A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

96
FACULDADE DE LETRAS/ UFRJ LUCIANA DE ALBUQUERQUE DALTIO VIALLI A REDUPLICAÇÃO NO BABY-TALK: UMA ANÁLISE PELA MORFOLOGIA PROSÓDICA Rio de Janeiro 2008

Transcript of A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

Page 1: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

FACULDADE DE LETRAS/ UFRJ

LUCIANA DE ALBUQUERQUE DALTIO VIALLI

A REDUPLICAÇÃO NO BABY-TALK:

UMA ANÁLISE PELA MORFOLOGIA PROSÓDICA

Rio de Janeiro

2008

Page 2: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

A REDUPLICAÇÃO NO BABY-TALK: UMA ANÁLISE PELA MORFOLOGIA PROSÓDICA

Luciana de Albuquerque Daltio Vialli

VOLUME ÚNICO Dissertação de Mestrado apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa). Orientador: Prof. Dr. Carlos Alexandre Gonçalves

Rio de Janeiro Agosto de 2008

Page 3: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

Nº 96 VIALLI, Luciana de Albuquerque Daltio

A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica Dissertação (Mestrado em Letras Vernáculas- Língua Portuguesa)- Universidade

Federal do Rio de Janeiro, Faculdade de Letras. Orientador: Carlos Alexandre Victorio Gonçalves 1. Reduplicação. 2 Morfologia Prosódica. 3. Letras – Teses I. Gonçalves. Carlos Alexandre Victorio. (Orientador) II Universidade Federal do Rio de Janeiro. Programa de Pós- Graduação em Letras Vernáculas. III A Reduplicação no Baby-talk.

CDD:

Page 4: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

A Reduplicação no Baby-talk: Uma Análise pela Morfologia Prosódica Luciana de Albuquerque Daltio Vialli

Orientador: Professor Doutor Carlos Alexandre Gonçalves

Dissertação de Mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa). Examinada por: _____________________________________________________ Presidente, Prof. Doutor Carlos Alexandre Gonçalves _____________________________________________________ Profa. Doutora Christina Abreu Gomes - UFRJ _____________________________________________________ Profa. Doutora Carmen Teresa Dorigo - UFRRJ _____________________________________________________ Prof. Doutor João Antônio de Moraes – UFRJ, Suplente _____________________________________________________ Prof. Doutor Mauro José Rocha do Nascimento – CEFET, Suplente

Rio de Janeiro Agosto de 2008

Page 5: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

SINOPSE

Estudo sobre o fenômeno da Reduplicação na aquisição da

linguagem em português: situações de Baby-talk. Análise

morfo-prosódica, baseada nas noções de molde e

circunscrição prosódica.

Page 6: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

AGRADECIMENTOS

Agradeço, primeiramente, ao meu orientador, professor doutor Carlos Alexandre

Gonçalves, pelo conhecimento transmitido, por toda paciência e tempo dedicado a mim,

pelo incentivo e apoio durante esses anos de convivência e, sobretudo, por acreditar na

minha capacidade, mesmo quando até eu duvidava, trazendo-me forças para prosseguir nos

momentos difíceis.

Agradeço ao meu marido, Alex, pela compreensão nos momentos de minha

ausência, pela ajuda nos momentos de dificuldade e pelo apoio incondicional aos meus

projetos, por estar comigo em todas as horas em que precisei.

Quero agradecer também à professora doutora Maria Lúcia Leitão de Almeida pelas

palavras de incentivo nas horas de dificuldade e pela injeção de ânimo dada sempre que

necessário.

Agradeço a todos os informantes que contribuíram para a formação do corpus

recolhido durante o período de pesquisa, pois sem eles nada teria sido possível.

Quero agradecer, ainda, ao professor doutor Leo Wetzels e à professora doutora

Giovana Bonilha pelas valiosas contribuições dadas ao trabalho durante o III Congresso

Internacional de Fonologia.

Page 7: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

RESUMO VIALLI, Luciana de A. D. A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2008. A presente dissertação analisa o fenômeno da Reduplicação no português brasileiro em situações de baby-talk com base na Morfologia Prosódica (McCARTHY & PRINCE, 1990 e 1993), numa abordagem que envolve estratos derivacionais e baseada na Morfologia Não-concatenativa. A Reduplicação é um fenômeno visto como marginal em português, apesar de seu recorrente emprego em diversas línguas naturais. Logo, o primeiro esclarecimento feito neste trabalho diz respeito à própria definição de Reduplicação e, em seguida, à verificação de seu constante uso na linguagem verbal humana. O modelo selecionado para a análise desse fenômeno foi desenvolvido a partir dos avanços da Fonologia Não-Linear e é baseado nos conceitos de molde e circunscrição prosódica, indo além de operações aglutinativas e provando que os moldes envolvidos no processo acessam primitivos prosódicos e devem, portanto, respeitar as condições de boa-formação. A Morfologia Prosódica prevê a atuação de filtros sobre um molde para formar uma base. Os principais pontos do processo são indicados durante a análise dos dados, recolhidos entre adultos e crianças em fase de aquisição da linguagem. Dessa forma, são mostradas as condições de boa-formação atuantes na Reduplicação no baby-talk, assim como a importância da sílaba tônica para a atuação da circunscrição prosódica positiva, e toda a trajetória que leva à obtenção das cinco bases formadas durante o processo: 1ª BASE »CV, 2ª BASE »CVV, 3ª BASE »CV.CV, 4ª BASE CV.CVV e 5ª BASE »CVC.CV. Ainda, é demonstrado como o processo de Reduplicação pode fornecer análises adequadas para fatos polêmicos da fonologia do português, como, por exemplo, a geminação de /¯/, proposta por Wetzels (2000).

Page 8: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

ABSTRACT VIALLI, Luciana de A. D. A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica. Dissertação de Mestrado em Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2008.

The present paper analyzes the Reduplication of the Brazilian Portuguese in baby-talk situations based on Prosodic Morphology, (McCARTHY & PRINCE, 1990 e 1993), in an approach that involves derivational strata and based on Nonconcatenative Morphology. The Reduplication is a marginal phenomenon in Portuguese, despite its recurrent usage in several natural languages. Therefore, the first clarification concerns the definition of Reduplication, and then, the verification of its constant usage in the human verbal language.

The model selected for the analysis of this phenomenon was developed from the improvements of the Nonlinear Phonology. It is based on the template concepts and Prosodic Circumscription that goes beyond the agglutinative operations, proving the templates involved in the process access primitive prosodic and must, ergo, respect the Well-formedness Condictions. The Prosodic Morphology presupposes the operation of filters under a template to create a basis.

The major points in the process are indicated during the data analysis collected from adults and children in the language acquisition phase. Therefore, the conditions of good formation presented in the baby-talk Reduplication are indicated, as well as the importance of the stressed syllable for the action of the positive prosodic circumscription. The course takes to the obtention of the five bases formed during the process are: 1ª BASE »CV, 2ª BASE »CVV, 3ª BASE 'CV.CV, 4ª BASE CV.CVV e 5ª BASE 'CVC.CV. Moreover, it demonstrates how the process of Reduplication provides adequate analysis for polemic facts of the Portuguese Phonology, for instance, the germination of /̄/, proposed by Wetzels (2000).

Page 9: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

SUMÁRIO

1 – INTRODUÇÃO..............................................................................................................10 2 – SOBRE A REDUPLICAÇÃO .......................................................................................13

2.1 – Reduplicação: breve definição como base na noção de molde esqueletal ..............13 2.2 – Caráter Marginal da Reduplicação nas línguas naturais e em português ................23 2. 3 – A Reduplicação em Português................................................................................24 2.4 – Baby-talk (BT).........................................................................................................28

3 – QUADRO TEÓRICO ADOTADO: A MORFOLOGIA PROSÓDICA........................30 3.1 – Bases da Morfologia Prosódica ...............................................................................30 3.2 – Morfologia Prosódica: histórico e fundamentos......................................................37

4 – A REDUPLICAÇÃO NO BABY-TALK EM UMA ANÁLISE MORFO-PROSÓDICA..48 4.1 – Metodologia e Recolha de Dados............................................................................48 4.2 – Dificuldades Enfrentadas.........................................................................................53 4.3 – Análise de Dados.....................................................................................................55 4.4 - Análise de Casos Excepcionais................................................................................83

5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS .........................................................................................86 6 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:...........................................................................89 ANEXO 1.............................................................................................................................92 ANEXO 2.............................................................................................................................93 ANEXO 3.............................................................................................................................94 ANEXO 4.............................................................................................................................95 ANEXO 5.............................................................................................................................96

Page 10: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

10

1 – INTRODUÇÃO

A Reduplicação é um fenômeno do português pouco analisado por possuir status

marginal dentre os processos de formação de palavras. Através de consulta na literatura

tradicional, pôde-se perceber que tal fenômeno não é tratado adequadamente, sendo muitas

vezes confundido com processos distintos, como a Composição. Neste trabalho, um tipo

específico de Reduplicação é focalizado: a Reduplicação no baby-talk (mamadeira �

dedera, boneca � neneca, iogurte � guguti, xampu � pupu, panela � nenela, papel

�pepéu etc). Esse fenômeno ocorre na interação de adultos com crianças pequenas (baby-

talk) e também é freqüentemente empregado por crianças em fase de aquisição de

linguagem.

A Reduplicação é um tipo de fenômeno que compõe a lista dos processos não-

concatenativos (MCCARTHY, 1981), ou seja, fenômenos que demandam, conjuntamente a

uma análise morfológica, informações fonológicas durante o processo de formação de um

vocábulo. Dessa forma, neste trabalho recorremos a um modelo que dá conta de

dispositivos morfológicos e prosódicos para consolidar a análise: a Morfologia Prosódica

(MCCARTHY & PRINCE, 1998).

Os principais objetivos do presente trabalho são os seguintes:

(1) Definir apropriadamente a Reduplicação, revendo definições anteriores;

(2) Traçar as regularidades envolvidas no processo;

(3) Determinar como se dá a atuação da circunscrição prosódica e que características estão

envolvidas no mapeamento de segmentos;

Page 11: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

11

(4) Determinar quais os filtros, encarregados das condições de boa-formação, são atuantes

no processo;

(5) Definir o modelo do Reduplicante;

(6) Definir os critérios que regulam a cópia.

De modo a dar conta dos objetivos acima, o trabalho está organizado da seguinte

maneira: no capítulo 2 , que foi dividido em 4 partes, o fenômeno da Reduplicação é tratado

em seus aspectos mais gerais. Na primeira seção 2.1, são indicados os aspectos da

Morfologia Não-concatenativa relevantes ao processo, evidenciando sua ocorrência e

características em outras línguas naturais, assim como a formação de moldes esqueletais.

Em 2.2, o caráter marginal da Reduplicação é sucintamente apresentado, ao lado das

características que o definem como um processo não-concatenativo. Na terceira parte do

capítulo 2.3, o fenômeno da Reduplicação em língua portuguesa é finalmente discutido,

começando com as definições prescritivas para, em seguida, apresentar nova definição e

divisão, tendo em vista os vários tipos de Reduplicação observados em português. Em 2.4,

o discurso conhecido como Baby-talk é definido, posto que o alvo da análise é a formação

de palavras reduplicadas no âmbito desse tipo de interação lingüística.

O modelo teórico adotado para a análise da Reduplicação no baby-talk é abordado

no capítulo 3. Em 3.1, as bases da Morfologia Prosódica são explanadas: representações

fonológicas independentes, camadas paralelas e níveis de representação diversos. Ainda

nessa seção, são definidas as Condições de boa-formação, responsáveis pela atuação dos

filtros e os devidos ajustes nas formas, durante a derivação. Em 3.2, o histórico da

Morfologia Prosódica é retomado, desde sua base na Fonologia Autossegmental.

Page 12: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

12

Na primeira seção 4.1 do capítulo 4, é apresentada a metodologia aplicada para o

desenvolvimento do trabalho, assim como é detalhado o processo de recolha de dados. A

seguir, em 4.2, são apontadas as maiores dificuldades enfrentadas durante a pesquisa e os

principais empecilhos encontrados na execução do trabalho. Em 4.2 e 4.3, é feita a análise

dos dados recolhidos e são apresentadas as regularidades do processo. Nessas seções, os

diferentes casos encontrados são divididos em grupos e analisados a partir de exemplos

representativos de cada situação envolvida. Mostramos, neste capítulo, que a Reduplicação

pode trazer à tona importantes questões da gramática fonológica da língua, como a idéia de

que a nasal palatal é uma consoante geminada em português.

Page 13: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

13

2 – SOBRE A REDUPLICAÇÃO

Neste capítulo, descrevemos o fenômeno da Reduplicação, observando os principais

significados que se manifestam, nas línguas do mundo, através desse tipo “especial” de

afixação (Gonçalves, 2004). Esse processo foi central para debates sobre morfologia não-

concatenativa em muitas línguas, assim como para o modelo teórico aqui adotado – a

Morfologia Prosódica, o que justifica as descrições a seguir apresentadas. Ainda neste

capítulo, apresentamos os diversos casos de Reduplicação que aparecem em português,

para, por fim, justificar o “recorte” aqui efetuado.

2.1 – Reduplicação: breve definição como base na noção de molde esqueletal

A Reduplicação é conhecida como um fenômeno não-concatenativo de formação de

palavras, através do qual uma espécie de afixo é produzida por meio da cópia de material

fonológico da base. Embora tal operação morfo-fonológica seja bastante comum nas

línguas naturais, ela ainda é vista como um processo marginal de formação de palavras em

muitas delas, como é o caso do português.

O fenômeno por meio do qual se repete todo o vocábulo ou parte dele para produzir

uma nova palavra é percebido com muita naturalidade em diversas línguas. Geralmente, a

Reduplicação é empregada com o intuito de expressar conceitos como distribuição,

pluralidade, repetição, atividade recorrente, continuidade, acréscimo de tamanho e maior

intensidade. Dessa forma, a Reduplicação é usada em muitos idiomas e dialetos como

mecanismo derivacional ou flexional.

Page 14: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

14

O tipo de Reduplicação observado neste trabalho (em situações de baby-talk) não

apresenta acréscimo ou mudança de significado, se comparados base e produto. Entretanto,

existem outros tipos de Reduplicação em língua portuguesa que possuem essa

característica, como o processo envolvido com a cópia de bases verbais (quebra-quebra,

mata-mata, bate-bate).

