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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA SETOR DE CIÊNCIAS DA TERRA LAURA DOS SANTOS ROUGEMONT A UHE Tijuco Alto no contexto dos conflitos gerados pelas barragens Curitiba 2011

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA

SETOR DE CIÊNCIAS DA TERRA

LAURA DOS SANTOS ROUGEMONT

A UHE Tijuco Alto no contexto dos conflitos gerados pelas

barragens

Curitiba

2011

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA

SETOR DE CIÊNCIAS DA TERRA

LAURA DOS SANTOS ROUGEMONT

A UHE Tijuco Alto no contexto dos conflitos gerados pelas

barragens

Monografia apresentada como requisito parcial

para a conclusão do curso de Bacharelado em

Geografia, Setor de Ciências da Terra, da

Universidade Federal do Paraná.

Orientador: Prof. Jorge R. Montenegro Gómez

Curitiba

2011

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................................ 3

1 UHE TIJUCO ALTO, CBA E CERRO AZUL: O PANORAMA DO CONFLITO ................................. 7

1.1 A UHE DE TIJUCO ALTO NO CONTEXTO DO VALE DO RIBEIRA ............................................... 8

1.1.1 O município de Cerro Azul (PR): um pedaço do Vale Do Ribeira ameaçado pela UHE Tijuco Alto

............................................................................................................................................................... 11

1.2 O EMPREENDEDOR: A COMPANHIA BRASILEIRA DE ALUMÍNIO............................................ 13

1.3 O PROJETO: UMA HISTÓRIA MARCADA POR RESISTÊNCIAS ................................................ 19

1.4 OS AMEAÇADOS: OS IMPACTOS SOBRE O MUNICÍPIO DE CERRO AZUL (PR) .................... 25

2 ANALISANDO O ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL E O RELATÓRIO DE IMPACTO

AMBIENTAL DA UHE TIJUCO ALTO: ENTRE “O DITO E O FEITO” ............................................... 29

2.1 O RESERVATÓRIO: UM ELEMENTO IMPORTANTE PARA O ENTENDIMENTO DOS

IMPACTOS ............................................................................................................................................ 31

2.1.1 Impactos sobre o meio físico........................................................................................................ 33

2.1.2 Impactos sobre o meio socioeconômico ...................................................................................... 39

2.2 COMPENSANDO OS IMPACTOS? ................................................................................................ 45

3 CONSIDERAÇÕES SOBRE O SETOR ENERGÉTICO ................................................................... 48

3.1 MUDANÇA DE PARADIGMAS NO SETOR ................................................................................... 48

3.2 OS RECENTES INVESTIMENTOS NO SETOR ENERGÉTICO: O EXEMPLO DO PAC ............ 53

3.3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O BNDES, AS PPPS E O MAB ..................................... 58

4 DESDOBRAMENTOS DA IMPLANTAÇÃO DE BARRAGENS: ENTRE O DESENVOLVIMENTO E

O CONFLITO ........................................................................................................................................ 68

4.1 PROCESSOS GERAIS DECORRENTES DA CONSTRUÇÃO DE BARRAGENS ........................ 69

4.2 O CHOQUE DE LÓGICAS NA PRODUÇÃO DO ESPAÇO GEOGRÁFICO: REFLETINDO SOBRE

ALGUNS CONCEITOS ......................................................................................................................... 74

CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................................. 81

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................................................... 84

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INTRODUÇÃO

A construção de barragens sempre se constituiu em ícone a respeito do

papel do Estado na sociedade. Um Estado forte é aquele que investe massivamente

em obras de infraestrutura. Logo, construir barragens é sinônimo de

desenvolvimento, de impulso à economia do país, de melhoria na qualidade de vida

da população. Nos últimos anos, a ampliação do consumo de energia elétrica com a

ampliação do parque industrial (inclusive em campos altamente consumidores como

a transformação de metais) e do consumo doméstico mantém a construção de

barragens como um referente indiscutível de investimento, com o objetivo de atender

as demandas por progresso e por bem-estar. A partir desta premissa a proliferação

do número de barragens vem sendo justificada.

Este, portanto, não é um fato novo, mas a sua análise no contexto atual se

faz pertinente, visto que as barragens se relacionam com uma série de iniciativas

voltadas para o desenvolvimento da economia, a partir da ampliação da quantidade

de infraestruturas hidrelétricas construídas, e, por sua vez, do aumento da oferta de

energia. Um dos projetos economicamente ambiciosos dos últimos anos, o

Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), lançado pelo governo federal em

2007, contempla a construção de barragens por todo o país. No que se refere à

geração de energia, o PAC possui uma pasta própria de investimentos para o setor,

denominada “PAC Energia”. A eletricidade, portanto, vem se constituindo como um

dos eixos prioritários para o crescimento econômico, o desenvolvimento nacional e o

posicionamento internacional como país chave na região latinoamericana.

Ao mesmo tempo em que se multiplicam obras deste porte, multiplicam-se

também denúncias de violações de direitos humanos na concepção das barragens,

relacionadas aos conflitos gerados desde as fases de preparação para as obras até

a fase de operação. Sobre hidrelétricas em vias de licenciamento, o caso atual mais

exemplar é a Hidrelétrica de Belo Monte, projetada para o Rio Xingu, no estado do

Pará. A proposta de maximizar o aproveitamento hidráulico da região Amazônica

tem permeado debates que apontam para duas direções principais: ora vê-se a

exaltação da sua importância para a geração de energia e, portanto, para o

incremento da economia do país; ora se relatam os impasses socioambientais e

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culturais que um projeto deste porte tem encontrado, evidenciados principalmente

pelas constantes manifestações de indígenas e/ou órgãos ambientalistas contra a

instalação da usina. Belo Monte é um caso exemplar para o entendimento da

conjuntura atual na qual está envolta a temática das barragens. No entanto, não é

único.

Embora o contexto de aproveitamento dos recursos hídricos no Sul e

Sudeste do país seja outro, já que estas regiões são as que concentram maior

número de usinas, os conflitos encontrados na construção destes empreendimentos

são bastante semelhantes. Com a finalidade de debater a complexidade dos

conflitos gerados pela construção de barragens, este estudo visa apontar os

principais desdobramentos e transformações que marcaram o delicado e longo

processo de licenciamento da Usina Hidrelétrica de Tijuco Alto (UHE Tijuco Alto),

projetada para ser construída no Rio Ribeira de Iguape, o único rio ainda não

barrado no estado de São Paulo e responsável pela conformação da singular região

do Vale do Ribeira.

A UHE Tijuco Alto é resultado de um estudo de inventário da Eletrobrás,

que previu, desde a década de 80, a construção de quatro barragens ao longo do

Rio Ribeira. Planejada para ser a primeira da sequência de quatro usinas, Tijuco Alto

se localizaria num trecho do Rio Ribeira que faz divisa entre os estados do Paraná e

São Paulo, na altura dos municípios de Adrianópolis (PR) e Ribeira (SP). O projeto

ainda não chegou a se concretizar, no entanto, ao longo de mais de duas décadas,

promoveu transformações substanciais na dinâmica das populações e dos

municípios ameaçados pela construção da barragem, os quais foram alvos de

medidas preliminares que visavam “preparar o terreno” para a instalação do canteiro

de obras.

A hipotética usina é detentora de uma série de particularidades, a começar

pelo fato de ser uma hidrelétrica planejada e empreendida por uma empresa

privada, a Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), integrante do Grupo Votorantim.

A energia produzida em Tijuco Alto, por esta razão, já teria um destino certo: a

unidade fabril da CBA sediada no município de Alumínio (SP). Outro ponto está

relacionado aos Estudos de Impacto Ambiental (EIA) apresentados pela CBA. Tais

estudos foram inúmeras vezes questionados quanto à suficiência de informações,

seja em relação à viabilidade do projeto de engenharia, seja por questões físicas e

ambientais ou em relação à abrangência dos impactos nas áreas afetadas, não

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considerados em sua totalidade. Em função desses aspectos e devido aos passivos

sociais que já incidiram na região, Tijuco Alto é um projeto que desde o seu anúncio

vem sendo marcado por forte resistência da sociedade – por parte, por exemplo, de

agricultores, comunidades quilombolas ou pesqueiras, entidades ambientalistas e

organizações sociais, que receiam que os prejuízos já percebidos localmente

possam se estender regionalmente caso a construção da usina se efetive.

Entende-se que o advento destes projetos de infraestrutura carrega em si

propostas racionalizadoras e uníssonas a respeito do conceito de desenvolvimento.

Neste caso, o desenvolvimento é visto apenas como crescimento econômico (PEET,

2007; ESTEVA, 2000; SOUZA; 1995) e o meio social é interpretado muitas vezes

como mero acessório, senão como obstáculo ou entrave para este desenvolvimento

(SEVÁ FILHO, 2008; ZHOURI, 2010). A concepção de tais infraestruturas gera uma

série de impactos sociais e ambientais, ao mesmo tempo em que os

empreendedores, na grande maioria dos casos, procuram invisibilizar as populações

afetadas, num esforço de diminuir os custos despendidos na resolução de conflitos

socioambientais, resultantes da construção destes empreendimentos (BERMANN,

2008; ACSELRAD, 2010).

Diante deste contexto, o objetivo desta pesquisa é observar quais são as

repercussões da implantação da UHE Tijuco alto, bem como os impactos sociais,

econômicos e ambientais desta hidrelétrica, entendida enquanto projeto de

desenvolvimento cujos desdobramentos sobre o território e sobre as populações

afetadas se dá dialeticamente.

No intuito de discutir a UHE Tijuco Alto, metodologicamente, buscou-se uma

aproximação do tema “barragens” a partir de revisão bibliográfica de autores

oriundos de diversas áreas do conhecimento – Engenharia, Economia, Geografia,

Ciências Sociais e outras. Também se optou por uma revisão documental,

utilizando-se de registros como notas, cartas, relatórios e resumos relacionados às

ações e à história em torno de Tijuco Alto, bem como a análise dos últimos estudos

técnicos – Estudos de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental

(EIA/RIMA) do empreendimento. Todos estes documentos foram cedidos pelo

CEDEA – Centro de Estudos, Defesa e Educação Ambiental, entidade que vem

atuando em defesa das populações afetadas e contra as Usinas no Ribeira. No

decorrer da pesquisa também foram realizadas duas visitas de campo ao município

de Cerro Azul (PR) onde se estabeleceram contatos com integrantes de duas

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entidades voltadas para a assistência aos agricultores, a CRESOL (Cooperativa de

Crédito Rural com Interação Solidária) e a ASSTRAF (Associação Sindical dos

Trabalhadores na Agricultura Familiar), tendo sido esta última uma das importantes

agentes de mobilização e resistência no município. Durante as saídas, também

foram realizadas visitas à comunidade ribeirinha do Mato Preto, uma das mais

afetadas pela UHE Tijuco Alto, onde foi possível conversar com moradores que lá

residem.

É importante ressaltar que, para os fins deste estudo, foi necessário definir

um recorte territorial e metodológico que serviu de base para a coleta e organização

das informações: o município de Cerro Azul, o qual teria a maior proporção de terras

alagadas. Portanto, não é objetivo deste estudo discutir a totalidade dos processos

referentes à Tijuco Alto nem das populações atingidas em outras áreas e municípios.

Longe de esgotar o tema e as questões relacionadas à usina, prioriza-se aqui

trabalhar com alguns pontos concernentes ao recorte estabelecido, como forma de

estabelecer conexões entre o campo e o referencial teórico e documental.

Desta maneira, priorizando-se uma relação dialética entre a realidade e a

teoria, o trabalho que é apresentado se organiza da seguinte maneira: o capítulo 1

busca localizar e descrever o projeto e seus desmembramentos, bem como

caracterizar os atores envolvidos na sua concepção, aí incluídos o empreendedor (a

CBA) e os atingidos (o município de Cerro Azul); o capítulo 2 tem a função de

apresentar uma análise crítica de alguns aspectos relevantes sobre o conteúdo dos

mais recentes Estudos de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental

(EIA/RIMA) de Tijuco Alto. Adiante, no capítulo 3, o objetivo é caracterizar o contexto

do setor energético brasileiro na atualidade, fazendo um breve apanhado histórico e

trazendo elementos importantes para a compreensão da conjuntura que caracteriza

o setor, como a atuação do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento), o

significado das PPPs (Parcerias Público-Privadas) e a resistência a todo esse

quadro por parte do MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens). Por fim, no

capítulo 4, procurou-se fazer um diálogo de autores, tanto entre os que se dedicam

ao tema das barragens quanto entre aqueles que contribuem conceitualmente para

o entendimento das lógicas destes empreendimentos.

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1 UHE TIJUCO ALTO, CBA E CERRO AZUL: O PANORAMA DO CONFLITO

Com o propósito de entender alguns dos principais desdobramentos

socioambientais e dos impactos que decorreram das tentativas de licenciamento e

precederam a instalação da Usina Hidrelétrica de Tijuco Alto, projetada para os

limites entre o município de Adrianópolis, localizado na porção paranaense do Vale

do Ribeira, e o município de Ribeira, na porção paulista, faz-se necessário, em

primeiro lugar, caracterizar alguns aspectos do projeto. Estes aspectos se

fundamentam no conhecimento tanto da localização do empreendimento quanto dos

“atores” envolvidos, autores estes entendidos tanto na figura do empreendedor desta

hidrelétrica, quanto do município de Cerro Azul (PR), um dos mais ameaçados pela

barragem, recorte desta pesquisa.

Neste sentido, propondo uma melhor organização, este capítulo foi dividido

em quatro subitens: o item 1.1 tem por objetivo caracterizar o local onde se prevê a

instalação de quatro usinas hidrelétricas (ver figura 1), que está inserido, do ponto

de vista regional, no Vale do Ribeira. Destes quatro projetos, todos previstos para o

rio Ribeira do Iguape, nos ateremos ao projeto da UHE de Tijuco Alto, que é o

barramento projetado para se instalar acima dos outros três. Previsto para ser

sitiado mais à montante do curso do rio, ainda nos limites do estado do Paraná, no

município de Adrianópolis (PR), quase divisa com Ribeira (SP), ocuparia uma faixa

do Rio Ribeira de caráter interestadual. Os outros três se localizariam abaixo deste

local, já no Estado de São Paulo.

Dando prosseguimento, o item 1.2 faz a apresentação da Companhia

Brasileira de Alumínio (CBA), enquanto empreendedora e principal interessada na

instalação desta hidrelétrica. A CBA consiste numa empresa privada, pertencente ao

Grupo Votorantim, o qual, além de outras atividades, se dedica à geração de

energia. Já no item 1.3, são retomados alguns aspectos que marcaram o decorrer

dos fatos acerca de Tijuco Alto, remontando ao histórico do processo de

licenciamento da obra, que já vem se desenrolando há mais de 20 anos.

Por fim, no subitem 1.4, será feito um breve relato sobre os impactos da

hidrelétrica sobre o município de Cerro Azul (PR), o qual seria o mais inundado com

a possível criação do reservatório e, portanto, um dos mais ameaçados pelo

empreendimento.

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1.1 A UHE DE TIJUCO ALTO NO CONTEXTO DO VALE DO RIBEIRA

Em fins da década de 80, um estudo de inventário da Eletrobrás previu a

viabilidade de se construírem quatro Usinas Hidrelétricas ao longo do Rio Ribeira de

Iguape, único rio ainda não barrado no Estado de São Paulo, no Vale do Ribeira.

Estas quatro usinas seriam: UHE Tijuco Alto, UHE Funil, UHE Itaoca e UHE Batatal.

Figura 1 – Os quatro projetos previstos para o Rio Ribeira do Iguape. Fonte: Instituto

Socioambiental (2002)

O Rio Ribeira de Iguape é o rio principal pertencente à bacia hidrográfica

homônima, com extensão total de 470 km. Tendo a sua bacia subdividida entre a

região nordeste do estado do Paraná e sudoeste do estado de São Paulo, ela

abrange vinte e três (23) municípios paulistas e sete (7) municípios paranaenses.

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Figura 2 - Bacia do Rio Ribeira de Iguape, Vale do Ribeira. Fonte: Instituto

Socioambiental, 2011

A região do Vale do Ribeira abrange trinta e um municípios, sendo nove no

estado do Paraná e vinte e dois em São Paulo. Estende-se ao longo de 28.306

quilômetros quadrados, sendo a sua maior porção no estado de São Paulo. É a

maior área brasileira de Mata Atlântica contínua e foi considerada patrimônio natural,

socioambiental e cultural da humanidade pela UNESCO, em 1999. É uma região

caracterizada pelo alto grau de preservação das matas e florestas, exibindo grande

diversidade ecológica. Nela se encontra aproximadamente 21% dos remanescentes

da Mata Atlântica existentes no país, além de comportar também cerca de 150 mil

hectares de restinga e 17 mil hectares de manguezais.

Tal diversidade de áreas preservadas não é encontrada apenas em parques,

estações ecológicas, reservas ou unidades de conservação, mas decorrem,

principalmente, do manejo de populações tradicionais, tais como quilombolas,

caiçaras e indígenas ou de pequenos agricultores de subsistência. Outra

característica marcante são as cavernas e os vestígios pré-históricos, que compõem

o patrimônio arqueológico, além de numerosos sítios tombados. Abrange a bacia do

Rio Ribeira do Iguape e o Complexo Estuário Lagunar de Iguape-Cananéia-

Paranaguá (CNEC, 2004; ISA, 2011).

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De acordo com o IPARDES (2007), na região há evidente predominância do

tipo de estabelecimento agropecuário familiar, com unidades produtivas que utilizam

exclusivamente mão-de-obra doméstica, seguida por estabelecimento empregador e

estabelecimento não-familiar, menos frequente. Na porção paranaense, a mão de

obra familiar em encontrada em 77,8% das propriedades. A agricultura familiar, em

especial, se constitui como principal atividade econômica e fonte de renda da

população do Vale do Ribeira, embora a pesca também exerça papel fundamental

para as comunidades ocupantes da faixa litorânea. Sua população é composta

basicamente por agricultores familiares que trabalham em pequenas unidades

produtivas que desenvolvem atividades agrícolas de subsistência em áreas

montanhosas da mata atlântica (DIEGUES 2007 apud BERNARDELLI;

ORZECHOWSKI, 2011)

Em alguns lugares do Vale do Ribeira, a pesca artesanal é uma das

atividades econômicas mais importantes. Com base em entrevistas realizadas por

Ramires (et. al 2002) em municípios como Peruíbe, Iguape e Cananéia, a

importância da pesca é total na renda familiar. Tendo suas atividades econômicas

condicionadas pelas características do meio físico, como pelo relevo íngreme e

dissecado, topografia acidentada e altas declividades, a região se caracteriza por

baixa mecanização agrícola, o que proporciona a formação de propriedades rurais

de pequeno e médio porte (IPARDES, 2007). Algumas culturas que mais se

destacam é a da banana. Segundo dados do IBGE (2001), a produção dos

municípios que formam o Vale do Ribeira, citado anteriormente, representou 11% da

produção nacional de banana desse ano. Dentre as regiões pesquisadas, o Vale do

Ribeira é a maior área produtora, com mais de 30 mil hectares de banana, 6% da

área plantada de banana no Brasil (MATTHIESEN; BOTEO, s/d; CNEC, 2005; ).

