliação do diagnóstico, estando inapropriada a

elaboração do plano de tratamento sem sua detalhada avaliação. Observa-se que a

sua guarda, apesar de prova material cabível, torna-se difícil em determinadas

46

situações, dependendo da área disponibilizada para arquivamento de prontuários,

uma vez que estes ocupam espaço considerável; contudo, devido a sua importância

legal é salutar ressaltar a necessidade da guarda, ao menos dos casos mais

complexos, com a possibilidade da cópia ou scanneamento (arquivamento digital)

dos demais (AORP, 2010).

As radiografias, sendo corretamente indicadas, também são, como os

modelos, recursos essenciais em lides jurídicas, servindo para comprovação do

estado inicial do paciente, anterior aos procedimentos propostos, isentando desta

forma, o Cirurgião-Dentista, de procedimentos realizados por outro colega em

situação pregressa, bem como o exame radiográfico final serve de subsídio para

afirmação de correta conduta nos procedimentos realizados (AORP, 2010).

Faz-se salutar ressaltar que para a sua afirmação legal os exames

radiográficos devem ser realizados e processados de forma correta, a técnica

prescrita deve estar de acordo com a necessidade específica do tratamento,

realizada dentro das normas indicadas, respeitando-se o adequado processamento,

respeitando-se os tempos, em caso de radiografias não digitais, de revelação,

fixação e secagem, com atenção especial aos elementos químicos destinados para

tal finalidade, trocando-os constantemente, observando a posterior armazenagem

adequada dos exames produzidos, evitando dobras ou riscos, não esquecendo da

correta identificação e data, na própria radiografia, em extra orais (evitar etiquetas),

e quando periapicais em cartelas próprias (AORP, 2010).

Quando solicitadas em laboratórios especificados, acompanhadas por laudos,

guardar a cópia dos laudos juntamente com cópia em scanners das radiografias

(AORP, 2010).

47

Os modelos, radiografias e fotografias, quando devidamente indicadas,

executadas e processadas, tendo o seu arquivamento realizado, com a finalidade de

garantir sua preservação sem que, por ventura, venham a ser danificados, garantem

ao profissional imprescindível fonte de recursos para sua defesa, não cabendo a

possibilidade de sua não validação em pleitos jurídicos (AORP, 2010).

Dentro do relacionamento profissional/paciente devemos considerar a

existência característica de direitos e deveres e que quando, por qualquer razão,

exista a quebra na confiança por parte do paciente para com o profissional, aquele

pode acreditar que qualquer falha no decorrer do tratamento foi ocasionada pelo

Cirurgião-Dentista, e advir daí a intencionalidade da reparação de possíveis danos,

por meio jurídico (TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008).

Segundo MORRIS (apud TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008) os consumidores

apresentam-se mais bem orientados quanto aos seus direitos e com maior

expectativa nos resultados a serem obtidos em tratamentos dentários.

Em ocorrências legais que questionam o trabalho executado por profissional

dentista, faz-se importante a comprovação documental dos atendimentos realizados,

sendo estes a melhor prova do correto cumprimento legal do profissional

(TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008).

Segundo SIMÕES e JURIC (apud TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008), as imagens

em odontologia podem ser divididas naquelas realizadas como forma de exames

complementares (radiografias, tomografias e ultrassonografias) sendo as

executadas como base de diagnóstico e acompanhamento clínico e as realizadas

48

com a finalidade de registro clínico na evolução do tratamento, principalmente nos

casos de tratamentos estéticos, como as fotografias.

As imagens quando devidamente realizadas e arquivadas tendem a ser

grandes aliadas em casos de ações cíveis, bem como determinante na orientação

pericial do acompanhamento clínico (TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008).

Conforme MASIOLI (2010), o uso das imagens podem ajudar a esclarecer

questões comuns no dia-a-dia do profissional odontológo, bem como ser

complemento para “arquivos forenses”, tendo seu uso em processos legais.

Para MORAES (id., 2008) a consideração de imagem consiste na

representação de uma pessoa. Para MANZONARES SAMANIEGO (ibdi., 2008), a

imagem está definida como a representação gráfica da figura humana, estática ou

móvel, bi ou tridimensional, de uma pessoa viva ou morta, não estando restrita a

fisionomia, mas a qualquer parte do seu corpo. Com base nesta afirmação qualquer

imagem, radiográfica ou fotográfica, se caracteriza pela reprodução do ser-humano

o que acaba por incorporar questões éticas para seu uso, “Direito de Imagem” com a

necessidade do consentimento para seu uso. Cite-se:

“Código Civil – Capítulo II Artigo 20 – do direito de personalidade: salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça, [...], a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento, e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se se destinarem a fins comerciais.”

“Código de Ética Odontológica – Capítulo VI Artigo 9 – do sigilo profissional: “ Constitui infração ética: I – revelar, sem justa causa, fato sigiloso de que tenha conhecimento, em razão do exercício de sua profissão”

“Código de Ética Odontológico - Capítulo X Artigo 20 – das entidades prestadoras de atenção à saúde: os profissionais inscritos, quando proprietários, ou responsável técnico responderão solidáriamente com o infrator pelas infrações éticas cometidas”.

49

O desenvolvimento da fotografia digital tem sido amplamente divulgado,

devido a sua imediata visualização, facilidade de arquivamento e melhora na

qualidade das reproduções das imagens com crescente redução do custo dos

equipamentos e quase que total nulidade no processamento e tem-se mostrado uma

ferramenta bastante útil na formação do prontuário odontológico (TEDESCHI-

OLIVEIRA, 2008; MANUAL, 2002; CONSTANTINO, GOMES, 2002).

O que podemos observar é a dificuldade da utilização dos prontuários

produzidos, que na sua maioria apresentam uma grande quantidade de incorreções

como erro de anotações, relatórios incompletos, troca de elementos dentários,

ausência de documentos entre outros, falhas estas que acabam por inutilizar o

prontuário como documentação jurídica, existindo inclusive grande risco de

tornarem-se contrapostos ao profissional (TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008).

A correlação do Cirurgião-Dentista como fornecedor, segundo o Código de

Defesa do Consumidor, Lei 8078/90, torna o prontuário uma ferramenta essencial,

não somente para o acompanhamento do tratamento, mas principalmente como

documentação comprobatória em ação civil, principalmente com a consideração do

fato de inversão do ônus da prova (TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008).

