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Diz o povo, na sua imensa sabedoria, que “quando a esmola é grande, o Santo desconfia”… O que se passa com o Santo acontece com os trabalhadores, acostumados como estamos a ser esfa- queados pelas costas a todo o momen- to, quando do lado contrário surge uma iniciativa aparentemente saudável, o pessoal tem tendência para a pôr ime- diatamente em dúvida. Lá diz o rifão que “gato escaldado de água fria tem medo”… Esta introdução pode parecer fora do contexto, mas basta olharmos à nossa volta para se ver que temos razão. Há cerca de um mês que o CG tomou a imprevisível iniciativa de propor aos Sindicatos a abertura das negociações para os AE’s e para os RC’s. Ora todos temos bem viva nas nossas memórias o verdadeiro pesadelo que tem dominado, desde há muitos anos, o processo de abertura das negociações para a revisão dos AE’s e dos RC’s. Como sabemos tanto o Ministério como os gestores das empresas primaram sempre, até agora, pelo boicote sistemá- tico às negociações, recusando-se não só a corresponder à legítima iniciativa dos sindicatos, mas indo ao ponto de se recusar ostensivamente a cumprir a letra da Lei. Como justificar então, neste momento, a “generosa” iniciativa do CG da CP? Lamentavelmente alguns sindicatos, menos atentos à essência das coisas, embandeira- ram em arco e acreditaram nas boas intenções do CG. Esquece- ram-se estes sindicatos que está em curso um importante processo de alteração (para pior) do Código do Bagão? Não seria prudente que esta estranha iniciativa do CG fos- se acolhida com alguma perplexi- dade? Para nós, para os trabalhadores, a prova dos nove foi tirada poucos dias depois. Confrontado com uma paralisação fortíssima no sector, integrada no Dia de Luta da CGTP- IN, contra o novo Código do Traba- lho, o CG, seguiu à letra as orienta- ções do Ministério, cometendo todo o género de ilegalidades no seu combate ao direito constitucio- nal de greve. Mais uma vez o governo do Sócrates pôs as polícias a servirem -no quer na intimidação de traba- lhadores e dos respectivos pique- tes de greve, quer no apoio ilegal à utilização não menos ilegal, de estranhos ao serviço na substitui- ção de grevistas. A Administração reaccionária da REFER foi mesmo ao ponto extremo de dar apoio e cobertura a um qua- dro superior reaccionário que arrom- bou a pontapé uma porta de um ser- viço de extrema responsabilidade para a circulação de comboio, tanto de mercadorias como de passagei- ros. Ainda bem que os passageiros que viajaram nalguns comboios que se efectuaram, não se aperceberam do perigo que foi circularem nestes comboios, monitorizados por indiví- duos estranhos ao serviço. E o que dizer da ameaça de marca- ção de faltas injustificadas aos gre- vistas, a pretexto, pasme-se de uma irregularidade alegadamente cometi- da pelo Sindicato, mesmo depois do Tribunal ter dado razão aos trabalha- dores? Quer o governo, quer os CG’s têm de assumir de uma vez por todas que são contra e querem acabar com o direito à greve, direito que só reco- nhecem sob a condição de não ser exercido. Mas os trabalhadores não se deixa- ram intimidar no regime fascista, pelo que não é agora, em plena democracia, embora mais formal do que efectiva, que vamos baixar os braços. ORGÃO DA COMISSÃO DE TRABALHADORES DA CP Nº 90 QUANDO A QUANDO A ESMOLA É ESMOLA É GRANDE... GRANDE... EDITORIAL

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Orgão da Comissão de Trabalhadores da CP

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Diz o povo, na sua imensa sabedoria,

que “quando a esmola é grande, o Santo desconfia”… O que se passa com o Santo acontece com os trabalhadores, acostumados como estamos a ser esfa-queados pelas costas a todo o momen-to, quando do lado contrário surge uma iniciativa aparentemente saudável, o pessoal tem tendência para a pôr ime-diatamente em dúvida. Lá diz o rifão que “gato escaldado de água fria tem medo”…

Esta introdução pode parecer fora do contexto, mas basta olharmos à nossa volta para se ver que temos razão. Há cerca de um mês que o CG tomou a imprevisível iniciativa de propor aos Sindicatos a abertura das negociações para os AE’s e para os RC’s.