Apesar da riqueza natural e cultural existente e da proximidade em relação a

dois grandes centros urbanos e industriais, São Paulo e Curitiba, o Vale do Ribeira é

marcado por baixos indicadores sociais, como baixos índices de desenvolvimento

humano (IDH) e altos índices de mortalidade e analfabetismo. Um dos problemas da

região se deve a regularização fundiária, onde a maior parte da população possui

apenas a posse da terra, e não a propriedade (GIACOMINI, 2010).

O relevo acidentado predominante da região é uma das características que

dificultam a integração econômica efetiva. No entanto, não se pode cair no risco de

se ater a um determinismo natural como consequência dos problemas que ali se

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encontram. Para além das questões naturais, soma-se, principalmente, a

desatenção do poder público para a região, que, não promove investimentos que

visem valorizar as potencialidades naturais e sociais, isolando-a economicamente.

Uma destas evidências está na precariedade de acessos à região. A PR 092 é via

que liga os municípios de Rio Branco do Sul (PR) e Cerro Azul (PR) e só foi

asfaltada no ano de 2005.

1.1.1 O município de Cerro Azul (PR): um pedaço do Vale do Ribeira

ameaçado pela UHE Tijuco Alto

O município de Cerro Azul localiza-se a 87 km da capital paranaense e

também pertence à Região Metropolitana de Curitiba. Sua origem remonta ao ano

de 1860, logo após a emancipação da província do Paraná. Cerro Azul é sede de

comarca e de microrregião, sua área é de 1.341 km². Possui dois distritos (Cerro

Azul e São Sebastião). A distribuição populacional pode ser vista na tabela abaixo,

que representa distribuição populacional do município, onde 28,11% da população é

urbana e 71,89% é rural (IBGE, 2010).

Figura 3 - Localização de Cerro Azul: recorte no Paraná e na Região Metropolitana de

Curitiba. Fonte: Polícia Civil do Paraná (2011 - com edição da autora)

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População residente 16.938

População urbana 4.808

População rural 12.130

Tabela 1 – População de Cerro Azul (2010). Fonte: IBGE – Cidades@, 2010

A partir de informações recolhidas junto à CRESOL (Sistemas de

Cooperativa de Crédito Rural com Interação Solidária) e à ASSTRAF (Associação

Sindical dos Trabalhadores na Agricultura Familiar), ambas sitiadas em Cerro Azul,

os 7 municípios que compõem a porção paranaense do Vale do Ribeira somam, no

total, aproximadamente 7.500 agricultores familiares. Cerro Azul se destaca neste

meio, pois atinge a marca de 3.500 agricultores somente no seu limite, sendo, por

isso, o município com maior número de agricultores familiares do Vale paranaense.

Estas duas instituições são, juntas, representativas para este cenário de

agricultores familiares da região. O CRESOL busca diferenciar agricultura familiar,

agricultura rural e agricultura patronal enquanto três categorias diferentes, já que

considera que para o Estado, elas são tratadas como “uma coisa só”. Neste sentido,

o CRESOL atua junto aos agricultores familiares como um banco cooperativista, cujo

patrimônio é coletivo, composto pelo patrimônio dos próprios agricultores

associados. Funciona facilitando o acesso ao crédito por parte dos agricultores e

organizando a questão da regularização fundiária na região, que possui mais

meeiros, arrendatários e posseiros do que proprietários rurais. A ASSTRAF surgiu

em 2004 buscando ampliar o contato com os agricultores, reconhecendo-os como

agricultores funcionais ou economicamente ativos, ao contrário de outros sindicatos,

que vinham tratando estes trabalhadores como “falidos”, resultando em poucas

iniciativas visando participação e incremento da atividade. As duas organizações

foram e vem sendo responsáveis por fazer oposição à UHE de Tijuco Alto na região,

resistindo, mobilizando e informando a população sobre as consequências

previsíveis para a agricultura familiar, caso a usina viesse a se concretizar.

Os usos das terras predominantes em Cerro Azul são a fruticultura e a

pecuária mista com gado de corte e de leite. A cultura de cítricos é bastante

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expressiva, em especial de laranja e tangerina ponkan, sendo uma das cidades com

maior produção nacional desta. De acordo com o IBGE, em 2010, em relação a

lavoura permanente, destaca-se a produção de tangerina, alcançando a marca de

161.107 toneladas no ano e a de laranja, atingindo 13.175 toneladas. A pecuária

mista de corte e leite também consiste em importante atividade, possuindo maior

rebanho de galináceos, seguido de bovinos e suínos. Entre as lavouras temporárias

destaca-se o milho e a mandioca, havendo ainda a produção expressiva de arroz,

batata-doce, feijão, melancia e tomate. Foram verificadas, ainda, áreas com

reflorestamento de pinheiro (Pinus sp) (IBGE,2010).

Segundo o CRESOL, o PIB do município está parcelado em 5% para a

indústria, 40% para os serviços e 55% para a agricultura, sendo esta atividade

essencial para a economia do município. Os dados reforçam aquilo que a ASSTRAF

e o CRESOL percebem enquanto potencialidade econômica, que é a grande

vocação na produção agrícola familiar, afirmando que “tudo que se planta em Cerro

Azul, dá”.

No seu território está localizado o Parque Estadual de Campinhos, criado em

1960 através de Decreto Estadual. Unidade de Proteção Integral que possui área de

337 ha e estende-se também pelo município de Tunas do Paraná. Apresenta bioma

de Floresta de Araucária e rico patrimônio espeleológico. Cerro Azul cumpre posição

de sub-centro regional por apresentar mais variedade de serviços e comércio em

relação aos municípios mais próximos Algumas atividades identificadas na área

periurbana da cidade são: laminadoras de madeira, chácaras, estabelecimentos

comerciais e edificações residenciais esparsas. No centro da cidade, apresenta uma

praça e edifícios históricos (CNEC, 2004).

1.2 O EMPREENDEDOR: A COMPANHIA BRASILEIRA DE ALUMÍNIO

A Companhia Brasileira de Alumínio (CBA), responsável por empreender o

projeto Tijuco Alto é integrante do grupo Votorantim, diversificado conglomerado

industrial e financeiro nacional.

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Empresa 100% brasileira, com atuação em mais de 20 países, o Grupo

Votorantim concentra operações em setores de base da economia que

demandam capital intensivo e alta escala de produção, como cimento,

mineração e metalurgia (alumínio, zinco e níquel), siderurgia, celulose e

papel, suco concentrado de laranja e autogeração de energia. No mercado

financeiro, atua por intermédio da Votorantim Finanças, e, em Novos

Negócios, investe em empresas e projetos de biotecnologia, pesquisas

minerais e especialidades químicas (CBA, 2011).

A CBA foi fundada em 1941 e apresenta ao longo de mais de 50 anos de

existência, um crescimento médio anual de 10% na sua produção. De acordo com

dados da Associação Brasileira de Alumínio (ABAL) de 2004, a unidade da CBA

localizada no município de Alumínio (SP) é a terceira maior produtora de alumínio no

país, ficando atrás apenas da ALBRAS, em Barcarena (PA) e da ALUMAR, em São

Luis do Maranhão (MA); no entanto é a segunda maior exportadora brasileira do

metal, exportando 118.789 toneladas/ ano, perdendo somente para a ALBRAS

(JERONYMO, 2007). Esta unidade é também a maior indústria integrada de

alumínio do mundo, responsável pelo processamento da bauxita e fabricação de

produtos derivados, voltados tanto para o mercado interno nos segmentos de

construção civil, transmissão de energia, bens de consumo, transportes e outros,

quanto para o mercado externo, tendo 40% de sua produção exportada, em especial

para a América do Norte (CBA, 2011).

Dados recentes da Associação Brasileira de Alumínio demonstram que só

até setembro do corrente ano, a CBA produziu aproximadamente 297,9 toneladas de

alumínio primário, reforçando a sua condição de grande produtora do metal no

Brasil, conforme podemos ver na tabela 2.

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Tabela 2 – Produção Brasileira de Alumínio. Fonte: ABAL, 2011 – com edição da autora

Dentre os diferenciais considerados pela própria empresa, está a sua

qualidade de autogeração de energia elétrica, sendo produtora de aproximadamente

60% da energia que consome na fabricação de alumínio. A condição de

autoprodução energética da CBA está assegurada pelo Decreto nº 2003 de 10 de

setembro de 1996, que “Regulamenta a Produção de Energia Elétrica por Produtor

Independente e por Autoprodutor e dá outras providências”, do qual se dispõe:

Art. 2º Para fins do disposto neste Decreto considera-se: I - Produtor Independente de Energia Elétrica, a pessoa jurídica ou empresas reunidas em consórcio que recebam concessão ou autorização para produzir energia elétrica destinada ao comércio de toda ou parte da energia produzida, por sua conta e risco; II - Autoprodutor de Energia Elétrica, a pessoa física ou jurídica ou empresas reunidas em consórcio que recebam concessão ou autorização para produzir energia elétrica destinada ao seu uso exclusivo. (BRASIL, 1996)

A partir dos dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL, 2011),

a CBA possui no total 18 empreendimentos (tabela 3) de geração energética em

operação sob sua tutela, que, no total, representam uma capacidade de geração de

1, 7469% do total do país.

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Tabela 3 – Estados onde há presença de usinas hidrelétricas da CBA. Fonte: Banco de Informações de Geração – ANEEL, 2011

A classificação dos agentes de geração de energia pelos empreendimentos

de propriedade da CBA se dá nas categorias “PIE” (Produção Independente de

Energia), “APE” (Autoprodução de Energia) ou “APE-COM” (Autoprodução com

Comercialização de Excedente), o que indica que quando a energia não é produzida

para o consumo exclusivo da CBA, ela é ou comercializada pela própria CBA para

outras companhias do ramo energético ou para indústrias eletrointensivas. Conforme

pode ser visto na tabela a seguir:

Usina Potência

(kW)

Destino

da

Energia

Tipo de

Geração

Proprietário Município

Alecrim 72.000 APE-

COM

UHE 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Miracatu - SP

Barra 40.400 APE-

COM

UHE 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Tapiraí - SP

Canoas I 80.085 APE

e PIE

UHE 50,3% para Companhia Brasileira de

Alumínio

e 49,7% para Duke Energy

International, Geração

Paranapanema S/A.

Cândido Mota - SP

e Itambaracá - PR

Canoas II 72.000 APE

e PIE

UHE 50,3% para Companhia Brasileira de

Alumínio

e 49,7% para Duke Energy

International, Geração

Paranapanema S/A.

Andirá - PR

e Palmital - SP

França 29.520 APE- UHE 100% para Companhia Brasileira de Juquitiba - SP

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COM Alumínio

Fumaça 36.400 APE-

COM

UHE 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Ibiúna - SP

Itupararanga 56.170 APE-

COM

UHE 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Votorantim - SP

Jurupará 7.200 APE UHE 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Ibiúna - SP

e Piedade - SP

Machadinho 1.140.000 APE-

COM

e SP

UHE 25,74% para Alcoa Alumínio S/A

e 27,52% para Companhia Brasileira

de Alumínio

e 5,53% para Companhia Estadual

de Geração e Transmissão de

Energia Elétrica

e 2,73% para Departamento

Municipal de Eletricidade de Poços

de Caldas

e 5,27% para InterCement Brasil S.A

e 19,28% para Tractebel Energia S/A

e 8,29% para Valesul Alumínio S/A

e 5,62% para Votorantim Cimentos

Brasil Ltda.

Maximiliano de

Almeida - RS

e Piratuba - SC

Ourinhos 44.400 PIE UHE 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Jacarezinho - PR

e Ourinhos - SP

Pirajú 81.000 APE-

COM

UHE 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Piraju - SP

Porto Raso 28.400 APE-

COM

UHE 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Tapiraí - SP

Salto do

Iporanga

36.870 APE UHE 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Juquiá - SP

Salto do Rio

Verdinho

93.000 PIE UHE 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Caçu - GO

e Itarumã - GO

Salto Pilão 182.340 PIE UHE 60% para Companhia Brasileira de

Alumínio

e 20% para Companhia Geração de

Energia Pilão

e 20% para DME Energética S.A

Apiúna - SC

e Ibirama - SC

e Lontras - SC

Santa

Helena

2.240 APE PCH 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Votorantim - SP

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Serraria 24.000 APE-

COM

UHE 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Juquiá - SP

Votorantim 3.000 APE PCH 100% para Companhia Brasileira de

Alumínio

Votorantim - SP

Total: 18 Usina(s) Potência Total: 2.029.025 kW

Tabela 4 – Usinas da CBA em operação. Fonte: Banco de Informações de Geração – ANEEL, 2011 (com edição da autora)

Na tabela acima, destacamos em vermelho as usinas hidrelétricas sob

propriedade exclusiva da CBA, voltada majoritariamente para a autoprodução de

energia e também comercialização de excedente. Ou seja: a CBA é 100% detentora

dos direitos de uso de catorze (14) usinas hidrelétricas, das quais ela consome

energia para uso próprio. Neste conjunto, de um total de dezoito (18) hidrelétricas

sob sua tutela, a empresa também possui direito de uso parcial de outras quatro (4).

Observa-se que sob a ótica da instalação destes grandes projetos, como a

UHE Tijuco Alto, está a intenção de uma empresa privada, como a CBA, em produzir

energia para abastecer seu complexo industrial no município de Alumínio (SP),

intencionalidade abertamente apontada na seção “Justificativas do empreendimento”

nos Estudos de Impacto Ambiental, buscando ampliar ainda mais a autogeração de

energia e, por consequência, a produção do alumínio e derivados. Neste sentido a

instalação de mais uma usina, desta vez sobre o Rio Ribeira de Iguape, cumpriria

apenas a demanda de energia para consumo próprio e exclusivo, objetivando a

alcançar altos níveis de suficiência energética na produção, deixando para as

populações atingidas apenas os passivos sociais e ambientais de um

empreendimento deste porte.

A respeito do que se propõe com a implantação da usina fica evidente que a

escolha da localização espacial de Tijuco Alto represente para a CBA certa garantia

monopolista, na medida em que acrescenta mais um empreendimento ao seu já

substancial conjunto de geradoras particulares. Como aponta Harvey (2005), esta

prática só pode ter como produto final a formação de monopólios ou oligopólios –

neste caso, de energia – sendo essenciais para as empresas do ramo terem estas

estruturas sob seu controle, já que dependem estrategicamente delas para a

continuidade dos seus processos produtivos, inseridos numa lógica capitalista.

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1.3 O PROJETO: UMA HISTÓRIA MARCADA POR RESISTÊNCIAS

O projeto de instalação da UHE Tijuco Alto gerou, desde o início, muitas

polêmicas em torno dos seus objetivos e das suas consequências. A história de

Tijuco Alto já tem desdobramentos há cerca de 24 anos e, no vai-e-vem das várias

tentativas de instalação, ainda não conseguiu ser concretizada, embora já tenha

produzido uma série de transformações sociais e territoriais ao longo destes anos.

A pretensão de instalação de Tijuco Alto se esboçou, em primeiro lugar, a

partir da formalização de um Protocolo de Intenções, assinado em 1987 o então

Governador do Estado do Paraná, Álvaro Dias e o Grupo Votorantim (que engloba a

CBA), representado por Antonio Ermírio de Morais, o empreendedor e principal

interessado no projeto. Desde o momento do anúncio, foram geradas mobilizações e

questionamentos a respeito do empreendimento, em especial nos municípios de

Cerro Azul, Adrianópolis e Doutor Ulysses (à época, “Distrito do Varzeão”), o que

estimulou a criação, em 1988, da Comissão de Mobilização do Vale do Ribeira, junto

ao Sindicato Rural de Cerro Azul. Esta entidade foi responsável por pressionar o

poder público em nível local, regional e nacional para que se posicionasse em

relação à barragem; pela divulgação das principais inquietações e dúvidas advindas

do projeto; pela conscientização da população e tomada de conhecimento do

mesmo, dando os primeiros passos na divulgação da luta popular que se instaurava

em torno de Tijuco Alto (COSTA, 2006).

Aos poucos, entidades ambientalistas, sindicais e sociedade civil foram se

posicionando em relação a Tijuco Alto, utilizando-se de variadas estratégias de

mobilização: denúncia aos meios de comunicação, elaboração de dossiês com

informações contra a barragem, realização de audiências com representantes do

Estado, assembléias populares, moções de repúdio, protestos, cartas abertas e

abaixo-assinados. A Comissão contava com o apoio massivo da população.

Porém, foi a partir do Decreto Federal nº 96.746, de 21 de setembro de

1988, assinado pelo então presidente José Sarney, que a Companhia Brasileira de

Alumínio garantiu o direito de outorga da área, iniciando as primeiras tentativas de

licenciamento, ao mesmo tempo em que respondia às mobilizações populares.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, usando da atribuição que lhe confere o artigo 81, item III, da Constituição, nos termos dos artigos 140, letra a, e 150 do Decreto n° 24.643, de 10 de julho de 1934, e tendo em vista o que consta do Processo MME n° 700.909/83-2,

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DECRETA: Art. 1º. É outorgada à Companhia Brasileira de Alumínio CBA concessão para o aproveitamento da energia hidráulica de um trecho do Rio Ribeira do Iguape, no local denominado Tijuco Alto, de coordenadas latitude 24°38'57" e longitude 49°02'16", com potência a ser instalada entre 120.000 a 150.000 Kw, nos Municípios de Cerro Azul e Adrianópolis, Estado do Paraná, e Ribeira, Estado de São Paulo, não conferindo o presente título delegação de Poder Público à concessionária. Art. 2º. O aproveitamento destina-se à produção de energia elétrica para uso exclusivo da concessionária, que não poderá fazer cessão a terceiros, mesmo a título gratuito. (...) Art. 6º. A concessão a que se refere o artigo 1° vigorará pelo prazo de 30 (trinta) anos, contados da data da publicação deste Decreto. (BRASIL, 1988)

Posteriormente ao decreto outorgado à CBA, as movimentações contrárias à

barragem não cessaram. Costa (2006) ressalta uma mudança de postura da

Comissão de Mobilização do Vale do Ribeira Paranaense, que “partiu da

sensibilização para a organização da sociedade civil rural”. Neste sentido, passou a

articular e organizar as comunidades ribeirinhas, o que resultou ainda no ano de

1988, na criação de vinte Associações de Moradores ao longo do Rio Ribeira em

Cerro Azul e Doutor Ulysses, que simbolizavam a forte resistência popular ao projeto

de Tijuco Alto e reivindicavam melhorias nas comunidades.

No entanto, após dois anos e meio, a outorga à CBA foi suspendida pelo

Decreto Federal de 15 de fevereiro de 1991 (s/n), assinada pelo então presidente

Fernando Collor. No seu artigo 2º dispunha que “O Ministro de Estado da Infra-

Estrutura declarará, mediante portaria, as concessões, permissões e autorizações

ou demais títulos de que trata o artigo anterior.” Desta forma, a tarefa de concessão

de novas outorgas para exploração de serviços de energia elétrica foi transferida

para o Ministério de Infraestrutura. No mês de novembro deste mesmo ano foi

assinada por João Santana – interino no cargo de ministro da infraestrutura - a

portaria nº 306, dando validade novamente todas as concessões que haviam sido

revogadas no último decreto. Neste momento a CBA retomou a concessão de

exploração de serviços de energia elétrica, por meio de Tijuco Alto.

