A SUSTENTABILIDADE EM ECOVILAS: DESAFIOS, PROPOSTAS E O CASO DA ECOOVILA 1 – ARCOO

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O trabalho aqui apresentado se caracteriza por um estudo exploratório referente às ecovilas,no que toca as suas práticas e a uma possível leitura analítica tomando-se como base o temada sustentabilidade. Ele teve como objetivo principal o desenvolvimento de um marco deanálise para a sustentabilidade de ecovilas no contexto brasileiro. Assim, este estudo sebaseou em um levantamento teórico-conceitual e no estudo de um caso, que é o da Ecoovila1, situada em Porto Alegre, RS. O modelo de análise da sustentabilidade foi montado a partirdas contribuições da discussão sobre desenvolvimento sustentável (Ignacy Sachs), sobreeconomia solidária (França Filho e Santana Júnior) e sobre as práticas das ecovilas (Jackson eSvenson), formando um quadro-síntese. Como resultado, percebeu-se que a experiênciaestudada não se enquadra, atualmente, em todas as dimensões da sustentabilidade conforme aproposta de análise apresentada. Ela representa, entretanto, um caso significativo para acompreensão do tema em discussão.RGSA – Revista de Gestão Social e AmbientalJan. - Abr. 2010, V.4, Nº.1, p. 113-1261www.gestaosocioambiental.net

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  • RGSA Revista de Gesto Social e Ambiental Jan. - Abr. 2010, V.4, N.1, p. 113-1261

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    A SUSTENTABILIDADE EM ECOVILAS: DESAFIOS, PROPOSTAS E O CASO DA ECOOVILA 1 ARCOO

    Eduardo Cunha Professor Assistente da Universidade Federal do Cear. E-mail: [email protected] Resumo O trabalho aqui apresentado se caracteriza por um estudo exploratrio referente s ecovilas, no que toca as suas prticas e a uma possvel leitura analtica tomando-se como base o tema da sustentabilidade. Ele teve como objetivo principal o desenvolvimento de um marco de anlise para a sustentabilidade de ecovilas no contexto brasileiro. Assim, este estudo se baseou em um levantamento terico-conceitual e no estudo de um caso, que o da Ecoovila 1, situada em Porto Alegre, RS. O modelo de anlise da sustentabilidade foi montado a partir das contribuies da discusso sobre desenvolvimento sustentvel (Ignacy Sachs), sobre economia solidria (Frana Filho e Santana Jnior) e sobre as prticas das ecovilas (Jackson e Svenson), formando um quadro-sntese. Como resultado, percebeu-se que a experincia estudada no se enquadra, atualmente, em todas as dimenses da sustentabilidade conforme a proposta de anlise apresentada. Ela representa, entretanto, um caso significativo para a compreenso do tema em discusso. Palavras-chave: ecovilas, sustentabilidade, economia solidria Abstract The work presented here is caracterized by a exploratory study over ecovillages, related to their practices and to a possible analitical interpretation based on the sustainability subject. It had as a main objective the development of a analitical framework to the sustainability of ecovillages in brazilian context. Thus, this study had been based in a theorical-conceptual reserch and in a case study Ecoovila 1 located in Porto Alegre, Brazil. The sustainability framework was constructed from the contribuitions of discussions about sustainable development (Ignacy Sachs), about solidarity economy (Frana Filho e Santana Jnior) and about the ecovillages practices (Jackson e Svenson), forming a synthesis-frame. As result, it was noticed that the studied experience dos not fit, presently, in all dimensions of sustainability as proposed in the framework. It represents, however, a significative case to the comprehension of the theme under discussion. Key words: ecovillages, sustainability, solidarity economy 1 Recebido em 27.01.2010. Aprovado em 27.03.2010. Disponibilizado em 28.04.2010. Avaliado pelo sistema double blind review