Ora todos temos bem viva nas nossas memórias o verdadeiro pesadelo que tem dominado, desde há muitos anos, o processo de abertura das negociações para a revisão dos AE’s e dos RC’s. Como sabemos tanto o Ministério como os gestores das empresas primaram sempre, até agora, pelo boicote sistemá-tico às negociações, recusando-se não só a corresponder à legítima iniciativa dos sindicatos, mas indo ao ponto de se recusar ostensivamente a cumprir a letra da Lei.

Como justificar então, neste momento, a “generosa” iniciativa do CG da CP? Lamentavelmente alguns sindicatos, menos atentos à essência das coisas, embandeira-ram em arco e acreditaram nas boas intenções do CG. Esquece-ram-se estes sindicatos que está em curso um importante processo de alteração (para pior) do Código do Bagão? Não seria prudente que esta estranha iniciativa do CG fos-se acolhida com alguma perplexi-dade?

Para nós, para os trabalhadores, a prova dos nove foi tirada poucos dias depois. Confrontado com uma paralisação fortíssima no sector, integrada no Dia de Luta da CGTP-IN, contra o novo Código do Traba-lho, o CG, seguiu à letra as orienta-ções do Ministério, cometendo todo o género de ilegalidades no seu combate ao direito constitucio-nal de greve.

Mais uma vez o governo do Sócrates pôs as polícias a servirem-no quer na intimidação de traba-lhadores e dos respectivos pique-tes de greve, quer no apoio ilegal à utilização não menos ilegal, de estranhos ao serviço na substitui-ção de grevistas.

A Administração reaccionária da

REFER foi mesmo ao ponto extremo de dar apoio e cobertura a um qua-dro superior reaccionário que arrom-bou a pontapé uma porta de um ser-viço de extrema responsabilidade para a circulação de comboio, tanto de mercadorias como de passagei-ros. Ainda bem que os passageiros que viajaram nalguns comboios que se efectuaram, não se aperceberam do perigo que foi circularem nestes comboios, monitorizados por indiví-duos estranhos ao serviço.

E o que dizer da ameaça de marca-ção de faltas injustificadas aos gre-vistas, a pretexto, pasme-se de uma irregularidade alegadamente cometi-da pelo Sindicato, mesmo depois do Tribunal ter dado razão aos trabalha-dores?

Quer o governo, quer os CG’s têm de assumir de uma vez por todas que são contra e querem acabar com o direito à greve, direito que só reco-nhecem sob a condição de não ser exercido.

Mas os trabalhadores não se deixa-ram intimidar no regime fascista, pelo que não é agora, em plena democracia, embora mais formal do que efectiva, que vamos baixar os braços.

ORGÃO DA COMISSÃO DE TRABALHADORES DA CP Nº 90

QUANDO AQUANDO A

ESMOLA ÉESMOLA É

GRANDE...GRANDE...

EDITORIAL

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CT e SubCT e Sub--CT’s repudiamCT’s repudiam

NOVO CÓDIGO DO TRABALHONOVO CÓDIGO DO TRABALHO

Em tempo útil a CT e as Sub-CT’s da CP enviaram à

Assembleia da República pareceres sobre as altera-ções propostas pelo governo do Sócrates ao código do trabalho do Bagão Félix.

Em todos estes pareceres a estrutura colectiva da CT repudia com toda a firmeza mais estes escandalosos recuos nas leis laborais, agora pela mão do PS, que assim e mais uma vez, através dos vigaristas dos seus dirigentes, renega tudo o que disse há três anos con-tra o projecto de direita.

Para que os ferroviários fiquem com uma ideia clara do que está em jogo, aqui se reproduz na íntegra o parecer da CT e respectivas Sub-CT’s:

Parecer da Comissão e Subcomissões de Trabalha-dores da Caminhos de Ferro Portugueses EP, sobre a proposta de lei nº 216/X apresentada pelo governo e sujeita a discussão pública, visando produzir altera-ções ao código do trabalho, aprovado pela lei 99/2003, de 27 de Agosto, bem como ao regulamento do código do trabalho, aprovado pela lei 35/2004, de 29 de Julho.