Em caso de aparato eletrônico, fazendo-se necessária a avaliação da

veracidade documental e esta se dará pela avaliação de perito, que através de

emissão de laudo, tenderá a prestar posteriores esclarecimentos sobre a validade

dos documentos que foram apresentados, que por meio de bites, representam a foto

(art. 429, Código Processo Civil - Do Perito) (TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008).

50

O acréscimo de imagens à documentação de prova acaba por enriquecer o

laudo pericial, auxiliando de forma bastante abrangente a correta determinação da

sentença judicial (TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008).

Podemos ainda observar que mesmo as imagens convencionais apresentam

a possibilidade de manipulação, segundo BLITZER E JOBOBIA (apud TEDESCHI-

OLIVEIRA, 2008), pela geração de um novo negativo retirado da impressão

fotográfica alterada de um negativo original, e que transformado em arquivo digital

apresenta ainda maior facilidade de manipulação.

Pode-se manter a autenticidade das imagens digitais, tanto fotografias,

radiografias ou o completo prontuário, sendo estes documentos arquivados em

banco de dados específicos que permitam seu resgate somente no formato leitura,

com duplicação, em arquivo e em separado, caso se faça necessária correção

(TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008).

O Código Civil que não contesta o uso das imagens digitais, entretanto, o

Código do Processo Civil obriga a necessidade da apresentação do negativo em

fotografias, conforme descrito abaixo:

“Código de Processo Civil - Artigo 383: qualquer reprodução mecânica, como a fotográfica, [...] ou de outra espécie, faz prova dos fatos ou das coisas representadas, se aquele contra quem foi produzida lhe admitir a conformidade;

Artigo 385: a cópia de documento particular tem o mesmo valor probante que o original, cabendo ao escrivão, intimando as partes, proceder a conferência e certificar a conformidade entre a cópia e o original;

§1º - quando se tratar de fotografia, esta deverá ser acompanhada do respectivo negativo.”

Com a criação do Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileiras (ICP), ocorreu

o amparo legal pela Medida Provisória 2200/2001, com a criação de algumas regras

51

necessárias para ordenamento jurídico, sendo dado por base da resolução nº2/2001,

do Comitê Gestor do ICP-Brasil, determinando como verdadeiros os documentos

eletrônicos com sua respectiva “assinatura eletrônica” e consequente Certificação

Digital (TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008; CONSTANTINO, GOMES, 2002).

Segundo SOARES ET AL (id., 2008), sendo a única forma válida,

juridicamente aceita, como prova, não sendo, porém, decisão unânime no meio

jurídico.

Devemos ressaltar que em virtude do uso cotidiano de documentos digitais,

por meio de transações via internet, acabam expostos os demais documentos

digitais em aceitação jurídica, caso não sejam contestados pela parte reclamante, e

sendo ainda, em caso de refuta, admitidos como prova após avaliação pericial,

cabendo para tanto a livre decisão do juiz responsável pelo caso (TEDESCHI-

OLIVEIRA, 2008).

Em situação de pleito judicial por ação de cobrança por danos, não constatou-

se, até o presente, a determinação de falsificação de documentação apresentada

por base da defesa, contra Dentistas, entretanto, evidencia-se sim uma falta notória

de documentos, e incorreto preenchimento destes, fato este que acaba por acarretar

o comprometimento das provas materiais destinadas à evidenciação do correto e

efetivo cumprimento do dever profissional (TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008).

A produção de imagens adquiridas dos pacientes do início ao fim do

tratamento, desde que devidamente autorizadas, independentemente do meio de

produção, mecânico ou digital, apresentam-se com grande valor legal, cabendo ao

juiz a determinação de sua aceitação ou não como parte integrante dos autos e em

52

caso de contestação da sua veracidade, assim como os demais documentos, cabe

ainda a avaliação pericial da sua autenticidade, que não sendo repudiada pelo

perito, pode ser agregada ao processo em detrenimento a orientação mais clara e

completa da decisão judicial (TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008).

Fica então evidenciado a necessidade do comprometimento do Cirurgião-

Dentista coma correta e completa elaboração do prontuário odontológico, agregando

a maior quantidade de informações possíveis, fazendo sempre que necessário e

possível o uso da imagem como meio importante de defesa em caso de inesperada

necessidade de comprovação contraria a fato negativo alegado por paciente em lide

jurídica (TEDESCHI-OLIVEIRA, 2008).

2.5.2.2. Documentação Digital

Desde o desenvolvimento e aprimoramento dos primeiros computadores

pessoais, na década de 80 e até o presente, vê-se um avanço na utilização da

informática na clínica odontológica, através da formatação de “softwares” específicos

desenvolvidos inicialmente pela Associação Brasileira de Usuários de Computador

na Odontologia (ABUCO) e pela Sociedade Brasileira de Informática e Saúde (SBIS)

(MORAES, MAHL, 2004).

A afirmação de que a informática teve grande influência e importância na

prática dentária pode ser evidenciada através da afirmação de Gilberto Paiva de

53

Carvalho, em seu trabalho sobre Prontuários Digitais em Odontologia, que diz: “ ser

a informática é a mais importante tecnologia introduzida na prática diária

odontológica” (MORAES, MAHL, 2004).

A implementação da informática deu-se inicialmente, em consultórios e

clínicas, com a função básica de administração, contábil, financeira, de

comunicação, por meio de correspondências, agenda entre outros, posteriormente

sendo agregada como ferramenta para elaboração e registro de prontuários

(MORAES, MAHL, 2004).

A informática, mais do que somente uma ligação direta no consultório, teve

sua influência de forma ainda mais evidente no avanço tecnológico nos

equipamentos de diagnóstico por imagem, com a melhoria na qualidade das

imagens produzidas, por meio de equipamentos mais seguros, e de maior precisão

(MORAES, MAHL, 2004).

Com o auxilio da computação, encontramos a imaginologia em grande

vantagem, sendo que quase toda documentação pode ser arquivada de forma

digital, em relação à documentação física. Dentre as vantagens que podem ser

enumeradas encontramos: (MORAES, MAHL, 2004):

a) Localização imediata de dados e de informações;

b) Transmissão e acesso instantâneo em rede;

c) Maior possibilidade de pesquisa;

d) Relatórios estatísticos;

e) Laudos de interpretação automatizados;

f) Possibilidade de trabalhar com inteligência artificial.

54

A técnica da radiologia digital teve seu surgimento na década de 70, em

outros países, como uma área de maior busca no aperfeiçoamento nos dias de hoje

(MORAES, MAHL, 2004).

