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A TRANSFORMAÇÃO DA VÁRZEA DO RIO PARAÍBA DO SUL EM ESPAÇO ECONÔMICO: UM OLHAR SOBRE A ARQUITETURA VERNACULAR AMARAL, RAPHAEL THOMAZ SANCHES DO (1); SANTOS, ADEMIR PEREIRA DOS (2); SANTOS, MOACIR JOSÉ DOS (3). 1. Universidade de Taubaté- UNITAU. Departamento de Economia, Contabilidade e Administração Rua Expedicionário Ernesto Pereira, 225, Portão 1, Centro, Taubaté - SP [email protected] 2. Universidade de Taubaté UNITAU. Departamento de Economia, Contabilidade e Administração Rua Expedicionário Ernesto Pereira, 225, Portão 1, Centro, Taubaté - SP [email protected] 2. Universidade de Taubaté UNITAU. Departamento de Economia, Contabilidade e Administração Rua Expedicionário Ernesto Pereira, 225, Portão 1, Centro, Taubaté - SP [email protected] RESUMO O presente trabalho busca compreender o processo de ocupação da várzea do Rio Paraíba do Sul e de sua transformação em espaço econômico, focando a implantação das colônias agrícolas como a Colônia de Canas, em Lorena (1885); Boa Vista, em Jacareí (1888); Quiririm, em Taubaté (1890) e Piagui, em Guaratinguetá (1892). Devido à abundância de água na região e à localização favorável, a rizicultura foi uma atividade atrativa para modificar o cenário rural do Vale do Paraíba após a decadência do café, e logo começou a ser difundida de forma crescente. No início a maior parte das atividades eram relacionada à subsistência, e após as obras do Serviço de Melhoramento do Vale do Paraíba Paulista do Estado de São Paulo, a técnica do cultivo do arroz foi aprimorada, possibilitando assim que se tornasse uma atividade de grande importância econômica. O Vale do Paraíba Paulista ainda ostenta inúmeras fazendas do século XIX, período áureo do café, tematizadas por estudos e publicações. No entanto, a arquitetura regional não se restringe somente a esses exemplares e a esse período histórico, pois, existe uma manifestações de uma arquitetura coadjuvante que deve ser observada também, pois apresenta-se aspectos interessantes, relacionados no caso, às tradições construtivas. Os colonos que ocuparam essa região, em sua maior parte italianos, vieram com suas famílias para trabalhar com a terra e trouxeram um “saber” específico, que foi adaptado às condições locais. As edificações vernaculares da várzea do Rio Paraíba do Sul, dialogam perfeitamente com o seu entorno, e em sua maior parte foram construídas de tijolos feitos nas olarias da região, além de fazerem o uso do bambu, constantemente encontrado em meio às quadras de arroz. Para o presente estudo, foi realizado um levantamento das construções rurais e também dos arranjos produtivos com

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A TRANSFORMAÇÃO DA VÁRZEA DO RIO PARAÍBA DO SUL EM ESPAÇO ECONÔMICO: UM OLHAR SOBRE A ARQUITETURA

VERNACULAR

AMARAL, RAPHAEL THOMAZ SANCHES DO (1); SANTOS, ADEMIR PEREIRA DOS (2); SANTOS, MOACIR JOSÉ DOS (3).

1. Universidade de Taubaté- UNITAU. Departamento de Economia, Contabilidade e Administração

Rua Expedicionário Ernesto Pereira, 225, Portão 1, Centro, Taubaté - SP [email protected]

2. Universidade de Taubaté – UNITAU. Departamento de Economia, Contabilidade e Administração

Rua Expedicionário Ernesto Pereira, 225, Portão 1, Centro, Taubaté - SP [email protected]

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Rua Expedicionário Ernesto Pereira, 225, Portão 1, Centro, Taubaté - SP [email protected]

RESUMO

O presente trabalho busca compreender o processo de ocupação da várzea do Rio Paraíba do Sul e de sua transformação em espaço econômico, focando a implantação das colônias agrícolas como a Colônia de Canas, em Lorena (1885); Boa Vista, em Jacareí (1888); Quiririm, em Taubaté (1890) e Piagui, em Guaratinguetá (1892). Devido à abundância de água na região e à localização favorável, a rizicultura foi uma atividade atrativa para modificar o cenário rural do Vale do Paraíba após a decadência do café, e logo começou a ser difundida de forma crescente. No início a maior parte das atividades eram relacionada à subsistência, e após as obras do Serviço de Melhoramento do Vale do Paraíba Paulista do Estado de São Paulo, a técnica do cultivo do arroz foi aprimorada, possibilitando assim que se tornasse uma atividade de grande importância econômica. O Vale do Paraíba Paulista ainda ostenta inúmeras fazendas do século XIX, período áureo do café, tematizadas por estudos e publicações. No entanto, a arquitetura regional não se restringe somente a esses exemplares e a esse período histórico, pois, existe uma manifestações de uma arquitetura coadjuvante que deve ser observada também, pois apresenta-se aspectos interessantes, relacionados no caso, às tradições construtivas. Os colonos que ocuparam essa região, em sua maior parte italianos, vieram com suas famílias para trabalhar com a terra e trouxeram um “saber” específico, que foi adaptado às condições locais. As edificações vernaculares da várzea do Rio Paraíba do Sul, dialogam perfeitamente com o seu entorno, e em sua maior parte foram construídas de tijolos feitos nas olarias da região, além de fazerem o uso do bambu, constantemente encontrado em meio às quadras de arroz. Para o presente estudo, foi realizado um levantamento das construções rurais e também dos arranjos produtivos com