Com o propósito de ilustrar a naturalidade de emprego do fenômeno em questão,

Katamba (1990: 181) seleciona diversos exemplos em línguas naturais. Alguns desses

exemplos estão reproduzidos abaixo, com o objetivo de demonstrar que, embora seja

considerado um processo marginal em português, a Reduplicação é um fenômeno bastante

corrente nas línguas do mundo:

(1.1) Plural de Nomes em Papago

SINGULAR PLURAL

bana ‘coiote’ baabana

tini ‘boca’ tiitini

kuna ‘marido’ kuukuna

Como se pode perceber, o plural de nomes em Papago é produzido através da

formação de um prefixo que copia a primeira sílaba do nome no singular e, em seguida,

alonga a vogal copiada.

Page 15: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

15

(1.2) Verbos – Envolvendo um participante

(a) -pik ‘toque’ � -pipik ‘toque repetidamente’

(b) guyon ‘zombar’ � guguyon ‘zombar repetidamente’

(1.3) Verbos – Envolvendo mais de um participante

(a) wu ‘morrer’ � wuwu ‘morrer numerosamente’

(b) bu ‘quebrar’ � bubu ‘quebrar várias coisas’

Nesses dois exemplos, a Reduplicação expressa freqüência ou repetição de um

evento ou ação, ou seja, manifesta o aspecto iterativo1. Em (1.2.a) e (1.2.b), temos

exemplos do Tzeltal e do Sudanês, respectivamente. Nesses casos, o processo envolve

apenas um participante. Já em (1.3), ambos exemplos do Twi, a mesma ação repetida

envolve mais de um participante.

A Reduplicação pode expressar intensidade ou atenuação em uma mesma língua,

como se observa nos exemplos a seguir, em (2.a) e (2.b), do Thai, também extraídos de

Katamba (1990: 182):

1 O aspecto iterativo também pode ser percebido na Reduplicação de bases verbais em língua portuguesa, como detalharemos mais adiante.

Page 16: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

16

(2) Reduplicação indicando intensidade e atenuação

(a) dii ‘ser bom’ � diidii ‘ser extremamente bom’

(b) kbb ‘velho’ � kbb- kbb ‘idoso’

Em (2.a), a Reduplicação foi empregada com o intuito de indicar intensidade; já no

exemplo (2.b), foi utilizada com o objetivo de atenuar o significado da palavra ‘velho’,

funcionando, portanto, como um eufemismo. Com esse pequeno corpus, fica comprovado

que a Reduplicação realmente envolve cópia de elementos da base e que tal fenômeno é

empregado com diversas funções em várias línguas naturais. No entanto, é importante

determinar o que exatamente pode ser copiado nesse processo.

Em um primeiro momento, poderíamos afirmar que o elemento copiado na

Reduplicação sempre envolve um constituinte interpretado como um morfema, uma sílaba

ou uma palavra, como acontece na maioria dos casos. A Reduplicação total é um bom

exemplo disso, como exposto abaixo, em dados do Maori (cf. Katamba, 1990: 183):

(3) Reduplicação total em Maori

a) mano

reo

‘mil’

‘voz’

manomano

reoreo

‘inumerável’

‘conversa’

b) ako

kimo

patu

‘aprender’

‘piscar’

‘matar’

akoako

kimokimo

patupatu

‘consultar em conjunto’

‘piscar repetidamente’

‘matar tudo’

c) mate

wera

‘doente’

‘quente’

matemate

werawera

‘doentio’

‘caloroso’

Page 17: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

17

Nos exemplos acima, a Reduplicação é total e pode expressar informações distintas.

Em (3.a), a Reduplicação total com nomes indica aumento; em (3.b), o mesmo fenômeno,

agora com verbos, expressa repetição; em (3.c), o significado expresso pela Reduplicação

com adjetivos é atenuativo. Esses são casos de Reduplicação considerados clássicos, já que

o processo copia constituintes morfológicos.

No entanto, há casos em que a cópia efetuada não é de um constituinte tipicamente

morfológico. É ainda no próprio Maori que podemos constatar casos desse tipo:

(4) Reduplicação Parcial em Maori

a) kimo ‘piscar’ � kikimo ‘manter os olhos firmemente fechados’

b) nui ‘grande’ � nunui ‘grandes’

c) moe ‘dormir’ � momoe ‘dormir junto’

Em (4), constata-se a Reduplicação da primeira sílaba CV da palavra.

Coincidentemente, em (4.a), a primeira sílaba é exatamente constituída por uma consoante

e uma vogal, mas nos dados (4.b) e (4.c) isso não acontece. Nesses dados, nota-se que a

cópia acontece, mas a operação leva à separação dos constituintes da sílaba, excluindo as

vogais [i] e [e] do material copiado. Observa-se o mesmo fenômeno em outras línguas,

como na formação do plural em Quileute:

(5) Reduplicação em Quileute

qax ‘osso’ � qaqax ‘ossos’

Page 18: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

18

No exemplo (5), a cópia envolve uma seqüência CV inicial. O elemento qa é

copiado, deixando para trás o segmento <x>, o que resulta na separação da sílaba ‘qax’, da

qual não se aproveita a coda. Novamente, temos a cópia de um elemento que não é

constituinte morfológico na língua. Esse fenômeno também acontece na Reduplicação em

situações de Baby-talk em língua portuguesa, que veremos em detalhes mais adiante; nela,

o reduplicante envolvido no processo nem sempre copia a primeira sílaba integralmente.

Logo, fica evidenciado que, no processo de Reduplicação, nem sempre se efetua a cópia de

um morfema, uma sílaba completa ou uma palavra. Esse fato levanta outra questão: como a

Reduplicação pode ser, então, definida? O que explica a seleção de apenas determinados

segmentos da base?

Utilizando noções da Fonologia Autossegmental, podemos afirmar que a

Reduplicação é um processo de afixação de uma espécie de molde. Trata-se de uma camada

CV-esqueletal subespecificada que, quando preenchida, será anexada a uma base como um

afixo. Nesse caso, as propriedades sintáticas – e até mesmo semânticas – são especificadas,

mas não a parte fonológica, que é deixada incompleta. Para que ela seja preenchida, é

necessário o mapeamento de segmentos da base de acordo com as camadas C e V que

existirem como padrão a ser alcançado no processo. Logo, uma porção da representação

segmental da base é copiada, sendo a ela mesma anexada a camada subespecificada. Os

segmentos copiados podem ou não representar constituintes morfológicos da base, como

destacamos mais acima.

A subespecificação tem como objetivo principal garantir a economia: trata-se de

uma representação individual de algo que é geral e aparece em forma de regra. Essas regras

gerais para, nesse caso, a cópia de segmentos fônicos de uma base, evitam o provável

Page 19: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

19

surgimento de, para cada cópia, a formação de uma lista com incontável número de

possibilidades.

Broselow & MacCarthy (1983: 27), propõem os princípios que regem a cópia de

elementos fônicos para um afixo subespecificado na Reduplicação, como se observa em

(6), a seguir.

(6) Princípios de mapeamento na Reduplicação

(a) Introdução de um afixo subespecificado (prefixo, sufixo ou infixo);

(b) Criação de uma cópia de segmentos fonêmicos separada da raiz ou base;

(c) Associação da cópia com a camada CV-esqueletal em relação de um-para-um, com

vogais ligadas a camadas V e consoantes, a camadas C. No caso de um prefixo, a

associação parte da esquerda para a direita e, no caso de um sufixo, ela parte da direita para

a esquerda;

(d) Finalmente, o apagamento de material fonêmico supérfluo ou de CV slots na camada

esqueletal que ficarem sem associação no fim do processo.

Esses princípios de mapeamento regem a formação de prefixos, sufixos e infixos na

Reduplicação. Vejamos os exemplos mais clássicos de cada tipo à luz de tais princípios:

(7) Reduplicação Prefixal em Agta (Filipinas)

(a) takki ‘perna’ � taktakki ‘pernas’

(b) uffu ‘coxa’ � ufuffu ‘coxas’

Page 20: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

20

A Reduplicação em Agta consiste num mecanismo para a formação do plural. O

processo não respeita a estrutura de constituintes morfológicos da base, pois tende a

desfazer a geminação existente, ao copiar apenas uma das camadas C, levando a uma

consoante travadora de sílaba, como em taktakki e ufuffu. É importante lembrar que uma

geminação se dá, nos termos da fonologia autossegmental, quando duas camadas são

ocupadas por um mesmo segmento. No caso em questão, as geminadas figuram na posição

de onset de uma sílaba e na de coda, de outra.

Logo, em nomes com a seqüência CVCCV, a primeira porção CVC é reduplicada,

como vemos em (7.a). Já quando a seqüência da base é VCCV, somente VC reduplica,

como em (7.b). Nesse caso, levando em conta os princípios de mapeamento expostos

acima, sabe-se que CV slots desgarradas na camada esqueletal são automaticamente

apagadas; isso explica a Reduplicação sem a primeira consoante em (7.b), já que uffu não

tem consoante inicial para ser copiada. Dessa forma, temos a validação de uma camada

esqueletal CVC para o processo. Abaixo, temos o esquema de cópia em (7.a) com mais

detalhes.

(8) Cópia em Agta

C V C C V � C V C- C V C C V � C V C- C V C C V

t a k i � t a k i t a k i � t a k t a k i

Page 21: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

21

(9) Reduplicação Sufixal em Saho

(a) lafa ‘osso’ � lafof ‘ossos’

(b) illa ‘primavera’ � illol ‘primaveras’

(c) gaba ‘mão’ � gabob ‘mãos’

Em Saho, o sufixo reduplicativo de plural é formado por uma camada esqueletal

parcialmente subespecificada. Nesse caso, uma vogal /o/ é sempre anexada à raiz da base

no lugar do /a/, sufixo formador de singular, seguida da cópia da última consoante

pertencente à raiz da base, ou seja, em Saho, o reduplicante tem a forma de uma camada VC

esqueletal, em que V corresponde à vogal /o/, como exemplificado em (9). Abaixo, em

(10), segue a representação de (9.a) com mais detalhes.

(10) Cópia em Saho

C V C � C V C -V C � C V C V C

l a f � l a f o � l a f o f

(11) Reduplicação Interna em Samoano2 (infixação)

(a) alofa ‘amar’ � alolofa

(b) savali ‘andar’ � savavali

(c) maliu ‘morrer’ � maliliu

2 Para a tradução no plural, seria também necessário o afixo identificador de pessoa verbal.

Page 22: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

22

Acima, temos os raros exemplos de infixação feita por meio de Reduplicação. Nesse

tipo de Reduplicação, copia-se parte da base, inserindo-se, em seguida, o material fônico

copiado em forma de afixo. No caso do Samoano, o plural dos verbos é formado a partir de

material reduplicado, que pode ser um prefixo (verbos dissílabos) ou um infixo (verbos

trissílabos). No último caso, o infixo é uma estrutura CV subespecificada na camada

esqueletal, inserida antes da segunda sílaba da base, da qual é cópia. Para uma melhor

explanação, observem-se as formalizações abaixo:

(12) Cópia em Samoano

C V C V C V � C V -C V- C V C V � C V C V C V C V

s a v a l i � s a v a l i � s a v a v a l i

Fica claro, portanto, que há várias formas de reduplicar segmentos, graças à

subespecificação envolvida no processo. No tipo de fenômeno analisado neste trabalho, a

Reduplicação em situações de baby-talk, também acontece uma prefixação a partir de uma

estrutura subespecificada, como será demonstrado no capítulo 4.

Page 23: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

23

2.2 – Caráter Marginal da Reduplicação nas línguas naturais e em português

O fenômeno da Reduplicação encontra-se na lista dos processos marginais de

formação de palavras do português, não apenas por apresentar escassez de análises

lingüísticas e dificuldades em sua definição, mas também porque faz parte da Morfologia

Não-Concatenativa da língua (GONÇALVES, 2004). Os processos não-concatenativos

(MCCARTHY, 1981) não se enquadram totalmente ao padrão aglutinativo, baseado na

noção de “item”, tradicionalmente preferido nos estudos morfológicos de línguas naturais.

Tais processos não envolvem apenas informações morfológicas, mas também fonológicas

para sua execução, integrando primitivos de ambos os tipos. Logo, operações morfo-

fonológicas como a Reduplicação ampliam a noção de “item”, levando, nesse caso, a um

processo de Afixação Não-Linear (GONÇALVES, 2004). Esse processo da Reduplicação

pode ser entendido como misto, já que, a partir da cópia, verificamos seu status não-

concatenativo e no reduplicante afixado, no baby-talk um prefixo, percebemos mostras de

um modelo aglutinativo.

O reduplicante envolvido no padrão de Reduplicação neste trabalho contemplado é

uma estrutura vazia, subespecificada, que engatilha um processo automático de cópia dos

segmentos da base, comportando somente informações prosódicas. Para analisar tal

fenômeno, modelos teóricos como a Morfologia Prosódica (MACCARTHY & PRINCE,

1990), com uma abordagem não-linear, são extremamente relevantes.

Na literatura referente à Morfologia Prosódica (doravante MP), a Reduplicação tem

destaque, havendo diversos trabalhos a esse respeito, embora não em língua portuguesa, o

que demonstra a contribuição do estudo aqui desenvolvido.

Page 24: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

24

2. 3 – A Reduplicação em Português

A Reduplicação é um fenômeno pouco analisado por possuir status marginal dentre

os processos de formação de palavras, como adiantamos acima. Através de uma consulta na

literatura de cunho prescritivo (LIMA, 2000; BECHARA, 1998 e CUNHA & CINTRA,

1985), percebemos que tal fenômeno não é tratado adequadamente, sendo muitas vezes

confundido com outros processos, como a Composição, por exemplo. Dessa forma, é

necessário:

(a) apresentar algumas análises normativas sobre o processo em questão e

(b) procurar desfazer os equívocos referentes a essa questão para dar curso à análise com

um objeto de estudo bem definido.

Focalizando o primeiro ponto, demonstrar o tratamento dado à Reduplicação nos

compêndios gramaticais, foram consultadas as gramáticas de Lima (2000), Bechara (1998)

e Cunha & Cintra (1985). No primeiro compêndio, o fenômeno da Reduplicação não

aparece na lista dos processos de formação de palavras; no entanto, o vocábulo “corre-

corre”, uma Reduplicação de base verbal, é indicado como resultado do processo de

Composição.