Segundo Whaites (2003) as imagens digitais podem ser processadas de

duas formas: a maneira direta aonde a imagem produzida é visualizada, em forma

digital, em tempo real, por meio de placas para captura de imagens, conectadas a

aparelhos de conversão de imagem, ou equipamentos digitais (radiográficos,

tomográficos, ressonância, fotográficos) ligados diretamente ao computador

coordenado por softwares específicos; ou indireta, por meio da conversão digital da

imagem real, por técnica convencional, após transcrição por meio de scaner.

As imagens, diretas ou indiretas, uma vez incorporadas ao sistema eletrônico,

por meio de programas específicos, podem sofrer ajustes e alterações, com a

finalidade de melhoria da visualização, aprimoramento de diagnóstico ou como

correção informativa ao paciente. Também apresentam-se com a vantagem de

arquivamento com a necessidade de menor espaço físico que as radiografias

convencionais, bem como não necessitam locais com condições específicas a fim de

evitar a ação das intempéries, não estando sujeitas a umidade, manchas e/ou

fungos (MORAES, MAHL, 2004).

Quanto à imaginologia digital ainda encontramos outros dois diferenciais, de

grande relevância, no que se relaciona a biossegurança, pois os equipamentos de

captura digitais apresentam uma menor necessidade de tempo de exposição e

quantidade de radiação para obtenção de uma imagem com qualidade, podendo

ainda sofrer correções pelo computador, e quanto ao resguardo do meio ambiente,

55

uma vez que não temos o descarte de soluções de processamento (MORAES,

MAHL, 2004; FALCÃO, SARMENTO, RUBIRA, 2003).

Na imaginologia, não somente as radiografias, mas também as fotografias

apresentam seu valor no processo de avaliação desenvolvimento nos tratamentos,

atualmente constituindo um recurso cada vez mais utilizado com o aprimoramento

das técnicas digitais (MORAES, MAHL, 2004; FALCÃO, SARMENTO, RUBIRA,

2003).

A fotografia digital apresenta-se com grandes vantagens na formação do

prontuário odontológico por constituir-se em um recurso de custo relativamente

baixo, com decrescente queda no valor dos equipamentos, extra e intra-orais, não

necessitando despesas adicionais com filmes ou revelação, de visualização imediata

e com necessidade de pequeno espaço para arquivamento, não se esquecendo da

possibilidade, assim como as radiografias, de serem corrigidas e alteradas para

demonstração, de possível resultado e evolução clínica, ao paciente em consulta

(MORAES, MAHL, 2004; FALCÃO, SARMENTO, RUBIRA, 2003).

A facilidade de arquivamento digital, pelos altos avanços na área de

informática, favorece diversas possibilidades de mídia para armazenamento dos

arquivos produzidos em consultório, tornando a produção digital cada vez mais um

facilitador na captura de imagens, para compor o prontuário, no cotidiano do

profissional odontólogo (MASIOLI, 2010).

Contudo é importante salientar que apesar do aprimoramento dos

equipamentos disponíveis no mercado, existem pequenas alterações quanto à

56

qualidade das imagens produzidas, em contraposição ao método mecânico de

obtenção de imagens, segue (MORAES, MAHL, 2004):

a) A medição da imagem é dada por divisão de linhas por cm ou

pol., quanto maior o número de linhas melhor a resolução, para cada 500

pares de linhas temos, correspondentes na forma digital, 1.000 pixel/cm, que

resultaria em uma definição de 8,6 milhões de pixels/cm em um filme de

slide; Em comparação a uma fotografia convencional, ainda assim, seria 8x

menor;

b) As fotografias convencionais não apresentam limitação na sua

escala de cor, reproduzindo fielmente todos os tons capturados, enquanto

que na imagem digital alcançamos uma resolução máxima de 16 milhões de

cores.

Tais fatores não são de grande influência na avaliação da imagem fotográfica

digital, considerando os parâmetros do olho humano, tornando-se imagens

satisfatórias para fins científicos, porém com reduzida qualidade em relação às

imagens convencionais (MORAES, MAHL, 2004).

Juntamente com as radiografias e as fotografias encontramos a possibilidade

da digitalização de laudos de interpretação radiográfica que além de poderem ser

armazenados com os mesmos benefícios dos demais documentos de imaginologia,

podem dispor de programas específicos para auxilio na definição de determinadas

patologias servindo como facilitadores de diagnósticos (MORAES, MAHL, 2004).

Isto posto, fica extremamente evidente a importância dos recursos digitais e

quão facilitadores na imaginologia se tornaram, porém com base nos dados

57

apresentados quanto à possibilidade de manipulação dos dados digitais cabe uma

reflexão quanto a sua validade jurídica, observando que “o computador é uma

espécie de máquina que produz simulações, ou seja, faz a decomposição da

informação (inputs) em uma linguagem de máquina (bits), e a recomposição em

representações (outputs) que simulam as imagens humanas, textos verbais, sons,

imagens, entre outros. Neste sentido todo output é gerado através de uma

simulação” (MORAES, MAHL, 2004).

Devido a característica da composição de dados (bits), um código binário,

composto de agrupamentos de números “1” e “0”, a interpretação da máquina se dá

em igualdade para uma música, um texto, uma imagem, entre outros, sendo

somente representado por meio de um programa específico, o que torna os dados

deveras instáveis e de fácil manipulação (MORAES, MAHL, 2004).

Alguns equipamentos destinados à produção de imagens com a finalidade de

diagnóstico apresentam um sistema de bloqueio que impedem a adulteração, para

fins ilícitos, das imagens geradas, permitindo somente alteração de brilho e

contraste, porém, boa parte dos equipamentos, principalmente os de uso em

procedimentos de menor complexidade, não dispõe de tal recurso, podendo ser

adulterada ou até mesmo excluída de um banco de dados, estando sujeitos somente

a disposição ética de seu usuário (MORAES, MAHL, 2004).

Diante desta situação fica claro a dificuldade da aceitação legal da

documentação digital, podendo ser recusado como prova, em ação jurídica

(MORAES, MAHL, 2004).

58

Está claro, também, a tendência da migração dos sistemas para arquivos

informatizados, cada dia mais presentes na vida de todos os indivíduos, notando-se

por meio da internet, veículo de negociações, comércio, transações bancárias, entre

outros; fatos estes que acarretaram necessidade de estabelecer um sistema de

segurança para autenticação de dados, para impossibilitar possíveis fraudes. Assim

como a informatização passa a ser mais rotineira o uso dos mecanismos de

segurança também devem ser, facilitando desta forma a aceitação legal dos

documentos digitalizados com finalidade de documentação odontológica (MORAES,

MAHL, 2004).