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    1 INTRODUO O presente trabalho se prope a ser exploratrio sobre o tema da sustentabilidade em ecovilas. Este estudo exploratrio, que tomou como base um caso e um levantamento terico-conceitual, tem como propsito a verificao e o aprimoramento de um marco de anlise para a sustentabilidade em ecovilas. Tal proposta tem em vista a aplicao posterior desta construo em um nmero maior de casos, atendendo s necessidades de um projeto de pesquisa que pretende mapear o campo destas prticas no contexto brasileiro. O assunto pertinente e atual especialmente quando percebido a partir do debate cada vez mais em voga sobre o tema meio ambiente e, especialmente, sobre a questo da sustentabilidade. Questes como aquecimento global, o esgotamento dos recursos naturais ou ainda desgaste nas relaes sociais e aumento das desigualdades provocadas pelo modelo de organizao scio-econmica atualmente dominante (Santos e Rodrguez, 2002) nos levam a direcionar a ateno para o que vem sendo construdo com as prticas das ecovilas. Estas prticas despontam neste contexto justamente por trazerem em suas bases a idia da construo de um tipo de vivncia (sob diversos aspectos econmicos, polticos, ambientais e sociais) radicalmente diferente daquela que nos dita hoje os comportamentos em sociedade. Para se ter uma idia do alcance da propostas, a ONU aponta estas iniciativas como modelo de excelncia de vida sustentvel (GEN, 2009). O caso escolhido para este trabalho exploratrio denomina-se Ecoovila 1, vinculado cooperativa Arcoo, situada em Porto Alegre, RS. Ele foi eleito com base no critrio da convenincia, dada a maior facilidade de acesso aos dados e visitao por parte do pesquisador. Apesar desta ecovila no estar associada a Global Ecovillage Network (rede que congrega estas prticas, cuja sigla GEN), sua escolha se justifica tambm pelo fato de ser a nica no estado do RS que se autodenomina como ecovila. De fato, no Brasil como um todo a prtica ainda pouco difundida (poucas so filiadas GEN), apesar do grande nmero de ecovilas j existentes no mundo. A abordagem adotada buscou o entendimento sobre como se d a sustentabilidade na experincia escolhida. Partiu-se para isto de um marco inicial para a leitura do caso, construdo a partir de trs fontes principais: outros estudos sobre as ecovilas, fornecendo elementos de prticas similares; a noo de sustentabilidade defendida por Sachs (2002), considerada uma das mais influentes dentro do debate sobre o tema; e a idia de sustentabilidade que emerge da economia solidria, pelo entendimento de que as suas prticas estariam relativamente bem alinhadas com a das ecovilas, especialmente considerando-se seus propsitos e princpios. A premissa, neste caso, que as ecovilas poderiam ser enquadradas como uma prtica de economia solidria. Esta questo no ser discutida com maior profundidade neste trabalho, j que foge do seu objetivo principal, devendo ser tratada em outras oportunidades. Considerando-se, ento, o objetivo deste trabalho, que o de definir (e testar) um marco analtico para a sustentabilidade em ecovilas, o pressuposto adotado que a experincia articula diversas dimenses da sustentabilidade, indo ao encontro dos referenciais tericos utilizados. Alm disto, no se pode definir a priori qual delas predominante sem o conhecimento da experincia, dado que os estudos apontam que esta caracterstica sempre

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    peculiar cada ecovila. O que se espera, entretanto que haja uma presena de todas elas, embora com a expectativa de predomnio de alguma (ou mais de uma) em particular. Por fim, acredita-se que a sustentabilidade, nos casos das ecovilas, tem um desenho muito particular, sendo mesmo definidor destas experincias. Metodologicamente, o estudo de caso tomou como apoio a realizao de pesquisa documental da experincia, especialmente no seu website (Arcoo, 2007), entrevista semi-estruturada com um representante da ecovila (coordenador tcnico da Arcoo e morador do local) e observao direta, por meio da visita do pesquisador ao local da ecovila (ambas atividades em dezembro de 2008). O presente trabalho se estrutura em cinco sees principais. Alm desta introduo, o captulo 2 trata de uma contextualizao geral e caracterizao das ecovilas, em que so apresentados um breve apanhado histrico do tema e uma possvel definio conceitual. O captulo seguinte apresenta uma discusso sobre a sustentabilidade, traando tambm um breve histrico e finalizando com uma proposta de quadro de anlise a partir do enfoque multidimensional do conceito. Em seguida apresentado o caso estudado, analisando-o frente ao quadro proposto. Por fim, so apresentadas as consideraes finais do trabalho, buscando-se as implicaes do estudo do caso frente proposta analtica apresentada. 2 ECOVILAS: CONTEXTO E HISTRIA Pode-se dizer que as ecovilas representam, hoje, uma atualizao em termos de prticas de comunidades intencionais. Estas ltimas surgiram principalmente aps a segunda guerra mundial, nos pases centrais, e tinham caractersticas o fato de serem contestatrios e libertrios que visavam questionar todos os setores constitudos da sociedade da poca: hbitos, idias, corporeidade, arte, organizao poltica, espiritualidade, estrutura produtiva e social, tecnologia (Santos Jnior, p. 3). Isto implicava em uma mudana de valores e na forma de relacionamento com a natureza. Diversos movimentos representavam esta forma de agir e pensar, ficando conhecidos genericamente como contracultura, e incluam temas como ecologismo, feminismo, pacifismo, movimento negro, hippies, etc... As comunidades intencionais foram, ento, formadas pela vontade de parcela destes grupos em fazer diferente, neste caso, ligados especialmente ao movimento hippie, fundando comunidades alternativas e agrupando-se principalmente nos espaos rurais (Santos Jnior, 2006). Neste sentido, as ecovilas seriam, ento, herdeiras destes movimentos, trazendo consigo algumas de suas caractersticas. Elas vo, entretanto, mas alm, ao produzirem uma sntese de um nmero mais ampliado de experincias, a maioria anteriores a estas, e que tiveram, em sua poca, igualmente um carter de contestao e de tentativa de definio de um outro tipo de vivncia em sociedade. o caso, por exemplo, do socialismo utpico, que inspirou atravs de Fourier, Owen e outros, a constituio de comunidades alternativas, ou do movimento quilombola, que ensejou a construo de quilombos com uma grande longevidade (muitos perduram at hoje). Esta sntese definiu, ento, o formato especfico das ecovilas, que se apresentou mais claramente nos anos 90. Elas se assentam, desta forma, no debate que envolve as questes de