Os anos de 1990, 1991 e 1992, foram marcados por intensa resistência dos

moradores à venda das terras para CBA. Enquanto isso, a empresa lançou mão de

algumas estratégias que visaram “mascarar” a falta de participação popular nos

processos de tomada de decisão, com o intuito de mostrar que, do contrário, a

empresa estava trazendo a população para o debate. O caso mais curioso foi no ano

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de 1993, quando a CBA realizou uma audiência pública no município Cerro Azul:

fretou em torno de 22 ônibus, cuja maioria dos passageiros era proveniente do

estado de São Paulo, e, portanto, a parcela menos atingida e menos interessada

pela barragem de Tijuco Alto. Desta forma, forjou a participação popular de forma

“fraudulenta e repudiável”, na medida em que se eximiu da responsabilidade de

aproximar dos debates públicos aqueles que eram os verdadeiros afetados pelo

empreendimento (COSTA, 2006).

Como afirma Bermann (2007), ao parafrasear Leroy (2002, p. 9) quando se

refere aos grupos ameaçados por barragens, “para o governo, os bancos

multilaterais, as empresas construtoras e os consultores que elaboram Estudos de

Impacto Ambiental, eles não existem”, ficando constantemente alijados e

desconsiderados de todo processo.

Com o passar de alguns anos, já em 1999, em decorrência da instauração

de uma ação civil pública, foi questionada a viabilidade da usina e apontadas falhas

nos seus estudos técnicos, paralisando mais uma vez o processo de licenciamento.

Nesta época, o fato mais marcante foi a transferência do licenciamento para o

IBAMA. Nas palavras de Jeronymo (2007):

Posteriormente o licenciamento foi anulado por meio de ação civil pública amparada por uma mobilização envolvendo parlamentares, entidades ambientalistas, lideranças de comunidades do Vale do Ribeira e advogados. No despacho judicial de 10/12/1999 o Ministério Público julga que o licenciamento não poderia ser estadual, definindo a competência para o licenciamento para o âmbito federal, para o IBAMA – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis. (JERONYMO, 2007, p. 45)

Isto se deveu ao caráter interestadual do empreendimento, que seria

instalado num trecho do Rio Ribeira que faz divisa com dois municípios, sendo um

em cada estado – Adrianópolis (PR) e Ribeira (SP). Desta maneira o próprio IBAMA

foi o encarregado de realizar um novo pedido de licenciamento no ano de 1997.

Novamente sem sucesso, a emissão da licença prévia foi indeferida em

2003, devido principalmente a dois fatores: um deles era a alta concentração de

chumbo nas águas do Rio Ribeira que inviabilizavam o uso da mesma; o outro se

devia a um desvio de 10 km previsto para o curso do rio. O projeto inicial, portanto,

foi completamente rejeitado. No ano de 2004, o IBAMA emitiu um Termo de

Referência,

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o qual tem por finalidade fornecer subsídios técnicos capazes de nortear o desenvolvimento de estudos que diagnostiquem a qualidade ambiental atual da área de implantação do empreendimento e sua área de inserção, na bacia hidrográfica do rio Ribeira do Iguape (TERMO, p. 2, 2004).

Este documento autorizou o recomeço dos estudos para a elaboração do

Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) da

UHE Tijuco Alto, e a partir disso, a CBA contratou o Consórcio Nacional de

Engenheiros Consultores – CNEC. Esta empresa de consultoria foi responsável pela

realização dos novos estudos técnicos do empreendimento, e já em 2005 havia sido

realizado novo Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental

(RIMA). Em julho de 2007 foram realizadas audiências públicas em três municípios

de SP (Registro, Eldorado e Ribeira) e dois municípios do Paraná (Adrianópolis e

Cerro Azul), momento nos quais foram constatadas, por meio de relatório das

audiências elaborado pelo CEDEA (2007), inúmeras manifestações contrárias à

obra. Também foi protocolado Ao Ministério de Minas e Energia e ao Ministério do

Meio Ambiente, documento manifestando repúdio à Tijuco Alto por parte da

população presente nas audiências. Ainda em 2007, o Ministério Público Federal

recomendou que o EIA fosse refeito, exigindo que ele fosse realizado do ponto de

vista de uma análise integrada de toda a bacia do rio Ribeira do Iguape.

Em fevereiro de 2008, quando o IBAMA emitiu o parecer técnico no 07/2008

– COHID/CGENE/DILIC/IBAMA, avaliando os estudos ambientais de Tijuco Alto e

concluiu pela “viabilidade ambiental” do empreendimento, abriu-se novo precedente

para a implantação da usina (COSTA, 2006; CARTA, 2008). Tal decisão gerou

repentinamente uma reação: em março de 2008, através do documento intitulado

“Carta aberta ao povo brasileiro”, 13 organizações, dentre elas sindicatos, entidades

ambientalistas e coletivos de comunidades tradicionais manifestaram seu repúdio à

instalação de Tijuco Alto, deixando claros os seus anseios.

Queremos que seja negada a licença ambiental para a UHE Tijuco Alto. Queremos que seja revisto o estudo que prevê a construção das quatro barragens no rio Ribeira de Iguape. Queremos que ele continue correndo livre e alimentando o povo da região. Como já dissemos anteriormente ao Governo Federal, não precisamos de grandes obras, mas de oportunidades para todos. Queremos outro tipo de desenvolvimento: um desenvolvimento que realmente dê oportunidades de melhoria e qualidade de vida para toda população. Tijuco Alto representa a MORTE e nós queremos VIDA (CARTA ABERTA AO POVO BRASILEIRO, 2008, p.2).

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Este trecho nos remete ao trabalho de Zhouri e Oliveira (2010) a respeito

das barragens no Vale do Jequitinhonha, em MG. Ao trabalhar com a desconstrução

do discurso dos atingidos e dos empreendedores da UHE Murta, através de falas em

audiências públicas, as autoras abordam a perspectiva de resistência ao avanço do

capital no espaço, expressada constantemente na fala dos atingidos pela barragem.

Assim, da perspectiva que orienta esta reflexão, o global não impediria o sentimento de enraizamento, o desejo de permanecer no lugar, com a salvaguarda da memória, da identidade e da vontade de se fixar, de criar raízes. Esses sentimentos não seriam paroquiais e reacionários por excelência. Eles também apontam para a resistência ao avanço do espaço – quer dizer, do capital – nos lugares – lócus de vivência e da história (...) (ZHOURI; OLIVEIRA, 2010, p. 444)

Outra ponte possível a partir deste trabalho é a exaltação, por parte das

populações atingidas, de um território da “vida”, em oposição a um território da

“morte”, notável em alguns discursos da UHE de Murta, mas que poderiam ser

facilmente transpostos para o caso de Tijuco Alto.

Além destes elementos, há o recurso metafórico empregado na identificação da terra com a figura materna, fonte de vida, em contraste à construção da barragem metaforizada como “morte”. Nota-se ainda a ideia de que, embora a localidade esteja sendo pleiteada pela empresa, as terras pertencem legitimamente aos trabalhadores; nas palavras do morador, trata-se do “nosso lugar”. Ora, o ideal do projeto como promotor de desenvolvimento para a região e como benéfico aos moradores é recusado, na medida em que o locutor afirma (...) que o interesse dos moradores é outro, qual seja, permanecer nas terras em que trabalham. (ZHOURI; OLIVEIRA, 2010, p.453)

No decorrer destes mais de vinte anos desde as primeiras ações em prol da

construção da UHE de Tijuco Alto - sem, no entanto, a obtenção definitiva do

licenciamento ambiental necessário - muitos processos foram se desenrolando na

região do Vale do Ribeira, relacionados diretamente à expectativa de instalação

deste empreendimento. Ainda que não tenha havido a sua implantação definitiva,

uma série de alterações foi inevitavelmente se dando nas áreas do entorno, como

forma de preparar a área para a criação do reservatório e instalação da barragem.

Uma das principais transformações decorreu da aquisição e da compra de terras de

proprietários nestas regiões e o consequente deslocamento de inúmeras famílias, de

moradores, trabalhadores, fomentando em muitos casos a perda dos meios de

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trabalho e das práticas de subsistência. De acordo com informações do sítio Instituto

Socioambiental (ISA),

O RIMA [de Tijuco Alto] afirma que 689 famílias terão suas vidas afetadas pela criação da barragem. É importante lembrar que nos últimos 15 anos outras centenas de famílias de ribeirinhos e pequenos agricultores já foram prejudicados no processo de compra de terras pela CBA na região em que a empresa planeja fazer o reservatório de Tijuco Alto. Naquele período, a empresa adquiriu 379 imóveis rurais - que hoje representam 60% da área do reservatório projetado. A compra dos imóveis provocou a queda na renda e o aumento do desemprego de ex-proprietários e ex-moradores, alterou o perfil sócio-econômico de toda a região do Alto Vale do Ribeira e prejudicou a vida dos atuais habitantes. Aproximadamente 228 famílias de meeiros, arrendatários, parceiros ou posseiros foram largadas à própria sorte, ao serem expulsas das terras onde viviam sem nenhum tipo de recompensa (ISA, 2011).

É importante ressaltar a noção de “recompensa” da qual lançamos mão,

bem como evidenciar a forma pela qual se entende a definição de “deslocamento

compulsório”. Fundamentando-se nas atribuições de Sevá Filho (2008) e Heloísa

Costa (2008) sobre ser extremamente delicado atribuir um valor de mercado à

natureza, também entendemos que é delicado atribuir um valor que seja realmente

capaz de recompensar a perda de uma propriedade, na qual não apenas se “habita”,

mas onde se vive, onde se planta, onde se estabelecem relações com a vizinhança

que se perdem a um “preço de mercado”. Aqueles que Sevá Filho (2008) se refere

como sendo atingidos pela “remoção hidráulica”, na definição de Jeronymo (2007),

são os deslocados compulsórios, afetados por estas lógicas.

Será deslocado compulsório aquele que for forçado a sair, ter que negociar a propriedade forçosamente. Fazer a negociação a contragosto. É deslocado compulsório quem é constrangido a fazer algo que não é do próprio interesse. No caso de apropriações de propriedades para a construção de infra-estrutura hidrelétrica, o fato comum, é a pressão que sofrem os proprietários de terras para efetivar a negociação da propriedade. Desta forma, um deslocamento tendo por base e essência a pressão, passará a ser um deslocamento compulsório. (p. 69 e 70)

As potenciais transformações não se dão apenas no meio socioeconômico,

mas também no meio socioambiental. Como prevê o último EIA, elaborado em 2005,

a instalação definitiva da UHE Tijuco Alto também ocasionaria sérias interferências

na fauna, vegetação, microclima, água, solos, relevo e uma série de outras

implicações. Pela série de impactos negativos, o projeto sempre teve ao longo dos

anos forte resistência da sociedade do Vale do Ribeira (ISA, 2011).

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1.3 OS AMEAÇADOS: OS IMPACTOS SOBRE O MUNICÍPIO DE CERRO AZUL

(PR)

Para se compreender a complexidade e os embates sociais e jurídicos que

tem impedido a emissão da licença prévia para o empreendimento, é de importância

o entendimento do contexto de interferência no qual se insere o projeto da UHE

Tijuco Alto. O projeto prevê que o reservatório da referida usina atinja os municípios

de Cerro Azul (PR), Adrianópolis (PR), Doutor Ulysses (PR), Itapirapuã Paulista (PR)

e Ribeira (SP). No entanto, para fins deste estudo, dar-se-á atenção exclusiva às no

meio físico e socioeconômico, bem como às resistências existentes apenas no

município de Cerro Azul, pertencente à porção do Vale do Ribeira paranaense, um

dos mais afetados pelo projeto.

Um primeiro aspecto de influência para Cerro Azul é a localização da usina e

o tamanho do reservatório: uma barragem de concreto de potência instalada de 144

MW seria construída a 10 km das cidades de Ribeira (SP) e Adrianópolis (PR), com

altura aproximada de 142 m e que, por conseqüência do barramento do rio, formaria

um reservatório à montante, com 71,5 km de extensão, inundando uma área

equivalente a 43,8 km. Isto significaria uma imensa área atingida e com profundas

alterações sócio-ambientais. Mesmo que a barragem não se instale em Cerro Azul

(PR), este seria um dos municípios mais afetados pelo reservatório

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Figura 4 – Local da barragem e extensão do reservatório, com ênfase na localização de Tijuco Alto e nas áreas inundadas em Cerro Azul (PR). Fonte: CNEC, 2005, com edição da autora.

A figura acima mostra o local da barragem e a abrangência do reservatório à

montante, com ênfase na área do município de Cerro Azul que será inundado,

gerando impactos sobre o meio sócio-econômico, e por sua vez, para as populações

urbanas e rurais residentes às margens do Rio Ribeira do Iguape. Cerca de 600 a

1000 famílias de agricultores familiares estão sujeitas a realocação ou indenização

pelo alagamento de suas terras. Grande parcela destas pessoas inclusive já deixou

suas terras ao longo destes anos, passando a exercer outras atividades em outros

municípios do Paraná.

Somente a notícia da construção da usina já provocou, na década de 90,

êxodo rural e enfraquecimento da economia ribeirinha (Rio Ribeira). Muitos

trabalhadores que eram meeiros ou pequenos produtores são hoje “bóias-frias” em

Cerro Azul, ou “operários” da CBA em Rio Branco do Sul, Itaperuçu ou Almirante

Tamandaré (CEDEA, 2004, p.1).

Outro aspecto interessante é o fato da concessão do direito de exploração

dos recursos hídricos ter sido dada a uma empresa privada, a Companhia Brasileira

de Alumínio (CBA), de forma que “o aproveitamento destina-se à produção de

energia elétrica de uso exclusivo da concessionária, que não pode fazer cessão a

terceiros, mesmo a título gratuito” (CNEC, 2005, p.1). O propósito de geração desta

energia, como já apresentado, seria o abastecimento de uma fábrica de fundição de

alumínio da CBA, localizada no município de Alumínio (SP), a 250 km do

empreendimento, na região se Sorocaba, tendo como único fim ampliar a produção

da empresa.

Acrescentado ao fato de ser “autoprodutora” – produz para consumo próprio-

a CBA se isenta do pagamento de royalties pela produção de energia em Tijuco Alto

para os municípios atingidos que se localizem na mesma unidade federativa da

usina. Visto que a sua unidade produtora de energia estaria localizada no PR,

somente os municípios afetados neste Estado receberiam os royalties. No entanto,

esta questão é um tanto quanto confusa, em se tratando de um empreendimento

efetivamente localizado num trecho do Rio que é interestadual. Conforme a Lei

7.990/1989:

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É isenta do pagamento de compensação financeira a energia elétrica: I - produzida pelas instalações geradoras com capacidade nominal igual ou inferior a 10.000 kW (dez mil quilowatts); II - gerada e consumida para uso privativo de produtor (autoprodutor), no montante correspondente ao seu consumo próprio no processo de transformação industrial; quando suas instalações industriais estiverem em outro Estado da Federação, a compensação será devida ao Estado em que se localizarem as instalações de geração hidrelétrica; III - gerada e consumida para uso privativo de produtor, quando a instalação consumidora se localizar no Município afetado. (BRASIL, Lei 7.990/1989, art. 4º, de 28 de dezembro de 1989)

Esta condição de produção exime o empreendedor de qualquer obrigação

em indenizar e repassar financiamento para as prefeituras dos municípios afetados

em decorrência da instalação do empreendimento, o que reduz as possibilidades de

geração de renda direta para a região devido à presença de UHE Tijuco Alto.

A previsão de inundação permanente de aproximadamente 11mil hectares

no médio e alto curso do rio de diversas áreas, inclusive terras agricultáveis, para

criação do reservatório da usina; o deslocamento de uma série de agricultores

familiares e moradores das áreas rurais e urbanas de Cerro Azul; a destruição de

áreas ambientalmente protegidas; ou a condição de “autoprodutor” de energia

elétrica, garantida pela CBA e sua não obrigatoriedade de repasse de royalties para

o município foram e são alguns dos motivos discutidos entre a população de Cerro

Azul, marcando o seu posicionamento contrário à construção de Tijuco Alto.

Primeiras indagações levantadas pela população de Cerro Azul contra a

UHE Tijuco Alto (1988)

a) Alagamento de uma área povoada por cerca de 1000 (mil) famílias,

aproximadamente 10.000 (dez mil) pessoas, quando o total populacional do Município era

de 22.000 pessoas;

b) Alagamento das terras mais férteis do Município: Vale do Rio Ribeira;

c) Tensão social gerada pela instabilidade sócio-econômica que o projeto

provoca ao povo local;

d) Aumento do desequilíbrio ecológico, gerado, principalmente, pela inundação

e corte de árvores. Destaca-se, aqui, que a área de influência da barragem atingirá,

inclusive, o Parque das Lauráceas, área de preservação entre os Municípios de

Bocaiúva do Sul, Adrianópolis e Cerro Azul;

e) Isolamento total da região norte do Município de Cerro Azul, pois o Rio

Ribeira corre de Oeste a Leste, dividindo-o em duas partes: Norte e Sul;

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Tabela 5 – Algumas questões apontadas pela população de Cerro Azul durante reuniões comunitárias na sede do Sindicato Rural de Cerro Azul e na Escola Municipal Rural da Região do Mato Preto. Fonte: Tabela elaborada com base em COSTA, 2006

A tabela 5 apresenta alguns dos principais questionamentos levantados à

época em que o empreendimento foi anunciado à população. Embora, de lá para cá

o projeto inicial tenha sido rejeitado, alguns impactos e conseqüências

permaneceram vigentes. Todos os aspectos mencionados dizem respeito às

numerosas perdas que o município de Cerro Azul teria com a implantação da obra.

Devido aos limites deste trabalho, pretende-se aqui dar enfoque, no capítulo que

segue, a apenas algumas destas questões apontadas desde o início como

ameaçadoras aos bens naturais e à população de Cerro Azul, analisadas a partir do

último EIA/RIMA do empreendimento, apresentados em 2005 pela CBA e pela

consultora CNEC.

f) O fato de que esta obra não trará qualquer benefício ao Município, nem ao

Estado do Paraná;

g) Favorecimento particular apenas a um grande grupo econômico: Votorantim

(Companhia Brasileira de Alumínio);

h) Submersão de grande quantidade de minérios, com boas perspectivas de

exploração (por 20 anos);

i) Autoritarismo, falta de informações e desrespeito à autonomia da população

local diretamente atingida.

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2 ANALISANDO O ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL E O RELATÓRIO DE

IMPACTO AMBIENTAL DA UHE TIJUCO ALTO: ENTRE “O DITO E O FEITO”

Tendo como base a apresentação do contexto geográfico em que se insere

Tijuco Alto, realizada no capítulo anterior, onde se buscou partir do apontamento dos

principais fatos que marcaram a concepção deste projeto desde a origem, neste

momento dedicamo-nos a apresentar uma análise de alguns aspectos que

consideramos relevantes sobre o conteúdo dos mais recentes Estudos de Impacto

Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA).