Na segunda obra, embora seja apresentada a Reduplicação, esta é indicada como o

fenômeno responsável pela formação de onomatopéias e, novamente, “corre-corre” é

Page 25: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

25

apontado como uma Composição vocabular, assim como na primeira obra anteriormente

destacada.

No terceiro compêndio consultado, o referido processo não é mencionado,

apresentando o vocábulo reduplicado acima apontado como fruto de uma Composição.

Entretanto, há uma importante observação que consta nessa gramática: o fato de que uma

palavra composta é formada por um Determinante (adjunto, modificador) e um

Determinado (núcleo, cabeça lexical). Nesse sentido, é preciso destacar que na palavra

”corre-corre”, apontada como composta em todas as gramáticas prescritivas consultadas,

não é possível depreender tal informação, já que se trata, na verdade, de uma cópia fiel de

uma base e não, como estabelecido, de uma composição de vocábulos. A partir disso, é

possível perceber que há uma confusão referente a essa questão, evidenciando, inclusive,

uma escassez de referência ao processo.

Tomando por base essas informações e tentando desfazer alguns equívocos, é

possível elaborar uma definição para a Reduplicação como processo formador de palavras.

Dessa forma, propomos que, para se caracterizar um processo como Reduplicação, é

preciso:

(i) reconhecer sincronicamente a base copiada e haver relação de

significado entre base e produto. Nesse caso, bebelo é uma

Reduplicação, porque a base cabelo é reconhecida sincronicamente. O

mesmo não acontece, por exemplo, com mamão, em que a

isolabilidade do suposto prefixo reduplicativo destruiria as relações de

Page 26: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

26

significado no interior da palavra, uma vez que a noção de mão não

está contida em mamão;

(ii) ter o resultado do processo uma forma com função lexical ou

expressiva de avaliação (BASÍLIO, 1987), como ocorre,

respectivamente, em corre-corre, que denomina um evento, e em

Dedé, hipocorístico do antropônimo André, marcado pela expressão de

afeto;

(iii) que a forma resultante não tenha valor onomatopaico, o que

caracterizaria simplesmente a reprodução de um som e não uma cópia

feita a partir de uma base, como fonfom e auau. Essas formações são

casos de Reduplicação bem motivados onomatopaicamente, ao

contrário de bate-bate e pega-pega, entre outros.

Tendo definido o que é, de fato, uma Reduplicação, é preciso determinar as

possíveis formas que esse processo pode assumir. Dessa maneira, é possível dividi-lo em

quatro tipos, como proposto em Gonçalves & Albuquerque (2004), que rastrearam dados a

partir de fontes variadas, como, por exemplo, dicionários eletrônicos, como o Aurélio

(Ferreira, 2000) e o Houaiss (2001), e diferentes situações de interação oral:

(a) Reduplicação em início de palavra, utilizado, sobretudo, em

relações de parentesco: papai, mamãe, titio, vovó, vovô;

Page 27: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

27

(b) Reduplicação no final de palavra, quase sempre vinculada à

expressão da intensidade: bololô, chororô;

(c) Reduplicação de base verbal: pega-pega, mata-mata, quebra-

quebra, bate-bate, puxa-puxa, pula-pula, cai-cai;

(d) Reduplicação em situações de baby-talk: pepeta, bebelo,

quequeta, cocoto, pipito, neneca, dedera, ninico, lilito .

Os tipos (a) e (b) são os menos produtivos, não havendo um volume considerável de

palavras desse tipo na língua. Os mais produtivos em língua portuguesa são (c) e (d). Em

(c), a base a partir da qual atua a cópia é um verbo, levando a uma mudança de classe e

especificação de significado. Já em (d), encontram-se formas utilizadas por crianças em

fase de aquisição da linguagem e por adultos que tentam reproduzir a fala infantil (o que

chamamos de situação de baby-talk). No presente trabalho, é feito um recorte: analisa-se o

padrão apresentado em (d), a Reduplicação no baby-talk, segundo um modelo teórico que

descreve com mais precisão a Morfologia Não-Concatenativa: a Morfologia Prosódica

(MCCARTHY & PRINCE, 1990 e 1993).

O fenômeno da Reduplicação é tratado, aqui, por meio de uma perspectiva que alia

princípios fonológicos e morfológicos, tratando a interface desses dois componentes da

Gramática. Para isso, foi preciso, portanto, traçar as regularidades do processo.

Em uma primeira análise, podemos perceber que o input envolvido nesse tipo de

Reduplicação é a forma realizada pelo adulto e o reduplicante apresenta-se como um

Page 28: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

28

prefixo, para o qual a parte mais importante a ser copiada será a sílaba tônica do input.

Outro ponto importante para o processo de cópia é o onset da sílaba: reduplicantes sempre

apresentam ataque, priorizando sílabas CV (papato). Algumas vezes, podemos encontrar

sílabas terminadas em coda (CVC), que podem ser nasais ou vocálicas, como em

‘dindinha’ e ‘pepéu’, respectivamente.

Outro aspecto importante para a formação do output é o tamanho da palavra, já que

a forma final será, no máximo, um trissílabo. O output final equivale, em significado, à

forma adulta e pode ser usado tanto pelas próprias crianças quanto pelos adultos que se

comunicam com elas. A apresentação mais detalhada dos diversos padrões silábicos será

feita em 4.4. Antes, porém, convém explicitar o que entendemos por baby-talk.

2.4 – Baby-talk (BT)

Segundo Crystal (1980: 38), o fenômeno denominado de baby-talk (também

conhecido como motherese ou caregiver speech) partiu de uma extensão nos estudos da

aquisição da linguagem, procurando sempre mostrar características distintivas no discurso

entre adultos e crianças.

Adultos, ao falar com crianças muito pequenas, ou mesmo mães, situação na qual é

mais comum o baby-talk, fazem uso de um tipo de linguagem altamente distintiva. No

entanto, o baby-talk não se caracteriza apenas pelo uso de determinada pronúncia, como

freqüentemente é descrito o caregiver speech; estruturas frasais simplificadas também são

contempladas no baby-talk, como quando um adulto completa uma sentença pronunciada

Page 29: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

29

por uma criança, por exemplo: Papá brincá � Sim, papai vai brincar; ou como

exemplificado por Crystal em inglês, Dadda gone � Yes, daddy’s gone. Dessa forma,

Crystal3 refere-se ao baby-talk como:

“Uma extensão nos estudos da AQUISIÇÃO DA LINGUAGEM, no sentido tradicional do termo, mostrando toda uma gama de características LINGÜÍSTICAS DISTINTIVAS encontradas no discurso adulto endereçado a crianças pequenas. Desse modo a Baby-talk inclui muito mais do que o uso freqüentemente estereotipado de pronúncia e palavras (como doggie, /den/ para then, etc.) e é primariamente caracterizado com referência ao uso de ESTRUTURAS FRASAIS simplificadas e certos tipos de interação lingüística”. (CRYSTAL, 1997, p. 38)

Logo, a Reduplicação na linguagem infantil é um tipo de baby-talk, posto que se

trata de um vocabulário altamente específico utilizado, sobretudo, em um discurso em que

um adulto se comunica com uma criança, esta estando em fase de aquisição da linguagem.

A partir desse tipo de linguagem, podemos perceber padrões prosodicamente bem

organizados, de forma que uma abordagem morfo-fonológica é a mais apropriada para dar

conta desse processo.

3 “An extension in LANGUAGE ACQUISITION studies of the traditional sense of this term, to refer to the whole range of DISTINCTIVE LINGUISTIC characteristics found in adult speech addressed to young children. Baby-talk thus includes far more than the often stereotyped use of endearing pronunciations and words (such as doggie, /den/ for then, etc.) and is primarily characterized with reference to the use of simplified SENTENCE STRUCTURES, and certain types of linguistic interaction”. (CRYSTAL, 1997, p. 38)

Page 30: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

30

3 – QUADRO TEÓRICO ADOTADO: A MORFOLOGIA PROSÓDICA

Neste capítulo, serão explicitadas as bases do modelo teórico aqui utilizado para a

análise da Reduplicação em situações de baby-talk. Para uma melhor apresentação da

Morfologia Prosódica, o capítulo descreve, primeiramente, as bases desse modelo na

Fonologia Autossegmental, valendo-se de exemplificações necessárias à compreensão do

paradigma em questão. Logo após, detalhamos os fundamentos básicos da Morfologia

Prosódica, tecendo considerações gerais sobre noções como moldes, circunscrições e

filtros.

3.1 – Bases da Morfologia Prosódica

A Morfologia Prosódica é um modelo que se desenvolve com base no aparato

teórico e no formalismo de outro, conhecido como Fonologia Autossegmental. Este, por

sua vez, é um modelo que descende diretamente da Teoria Fonológica Gerativa

(CHOMSKY & HALLE, 1968).

Segundo Katamba (1990), a Fonologia Autossegmental propõe que as

representações fonológicas consistem em partículas independentes, camadas paralelas e

níveis de representação (KATAMBA,1990: 154). Porém, muito embora essas camadas

sejam autônomas, elas acabam por interagir. Um exemplo pertinente é o acento, que não é

uma propriedade fonológica inerente a consoantes ou vogais, mas a elementos com

autonomia na palavra. Podemos ilustrar esse caso com alguns exemplos em português. Os

Page 31: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

31

dados em (13) mostram que o acréscimo de sufixos promove a reaplicação da regra de

acento:

(13) Autonomia acentual no Português

Demo’crata Democra’cia

Pom’poso Pomposi’dade

Adje’tivo Adjeti’val

Katamba (1990: 155) ainda fornece um outro exemplo para comprovar essa

autonomia dos elementos prosódicos: o caso do tom em Luganda. Nesse dialeto, vigora

uma regra gramatical que, no caso do encontro de duas vogais, leva ao apagamento da

primeira delas. No entanto, o tom anteriormente atribuído à vogal deletada não é perdido,

como se pode perceber no exemplo em (14), abaixo, que apresenta as seguintes

convenções: H marca um tom alto; L marca um tom baixo; HL marca um falling contour

tone; LH marca um rising contour tone; e o espaço em branco marca uma sílaba sem tom.

(14) Autonomia tonal em Luganda

Camada Segmental

K u s a E b y o � K u s e: b y o ‘triturá-los’

Camada tonal

L H L H L H L H

Page 32: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

32

Em (14), a vogal final de kusa é deletada; entretanto, o tom pertencente a essa vogal

não se perde. Se o tom fosse uma propriedade inerente à vogal, ele se perderia com esse

apagamento. A preservação desse tom é, portanto, a prova de sua independência da vogal

na qual ele pode recair. Logo, fica clara a denominação desse modelo como Fonologia

Autossegmental, pois as representações fonológicas consistem em categorias, como acento,

tom, vogais e consoantes, divididas em camadas autônomas. No entanto, tais camadas não

são isoladas; ao contrário, interagem em estruturas hierárquicas complexas.

Para que a interação das categorias fonológicas aconteça, as camadas às quais

pertencem devem estar ligadas de alguma forma por uma espécie de força que as una

(KATAMBA, 1990: 156). Tal força de ligação é chamada de camada esqueletal (ou CV-

camada). Essa camada é a responsável por manter juntas diferentes camadas fonológicas,

como um livro faz com suas páginas. Assim, é dessa forma que acontece a associação entre

acento ou tom e vogais, por exemplo.

A camada esqueletal pode ser representada por X (Hyman, 1985) ou, como proposto

por Clements & Keyser (1983), por C e V para consoantes e vogais, respectivamente.

Ambas as representações são ilustradas abaixo, nos exemplos em (15):

Page 33: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

33

(15) Representação da camada esqueletal

(A)

Camada Esqueletal

X X X X X X

Camada Segmental

a f i A f i

(B)

Camada Esqueletal

V C V V C V

Camada Segmental

a f i A f i

No entanto, deve-se lembrar que essa teoria não requer uma associação de um-para-

um de elementos em camadas diferentes, cada um pertencendo a uma única camada. Nesse

caso, um mesmo elemento prosódico pode ligar-se a várias camadas segmentais, assim

como também é possível que vários elementos estejam ligados a apenas uma camada.

Nesse sentido, existem tons com nomenclaturas diferentes para cada aplicação; eles são

chamados rising ou falling contour tones. Em (16), os exemplos são de Mende:

Camada Tonal

H L L H

Camada Tonal

H L L H

Page 34: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

34

(16) Representação de rising e falling contour tones

(A)

K æ B b=ä=b M b û M b a M a

H L H L L H

(B)

kæ ‘guerra’ kæmá ‘em guerra’

bblb ‘calças’ bblbmà ‘nas calças’

mbû ‘coruja’ mbûmà ‘na coruja’

mba ‘arroz’ mbamá ‘no arroz’

Nesses casos, podemos perceber que o morfema –ma não é associado a nenhum

tom. Isso quer dizer que a teoria permite que uma dada camada não esteja associada a

nenhuma outra. O morfema –ma acaba por receber, ao final do processo de sufixação do

qual faz parte, o último tom do radical por espraiamento.

No entanto, segundo Katamba (1990), esses diversos tipos de associações possíveis

não acontecem de forma desordenada. Apesar de algumas camadas estarem juntas na

produção da fala, como exemplificado acima, isso não acaba com a independência dos

elementos proposta anteriormente. Entretanto, tal questão nos leva a outra: existem

restrições que governam essas ligações? Certamente, esse tipo de conjunto de restrições

existe como parte da Gramática Universal; são os chamados Princípios de Boa Formação

Page 35: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

35

(fonotáticos) ou WFC (Well-formedness Condictions – condições de boa-formação) e estão

representados em (17).

(17) WFC (fonotático)4

(a) Uma seqüência de autossegmentos deve estar ligada a uma série de elementos na

camada esqueletal que seja capaz de comportá-la;

(b) A associação dos segmentos deve ir do início ao fim da palavra, a menos que instruções

específicas sejam dadas na Gramática da língua para que se modifiquem. Autossegmentos

devem estar ligados a unidades que sejam capazes de suportá-los individualmente.

(c) As linhas de associação não devem se cruzar no processo de ligação.

É importante ressaltar que, ainda assim, violações a WFC podem surgir, mas, nesses

casos, as mesmas engatilham regras de reparação para sanar o problema. Deve-se ressaltar,

no entanto, que a melhor estratégia é sempre aquela na qual se utiliza um menor número de

regras de reparação possível.