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foco na rizicultura, presentes na várzea da região do Piagui em Guaratinguetá (antiga Colônia do Piagui – 1892) e em Quiririm, distrito de Taubaté (antiga Colônia de Quiririm – 1890). As documentações produzidas em fotografias e desenhos, somadas às fotos históricas evidenciam a presença de uma tradição construtiva que se mantém até os dias de hoje. Os resultados apontam que é urgente e necessário o estudo e a documentação dessas manifestações rurais devido à transformação da várzea em espaço econômico de uso urbano, pois esse espaço tornou-se alvo de outros tipos de atividades econômicas como pesqueiros, extração de areia, substituindo as atividades agrícolas. A rizicultura vem perdendo espaço, por exemplo, para a produção de grama, demandada pelas cidades e pelos empreendimentos imobiliários que estão sendo implantados nas cidades estudadas. E com a destruição e a descaracterização do que resta de uma arquitetura vernacular associada à rizicultura, perde-se uma modalidade muito particular de testemunho do sincretismo cultural que envolve o saber fazer de colonos europeus e os piraquaras, os caipiras do Vale do Paraíba. Este artigo é fruto da dissertação “A TRANSFORMAÇÃO DA VÁRZEA DO VALE DO PARAÍBA PAULISTA EM ESPAÇO ECONÔMICO: UM OLHAR SOBRE A ARQUITETURA VERNACULAR”, apresentada para a obtenção do título de mestre em Planejamento e Desenvolvimento Regional do Programa de Pós-graduação em Administração do Departamento de Economia, Contabilidade e Administração da Universidade de Taubaté – São Paulo.

Palavras-chave: vale do paraíba; colônias agrícolas; arquitetura vernacular; planejamento, rizicultura.

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1. Economia e Território

1.1. As Colônias Agrícolas

Historicamente, a economia valeparaibana sempre esteve baseada na agricultura e nas

atividades ligadas à terra como: açúcar, café, algodão, fumo, milho, feijão e outros produtos

secundários. No início do seu povoamento, a economia era de subsistência, enfrentou o

declínio da produção aurífera, a monocultura açucareira e, posteriormente, o grande ciclo

produtor de café.

Uma das regiões agrícolas mais importantes de São Paulo, suas terras ainda hoje

constituem um sério desafio para o aumento de uma produção racional de cereais, capaz de

garantir o seu abastecimento. A ocupação e utilização das várzeas do Rio Paraíba teve

início na segunda metade do século XX, com a implantação de colônias agrícolas pelo

governo provincial. (PASIN, 1992, p.1).

Os núcleos agrícolas do Estado de São Paulo, eram divididos em particulares e oficiais,

como consta na relação das colônias que foram fundadas entre 1827 e 1892, são

totalizados 108 núcleos, com seus respectivos números de ordem, nome das colônias, data

de fundação, município, nome dos proprietários/fundadores, condições dos trabalhos e

observações. A partir desses dados, foi possível identificar 9 colônias particulares no Vale

do Paraíba, sendo duas em Ubatuba, duas em Taubaté, duas em São Sebastião, duas em

Lorena e uma em Paraíbuna.

O mapa do estado com a localização da colonização oficial em São Paulo marca 39 colônias

que foram instituídas entre 1829 e 1938, criadas pelo império, governo federal e estadual,

sua maior parte implantada ao longo da ferroria.

A partir desse documento, é possível constatar que foram instituídas cinco colônias oficiais

no Vale do Paraíba Paulista, conforme tabela abaixo:

Tabela 1 - Colônias agrícolas oficiais do Vale do Paraíba Paulista 1829 - 1938 Nome da Colônia Data da Fundação Município Governo

Canas 1885 Lorena Império

Boa Vista 1888 Jacareí Governo do Estado

Quiririm 1890 Taubaté Governo do Estado

Pigaui 1892 Guaratinguetá Governo do Estado

São José do Barreiro - São José do Barreiro Governo Federal

Fonte: MARCONDES, 1981, p. 38. adaptação do autor

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A implatação destas colônias agrícolas resultava da necessidade de se ocupar as várzeas

do Paraíba e as áreas livres dos municípios, tendo em vista o domínio absoluto do café e as

crises periódicas de abastecimento de cereais e legumes na região. (PASIN, 1992, p.1).

Estas colônias eram integradas por italianos, alemães, portugueses, espanhóis, suíços,

austríacos e outras nacionalidades, predominantemente as famílias de origem italiana. A

rizicultura como atividade produtiva sistemática na região tem como marco inicial, quando

cerca de 400 imigrantes fixaram-se no bairro do Paiolinho em Taubaté em 1890, que mais

tarde tornou-se o Distrito de Quiririm em 1925. (SANTOS, 2012. p. 3)

Outras experiências envolvendo colônias de imigrantes e migrantes que se

dedicaram ao arroz também foram implantadas em lugares como Canas e Roseira e

Potim. Foram estes os principais vetores da diversificação das culturas agrícolas e

os responsáveis pela introdução do cultivo do arroz irrigado na região. Apontavam

uma alternativa para a substituição dos cafezais além das pastagens que se

tornaram predominantes como paisagem rural.