Antes da análise dos documentos em questão, é importante registrar que,

desde 1989, ano em que o projeto Tijuco Alto foi apresentado às populações do Vale

do Ribeira, a CBA vem tentando obter o licenciamento ambiental necessário para

pôr em andamento a construção desta hidrelétrica. Para isso, já naquele ano foi

entregue aos órgãos estaduais ambientais do estado do Paraná e São Paulo

(SUREHMA e SMA, respectivamente) os Estudos de Impacto Ambiental para a

obtenção de licença prévia. Tais estudos são exigidos pela Lei Federal nº 6.938/81,

para os empreendimentos com significativo grau de poluição, degradação ou

transformação do meio ambiente. O Decreto 88.351 de 1983, que regulamenta esta

lei, diz o seguinte:

Art. 18. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de

estabelecimento de atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como os empreendimentos capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento do órgão estadual competente, integrante do SISNAMA, sem prejuízo de outras licenças legalmente exigíveis. § 1º Caberá ao CONAMA fixar os critérios básicos, segundo os quais serão exigidos estudos de impacto ambiental para fins de licenciamento, contendo, entre outras, os seguintes itens: a) diagnóstico ambiental da área; b) descrição da ação proposta e suas alternativas; c) identificação, análise e previsão dos impactos significativos, positivos e negativos. § 2º O estudo de impacto ambiental será realizado por técnicos habilitados, e constituirá Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), correndo as despesas por conta do proponente do projeto. (BRASIL, 1983 – grifo nosso)

Sabe-se que este mesmo decreto dispõe sobre as etapas de licenciamento

pelas quais estes empreendimentos têm que ser submetidos, até que se chegue a

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sua fase efetivamente de operação. A apresentação e aprovação dos Estudos de

Impacto Ambiental servem como instrumento para a aquisição apenas da primeira

etapa de três licenças requeridas para o licenciamento ambiental.

Art. 20. O Poder Público, no exercício de sua competência de controle,

expedirá as seguintes licenças: I - Licença Prévia (LP), na fase preliminar do planejamento da atividade, contendo requisitos básicos a serem atendidos nas fases de localização, instalação e operação, observados os planos municipais, estaduais ou federais de uso do solo; II - Licença de Instalação (LI), autorizando o início da implantação, de acordo com as especificações constantes do Projeto Executivo aprovado; III - Licença de Operação (LO) autorizando, após as verificações necessárias, o início da atividade licenciada e o funcionamento de seus equipamentos de controle de poluição, de acordo com o previsto nas licenças Prévia e de Instalação. (BRASIL, 1983)

A CBA submeteu tais estudos para análise, tendo obtido a licença prévia

(LP) do empreendimento no ano de 1994, pela SEMA (SP) e pelo IAP (PR) – órgão

que sucedeu a SUREHMA. Além de uma série de questionamentos a respeito de

carência de informações nos estudos que resultaram na emissão desta LP e da

sucessão de principais fatos em torno da polêmica hidrelétrica, já apresentados no

capítulo anterior, houve também uma ação movida pelo Ministério Público Federal.

Esta ação consistiu na transferência ao IBAMA da responsabilidade de emitir os

licenciamentos. Por isso, estas licenças prévias de 1994 foram invalidadas e

reiniciou-se o processo de licenciamento no ano de 1997 junto a este órgão. O

IBAMA, desde então, solicitou algumas complementações nos estudos, que foram

reformulados algumas vezes, até que em 2003, foi indeferida a emissão da Licença

Prévia em definitivo, em decorrência do não atendimento a algumas condicionantes

delegadas pelo IBAMA, que são apontadas abaixo, e que invalidaram o EIA/RIMA e

os documentos complementares a estes estudos. Já era a segunda tentativa de

obtenção das licenças.

- a inexistência de diagnósticos fundamentais para avaliação dos impactos potenciais do empreendimento, como o levantamento da vegetação a ser suprimida, das macrófitas aquáticas, da ictiofauna, o grau de risco de contaminação de chumbo, entre outros. - os levantamentos e relatórios apresentados, posteriormente ao EIA/RIMA, constituem documentos independentes, não tendo sido realizada uma avaliação integrada dos impactos ambientais, o que impossibilita a análise da viabilidade do empreendimento (CNEC, 2005).

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Foi só a partir da emissão de um novo termo de referência1, em junho de

2004, que foram dadas condições para se iniciar outro processo de licenciamento,

caso ainda fosse de interesse da CBA. Foi também neste momento que o

empreendedor solicitou os serviços da CNEC, o novo consórcio que passou a ser

responsável pela elaboração dos Estudos e do Relatório de Impacto Ambiental.

Além de uma nova consultoria e um novo processo de licenciamento, havia também

um novo projeto de engenharia, evitando-se, por exemplo, um desvio de dez

quilômetros do leito original do Rio Ribeira.

Entre tantas “idas e vindas”, marcadas fortemente por resistências dos mais

diversos tipos, tanto da sociedade civil em geral, dos movimentos de populações

tradicionais como os quilombolas, das organizações de agricultores, de ONGs

ambientalistas, dentre outros, o processo de licenciamento da UHE Tijuco Alto vem

sendo construído de maneira atípica, já que se encontra em sua terceira tentativa de

aprovação ao longo destes anos. É em cima dos últimos estudos, elaborados pelo

CNEC, que faremos algumas breves colocações com o intuito de se refletir sobre o

uso e a validade deste instrumento – cuja obrigatoriedade para o licenciamento

ambiental é assegurada por lei. Para tal, analisaremos alguns dos impactos

abordados, tanto àqueles relativos ao meio físico quanto ao meio sócio-econômico

afetados, que sofreram/sofrerão alterações caso a usina venha a ser concretizada.

2.1 O RESERVATÓRIO: UM ELEMENTO IMPORTANTE PARA O ENTENDIMENTO

DOS IMPACTOS

Um dos principais fatores que interferem nos impactos abordados pelos

Estudos de Impacto Ambiental de grandes empreendimentos hidrelétricos é a

formação de um reservatório, que se enche à montante do local de instalação da

barragem de concreto, constituindo a porção do que se intitula “Área Diretamente

afetada2” (ADA) do empreendimento. No caso da UHE Tijuco Alto, este reservatório

inundaria, em nível d’água máximo normal, uma área de aproximadamente 43,8 km².

1 Como já apontado no capítulo 1, este documento teve a finalidade de fornecer subsídios técnicos

2 É constituída pela área do reservatório e mais uma faixa de 100 metros ao redor do mesmo (CNEC,

2005).

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Já para o nível máximo excepcional, usado para controle de cheias, a área inundada

seria de aproximadamente 56,59 km², atingindo grande parte do município de Cerro

Azul (PR), bem como os municípios de Adrianópolis (PR), Doutor Ulysses (PR),

Itapirapuã Paulista (PR) e Ribeira (SP), em menores proporções (CNEC, 2005).

A formação deste reservatório em si, não é enumerada enquanto impacto,

mas sim, apontada como um “fator gerador de impacto”, visto que um reservatório

constitui parte estrutural de uma obra hidrelétrica. Desta forma, além dos impactos

gerados pela mobilização da obra, muitos impactos acabam tendo interconexão

direta com a criação deste grande lago. Em relação a Tijuco Alto, a hipotética

criação do reservatório resultaria – e já resultou em algumas situações, como

aquelas relacionadas com a movimentação dos empreendedores na aquisição de

terrenos a serem inundados, que veremos mais adiante – em conseqüências sociais

e ambientais.

A respeito das consequências mais gerais que a instalação de uma usina

hidrelétrica pode ter, tanto de grande quanto pequeno porte, estão àquelas

associadas com a inundação de grandes áreas, que afetam não só o patrimônio

natural e paisagístico (flora), mas também modificam a fauna local, os modos de

produção e de subsistência de algumas populações, o patrimônio arquitetônico, as

benfeitorias construídas (escolas, postos de saúde, igrejas), o patrimônio

espeleológico (cavernas), a hidrologia, a geomorfologia. Estes e inúmeros outros

aspectos foram encontrados de maneira recorrente em alguns dos Estudos de

Impacto Ambiental de empreendimentos hidrelétricos no estado do Paraná,

analisados durante o período de execução desta pesquisa. Em função desta enorme

gama de transformações, é obrigação de o empreendedor apontar em seus estudos

quais as consequências específicas, ou seja, quais impactos a obra proporcionará,

analisados sobre três eixos: meio físico, meio biótico e meio socioeconômico. E a

partir disso propor medidas que visem mitigar ou compensar os efeitos destes

impactos, através de programas ambientais.

No entanto, cabe aqui fazer uma ressalva: é importante complementar que a

idéia de “atingidos” pela construção de uma barragem não se resume àqueles que

são afetados pelo reservatório. Vainer (2008) observa que o conceito de atingido é

mais amplo do que se supõe e faz esta distinção entre “atingido” e “inundado”.

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A concepção hídrica foi fortalecida pela legislação referente a compensações financeiras, uma vez que esta considera que os municípios a serem compensados são aqueles que têm parte de seus territórios inundados. Ora, em muitas ocasiões tem ficado evidente que municípios sem qualquer área inundada podem sofrer mais severamente as conseqüências da implantação de uma hidrelétrica que municípios com áreas tomadas pelas águas do reservatório, mas isso não é contemplado pela legislação, em virtude da concepção hídrica (VAINER 2008, p.6 - grifo no original).

O autor ainda ressalta que, dentro do grupo dos “inundados”, só são

considerados passíveis de compensação pelos empreendedores aqueles que

possuem o domínio e a propriedade da terra, afirmando que no Brasil prevalece a

lógica de compensação que fundamentada numa estratégia “territorial-

patrimonialista”.

Na prática, a conseqüência da concepção hídrica tem sido a sistemática omissão diante dos efeitos do empreendimento na vida de populações não atingidas pelas águas, efeitos que podem ser, e em muitos casos têm sido, dramáticos. Na verdade, a concepção hídrica não é senão uma reformulação da concepção territorial-patrimonialista, uma vez que continua prevalecendo a estratégia exclusiva de assumir o domínio da área a ser ocupada pelo projeto, e não a responsabilidade social e ambiental do empreendedor (VAINER 2008, p.6).

Porém, para fins desta pesquisa, nos ateremos apenas a analisar impactos

que tenham relação com a formação do reservatório de Tijuco Alto. Diante do

exposto, o que se tentará a seguir é esboçar uma breve análise crítica de alguns

destes impactos e, para isso, abordaremos impactos referentes a dois eixos

prioritários: o meio físico e o meio socioeconômico. De cada um desses eixos serão

abordados dois impactos, sendo um de caráter positivo e outro de caráter negativo.

2.1.1 Impactos sobre o meio físico

Neste subitem pretendemos analisar de que maneira foram apresentados,

definidos e exemplificados alguns dos componentes ambientais incidentes sobre o

meio físico das referidas àreas onde haverá interferência da usina hidrelétrica,

atentando-se para alguns mecanismos discursivos utilizados pelo empreendedor.

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Perda e Alterações no Patrimônio Espeleológico Existente (negativo)

Na chamada Área de Influência Direta (AID)3 do empreendimento foram

identificados alguns aspectos do Patrimônio Espeleológico regional: 450 dolinas, 52

cavidades naturais subterrâneas, 59 feições secundárias, 4 sumidouros e 8

ressurgências. O reservatório de Tijuco Alto irá afetar, especialmente, duas

cavernas: Gruta do Rocha e Gruta da Mina do Rocha; além disso, outras feições

secundárias também sofrerão interferências, tais como os buracos da Figueira, da

Porteira Preta, Quente e Frio; paredões das Dolinas e da Serra da Balança, Pedra

do Morcego e tocas da Ilha Rasa e do Mamed II.

Com o intuito de valorar o patrimônio espeleológico impactado, a CNEC,

consultora ambiental responsável pelos estudos, caracterizou os elementos afetados

da maneira que se segue. Em relação ao que se observa na Gruta da Mina do

Rocha, é dito que “a gruta já está muito degradada, apresentando pichações,

espeleotemas quebrados e muita fuligem decorrente das detonações e de outras

operações da antiga mina.” (CNEC, 2005, p. 27 [seção P-14]). Complementa, a

respeito da biodiversidade encontrada, que “apresenta uma baixa diversidade,

composta por apenas 13 táxons registrados, e nenhuma espécie exclusiva do

ambiente subterrâneo foi registrada.” (ibidem, grifo nosso).

Sobre a Gruta do Rocha, afirma-se que ela detém:

A maior diversidade da AID com 40 espécies, destacando-se das demais cavernas por apresentar uma fauna aquática de grupos comumente registrados no ambiente subterrâneo. Esta diversidade contempla três espécies restritas ao ambiente cavernícola, de interesse biológico, mas também encontradas em outras cavernas da região do Vale do Ribeira. (ibidem, grifo nosso)

Em relação às outras nove feições secundárias situadas na região, já citadas

anteriormente, o corpo técnico garante que são constituídas por “buracos, tocas e

paredões/pedra com pouco significado em termos de patrimônio espeleológico”

(p.26).

3 Área sujeita aos impactos diretos da implantação e operação do empreendimento. A delimitação

dessa área considerou as características sociais, econômicas, físicas e biológicas dos sistemas estudados e das particularidades do empreendimento. Compreende os municípios de Ribeira e Itapirapuã Paulista, no estado de São Paulo, e Adrianópolis, Cerro Azul e Doutor Ulysses, no Paraná para o meio socioeconômico e parte desses municípios (a parte da bacia hidrográfica cujos rios correm para o reservatório) para os meios físico e biótico (parte dos componentes da natureza que não têm vida e os que têm vida). (CNEC, 2005)

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Com um olhar atento sobre o que está sendo colocado, percebe-se que o

impacto sobre estas estruturas, apontado como negativo e irreversível para a AID,

devido a sua localização no montante compreendido para inundação pelo

reservatório é, sensivelmente, considerado “menos impactante”, pela forma como

está descrito. O que se supõe é que o intuito do consultor é amenizar a perda

irrecuperável destas cavernas e feições e, para isso procura demonstrar a pequena

importância destes elementos, tanto em relação à diversidade encontrada

(considerada baixa); quanto à não exclusividade das “poucas espécies encontradas”

e/ou ao seu estado de conservação. O reducionismo quanto à relevância destas

grutas se reafirma quando, no Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), se esboça a

afirmação de que “as únicas grutas que serão inundadas com a construção da UHE

Tijuco Alto são a Gruta do Rocha e a Gruta da Mina do Rocha. Nenhuma dessas

grutas apresenta potencial turístico.” (CNEC, 2004, p. 74 – [seção P-14])

Figura 5 – No RIMA4, o personagem “Tio Juco”

5 dá o seu parecer sobre este

impacto. Fonte: CNEC, 2005

4 O RIMA tem caráter informativo e divulgativo, já que é o documento pelo qual a população geral

conhece um empreendimento, ao contrário do EIA, que por ser o registro encaminhado para avaliação de profissionais e especialistas, possui linguagem mais técnica e rebuscada, além de apresentar conteúdo mais detalhado. Por esta razão, o RIMA possui uma linguagem mais acessível, já que consiste numa adequação do EIA. 5 No caso do empreendimento em questão, o recurso de linguagem utilizado foi uma história em

quadrinhos intitulada “Adriana e o Ribeirinho em: conhecendo o projeto Tijuco Alto”, onde o personagem “Tio Juco” é uma espécie de super-heroi da informação – a personificação da usina, “super-heroína do desenvolvimento” - que chega à região para apresentar Tijuco Alto aos jovens “Adriana” e “Ribeirinho”. Tio Juco vai, ao longo do documento, tecendo comentários e pontuando informações a respeito da hidrelétrica, criando um enredo que vai se desenrolando ao longo do RIMA.

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Efeitos sobre as cheias no rio Ribeira a jusante do reservatório (positivo)

Outro impacto apontado pelo EIA, desta vez de caráter positivo, seria a

possibilidade de o reservatório atuar na contenção de cheias na região. O Vale do

Ribeira está localizado em área de transição entre os climas tropical e semi-tropical,

portanto, com temperaturas médias variando em torno dos 17º aos 25º ao longo de

todo o ano, tendo a média em janeiro – o mês mais quente – próxima da marca dos

28º. Tais características delegam a região alto padrão de umidade e frequência de

chuvas. Seu trimestre mais úmido corresponde aos meses de dezembro, janeiro e

fevereiro (verão) e o trimestre mais seco, aos meses de junho, julho e agosto

(inverno) (CNEC, 2005).

Ao mesmo tempo em que se esboça este panorama climático, a falta de

estrutura adequada para o volume de chuvas, a ausência de políticas públicas

efetivas focadas neste problema, o desmatamento das margens do Ribeira, são

alguns dos fatores que fazem a região ser altamente suscetível às enchentes. Neste

cenário, o estudo aponta como seria a altura da lâmina de água caso existisse a

UHE Tijuco Alto em janeiro de 1997, época em que se registrou a maior cheia da

região (CNEC, 2005, p. 48 [RIMA]). Afirma-se, pois, que “as análises efetuadas

sobre o controle de cheias assinalam expressivo benefício em consequência da

implantação da UHE Tijuco Alto, com abatimentos das ondas de cheias observadas

até a localidade de Sete Barras.” (ibidem).

Nesse discurso, a barragem não é geradora de uma vulnerabilidade, mas aquilo mesmo que retira a localidade de sua vulnerabilidade prévia em relação às formas alocativas dos mananciais, vistas como formas de manejo atrasadas. Na lineraridade em que este discurso opera, aquilo que retira uma localidade da vunlerabilidade não pode, dialeticamente, produzir um outro tipo de vulnerabilidade. Apenas produz o progresso infenso de riscos (VALENCIO; GONÇALVES; MARCHEZINI, 2009, p.5).

No entanto, os benefícios de tal contenção estariam limitados

geograficamente a algumas porções do rio Ribeira, em específico, às porções à

montante da instalação da barragem.

Aspecto a ser ressaltado quanto ao controle de cheias refere-se à localização das precipitações, pois os maiores benefícios promovidos pelo aproveitamento ocorrem quando as chuvas ocorrem na parcela da bacia situada a montante do eixo de Tijuco Alto. Em condições meteorológicas inversas, quando o núcleo chuvoso se posiciona nas porções médias e

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baixas da bacia, os efeitos de amortecimento das ondas de cheias serão atenuados ou mesmo anulados, já que a principal parcela das vazões contribuintes deverá provir das porções a jusante do eixo, portanto fora da influencia do controle operacional de Tijuco Alto (CNEC, 2005, p.48– [seção P-14]).