Como demonstrado até aqui, originalmente a Fonologia Autossegmental ocupou-se

da análise do tom. Entretanto, posteriormente percebeu-se que essa abordagem poderia

estender-se a outros fenômenos fonológicos, como a harmonia vocálica e a harmonia nasal.

Katamba (1990) afirma que, geralmente, no léxico, toda vogal é associada a um

espaço V e toda consoante a um espaço C na camada esqueletal (isso pode ser observado

em (3-B)). Em Luganda, existem vogais e consoantes geminadas, que, se comparadas às

vogais breves e às consoantes simples, são mais longas e exigem maior força de articulação

4 Esses princípios são baseados em Pulleyblank (1986) e Archangeli (1983).

Page 36: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

36

para serem produzidas. Consoantes geminadas surgem quando há mais de um espaço C

para um segmento consonantal simultaneamente. Da mesma forma, isso acontece com as

vogais, o que leva à violação à regra de associação de um-para-um exposta anteriormente:

quando há mais de um espaço V para apenas um segmento vocálico, surge a geminação. O

surgimento das geminadas pode ser observado em (18).

(18) Surgimento das Geminadas em Luganda

(A) Consoantes Geminadas

C C V C V

t a tta t a ta

‘matar’ ‘vamos’

(B) Vogais Geminadas

C V V C V C V C V

s i g a siiga s i g a siga

‘pintar’ ‘plantar’

Page 37: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

37

3.2 – Morfologia Prosódica: histórico e fundamentos

Todas as inovações feitas pela Fonologia Autossegmental a respeito da organização

das representações fonológicas tornaram-se a matéria-prima do modelo adotado na presente

análise: a Morfologia Prosódica.

O fenômeno da Reduplicação no baby-talk é aqui analisado com base na Morfologia

Prosódica, numa abordagem que envolve estratos derivacionais. Indo além de operações

aglutinativas e comprovando que os moldes envolvidos no processo acessam primitivos

prosódicos e devem, portanto, respeitar as condições de boa-formação, o modelo em

questão prevê a atuação de filtros sobre um molde para formar uma base.

Segundo McCarthy & Prince (1998), a Morfologia Prosódica nasce no estudo de

línguas com profunda interação de constituintes fonológicos com morfológicos. Nesse

sentido, pode-se afirmar que estruturas prosódicas têm papel relevante na construção de

moldes e na formação da circunscrição morfológica.

Segundo tal premissa, definem-se os princípios da Morfologia Prosódica:

(i) Hipótese geral da MP

Os moldes identificam a formação possível para determinados processos

morfológicos e são expressos por unidades prosódicas, como mora (µ), sílaba (σ), pé (Σ) e

palavra prosódica (ω);

Page 38: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

38

(ii) Satisfação do Molde

Processos morfológicos atuam em favor de um molde específico. O molde deve

satisfazer obrigatoriamente às condições de boa formação (restrições), determinadas pelos

princípios da prosódia universalmente definidos e levando em conta as línguas específicas

às quais forem aplicadas.

(iii) Circunscrição Prosódica

Processos morfológicos atuam sobre um domínio que pode ser identificado por

primitivos prosódicos. Dessa forma, operações morfológicas podem ser circunscritas

segundo critérios prosódicos e levando em conta também critérios morfológicos da língua

em questão.

A maioria dos trabalhos produzidos com base na Morfologia Prosódica adota o

conceito morfológico de morfema-base, amplamente difundido sob a denominação do

modelo item-e-arranjo. Esse modelo teórico é baseado na conhecida hierarquia prosódica,

esboçada abaixo, em (19):

(19) Hierarquia Prosódica (SELKIRK, 1980)

Palavra Prosódica PrWd

Pé Ft

Sílaba σ

Mora µ

Page 39: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

39

Com isso, sabemos que a menor unidade prosódica é a mora, a partir da qual

formamos as sílabas e assim sucessivamente, até chegar à palavra prosódica no topo da

hierarquia. É exatamente pela diferença em termos moraicos que podemos estabelecer a

distinção entre sílabas leves e pesadas. De acordo com a teoria moraica, as sílabas podem

ser leves, sendo abertas e contando apenas uma mora, como em do (consoante + vogal –

CV), ou pesadas, sendo fechadas ou contendo uma vogal longa, como em dor e paa,

respectivamente (CVC ou CVV). A ilustração em (20), abaixo apresentada, exemplifica

como se dá essa contagem:

(20) Sílabas em Teoria Moraica – Peso Silábico

LEVES PESADAS

σ σ σ

µ µ µ µ µ

d o

d o r

p a

O peso silábico é fundamental para determinar metricamente o tipo de pé. Dessa

forma, os pés são definidos moraica e silabicamente e divididos em três tipos distintos

(HEYES, 1991): (a) troqueus silábicos, (b) troqueus moraicos e (c) iambos, como apontado

em (21) a seguir.

Page 40: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

40

(21) Padrões Acentuais (BISOL, 2005)5

(a) Troqueu Silábico

É um pé dissilábico, com proeminência acentual à esquerda. Insensível ao peso

silábico, esse sistema acentual conta sílabas.

( * . )

σ σ

(b) Troqueu Moraico

Trata-se de um sistema sensível ao peso silábico, em que, a cada duas moras, forma-

se um pé com proeminência acentual à esquerda. Nesse caso, quando ocorre uma sílaba

pesada, ou seja, que já possua duas moras, também há a formação de um pé. Portanto, nesse

sistema, duas estruturas são possíveis:

( * . ) ( * )

σ( σ( σ#

(c) Iambo

Este é o sistema acentual mais singular, pois, embora também leve em consideração

o peso silábico, como o moraico, tem proeminência acentual à direita. Ele pode ser

representado pelas seguintes estruturas:

5 Como a autora está interessada em observar a posição da cabeça, são omitidas da representação as informações acerca do peso das sílabas. Na apresentação a seguir, utilizaremos o símbolo ( para sílabas leves e # para as pesadas.

Page 41: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

41

( . * ) ( * )

σ( σ# σ#

Dessa forma, percebe-se que um pé formado por apenas uma sílaba leve é barrado

pela teoria, evitando o surgimento de pés desgarrados. Isso é corroborado pela condição

geral de formação de pés, exposta em (22):

(22) Pés Binários: Pés são binários sob análise silábica ou moraica.

Ora, se de acordo com a hierarquia prosódica toda palavra prosódica deve ser

constituída de, no mínimo, um pé e, ainda, segundo a condição destacada em (22), afirma-

se que pés devem ser bimoraicos ou dissilábicos, isso quer dizer que toda palavra prosódica

deve conter, pelo menos, duas moras ou sílabas, sendo estas monomoraicas.

Segundo McCarthy & Prince (1998), a Reduplicação é um caso clássico para a

Morfologia Prosódica, no qual seus princípios são muito visíveis. Nesse tipo de fenômeno,

o material prosodicamente depreendido é uma cópia de segmentos da base, à qual o mesmo

será adicionado como uma espécie de afixo. Há exemplos clássicos da Reduplicação

analisados à luz do modelo em questão, como o caso do plural reduplicativo do Ilokano,

descrito em (23) a seguir. Nessa língua, um prefixo é adicionado à base para formar o

plural; entretanto, tal afixo é sempre uma sílaba pesada copiada da própria base.

Page 42: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

42

(23) Reduplicação para formação de plural em Ilokano

kaldín ‘bode’ � Kal-kaldín ‘bodes’

Púsa ‘gato’ � Pus-púsa ‘gatos’

kláse ‘aula’ � Klas-kláse ‘aulas’

Constata-se, com esse caso, que no Ilokano o molde a partir do qual se forma o

plural é sempre uma sílaba pesada, ou seja, bimoraica (σµµ.) e que para tal formação é

irrelevante a complexidade do onset envolvido no processo (veja kal vs klas). Por essa

razão, esse pode ser considerado um caso clássico da Morfologia Prosódica, já que,

segundo essa teoria, os moldes devem sempre ser definidos em termos autênticos da

prosódia, exatamente como o Ilkoano faz, ao definir como reduplicante uma sílaba pesada.

Outro ponto que torna esse caso ainda mais ilustrativo é o fato de o reduplicante tornar-se

um afixo, como na maioria dos casos envolvendo Reduplicação.

A Hipótese da Morfologia Prosódica, em conjunto com a Hierarquia Prosódica,

considera a existência de um sem número de moldes possíveis para a formação de um

reduplicante. A sílaba pesada do Ilokano, anteriormente analisada, é apenas um deles, pois

até mesmo nessa língua podemos encontrar outros casos de Reduplicação nas construções

morfológicas envolvendo moldes diferentes, como o caso da sílaba leve usada como molde

(veja o exemplo em 24). Isso contraria a idéia inicial de que toda Reduplicação envolve

simplesmente a cópia da primeira sílaba da base.

Page 43: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

43

(24) Ilokano si + σµ � ‘coberto com’

jyaket ‘jaqueta’ � si-jya-jyaket ‘usando uma jaqueta’

pandilin ‘saia’ � si-pa-pandilin ‘usando uma saia’

Logo, levando em conta a satisfação ao molde, não será permitido, durante o

processo, o surgimento de segmentos que não tenham sido anteriormente selecionados pela

atuação da circunscrição prosódica. Entretanto, isso não quer dizer que não possa haver

material fônico a ser descartado presente no molde. Segmentos que não satisfazem as boas

condições de formação (restrições) podem estar presentes no molde; no entanto, os mesmos

sofrerão a atuação dos filtros.

Para uma melhor compreensão das instâncias envolvidas na Reduplicação, convém

deter-se ainda em seus princípios com mais detalhes e exemplos em português. Nesse

sentido, as análises feitas por Gonçalves (2004 e 2008) são importantes, posto que tratam

de fenômenos marginais em português, como o caso da Reduplicação aqui desenvolvido.

Dessa forma, sabe-se que a função selecionar os elementos mais indicados para uma

boa formação dos vocábulos, é dos filtros. Essas condições podem ser referentes ao

bloqueio de algum segmento no processo ou, até mesmo, à obrigatoriedade de outros.

Outro princípio da Morfologia Prosódica já citado – a circunscrição – revela que

critérios prosódicos e morfológicos circunscrevem as operações morfológicas. É por meio

Page 44: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

44

da circunscrição que é localizada uma seqüência prosódica determinada, sempre menor que

a base, através da função de parseamento (F).

Segundo McCarthy & Prince (1990), a circunscrição pode ser negativa ou positiva.

Circunscrição Negativa

Quando ativada, mapeia uma parte da palavra-matriz, apagando-a. É uma circunscrição que

envolve subtração dos segmentos mapeados, daí sua denominação como negativa. Logo, o

material aproveitado será aquele não circunscrito, como no exemplo a seguir.

(25) Circunscrição Negativa no Truncamento (GONÇALVES, 2008)

circunscrição

B A T E R I S T A

(B A T E R) + A BATERA

Esse caso de Truncamento em português é um exemplo de circunscrição negativa. O

Truncamento é um processo através do qual se encurta uma base com o intuito de expressar

carga emocional determinada; nele, o material circunscrito é subtraído. Aqui, a

circunscrição é ativada da direita para a esquerda com o objetivo de mapear um troqueu

moraico (-rista) e dissociar o onset da rima na segunda sílaba rastreada (r-is). O material

fonológico restante, formado após a atuação da circunscrição no Truncamento em

Page 45: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

45

português, é aproveitado junto com o onset mencionado (bater-). A esse produto é

adicionada a vogal –a, tendo como forma final batera.

Circunscrição Positiva

Quando ativada, mapeia uma parte da palavra-matriz, selecionando-a. É uma circunscrição

que aproveita apenas os segmentos mapeados, rejeitando os que ficarem de fora. Um

exemplo típico desse tipo de circunscrição é encontrado na Hipocorização em português,

como destacado a seguir.

(26) Circunscrição Positiva na Hipocorização (GONÇALVES, 2008)

circunscrição

F E L I P E

A Hipocorização é o processo por meio do qual se formam nomes afetivos a partir

de antropônimos. No exemplo acima, o material circunscrito é aproveitado, gerando a

forma final Lipe. Nesse caso, a circunscrição mapeia um troqueu moraico, dissociando-o da

parte restante (Fe), já que o molde deve ter o formato da circunscrição.

É importante ressaltar que o processo pode não estar completamente terminado com

a produção de um molde. É nesse momento que os filtros podem atuar, no sentido de

corrigir um molde que esteja infringindo alguma condição de boa-formação (McCARTHY

& PRINCE, 1990). Portanto, pode existir um nível intermediário de representação nos

L I P E

Page 46: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

46

processos, pois a diferença entre a forma de molde e a final significa a atuação dos filtros.

O esquema a seguir, extraído de Gonçalves (2008), demonstra como se dá a atuação dos

filtros.

(27) INPUT � Circunscrição Prosódica � (Condições de Minimalidade)

Condições de Boa- � molde Formação � OUTPUT

Os pontos principais da Morfologia Prosódica (MP) podem ser resumidos no quadro

a seguir:

Page 47: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

47

MP

Dispositivos de naturezas diferentes vão regular a gramaticalidade das formas

(circunscrição, filtro, restrições).

Condições de boa formação são invioláveis e atuam no molde, material rastreado pela

circunscrição prosódica.

Há, pelo menos, três instâncias derivacionais:

Input � palavra-matriz;

Molde � material lingüístico aproveitado após a atuação da circunscrição prosódica.

Ao molde podem ser ainda aplicados os filtros, caso haja a necessidade de satisfazer

alguma condição de boa-formação;

Forma final � produto final do processo.

Em casos de Reduplicação, o material filtrado no molde constitui a base para o

acréscimo de reduplicante. Nesse caso, quatro instâncias são necessárias:

Input � palavra-matriz;

Molde � material lingüístico aproveitado após a atuação da circunscrição prosódica

e sujeito à atuação de condições de boa-formação;

Base � material lingüístico filtrado pelas condições de boa-formação e passível de

afixação;

Forma final � produto final do processo.