A proposta de lei 216/X que visa rever o código do trabalho foi posta à discussão pública entre 17 de Julho e 10 de Setembro de 2008 ou seja, durante o período de férias.

A matéria em discussão é muito vasta e complexa, porquanto envolve a fusão do código e da regulamen-tação.

Comissões de Trabalhadores, Coordenadoras e Sub-comissões:

As Comissões de Trabalhadores são sobretudo penalizadas, especialmente as que desenvolvem a sua acção em grandes empresas.

Por isso, é inadmissível a manutenção na actual pro-posta de lei, do crédito de 25 horas para os membros das Comissões de Trabalhadores e de 20 horas para os membros das Coordenadoras e das Sub-CT’s, assim como a continuação da impossibilidade da não acumulação dos mesmos.

É também inadmissível a manutenção da judicializa-ção dos processos eleitorais para as CT’s, Coordena-doras e Sub-CT’s:

1.A proposta de lei apresentada e a que aqui se emite parecer consubstancia um conjunto de alterações pro-fundas no ordenamento laboral português, aliás, na esteira do código do trabalho que se propõe rever.

2.Neste sentido, o parecer destas Comissão e Subco-missões incidirá sobre as questões que, no nosso entender, assumem especial relevância dada a gravi-dade, para os trabalhadores, das medidas e alterações que se pretendem implementar.

3.Desde logo, cumpre notar a manutenção, clara, da negação do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador, pervertendo, salvo o respeito por opinião diversa, a base jurídica em que deve assentar o direito laboral e, desta feita, produzindo o completo desfasa-mento entre o ordenamento jurídico-laboral e a reali-dade social.

4. Com efeito, é por demais manifesta a desigualdade contratual existente entre o trabalhador e o emprega-dor, perdendo-se, nesta proposta de revisão do código do trabalho, uma oportunidade para a necessária e urgente consagração legal deste princípio essencial à prossecução da justiça laboral. 2

5. Não é, pois, estranho que a proposta de Lei agora

apresentada sobre matérias essenciais venha não só a manter como ainda sobretudo a agravar a situação laboral e contratual dos trabalhadores.

6.Referimo-nos, concretamente, às matérias relativas ao horário de trabalho e à contratação colectiva.

Flexibilidade e mobilidade geográfica e funcional: Esta proposta de lei do governo nestas matérias colo-

ca nas mãos do patronato toda a organização do traba-lho, visando exclusivamente desobrigar as empresas de pagarem trabalho extraordinário, reduzir direitos e os custos com os salários.

O ministro do trabalho veio reconhecer publicamente que é disso que se trata, quando afirmou que “um modelo saudável não pode passar pelas horas extraor-dinárias”.

7.De facto, a proposta de lei ora apresentada, manten-do o regime de adaptabilidade do horário de trabalho trazido pelo actual código do trabalho, visa ainda insti-tuir novos regimes de horário de trabalho, nomeada-mente, o horário com “adaptabilidade grupal”, o “banco de horas” e o “horário concentrado”.

8.Estas formas de organização do tempo de trabalho visam permitir ao empregador o aumento da carga horá-ria, diária e semanal, dos trabalhadores sem que, para tanto, tenham de efectuar o pagamento dessas horas ou do respectivo trabalho suplementar.

9.Ora, salvo o devido respeito, nas matérias respeitan-tes ao horário de trabalho o retrocesso social é absolu-tamente gigantesco o que, inevitavelmente, trará conse-quências que, certamente, não estarão a ser bem equa-cionadas pelos autores da proposta de lei aqui em apre-ço.

10.De facto, tais medidas, que reflectem bem o enten-dimento economicista dos trabalhadores enquanto mero custo de produção, sufragado agora, com toda a clareza, pelo próprio estado, aqui nas vestes da pessoa do governo, trarão consequências nefastas para a ordem jurídica, que, ao invés de combater a ilegalidade se adequa a ela; para a sociedade no seu todo que terá para si menos tempo de população activa; e para cada um dos trabalhadores individualmente afectados que passam a ter que trabalhar mais horas recebendo menos.