É deste momento, período pós-abolicionista da viradado século XIX, que envolve a

Primeira República, os primeiros sinais da nova paisagem rural e urbana em

gestação. Já se anunciava ali o uso das águas e a geometria regular da área

cultivada pelos arrozais, assim como pelos núcleos urbanos que surgiram das vilas e

povoados das colônias agrícolas. (SANTOS, 2012, p.3.)

1.2. A Rizicultura e o Desenvolvimento no Vale do Paraíba Paulista

Em todas as partes do mundo, a civilização adentrou primeiramente os vales, já São

Paulo era uma excessão, a sua primeira grandeza agrícola, o café, vinha dos

espigões. Muito depois quando o café foi dado como vencido e surge o interesse por

outras culturas, o fazendeiro se vê obrigado a descer dos espigões para fazer a

chamada “quitanda”, outras “culturas agrícolas que não fossem a do café.”

(MENDES, p.19, 1940.)

Após o declínio da produção cafeeira no Vale do Paraíba, Mendes (p.19, 1940)

afirma que “aparecem os primeiros symptomas de vida nova, de verdadeira

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ressureição, na mesma terra e com a mesma raça”. Otimista, Mendes (p.20, 1940)

ressalta que “por esta ou por aquella razão, o paulista já está descendo dos

espigões para os vales e nelles reviverá os mesmos prodígios que realizou com o

café”. Eis que surge um interesse de ordem econômica, que impõem o

aproveitamento de terras que foram olhadas com menos interesse, além da posição

geográfica privilegiada do Vale do Paraíba, que está entre as duas maiores cidades

do Brasil, São Paulo e Rio de Janeiro, grandes centros industriais, enormes

mercados para a produção agrícola. (MENDES, 1940, p.20.)

Em 1904 chegaram os monges trapistas, vindos da França, fixaram-se no município

de Tremembé, SP, na Fazenda Maristela, e deram início ao cultivo racional do arroz.

(SANTOS, 2012, p. 3).

Desde a decadência da produção cafeeira no Vale do Paraíba, as plantações de

arroz passaram a dominar a várzea, sendo em 1920, o principal produto agrícola da

região. (SECRETARIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO REGIONAL,

2013, p. 68)

O arroz é o principal produto agrícola cultivado no Vale do Paraíba, destacando-se

as áreas de São José dos Campos, Caçapava, Pindamonhangaba, Roseira,

Guaratinguetá e Lorena. Além do arroz, a produção agrária da região se caracteriza

pelo cultivo do milho, tomate, batata e feijão. (PASIN, 1992, p. 1)

Como o Estado de São Paulo não possuí diversos trechos planos onde possa

empregar o processo de irrigação de forma apropriada, esse era o motivo o qual

estimava-se que o Vale do Paraíba seria no futuro considerada a melhor zona para o

plantio do arroz. (MENDES, 1940, p.36.) A partir desses fatos, Mendes reafirma que

“as facilidades da irrigação, em grande escala, constituem elemento decisivo de

êxito na cultura do arroz”. (MENDES, 1940, p.40)

Em 1940, Vale do Paraíba ja estava em condições de poder desenvolver

consideravelmente a sua produção de arroz, que naquela altura ja atingia mais de

meio milhão de sacas, sendo São José dos Campos (200.000 sacas) e

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Pindamonhangaba (102.445 sacas) os principais municípios produtores, e em

seguida Taubaté com mais de 80.000 sacas. (MENDES, 1940, p.40)

A partir do decreto de “Reerguimento Econômico do Valle do Parahyba”, o Instituto

Agronômico de Campinas (IAC) foi responsável de instalar uma estação

experimental de cereais, leguminosas, fibras e culturas diversas, para que fossem

realizados estudos científicos in loco, para aperfeiçoamento da cultura do arroz, cuja

maior produção no país, pertencia a São Paulo, com o total de 8.000.000 de sacas.

(MENDES, 1940, p.40)

No Vale do Paraíba, os terrenos que se prolongam pelas margens do Rio Paraíba e

vão de Jacareí até o município de Cachoeira Paulista, aproximadamente 100 mil

hectares, são perfeitos para a cultura intensiva do arroz.

1.3. O Serviço de Melhoramento do Rio Paraíba

As obras realizadas pelo Serviço do Vale do Paraíba do Departamento de Águas e Energia

Elétrica, desde a criação do órgão em 1951 até a década de 1990, construiu um sistema de

diques, polders, associado a um extenso projeto de aproveitamento hidroelétrico da bacia do

rio do Paraíba do Sul. (SANTOS, 2012, p.4)

O contexto histórico que levou o governo estadual a criar o Departamento de Águas e

Energia Elétrica nos leva ao problema do abastecimento de água e de energia elétrica para

a capital paulista que estava em pleno processo de industrialização, associado a uma

urbanização acelerada.