Para a regulamentação dos arquivos digitais foi criado em 24/08/2001, pela

Medida Provisória 2.200-2 a Infraestrutura de Chaves Públicas – Brasil (ICP-Brasil),

funcionando como um “Cartório Virtual”, como “reconhecimento de firma” eletrônico,

com a destinação de “garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de

documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações

habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações

seguras” (MORAES, MAHL, 2004).

Este sistema destina-se ao arquivamento de dados digitais ou digitalizados

com a impressão de uma chave de segurança recebida do ICP-Brasil, após cadastro

do usuário, em banco específico, com cópia recebida via internet em um dos

cartórios integrantes da Associação dos Notários e Registradores do Brasil

(ANOREG), não podendo ser alterada em nenhum dos “bites” originais, com o risco

de perda da certificação de segurança. O arquivo original pode ser copiado e

armazenado em local em separado para as possíveis e necessárias modificações,

garantindo a notoriedade do original com fé pública (MORAES, MAHL, 2004).

59

Quanto à posse e guarda dos documentos é salutar salientar que da mesma

forma que os documentos não digitais aqueles gerados por meio eletrônico são de

propriedade dos pacientes, devendo ser entregues sempre que da sua solicitação,

com reconhecimento de sua autenticidade e guarda de cópia integral, sejam eles

originalmente arquivados em meios magnéticos, ópticos ou microfilmados, com

tempo de guarda prevista por 20 anos a contar da última anotação feita, para

comprovação de ação licita em caso de possível pleito judicial (MORAES, MAHL,

2004).

2.6. DIREITO A DOCUMENTAÇÃO ODONTOLÓGICA

No posicionamento clínico, na relação profissional/paciente, o direito

encarrega-se de uma modificação direta na relação humana, atribuindo-lhe uma

conotação jurídica direta entre o poder e o dever, direcionando cada indivíduo a uma

posição na qual sua vontade é prevalente, garantindo direitos e deveres específicos

(SEVERO et al., 2002).

Os procedimentos realizados em odontologia, diante do Código de Defesa do

Consumidor, são formadores de relações de consumo, portanto podemos considerar

que os procedimentos destinados a exames radiográfico também os são, deixando

claro que o prestador de serviço radiológico, torna-se um fornecedor em uma

relação comercial (SEVERO et al., 2002).

60

Cite-se o Código de Defesa do Consumidor:

“Artigo 2º - Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produtos ou serviços como destinatário final.

Artigo 3º - Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como antes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

§ 2º - Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito, e securitária, salvo as decorrentes de relações de caráter trabalhista.”

Pelo mesmo código podemos ainda verificar em seu Artigo 6º, item III, o

amparo, nas relações de consumo, da necessidade da correta e clara informação de

todo o procedimento a ser realizado, a qualidade, o preço, bem como a notificação

dos riscos pertinentes a execução do serviço (SEVERO et al., 2002; CÓDIGO,

2003).

Segundo as considerações acima, podemos afirmar, em base legal que o

profissional Cirurgião-Dentista, de qualquer especialidade e/ou técnico em

radiologia, deve oferecer um serviço de qualidade fornecendo ao paciente todas as

informações pertinentes ao procedimento a ser realizado (SEVERO et al., 2002).

Todos os dados fornecidos pelos pacientes que se apresentem com a

finalidade diagnóstica ou para execução de qualquer procedimento, sendo estas em

qualquer forma, estando este, no setor público ou privado são de sua propriedade,

considerando o profissional, com a autorização do paciente, o detentor temporário

do direito de uso para fins de tratamento, não sendo de impedimento seu livre uso,

afirmação esta fundamentada no Código Civil Brasileiro, em seus Artigos 524, 525 e

527 Capitulo I, Do Direito da Propriedade, Capitulo II, Do Direito das Coisas, Artigos

61

485 e 486, da aquisição e posse, do mesmo Capitulo, Artigos 493 e 494, e dos

efeitos da posse Capitulo III, Artigo 505 (SEVERO et al., 2002).

Desta forma consideramos que pelo fato do paciente, direta ou indiretamente

pagar pelo exame radiográfico, bem como tratar-se de informação pessoal destinada

exclusivamente para diagnóstico e/ou tratamento, este documento é, com base no

Código Defesa do Consumidor e Código Civil Brasileiro, de propriedade do paciente

sendo de direito deste a reivindicação da sua devolução a qualquer tempo (SEVERO

et al., 2002).

Varella e Tamoto (apud SEVERO, 2002), desenvolvem a tese da divisão dos

profissionais em três categorias conforme as opiniões apresentadas, sendo

defendido por alguns que a documentação pertence ao profissional, os

“absolutistas”, uma vez não sendo do interesse do paciente e é parte da

documentação profissional, uma outra vertente, os “simplistas”, que indicam que

pelo pagamento a radiografia pertence ao paciente, devendo ser entregue, e entre

alguns autores a definição de uma terceira classe na defesa de que a detenção da

radiografia esta ligada a necessidade da solicitação.

Holmes (id., 2002), defende a importância da radiografia como documento

legal devendo permanecer sob a guarda do profissional por 8 anos após o término

do tratamento, subdividindo o direito de posse com base no pagamento, não sendo

válido no serviço público pela inabilidade do pagamento.

Hirschmann (ibid., 2002) declara que o paciente paga pela opinião do

profissional, não pelo documento físico, sendo este parte do prontuário, com

finalidade de diagnóstico, tratamento e acompanhamento.

62

A resolução do CFO – 179/91, que em seu Artigo VI, descreve: “elaborar as

fichas clínicas dos pacientes, conservando-as em arquivo próprio”, define, para

RAMOS, CROSATO e MAILART (op. cit., 2002), o entendimento mais amplo da

definição de ficha clínica, com reflexo de toda a documentação, produzida pelo

profissional, pertinente ao andamento do tratamento, incluindo a documentação

radiográfica.

Com base na Constituição Brasileira de 1988, em seu artigo 5º, inciso XIV, é

assegurado a todos o acesso a informação, determinando desta forma que o

paciente apresenta pleno direito à documentação clínica, pertinente ao seu

tratamento, porém com variante em relação à documentação radiográfica sendo de

propriedade de quem a custeou (SEVERO et al., 2002).