Page 48: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

48

4 – A REDUPLICAÇÃO NO BABY-TALK EM UMA ANÁLISE MORFO-PROSÓDICA

Como anteriormente exposto, a Reduplicação é um fenômeno clássico para a

literatura que enfoca os casos de não-concatenação morfológica. No português brasileiro, o

tipo de Reduplicação efetuado no baby-talk é analisado no presente capítulo com base nos

pressupostos da Morfologia Prosódica, um modelo chamado por Gonçalves (2004) de

transderivacional. Antes de apresentar a análise, descrevemos as estratégias metodológicas

adotadas.

4.1 – Metodologia e Recolha de Dados

A recolha dos dados, realizada em dois momentos específicos, foi feita, em sua

maioria, sob controle, dada a especificidade do tema. Para tanto, foram utilizadas três

fontes, fundamentalmente:

(a) Dados extraídos em situação de fala real, através do

acompanhamento de 15 crianças (8 do sexo feminino e 7 do sexo

masculino) em fase de aquisição da linguagem, de 2 a 4 anos de idade;

(b) Entrevistas com os pais e parentes que conviviam com as crianças

acompanhadas. A distribuição dos informantes foi articulada com o intuito

de controlar distintas variáveis sociais, como classe social (baixa e média-

Page 49: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

49

alta) e escolaridade (ensino fundamental, médio e superior). Nessas

entrevistas, conduzidas sempre separadamente para que um informante não

tivesse acesso às respostas dos demais, foram feitas perguntas relacionadas

à produção verbal de cada criança, como:

i. Quais são as palavras que seu filho (a) costuma dizer?

ii. Como seu filho (a) costuma pronunciar essas palavras?

iii. Você sempre se comunica (ao pronunciar as palavras) com seu

filho (a) da mesma forma que o faz com adultos? Em caso

negativo, de que forma você pronuncia tais palavras?

iv. Existe alguma palavra ou frase que você pronuncie de maneira

diferente da normal ao se dirigir a seu filho(a)? Em caso

afirmativo, que palavras são essas e de que forma são pronunciadas

nesse contexto?

(c) Observação dos momentos de interação entre as crianças,

acompanhadas de seus respectivos pais e parentes, assim como também

com outras crianças;

(d) Testes propostos aos falantes com o intuito de verificar a

regularidade do fenômeno. Os referidos testes continham 3 questões a fim

de buscar dados distintos acerca do fenômeno, como (não necessariamente

na mesma ordem, ver Anexos 1, 2, 3 e 4):

Page 50: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

50

i. Reconhecimento pelos falantes do fenômeno estudado;

ii. Criação de formas reduplicadas seguindo o modelo de baby-talk

para a observação de suas regularidades;

iii. Escolha da melhor forma reduplicada para a constatação de

entraves ao processo.

Em seguida a essa etapa do trabalho, verificamos, ainda, como se dava a escolha do

input, tendo como base o output do adulto, assim como também a escolha da forma final,

baseando-se na maior semelhança possível com a forma de input.

Outro ponto importante foi a constatação da situação prefixal do reduplicante e,

mais adiante, de sua forma esqueletal, ao copiar segmentos da base formada a partir de

determinadas condições de boa-formação. Para tanto, uma outra etapa extremamente

valiosa foi a análise das regularidades do fenômeno e a formulação dos filtros envolvidos

no processo.

Os aspectos metodológicos acima citados estenderam-se por dois momentos

específicos da análise: durante o período de Iniciação Científica, subvencionado pela

FAPERJ, e, mais tarde, no período de Pós-Graduação, agora com o auxílio do CNPq. A

recolha de dados, no segundo momento, foi necessária para, além de expandir o corpus já

coletado anteriormente, elucidar algumas dúvidas a respeito de filtros envolvidos no

processo à luz de novo modelo e proposições (sobretudo aquela que envolve a presença da

consoante geminada). Dessa forma, estão divididos a seguir os dois momentos da pesquisa,

com seus respectivos detalhes a respeito da coleta de dados:

Page 51: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

51

(A) Iniciação científica (FAPERJ)

Durante essa fase, foram coletados dados gerais para a análise, em sua maioria

reunidos sob controle através dos questionários anteriormente citados e aqui anexados.

Houve coletas feitas através do contato com crianças em idade de aquisição da linguagem e

observação junto aos pais e parentes para uma melhor identificação do baby-talk e

confirmação das estruturas obtidas nos testes propostos, como já explicado. Nesse caso, a

pesquisa teve como foco a Teoria da Otimalidade. A distribuição dos informantes foi feita

da seguinte forma, nesse momento da pesquisa6:

BEBÊS (entre 2 e 4 anos)

SEXO Nº. DE INFORMANTES

M 5

F 5

6 CLASSE SOCIAL: A � média-alta B � baixa ESCOLARIDADE: FUND � fundamental MED �médio SUP � superior

Page 52: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

52

• Família

CRIANÇAS (5 informantes) 6 – 10 anos

CLASSE SOCIAL

ESCOLARIDADE S E X O

TOTAL A B FUND MED SUP

M 2 1 1 2 -- --

F 3 2 1 3 -- --

ADOLESCENTES / JOVENS (10 informantes) 11 – 25 anos

CLASSE SOCIAL

ESCOLARIDADE S E X O

TOTAL A B FUND MED SUP

M 3 2 1 1 1 1

F 7 3 4 4 2 1

ADULTOS (12 informantes) + 25 anos

CLASSE SOCIAL

ESCOLARIDADE S E X O

TOTAL A B FUND MED SUP

M 6 4 2 2 2 2

F 6 4 2 2 2 2

IDOSOS (3 informantes) + 60 anos

CLASSE SOCIAL

ESCOLARIDADE S E X O

TOTAL A B FUND MED SUP

M 1 -- 1 1 -- --

F 2 1 1 2 -- --

(B) Pós-Graduação (Mestrado)

Com o início da atual fase em que se encontra o trabalho, foi necessária uma nova

recolha de dados, pois percebemos que os filtros envolvidos no processo, agora focalizado

pela Morfologia Prosódica, precisavam ainda ser testados e confirmados. Com isso, foram

Page 53: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

53

feitos novos questionários e entrevistas com pais e filhos para determinar os últimos

detalhes do processo. A distribuição dos informantes foi feita da seguinte forma, nesse

momento da pesquisa:

BEBÊS (entre 2 e 4 anos)

SEXO Nº. DE INFORMANTES

M 2

F 3

• Família

CRIANÇAS (5 informantes) 6 – 10 anos

CLASSE SOCIAL

ESCOLARIDADE S E X O

TOTAL A B FUND MED SUP

M 5 3 2 2 1 2

F 5 3 2 2 1 2

4.2 – Dificuldades Enfrentadas

Durante o desenvolvimento do trabalho, houve muitas dificuldades a serem

superadas:

Page 54: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

54

(1) A primeira – e a mais evidente – foi relativa ao acesso às crianças na fase

requerida pelo baby-talk. Ter acesso a crianças tão pequenas pode ser muito difícil,

inclusive em escolas e creches, onde o fenômeno podia ser observado amplamente

no ambiente de interação entre elas.

(2) A Reduplicação é um fenômeno muito específico na língua. Às vezes, era

necessário observar as crianças por um longo período de tempo para conseguir

apenas um dado, mesmo propondo algum teste de forma lúdica.

(3) As palavras envolvidas pertencem sempre ao universo infantil ou devem ser

passíveis de uso por crianças, sendo ouvidas em ambiente familiar. Isso acaba por

restringir bastante o número de possibilidades, o que nos leva a um corpus mais

limitado, já que não há muita diversidade.

(4) As classes de palavras envolvidas nesse tipo de Reduplicação são sempre

substantivos (a maioria) e verbos. Esses dados devem sempre estar contidos no

universo infantil, tornando-se mais um fator de limitação do corpus.

(5) A constituição das palavras envolvidas também restringe as possibilidades

de verificação do processo. A maioria das palavras envolvidas é trissilábica, com

predomínio do formato CV (consoante + vogal).

Como é possível perceber, coletar dados ou mesmo imaginar quais podem ser

considerandos nesse processo foi um empecilho. Dessa maneira, mesmo a formulação dos

testes para a obtenção de dados sob controle foi bastante dificultada, dadas as limitações

acima definidas. Apesar das dificuldades, chegamos a um corpus constituído de 57 formas

(anexo 5) e é com base nelas que a análise morfo-prosódica será desenvolvida na próxima

seção.

Page 55: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

55

4.3 – Análise de Dados

O processo de Reduplicação no baby-talk, como já definido nos capítulos anteriores,

faz parte de um tipo de discurso entre adultos e crianças em fase de aquisição da

linguagem. É um processo de formação de palavras visto como marginal, tratando-se de um

fenômeno que faz parte da Morfologia Não-concatenativa, pois acessa, além de

informações morfológicas, também informações fonológicas.

O referido processo tem como forma de input (palavra-matriz, forma derivante) a

saída fonética do adulto, ou seja, o input desse fenômeno não é uma forma subjacente, mas

uma realização fonética, como argumentaremos mais adiante. De acordo com a Morfologia

Prosódica (modelo aqui utilizado), o fenômeno envolve desde o rastreamento de um molde

por meio de uma circunscrição positiva, tipo de scanneamento que, como vimos em 3.2,

aproveita apenas os elementos mapeados, até o processo de Reduplicação através de uma

estrutura esqueletal subespecificada.

A circunscrição prosódica envolvida no processo tem como meta principal rastrear a

sílaba tônica, informação importante para a formação do molde, que, em seguida, sofrerá a

atuação dos filtros.

Nesse tipo de Reduplicação, o reduplicante é sempre uma forma prefixal e o output

final será equivalente, em significado, à forma adulta, ou seja, esse é um caso em que não

há alteração semântica, ao contrário de muitos outros em diversas línguas naturais e na

própria língua portuguesa, como a Reduplicação de base verbal (corre-corre, pega-pega,

bate-bate). Predomina, nesse tipo de processo, a função expressiva de avaliação, nos termos

de Basílio (1987), uma vez que o produto é marcado pela expressão de carinho, afeto.

Page 56: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

56

Para a formação da base que sofre Reduplicação, algumas condições de boa-

formação devem ser atendidas. Nesse momento da derivação, atuam 5 filtros (restritores

que dão conta das condições de boa-formação). Para uma melhor observação e definição

das etapas pertinentes ao processo em questão, seguem, abaixo, o modelo e as devidas

explicações a respeito de cada estágio de formação:

(28) Etapas do Processo de Reduplicação no baby-talk

INPUT � Forma de entrada, realização fonética do adulto;

CIRCUNSCRIÇÃO � Mapeia segmentos do input (saída fonética do adulto). A

circunscrição envolvida nesse processo é positiva, pois aproveita apenas os elementos

mapeados do input para formar o molde, deixando de fora os que restarem. Um marco

importante para a circunscrição é a sílaba tônica, pois é a partir dela que se decidirá quais

elementos serão mapeados;

INPUT CIRCUNSCRIÇÃO POSITIVA

MOLDE

BASE CV(C)NASAL

RED

FORMA FINAL

1

FILTROS

ONSET

2 *COMPLEX

3 CODA INT[sibilante,nasal]

4 CODA-FINAL[vocálica]

5 *Pwd[R, ¥, ̄

Page 57: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

57

MOLDE � Parte formada através do mapeamento feito pela circunscrição positiva e que

sofrerá atuação dos filtros;

FILTROS7 � Restritores que têm como função dar conta das condições de boa-formação

envolvidas no processo. Eles corrigem os moldes que infringem essas condições. No caso

da Reduplicação no baby-talk, há 5 filtros:

1. ONSET (Sílabas são iniciadas por consoantes) � Condição de boa-

formação que exige onset para todas as sílabas do molde, o que torna impossível

a Reduplicação de uma palavra em que a sílaba envolvida se inicie por vogais,

como toalha. Nesse caso, a tonicidade recai exatamente na vogal a, razão pela

qual, nos testes aplicados durante o desenvolvimento do trabalho, os

informantes afirmaram ser impossível reduplicar essa palavra.

2. *COMPLEX (ONSETs são simples) � Condição de boa-formação que

proíbe complexidade na margem esquerda da sílaba. É por esse motivo que

palavras como bicicleta geram formas como kekéta: o segundo filtro as corrige,

de maneira que possam servir de base à anexação do prefixo, efetuada mais

tarde, após todo o processo de filtragem.

3. CODA INT[sibilante, nasal] (codas internas são nasais ou sibilantes) �

Condição de boa-formação que restringe o tipo de coda interna no processo.

7 Esses restritores não devem ser vistos como regras ordenadas intrinsecamente; são condições que devem ser atendidas em conjunto para que se gere a forma de base. Dessa forma, não há prioridade de uma sobre a outra – todas são igualmente importantes e devem ser sempre obedecidas.

Page 58: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

58

Nesse caso, estão licenciados apenas segmentos consonantais nasais e sibilantes,

como em madrinha � dindinha e revista � vivista.

4. CODA-FINAL[vocálica] (codas finais são vocálicas) � Condição de boa-

formação que restringe o preenchimento da coda final no molde, proibindo

qualquer segmento consonantal nessa posição. Devido a isso, é possível a

formação de chapéu � pepéu.

5. Palavras Prosódicas não podem começar por [RRRR, ¥¥¥¥, ¯̄̄̄] � Condição de

boa-formação que proíbe os segmentos [R, ¥, ¯] de preencher a posição de onset

em início de palavra prosódica (PWd) na língua portuguesa, como mostram

Gonçalves (2004: 27) e Monaretto, Quednau & Hora (2005:208). Os segmentos

bloqueados serão substituídos por aqueles articulatoriamente mais próximos.

Esse filtro será atuante apenas nos casos excepcionais, contemplados em 4.4.

BASE � Forma que surge após a atuação dos filtros e que sofrerá a Reduplicação. Resulta

da porção segmental que obedece as condições de boa-formação; é a base para a forma

final.

REDUPLICANTE (RED) CV(C)NASAL � É uma estrutura esqueletal subespecificada, que

copiará sempre a primeira seqüência CV da base e também um segmento em coda, desde

que seja nasal. Quando não houver coda nasal, essa cópia não acontecerá; daí o segundo C

entre parênteses, convenção que indica opcionalidade. O reduplicante atuará como prefixo,

do mesmo modo que na maioria dos processos de Reduplicação descritos no capítulo 2;

Page 59: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

59

FORMA FINAL � É a forma que resulta do acréscimo de reduplicante, após a cópia, à

direita da base, finalizando o processo.