A dotação da várzea do rio Paraíba dos dispositivos necessários para que se fizesse o

aproveitamento agrícola e especialmente a rizicultura foi contemplado como parte de um

conjunto de outras soluções de caráter social, econômico e sanitário, aspectos que também

foram associadas ao aproveitamento do potencial hídrico e elétrico do principalrio da região.

Além do controle das enchentes que amargavam periodicamente as comunidades,

desenvolvimento da cultura do arroz deveria promover o que se denominou como

“reerguimento econômico” para as cidades valeparaibanas que viviam momentos difíceis.

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Chegaram a registrar significativa perda demográfica desde a decadência da cafeicultura.

(SANTOS, 2012, p.4.)

Com a criação do DAEE teve-se o início em São Paulo os serviços regulares de estudo,

exploração e gestão dos recursos hídricos, implementados a partir da definição de zonas,

estabelecidas por bacias hidrográficas.

As obras da região foram conduzidas pelo Serviço do Vale do Paraíba do DAEE que teve

como atribuição desenvolver e viabilizar os projetos para região a partir do conceito de

“aproveitamento múltiplo”.

As referências eram os programas desenvolvidos no vale do rio Tennesseee

Columbianos EUA, assim como as Companhias do Ródano, na Provence, e Baixo

Ródano e Languedoc na França. Outras referências vinham do caso holandês e

português. (REVISTA,1967,s.p.).

Duas grandes frentes de trabalho foram abertas pelo Serviço do Vale do Paraíba: a

regularização do regime hídrico conjugado à geração de energia elétrica e o

aproveitamento agrícola das águas e para terras férteis de sua planície de

inundação.

O projeto para o aproveitamento hidrelétrico da bacia do rio Paraíba do sul previa

um conjunto de cinco grandes barragens: duas nos rios Paraibuna e Paraitinga que

formam o rio Paraíba; uma no rio Paraíba em Santa Branca, uma no rio Jaguari em

Jacareí e outra no rio Buquira em São José dos Campos. De acordo com o plano o

lago único formado pelas barragens dos rios Paraibuna e Paraitinga abasteceria

ainda a cidade de Caraguatatuba por meio de uma usina subterrânea, aproveitando

o forte desnível da Serra do Mar e valendo-se de canais e túneis para adução.

(SANTOS, 2012, p.4)

]

Além da geração de energia elétrica que abasteceria a região e integraria o sistema

estadual, as barragens resolveriam o problema de abastecimento de água potável,

incluindo a capital, e evitariam as periódicas e devastadoras inundações que

assolavam as cidades banhadas pelo rio e seus principais afluentes.

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Foi prevista a construção de diques ao longo de toda a várzea, numa extensão de

260km, de Jacareí à Cachoeira Paulista. Até o ano de 1966 foram construídos

123km, sendo que 60km dedicados à regularização do rio, que teve meandros

cortados e trechos retificados.

Os estudos que embasaram o “aproveitamento múltiplo” dos recursos hídricos

apontaram para obras de pequeno, médio e grande porte, além de uma ação

contínua do estado envolvendo a participação de setores e áreas do conhecimento

fundamentais para promover o desejado “desenvolvimento rural”. Era previsto para o

rio Paraíba a constituição de 36 polders, “áreas protegidas” da inundação eventual,

definindo então 36 “unidades agrícolas” que contariam com adutoras,

reservatórios, estações de bombeamento, canais e valas de irrigação e sistema de

drenagem, além dos caminhos necessários para estabelecer a plantação, cultivo e a

colheita. (SANTOS, 2012, p. 5; 6)

O novo cenário possibilitado pelas barragens permitiria ainda que as terras da

extensa planície de inundação que margeiam o rio de Jacareí a Cachoeira Paulista

fossem aproveitadas para o cultivo de arroz, batata, feijão e outras culturas.

Constituía-se com este sistema a base de uma agricultura intensiva e de grande

apuro técnico.

A ação do SVP do DAEE impactou e transformou o modo de vida de parcela

considerável da população e alterou significativamente a paisagem das primeiras

décadas do século XX. Os polders transformaram a várzea num ordenado cenário

de produção controlada e cada vez mais mediada pela técnica e tecnologia.

Com a regularização das cheias e a água proporcionada pelo sistema de polders chegaram

à várzea novos usos e aumentou a presença humana. Tornou-se um espaço produtivo

disputado pelos agricultores, pelos especuladores imobiliários e pela indústria extrativa,

destacadamente os areeiros. A regularização do rio possibilitou a expansão do uso

agroindustrial da planície de inundação. “Aumentou significativamente a área agriculturável

numa região com parte considerável das terras férteis marcada pela forte inclinação,

imprópria, portanto para a agricultura.” (SANTOS, 2012, p. 9).

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2. Propriedade e Paisagem

2.1. Colônia de Quiririm – Taubaté (1890)

No dia 5 de Janeiro de 1889, o Dr. Francisco de Paula Toledo junto do Ministério da

Agricultura, decidiu realizar a fundação de um Núcleo Colonial em sua fazenda do Quiririm

no município de Taubaté.

Após o Governo nomear uma comissão responsável para iniciar os trabalhos técnicos, é no

dia 16 de Agosto de 1890 que é inaugurada a Colônia de Quiririm.Vindos de trem do Rio de

Janeiro, desembarcaram às 8 horas da noite, 2 dias após a inauguração da Colônia, cerca

de 400 imigrantes italianos. No dia seguinte, muitos deles dirigiam-se para a estação da

cidade, arrependidos da viagem. Porém mais tarde, cederam aos agrados e as promessas

das pessoas interessadas no serviço da imigração.