11.Além disso, em boa verdade, mais horas de traba-lho não significa necessariamente melhor trabalho, fac-to que a história tem demonstrado reiteradamente e, em muitos sectores de actividade, como é o caso do sector ferroviário, mais horas de trabalho tem uma relação directa ou indirecta com acidentes de trabalho, alguns muito graves, sendo certo que, e pedindo desculpa pela analogia, correr uma maratona em dois dias, não é o mesmo que corrê-la de seguida.

12.Poré, talvez ainda mais grave é o facto da proposta de lei, de forma a permitir escancaradamente a adopção destas medidas e dos princípios que as norteiam, ofere-cer um fortíssimo ataque á contratação colectiva deter-minando o seu fim, bem como o fim dos direitos aí ins-critos conquistados pelos trabalhadores ao longo de muitas gerações.

13.O objectivo do patronato/governo/UGT é estabele-cer um regime de despedimento individual fácil, rápido, barato e certo.

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Só assim se entende a simplificação do processo disciplinar, a redução das situações em que o trabalha-dor seria readmitido; e o pagamento pelo estado dos salários intercalares nos processos, que não sejam concluídos no prazo de 1 ano.

-Elimina o carácter obrigatório da instrução. -A contestação do despedimento deve ser feita no

prazo de 60 dias -As irregularidades formais deixam de constituir fun-

damento de ilicitude. -O alegado combate à precariedade. Nas medidas de combate à precariedade não há qual-

quer referência à fiscalização e sancionamento do incumprimento das normas laborais.

Ora, para as Comissões de Trabalhadores, o combate à precariedade passa, em primeiro lugar, pela efectivi-dade das normas laborais em vigor.

Assim: Para obviar a esta cultura de incumprimento, é imprescindível aumentar a fiscalização e o sanciona-mento das situações de incumprimento.

Em conclusão: A hecatombe financeira que está a desabar sobre o

mundo há muito que era esperada. A ganância desen-freada dos grandes senhores do capital só poderia aca-bar nisto.

Bem pode João Salgueiro, representante dos bancos, vir tentar absolver os criminosos que estão na origem da crise que avassala o mundo, que ninguém já o acre-dita. Bem pode Jorge Coelho proclamar, que não o preocupa os que ganham muito, mas sim os que ganham pouco. Porque todos já sabemos que eles estão apenas a preparar o salto para posições cada vez mais lucrativas.

Na verdade João Salgueiro, ao dar-nos a sua cândida imagem do nosso sistema bancário, esquece-se delibe-radamente de que grande parte do endividamento das famílias é criminosamente induzido e forçado por uma publicidade agressiva, que todos os dias e a toda a hora nos entra pela porta a dentro, do género, vá para férias agora, pague depois. E mais, se João Salgueiro, se quisesse recuperar minimamente do prestígio que já teve, deveria explicar quais os bancos que se encon-tram por trás das chamadas empresas financeiras que empurram as famílias para a insolvência.

Ao ter conhecimento, através da Sub-CT, de que o

Centro de Formação de Guifões estava a ser desmante-lado, a CT dirigiu uma carta ao CG, solicitando informa-ção sobre o assunto.

Na carta enviada a CT aproveitou para manifestar a sua indignação pelo facto de nem ao menos ter havido o cuidado de salvaguardar os dados pessoais dos for-mandos que passaram por aquele centro. Na verdade, chegou ao conhecimento da CT que as fichas identitá-rias de muitos formando foram vistas espalhadas pelo chão no espaço do centro.

Mas o problema de fundo reside no encerramento daquele centro, p’lo que importa saber se para ele irá ser avançada uma alternativa credível. Ou será que o caminho de ferro já tem satisfeitas todas as suas necessidades de formação profissional?

Perante o exposto, esta Comissão e Subcomissões de Trabalhadores, tem uma posição de veemente repúdio

desta proposta de lei, que viola a Constituição da Repú-blica Portuguesa, designadamente quando pretende;

-Destruir completamente todo o património de direitos dos trabalhadores, constantes da contratação colecti-va, livremente acordada entre associações sindicais e patronais e que foram alcançados através de anos e anos de luta dos trabalhadores;

-Impor períodos de trabalho mais alargados, com per-da do pagamento das horas extraordinárias, e com pre-juízo da conciliação entre a vida profissional e familiar com o objectivo de conseguir mais trabalho por menos dinheiro;

-Dar a ilusão de que combate o trabalho precário e o trabalho ilegal, não atacando o primeiro e legitimando o segundo (falsos recibos verdes);

-Que a discussão de uma matéria desta natureza tenha lugar num período de férias dos trabalhadores.