Por definição do Desembargador João Pedro Freire (apud SEVERO, 2002),

em manifesto voto no tribunal de justiça, descreve que “o prontuário médico-

hospitalar não pertence ao estabelecimento de saúde, mas, ao paciente”. Esta

alegação é reforçada pela farta inexistência de reprovação à negativa de

fornecimento da documentação ao paciente com fornecimento de parecer favorável

a este.

Reiterando que a documentação odontológica, especialmente as radiografias

intra-orais, de grande volume em consultório, e é de propriedade do paciente

estando sob temporária guarda do profissional enquanto perdurar o tratamento,

sendo relevante a duplicação, para fins de caráter legal, quando da sua entrega ao

final da conclusão do tratamento ou quando efetuada a solicitação de retirada

(SEVERO et al., 2002).

63

Descrito na literatura que a correta guarda e organização das radiografias

garantem maior tempo de posse pelo profissional, devendo este estar atento a

importância legal da documentação como prova (SEVERO et al., 2002).

Fica caracterizado que, talvez, a maior dificuldade no armazenamento da

documentação seja o local apropriado e o espaço presente, podendo este ser

compensado por meio da digitalização, desde que seguindo-se os parâmetros

vigentes em lei (SEVERO et al., 2002).

A legislação também protege o uso das imagens, conforme descrito

anteriormente, sendo de finalidade exclusiva para o tratamento, devendo ser

entregue ao paciente sempre que solicitado, não podendo usar desta para

exposição pública senão por meio de expressa autorização (SEVERO et al., 2002).

2.7. JURISPRUDÊNCIA

Com a finalidade de corroborar as afirmações acima, foi efetuado

levantamento nos sites dos Tribunais de Justiça dos Estados de São Paulo, Santa

Catarina e Rio Grande do Sul, sendo possível a identificação de inúmeros casos

concretos relacionados à condenação e a indenização, decorrentes de

procedimentos odontológicos, nas mais diversas áreas da odontologia, sendo mais

evidentes naquelas onde existem a prevalência do condicionamento estético, ligado

ao tratamento dentário ou ainda em casos de tratamentos extensos ou complexos e

de alto custo, como processos ortodônticos, implantológicos, não estando

64

descartadas ações por procedimentos curativos mais simples, cite-se as exodôntias

e procedimentos restauradores e endodônticos.

Nestas pode-se observar que a insatisfação do paciente decorreu, na sua

maioria, não da falta de conclusão do tratamento, mas decorrente da impossibilidade

do profissional alcançar os anseios específicos dos clientes, originário, tal resultado,

pela ausência de adequada informação ou insuficiência de dados para o correto

diagnóstico e consequentemente a precisa e adequada elaboração do plano de

tratamento, acabando por não dar, ao paciente, a ciência da correta limitação dos

resultados a serem alcançados bem como as possíveis sequelas do tratamento.

Pode-se observar que em sua maioria, que a condenação, após julgada a

ação, teve base na insuficiência ou a não observância da qualidade das provas

geradas, pelos profissionais, com a finalidade de comprovar que os fatos expostos

pela parte contrária, estavam em desacordo com a verdade, cabendo ao magistrado

somente a explicitação da pena cabível ao pleito.

Dentre essas ações exemplificamos, conforme descrição de casos:

2.7.1. Ação de Apelação Cível, nº 439.360-4/3, Comarca de São Paulo:

Por solicitação de responsabilidade civil de Cirurgião-Dentista, por perda

irreversível de sensibilidade da língua após procedimento cirúrgico para extração de

terceiro molar inferior, caracterizando-se o dever de indenizar danos materiais e

morais, após avaliação pericial, dando condenatória com montante de R$

65

65.000,00. Em recurso, apesar da alegação da odontologia como obrigação de

meio em virtude de ação “complexa” e “dependente de imprevisíveis ações do ser

humano”, existiu a confirmação do nexo causal, sendo da requerida “comprovar

que o evento se deu por fatalidade”, não o sendo, relato dos termos do Artigo 333,

item II, do Código de Processo Civil. Deu-se como fato a ação culposa, por

imperícia ou imprudência, aplicando-se o Artigo 186, do Código Civil de 2002,

“lesão gravíssima é a que provoca inutilização do órgão, membro ou função[...]”,

”[...] este tipo de lesão deixa marca indelével e na maior parte causa doloroso

trauma psicológico”. Pela exposição foi negado provimento e condenada a requerida

ao pagamento do valor estipulado bem como os honorários advocatícios da parte

contrária ( TJSP, 2010).

2.7.2. Ação de Apelação Cível, nº 240.541.4/4-00, Comarca de Santos,

Estado São Paulo: ( TJSP, 2010).

Por ação de responsabilidade civil por erro odontológico (extração de

Terceiro Molar (ciso) com fratura mandíbular), sendo para tanto dada à alegação

pelo apelante de que a fratura teria sido ocasionada pelo profissional que atendeu a

requerente após a extração, provimento previamente negado, com conversão da

sentença em perdas e danos dada à impossibilidade de realização de novo ato

cirúrgico decorrente de prazo superior a 20 anos do ocorrido. O valor foi

estipulado com base em “dias-multa”, com arbitramento do valor de R$ 324.000,00.

Determinado que o dano foi decorrente de ação intempestiva do apelante, que

66

intitulou defesa no sentido de que notificou à reclamante das dificuldades e riscos do

procedimento. Observou-se, porém que ao longo de 60 dias, não esboçou a

indicação de um exame radiográfico complementar, apesar da contínua queixa de

dor pós-cirúrgica, apenas prescrevendo analgésicos e anti-inflamatórios, sendo

verificada a fratura, tão somente, mediante a solicitação do referido exame por outro

profissional.

Com base na única radiografia apresentada “foi possível visualizar que a

imagem revela um dos casos mais simples para uma extração cirúrgica”, “as raízes

encontravam-se com rizogenese incompleta”. Segundo relato no processo “a falta de

planejamento e execução correta dos passos cirúrgicos...”, “técnica errada e força

física excessiva e descontrolada, terminando por provocar a fratura da mandíbula,

caracterizando seu ato imprudência, imperícia e negligência”. É mister a correta

conduta durante o procedimento devendo ser realizado “somente após cuidadosa

avaliação clínica e radiográfica e construção de talas pré-operatórias”. “duas

semanas após o ocorrido “o apelante nem se dignara a requisitar a radiografia

necessária à constatação da fratura”. “ tem patrimônio imobiliário razoável”, donde

negou-se provimento de recurso (TJSP, 2010).