Há algumas restrições sobre as palavras que podem sofrer o processo, para o qual

não estão licenciadas todas as formas da língua; apenas aquelas que preenchem os

requisitos necessários. Dessa maneira, há um padrão pré-definido para a formação desses

vocábulos reduplicados, a saber:

(29) Restrições que atuam sobre os derivantes da Reduplicação no baby-talk

1. Trissílabos e polissílabos geram trissílabos, como em chinelo � nenelo, biscoito �

cocoto, estante � tantante, boneca � neneca, sabonete � nenete, telefone � fofone,

gelatina � titina;

2. Dissílabos oxítonos geram dissílabos igualmente oxítonos, como em chapéu � pepéu,

xampu � pupú, pastel � tetéu, dormir � mimi;

3. Monossílabos e dissílabos paroxítonos não são reduplicados, porque isso levaria a um

produto com maior extensão e complexidade que a palavra derivante;

4. O processo é raro em proparoxítonas, seguindo a tendência geral da própria língua

portuguesa, que evita, desde de sua gênese, palavras proparoxítonas. Há, no entanto, um

único caso desse tipo – helicóptero � cocopi – que será analisado com mais detalhes em

4.4.

Page 60: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

60

A partir do estabelecimento dos dispositivos gerais que regem o processo, isto é,

que norteiam a escolha da palavra-matriz (derivante) habilitada para esse operação morfo-

fonológica, podem-se enumerar quais os tipos de bases8 reconhecidos nesse tipo de

fenômeno. No caso da Reduplicação no baby-talk, existem 5 tipos estruturais distintos; são

eles:

(30) Bases envolvidas na Reduplicação no baby-talk

1ª BASE ���� »»»»CV

2ª BASE ���� »»»»CVV

3ª BASE ���� »»»»CV.CV

4ª BASE ���� CV.CVV

5ª BASE ���� »»»»CVC.CV

Cada base gera reduplicantes e seqüências distintas. A seguir, o processo é mostrado

em detalhes para cada tipo de base. Em razão de ser atuante apenas em casos excepcionais,

o filtro 5 será levado em conta somente nas análises feitas em 4.4.

1ª BASE ���� CV

É o caso de xampu � pupu e dormir � mimí. Nessas palavras, a circunscrição

prosódica copia apenas a sílaba tônica, com o intuito de formar um outro dissílabo, já que

vocábulos maiores que a palavra-matriz são bloqueados no processo, conforme as

condições expressas em (29). O esquema a seguir ilustra como se desenvolve esse tipo de 8 Lembramos que o termo ‘base’ se aplica, aqui, ao material fonológico filtrado no molde pelas condições de boa-formação. Desse modo, a base é o molde que satisfaz as restrições fonotáticas.

Page 61: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

61

base. Nele e nos demais, o ponto indica fronteira de sílaba e símbolo », antes do ponto, a

sílaba proeminente.

(31)

Na situação apresentada em (31), como a base é uma sílaba CV, ela será totalmente

copiada pelo reduplicante CV(C)nasal – por isso a formação de um dissílabo oxítono, como

a palavra-matriz. Depois de demonstrado o modelo do processo para uma base CV,

passemos à testagem com os dados adquiridos durante a pesquisa. Comecemos com

‘xampu’, em (32):

INPUT

CV.’CV(C)

CIRCUNSCRIÇÃO

MOLDE

CV(C)

BASE

C V

RED

Forma final CV.’CV

1

FILTROS

ONSET

2 *COMPLEX

3 CODA INT[sibilante,nasal]

4 CODA-FINAL[vocálica]

5 *Pwd[R, ¥, ̄

CV(C)NASAL

Page 62: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

62

(32)

Em (32), é ilustrado o mecanismo derivacional com um dos dados recolhidos

durante a fase de rastreamento. Em xampu � pupu, a circunscrição parte da direita para a

esquerda, rastreando e mapeando a sílaba tônica pu. Em seguida, a seqüência mapeada é

jogada para o molde, no qual os filtros atuarão, de modo a satisfazer as condições de boa-

formação. A forma de molde passa por todos os filtros, pois é (1) uma sílaba iniciada por

consoante, (2) não possui complexidade no onset e não apresenta coda de nenhuma espécie,

atendendo, com isso, os filtros (3) e (4). Dessa forma, o molde é inteiramente fiel à base e,

a partir daí, sofrerá a cópia, engatilhada pela estrutura subespecificada do reduplicante. O

reduplicante, por sua vez, copia a consoante e, logo após, a vogal, não havendo uma

consoante nasal a ser copiada. Logo, a forma final é pupu, um caso de Reduplicação total.

Com ‘dormir’, ocorre simplificação do molde, como se vê em (33):

INPUT

[Sã»pu]

CIRCUNSCRIÇÃO

MOLDE

[»pu]

BASE

[»p u]

RED

Forma final [pu»pu]

1

FILTROS

2 �

3 �

4 �

5 �

CV(C)NASAL

Page 63: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

63

(33)

Em (33), a circunscrição prosódica também rastreia a sílaba tônica do input9, mi,

levando-a para o molde. Aqui, apenas um filtro tem atuação, pois o molde não infringe

nenhuma outra condição de boa-formação, já que a sílaba mir (1) começa por consoante,

(2) não possui complexidade no ataque e (3) não apresenta coda interna. O filtro (4) age

corrigindo o molde, pois este possui uma coda proibida pelo processo, para o qual só estão

licenciados segmentos vocálicos. Logo, a base sofre a cópia da consoante e da vogal,

levando à forma final mimi. Passemos, agora, à análise das bases CVV.

9 Nesse caso, a forma adulta é durmir, devido ao fenômeno do alteamento da pretônica por harmonia vocálica, típico do português brasileiro.

INPUT

[duƒ»mix]

CIRCUNSCRIÇÃO

MOLDE

[»miX]

BASE

[»m i]

RED

Forma final [mi»mi]

1

FILTROS

2 �

3 �

4

5 �

CV(C)NASAL

Page 64: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

64

2ª BASE ���� CVV

É o caso de chapéu � pepéu e pastel � tetéu. Nessas palavras, da mesma forma

que nas anteriores, a circunscrição prosódica copia apenas a sílaba tônica do input, com o

intuito de formar um outro dissílabo. A seguir, é ilustrada a generalização do processo para

esse tipo de base.

(34)

Dessa vez, ocorre uma coda vocálica, o único tipo permitido pelo processo em

posição final. Logo, apenas a primeira consoante e a primeira vogal sofrerão a cópia pelo

reduplicante. A forma final será um dissílabo oxítono, como é demonstrado com os dados,

a seguir.

INPUT

CV.’CVV

CIRCUNSCRIÇÃO

MOLDE

»CVC

BASE

»C V C

RED

Forma final CV.’CVV

1

FILTROS

ONSET

2 *COMPLEX

3 CODA INT[sibilante,nasal]

4 CODA-FINAL[vocálica]

5 *Pwd[R, ¥, ̄

CV(C)NASAL

Page 65: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

65

(35)

Em (35), a circunscrição positiva rastreia a sílaba tônica péu, lançando-a para o

molde. Em seguida, o molde passa sem correções pelos filtros, pois (1) começa por

consoante, (2) não possui complexidade na margem esquerda da sílaba, (3) não apresenta

codas internas, por se tratar de um monossílabo, e (4) apresenta uma coda final vocálica,

permitida pelo processo. Dessa forma, a base é idêntica ao molde e dela são copiados os

dois primeiros segmentos pelo reduplicante, formando pepéu. Nesse caso, a consoante em

coda presente na estrutura esqueletal do reduplicante não copia nenhum elemento, já que,

apesar de haver uma coda na base, esta é vocálica, sendo necessária uma coda nasal para

haver a cópia. Situação idêntica ocorre com ‘pastel’, como se vê em (36):

INPUT

[Sa»pEu]

CIRCUNSCRIÇÃO

MOLDE

[»pEu]

BASE

[»p E u]

RED

Forma final [pE»pEu]

1

FILTROS

2 �

3 �

4

5 �

CV(C)NASAL

Page 66: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

66

(36)

Em (36), a circunscrição positiva rastreia e mapeia a sílaba tônica tel10. Ao passar

para o molde, a sílaba mapeada passa sem alterações pelos filtros por (1) começar por

consoante, (2) não apresentar complexidade no ataque, (3) não possuir coda interna, em se

tratando de apenas uma sílaba, e (4) possuir uma coda final vocálica. Assim, a mesma

forma passa para a base e sofre a cópia do reduplicante, por meio da qual apenas os dois

primeiros segmentos CV são contemplados. A forma final é, portanto, tetéu. Passemos, a

seguir, à análise das bases ‘CV.CV.

10 Ocorre a vocalização da lateral no contexto final, como em animal � animau, o que corrobora a afirmativa de que o input do processo é uma forma de output.

INPUT

[paS»tEu]

MOLDE

[»tEu]

BASE

[»t E u]

RED

Forma final [tE»tEu]

1

FILTROS

2 �

3 �

4

5 �

CV(C)NASAL

Page 67: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

67

3ª BASE ���� ‘CV.CV

Este tipo de base mostrou-se o mais interessante no fenômeno, apresentando o

maior número de atuação dos filtros, como em boneca � neneca, bicicleta � quequeta e

cobertor � bebetô. Agora, a circunscrição prosódica mapeia todos os segmentos até a

sílaba tônica e os lança para o molde. É uma base que forma trissílabos.

(37)

Nesse caso, as formas de input e molde são estruturalmente diversificadas, como

assinalam os diversos parênteses, que, como já dissemos, indicam constituintes que podem

não estar presentes. No entanto, em todos os casos os filtros atuarão corrigindo-as e

uniformizando o processo para gerar sempre o mesmo tipo de forma final. Os detalhes são

demonstrados a seguir. Comecemos com ‘boneca’:

INPUT

(CV).(C)V.’C(C)V.CV

CIRCUNSCRIÇÃO

MOLDE

»C(C)V.CV

BASE

»C V CV(C)NASAL

RED

Forma final CV.’CV.CV

1

FILTROS

ONSET

2 *COMPLEX

3 CODA INT[sibilante,nasal]

4 CODA-FINAL[vocálica]

5 *Pwd[R, ¥, ̄

Page 68: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

68

(38)

Em (38), a circunscrição prosódica rastreia a sílaba tônica da direita para a esquerda,

mapeando toda a seqüência de segmentos até ela. Logo, a forma levada para o molde é

neca, que passa incólume pelos filtros, pois (1) todas as suas sílabas são iniciadas por

consoante, (2) nenhuma delas possui complexidade no onset ou apresenta codas (3 e 4).

Portanto, a base é igual ao molde, sofrendo a cópia de apenas os dois primeiros segmentos

CV. A forma final é neneca. Em ‘bicicleta’, molde e base são diferentes, como é visto em

(39):

CIRCUNSCRIÇÃO

INPUT

[bu»nEka]

MOLDE

[»nEka]

BASE

[» n E k a] CV(C)NASAL

RED

Forma final [nE»nEka]

1

FILTROS

2 �

3 �

4

5 �

Page 69: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

69

(39)

Em (39), a circunscrição prosódica parte igualmente da direita para a esquerda,

rastreando toda a seqüência de segmentos até a sílaba tônica. Logo, o molde será kleta, que

passa pelo primeiro filtro, pois começa por uma consoante. No entanto, infringe o segundo

filtro, já que possui um onset complexo. Dessa forma, essa infração é corrigida, de modo

que a líquida lateral é apagada. Os filtros (3) e (4) não apresentam atuação, pois o molde

não possui codas. A base, keta, sofre a cópia da seqüência CV inicial, levando à forma final

quequeta. Vejamos, a seguir, o mecanismo derivacional que gera ‘bebetô’ a partir de

‘cobertor’:

INPUT

[bisi»klEta]

MOLDE

[»k l Eta]

BASE

[ »k E t a] CV(C)NASAL

RED

Forma final [kE»kEta]

1

FILTROS

2

3 �

4

5 �

Page 70: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

70

(40)

Em (40), a circunscrição prosódica rastreia a sílaba tônica tor. No entanto, ela não

pára o mapeamento, já que, como esclarecido nas restrições das bases para o processo (29),

trissílabos gerarão sempre trissílabos11. Isso garante o prosseguimento da circunscrição até

a sílaba seguinte, jogando para o molde a seqüência bertor. O filtro (1) não é atuante nesse

caso, pois as sílabas começam por consoantes, assim como (2), uma vez que não há

complexidade no onset. O filtro (3) atua nesse molde, já que existe uma coda interna e esta

não é nasal ou sibilante, sendo eliminada para a satisfação dessa condição de boa-formação.

O filtro (4) também atua, corrigindo a coda final não-vocálica no molde em questão. Logo,

a base é Betô, da qual apenas os dois primeiros segmentos CV são copiados, gerando a

forma final bebetô. Passemos, agora, à descrição das bases com formato CV.CVV.

11 Entendemos, dessa forma, que a circunscrição prosódica é regida de algum modo por condições de tamanho, pois quando bases oxítonas são trissílabos ou polissílabos não é apenas a sílaba tônica que se projeta para o molde, mas também a pretônica. Acreditamos, então, que alguma instrução quanto à fidelidade está contida na circunscrição prosódica, pois o rastreamento apenas da tônica pode gerar uma forma opaca. Deixaremos essa questão em aberto para uma posterior reanálise.

CIRCUNSCRIÇÃO

INPUT

[kobex»tox]

MOLDE

[be X »to X ]

BASE

[ b e »t o] CV(C)NASAL

RED

Forma final [bebe»to]

1

FILTROS

2

3

4

5 �

Page 71: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

71

4ª BASE ���� CV.CVV

Este é o caso de remédio � memédio e algodão � gogodão. A forma final será um

trissílabo, terminado em coda vocálica, como na generalização a seguir.