E já agora, também a talhe de foice recordar a Jorge

Coelho que, afinal, os escandalosos prémios salariais e toda a espécie de mordomias pagas aos gestores dos bancos agora falidos são apontados como uma das causas geradoras da crise que aí temos. É tão simples como isso. Para uns tantos ganharem de mais, muitos têm que ganhar de menos. Mas Jorge Coelho, um dos grandes construtores da situação política que nos avassala, sabe isto tão bem ou melhor do que nós. Mas os interesses sobrepõem-se quase sempre à necessi-dade de reconhecer a verdade.

E, já agora, uma palavra para o lamento de Cavaco Silva acerca da crise financeira que nos ameaça. Não se pondo em causa a sua sinceridade quando se mos-tra preocupado com as consequências desta crise , dominando a matéria de economia, é triste e lamentável que tenha assistido calado a tudo isto que se passa à nossa volta, enquanto alguns comiam à tripa forra e enriqueciam através das especulações mais escandalo-sas, para só agora vir proclamar o seu lamento, ainda assim com os olhos postos nos efeitos e não nas cau-sas da crise. Será que Cavaco Silva se prepara para fazer mais um dos seus apelos aos trabalhadores no sentido de apertarem ainda mais o cinto, a fim de aju-darem o grande capital a sair do fosso para onde está a arrastar-nos? Será que também não tem culpas no car-tório?

É que os trabalhadores já sabem muito bem o que a casa gasta. Os lucros são sempre para os ricos, para os especuladores, para os gananciosos. Para os pobres, para os trabalhadores e para os reformados sobram sempre, mas sempre, só os prejuízos. Até quando é que vamos aguentar mais isto?

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“À TABELA” Nº 90 NOVEMBRO DE 2008

Orgão da CT da CP Redacção - Secretariado da CT da CP Composição e Impressão - CT da CP

Calçada do Duque, 14 Tel: 211023739 - Tlm: 917484271

1249-109 LISBOA

LUCROS PARA OS RICOSLUCROS PARA OS RICOS

PREJUÍZOS PARA OS POBRESPREJUÍZOS PARA OS POBRES

FORMAÇÃO ACABAFORMAÇÃO ACABA EM GUIFÕESEM GUIFÕES

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Por vezes até chego a perder a

paciência com as posições que a minha Teresa toma. Mas como já estou habituado a ter que reconhecer a sua grande capacidade para ver onde está a verdade das coisas, acabo quase sempre por me calar. È que a minha Teresa, como sabem, de parva não tem nada. Vem isto a propósito do alvoroço que houve há dias lá em casa quando se soube que a CP tinha perdi-do a exclusividade do transporte de mercadorias, que passa agora a parti-lhar com uma empresa ligada directa-mente à Mota-Engil, a tal que acolheu recentemente no seu regaço dourado o ex-dirigente e ministro do PS, Jorge Coelho, (esse mesmo que foi respon-sável político pela queda da Ponte de Entre-os-Rios, a que ceifou a vida a dezenas de pessoas). É bom que nin-guém se esqueça destas coisas.

A minha Teresa por vezes também anda depressa demais e pôs-se logo a fazer congeminações, procurando estabelecer pontos de contacto com situações que todos conhecemos mas que, por vezes, deixamos cair no esquecimento.

Todos sabemos que tudo isto acon-

teceu dentro da mais rigorosa legali-dade e que nada há a temer das panta-nosas ligações dos nossos políticos com as empresas. Também é sabido que os crimes de corrupção são os mais difíceis de provar e, sobretudo, de condenar. Todos estamos habitua-dos a ver uma autarca que foge para o Brasil e que, no regresso, é recebida triunfalmente para continuar a presti-mosa actividade que a levou à fuga.

Todos sabemos que os políticos da área do poder são colocados, nas son-dagens no mais baixo degrau da con-sideração pública.

Já todos sabíamos isto quando o coveiro da CP, João Cravinho, decidiu proibir a CP de concorrer à travessia do Tejo, porque sabia, todos sabíamos 4

-Pois é, Zé. O homem foi ministro

das Obras Públicas e dos Transpor-tes e agora é o presidente da maior empresa do sector.