67

2.7.3. Ação de Apelação Cível, nº 2008.013496-5, Comarca de Blumenau,

Santa Catarina:

Ação de indenização, Responsabilidade Civil do Odontólogo decorrente de

tratamento dentário estético não bem sucedido, caracterizado a obrigação de

resultado, sendo excluído caso fortuito ou de força maior (TJSC, 2010)

“A atividade dos dentistas pode encerrar obrigação de meio ou resultado,

estando patenteada a segunda em hipóteses como o tratamento para clareamento

dental ou a colocação de próteses, que visam, em regra, melhorias de ordem

estética e fisiológica. “Diante de obrigações de resultado, basta ao lesado

demonstrar, além da existência de contato, a não obtenção do resultado

prometido. Isso é suficiente para caracterizar o inadimplemento contratual.”

(TJSC, 2010)

Segundo narração “o objetivo da visita consistia apenas num exame de rotina,

mas que afinal restou pactuado um tratamento estético por sugestão da dentista

requerida”. O tratamento orçado em R$ 1.400,00, deveria ser disponibilizado por

recursos próprios por não ser coberto pelo plano de assistência da requerente, tendo

sido orientado, segundo a Dentista tão somente a aplicação de facetas de

porcelana, tendo findado, porém, com a confecção de coroas protéticas em

substituição aos elementos dentários originais. Estas coroas acabaram por

ocasionar dano estético acentuado por retração gengival com necessidade de

sucessivos procedimentos cirúrgicos corretivos, sem êxito. Concretizado a ação com

solicitação de ressarcimento de danos materiais no montante de R$ 12.576,56 para

68

cobertura de gastos com procedimentos reparadores e danos morais e estéticos

equivalentes a R$ 100.000,00. (TJSC, 2010)

Fica descrito na ação: “[...] as fotos mostradas no documento de

fls.110 demonstram claramente que houve erro de instalação das próteses,

pois há uma desadaptação nítida das próteses...”

Segundo o perito: “caso as radiografias fossem tiradas na fase inicial do

tratamento protético os problemas poderiam ser evitados, pois haveria

condição de melhor adaptação das próteses e dos núcleos”.

Segundo apresentação documental e pericial ficou negado recurso,

mantendo-se a sentença indenizatória (TJCS, 2010).

2.7.4. Ação de Apelação Cível, nº 2007.064655-3, Comarca de Criciúma,

Santa Catarina: (TJSC, 2010).

Por parte do requerente, devido ação de indenização por danos morais

decorrente de tratamento odontológico inexitoso, devido à fratura de instrumento

endodôntico no conduto radicular com inexistência de nexo de casualidade

afastando-se a responsabilidade civil do profissional (TJSC, 2010).

Ausente o nexo de causalidade entre o dano sofrido e a conduta do agente,

requisito indispensável para a responsabilização civil, a improcedência do pleito

indenizatório é medida que se impõe” (TJSC, 2010).

69

O requerente solicitou por meio de ação cível, indenização por danos

materiais e morais, decorrente de dor física e abalo psíquico, consumada pela lesão

periapical decorrente de tratamento endodôntico malogrado, com fratura de

instrumento metálico (lima) no interior do conduto radicular (TJSC, 2010).

Contestação do ato, por parte do requerido, alegando que em exame clínico

realizado antes do inicio do tratamento foi constatado grande cavidade de cárie,

procedendo tão somente a desinfecção da cavidade e medicamento de demora,

com a realização de exame radiográfico, pelo qual foi evidenciado a presença de um

fragmento de instrumento endodôntico (TJSC, 2010).

Conforme registro em ficha clínica ficou evidente a inscrição do fato com

alegação da notificação prévia do requerente, por outro profissional, da fratura do

instrumento (TJSC, 2010).

A apelação baseou-se na tentativa do estabelecimento de relação da ação

omissiva por parte do requerido, com caracterização de conduta ilícita e agravo

posterior a saúde do requerente, com finalidade de estabelecimento do nexo causal

(TJSC, 2010).

“No intento de comprovar suas alegações, o recorrente apresentou diversas

radiografias tiradas em 2004 e 2005, nas quais fica evidente a lesão no dente;

todavia, por tais documentos não há como precisar quando o pedaço de lima foi

deixado no interior do dente...”. ”Salienta-se, por oportuno, não ser viável a inversão

do ônus da prova, consagrada pelo Código de Defesa do Consumidor, de modo que

cumpria ao autor apelante comprovar o fato constitutivo de seu direito, qual seja, que

70

a Dentista apelada foi a responsável pela fratura do instrumento em seu dente”

(TJSC, 2010).

Neste sentido, segundo autos do processo, esclarece Nelson Nery Junior:

“Prestação de serviços médicos. Inversão do ônus da prova. Impossibilidade

de aplicação do Código de Defesa do Consumidor, Artigo 6º, tendo em vista que em

face da regra do Código de Defesa do Consumidor, Artigo 14, inciso 4º, e do Código

Civil de 1916, Artigo 1545 ( correspondente ao Artigo 951 do Código Civil de 2002),

os médicos e demais profissionais liberais só podem ser responsabilizados por atos

que realizem no exercício de suas atividades, quando tenham agido com

imprudência, negligência ou imperícia, circunstâncias que devem ser comprovadas

pelo próprio autor da pretensão” (TJSC, 2010; CONSTANTINO, GOMES, 2002).

Isto posto, segundo o relator ficou negado o provimento do recurso,

mantendo-se decisão da inicial (TJSC, 2010).

2.7.5. Apelação Cível, número 2006.044097-2, Comarca de Itajaí, Santa

Catarina: (TJSC, 2010).

Formulado pelo profissional, decorrente de Ação de Responsabilidade Civil

para reparação de danos morais e materiais decorrentes de erro odontológico,

julgado em favor da requerente, em petição inicial, com ônus indenizatórios de R$

36.000,00, para danos materiais e morais, além de honorários advocatícios

71

equivalente a 20% do montante da ação. Dado na inicial, por hipossuficiência, da

requerente o direito da inversão do ônus da Prova, conforme o artigo 6º, inciso

VII, do Código de Defesa do Consumidor, dando-se justa a causa por não ter, o

profissional, acompanhado de forma diligente, o pós operatório da paciente, após

processo de implantação de elementos dentários artificiais, não fornecendo provas

comprobatórias de que realizou-se o planejamento e a execução adequada de todos

os protocolos necessários para conclusão correta do procedimento (TJSC, 2010).