Logo, como é possível tratar este aspecto como positivo, visto que não

chove somente próximo ao eixo da barragem, mas sim, há um padrão de chuvas em

toda a região? Sevá Filho, Rick e Minello (2007) haviam afirmado que, desde os

primeiros estudos apresentados pela CBA, os argumentos que apontavam a

positividade deste impacto já haviam sido desconstruídos por Bermann (1993), que

analisou criteriosamente os estudos elaborados pela Intertechne (primeira consultora

contratada pela CBA) e acrescenta:

A represa Tijuco Alto iria receber águas de rio em época de chuvas, em períodos de chuva bem intensa por poucas horas ou poucos dias; portanto, uma bela proporção de barro, de areia, seixos e pedras roladas, de restos de árvores, tranqueiras. Assim, quanto mais vezes atuar nessa função, ao longo do tempo, a represa tem que acumular sólidos, vai se entupindo, não tem como não se entupir. Vai perdendo justamente sua habilitação em dispor de “volumes de espera”. Todos sabem: entupindo, acumula mais sólido e menos líquido. Pela lógica, pode ser que a operação da usina Tijuco Alto realmente favoreça o amortecimento da onde de cheia do rio Ribeira... Mas pode igualmente acontecer das cheias no corpo da represa e rio abaixo serem ainda piores e menos controláveis que as atuais. (SEVÁ FILHO, RICK E MINELLO, 2007, p.15- grifo no original)

O que se observa na região é uma fraquíssima adequação para qualquer

elevação do nível do rio, o que, com a formação de um reservatório de tamanha

extensão, seria inevitável. Um dos exemplos mais recentes, e que reafirmam quão

inadequada é a ideia de um reservatório na região, foi a queda da ponte

intermunicipal, que liga Dr. Ulysses a Cerro Azul, em 1º de agosto de 20116. O único

acesso entre as duas cidades, que servia como via de transporte dos moradores,

mas, especialmente, da escoação da produção agrícola para comercialização, foi

destruído pelos elevados volumes d’água decorrentes das chuvas que caíram sobre

o Vale do Ribeira naquele mês.

Em visita à região, o que podemos observar é um precário sistema de

transporte para os moradores, que passaram a exercer suas atividades diárias

6 Ver mais em MARQUES (2011) e ANTONELLI (2011)

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através de pequenos barcos ou balsas, os quais são carregados na margem

esquerda do rio e descarregados após a travessia. São enormes quantidades de

caixas com produtos agrícolas – em destaque para a tangerina ponkan. Além deste

problema enfrentado, a simples travessia diária para os moradores foi dificultada, e

nas poucas barcas e balsas existentes, o que se vê é a formação de enormes filas,

que muitas vezes duram até duas horas para realizar uma simples travessia.

A situação de alta intensidade de chuvas que caem em regiões com muita

umidade como é o Vale do Ribeira, provocando estragos ao longo das margens do

rio, evidencia a fragilidade ambiental natural daquela região. Somando esta situação

à presença de populações ribeirinhas e/ou habitantes próximos dos rios e a falta de

investimentos em infraestruturas adequadas às circunstâncias físicas, fica claro que

com a presença de uma barragem, a situação das cheias só tenderia a piorar,

expondo os moradores a uma maior suscetibilidade socioambiental. Este fato por si

só serve para invalidar todo o argumento de que a UHE Tijuco Alto cumpriria a

função de contenção de cheias na região.

Aprofundando-se nesta questão, em que se evidencia um ambiente de

suscetibilidade para as populações residentes próximas aos rios, Acselrad, em

exposição durante o I Seminário Ecossocialismo e Sustentabilidade7, traz a noção

dos riscos ambientais que certos grupos assumem de acordo com o local onde

habitam. Neste debate, o autor incute a idéia de que os riscos ambientais são

diferenciados e diferentemente distribuídos entre os diversos sujeitos sociais.

Aqueles que se predispõem a assumir os riscos dos conflitos ambientais são

geralmente as comunidades pobres, de baixa renda, que se submetem, por falta de

opção, a habitar locais degradados. Este fato promove aquilo que se denomina de

“injustiça ambiental”, fator que está intimamente ligado à desigualdade social, pois

há o lado dos que promovem o progresso e o lado dos que arcam com as

conseqüências e com as responsabilidades dos problemas ambientais gerados por

este mesmo progresso. Destinam-se aos mais fracos os prejuízos da

desorganização da sociedade, gerando “racismo ambiental”.

Retomando o foco das cheias, além de desconstruir os argumentos de

contenção da água, Sevá Filho et al. (2007) também discutem mais um problema.

7 Notas pessoais da exposição de Henri Acselrad no dia 8 de julho de 2011 na mesa intitulada “Meio

Ambiente e Justiça Socioambiental”, durante o I Seminário Ecossocialismo e Sustentabilidade, realizado pela APP-Sindicato, em Curitiba (PR).

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Ao invés de conter as cheias, a barragem acabaria contendo estes sólidos que vêm

carregados pelo fluxo do rio (galhos, seixos, etc.). Isto diminuiria a massa de

nutrientes naturais e orgânicos, prejudicando as atividades à jusante, como a

agricultura de várzea e influindo sobre a diminuição do volume dos pescados por

inexistência de matéria suficiente para alimentação, promovendo uma “degradação

cumulativa de ecossistemas” (ibidem). Neste sentido, a única efetividade deste

argumento seria entendida somente com a construção das outras três hidrelétricas

previstas rio abaixo- UHE Itaoca, UHE Funil e UHE Batatal - já que, conjuntamente,

poderiam atuar como um sistema de contenção de cheias. Enfim, trazer este ponto

como afirmativo junto aos impactos do empreendimento só serve como mais um

precedente e incentivo para a liberação posterior da construção destas outras

barragens. Ainda assim, é sempre importante ressaltar que a função de uma

barragem é a produção de energia – e não a contenção de cheias - e, para isso, é

preciso que a água atravesse as comportas, ou seja, esteja sempre em movimento.

Portanto, não liberar água significa não produzir energia e este não é, claramente, o

objetivo do empreendedor. (ISA, 2002)

2.1.2 Impactos sobre o meio socioeconômico

Neste subitem pretendemos dar continuidade na análise dos componentes

apresentados, definidos e exemplificados, mas, neste momento, focaremos nossa

análise naqueles incidentes sobre o meio socioeconômico; também utilizar-se-á da

observância de mecanismos discursivos utilizados pelo empreendedor.

Impactos relacionados ao processo de aquisição de terras efetuadas pela

CBA, no período 1988/99 (negativo)

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Figura 6 – Adriana, personagem doRIMA, demonstra qual é a base econômica da

população atingida. Fonte: CNEC, 2005

O recente EIA também traz um impacto que teve seus efeitos já nos

primeiros anos de ações visando a implantação de Tijuco Alto. A não consolidação

da obra não impediu, no entanto, que algumas transformações prévias fossem

ocorrendo e uma das principais está relacionada à venda de propriedades nas áreas

que viriam a ser diretamente afetadas pelo empreendimento.

O empreendedor já vinha conduzindo ações que determinaram impacto principalmente no tocante à aquisição de terras (cerca de 90% das áreas necessárias, sem ter a licença ambiental para tal). A aquisição desencadeou impactos adversos, criando passivos: evasão rural, desarticulação da produção agrícola, urbanização da população rural, afetação das relações sócio-econômicas regionais, efetivação de negociações sem o acompanhamento do poder público competente para garantir o cumprimento de direitos básicos dos atingidos, que propiciou um cenário desfavorável aos mesmos sem que pudessem contar com canal de interlocução e intermediação dos direitos feridos; criação de falsa noção de poder consumado e impotência do atingido diante da crença de que o poder do dono do projeto era inquestionável. (CNEC, p. xli – [seção B])

A partir de relatos de moradores e agricultores da região, o período em que

houve a maior parte das vendas de terras foi entre os anos 1989 e 1991, quando

muitos agricultores familiares deixaram suas propriedades. No entanto, a existência

de um grande número de não-proprietários, ou seja, de meeiros, posseiros e

arrendatários, foi um fator que deu origem a uma série de problemas, visto que a

CBA declarou que arcaria apenas com os custos de indenização para os

proprietários diretos. Neste ínterim, muitos dos não-proprietários que queriam

permanecer na terra, foram obrigados a sair por vontade do proprietário, aos quais

eram dirigidas as negociações, formando, por sua vez, um grupo de deslocados

compulsoriamente pelo empreendimento. De acordo com a CNEC (2005), foram

adquiridos, ao todo, 377 imóveis, relativos a 286 proprietários.

Outro aspecto a se ressaltar é que o processo de negociação levado à época voltava-se exclusivamente aos proprietários dos imóveis, sendo que os mesmos deveriam se responsabilizar pelos meeiros, arrendatários e empregados que moravam ou trabalhavam em suas terras. Por conseguinte, este segmento que não foi objeto de preocupação nem do

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empreendedor e nem dos proprietários acabou por ter que deixar as propriedades sem qualquer perspectiva de trabalho ou local de moradia (...) sem nenhum benefício social com o intuito de apoiar a recomposição do cotidiano dessas famílias. (CNEC, 2005, p.65 [P-14])

O que houve, de acordo com moradores da comunidade do Mato Preto, em

Cerro Azul, e com base em levantamentos concretos realizados com esta

população, foi a dispersão de muitos destas pessoas, que se direcionaram a outras

cidades ou a outros bairros, perdendo seus laços de trabalho e convivência.

Jeronymo (2007) em levantamento a respeito dos destinos desses ex-moradores

localizou 17 não-proprietários que residiam em algumas comunidades inseridas na

AID do empreendimento, a maior parte formada por posseiros. A partir de

informações coletadas, o autor traçou os destinos destas pessoas após serem

deslocadas da comunidade, algumas tendo até 3 deslocamentos distintos.

Apenas para se ter uma noção dos itinerários de algumas destas pessoas,

destaca-se na tabela abaixo a situação de alguns ex-moradores da comunidade de

Mato Preto. A maior parte foi morar em outras sedes municipais, fora da AID, mas

dentro da Região Metropolitana de Curitiba (RMC), como por exemplo, nos

municípios de Almirante Tamandaré ou Rio Branco do Sul. Visto que este grupo

ficou sem receber nenhum dos benefícios previstos com o empreendimento – nem

indenização, nem empregos, contribuíram para ampliar processos de marginalização

desencadeados com a pré-concepção de Tijuco Alto.

Os laços de sociabilidades, as relações comerciais, o escambo e a criação de animais, as produções agrícolas, as propriedades distantes umas das outras e dos estabelecimentos comerciais comunitários, são vítimas do processos de desorganização orquestrado pelo empreendedor (JERONYMO, 2007, p.21)

A nota do CEDEA- Centro Estudos, Defesa e Educação Ambiental sobre

Tijuco Alto ratifica esta situação:

Embora seja citada Adrianópolis como local da barragem, a área a ser inundada fica em Cerro Azul, onde o impacto sócio-econômico já é grande, pois somente a notícia da construção da usina já provocou, na década de 90, êxodo rural e enfraquecimento da economia ribeirinha (Rio Ribeira). Muitos trabalhadores que eram meeiros ou pequenos produtores são hoje “bóias-frias” em Cerro Azul ou “operários” da CBA em Rio Branco do Sul, Itaperuçu ou Almirante Tamandaré. Portanto, a CBA JÁ TEM UMA DÍVIDA SÓCIO-ECONÔMICA BASTANTE SIGNIFICATIVA COM O MUNICÍPIO DE CERRO AZUL (CEDEA, 2004, p.1 – caixa alta no original)

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Tabela 6 – Destinos de moradores da comunidade de Mato Preto, em Cerro Azul (PR). FONTE: Tabela elaborada pela autora com base em JERONYMO (2007) – pesquisa de campo (outubro de 2006)

Ainda sobre os processos de aquisição destas propriedades, em conversa

com moradores e/ou parentes de moradores da comunidade do Mato Preto, foi

afirmado que, desde o início da década de 90, quando a CBA passou a adquirir os

imóveis que seriam inundados pela barragem, os representantes da empresa se

utilizaram de estratégias que ameaçavam os direitos e impediam que os processos

de compra fossem efetuados sob trâmites legais. Alegam que foi feita muita

“pressão psicológica” durante os processos de negociação, pois eram dados prazos

apertados para a negociação dos imóveis; logo, quem não saísse teria sua casa e

benfeitorias inundadas. Outra forma de pressão foi em relação aos preços dos

imóveis que, se negociados com a CBA, seriam comprados a um “preço de

mercado” e que depois, para aqueles que não haviam vendido, a única solução seria

negociar com o governo, com valores muito inferiores aos do empreendedor.

Ainda a partir de informações recolhidas em campo, os interlocutores

disseram que os responsáveis pelas negociações, inclusive, se propuseram a

adquirir as propriedades de maneira alternada espacialmente, ou seja, em série de

aquisições, que funcionava da seguinte forma: num grupo de três propriedades, era

feita a negociação com o primeiro e o terceiro dono; ao segundo, que residia na

interseção dos imóveis já adquiridos, não restava alternativa a não ser também

vender a sua terra, afinal, todos os proprietários vizinhos já haviam vendido. Por

vezes a CBA também anunciava que já tinha a posse de toda a terra a ser inundada,

Categoria/AID Deslocamento 1 Deslocamento 2 Deslocamento 3

1. Meeiro – Mato Preto Três Barras – Cerro Azul (PR)

2. Meeiro – Mato Preto Poço Negro – Colombo (PR)

Bocaiuva do Sul (PR)

Jardim Eliane – Cerro Azul (PR)

3. Meeiro – Mato Preto Colombo (PR)

4. Meeiro – Mato Preto Colombo (PR)

5. Meeiro – Mato Preto Abacaetava – Colombo (PR)

6. Meeiro – Mato Preto Sem deslocamento, proprietário não negociou

7. Meeiro – Mato Preto Poço Negro – Colombo (PR)

8. Traballhador diarista– Mato Preto

Poço Negro – Colombo (PR)

Vila Macieira – Rio Branco do Sul (PR)

9. Traballhador diarista– Mato Preto

Boqueirão – Curitiba (PR)

Poço Negro – Colombo (PR)

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mesmo que isto fosse um argumento falacioso. Foram estratégias de pressão

amplamente utilizadas pela empresa, responsável por gerar um quadro ainda maior

de instabilidade social para os moradores na região.

Formação de locais de interesse turístico (positivo)

Um segundo impacto sobre o meio sócio-econômico apontado como sendo

positivo, é a influência que a instalação da UHE Tijuco Alto teria sobre o turismo na

região. De acordo com os consultores, a formação do lago do reservatório da

barragem se tornaria um atrativo para visitantes na região, compondo assim, mais

um ganho financeiro para os municípios com terras inundadas.

A alteração que irá ocorrer na fase final da implantação da UHE Tijuco Alto,

quando do enchimento do reservatório, tem aspectos positivos se considerarmos que o lago terá uma grande potencialidade paisagística, podendo atrair atividades de recreação e lazer, potencial este reforçado pela proximidade da área em estudo à Região Metropolitana de Curitiba. O reservatório de Tijuco Alto, no rio Ribeira, pode ser aproveitado para atividades turísticas e de lazer, propiciando novas oportunidades de desenvolvimento do turismo em toda a área de influência do empreendimento. (CNEC, 2005, p. 83 [seção P-14])

Ao mesmo tempo em que afirma que há esta possibilidade, o EIA caracteriza

alguns dos principais atrativos naturais que existem na região, em especial, em

Cerro Azul, local onde nos aproximamos nesta pesquisa. É ressaltado o próprio

apelo do Rio Ribeira para atividades de lazer e turismo, pois possui “leves

corredeiras que poderiam ser usadas para a prática do rafting, e que deverão ser

submersas pela implantação da UHE Tijuco Alto.” (CNEC, 2005, p.82, [seção P-14]).

Outro atrativo seria a Gruta do Bom Sucesso, existente em localidade rural chamada

Bom Sucesso, distante em dez quilômetros do centro da cidade e que possui dois

salões com espeleotemas e um pequeno lago em seu interior. Outros aspectos

referem-se, inclusive, ao próprio patrimônio arquitetônico, encontrados

especialmente nas casas da vila do Rocha e da comunidade do Mato Preto, com

forte influência europeia e da imigração estrangeira, bem como da arquitetura do

Segundo Império e que, de acordo com os estudos “desaparecerão com o

reservatório”.

Uma das formas de desvalorizar a importância destes elementos de apelo

turístico é justamente afirmar que eles já não possuem nenhuma importância e,

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portanto, não “farão muita falta”. Os consultores reiteram ao precário estado de

conservação e de infraestrutura destes elementos, fatos que não permitem o

aproveitamento destas características para estimular o turismo regional. O que

opõem com os argumentos sobre as inúmeras possibilidades geradas pelo

hipotético reservatório.

Com a implantação do reservatório cria-se um novo espaço de beleza no cenário local, que será apropriado pela população para entretenimento, criando-se oportunidades de navegação, esportes náuticos e outras práticas de lazer. O Plano de Uso e Conservação do Entorno do Reservatório que é proposto cuida desses aspectos constatados, entre outros. (CNEC, 2005, p.99 [RIMA])

Moradores da região e organizações ambientalistas, como o CEDEA –

Centro Estudos, Defesa e Educação Ambiental já vêm destacando, ao longo dos

anos, que o município de Cerro Azul possui outras potencialidades turísticas – o que

se diagnostica no próprio estudo da CNEC – que não são aproveitadas. Eles

acreditam que o turismo rural se faz em conjunção com aquilo que as cidades

possuem de natural e com as tradições locais, de forma a promover uma atividade

participativa, que envolva os moradores da região, e na qual haja efetiva distribuição

de benefícios. Em “Nota do CEDEA sobre a Hidrelétrica de Tijuco Alto”, essa

perspectiva é apontada.

Existem propostas de incentivo ao eco-turismo rural, como forma de buscar alternativas para a auto-sustentabilidade local e a construção dessa usina ali inviabiliza esta proposta. ECO-TURISMO RURAL SE FAZ APROVEITANDO E VALORIZANDO A CULTURA, OS COSTUMES E AS TRADIÇÕES LOCAIS E NÃO DESTRUINDO ISSO TUDO E BUSCANDO IMPLANTAR OUTROS ATRATIVOS NÃO CONDIZENTES COM A REALIDADE DO MUNICÍPIO (CEDEA, 2004, p. 2 – caixa alta no original).

Diante destas proposições, questiona-se o seguinte: como pode, por

exemplo, a construção de uma barragem e de seu reservatório atrair mais turistas do

que o aproveitamento do próprio patrimônio natural proporcionado pelo Rio Ribeira?

Afirmar, do contrário, que a formação de um reservatório é mais importante do ponto

de vista turístico é simplificar/banalizar/afrontar/negar a diversidade social, natural e

cultural de uma região. Deste ponto de vista, abdicam-se de projetos que integrem

efetivamente as comunidades locais residentes, que permitam redistribuição de

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renda e aproveitamento das potencialidades. É mais “simples” transformar tudo em

um grande reservatório e daí se inventarem formas de “fazer turismo”, que se

resumem a um turismo de “natureza morta”.

Em conversa com moradores da região, percebe-se a consciência de que a

atividade turística seria uma grande estratégia para o Vale do Ribeira, pela

possibilidade de aproveitamento das corredeiras do rio para a atividade do rafting;

pela gastronomia regional; pelas belas paisagens vegetadas e preservadas de Mata

Atlântica. No entanto, o que eles apontam é um profundo descaso do poder público

em incentivar tais atividades, ao mesmo tempo em que, ao permitir a instalação da

UHE Tijuco Alto, estaria proporcionando não a valorização, mas a destruição de todo

este cenário, que seria aproveitado utilitariamente e de forma degradante.

2.2 COMPENSANDO OS IMPACTOS?

Apesar das constatações a respeito dos impactos analisados acima - ainda

que alguns sejam apontados como de caráter positivo - eles possuem uma série de

equívocos não considerados nos Estudos de Impacto Ambiental. Observa-se, nestes

documentos uma tendência a afirmar que sem a instalação da UHE Tijuco Alto o

cenário seria ainda pior ou se manteria tal como está. Os impactos considerados

negativos são sempre passíveis de compensação através dos programas

ambientais; já os impactos positivos, passíveis de potencialização, tornando o

cenário ainda melhor.