-Mas eu não consigo compreender o que tem, como se diz lá na minha terra, o cu com as calças?

-Ai não? Então tu não vês, Zé, que ser ministro vale muito menos do que ter sido ministro?

-Agora é que fico mais confundi-do…

-Como sabes a Mota-Engil já é a maior accionista da Lusoponte, que tem como presidente o Ferreira do Amaral, o tal do buzinão e que assi-nou o faraónico contrato de conces-são da Ponte 25 de Abril, ao tempo que era, também, ministro das Obras Públicas…

-Não me digas que aqui há gato… ou podemos chamar-lhe corrupção?

-Eu não te digo mais nada, mas peço-te que penses.

-Então estamos feitos… -É isso pouco mais ou menos. Não

é por acaso que Portugal é o País da Europa com o maior índice de desi-gualdade e de injustiça social…

que esta empresa era a única que reunia todas as condições para, em igualdade de circunstâncias, ganhar a concessão, que foi parar às mãos da empresa que estava previamente escolhida.

Mas alguns anos depois, mesmo muito depois, de se ter falado tanto de corrupção, eis se não quando nos surge um ex-ministro das Obras Públicas a presidir a uma das maio-res empresas do sector. E qual foi uma das primeiras medidas do governo de Sócrates em tudo isto? Foi nem mais nem menos, a repeti-ção do caso Fertágus, ao decidir entregar clientes da CP à Mota-Engil, de que é agora presidente Jorge Coelho, o tal que ainda não há mui-tos meses dizia que não se preocu-

A minha Teresa, afinal, tinha mais uma vez carradas de razão.

-Não vês Zé, que o mal do País resi-de, fundamentalmente, na falta de transparência e na promiscuidade escandalosa que se observa nas rela-ções entre o público e o privado?

-Mas com a nova empresa nas mer-cadorias talvez se consiga dar um passo em frente na modernização do caminho de ferro.

-Olha Zé: Se isso acontecesse era a primeira vez que, nos últimos 30 anos, se fazia alguma coisa em benefício do caminho de ferro desde que os tuba-rões, vigaristas, corruptos, e outros da mesma trupe que tais, se apoderaram deste pobre país…

-Mas… -Lá vens tu com os teus mas… como

se não soubéssemos que o objectivo desta gente é a entrega de todas as rédeas da economia a uma dúzia de tubarões, em detrimento dos interes-ses da esmagadora maioria dos portu-gueses.

-Então não há nada a fazer? -É claro que há. Aos trabalhadores

não resta outro caminho que não seja o da luta contra as injustiças sociais e contra a mentira que nos servem todos os dias embrulhadas em lindos papéis decorados com o que de melhor há no campo da hipocrisia política e social.

-Então, afinal, sempre estamos fei-tos…

-O que eu digo e o que muita gente já anda para aí a dizer é que não foi para isto que os capitães de Abril arriscaram a pele. Na verdade o espíri-to do 25 de Abril está a ser completa-mente subvertido. Os lobos e as rapo-sas estão de novo a tomar de assalto as capoeiras que são legitimamente do povo.

pava mesmo nada com quem ganha muito, porque estava mais preocupa-da com quem ganha pouco….

Mas o bónus que o governo de Sócrates acaba de entregar à Mota-Engil não se fica por aqui. Com efeito a CP acabaria de ser afastada do transporte de material e carros da Renault que passaria a ser feito pela Takargo, também da mesma empresa.

É claro que tudo isto teria sido feito sem quaisquer tipo de transparência, como de costume. Desviam os negó-cios da CP para dá-los de mão- beija-da ao patrão Jorge Coelho, uma vez que ao contrário do negócio da Fertá-gus, desta vez nem sequer teria sido preciso fazer qualquer portaria do governo, bastando para tal, pronun-ciar uma simples ordem verbal, para que o serviço Renault passasse para a Takargo.

E ainda há quem não acredite no famigerado plano de Sócrates, que ficou conhecido pelo SIMPLEX...

Zé Ferroviário

a verdade éa verdade é

como o azeitecomo o azeite

CP CARGA NAS MÃOS DE JORGE COELHO?