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    esgotamento da natureza, por um lado e os crescentes desnveis sociais a se propagarem pelo mundo, por outro. Isto funda os propsitos nos quais se assentam as ecovilas, que podem ser considerados formadores do seu conceito: de um lado, uma transformao na forma do relacionamento com a natureza, que implica fundamentalmente numa mudana na maneira como ela percebida. Ela deixaria de ser um pano de fundo da vida humana, com todas as implicaes que isto traz, e passaria a ocupar um papel central nas suas atividades, devendo estas se integrar ela como num sistema, a partir da adoo de uma forma de viver com baixo impacto ambiental. De outro lado, Svenson aponta que existe um novo formato de estruturao social, que superaria a dicotomia entre os assentamentos rurais e urbanos (como citado em Santos Jnior, 2006, p. 8), e que se definiria segundo valores comunitrios, implicando em, por exemplo, respeito diversidade, cooperao, solidariedade, autonomia e liberdade, e novamente, o profundo respeito natureza. Tal caracterstica faz com que as ecovilas sejam singulares em cada uma de suas iniciativas, tendo, entretanto uma unificao a partir do fato de elas serem, ao mesmo tempo, intencionais e sustentveis (Santos Jnior, 2006). Esta sustentabilidade estaria na base da noo que definiria uma outra tica, constituda a partir dos valores referidos. Vale citar ainda a articulao das ecovilas em um movimento mais global, representada principalmente pela Global Ecovillage Network (GEN), criado em 1995, que congregava, em 2002, 15.000 ecovilas pelo mundo (Bissolotti, 2004) e seus escritrios reginais, como o das Amricas (Ecovillage Network of Americas ENA), com sede nos Estados Unidos. Esta rede vem adquirindo um forte peso poltico na articulao global, tendo assumido, frente a ONU, um status consultivo. 3 SUSTENTABILIDADE(S) H uma leitura que identifica a gnese do debate sobre sustentabilidade na evoluo da discusso em torno do tema desenvolvimento, a partir do aporte dos temas ambientais na sua agenda. Pode-se dizer que este debate levou construo de um amplo espectro de propostas, que poderiam ser classificadas entre dois plos extremos: o primeiro relativo ao entendimento do desenvolvimento como crescimento econmico e o segundo que faz referncia a sua negao absoluta (da noo de crescimento). Entre estes extremos se define uma espcie de caminho do meio, (conforme prope Sachs (2002)), que estaria identificado com os conceitos de ecodesenvolvimento ou desenvolvimento sustentvel. Para Sachs, esta abordagem assumiria esta posio intermediria por se colocar de forma crtica ao crescimento selvagem (ou perverso), que tenderia a carregar junto consigo, quase sempre, altos custos sociais e ambientais, assumindo, porm, que ele , de alguma forma, necessrio. Nesta noo, est presente ainda a idia de que o jogo do mercado livre no compatvel com a noo de desenvolvimento sustentvel, principalmente porque este jogo s percebe o curto prazo, a busca de lucro e da eficincia na alocao de recursos. Vale ressaltar que estas discusses em torno da sustentabilidade promoveram encontros que visavam revisar e difundir um novo conceito de desenvolvimento, como o caso da Comisso de Brundtland de Meio Ambiente e Desenvolvimento. O termo desenvolvimento sustentvel foi definido por esta comisso (sendo provavelmente a definio mais conhecida) como sendo aquele que atende s necessidades das geraes presentes sem comprometer a