Trabalha-se, ao longo dos estudos, com a proposta de “responsabilidade

ambiental e social” da empresa. Um exemplo: embora o enchimento do reservatório

impacte sobre áreas de vegetação nativa, a CBA se propõe a realizar

reflorestamento no entorno do reservatório ou a criar unidades de conservação.

Lembra-se também sobre a quantidade de geração de empregos e de repasse de

royalties para os municípios afetados – ainda que nem todos tenham o acesso a

essa recompensa financeira, conforme isenção prevista na Lei nº 9.990/89.

Ratificando os benefícios oriundos desta obra, o prognóstico, de Tijuco Alto, resulta

na conclusão de que “pior que está não pode ficar”. Afinal se o ambiente já é

“antropizado”, “degradado”, o que pode acontecer será sempre de “ordem superior”,

“melhor” do que o que acontece hoje. Há, no discurso do empreendedor e da

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consultora responsável a exaltação de melhores condições no momento posterior à

obra.

Em relação à exaltação dos aspectos positivos e ao apagamento das

contradições geradas com a instalação de um projeto deste porte, as contribuições

de Acselrad e Bezerra (2010) se fazem pertinentes, pois colocam um cenário de

“resolução negociada dos conflitos ambientais”, caracterizada pela influência de

experts na apreciação dos litígios ambientais e na predominância de soluções

amparadas em medidas compensatórias, muitas com atribuição de valor aos

impactos.

Os discursos que evocam a possibilidade de resolução dos conflitos pela via da compensação econômica enfatizam, em geral, duas “virtudes”: a possibilidade de que todos os entes do conflito vençam (ter algum tipo de compensação) e a oportunidade de se evitar que os litígios cheguem à esfera judicial (prática tida como intrinsecamente indesejável). A compensação econômica equacionaria o conflito no próprio âmbito dos atores envolvidos, esvaziando a possibilidade de evidenciar o confronto entre diferentes modelos de relação entre meio ambiente e sociedade. (ACSELRAD; BEZERRA, 2010, p. 50)

Heloisa Costa (2008) também retrata o funcionamento dos processos de

licenciamento ambiental, nos quais, segundo ela, é atribuída, na maior parte dos

casos, uma racionalidade econômica à natureza. Para a autora, a regulação

ambiental calcada sobre o princípio do “poluidor-pagador”, do ressarcimento e das

medidas compensatórias serve para legitimar o empreendedor com um falso direito

adquirido: o de apropriação da natureza. No entanto, acrescenta que este direito

consiste em permitir não somente o seu uso, mas eventualmente a sua degradação.

O licenciamento ambiental, inserido nesta lógica, apenas cumpre um papel

burocrático para a implantação destes empreendimentos, mas, no fim, os impactos

são sempre interpretados como mitigáveis, recompensáveis, solucionáveis. Costa

(2008) questiona: “se tudo está reduzido a um preço, trata-se então de discuti-lo?”

(p. 90). Como mensurar, então, a perda de vidas, cidades inundadas ou outras

perdas materiais?

Neste sentido, o licenciamento da UHE Tijuco Alto não foge à lógica de

outros empreendimentos. Ao mesmo tempo em que os documentos EIA/RIMA

estipulam uma série de aspectos positivos que podem ser associados à sua

implantação, paradoxalmente, trazem uma série de contradições. Como quantificar

em dinheiro determinados impactos desta grande obra? Qual o valor monetário se

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faz justo e está à altura de compensar as perdas, muitas delas irreversíveis? Seriam

os impactos efetivamente mitigáveis? Estas e outras questões servem de reflexão

para se pensar na possibilidade e na viabilidade deste empreendimento.

Uma série de problemas podem ser apontados desde a elaboração dos

estudos de impacto, passando pelas estratégias discursivas de coerção – e muitas

vezes omissivas dos reais desdobramentos destas obras - até a prática em si, ou

seja, as reais repercussões de uma hidrelétrica na conformação e na produção do

espaço geográfico e de novas relações econômicas, sociais e físicas. Apesar de

tantas contradições atravessadas no encaminhamento que tem sido dado a estes

megaprojetos de infraestrutura, eles permanecem ocupando um grande espaço na

agenda e nos financiamentos governamentais e permanecem inseridos em

projeções de longo prazo para o fortalecimento da matriz energética brasileira.

Sobre estes aspectos, trataremos com mais detalhes no capítulo seguinte.

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3 CONSIDERAÇÕES SOBRE O SETOR ENERGÉTICO

Este capítulo tem o objetivo de relatar alguns aspectos que caracterizam o

contexto do setor energético brasileiro na atualidade. Para tal, nos proporemos a

fazer um breve histórico das mudanças que ocorreram na administração do setor

nos últimos 40 anos, quando houve a passagem do papel preponderante do Estado

para a iniciativa privada, entendendo a UHE Tijuco Alto como expressão destas

transformações. Adiante, a ideia é trazer elementos que subsidiem a afirmativa de

que a matriz de energia hidrelétrica é e será ainda por muito tempo, alvo de pesados

investimentos, se reafirmando como uma das principais fontes de geração de

energia nacionalmente. Para isso, trataremos de alguns investimentos do Programa

de Aceleração do Crescimento, o PAC, para o setor, avaliando também o caso do

Paraná.

Num momento posterior, apresentaremos qual é o papel do Banco Nacional

do Desenvolvimento - BNDES na viabilização de investimentos infraestruturais, os

quais compreendem obras voltadas para geração, transmissão e distribuição de

energia, analisando a ampliação das formas de negociação a partir de Parcerias

Público-Privadas, também conhecidas como PPPs, na expansão do setor. Ainda

neste item, nos propomos a trazer um contraponto a respeito dos efeitos que a

privatização da energia tem repercutido na sociedade, apontado brevemente as

atuações do Movimento dos Atingidos por Barragens como ator que se opõe ao

modelo energético predominante.

3.1 MUDANÇA DE PARADIGMAS NO SETOR

Quando se trata especificamente de investimentos no setor energético

brasileiro, nota-se que o período após 2ª guerra mundial, até aproximadamente a

década de 70, o país passou a investir de forma massiva em infraestruturas para a

geração de energia. O que se teve de lá pra cá foi a adoção e o predomínio do

modelo de barragens no setor hidrelétrico brasileiro, que vem ganhando

expressividade principalmente em função da demanda imposta pelos projetos

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industriais propostos no II Plano Nacional de Desenvolvimento, datado do período

de 1975 a 1979 (IGPLAN, 2010).

De acordo com o Movimento dos Atingidos por Barragens (2011), nesta

época,

Projetos “faraônicos” são levados adiante com o objetivo principal de gerar eletricidade para as indústrias que consomem muita energia - chamadas de eletrointensivas - e para a crescente economia nacional, que passava pelo chamado “milagre econômico”, durante a Ditadura Militar. (grifo nosso)

Na década de 80, houve uma estagnação do setor, que “culminou na

desestruturação dos fluxos financeiros e na desorganização da estrutura

institucional” (MMA, 2006, p.23). A necessidade de cada vez mais investimentos no

setor, paralelamente ao endividamento das empresas estatais, tendo como

representante nacional a Eletrobrás foram responsáveis por esta crise. Foschiera

(2009) relata que:

Nos anos de 1980, o setor elétrico será afetado pela crise financeira que se instaura em escala mundial e sofrerá as consequências econômicas gerais da denominada “década perdida”. A política energética brasileira tinha nos financiamentos externos um importante pilar de sustentação. As crises do petróleo (1973 e 1979) levaram o governo a investir mais em hidrelétricas e termoelétricas, num momento em que os juros internacionais se ampliavam. As tarifas foram utilizadas como arma inflacionária, mantendo os reajustes dos preços abaixo da inflação, fazendo com que as receitas de algumas empresas estatais não cobrissem seus investimentos, necessitando recorrer a novos empréstimos, que com a Moratória do México, em 1982, tornou-se mais difícil sua obtenção e com juros maiores (p.108).

Apesar da crise que afetava o setor, Foschiera (2009) afirma que “continuou-

se investindo em infraestrutura e modernização tecnológica, embora o Estado

apresentasse sua capacidade financeira praticamente esgotada” (p.109). Exemplo

disso é que muitas barragens foram construídas e postas em funcionamento durante

este período. Alguns exemplos são as barragens de Itaparica, no Rio São Francisco

(PE/BA), inaugurada em 1988; a usina de Itaipu (PR) no Rio Paraná e a UHE

Tucuruí (PA), no Rio Tocantins, ambas inauguradas em 1984.

A partir da situação que estava sendo traçada e diante da crise instaurada

no setor elétrico, “a passagem do modelo energético existente para um modelo

privado passa a ser justificado como uma ação natural, já que o primeiro havia se

configurado em um momento histórico já esgotado” (FOSCHIERA, p.109). Em

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consonância ao movimento neoliberal na década de 90, o setor elétrico foi alvo de

uma reestruturação de investimentos, desta vez, comandada pela iniciativa privada.

No Brasil, um dos fatores que impulsionaram esta transformação no setor foi a foi a

Lei Nº 8.031, de 12 de abril de 1990, que, em seu Art. 1°, instituía o Programa

Nacional de Desestatização (PND), assinada pelo presidente Fernando Collor e que

tinha objetivos claros sobre o que se previa para o papel do Estado. Aqui,

destacamos apenas três objetivos do Programa:

I - reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público; II - contribuir para a redução da dívida pública, concorrendo para o saneamento das finanças do setor público; III - permitir a retomada de investimentos nas empresas e atividades que vierem a ser transferidas à iniciativa privada (BRASIL, 1990).

Porém, neste ínterim, PINHEIRO (2007) aponta que os investimentos em

infraestrutura de geração de energia por parte da iniciativa privada, foram

insuficientes e não o crescimento da demanda do setor elétrico no período que se

deu entre os anos de 1995 e 2001, culminando com a crise energética, chamada

também de “apagão”.

Durante seis anos de adiamento dos investimentos em nova capacidade de geração e transmissão, em 2001 a situação de crise e a ameaça de racionamento se concretizaram. Dessa maneira, a crise de racionamento de energia ocorrida no ano de 2001, no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso (1999 – 2002), acabou por revelar falhas e limites do novo modelo, como a falta de investimentos em geração e em transmissão de energia elétrica, fato que levou à reformulação do modelo. Tal crise permanece sendo utilizada como argumento favorável à expansão do sistema elétrico. (PINHEIRO, 2007, p.18)

Apesar deste panorama, é da década de 90 que surgem os marcos jurídico

e regulatório que amparavam dois novos agentes de geração de energia: a Lei

9.074, de 1995, que cria a figura do “Autoprodutor” e do “Produtor Independente” de

energia e o Decreto nº 2003 de 10 de setembro de 19968, que regulamenta a

produção destes, o que deu abertura para que várias empresas atuassem na

produção, geração e transmissão de energia, tanto para uso exclusivo quanto

comercializável. Em suma, uma efetiva apropriação do setor por grupos privados

passou a ganhar destaque, resultando na substituição paulatina de um modelo

8 Art 2º, parágrafo II, do Decreto nº 2003 de 10 de setembro de 1996, que “Regulamenta a Produção

de Energia Elétrica por Produtor Independente e por Autoprodutor e dá outras providências”.

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estatal para um modelo empresarial. Tais empresas se figuram não somente entre

as que consomem elevadas cotas de energia, mas também se apropriam dos meios

de produção dessa energia, isto é, das infraestruturas propriamente ditas, além de

fundirem investimentos internacionais com capital nacional para a construção de

hidrelétricas. Este modelo é o que prevalece na atualidade.

Dentre as principais indústrias eletrointensivas com capital internacional que investem na construção de hidrelétricas podemos destacar Alcoa Alumínio (EUA), CVRD (EUA), BHP Billiton (Reino Unido), e Alcan Alumínio (Canadá). Já entre as empresas que têm capital nacional podemos destacar: Votorantin Cimento, Camargo Corrêa Metais, Camargo Corrêa Cimentos, Companhia Brasileira de Alumínio. Essas empresas têm se utilizado da estratégia de se unirem em consórcios para participar das licitações, agregando-se com outras empresas que não necessariamente estejam ligadas ao setor industrial eletrointensivo, mas que desempenham uma importante função na construção ou financiamento das barragens, na exploração de água ou do consumo da energia produzida (FOSCHIERA, 2009, p.128 – grifo nosso)

Elas são responsáveis por todas as fases de concepção de

empreendimentos energéticos: atuam desde a contratação de empresas de

consultoria9 para a realização dos estudos técnicos de viabilidade e para a

elaboração dos Estudos de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental, até

a administração destes empreendimentos, sendo proprietárias de muitas PCHs10 –

Pequenas Centrais Hidrelétricas – e CGHs11 – Centrais Geradoras Hidrelétricas ou

UHEs. No entanto, nem sempre são as que atuam sozinhas no financiamento das

obras, como veremos mais adiante.

No modelo anterior, a geração, a transmissão e a distribuição eram consideradas monopólios naturais. O novo sistema tinha como finalidade promover a competição onde fosse possível, ou seja, na geração e na comercialização (...). O setor elétrico brasileiro passou de um contexto de predomínio estatal, ambiente regulado e áreas de concessão, onde o

9 Um dos exemplos que evidenciam que as consultoras ambientais - responsáveis pelos estudos

técnicos de empreendimentos hidrelétricos - têm relação com as próprias empresas proponentes dos projetos, é o fato da consultora CNEC, responsável pelo EIA/RIMA de Tijuco Alto, já ter pertencido ao grupo “Camargo Corrêa”, uma das eletrointensivas apontadas por FOSCHIERA (2009). Porém, recentemente a CNEC foi vendida a um outro grupo estrangeiro do ramo, a empresa australiana WorleyParsons. Ver mais em: http://www.brasileconomico.com.br/noticias/nprint/74328.html 10

Entende-se por Pequena Central Hidrelétrica uma central hidrelétrica com potência entre 1 MW e 30 MW, cuja extensão do seu reservatório não ultrapasse 3km² ( ou 300ha) de área alagada. Opera a “fio d’água”, o que significa que seu reservatório não altera substancialmente o fluxo de água do rio (ANEEL, 2011). 11

Centrais Geradoras Hidrelétricas são usinas com potência instalada de até 1000kw (1MW) que necessitam apenas de um simples registro para funcionar (ANEEL, 2011)

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estado tinha propriedade dos ativos, controlava a operação, regulava os preços e serviços e o planejamento era determinativo, para um contexto baseado na livre iniciativa; na competição, na geração e na comercialização e na regulação dos preços para a transmissão e para a distribuição (MMA, 2006, p.24).

Se antes a geração e o controle das fontes de energia eram

majoritariamente de tutela do poder público, atualmente, a elevada demanda de

energia destes segmentos industriais e a regulamentação específica da modalidade

autoprodutora, permitem que o setor privado se aproprie da geração e do consumo

de parte da energia hidrelétrica, interferindo não só na transferência de

responsabilidades do poder público para o poder privado, mas também favorecendo

substancialmente a monopolização e privatização do setor hidrelétrico no país,

constituindo o Gilberto Cervinski, membro da Coordenação Nacional do MAB,

denomina de “latifúndios energéticos”.

Grupos que na época trabalhavam como empreiteiras, como a Camargo Corrêa e a Votorantim, são agora donos de barragens. Mas, quando o setor elétrico foi privatizado, a situação piorou porque todos os avanços que havíamos conquistado foram sendo desrespeitados pelas empresas (CERVINSKI, 2007).

Estes aspectos característicos de um modelo de geração de energia cada

vez mais privatizado demonstram que por trás de um discurso de geração de

empregos, de progresso e de desenvolvimento local que viriam “naturalmente”

acompanhados da instalação destes grandes projetos, está a intenção mais direta

da construção das UHE’s: a geração de energia para o abastecimento de indústrias

eletrointensivas. Tal constatação se evidencia devido à presença na região da CBA.

Como já apontamos, a CBA possui um complexo metalúrgico no município de

Alumínio (SP) e grande parte da sua produção é voltada para a exportação (ver

capítulo 1). Como o processo de produção do alumínio carece de alto consumo de

energia, fica clara a intencionalidade da CBA na construção da barragem de Tijuco

Alto, que busca a sua suficiência energética (INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL,

2011). No jogo entre discursos e reais interesses, revelam-se os conflitos.

A opinião pública por sua vez é manipulada através de polpudas somas investidas na propaganda do governo e das obras, a nível federal, estadual e regional, ocupando rádios, jornais e televisão. Na propaganda as usinas são vendidas como sinônimo de desenvolvimento. Oculta-se que grande parte dos agricultores que tem suas terras desapropriadas para a

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construção das usinas não tinha acesso a energia elétrica antes da obra e não o terá depois (SCALABRIN, 2006).

Carlos Vainer é incisivo ao afirmar que estes projetos

são empreendimentos que consolidam o processo de apropriação de recursos naturais e humanos em determinados pontos do território, sob lógica estritamente econômica, respondendo a decisões e definições configuradas em espaços relacionais exógenos aos das populações/regiões das proximidades dos empreendimentos(VAINER [1992, p. 34] apud PINHEIRO [2007, p.31]).

Diante do panorama exposto, nota-se que analisando a prática para além do

discurso do desenvolvimento e crescimento econômico, os benefícios sociais destes

empreendimentos são questionáveis. O que se apresenta é o anseio de uma

empresa privada pela sua soberania energética, a despeito dos interesses das

comunidades locais diretamente afetadas pela construção destas barragens e da

diversidade de usos e formas de apropriação dos territórios por estas mesmas

comunidades. Ana Esther Ceceña (2009) acredita que atualmente o cenário é de

conversão da natureza em elementos de disputa hegemônica, transformando os

territórios em peças-chave do mercado internacional de bens primários e onde

muitas vezes as comunidades locais são confrontadas com uma dinâmica

econômica que não corresponde aos seus modos de vida.

3.2 OS RECENTES INVESTIMENTOS NO SETOR ENERGÉTICO: O EXEMPLO

DO PAC

Atualmente, muito se fala de modelos alternativos para geração de energia,

tais como fontes de energia eólica e biomassa, por exemplo, consideradas mais

limpas do que outras matrizes energéticas, como a termoelétrica. No entanto, o

modelo de geração de energia hidrelétrica ainda é o predominante, possuindo

aproximadamente 82.073MW de potência instalada, com aproveitamento de 70,80%

desta capacidade disponível, de acordo com dados do Ministério de Minas e

Energia, de setembro de 2011. Ainda que se fale em alternativas e modelos

energéticos mais “limpos” e menos impactantes, num contexto de fortes restrições

socioeconômicas e ambientais, mas também de incremento da tecnologia para a

exploração de outras fontes, a realidade aponta que o modelo hidrelétrico ainda é o

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prevalecente. Ao que indicam os planos para o setor, a produção de energia

hidrelétrica continuará sendo por muitos anos a principal fonte de geração de

eletricidade no país. Estima-se que aproximadamente 50% da necessidade de

expansão da capacidade de geração será de origem hídrica. (ANEEL, 2002)

O Brasil faz parte do grupo de países em que a produção de eletricidade é maciçamente proveniente de usinas hidrelétricas. Essas usinas correspondem a 75% da potência instalada no país e geraram, em 2005, 93% da energia elétrica requerida no Sistema Interligado Nacional – SIN. Cumpre notar ainda que apenas cerca de 30% do potencial hidrelétrico nacional se encontra explorado, proporção bem menor do que a observada nos países industrializados. (MME, 2007, p. 28)

Figura 7 – Matriz de energia elétrica brasileira – capacidade instalada. Fonte: MME, 2011

O que no passado marcou a expansão econômica é visto hoje como um

condicionante da velocidade do crescimento, ou seja: não basta apenas buscar cada

vez mais o crescimento econômico, é necessário que esse crescimento seja também

cada vez mais rápido. Impulsionado por uma forte parceria entre poder público e

privado, através das chamadas PPPs (Parcerias Público-Privadas) bem como entre

governos federais, estaduais e municipais, a construção de empreendimentos

hidrelétricos continua em crescente expansão, ampliando sua importância para a

economia do país. A disseminação destes projetos inclusive faz parte de pacotes de

investimentos contidos no PAC12, do governo federal. No que concerne à geração de

12

Consiste num programa voltado para a aceleração no crescimento econômico do Brasil, com investimentos públicos, privados e estatais, voltados para infraestruturas nas áreas de logística

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energia hidrelétrica, o pacote contempla o financiamento de Usinas Hidrelétricas

(UHEs) em todas as regiões do país, bem como de Pequenas Centrais Hidrelétricas

(PCHs).