A colônia tem junto a sede a estação de Quiririm da antiga estrada de ferro Central do

Brasil. Sua população era de 424 pessoas, distribuídos por 60 lotes urbanos, 48 suburbanos

e 56 rurais, não inclusos nestes a herança do Dr. Francisco de Paula Toledo.

Já em 1892, a produção da colônia chega a marca de: 5.000 litros de batatas, 120 arrobas

de café, 7.500 litros de arroz, 10.000 litros de farinha, 10.000 litros de feijão e 20.000 litros

de milho. Quando foi pequena a produção agrícola, os colonos se dedicaram a fabricação

de tijolos que foram consumidos em Taubaté, e na própria colônia na construção das casas.

Os colonos estavam bem estabelecidos, e com tanta produtividade, poucos faltavam saldar

suas contas com o Governo.

Ainda em 1892, a Colônia de Quiririm contava com a infra-estrutura de 86 casas provisórias,

11 casas definitivas, 1 prédio escolar e 3 próprios do Estado, tudo no valor de 55:600$000.

Os colonos ainda possuíam 31 carros de bois e 8 carroças, no valor de 7:400$000. Havia

ainda 18 cavalos, 5 éguas, 152 bois, 36 porcos, 1 cabra, 12 muares, 1.611 galinhas, tudo

avaliado em 32:059$000.

A Colônia possuía também, 11 olarias, 2 casas de negócios, 2 engenhos de água ardente e

1 engenho de fubá.

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Um dos primeiros e mais importantes prédios da colônia foi construído pelos irmãos Indiani

em abril de 1903, conhecido como “sobradão”, motivo de orgulho para a colônia, não só pelo

seu porte mas ainda pelas pinturas a óleo nas paredes internas.

Sem dúvida a influência dos colonos italianos foi muito importante para o desenvolvimento

em diversos setores da cidade, que recebeu também italianos não imigrantes, que por sua

vez, vieram por conta própria na intenção de progredir e transformar a região.

2.2. Colônia do Piagui – Guaratinguetá (1892)

Em 1844, Guaratinguetá é elevada à categoria de cidade. Em 7 de julho de 1848, nasce

Francisco de Paula Rodrigues Alves, futuro Conselheiro e Presidente da República (eleito

duas vezes). O ano 1885 marca o auge da produção cafeeira e 1877 torna-se marco divisor

da história com a chegada da Estrada de Ferro que liga São Paulo ao Rio de Janeiro,

propiciando maior troca entre capital e provincial, trazendo grandes benefícios para a

cidade.

Em 1886 foi quando a produção cafeeira atingiu seu auge, e em 1892 foi fundada a Colônia

do Piagui, motivando assim a vinda de um grande número de imigrantes para

Guaratinguetá, que com sua influência e trabalho, muito contribuíram para o

desenvolvimento.

Em Guaratinguetá, o desenvolvimento urbano deve-se ao café, que atraiu novas

possibilidades econômicas, sociais e políticas. A educação privilegiada, confluiu para que a

elite rural conseguisse um papel imporante na direção política da cidade, mas esse

desenvolvimento intelectual não é evidenciado só pelo aparecimento de membros dessa

elite agrícola com profissões liberais ou diplomas como também pelo desenvolvimento do

número de escolas e jornais. (GIFFONI JR, 2003, p. 11).

O ciclo do café faz também surgir outra característica bastante marcante no município, que

é então a união dos modos de vida rural e urbano. Em Guaratinguetá, como em qualquer

outra cidade do Vale do Paraíba que tiveram o desenvolvimento urbano ligado a cultura

cafeeira, apresentaram um aumento demográfico, devido a vinda de imigrandes de outros

países e de diversas localidades do território brasileiro bem como pelo aumento do número

de escravos negros, o que consistia uma mão de obra abundante e que serviu de base para

a economia do café.

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Conforme Hermann (1969 apud. GIFFONI JR, p. 11, 2003.), 230 indivíduos de diversas

nacionalidades, um número bem menor do que em outras áreas cafeicultoras de São Paulo,

habitavam Guaratinguetá em 1872. Esse grupo de indivíduos era predominantemente

homens, solteiros e de nacionalidade portuguesa.

Com a proibição do tráfico negreiro em 1850, e com a abolição da escravatura decretada em

1888, trouxe grande prejuízo para os cafeicultores, que foram obrigados a procurar uma

nova mão-de-obra. A solução encontrada foi a introdução do imigrante como mão-de-obra

assalariada nas lavouras, substituindo a mão-de-obra escrava.

Com a chegada do imigrante começa a desenvolver em Guaratinguetá o trabalho

remunerado. Os imigrantes contribuíram muito para o desenvolvimento do município, onde a

sua colaboração foi a introduçãoo de novas técnicas de trabalho oriundas das próprias

condições em que viviam em seus países de origem. Já em 1892 é que o número de

imigrantes aumenta consideravelmente, devido o início das atividades da Colônia do Piagui.