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    possibilidade das geraes futuras atenderem suas prprias necessidades (Van Bellen, 2006). H ainda a defesa de que o conceito de sustentabilidade no pode ser entendido como cientfico. Veiga (2005) diz que ela envolve primordialmente uma questo tica e surge de fato de uma conciliao poltica, da a sua aceitao mais ou menos generalizada. Ou seja, a sustentabilidade no uma noo de natureza precisa, discreta, analtica ou aritmtica, como qualquer positivista gostaria que fosse (p. 165), assim como, por exemplo, a idia de democracia dentre muitas outras idias to fundamentais para a evoluo da humanidade (p. 165). Apesar disto, existe um esforo de amplitude considervel para tornar o conceito passvel de anlise, o que perpassa diversos campos do conhecimento. o caso, apenas para citar dois exemplos, dos trabalhos de Van Bellen (2006), que estuda alguns dos indicadores mais utilizados para a medio do desenvolvimento sustentvel em nveis nacionais ou regionais e de Bissoloti (2004) que prope uma forma de medio para a sustentabilidade em ecovilas. 3.1 A PERSPECTIVA MULTIDIMENSIONAL Todos estes esforos para tornar o conceito da sustentabilidade analtico partem de uma concepo de multimensionalidade. Discutiremos aqui trs vises representativas frente ao caso e contexto estudado, buscando uma sntese final, que ir se constituir como marco de anlise do estudo. Estas vises so a de Sachs (2002), considerada seminal nas discusses realizadas no transcurso histrico referido acima, a da economia solidria, representada por um trabalho de Frana Filho e Santana Jnior (2007) e a proposta pelo prprio movimento de ecovilas, como pode ser observado em Jackson e Svenson (como citado em Bissolotti, 2004). Nas duas ltimas, ser dada maior nfase descritiva, em funo de serem mais apropriadas para a descrio de experincias como esta a proposta de Sachs se vincula principalmente idia de desenvolvimento nacional ou global. Sachs (2002) apresenta o conceito como composto de seis dimenses principais: social, ambiental, cultural, territorial, econmica e poltica (nacional e internacional). Na sua viso, a sustentabilidade social assume uma posio prioritria, subordinando as demais, j que deve ser o objetivo mesmo do desenvolvimento e pela probabilidade de que um colapso social preceda uma catstrofe ambiental. As dimenses culturais e ambientais so consideradas uma decorrncia, alm da distribuio territorial mais equilibrada. J a sustentabilidade econmica vista como uma necessidade, mas no condio para a existncia das demais, pois ela pode ser uma grande desestabilizadora das outras dimenses. Finalmente, Sachs aponta a sustentabilidade poltica nacional (no mbito da governabilidade) e internacional, olhando-se o tema a partir da perspectiva da manuteno da paz, j que as guerras modernas so tambm ecocidas. A discusso proposta a partir do marco da economia solidria, nos moldes empreendidos por Frana Filho e Santana Jnior (2007), engloba cinco dimenses principais: a econmica, a social, a cultural, a poltica e a ambiental. Os autores enfatizam a inter-relao e a importncia de cada uma, o que supe um equilbrio dinmico entre as vrias dimenses que atravessam a vida das pessoas (p. 7). A caracterizao destas dimenses se daria da seguinte forma:

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    a) dimenso econmica: envolve a distribuio de renda promovida pela experincia (nmero de postos de trabalhados criados, os rendimentos proporcionados, a utilizao de insumos do territrio e a dinmica do consumo local); pressupe a articulao entre diferentes lgicas: mercantis, no mercantis e no monetrias (produo para auto-consumo, intercmbios de produtos e servios no monetarizados, mecanismos de subsidiariedade para produo e consumo nas relaes com os poderes pblicos, utilizao coletiva de recursos e diferentes formas de finanas solidrias, entre outras). b) dimenso social: compreende a coeso social entre as pessoas envolvidas, expresso em questes como o tipo de sociabilidade vivido no territrio, o grau de confiana e a natureza do vnculo na relao entre as pessoas. c) dimenso cultural: inclui o grau de afirmao identitria, o grau de identificao das pessoas com sua histria, o que envolve o sentimento de pertencimento das pessoas em relao ao seu territrio, as prticas e valores comuns compartilhados; envolve tambm o grau de enraizamento das atividades empreendidas no tecido da vida cultural local. d) dimenso poltica: tem um triplo aspecto: grau de autonomia dos grupos locais no processo de gesto da experincia (considerando-se o grau de democratizao das relaes e o nvel de participao das pessoas); capacidade da experincia em fomentar um modo de ao pblica no territrio; nvel de articulao da experincia, tanto em redes no mbito da prpria sociedade civil, quanto no estabelecimento de pactos ou interaes com poderes pblicos, preservando sua autonomia. e) dimenso ambiental: representa o grau de vinculao da experincia em relao s caractersticas ambientais prprias num territrio, observando-se o manejo dos recursos ambientais atravs das atividades desenvolvidas, e avaliando-se o tipo de tecnologia empregada (originalidade e referncia social ou se adaptada de outras realidades ou se ela convencional, sem considerar as especificidades do territrio). Avalia-se ainda se so utilizados insumos ou recursos prprios do seu territrio, se eles tm efeito poluidor; se as fontes energticas utilizadas so de base renovvel; e nvel de gerao de resduos e seu modo de tratamento. avaliado, ainda, o grau de centralidade do ser humano em relao aos processos utilizados e a reeducao dos envolvidos nos processos de consumo. Por fim, os conceitos de Jackson e Svenson (como citado em Bissolotti, 2004) envolvem a leitura da sustentabilidade a partir de trs dimenses: a ecolgica, a social/comunitria e a cultural/espiritual, que so consideradas tambm os trs tipos de colas das ecovilasi, conceitos que aparecem tambm em outros trabalhos da rea (Rainho, 2006; Santos Jnior, 2006). A nfase em cada uma destas dimenses tende a variar segundo a experincia, o que d a identidade a cada uma delas, entretanto os autores enfatizam que todas devem se fazer presente em favor da harmonia dos assentamentos (Jackson & Swenson, como citado em Bissolotti, 2004, p. 39). Estas dimenses podem ser assim descritas: a) dimenso ecolgica: envolve o senso de local e lugar (conexo com o local em que vivem e convivncia harmnica com o sistema ecolgico); a produo e distribuio de alimentos (de forma orgnica e biodinmica); os esquemas de reciclagem (e reutilizao); o cuidado com a gua (principalmente com as fontes e efluentes, que devem ter qualidade igual ou melhor do que antes da utilizao); a utilizao de sistemas de energia renovvel; a restaurao ecolgica (que envolve a utilizao da permacultura e da bioconstruo). b) dimenso social/comunitria: refere-se acessibilidade dos cuidados de sade e integrao entre medicina ortodoxa e complementar; economia, tendo como prioridade a economia local, partilhando excedentes, e estimulando a criao de negcios que no gerem