Manifesta na ação o relato que “ nos casos de responsabilidade civil de

profissional liberal ( subjetiva), verificada a hipossuficiência do consumidor ao

acesso e a técnica necessária para produção de provas, nada impede que o

Magistrado conceda a inversão do ônus da prova, até mesmo de oficio, incumbindo

ao prestador de serviços provar que não laborou com imprudência, negligência ou

imperícia” (TJSC, 2010).

Apesar do relato, indicar com comprovação de ficha clínica, bem como

radiografias, saúde bucal “deveras combalida”, foi explicitado que as alterações

infecciosas, pós-cirurgicas, se deram por “desleixo do profissional”, uma vez que não

promoveu correto acompanhamento, sem evidentes notificações de cuidados pós-

operatórios bem como registro de notificações de retorno para tal, a verdade é que

as provas coligidas neste sentido são deveras insubsistentes. “Tem-se que o

profissional não comprovou o recebimento das aludidas notificações pela paciente”

(TJSC, 2010).

Segundo prova pericial o não correto planejamento cirúrgico foi

colaborador para a condição de precariedade após procedimento de instalação dos

implantes (TJSC, 2010).

72

Com base nos fatos julgados pode-se afirmar que “ na conduta do Cirurgião-

Dentista existiu importante falta de diligência no trato com o paciente...”, conforme

sentença, “talvez até por desinteresse em atender bem a autora ( apelada), em

não sendo ela uma paciente particular que estaria pagando o valor justo da

cirurgia” (TJSC, 2010).

Quanto aos valores foi descrito que “o montante fixado pela sentença atende,

com eficiência, os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, mostrando-se

eficiente para lenir o abalo experimentado pela vitima, consusbstânciado na dor,

vergonha e humilhação gerados pela perda do tecido ósseo e gengival, e, ainda,

pela exposição das estruturas metálicas implantadas – bem como para, concreta e

eficazmente, inibir os lesantes na reincidência do ilícito” (TJSC, 2010).

Dado pela justa negativa de apelação com manutenção da sentença, dada a

petição inicial transitado em julgado (TJSC, 2010).

2.7.6. Recurso Inominado, nº 71002274934, Comarca de Campo Bom, Rio

Grande do Sul: (TJRS, 2010).

Em apelo por sentença proferida em ação inicial, negando pedido de

andamento do processo por necessidade de prova pericial a ser gerada por parte da

autora, bem como suas custas, a fim da determinação do nexo de casualidade, em

determinação da responsabilidade profissional por ato odontológico malogrado,

73

conforme relatado, decorrente de dores oriundas no local de tratamento endodôntico

(TJRS, 2010).

Alega a autora ter procurado atendimento de outro profissional após

atendimento realizado pela reclamada, com realização de tomografia

computadorizada, nesta evidenciada a presença de “um corpo estranho no interior

do dente”, a verificar-se, após remoção cirúrgica, tratar de fragmento de uma broca,

solicitando reparação material pelas espensas do tratamento inicial e dos

reparadores a posterior, bem como postulando a reparação moral pelo cometido

(TJRS, 2010).

Promoveu-se pela reclamada contestação, pela alegação de necessidade da

perícia técnica, considerando que o atendimento inicial da reclamante deu-se em

abril / 2008 e o último atendimento em junho/2008, com acompanhamento do

procedimento, sendo que os exames acostados aos autos são de 10/2008, não

estando presente o fragmento relatado, em exames radiográficos realizados

durante o acompanhamento até a data de conclusão, o que pode determinar que

a referida broca pode ter sido deixada por outros procedimentos, praticados por

outros profissionais (TJRS, 2010).

Como comprovação foram incluídos nos autos a ficha clínica da paciente e

todos os exames radiográficos realizados nas consultas de acompanhamento

posterior a intervenção (TJRS, 2010).

“Para decidir a responsabilidade da ré é imprescindível o exame técnico

destes supostos RX realizados após a obturação, circunstância imprescindível a

resolução do mérito da lide, sendo que os laudos particulares acostados pela autora

74

não são suficientes à comprovação dos fatos constitutivos do seu direito”. “Logo,

nada a reparar na sentença que determinou a extinção do processo diante da

complexidade da causa pela necessidade de produção de prova pericial.” (TJRS,

2010).

2.7.7. Ação de Apelação Cível, nº 70027281856, Comarca de Taquara, Rio

Grande do Sul: (TJRS, 2010).

Ajuizada por parte do Município, em contradita a solicitação de paciente

atendida em posto de saúde por profissional concursado, sendo desta, feito negado

provimento de anulação da sentença inicial de reparação de danos por insucesso de

extração de Terceiro Molar (ciso) malograda, com reparação indenizatória

equivalente a 500 salários mínimos, considerando a responsabilidade civil do

profissional bem como da responsabilidade subsidiária do Município com definição “

no caso de serviços públicos ou obras públicas executadas por pessoas jurídicas de

direito privado, a responsabilidade do Poder Público na indenização de eventuais

prejuízos sentido por terceiros é subsidiária e não solidária. A solidariedade exige

previsão legal e contratual, o que não se verifica no presente. Outrossim, a empresa

prestadora executora de obra pública possui personalidade, capacidade e patrimônio

próprios, com a qual responde pelos danos acarretados no desempenho das

atividades” (TJRS, 2010).

Deu-se provimento considerando o fato do profissional, em procedimento

exodôntico, com fratura e perda de parte óssea contigua ao elemento a ser extraído,

75

com declaração em processo onde apontou-se “a extração foi realizada de forma

negligente por parte do co-demandado, haja vista que tal procedimento se deu em

mínima cautela, ou seja, sem os prévios exames procedimentais que se faziam

necessários e inerentes a qualquer tratamento deste porte, como raios-X [...]”

“Saliento ainda que a responsabilidade do profissional pelos prejuízos à saúde bucal

da autora decorre de suas próprias declarações...”, sendo tipificado nesta parte que

uma vez que foi solicitado a autora o exame complementar e esta por sua vez não o

pode realizar, deu-se ainda, a continuação do procedimento, com a afirmação de ser

“tecnológicamente possível de fazê-lo”. Afirmação rebatida pela parte reclamante

“Sem dúvida que é possível a extração de um dente sem a feitura de Raios-X,

como também não se desconhece o descaso da Saúde Pública para com a

população carente, que sequer possibilita um exame radiológico, contudo,

entendo que o profissional poderia ter deixado de fazer o procedimento

cirúrgico ante a não apresentação do exame, principalmente porque o exame

tem por escopo dar ao profissional toda a segurança e garantia para poder

realizar bem o seu mister antes de um procedimento exodôntico sem pôr em

risco a saúde do paciente e o próprio conceito profissional...” (TJRS, 2010).