Independente do porte destes empreendimentos, obras impactantes de

infraestrutura energética já fazem parte dos planos de desenvolvimento, tanto nas

fases do PAC1 (2007- 2010) quanto no PAC2 (2011 – 2014). As figuras a seguir

apresentam os investimentos em energia previstos na 2ª etapa do programa e as

diferenças no direcionamento das verbas por matriz energética.

Figura 8 – Investimentos em fontes de energia hídrica. Fonte: Relatório PAC 2 – Energia, 2010

Figura 9 - Investimentos em fontes de energia alternativas.Fonte: Relatório PAC 2 –

Energia, 2010

Em termos comparativos, observa-se uma expressiva diferença nos

investimentos para as duas categorias de fontes de energia. Enquanto o

(transporte: ferrovia, hidrovia, rodovia), energia, cidades, habitação, energia, entre outras. Mais informações, consultar: http://www.brasil.gov.br/pac

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investimento total para as fontes hídricas é de R$116,2 bilhões de reais, os

investimentos em fontes alternativas são de R$ 9,7 bilhões, o equivalente a uma

verba 12 vezes menor. São dados que reforçam a continuidade e prevalência do

modelo de geração hidrelétrico. Informações do relatório nº 5 do PAC2 (Energia)

demonstram que somente na Região Sul, foram contemplados 20 (vinte) projetos de

construção de usinas hidrelétricas, sendo 8 (oito) delas no estado do Paraná, como

se vê na figura a seguir.

Figura 10 – UHEs previstas pelo PAC – Região Sul. Fonte: Relatório PAC 2 – Energia,

2010

Dentre os empreendimentos hidrelétricos previstos para o PAC na região

Sul, observa-se que a UHE Tijuco Alto, representada em cor roxa, estava nos planos

desde o PAC1, mas tem sua conclusão prevista para além do ano de 2010, ou seja,

após o período inicial, que valia de 2007 a 2010. Além desta, outras três UHEs -

Salto Grande, Telêmaco Borba e Baixo Iguaçu - são projetos na mesma condição.

Destaca-se, neste meio, a UHE Mauá, também contida nos investimentos do PAC1

e que, apesar de grande avanço nas obras, teve seu processo interrompido pelo

MPF, devido às denúncias direcionadas ao ex-presidente Rasca Rodrigues, do

Instituto Ambiental do Paraná (órgão responsável pelo licenciamento ambiental no

estado). Ele é acusado de conceder licença prévia para a UHE Mauá em

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desconformidade com a legislação vigente, sendo também apontado como

beneficiado pela sua dupla atuação, tanto no IAP quanto como conselheiro fiscal da

Companhia Paranaense de Energia (Copel), o que indica favorecimento da sua

empresa pela concessão da licença. Outras irregularidades foram apontadas

também nos Estudos de Impacto Ambiental desta hidrelétrica, que não previam a

ocupação e as compensações ambientais dos impactos em terras indígenas kaigang

e guarani. 13 A propósito, a empresa responsável pela consultoria ambiental e

elaboração dos estudos é o Consórcio CNEC, o mesmo que realizou os últimos

estudos de Tijuco Alto.

Apesar disso, para o PAC 2, previsto entre os anos de 2011 à 2014, já estão

contempladas as UHE São João, Cachoeirinha e Paranhos, no Paraná. A tabela

abaixo, retirada do relatório intitulado “Balanço de 4 anos: 2007 – 2010” no Paraná

indica a continuidade dos investimentos do PAC no estado, com ênfase em obras do

eixo energético.

Tabela 7 - Investimentos do PAC no Paraná (em milhões de reais). Fonte: Relatório PAC Paraná – Balanço de 4 anos: 2007-2010. Dezembro de 2010

13

Maiores informações podem ser encontradas nas notícias “Justiça cassa deputado por liberar obra de hidrelétrica” e “Índios terão de ser compensados pela construção da Usina Mauá”, ambas do jornal A Gazeta do Povo; também em “Bacia do Rio Tibagi é declarada território indígena kaigang e guarani”, da assessoria de comunicação do MPF, todas datadas de outubro de 2011 (links disponíveis em “sites consultados”)

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Por ser um empreendimento de propriedade e interesse exclusivo da CBA,

surpreende o fato da UHE Tijuco Alto estar contemplada nos projetos previstos para

o PAC – do governo federal - no estado do Paraná. Para Kureda (2008):

É difícil afastar a impressão de que estamos diante de uma decisão tomada. Uma decisão política, diga-se de passagem, de construir uma UHE para favorecer uma única empresa – eletrointensiva – pagando o preço da devastaçao ambiental e do sofrimento de milhares de pessoas que fazem parte das comunidades do Vale do Ribeira, como quilombolas, pescadores e ribeirinhos.

Isto demonstra que do montante dos 500 milhões de reais previstos nos

custos totais para concretização do projeto, grande parte provém de dinheiro

público, apesar de não haver benefícios diretos para a população no geral, que

apenas arca com as inseguranças e as consequências negativas, caso efetivamente

Tijuco Alto saia do papel.

3.3 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O BNDES, AS PPPS E O MAB

Um dos maiores reflexos de que há maciça transferência de dinheiro público

a empreendimentos privados, é representado pela atuação do BNDES, o Banco

Nacional de Desenvolvimento, empresa pública federal, que “é hoje o principal

instrumento de financiamento de longo prazo para a realização de investimentos em

todos os segmentos da economia, em uma política que inclui as dimensões social,

regional e ambiental”. De acordo com o seu site institucional, o BNDES destina

apoio financeiro a uma diversidade de áreas: Agropecuária, Comércio, Serviços e

Turismo, Cultura, Desenvolvimento Social e Urbano, Exportação e Inserção

Internacional, Indústria, Infraestrutura, Inovação, Meio Ambiente e Mercado de

Capitais.

No entanto, não é de hoje que o BNDES financia e apóia projetos da

iniciativa privada.

No processo de privatização, desencadeado pelo PND, o BNDES vai ter papel fundamental, sendo designado como gestor do Fundo Nacional de Desestatização (FND). Cabe-lhe, assim, licitar e contratar os prestadores de serviços que atuariam no PND e supervisionar e acompanhar suas ações; recomendar ao Conselho Nacional de Desestatização (CND) as condições gerais de venda; executar as decisões do CND; divulgar ao público todas as etapas e os resultados do processo, entre outras. Para tanto, criou três

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áreas exclusivas para atuar nas privatizações: Área de Desestatização (AD), Secretaria Geral de Apoio à Desestatização (SD) e Áreas de Serviços de Privatização (ASP). Também coube ao BNDES, junto com outras instituições, a função de agente financiador das privatizações (ABREU, 1999 apud FOSCHIERA, 2009, p.114).

Atualmente, na área de infraestrutura destaca-se a responsabilidade em

promover o PAC, cujo andamento das obras e ações, o banco destaca como

prioridade, servindo, portanto, como indutor do desenvolvimento econômico e social

do Brasil e promovendo não só o estímulo ao investimento privado em infraestrutura,

mas também ampliando os investimentos públicos. Dentro dos investimentos deste

porte, incluem-se aí os três segmentos do setor elétrico: geração, transmissão e

distribuição de eletricidade, tendo como empreendimentos passíveis de apoio as

hidrelétricas, termoelétricas (incluindo nuclear) e cogeração a gás ou a óleo. Busca,

desta forma, ampliar o apoio na modernização do setor elétrico visando garantir

suprimento energético com “qualidade, segurança e tarifas justas” para a economia

e para a sociedade, de forma geral (BNDES, 2011).

Uma ferramenta utilitária para saber alguns dos projetos de infraestrutura –

não apenas os de energia, mas de outros ramos - que vem sendo financiados pelo

BNDES é o “Mapa interativo de projetos apoiados pelo BNDES”, inserido num

projeto de monitoramento intitulado “Plataforma BNDES” 14

. Neste site é possível

gerar mapas que localizam onde estão e quais são os empreendimentos que o

BNDES financia. Isso é feito através da filtragem de informações, como tipo de

projeto, localização, valor de operação, ou também realizar uma busca livre, a partir

de palavras-chave. Também é possível sobrepor algumas informações aos mapas

gerados, tais como terras indígenas, áreas de biomas, áreas protegidas, dentre

outras. Abaixo, demonstramos um recorte feito através de pesquisa contendo os

termos “UHE” e “PCH”: o primeiro mapa é resultado da busca das hidrelétricas e o

segundo de pequenas centrais hidrelétricas que têm financiamento do banco. Onde

há marcadores em amarelo são as áreas em que se encontram um

empreendimento; nos marcadores em azul, são conjuntos de empreendimentos

concentrados numa mesma área. No mapa virtual, é possível ampliar as imagens e

visualizar o nome e a descrição destes empreendimentos.

14

A “Plataforma BNDES” pode ser acessada em: http://www.plataformabndes.org.br/mapas/

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Figura 11 – Projetos apoiados pelo BNDES: Usinas Hidrelétricas (UHEs). Fonte:

Plataforma BNDES, 2011

Figura 12 – Projetos apoiados pelo BNDES: Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs - recorte). Fonte: Plataforma BNDES, 2011

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Devido ao amplo apoio dado pelo BNDES aos projetos de infraestrutura e

amplamente ao PAC, a UHE Tijuco Alto está contemplada no programa e nas

verbas destinadas ao setor, embora, de certa maneira, este seja um fato um tanto

quanto contraditório, por uma série de fatores. A UHE Tijuco Alto se trata de um

empreendimento privado e de uso exclusivo da CBA, portanto, de interesse maior de

uma empresa; já foi questionada inúmeras vezes pelos órgãos ambientais, tendo um

processo de licenciamento bastante problemático e que põem em cheque sua

viabilidade. Ao mesmo tempo em que apresenta este quadro conflituoso, marcado

por resistência social, surpreende o fato de ter sido “reavivada” num dos principais

programas do Estado para a construção de infraestruturas.

Estes apontamentos reafirmam que há um forte impulso do poder público em

multiplicar o número de obras, sem que sejam revistos ou considerados os

desdobramentos e os impactos destas ou que sejam minimamente cumpridas as

condicionantes legais para a sua execução, demonstrando a prioridade do

“crescimento a qualquer custo” executado em detrimento dos passivos

socioambientais deixados como rastro deste mesmo progresso econômico.

Este caso e muitos outros expõem um padrão de investimentos que na

atualidade é marcado pelas Parcerias Público-Privadas, que atuam fortemente na

concepção de megaprojetos não só no país, mas na América Latina, como um todo.

De acordo com a Lei Federal nº 11.079 de 2004, a definição para o termo, no seu

artigo 2º é: “Parceria público-privada é o contrato administrativo de concessão, na

modalidade patrocinada ou administrativa.” Outra definição, mais explicativa é:

Uma PPP é uma parceria onde o setor privado projeta, financia, executa e opera determinada obra/serviço, objetivando o melhor atendimento de uma determinada demanda social. Como contraprestação, o setor público paga ou contribui financeiramente, no decorrer do contrato, com os serviços já prestados à população, dentro do melhor padrão de qualidade aferido pelo Poder concedente (PREFEITURA DE PORTO ALEGRE, 2011).

Estas parcerias são interpretadas por David Harvey (2005b) como um sinal

de um novo empreendedorismo, presente tanto no campo quanto na cidade. Dentro

deste modelo, ele aponta que os governos locais se agregam com a iniciativa

privada em busca de fontes externas de investimentos diretos e canais de geração

de empregos. No entanto, a PPP possui caráter especulativo, ao contrário do

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desenvolvimento planejado puramente pelo poder público, que é mais racional e

coordenado. Neste sentido, Harvey afirma que um problema recorrente destas

parcerias é a sujeição dos obstáculos e riscos gerados pela especulação, fazendo o

setor público assumir sempre os riscos dos problemas que possam vir a acontecer,

enquanto o setor privado assume apenas os benefícios destes empreendimentos,

caso eles dêem certo. Esta problemática se insere perfeitamente no caso de Tijuco

Alto, na medida em que uma empresa privada, a CBA, do grupo Votorantim, é a

maior beneficiária da construção da hidrelétrica, enquanto restará às populações

afetadas e ao poder público como um todo, dar conta das consequências e dos

impactos que transformarão a vida de algumas cidades no Vale do Ribeira. Será

cobrada do Estado, e não da empresa, a responsabilidade na resolução dos

problemas advindos desta obra.

O padrão de investimentos observado não é só encontrado no Brasil, mas

na América Latina como um todo. Uma situação semelhante é observada no projeto

IIRSA (Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sulamericana). De

acordo com o website do projeto, é “uma iniciativa de doze países sul-americanos

que têm por objetivo promover o desenvolvimento da infra-estrutura de transporte,

energia e comunicações sob uma visão regional” (IIRSA, 2010). A IIRSA surgiu

efetivamente a partir de uma reunião de doze chefes de Estado, que ocorreu em

agosto de 2000, na cidade de Brasília, e resultou de um acordo entre esses países

para a elaboração de um mega-plano para a integração física do continente, tendo o

apoio técnico-financeiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), da

Corporação Andina de Fomento (CAF), do Fondo Financiero para el Desarrollo de la

Cuenca del Plata (FONPLATA) e também do BNDES. Estes órgãos financiadores

também têm a característica de financiarem projetos particulares, fundindo capital

público com privado e têm papel preponderante no investindo para implantação de

infraestruturas diversas na América Latina.15

A despeito de todo esse sistema e para além dos modelos de investimentos

ancorados pelas PPPs, um movimento tem feito contraponto às formas de

apropriação da água e da energia. O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)

vem há 20 anos posicionando-se contra estas estratégias de privatização do setor

elétrico e tem como lemas principais “Água e Energia não são Mercadorias!” e “Água

15

Sobre a IIRSA, ver ZIBECHI (2010); CECEÑA (2009); ACHKAR e DOMINGUEZ (2006)

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e Energia são para a Soberania!”. Além disso, questiona os altos custos das tarifas

de energia pagas pelos consumidores residenciais, a péssima qualidade do serviço

oferecido pelos empreendedores e também atuam denunciando as constantes

violações de direitos humanos na construção de barragens.

De acordo com o MAB, existe a estimativa de que 1,3 milhões de brasileiros

já tenham sido prejudicados pela instalação de usinas, entre eles proprietários de

terras, comunidades tradicionais – indígenas, ribeirinhos, quilombolas -, pequenos

agricultores, dentre outros, geralmente afetados pelas mudanças decorrentes destes

empreendimentos. Enquanto se multiplicam os projetos de usinas em todo o Brasil,

em novembro de 2010, um relatório da Comissão Especial do Conselho de Defesa

dos Direitos da Pessoa Humana apontou 16 direitos humanos frequentemente

violados, verificados a partir do estudo de caso de algumas barragens já construídas

(MAB, 2011).

Se por um lado é importante reconhecer a exploração de recursos natrais como uma das características centrais do desenvolvimento nacional; por outro, devem-se evitar formulações simplistas sobre a geração de injustiças ambientais e impactos ambientais associados ao crescimento da economia (IORIS, 2010, p.219).

Segundo o relatório apresentado em 2010, foram identificados e analisados

16 direitos humanos sistematicamente violados no processo de implantação de

barragens no Brasil.

Os estudos de caso permitiram concluir que o padrão vigente de implantação de barragens tem propiciado, de maneira recorrente, graves violações de direitos humanos, cujas conseqüências acabam por acentuar as já graves desigualdades sociais, traduzindo-se em situações de miséria e desestruturação social, familiar e individual. (APROVADO..., 2010)

Entre os 16 direitos violados apontados, estão, por exemplo, o direito à falta

de informação e participação; à liberdade de reunião, associação e expressão; à

moradia adequada; à melhoria contínua das condições de vida; a plena reparação

das perdas; direito às práticas e os modos de vida tradicionais, assim como o

acesso e preservação de bens culturais, materiais e imateriais. Isto apenas para

citar alguns. De acordo com o relatório, a Comissão acolheu algumas barragens em

todo o país para acompanhar as denúncias relativas a elas: Tucuruí (PA), Acauã

(PB), Cana Brava (GO), Aimorés (MG e ES), Emboque (MG), Fumaça (MG) e Foz

do Chapecó (SC e RS), contemplando as 5 regiões. Este documento demonstra

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uma infeliz, porém real constatação: a de que existe um “padrão nacional” de

violação dos direitos humanos em barragens, apontando como principais

responsáveis as empresas donas das barragens, os governos e o Estado brasileiro

(MAB, 2011).

Para o MAB as PPPs significam descaradamente a privatização da água,

embora mascaradas por uma parceria que também é pública. Ao mesmo tempo

representam somente o interesse de empresas privadas, que atuam na busca de

melhores negócios, e não em benefício da população. Por esta razão, tem apoiado

recentemente uma campanha da Federação Nacional dos Urbanitários (FNU)

chamada “Água para o Brasil - Diga não às PPPs”.16 No manifesto da campanha,

lançado no site, a FNU, juntamente a entidades populares e sindicais se coloca

radicalmente contra as PPPs, por

entender que essa ação seria uma nova forma de privatização do setor, algo que nem mesmo os governos neoliberais dos anos 90 conseguiram fazer. E que já se mostrou catastrófica em vários países, levando a população às ruas cobrando e em alguns casos, conseguindo a reestatização, em razão dos péssimos serviços prestados e ao aumento abusivo de tarifa (ÁGUAS PARA O BRASIL, 2011)

Figura 11 – Cartaz da campanha “Diga não às PPPs”. Fonte: ÁGUAS PARA O BRASIL,

2011

Segundo informações do MAB, uma das principais frentes de luta é a

ferrenha oposição ao modelo energético adotado pelo Brasil e pela defesa dos

direitos dos atingidos. Eles afirmam que há mais de duas décadas o país já

“produziu mais de um milhão de atingidos por esse modelo e 70% desse total não

16

Para saber mais sobre a campanha, acesse http://www.aguaparaobrasil.com.br/index.php

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recebeu nenhum tipo de indenização”. Consideram falacioso o argumento de que o

desenvolvimento do setor energético significa amplitude de distribuição e acesso à

energia elétrica, pois, segundo eles, há muitas pessoas que moram ao lado de

grandes empreendimentos hidrelétricos e não possuem acesso à energia, como é o

caso de assentamentos localizados em Marabá e Eldorado dos Carajás, ambas as

cidades no estado do Pará, próximas à gigante UHE de Tucuruí e que, até hoje

sofrem com a ausência de energia (MAB, 9/08/2011).