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    poluio e no explorem recursos humanos ou naturais; utilizao de sistemas alternativos de trocas e viso com relao finitude de recursos; no aspecto poltico, ao tamanho adequado para a participao de todos, e tomada de deciso democrtica, com liderana circular; s formas educacionais implantadas, que valorizem o crescimento pessoal; desenvolvimento de habilidades comunicativas. c) dimenso cultural/espiritual: devem ser percebidas a existncia de atividades artsticas prprias, celebraes, festivais e encontros; a unio entre as geraes; o reflexo da cultura na arquitetura e no design da ecovila; a abertura para manifestaes espirituais individuais e prticas comunitrias neste mbito. Percebe-se uma grande similaridade entre as trs abordagens apresentadas, e as diferenas concentram-se principalmente nas nfases em determinados aspectos, ou na existncia de alguns elementos especficos numa em relao a outra, segundo a orientao epistemolgica e/ou poltica de cada vertente. Abaixo, na Tabela 1, apresentamos uma proposta de quadro sinttico para estas abordagens, formando o modelo de anlise guia do presente trabalho.

    Tabela 1: Quadro analtico para a sustentabilidade em ecovilas Dimenso Variveis / Indicadores Forma de medio

    Impacto gerado na distribuio de renda do local

    Postos de trabalho criados, rendimentos proporcionados, utilizao de insumos locais

    Articulao entre diferentes lgicas econmicas (mercantis, no-mercantis e no-monetrias)

    Utilizaes alternativas de recursos, alm dos mercantis: auto-produo, trocas, utilizaes coletivas (finanas solidrias), fontes governamentais, etc.

    Econmica

    Formato dos empreendimentos Tipo de empreendimentos (individuais, ou coletivos), forma de distribuio dos excedentes

    Coeso social entre os moradores

    Tipo de sociabilidade existente, existncia de confiana entre as pessoas, natureza dos vnculos, relao entre os vnculos e atividades econmicas, etc

    Sade Acessibilidade e existncia de integrao entre tratamentos ortodoxos e complementares

    Social / Comunitria

    Educao Existncia de prticas de educao, especialmente ambiental e para o consumo

    Identidade das pessoas com a experincia

    Grau de enraizamento dos moradores com as atividades realizada (identidade cultural), utilizao de tecnologias socialmente apropriadas

    Atividades culturais Tipos de atividades artsticas/culturais existentes

    Cultural / Espiritual

    Expresses culturais materiais Reflexos da cultura na arquitetura e desenho da ecovila

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    Manifestaes espirituais Existncia e forma de realizao das prticas (abertura para diferentes tipos, realizao comunitria, etc)

    Participao dos moradores Nvel e tipo de participao dos moradores (tomada de deciso democrtica), estilo de liderana existente

    Fomento de um modo de ao pblica no territrio

    Processos de discusso ampliada existentes Poltica

    Articulaes externas

    Articulao com redes do movimento de ecovilas ou outras pertinentes (meio ambiente, economia solidria, assistncia social, etc...), convivncia com comunidades do entorno

    Uso de tecnologia socialmente referenciada

    Tipo de tecnologia empregada (originalidade e se socialmente referenciada ou adaptada de outro local ou convencional), origem dos recursos

    Centralidade do ser humano Papel das pessoas envolvidas no processo e impacto das atividades sobre elas

    Senso de local e lugar Tipo de convivncia com o sistema ecolgico do entorno;

    Produo e distribuio de alimentos Existncia de produo orgnica

    Esquemas de reciclagem Tipos de sistemas de reciclagem (e reutilizao) existentes

    Utilizao da gua Como ela captada e tratada (efluentes)

    Utilizao de energia Fonte da energia utilizada (se renovvel)

    Ambiental / Ecolgica

    Restaurao ecolgica Utilizao de tcnicas de permacultura e bioconstruo

    Fonte: elaborao prpria 4 A EXPERINCIA DA ECOOVILA 1DA ARCOO 4.1 HISTRICO A constituio da Ecoovila 1 foi precedida pela fundao da Arcoo, em 1992ii. Esta uma cooperativa de trabalho fundada por um grupo de profissionais que se interessavam pelo tema de construes sustentveis, e que atuam em campos como planejamento urbano e condominial, decorao e outros correlatos. A idia da ecovila comeou a se concretizar efetivamente a partir da criao do setor de habitao na cooperativa, em 2001. Nesta fase de operao a cooperativa passou a aceitar o ingresso de interessados em participar da proposta, a partir da idia de que os moradores da ecovila fossem tambm associados desta cooperativa. O ingresso na cooperativa passou a se dar, ento, a partir de planos de poupana, que se referiam integralizaes de cota, com o objetivo de adquirir o terreno para as construes,