(41)

Em (41), omitiu-se a informação referente ao acento, uma vez que as bases podem

ser oxítonas (‘algodão’) ou paroxítonas (‘remédio’). Comecemos com ‘remédio’,

analisando a formalização apresentada em (42), a seguir:

INPUT

CV.CV.CVV

CIRCUNSCRIÇÃO

MOLDE

CV.CVV

BASE

C V .CVV CV(C)NASAL

RED

Forma final CV.CV.CVV

1

FILTROS

ONSET

2 *COMPLEX

3 CODA INT[sibilante,nasal]

4 CODA-FINAL[vocálica]

5 *Pwd[R, ¥, ̄

Page 72: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

72

(42)

Em (42), a circunscrição positiva rastreia a sílaba tônica, mapeando toda a seqüência

de segmentos até ela. Logo, o molde mediu sofre a ação dos filtros e passa irretocável por

todos eles, já que (1) começa por consoante, (2) não possui complexidade no onset, (3) não

apresenta codas internas e (4) apresenta apenas uma coda final vocálica, permitida pelo

processo. Portanto, a base mediu passa para a próxima etapa: a cópia. O reduplicante copia

a primeira seqüência CV da base, levando à forma final memédio. No caso de ‘algodão’,

como em ‘cobertor’, a circunscrição avança além da tônica, como é visto em (43):

CIRCUNSCRIÇÃO

INPUT

[xe»mEdiu]

MOLDE

[»mEdiu]

BASE

[»mEdiu] CV(C)NASAL

RED

Forma final [me»mEdiu]

1

FILTROS

2

3

4

5 �

Page 73: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

73

(43)

Em (43), a circunscrição prosódica também rastreia a sílaba tônica; no entanto,

prossegue no mapeamento até a sílaba seguinte para formar um trissílabo. O molde godão

passa sem correções pelos quatro filtros, pois (1) começa por consoante, (2) não possui

complexidade no onset, (3) não apresenta codas internas e (4) apresenta, como no caso

descrito anteriormente, em (42), uma coda final vocálica, permitida pelo processo. A base,

idêntica ao molde, sofre a cópia CV do reduplicante e forma, finalmente, gogodão.

Apresentemos, por fim, o último tipo de base: »CVC.CV.

CIRCUNSCRIÇÃO

INPUT

[augo»dãu]

MOLDE

[go»dãu]

BASE

[g o»dãu] CV(C)NASAL

RED

Forma final [gogo»dãu]

1

FILTROS

2

3

4

5 �

Page 74: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

74

5ª BASE ���� CVC.CV

É o caso de revista � vivista e madrinha � dindinha, únicos casos em que ocorre

uma coda interna. A forma final será sempre um trissílabo. No segundo exemplo, que, em

princípio, não apresenta o formato »CVC.CV, podemos perceber a ocorrência de uma

geminada, proposta por Wetzels (2000), para o português. Os detalhes desse fenômeno,

assim como a proposta do referido autor, são descritos adiante. A generalização para essa

base não é apresentada, como foi feito nas anteriores, pois aqui a cópia de segmentos pelo

reduplicante será distinta em cada caso. Passemos diretamente à exemplificação,

começando com ‘revista’.

(44)

Em (44), a circunscrição prosódica rastreia a sílaba tônica, mapeando toda a

seqüência de segmentos até ela. Em seguida, o molde vista passa sem correções pelos

INPUT

[xe»viSta]

MOLDE

»[viSta]

BASE

[»v iSta] CV(C)NASAL

RED

Forma final [vi»viSta]

1

FILTROS

2

3

4

5 �

Page 75: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

75

filtros, pois (1) começa por consoante, (2) não apresenta complexidade no onset, (3) possui

uma coda interna preenchida por sibilante e permitida pelo processo, e (4) não possui coda

final, passando ileso por esse último filtro. Logo, a base vista sofre a atuação do

reduplicante, que copia a sua primeira seqüência CV. A forma final será, portanto, vivista.

Passemos, então, para o último dado desta seção: madrinha � dindinha. Esse par

representa uma parte muito importante da análise, pois é através dele que se pode confirmar

a presença de uma geminada fonológica /¯¯/, como propõe Wetzels (2000). Antes de

proceder à análise, é necessária uma revisão da proposta de Wetzels a respeito de tal

geminação.

Segundo Wetzels (2000), a nasal palatal /›/ em português tem um comportamento

diferente das não palatais. O autor estabelece as principais peculiaridades de tal segmento:

(a) comportamento da nasal palatal /›/ como consoante-coda, mesmo estando sempre

posição intervocálica;

(b) criação de um hiato quando do surgimento de seqüências Vogal + Vogal Alta antes

das mesmas soantes palatais (moinho, tainha). Em outros casos, como antes de /m,

n/, aparecem os ditongos decrescentes (queima, andaime);

(c) caso uma nasal palatal esteja em posição de onset de uma sílaba em final de palavra

(alcunha), tal palavra nunca será uma proparoxítona, já que no português não

existem palavras proparoxítonas com sílaba pesada pré-final.

Page 76: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

76

Para Wetzels, a explicação para tais ocorrências é que, na verdade, a nasal palatal é

uma geminada em português. No entanto, para discutir essa questão, é necessário rever

determinados conceitos, como o da estrutura silábica do português.

Levando em conta a Teoria da Sílaba, o molde silábico do português pode ser

definido nos seguintes termos:

(45) Estrutura Silábica do Português

σ

C L R

V C s

Em língua portuguesa, a estrutura da sílaba segue os parâmetros expostos em (45).

As sílabas possuem ataque, C, podendo ou não haver complexidade, isto é, após a

consoante inicial pode haver uma líquida (L). Em seguida, temos a rima, que consiste em

um núcleo vocálico V, podendo ser seguido de coda, C, e /s/. Todas essas categorias podem

ser vazias, menos o núcleo V.

Observa-se, ainda, que a posição C, na Rima, é sempre reservada para segmentos

soantes (vogais, líquidas e nasais) ou /s/. Isso leva a uma representação mais precisa da

rima em português, como em (46):

Page 77: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

77

(46) Rima Silábica no Português

Rima

Núcleo Coda

Vogal C C

[+soante] s

Em português, pode-se usar a noção de sílaba pesada de modo mais geral: sempre que

houver duas posições de rima preenchidas. Nesse caso, o português possui sílabas abertas (leves)

e travadas (pesadas), tendo em vista a teoria moraica de peso silábico, como já explicado no

capítulo 3. As vogais nasais também acabam por comportar-se como rimas pesadas no português.

Nesse sentido, Wetzels propõe uma lista de rimas do português brasileiro:

(47) Rimas Pesadas no PB

Rimas possíveis Ilustrações

Final de palavra Pré-final

Vr abajur aberto

Vl anel asfalto

Vs cortês adestro

Ditongos orais herói eleito

Ditongos nasais irmão cãibra

Vogais nasais irmã macumba

Page 78: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

78

Tendo em vista a estrutura da rima em português, quando sílabas terminam em

líquidas, não podem ser seguidas de nasais e o contrário também é verdadeiro, ou seja,

quando terminadas por nasais, não podem ser seguidas por líquidas.

Outro ponto importante esclarecido por Wetzels é sobre a assimetria na regra da

nasalização alofônica no português. Ele explica que o português possui um tipo de

nasalização alofônica, além das vogais nasais contrastivas (campo, lenda, minto, lombo,

mundo), desencadeada por uma consoante nasal intervocálica, que passa o traço nasal para

a vogal precedente, como em c[ã]ma, l[ã]ma, men[i)]na. No entanto, existem diferenças na

utilização dessas regras, já que a nasalisação contrastiva é obrigatória, fazendo o acento

recair sempre na sílaba pré-final, e a alofônica é uma regra variável na língua. Um bom

exemplo dessa variabilidade é o verbo amar, pois, para muitos falantes de português, a

nasalização alofônica, muito embora não aconteça com a forma infinitiva, acontece na

forma conjugada [ã]mo. Outros exemplos desse fenômeno são mostrados abaixo:

(48) Nasalização alofônica

(48.a) Acentuada antes de /n, m/

[»si)nu] sino [»fu )mu] fumo

[»le)mi] leme [»dõnu] dono

[»kãma] cama

Page 79: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

79

(48.b) Não-acentuada antes de /n, m/

[pi»nçja] pinóia [kuma»ri] cumari

[te»nas] tenaz [bo»nEka] boneca

[ta»mãku] tamanco

(48.c) Acentuadas antes de /¯/

[ko»zi)̄ a] cozinha [aw»ku)̄ a] alcunha

[a»ze)̄ a] azenha [se»go))̄ a] cegonha

[a»rã̄ a] aranha

(48.d) Não-acentuadas antes de /¯/

[di»)̄ ejru] dinheiro [ku»)̄ adu] cunhado

[se»)̄ ox] senhor [vexgo»)̄ ozu] vergonhoso

[ka)»¯otu] canhoto

Como demonstrado acima, a nasalização da vogal precedente acontece sempre antes

de /̄ /; o mesmo não se pode dizer de /n,m/, para os quais a regra é bem menos geral.

Portanto, a nasalização alofônica diante da nasal palatal independe do acento, tal como a

Page 80: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

80

nasalização contrastiva12. Wetzels retoma Abaurre & Pagotto (1996:24) para corroborar sua

afirmação:

“A nasalização é categórica quando a vogal precede uma consoante nasal

palatal, independentemente do contexto tônico ou átono”. (ABAURRE &

PAGOTTO, 1996:24).

Wetzels admite que tal nasalidade acontece em posição de coda, como em campo, e

propõe considerar a palatal como uma geminada lexical /̄ ¯/, o que torna a sílaba

precedente sempre pesada. Isso explica porque uma nasal palatal não é precedida por sílaba

pesada no português. Observemos os exemplos abaixo:

(49)

alma alcunha

arma caminho

abismo cozinha

teimar desenho

andaime façanha

Como pode ser observado em (49), uma sílaba pesada pode preceder /m,n/, mas não

/¯/. Isso pode ser explicado porque, admitindo-se que a nasal palatal é, na verdade, uma

geminada, a primeira parte da mesma ocuparia a posição de coda da sílaba precedente,

12 Com /m, n/, a nasalização depende do acento como um a priori para sua aplicação, já que em determinados falares, como o nosso, vogais só se realizam nasais diante de nasais em sílaba tônica, como mostram os exemplos em (47.a) e (47.b).

Page 81: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

81

impossibilitando o surgimento de outra consoante nessa sílaba. A isso também se deve o

fato de que, quando tal consoante palatal ocorre entre as duas últimas vogais de uma

palavra trissilábica, esta nunca será proparoxítona, já que no português não existem

proparoxítonas com uma sílaba pesada pré-final.

Outra evidência em favor da geminação é o fato de /¯/ não ser licenciado para início

de palavras no português, como evidencia o filtro (5) da Reduplicação no baby-talk. Tal

proibição mostra-se ainda mais clara quando se observa a pronúncia brasileira de uma

palavra como nhoque, empréstimo do italiano. Os falantes de português pronunciam

[i »)̄ çki], provando que a complexidade da nasal palatal só é suportada em posição

intervocálica.

Ainda, a nasal palatal pode ser precedida por uma seqüência de Vogal + Vogal Alta.

No entanto, não se formarão ditongos, mas sim hiatos, devido à situação de coda na qual se

encontrará uma das geminadas. Da mesma forma, isso também explica porque nesses casos

o acento nunca recai na antepenúltima sílaba.

Dessa forma, fica comprovado que, na verdade, a geminada /̄ ¯/ deixa sempre a

sílaba precedente pesada. Isso fica bastante claro na análise a seguir.

Page 82: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

82

(50)

Em (50), a circunscrição prosódica rastreia novamente a sílaba tônica, mapeando

toda a seqüência de segmentos até ela. O molde drinha sofre a ação dos filtros, passando

incólume pelo primeiro por começar por consoante. Já no segundo filtro, acontece uma

correção, devido à complexidade do onset, o que leva à eliminação do tepe. Os filtros (3) e

(4) não são atuantes, pois o referido molde não possui coda final e a coda interna é nasal.

Logo, a base é dinha. É no momento de o reduplicante copiar os segmentos da base que

podemos perceber melhor a importância da geminada nesse processo. Além dos dois

primeiros segmentos CV, será copiada também uma das geminadas, por se tratar de um

segmento consonantal nasal, sendo apropriado para a cópia da consoante nasal prevista pela

estrutura esqueletal do reduplicante. Essa geminada implica, na verdade, um ganho de

nasalidade para a forma final, gerando dindinha.

INPUT

[ma»dRi)̄ ¯a]

MOLDE

[»d R i)̄ ¯a]

BASE

[»d i) ¯¯a] CV(C)NASAL

RED

Forma final [d i)»d i)̄ ¯a]

1

FILTROS

2

3

4

5

Page 83: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

83

4.4 - Análise de Casos Excepcionais

Alguns casos, como citado anteriormente, enfrentam mais atuação dos filtros no

processo, devido à maior dessemelhança input-output. Nesses casos, há mais ajustes.+-

no molde e correções mais acentuadas, fazendo algumas estratégias de reparo, que não

aparecem nos demais casos, surgirem. No entanto, esse é um importante fato para o

fenômeno; tal capacidade de correção e adequação o torna bastante regular, como

percebido nos dados, e prova a total eficácia de seus mecanismos. Ainda, mais uma vez, a

3ª base se mostra a mais rica, pois é com ela que esses casos aparecem. Veja-se o

mecanismo envolvido em ‘palhaço’, na formalização em (51):

(51)

Este é um exemplo de trissílabo paroxítono, cuja seqüência copiada pela

circunscrição vai até a sílaba tônica. O molde ¥açu passa sem dificuldades até o filtro 5,

CIRCUNSCRIÇÃO

INPUT

[paȴasu]

MOLDE

[» ¥ asu]

BASE

»[l asu] CV(C)NASAL

RED

Forma final [la»lasu]

1

FILTROS

2

3

4

5

Page 84: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

84

pois (1) começa por consoante, (2) não possui complexidade no onset e (3/4) não apresenta

coda de nenhuma espécie. Entretanto, esse molde tem uma sílaba iniciada por ¥, segmento

proibido em início de palavra no português e corrigido pelo filtro 5, sendo substituído pelo

segmento fônico articulatoriamente mais próximo, l, formando a base laçu. A base sofre

cópia de seus dois primeiros segmentos pelo reduplicante, gerando a forma final lalaçu.