A cidade recebeu imigrantes de diversas etnias, que tiveram um importante papel de

destaque na vida comunitária da idade, exercendo uma influência no meio urbano e no rural.

(GIFFONI JR, 2003, p. 12 – 13).

A partir de 1892, com a fundação da Colônia do Piagui, o número de imigrantes italianos

aumentou consideravelmente. A maior parte deles, vinham de cidades localizadas ao norte

da itália, esses imigrantes dedicaram-se à rizicultura e à agricultura de subsistência.

A cidade de Guaratinguetá recebeu um grande número de imigrantes italianos que se

instalaram tanto no meio rural, ocupando lotes na Colônia do Piagui, quando no meio

urbano, onde desenvolveram diversas outras atividades. Os imigrantes, em sua maior parte,

tinham o objetivo de prosperar, ou seja, encontrar um local para trabalhar, construir família e

adquirir bens. Tudo isso simultaneamente com o periodo de transição entre a já decadente

lavoura cafeeira e o desenvolvimento e consolidação de outras alternativas de substituição a

essa economia, no caso a pecuária, a indústria e o comercio. (GIFFONI JR, 2003, p. 16 –

17).

A esse fato, soma-se o processo de urbanização que a cidade passava neste momento,

onde o imigrante passou a fazer parte integrante e atuande desse meio. Esses imigrantes

não se limitaram somente a monocultura, ja que no setor rural desenvolveram outras

atividades, como agricultura de subsistência, produzindo excedentes para comercializar na

cidade, uma prática até então desconhecida no município. Já no setor urbano, onde se

dirigiram muitos imigrantes que tinham o sonho de se tornar comerciantes ou artifices,

muitos acabaram se instalando em casas comerciais, pequenas indústrias além de se

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dedicarem à execução de atividades artesanais, sem esquecer, entretanto do aspecto

cultural onde mostrou sua influência. (GIFFONI JR, p. 17, 2003.)

Esse processo de modificação dos hábitos e do modo de vida dessa comunidade, contribuiu

de modo efetivo para o desenvolvimento da cidade de Guaratinguetá, cujos efeitos podem

ser notados até os dias atuais.

3. Pesquisa e Documentação

Com a evolução das cidades, é natural que muitos elementos culturais acabem se

transformando através desse processo. Devido a este crescimento urbano tornou-se

emergencial e oportuno o estudo sistemático desta paisagem produtiva, focando a

arquitetura rural, especialmente a arquitetura vernacular, ausente dos levantamentos oficiais

pautados pelos aspectos artísticos e formais, especialmente das exuberantes fazendas de

café.

É urgente a necessidade de estimular a educação patrimonial, a valorização da cultura local,

e a busca de incentivo e criação de políticas públicas que fomentem essas atividades

contribuindo para que a sociedade valorize e cresça, buscando o desenvolvimento pela

criatividade usando sua cultura como intermédio. A valorização do patrimônio está

diretamente ligada à preservação da cultura local, que possui relação profunda com a

comunidade pertencente a esse lugar e seu meio.

A arquitetura vernacular do vale do Rio Paraíba reúne testemunhos antigos e

valiosos em termos antropológicos e arqueológicos. Além das fazendas de café há

pequenas, médias e grandes propriedades dedicadas à policultura, à pecuária e à

produção de cana.

Destacaremos neste artigo os agenciamentos e as tipologias associados à cultura

do arroz que se concentrou na planície sedimentar da várzea.

Integram o conjunto das edificações estudadas aquelas feitas de madeira, de tijolos,

técnica mais utilizada desde a virada do século XIX, quando chegam os imigrantes

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italianos na região. Tratam-se de testemunhos que reúnem sincretismos valiosos da

cultura mineira, fluminense e paulista, que se somaram à cultura do migrante e

principalmente do imigrante

A importância desse levantamento, além da preservação dessa memória, é sugerir

elementos que contribuam para o controle e a orientação da expansão das cidades da

região do Vale do Paraíba.

3.1. Documentação

A documentação da arquitetura vernacular valeparaibana proporciona uma reflexão sobre o

processo de aculturação a partir do espaço, e do que se denomina como arquitetura

vernacular, produzida por um saber fazer afastado da cultura técnica acadêmica.

Em Quiririm, distrito de Taubaté, foram documentadas duas fazendas de arroz, intituladas

de Fazenda “Quiririm 1” e a Fazenda “Quiririm 2”.

Nota-se a posição das fazendas em relação a várzea (Figura 1), sendo a

proximidade um fator importante para a produção e transporte, seu traçado

semelhante, onde há grande concentração de galpões e algumas habitações rurais

no entorno que facilitavam o trabalho local.

Figura 1 - Localização da Fazenda Quiririm 2 (mancha vermelha localizada a esquerda) e Fazenda Quiririm 1 (mancha vermelha localizada a direita Fonte: Google Earth, 2013.

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Na antiga Colônia do Piagui, hoje é um bairro afastado do centro de Guaratingueta, foi

documentada uma fazenda de arroz, intitulada de “Piaguí 1”. Essa fazenda, por sua vez,

esta localizada onde era a área da antiga colônia agrícola, possivelmente mantendo seu

traçado característico da região.