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    urbaniz-lo, elaborar os projetos tcnicos e construir as residncias individuais e as coletivas previamente estipuladas. O terreno pde ser adquirido no primeiro ano da criao do setor habitao, j que o valor integralizado pelos scios na ocasio atingira o montante necessrio para a compra. O plano urbanstico foi tambm realizado em seguida, restando a construo das unidades individuais, que seria realizada conforme a disponibilidade financeira de cada associado. O terreno adquirido tem 26.000 m e situado na zona sul da cidade de Porto Alegre (bairro Vila Nova), na Estrada Joo Passuelo. uma regio da cidade com urbanizao recente, em que se observa ainda uma baixa taxa de ocupao de terrenos, contendo ainda alguma vegetao nativa, porm esparsa. O plano proposto para este assentamento pode ser visto na Figura 1. Ele prev a instituio de uma rea de jardim individual de 200 m por lote e outra de 18.000 m para uso coletivo, sendo 8.000 m destes reservados para o bosque nativo pr-existente no local.

    Figura 1: Implantao da Ecoovila no terreno

    A construo das casas se deu no transcurso dos anos seguintes, sendo que foram construdas at o presente 23 das 28 unidades inicialmente previstas. Os projetos seguem um padro, tendo, entretanto, itens customizveis, que procuram equilibrar as propostas de construo segundo o padro ambiental definido e as necessidades de cada famlia. Alguns detalhes das construes podem ser vistas nas fotos apresentadas nas Figura 2.

    Figura 2: Parreiras de duas residncias, utilizadas como garagem Para a execuo dos trabalhos (produo das habitaes), foi definido um subsetor de trabalho, dentro do setor de habitao, atravs do qual todos os trabalhadores que atuaram na

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    construo foram tambm associados cooperativa. Isto cumpriu uma dupla funo: o amparo legal aos trabalhadores e a sua integrao aos princpios adotados pela cooperativa. A cooperativa, desde 2005 vem, entretanto, passando por dificuldades de gesto devido conflitos internos, sendo que algumas propostas iniciais no foram colocadas em prtica, devido a uma certa paralisao em suas atividades. As propostas hoje adotadas (e as previstas) sero apresentadas a seguir, segundo o modelo de leitura proposto na seo anterior. 4.2 PRTICAS DE SUSTENTABILIDADE ADOTADAS NA ECOOVILA 1 Dimenso econmica A iniciativa permitiu a gerao de trabalho e renda de duas formas: pela gerao de cerca de 40 postos na construo das casas e pela compra de materiais no prprio bairro. O nmero de pessoas trabalhando diretamente nesta etapa variou durante todo o processo pelo prprio ritmo das obras, e atualmente apenas uma casa encontra-se em construo, sendo este nmero muito mais reduzido. Os recursos utilizados so essencialmente da poupana coletiva, ou seja, das cotas integralizadas por cada um dos associados da cooperativa, o que representa uma forma de finana solidria que se insere num tipo de lgica no-mercantil. Quanto aos empreendimentos gerados na iniciativa, existe, em primeiro lugar, a prpria cooperativa de trabalho, pr-existente ecovila, que abriga profissionais da rea da habitao (arquitetos, engenheiros, pedreiros, etc). Uma segunda iniciativa prevista a prpria gesto da ecovila, que deveria gerar outros postos de trabalho. Seguindo a idia de reduo dos custos condominiais, cada casa deveria cultivar no espao reservado para o estacionamento dos carros (ver Figura 2) uma parreira de uvas, cuja produo serviria cobrir os custos de manuteno. Alm destas iniciativas, tambm estava previsto um espiral de ervas em cada residncia, a ser utilizado a critrio de cada famlia para o seu consumo prprio. Estas iniciativas foram parcialmente implantadas (a parreira de uvas e a espiral de ervas esto produzindo em diversas residncias), porm no foi colocada ainda em prtica a utilizao desta produo com o propsito da gerao de recursos para a manuteno da ecovila. A proposta inclua ainda a construo de um espao de servios dentro da ecovila, a ser utilizado por diversos profissionais (engenheiros, mdicos, fotgrafos, etc), alm de abrigar a sede administrativa do local e da cooperativa e de servir de espao para educao ambiental. Este espao se encontra, entretanto, atualmente desativado. Dimenso social/comunitria No se percebe uma coeso social forte na ecovila, pelo menos no tempo presente. Tal fato pode ter sido alimentado pelos conflitos que ocorreram no interior da cooperativa, j citados previamente, que dividiram e afastaram os moradores uns dos outros. As reunies peridicas para discusso dos propsitos comuns, que existiam previamente intensificao dos conflitos no existem mais. Isto provocou a deciso de mudana na administrao da ecovila em direo a adoo do padro comumente adotado por condomnios, em prejuzo da proposta de organizao coletiva inicial.