Processo semelhante ocorre em (52):

(52)

Este caso é bastante semelhante ao anterior. A circunscrição copia todos os

segmentos até a sílaba tônica. O molde Rede sofre a ação dos filtros e é bloqueado apenas

no quinto, assim como o anterior. O segmento R é substituído por l e a base do processo será

lede. O reduplicante copia o CV inicial da base, gerando a forma final lelede. Terminemos

a análise com o único caso de palavra-matriz proparoxítona, ‘helicóptero’:

CIRCUNSCRIÇÃO

INPUT

[pa»RedZi]

MOLDE

[» R edZi]

BASE

[»l edZi] CV(C)NASAL

RED

Forma final [le» ledZi ]

1

FILTROS

2

3

4

5

Page 85: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

85

(53)

Este é o caso mais excepcional de todos. Como já observado nas restrições que atuam nas

bases do processo, o fenômeno da Reduplicação no baby-talk é raro em proparoxítonas. A

curiosidade aqui repousa na atuação da circunscrição, que rastreia a sílaba tônica normalmente.

No entanto, ao fazer esse rastreamento, ela engloba uma seqüência de 4 sílabas13, o que seria

impossível para o processo, já que geraria um polissílabo (o fenômeno gera, no máximo,

trissílabos). Portanto, a circunscrição mapeia apenas a sílaba tônica e a adjacente a ela envolvida

no rastreamento, jogando somente essa seqüência para o molde. Logo, o molde copi passa sem

problemas por todos os filtros, chegando intacto à base e sofrendo a cópia dos dois primeiros

segmentos. A forma final será cocopi.

13 Ocorre a formação de 4 sílabas, pois como a Reduplicação no baby-talk tem como input o output do adulto, existe a inserção de [i] diante do p mudo, caso típico do português brasileiro.

CIRCUNSCRIÇÃO

INPUT

[eli»kçpiteRu]

MOLDE

[»kçpi]

BASE

[»k çpi] CV(C)NASAL

RED

Forma final [kç»kçpi ]

1

FILTROS

2

3

4

5

Page 86: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

86

5 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste trabalho, foi investigado o fenômeno da Reduplicação no baby-talk segundo

os moldes da Morfologia Prosódica, um modelo que envolve princípios morfológicos e

fonológicos, procurando contemplar fenômenos não explicados pela morfologia tradicional,

como a Reduplicação – processo não-concatenativo considerado marginal em português.

A primeira preocupação deste estudo foi procurar uma definição mais apropriada

para a Reduplicação, já que as demais pareciam insuficientes ou equivocadas. Os diversos

tipos de Reduplicação também foram abordados e divididos em quatro grupos: em início de

palavra (mamãe, papai, titio, titia), em final de palavra (chororô, bololô), de base verbal

(corre-corre, pega-pega, bate-bate, puxa-puxa) e no baby-talk (brinquedo � quequedo,

boneca � neneca, panela � nenela, peteca � teteca). Nesta Dissertação, apenas o último

tipo foi focalizado.

Para compor o grupo amostral, foram escolhidas crianças em fase de aquisição da

linguagem e adultos que conviviam com as mesmas para a observação do fenômeno da

Reduplicação no baby-talk, já que este se caracteriza pelo discurso de adultos endereçado a

crianças. Algumas entrevistas e testes foram aplicados aos adultos para chegar às bases do

processo.

Com a aplicação dos testes e a observação do fenômeno, foi percebido que o

processo era bastante regular, dando grande importância à tonicidade (a parte reduplicada

envolve a sílaba tônica) e a restrições em relação à coda. Algumas restrições que atuam na

escolha das bases do processo também foram detectadas, pois se formam, nesse tipo de

Reduplicação, apenas trissílabos paroxítonos e dissílabos oxítonos.

Page 87: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

87

O input envolvido na Reduplicação no baby-talk é uma forma de output do adulto e

não uma representação subjacente. Isso permite que formas como helicóptero � cocopi

possam surgir, na qual percebemos a inserção de [i] após a consoante oclusiva em coda. A

circunscrição atuante no processo é positiva e tem como principal alvo a sílaba tônica:

mapeia os segmentos a partir dela e os leva para um molde.

Os filtros, que dão conta das condições de boa-formação e corrigem as formas, são

5: ONSET, que proíbe sílabas não iniciadas por consoantes; *COMPLEX, que determina

que onsets sejam simples; CODA INT[sibilante, nasal], que proíbe codas internas que não

sejam nasais ou sibilantes; CODA-FINAL[vocálica], que determina que codas finais devem

ser vocálicas, e palavras prosódicas não podem começar por [R, ¥, ̄ ] ( PWD*[ R, ¥, ̄ ), um tipo

de restrição para início de palavra existente em língua portuguesa.

Por último, o reduplicante envolvido no processo é uma estrutura esqueletal

subespecificada que copia os segmentos da base após a atuação dos filtros. Isso significa

que o reduplicante CV(C)NASAL copiará sempre os primeiros segmentos da base, já que neste

processo ele é um prefixo. A coda só será copiada no caso de haver uma consoante nasal

nos primeiros segmentos da base, como é o caso de madrinha � didinha e chapinha �

pinpinha. Seguindo esse modelo, foram encontradas e analisadas, finalmente, as 5 bases

pertinentes ao processo: 1ª BASE »CV, 2ª BASE »CVV, 3ª BASE »CV.CV, 4ª BASE

CV.CVV e 5ª BASE »CVC. CV.

Embora algumas questões ainda tenham permanecido em aberto, reservadas para

estudos posteriores, esse trabalho mostra-se extremamente relevante, posto que são poucos

os estudos em língua portuguesa com base na Morfologia Prosódica e, sobretudo,

Page 88: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

88

envolvendo baby-talk. Esse estudo dá, então, sua contribuição para outras pesquisas na

área, deixando mais um caminho aberto para novas descobertas sobre a língua.

Page 89: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

89

6 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ABAURRE, M. B. & PAGOTTO, E. G. Nasalização no Português do Brasil. In: KOCH, I. V. (Ed.). Gramática do português falado VI. Campinas: Editora da UNICAMP, 1996. ARCHANGELI, Diana. The root CV template as a property of the affix. Natural Language and Linguistic Theory 1, 347-384. 1983. AURÉLIO, F. Dicionário Eletrônico Aurélio da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2000. BASÍLIO, M. Teoria lexical. São Paulo: Ática, 1987. BECHARA, E. Moderna gramática portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998. BISOL, Leda. Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro. Porto Alegre: EDIPUCRS. Ed. 4ª. 2005. BROSELOW, E. & MACCARTHY, J. A theory of internal Reduplication. The Linguistic review 3. p. 25-88, 1983. CHOMSKY, N & HALLE, M. The Sound Pattern of English. New York: Harper e Row. 1968. CLEMENTS, G. M. & KEYSER, S. J. CV Phonology: a generative theory of the syllable. Linguistic Inquiry Monograph. Cambridge, Mass: MIT Press, nº 9, 1983. CRYSTAL, David. A Dictionary of Linguistics and Phonetics. Copyright. Ed. 4ª. 1997. CUNHA, C. F. & CINTRA, L. Nova gramática do português contemporâneo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. Ed. 2ª, 1985.

Page 90: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

90

GONÇALVES, C. A. V. ; ALBUQUERQUE, L. R. . Análise da reduplicação em dados de aquisição: uma abordagem otimalista. In: VIII Congresso Nacional de Filologia e Lingüística, 2005, Rio de Janeiro. Questões de morfossintaxe. Rio de Janeiro : CiFeFil, 2004, v. 8, p. 45-53. GONÇALVES, C. A. V. A morfologia prosódica e o comportamento transderivacional da hipocorização no português brasileiro. Revista de Estudos da Linguagem, Belo Horizonte, v. 12, p. 7-38, 2004. GONÇALVES, C. A. V. Retrospectiva dos estudos em Morfologia Prosódica: das circunscrições e regras à abordagem por ranking de restrições 2008 (Artigo inédito). HEYES, Bruce. Metrical stress theory. Cambridge: Cambridge University Press, 1991. HOUAISS, A. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. Lisboa: Objetiva. 2001. HYMAN, Larry M. A theory of phonological weight. Dordrecht: Foris. 1985. KATAMBA, Francis. Prosodic Morphology. Morphology. New York: Maxmillian, p.154-200, 1990. LIMA, R. Gramática normativa da língua portuguesa. Rio de Janeiro: José Olympio. Ed. 39ª, 2000. McCARTHY, J. & PRINCE, A. Generalized alignment. In: BOOIJ, G. E.; MARLE, J. (Ed.). Yerbook of morphology. Dordrecht: Kluwer, 1993. McCARTHY, J. A prosodic theory of nonconcatenative morphology. Linguistic Inquiry,v.12, n.1, p. 373-418, 1981. McCARTHY, J.& PRINCE, A. Foot and word in prosodic morphology. Natural language and Linguistic Theory, v.8, n.1, p. 209-84, 1990. McCARTHY, J.& PRINCE, A. Prosodic Morphology. In: SPENCER, A. & ZWICKY, A. The Handbook of Morphology. Cambridge: Cambridge University Press.1998.

Page 91: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

91

MONARETTO, V. N. & QUEDNAU, L. R. & HORA, D. O. As consoantes do português. In: BISOL, Leda (org.). Introdução a estudos de fonologia do português brasileiro. Porto Alegre: EDIPUCRS. Ed. 4ª. 2005. p 207-238. PULLEYBLANK, Douglas. Tone in Lexical Phonology. Reidel: Dordrecht, 1986. SELKIRK, E. On prosodic structure and its relation to syntactic structure. Bloomington: IULC, 1980. WETZELS. W. Leo. Consoantes Palatais como Geminadas Fonológicas no Português brasileiro. In: Revista de Estudos da Linguagem. Belo Horizonte: Faculdade de Letras da UFMG. v. 9, p. 5-15, 2000.

Page 92: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

92

ANEXO 1

Idade: Sexo: Escolaridade:

QUESTIONÁRIO

1. Dirigindo-se a uma criança / bebê como poderiam ser ditas essas palavras? (a) rodapé (b) telefone (c) tapete (d) ônibus (e) música (f) xampu

2. Crianças aprendendo a falar se expressam através das seguintes palavras: (a) papato (b) pepéu (c) neneca (d) nenelo (e) bebelo

O que essas palavras significam?

3. Como uma criança aprendendo a falar diria as palavras abaixo? Assinale todas as opções possíveis.

I. banheira (a) nhenhera (b) nenera (c) nenela (d) banera II. cobertor (a) cobebetô (b) bebeto (c) berbertô (d) bebertô

III. caderno (a) dederno (b) cadedeno (c) derderno (d) dedeno

IV. algodão (a) gogodão (b) algodão (c) godãodão (d) dãodão

V. abajur (a) abajuju (b) ababaju (c) bubuju (d) babaju

Page 93: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

93

ANEXO 2

Idade: Sexo: Escolaridade:

QUESTIONÁRIO

1. Dirigindo-se a uma criança / bebê como poderiam ser ditas essas palavras? (a) pastel (b) escova (c) bermuda (d) carteira (e) mágico (f) papel

2. Crianças aprendendo a falar se expressam através das seguintes palavras: (a) teteca (b) neneca (c) tetelo (d) ninico (e) neneta

O que elas tentaram falar?

3. Como uma criança aprendendo a falar diria as palavras abaixo? Assinale todas as opções possíveis.

I. chuveiro (a) vevero (b) chuvero (c) chuvelo (d) vevelo II. parede (a) palede (b) palelede (c) rerede (d) lelede

III. panela (a) nenela (b) panenela (c) panpanela (d) nelala

IV. estante (a) estate (b) tantante (c) tatante (d) estantante

V. sabonete (a) nenete (b) babonete (c) bobonete (d) sabobonete

Page 94: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

94

ANEXO 3

Idade: Sexo: Escolaridade:

QUESTIONÁRIO 1. Como uma criança aprendendo a falar diria as palavras abaixo? Assinale todas as opções possíveis.

I. revista (a) visvista (b) rerevista (c) vivista (d) tatá II. cobertor (a) totô (b) bebetô (c) berbertô (d) betotô

III. banheira (a) nenheila (b) nenela (c) inheinhela (d) nenera

IV. parede (a) rerede (b) palelede (c) papalede (d) lelede

2. Crianças aprendendo a falar se expressam através das seguintes palavras:

(a) nenete (b) pepelho (c) nenela (d) dindinha (e) bibide

O que essas palavras significam? 3. Dirigindo-se a uma criança / bebê como poderiam ser ditas essas palavras?

(a) vitamina (b) telefone (c) buzina (d) remédio (e) música (f) artista

Page 95: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

95

ANEXO 4

Idade: Sexo: Escolaridade:

QUESTIONÁRIO 1. Como uma criança aprendendo a falar diria as palavras abaixo? Assinale todas as opções possíveis.

I. hamburguer (a) bubugue (b) bugueguê (c) buburgue (d) bubú II. chapinha (a) pipinha (b) pimpinha (c) chachapinha (d) pumamá

III. palhaço (a) lalaço (b) lalhaço (c) lialiaço (d) papalhaço

IV. artista (a) tistista (b) artitista (c) titista (d) tatá

2. Crianças aprendendo a falar se expressam através das seguintes palavras:

(a) quequeta (b) neneco (c) titina (d) guguti (e) teteca

O que essas palavras significam? 3. Dirigindo-se a uma criança / bebê como poderiam ser ditas essas palavras?

(a) espuma (b) menina (c) cachoeira (d) toalha (e) aquário (f) lâmpada

Page 96: A Reduplicação no Baby-talk: uma Análise pela Morfologia Prosódica

96

ANEXO 5

Lista de Dados

abajur � babaju alfinete � nenete algodão � gogodão apito � pipito artista � titista banheira � nenera bicicleta � quequeta biscoito � cocoto boneca � neneca brinquedo � quequedo buzina � zizina cabelo � bebelo cabide � bibide cadeira � dedera caneco � neneco caneta � neneta cebola � bobola chapéu � pepéu chapinha � pimpinha chiclete � quequeti chinelo � nenelo chocalho � cacalho chupeta � pepeta cobertor � bebetô cortina � titina dormir � mimi elefante � fanfante escada � cacada espelho � pepelho

espuma � pupuma estante � tantante gelatina � titina hamburguer � bubugue helicóptero � cocopi iogurte � guguti janela � nenela madrinha � dindinha mamadeira � dedera martelo � tetelo menina � ninina palhaço � lalaço panela � nenela papel � pepéu parede � lelede pastel � tetéu peteca � teteca pinico � ninico remédio � memédio revista � vivista sabonete � nenete sandália � dadálha sapato � papato tapete � pepete telefone � fofone televisão � vivisão vitamina � mimina xampu � pupu