Atualmente, o Bairro do Piaguí é caracterizado como cinturão verde da cidade, sua

paisagem é tipicamente com predomínio de plantações de arroz e hortaliças, sendo

o primeiro lugar do Brasil a ser implantado o sistema de irrigação “Sistemas de

Polders” (1950/1960), obra responsável pela sistematização e intensificação da

produção do arroz.

Ao observar a Figura 2, nota-se a proximidade do atual Bairro do Piaguí, e da antiga

localização da Colônia do Piagui.

Figura 2 - Localização do Bairro do Piaguí (mancha vermelha) e antiga Colônia do Piaguí (mancha amarela Fonte: Google Earth, 2013.

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3.2. Fazenda Quiririm 1 – Taubaté A Fazenda intitulada de “Quiririm 1”, é localizada no distrito de Quiririm, e tem seu acesso

dado pela Estrada do Pinhão, onde ainda encontram-se diversos galpões e ruínas de

máquinas que eram utilizadas para o manuseio e produção do arroz.

Sua localização estratégica, próxima a várzea, facilita o transporte e o processo de

manuseio do produto agrícola. Atualmente a propriedade não funciona como

fazenda de arroz, as terrar produtivas na várzea são arrendadas, dando lugar para a

produção de grama. As construções aparentemente em mal estado de conservação,

são usadas como depósito de autopeças.

Pode-se observar na implantação da Fazenda Quiririm 1 (Figura 3), logo ao centro a

concentração dos grandes galpões destinados ao armazenamento e processamento

do arroz. As pequenas construções na parte inferior esquerda são pequenas

residências rurais, provavelmente de trabalhadores da fazenda. Nota-se a

localização estratégica das residências próximas ao espaço de trabalho, fazenda e

várzea.

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Figura 3 - Implantação e fachada das edificações – Fazenda Quiririm 1. Desenho do autor. 2013.

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3.3. Fazenda Quiririm 2 – Taubaté

A Fazenda “Quiririm 2” (Figura 4), localizada no distrito de Quiririm, tem seu acesso

dado pela Avenida Líbero Indiani e fica de costas para a Rodovia Floriano Rodrigues

Pinheiro.

Sua localização próxima a várzea, e a estrada facilita o transporte do espaço

produtivo para o espaço fabril, além de rota de escoamento. Atualmente a Fazenda

Valério produz arroz, nota-se pelo característico arranjo produtivo, seguido dos

galpões e também a presença das tulhas e silos.

As construções estão em ótimo estado de conservação, o arranjo é composto de

três grandes galpões, e uma provável casa de máquinas ao centro, além das

pequenas habitações rurais em seu entorno.

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Figura 4 - Implantação e fachada das edificações – Fazenda Quiririm 2. Desenho do autor. 2013.

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3.3. Fazenda Piagui 1 - Guaratinguetá

A Fazenda intitulada de “Piagui 1”, localiza-se na antiga Colônia do Piagui, hoje

Bairro do Piagui em Guaratinguetá. Tem seu acesso dado pela Estrada Colônia do

Piaguí. Está localizada dentro da vázea, rodeada pelas quadras de arroz como fica

evidente na implantação (Figura 5). Atualmente a Fazenda “Piagui 1”aparenta

produzir arroz, nota-se um característico arranjo de produção e plantio.

As construções estão em ótimo estado de conservação, o arranjo é composto de

três construções, localizada ao fundo do terreno, uma casa sede, uma provável

habitação próxima a estrada, e uma curiosa capela localizada as margens das

quadras

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Figura 5 – Implantação e fachadas das edificações – Fazenda Piagui 1.” Desenho do autor. 2013.

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3.4. Arquitetura Local

Além das fazendas documentadas, encontram-se ao longo da Várzea do Vale do Paraíba

Paulista diversas outras construções rurais de ordem vernacular, sejam habitações, espaços

produtivos ou de infraestrutura, próximos aos espaços destinados a rizicultura. Nota-se que

essas construções apresentam características semelhantes em técnica construtiva, traçado

e conformação. A técnica construtiva geralmente são paredes feitas de tijolos, em sua maior

parte produzidos nas olarias da região, pintura a base de cal, esquadrias de portas e janelas

em madeira, telhado em duas águas, com estrutura confeccionada originalmente em

madeira roliça, posteriormente substituída por caibros. As telhas são do tipo capa e canal,

porém as maiores das construções substituíram por outras telhas devido a impossibilidade

de reposição das mesmas.

Ao compararmos as construções documentadas a seguir, com as construções registradas

em fotografias pelas famílias italianas da Colônia de Quiririm (Figura 6), constata-se que

muitos desses exemplares vernaculares construídos pelos imigrantes perduram até os dias

de hoje, e que esse saber fazer específico da região, foi passado de geração a geração,

sofrendo modificações devido as condições geográficas, climáticas, econômicas e culturais.

Figura 6 – Casa rural da Colônia de Quiririm (Entre 1910 – 1920). Fonte: Acervo fotográfico de Carmem Soldi

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Ao observarmos a habitação da Figura 7, nota-se a presença do telhado em duas águas

característico da região, telhas capa e canal substituídas por telhas francesas, janelas e

portas aparentemente de época, todas confeccionadas em madeira.

Figura 7 - Implantação e fachadas - Habitação Tremembé Fonte: Desenho do autor.