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    Sobre esta dimenso, pode-se dizer, ainda, que havia no projeto original uma proposta de utilizao do Bosque do Silncio para educao ambiental e arrecadao de fundos para manuteno da ecovila, funo que atualmente no est sendo utilizada. Dimenso cultural/espiritual A dimenso cultural pode ser evidenciada na proposta de urbanizao e de construo das casas, cujos elementos se inspiram na identidade cultural italiana, j que esta identificada com a origem de parte dos moradores. Isto marcado especialmente pelas parreiras de uva em frente s casas. Alm destes elementos, no foram identificadas atividades culturais ou espirituais coletivas ou comunitrias na experincia. Dimenso poltica A dimenso poltica um dos traos marcantes da experincia, j que ela se originou a partir de uma cooperativa atuante, constituda a partir de discusses e articulaes entre todos os membros da ecovila. Este ponto, entretanto, representou o centro da prpria desarticulao da construo coletiva, a partir do surgimento de divergncias inconciliveis nas discusses coletivas. No que toca s articulaes externas, a experincia no se comunica com outras similares (com o movimento de ecovilas, por exemplo), embora houvesse a inteno, na sua fundao (prevista estatutariamente) de se vincular s redes internacionais, especialmente GEN. Dimenso ambiental/ecolgica Esta dimenso provavelmente a mais desenvolvida na ecovila estudada, ou pelo menos a mais cuidadosamente planejada. Muitas tecnologias adotadas foram baseadas na permacultura, e envolvem a utilizao de: tratamento separado dos efluentes cloacais e de gua cinza, com a utilizao de filtros naturais de palha e brita e absoro da gua com bananeiras (ver Figura 3); utilizao de telhados verdes (com exceo de duas casas) e dutos de circulao natural para climatizao da residncia, que toma o ar da rea externa, proveniente do espiral de ervas (ver Figura 4); painel solar (em algumas residncias) para aquecimento de gua; orientao solar adequada para aproveitamento da luz e do calor natural, amplas aberturas, paredes e vidros duplos e lareira com cinco atuaes, inclusive com aproveitamento de calor no inverno. A espiral de ervas e a parreira de uvas tambm complementam a proposta ambiental, com a j referida produo orgnica de alimentos. O projeto previa tambm a utilizao de composteiras individuais (tratamento do lixo orgnico) e captao das guas pluviais. Estas estratgias no foram adotadas, assim como parte do esgoto tambm no est recebendo ainda tratamento conforme descrito acima.

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    Figura 3: Filtro de guas cinzas

    Figura 4: Detalhes do duto de ventilao natural, do painel solar e do telhado verde

    5 CONSIDERAES FINAIS A experincia estudada facilmente enquadrada, enquanto inteno, como uma prtica de ecovila, segundo seus dois propsitos bsicos, que so o de buscar uma outra forma de relacionamento com a natureza, mais integrada e o de constituir uma forma de convivncia humana sobre bases mais comunitrias e cooperativas. Ao analisarmos a prtica frente ao pressuposto, observa-se, entretanto, que no momento atual, a ecovila no consegue experienciar todas as dimenses da sustentabilidade, mesmo que muitos de seus elementos tivessem sido previstos e de fato tentados na sua constituio. As dimenses mais intensamente desenvolvidas na experincia foram a poltica e a ambiental. Alm de ambas serem as intencionalmente mais trabalhadas, temos, de um lado, o fato de a ecovila surgir justamente de uma proposta advinda da articulao em torno de uma cooperativa de trabalho (e habitao) e de outro, a questo de, no seu planejamento, serem includas cuidadosamente diversas solues ambientais de baixo impacto e integradas ao meio ambiente. Em que pese a maior nfase nesta duas dimenses, destaca-se que a econmica e a social tambm tiveram atividades planejadas, como as questes de gerao de renda, compra local e a preocupao com a educao ambiental. Alguns elementos da dimenso econmica puderam ser colocados em prtica na construo da ecovila, mas esta dimenso apresenta