Foi considerada, ainda, a negligência plena do profissional ante as reais

necessidades do paciente, assumindo risco desnecessário, estando ciente da

possibilidade do dano que pudesse advir (TJRS, 2010).

Negado recurso, mantido sentença de reparação de danos (TJRS, 2010).

76

3. DISCUSSÃO

Segundo Carmelo (2006), Cunha (1952) e Lermon (1974) a Odontologia,

apesar de seu direto relacionamento histórico com a Medicina, do desenvolvimento

e aprimoramento técnico científico ao longo dos tempos, passa, cada vez mais por

razões mercantilistas, a ser estruturada com profissionais que acabam por

comprometer a qualidade de seus atendimentos, distanciando-se do caráter

biológico e humano da profissão, descaracterizando-se dos aspectos éticos e legais,

o que leva, por muito ao descontentamento de seus clientes;

Souza (2006), Melani (2006), Antunes et al. (2001) concordam que os

clientes, por sua vez, mais conscientes de seus direitos como consumidores e, por

conseguinte, mais exigentes quanto à qualidade dos produtos e serviços adquiridos,

amparados amplamente por uma legislação vigente, deveras protetora, tanto no

aspecto ético quanto no penal e civil, constando inclusive com uma legislação

própria, o Código de Defesa do Consumidor.

Este Código explicita a relação formal de consumo dos prestadores de

serviços médico/odontológicos executados por remuneração, determinando

insuficiência plena do consumidor nos processos de consumo, frente ao profissional,

considerando que primariamente desconhecedor dos procedimentos executados

durante o atendimento odontológico, garantindo-lhe, desta forma, o direito da

exigência da comprovação, em caráter judicial, da correta atuação do Odontológo

que o atendeu, estando isento do dever de como acusador gerar o ônus da prova

(CÓDIGO, 2003)

77

Antunes et al. (2001), Souza (2006), Costa (2008) e Falcão et al. (2003)

concordam que para tanto deve o Cirurgião-Dentista ficar atento ao pleno decoro no

atendimento de seus clientes, agindo de maneira ética e moral, dentro dos preceitos

legais, resguardando o dever da elaboração de completa e correta documentação,

principalmente utilizando-se dos recursos de diagnóstico por imagens, que, quando

corretamente solicitada, processada e acondicionadas apresentam finalidade, não

somente de uma assertiva quanto ao diagnóstico, plano de tratamento e

proservação do paciente, mas também, como subsídio legal de grande valia.

Conforme descreve Barbieri (2008) a atenção a estes preceitos contribuem de

maneira mais clara para fornecimento da correta informação quanto as

possibilidades de tratamento e os riscos e benefícios envolvidos, diminuindo desta

forma a possibilidade de insatisfação de seus clientes e futuras ações por perdas e

danos decorrentes de queixas quanto a possíveis atos de negligência, imperícia ou

imprudência durante o atendimento odontológico.

Elementos judiciários presentes em jurisprudências verificados nos Tribunais

de Justiça dos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo (2010)

casos transitados em julgado corroboram para afirmação de que as diversas

condenações por pleitos relacionados a ações de fato concreto, com a necessidade

de prova consubstânciada, tornam-se formadoras da condenação, dada a falta de

apresentação de documentação pertinente ao caso e/ou inclusão processual de

documentos incorretamente preenchidos ou danificados, sem ciência expressa do

cliente, não dando conhecimento dos fatos propostos pelo profissional, bem como a

explicita observação da falta de exames complementares para suporte pericial,

cabendo tão somente ao magistrado a estipulação de valores indenizatórios

78

mediante afirmada condenação, fato este observado por Tedeschi-Oliveira et al.

(2008).

Ainda lembramos, como descreve Severo (2002) que a documentação, por

determinação jurídica, pertence ao paciente, devendo ser entregue ou estar às

vistas do mesmo sempre que necessário, cabendo, somente, ao profissional, por

direito, resguardar seu sigilo, incluindo-se as radiografias e fotografias, modelos

entre outros, com anexo da declaração do direito de uso das imagens daquele que

pertence, sendo importante, em caso de liberação, por solicitação, a guarda de

cópias.

Antunes et al. (2001), Melani (2006), Souza (2006) e Garbin et al. (2006)

concordam que fica claro, também, que em situações onde mesmo havendo a

conduta correta e plena, por parte do odontólogo, o paciente, por motivos pessoais,

alheios a vontade do profissional, pode vir a buscar o poder judiciário, pleiteando

valores por insatisfação no tratamento ocorrido, este, dando-se a qualquer tempo.

Nestas ações, uma vez confirmado a relação de causa efeito, entre a ação ou

omissão do odontólogo e o dano ocorrido, faz-se pleno o direito do consumidor pelo

pleito, estando válido até cinco anos após a identificação do vicio, cabendo, desta

forma, ao acusado a juntada de documentos, que devem estar sob guarda, pelo

foro, por tempo indefinido, original ou cópia devidamente elaborada, com a inclusão

principalmente de exames complementares de imagem, como fotos, exames

radiográficos, modelos entre outros, os quais são destacados como suporte de

grande valia na orientação do representante jurídico, bem como servirão de base

para confirmação, por perito, de correto ato do Cirurgião-Dentista, caso se faça

necessário, segundo a orientação do magistrado, a correta elaboração da

79

documentação do prontuário do paciente, com recursos de imagens, em ações

jurídicas, são claramente sustentados pelo ditado popular que diz: “uma imagem

vale mais que mil palavras”.

80

4. CONCLUSÃO

A Imaginologia é uma ferramenta que contribui ativamente na elaboração de

diagnósticos como também para a elucidação de ações cíveis movidas pelos

pacientes, e estas, têm sido mais frequentes a cada dia, visto que a maioria das

Especialidades Odontológicas são caracterizadas como atividades fim.

A correta elaboração e manutenção do prontuário odontológico são

indispensáveis a todos os Cirurgiões-Dentistas, conforme rege a legislação vigente

no Brasil, tanto para a elaboração do tratamento, para a realização do mesmo e

após para a comprovação de sua correta conduta dentro dos preceitos éticos e

legais.

81

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