Na habitação da Figura 8, podemos ver um traçado mais vernáculo através do uso do

cercado feito de bambu encontrado nos arrozais, telhado em duas águas, telhas capa e

canal, janelas e portas em madeira. Um exemplar remanescente, que ainda mantém traços

tradicionais.

Figura 8 - Implantação e fachada - Habitação Tremembé Fonte: Desenho do autor.

Na Figura 9, encontra-se uma habitação na várzea da antiga Colônia do Piagui, a

mesma possuiu o característico telhado em duas águas, telhas capa e canal além de

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janelas e portas confeccionadas em madeira, e a estrutura do telhado que

originalmente era feito de madeira roliça foi substituída por caibros. Na parte frontal

e posterior da habitação, é possível identificar a presença de dois espaços de

plantio, onde o morador cultiva milho, feijão, entre outros alimentos para o próprio

consumo. Ao lado direito nota-se a presença de um curso d’água, que em épocas de

chuva costuma encher e alagar a área da residência.

Figura 9. Implantação e fachadas - Habitação Colônia do Piagui Fonte: Desenho do autor

A construção da Figura 10, encontrada na várzea de Pindamonhangaba é,

possivelmente uma habitação. Nota-se mais uma vez a presença do telhado em

duas águas, telhas capa e canal substituídas por telhas francesas, janelas e portas

aparentemente de época, todas confeccionadas em madeira, e pintura das paredes

em cal.

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Figura 10 - Implantação e fachada - Habitação Pindamonhangaba Fonte: Desenho do autor

Podemos notar na Figura 11, um conjunto de habitações rurais bem próximos a

várzea de Quiririm. Possuem telhado em duas águas e ainda mantém as telhas capa

e canal, nota-se o uso do cercado em bambú encontrado nos arrozais, e também a

substituição das portas e janelas de madeira por janelas de alumínio.

Figura 11 - Implantação e fachada - Habitação Quiririm Fonte: Desenho do autor

Na Figura 12, encontra-se uma habitação, com uma planta diferenciada das outras

construções apresentadas. Possuí telhado em quatro águas, mantém as telhas capa

e canal, além das portas e janelas todas em madeira. Segundo relato de moradores,

a atual habitação era uma antiga casa sede de fazenda, a qual os trabalhadores

rurais compareciam para receber o pagamento. A casa é toda cercada por árvores e

fica próxima a várzea. Ao fundo, nota-se a presença de um curso d’água, de uma

fossa e de um tanque para uso dos moradores.

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Figura 12 - Implantação e fachada – Habitação Piagui Fonte: Desenho do autor

4. Considerações Finais

A instituição oficial de núcleos coloniais agrícolas no Vale do Paraíba Paulista foi de

extrema importância para a região. Após a abolição da escravatura e a decadência

do café, a mão de obra “livre” do colono foi fundamental para a estruturação

econômica e a ocupação da várzea como espaço de produção.

As mesclas das diversas etnias aqui estabelecidas foram de extrema relevância,

pois, com o passar do tempo, o aprimoramento da mão de obra e do uso e

ocupação do solo, possibilitaram que a várzea se tornasse um espaço de maior

evidência no vale.

Devido ao intenso uso da várzea, foi necessário realizar uma grande obra de infra

estrutura, possibilitando assim, um maior domínio dessa área, rica e de difícil

manuseio. O controle das águas do Rio Paraíba do Sul, que vieram com o Serviço

de Melhoramento, possibilitou a utilização de forma sistemática do solo,

alavancando a produtividade, passando da agricultura de subsistência para uma

produção intensiva e extensiva, tornando assim a rizicultura a principal atividade

agrícola da região.

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Com maior controle da várzea, foi possível ocupa-la não só com áreas de produção,

mas também com construções, arranjos que facilitaram e racionalizaram a

produtividade, desenvolvendo uma produção em outro nível.

O trabalho proposto além de documentar a arquitetura vernacular valeparaibana,

proporcionou uma reflexão sobre o processo de aculturação a partir do espaço, e do

que se denomina como arquitetura vernacular, aquela que é produzida por um saber

fazer afastado da cultura técnica acadêmica.

O uso de suportes eletrônicos e digitais combinados a técnicas usuais para

documentação visual como desenho, proporciona contornos para uma

caracterização de um patrimônio cultural relevante, porém ignorado diante do relevo

conferido às sedes da fazendas de café, que duraram menos de meio século, ou

mais precisamente, de 1836 a 1888.

As atividades rurais e principalmente a arquitetura e a cultura rural não se restringem

somente a este período e a este produto agrícola. A várzea do Vale do Paraíba é

rica não só em seu solo ou produção agrícola, mas é símbolo de um avanço para a

região, que geralmente nos passa desapercebido como uma paisagem natural.

Devido ao crescimento urbano e o avanço da região, tornou-se emergencial e

oportuno o estudo sistemático desta paisagem produtiva, focando a arquitetura rural,

especialmente a vernacular, como as fazendas, olarias e habitações, ausentes dos

levantamentos oficiais pautados pelos aspectos artísticos e formais.

A documentação desses resquícios da colonização do Vale do Paraíba Paulista é de

extrema importância não só para a memória, mas também, para uma melhor

compreensão do processo de urbanização e evolução da nossa região.

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Referências Bibliográficas

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