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    hoje poucas atividades em curso. J a dimenso social/comunitria apresentou poucos elementos em ao desde o incio das atividades, e no pde ser observada uma vivncia comunitria mais intensa entre os moradores. A dimenso cultural/espiritual se apresenta na insero de elementos da cultura italiana na experincia, especialmente no seu aspecto material. Entretanto, no foram evidenciadas manifestaes da questo espiritual do ponto de vista organizacional/coletivo, conforme proposto no quadro analtico, o que por si s no deve ser considerado como desqualificador da proposta, dada constatao de que algumas ecovilas reconhecidas como tais tambm no enfatizarem esta questo. Fato que chama ateno e que no pode deixar de ser destacado o processo de desarticulao vivido na cooperativa, por conta dos conflitos internos que surgiram. Tal situao contribuiu fundamentalmente para a depreciao de algumas propostas, nas diversas dimenses citadas, que, de fato, cobriam boa parte das aes apontadas nos indicadores sugeridos. Tais fatos, conquanto apontem para a no realizao de todo o potencial da proposta inicial da ecovila, no a afastam totalmente do quadro analtico traado, especialmente se considerarmos as diversas modificaes que consegue construir frente ao modo de viver e de pensar na sociedade contempornea. uma experincia que se concretiza materialmente enquanto local de viver diferenciado, especialmente nos aspectos ambientais e polticos. Pode at haver (embora em reduzidssimo nmero no RS e provavelmente sem todas as solues ambientais apontadas) empreendimentos que procurem se harmonizar com o ambiente, mas nenhum deles (excetuando-se os casos de outras ecovilas em estgio de constituio no estado) se constri politicamente articulado como neste caso, em que cada morador se envolve no processo e em que os custos e dividendos so distribudos, de alguma forma, entre os envolvidos. Devido a estes elementos, podemos concluir que esta uma experincia que fornece um grande espao para o aprendizado, permitindo, com isto, a aquisio de conhecimentos para o refinamento do quadro analtico, principalmente a partir dos elementos que so apontados na seqncia. 5.1 DISCUSSES FUTURAS Pensando num aprofundamento de estudos futuros direcionados, de um lado, para esta prpria ecovila, e de outro, para o propsito deste trabalho (levantar elementos importantes para a construo de um marco analtico para o estudo das prticas das ecovilas no contexto brasileiro), e norteando a aproximao com outras experincias, podemos lanar elementos que facilitem o entendimento do no desenvolvimento de todas as dimenses ou da desarticulao vivida mais recentemente pela experincia analisada. Talvez o mais relevante deles que, no presente caso, parece ter havido uma dificuldade no estabelecimento da cola, fator que parece ser fundamental na perenizao de uma ecovila. Se utilizarmos a classificao de Jackson e Svenson, esta cola pode ser de trs tipos: espiritual/cultural, ambiental ou social/comunitria. Na Ecoovila 1, as dimenses com maior potencial para fornecer este elemento so as duas ltimas, com especial nfase na segunda. A dificuldade

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    parece ter surgido, ento, no momento da aglutinao das pessoas para a formao da comunidade. Ser que elas estavam realmente imbudas nos ideais de formao de uma experincia diferenciada em relao aos moldes da sociedade atual? Qual o nvel de comprometimento delas com a experincia? Este chegava ao ponto de abrir mo de prticas, convices e outros valores anteriores que no se enquadrariam na proposta a ser vivida? Um elemento que chama a ateno quando analisamos esta questo que um dos fatores de atrao da ecovila era o fato de que os custos da casa, que tem um alto padro de construo, seria cerca de 50% menor do que no mercado, sendo que o valor delas de venda poderia ser at 20% maior. Tal informao de excepcional relevncia e aponta para a constatao de que, alm de todas as vantagens ambientais e sociais que uma tal experincia pode produzir, ainda h uma considervel vantagem financeira. Mas ser que os moradores no se apoiaram excessivamente neste fator (o econmico-financeiro), e negligenciaram os demais? Ou ainda, as pessoas que se aproximaram da experincia buscavam algo mais do que um custo menor e um local agradvel para viver, em contato com o meio ambiente? 6 REFERNCIAS Arcoo (n.d.). Arquitetura e Cooperativismo. Recuperado em dezembro, 2007, de www.arcoo.com.br. Bissolotti, P. M. A. (2004). Ecovilas: um Mtodo de Avaliao de Desempenho da Sustentabilidade. Dissertao de mestrado, Programa de Ps-graduao em Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianpolis, Brasil. Ena (n.d.). Ecovillage Network of the Americas. Recuperado em janeiro de 2009, de http://ena.ecovillage.org. Frana Filho, G. C.; Santana Jnior, G. (2007). Um Olhar Renovado sobre o Desenvolvimento Local: Uma anlise a partir dos Aportes da Economia Solidria e de Pesquisa Emprica na Bahia. VI Conferncia da Rede Regional Amrica Latina e Caribe da International Society for Third Sector Reserch. Salvador. Gen (n.d.). Global Ecovillage Network. Recuperado em janeiro de 2009, de http://gen.ecovillage.org. Rainho, L. C. S. (2006). As tecnologias Ambientais nas Ecovilas: Um Exemplo da Gesto da gua. Dissertao de mestrado, Programa de Ps-graduao em Arquitetura, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. Sachs, I. (2002) Caminhos para o desenvolvimento sustentvel. Rio de Janeiro, RJ: Garamond. Santos, B. S.; Rodrguez, C. (2002). Para ampliar o cnone da produo. In Santos, B. S. (Org). Produzir para viver: os caminhos da produo capitalista. Rio de Janeiro: Civilizao Brasileira.

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    ii O nmero 1 ao final do nome uma referncia a um planejamento realizado que prev a constituio de novas ecovilas, a partir do sucesso desta primeira iniciativa