Além de se posicionarem contrários a este modelo privatizador e excludente

e, ao mesmo tempo, em favor de que os atingidos por barragens tenham seus

direitos assegurados, o movimento também procura divulgar alternativas à geração

de energia. Um dos exemplos é o desenvolvimento de um projeto de aquecimento

de água através de placas solares, em substituição dos chuveiros elétricos, nos

estados de Minas Gerais, São Paulo e na Região Sul. Consiste num método mais

barato e acessível, e vem sendo aplicado principalmente em casa de reassentados

do próprio movimento. Estas e outras ações podem ser visualizadas no quadro

abaixo, que dá destaque a algumas notícias que foram divulgadas no site do MAB

no ano de 2011.

Fonte: Notícias extraídas de http://www.mabnacional.org.br/ (2011)

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Atamis Foschiera (2009), em sua tese sobre a trajetória do MAB frente às

políticas do setor energético, ressalta o momento atual da centralidade da luta do

movimento.

A “nova” forma de atuação proposta e que o MAB tem implementado, destaca dois novos eixos de ação: a discussão do preço da energia e a atuação do Movimento no meio urbano, dentro da concepção de “atingido pelo preço da energia”. Estes dois eixos se apresentam de forma imbricada, sendo que o debate do preço da energia é uma das formas do MAB se vincular a movimentos e instituições urbanas (p.309)

E complementa, apontando novos rumos para o debate:

A questão do preço da energia está relacionada ao processo de privatização do setor energético e à forma de como vêm sendo definidas as regras que determinam a tarifa de energia, ou seja, a transformação da energia em mercadoria, como destaca o MAB. Neste tema, a ação do movimento se dá pelo questionamento da cobrança de preços elevados aos consumidores cativos e o favorecimento das indústrias eletrointensivas. Tratando mais especificamente essas indústrias, o MAB relata que a produção das mesmas trás pouco retorno social (FOSCHIERA, 2009, pp.309 e 310)

Analisando o que foi até então exposto, observa-se claramente a

emergência e a concretização de um cenário que privilegia a tomada do setor

hidrelétrico pelo ramo empresarial, através de programas de investimentos como o

PAC e da atuação conjunta do BNDES, possibilitando que empreendimentos

particulares sejam financiados por dinheiro público. Tais negociações se fortalecem

especialmente com o incremento das Parcerias Público-Privadas como modelo de

gestão de investimentos. Esta etapa marca o avanço das medidas de privatização

do setor elétrico, iniciada na década de 90 e marcada pela proliferação de indústrias

eletrointensivas, que gerem seus negócios e produzem energia para uso e/ou

comercialização exclusiva. Sobre este cenário, emerge também a sua crítica,

elencada através de movimentos sociais como o MAB que passam a questionar as

formas de apropriação da água e da energia e buscam alternativas para esta

problemática, que não se resume apenas pontualmente, mas trata-se de questão de

ordem sistêmica.

Após este balanço, passaremos adiante a produzir um diálogo entre os

autores acadêmicos que têm se dedicado à questão da construção de barragens e

dos seus impactos, ampliando um pouco a discussão de conceitos que amparam o

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entendimento do tema. Tais autores têm identificado certo padrão de situações que

promovem a expropriação de direitos sociais e ambientais na construção destas

infraestruturas, contribuindo assim para pensarmos no que elas representam de um

ponto de vista mais estrutural.

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4 DESDOBRAMENTOS DA IMPLANTAÇÃO DE BARRAGENS: ENTRE O

DESENVOLVIMENTO E O CONFLITO

Até o momento, houve um esforço em esclarecer alguns pontos principais

concernentes ao projeto da Usina de Tijuco Alto, buscando-se elucidar questões

específicas, tais como: análise dos aspectos históricos e dos impactos que

marcaram os longos anos de tentativas de implantação desta barragem;

desconstrução de alguns pontos controversos do seu último Estudo de Impacto

Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental, fortalecendo, também, neste sentido,

uma crítica aos processos de licenciamento ambiental; e compreensão de que a

UHE Tijuco Alto é apenas mais uma hidrelétrica pensada dentro de um contexto

mais amplo de investimentos do poder público no setor, em especial do governo

federal, aqui problematizado através do Programa de Aceleração do Crescimento.

O capítulo 4 é composto de dois itens: no primeiro tópico, o objetivo é abrir

um panorama mais genérico para se refletir a respeito dos conflitos recorrentes que

podem ser apontados na instalação de usinas hidrelétricas. Através de um diálogo

com autores que se dedicam a pesquisar estudos de caso de outras hidrelétricas no

Brasil, é possível observar relações e semelhanças entre os projetos, fato que

expressa na atual conjuntura, um determinado padrão de transformações do espaço

e, consequentemente, de impactos e de interpretação destes contextos.

No segundo tópico, optou-se por articular alguns conceitos que permeiam a

lógica de produção do espaço, trazendo autores – em sua maioria geógrafos – que

enriquecem o debate do ponto de vista conceitual. Serão abordadas brevemente as

diferentes concepções que se tem do território, o tema do desenvolvimento –

permeado por uma racionalidade unilateral - e a produção do espaço desde uma

perspectiva capitalista, ou seja. São elementos que possuem relações com o tema

das barragens, a partir do entendimento de que a construção destas infraestruturas

compactua com as formas de desenvolvimento no capitalismo atual, apesar de que

o termo “desenvolvimento” pode ser repositório de muitos outros significados.

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4.1 PROCESSOS GERAIS DECORRENTES DA CONSTRUÇÃO DE BARRAGENS

O tema “barragens” vem sendo amplamente pesquisado por diversos

autores e áreas do conhecimento. Na medida em que cresce o número de casos

polêmicos e conflituosos a respeito do tema, crescem também as denúncias de

violação de direitos humanos nos processos de instalação de barragens. Por isso,

compreender as dinâmicas particulares destes projetos, vinculadas a identificação

de aspectos comuns entre eles, torna-se cada vez mais instigador.

As barragens evidenciam um cenário de conflitos dos mais diversos

possíveis, encontrados nas regiões onde já se existem ou onde se planejam a

instalação de projetos de grande porte ou “megaprojetos”. O prefixo “mega” é

entendido desde dois aspectos: um se refere às dimensões destes

empreendimentos, que além de ocupar áreas extensas no espaço, também

provocam impactos proporcionais. O segundo aspecto se deve aos grandes volumes

de capitais que são injetados para se viabilizar uma obra como uma hidrelétrica.

Esta denominação vai de encontro com aquilo que RIBEIRO (2005, p.3)

interpreta como sendo “projetos de infraestrutura de grande escala” (ou PGEs), os

quais possuem algumas características estruturais básicas: tamanho do capital, dos

territórios e das pessoas controladas por estes projetos, elevado poder político e

magnitude dos impactos ambientais e sociais, inovações tecnológicas e

complexidade de redes que engendram (RIBEIRO apud FRANÇA, 2011, p.7). Outra

denominação, desta vez empregada por VAINER (1996) também partilhada por

FRANÇA (2011) é de “Grandes Projetos de Investimento” (ou GPIs), que são

reflexos de um modelo de desenvolvimento que prioriza o crescimento econômico

em detrimento de outros fatores. O autor acrescenta que estes GPIs abrangem

grandes unidades produtivas que não se restringem apenas às iniciativas

relacionadas ao setor energético, como é o caso das hidrelétricas, mas também

representam outros setores, como a mineração, a indústria de petróleo, atividades

portuárias, exploração de florestas, etc..

Quando se debatem a magnitude dos impactos destas infraestruturas, o

objeto deste estudo, Tijuco Alto, é prova de que as interferências – em especial as

do âmbito socioeconômico - se dão muitas vezes antes do início das obras, geradas

muitas vezes em função das expectativas das populações ameaçadas. Quando a

CBA anunciou o projeto na região do Vale do Ribeira e deu seus primeiros passos

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na compra de terras que seriam inundadas pelo reservatório, cravando placas nos

terrenos que passaram a ser de propriedade da empresa, ocorreu,

consequentemente, um reordenamento territorial seguido de desorganização social.

Aos poucos houve um refluxo de populações para localidades distantes,

promovendo marginalização social a grupos que estavam consolidados há anos em

suas terras e que delas obtinham sua subsistência (JERONYMO, 2007).

Desta perspectiva, Sevá Filho (2008) afirma que é possível identificar, no

estudo das hidrelétricas, um padrão de desordem social e territorial, que atinge

desde as Áreas de Influência Direta17 - com mais intensidade-, até as Áreas de

Influência Indireta18. Três dimensões que acompanham a instalação de uma UHE

fundamentam estas transformações: a dimensão técnica, a dimensão econômica e a

dimensão territorial. Nos locais onde estão previstas a construção de barragens são

alterados elementos que compõem essa tríade. Modificam-se os padrões técnicos

do local, as relações econômicas e as relações territoriais. A fixação de novas

atividades no entorno da represa, promove inevitavelmente a disputa destes

terrenos (e de territórios) entre empreendedor e moradores, simplesmente pelo fato

de que as atividades presentes e as futuras se tornam inconciliáveis.

Neste meio, marcado por profunda ausência de debates e discussões

efetivamente democráticas em torno do projeto, estas transformações são

justificadas e exaltadas como sendo de interesse público e nacional. Predomina a

retórica do consenso, ou seja, a hidrelétrica corresponde ao interesse de todos e,

por isso, possui uma causa “nobre”, de “interesse maior”, quando comparada, por

exemplo, com aquelas causas e interesses dos que são atingidos por ela. Os

argumentos de convencimento da importância de uma hidrelétrica, independente de

onde esta venha a se localizar, sempre se fundamentam em torno das ameaças de

um novo apagão ou de riscos de déficit de energia (ZHOURI, 2011; BERMANN,

2007).

No entanto, na prática, a incompatibilidade dos distintos usos do território

pelos atingidos e pelo novo projeto hidrelétrico sugere, consequentemente, prejuízos

17

Área de Influência Direta – AID, território em que se dão majoritariamente as transformações ambientais primárias (ou diretas) decorrentes do empreendimento (IBAMA, 2011)

18 Área de Influência Indireta – AII, onde ocorrem os processos físicos, bióticos e antrópicos

espacialmente mais abrangentes (ou regionais) com os quais o projeto estabelece interações principalmente através de efeitos secundários (ou indiretos) (IBAMA, 2011).

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aos cidadãos que ali moram, bem como a destruição de patrimônios naturais e

construídos, como resultado “natural” e imediato da instalação do canteiro de obras

destes empreendimentos. Estas pessoas, que em muitos casos são contrárias às

obras pelas inúmeras perdas que somam ao longo do processo passam a ser

estigmatizadas desde uma “razão hidrelétrica cega”, como minorias que “emperram”,

“prejudicam”, “atravancam” os processos de desenvolvimento e de progresso (SEVÁ

FILHO, 2008; 2011).

O distanciamento proposital e a falta de informação para orientar os

atingidos pela obra apenas contribuem para demonstrar quão difusos são os

argumentos de convencimento das vantagens destes empreendimentos, usualmente

utilizados pelo Estado e pelos empreendedores. Seus benefícios são questionáveis,

pois efetivamente, produzem alterações que pouco ou quase nada tem de positivo

para as populações atingidas, visto que elas são alijadas do debate durante todo o

processo. Como é possível que se afirme, por exemplo, que meeiros residentes na

comunidade de Mato Preto (Cerro Azul) que não tiveram acesso à recompensa pela

perda da terra – já que não eram proprietários – e se deslocaram uma, duas ou até

três vezes em busca de fixação para moradia e trabalho, sem muitas perspectivas,

tenham sido beneficiados com a possível instalação da UHE Tijuco Alto?

Tais concepções das vantagens propostas pelo empreendimento são

incompatíveis com a melhoria da qualidade de vida dos principais afetados; ou seja,

são noções exógenas à realidade dos atingidos. Sevá Filho (2008, p. 47) trabalha

com a proposição de que estas obras expressam métodos de conquista política e de

colonização cultural por parte de grupos que possuem valores externos, “de fora”,

que não visam o bem estar daqueles que estão sendo impactados, mas buscam

apenas reafirmar e ampliar a sua hegemonia. França (2011) partilha desta

compreensão.

Destaca-se também que estes grandes projetos evidenciam a delicada relação que envolve decisões tomadas em grandes centros e a sua aplicação em contextos geralmente distantes deste lócus de tomada de decisão. Neste sentido, não são apenas decisões tomadas geograficamente distantes do local de instalação das obras, mas que geralmente contém diferentes representações sociais sobre uma determinada realidade, ou seja, são diferentes lógicas e racionalidades que se confrontam. (p.8)

Bermann (2007) complementa afirmando que não é apenas a externalidade

do processo que prejudica as populações atingidas, mas também uma proposital

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invisibilidade destes grupos, que, para o empreendedor, simplesmente não existem.

A sua não existência é evidenciada na permanente desconsideração destes grupos

nos processos de tomada de decisão, e a não participação nestes processos implica

no não atendimento dos interesses e propostas que eles têm. Considerar a

existência efetiva implica em aumento de custos de tratamento e a elaboração de

medidas visando atender as demandas destas pessoas.

A acumulação de capital em poucas mãos se instrumenta por meio de negociações entre partes desiguais; os que acabam sendo prejudicados são muitos. Mas são individualmente fracos, envolvidos a contragosto em transações forçadas; pessoas, famílias e até cidades inteiras sendo objetos de logro, de traição, de ameaças (SEVÁ FILHO, 2005, p.285).

Ameaçadas por estas condições, estes cidadãos abdicam das suas

condições de vida e trabalhadores autônomos - capazes de produzir sua própria

subsistência - para se tornarem trabalhadores assalariados, comerciantes,

prestadores de serviço, abandonando assim sua forma tradicional de vida e

tornando-se incapazes de exercê-la (VALENCIO; GONÇALVES; MARCHEZINI,

2009; ZHOURI, OLIVEIRA, 2010).

Neste terreno, arma-se um embate entre o que está por vir e o que já existe.

O “fato hidrelétrico”, aparecendo como inexorável e inquestionável (ZHOURI, 2011),

por si só já subjaz um panorama conflitivo, pois necessita se sobrepor e se apropriar

de um espaço, que, por sua vez, não está vazio. Em alguns casos estes territórios

atingidos por barragens são marcados por outros tipos de lógicas e relações

diferenciadas entre população e natureza, e, na medida em que são construídas,

estas grandes obras têm impactos muito fortes na vida destas pessoas, já que

representam a contraposição de diferentes concepções do que é o território para o

grande capital, de cunho economicista (território-mercadoria) e do que é o território

para estas populações (território-de-vida), local do qual tiram o seu sustento e

subsistência (ZHOURI; OLIVEIRA, 2010; SEVÁ FILHO, 2011)

A cada canteiro de obras, introduzem- se “para sempre” novas noções e novos valores da mercantilização, pois terras, benfeitorias, patrimônios passam a ser vistos apenas como dinheiro, e por fim, a mercantilização da própria força de trabalho e de muitas relações sociais. O investimento em si, o avanço de capital nas contratações e nas compras de insumos cria novas oportunidades de negócios assanhando as contas feitas nos gabinetes das direções financeiras e industriais (SEVÁ FILHO, 2008, p.14).

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Dentro desta lógica neoliberal de mercantilização da natureza, os seus

elementos são destituídos de condição de “bens”, e passam a ser apropriados

enquanto “recursos” em favor de algumas minorias. Como afirma Jeronymo (2007),

fundamentado em Waldmann (1990), o setor hidrelétrico segue a lógica de integrar

espaços ainda não integrados à economia de mercado. Para isso pontuam-se as

potencialidades dos lugares para a instalação de empreendimentos. Tratar a

natureza como mera fonte de recursos e como mais um meio sobre a qual se agrega

valor de mercadoria é um reducionismo extremo da sua relevância; a natureza

passa a ser interpretada desde uma lógica única e limitante, como se o uso de um

rio para o funcionamento de uma hidrelétrica fosse a única possibilidade de uso

deste rio.

Enquanto os chamados recursos [o solo, as terras, as águas, os minérios, a vegetação, o patrimônio genético e biológico das plantas e dos animais] se encontram numa dada situação, existem n rotas de possibilidades de evolução futura. Quando chegam os mega – projetos, são reduzidas as possibilidades a uma só, ou, a um uso tão dominante que os demais usos ficam como “sobras”, magras compensações diante da prepotência da atividade (SEVÁ FILHO, 2005, p. 284 – grifo no original).

A redução da natureza a um uso tão estrito também acaba por limitar a

compreensão de que cada grupo pode se apropriar dela de diferentes maneiras. No

entanto, é reforçada uma única lógica de uso desta, impedindo a aceitação de usos

diferenciados do território. A implantação de usinas hidrelétricas tem significado este

unilateralismo de uso do espaço. Em referência aos processos de licenciamento,

Zhouri (2011) afirma que eles colidem com os modos de vida tradicionais, como de

indígenas, ribeirinhos, quilombolas e outros. Planeja-se uma usina à revelia das

concretas condições dos lugares e da vida das pessoas, havendo negação e

apagamento da diversidade socioambiental e cultural do país. Elas são instaladas,

em muitos casos, em espaços sociais concebidos pelas e para as populações

ribeirinhas, que possuem formas próprias de subsistência a partir da dependência

dos rios. Quando chegam nesses locais, os projetos de construção de

hidrelétricas ocupam espaços já produzidos por estas populações - proprietárias ou

não - e passam a determinar conflitos de uso, já que impõem uma forma de

apropriação do espaço – e da água, em especial - enquanto mercadoria para gerar

eletricidade, contrariando o uso social e de reprodução sociocultural destes grupos,

que usam a água como meio de vida (BERMANN, 2007).

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O diálogo entre autores permitiu, até então, observar a maneira como são

concebidos estes megaprojetos no espaço, impondo, em alguns casos, lógicas

exógenas às dinâmicas sociais pré-existentes. Através da sobreposição de

interesses e da recorrente tentativa de apagamento das populações que habitam o

local planejado para receber um a obra de grande porte, os empreendedores

promovem desordem territorial e perturbação social das populações atingidas,

desconstruindo formas distintas de sociabilidade e existência.

Partindo das lógicas de reprodução do modelo hidrelétrico no espaço no

espaço, com suas formas exclusivas e excludentes de materialização, passamos

adiante para a exposição de algumas noções e conceitos que podem amparar as

discussões do ponto de vista estrutural, entendendo as hidrelétricas como produto

de visões conflituosas sobre o território e como forma uniformizante do

desenvolvimento.

4.2 O CHOQUE DE LÓGICAS NA PRODUÇÃO DO ESPAÇO GEOGRÁFICO:

REFLETINDO SOBRE ALGUNS CONCEITOS

Como se pode observar, um dos aspectos principais que permeiam a lógica

dos megaprojetos é a evidência de uma série de conflitos, oriundos das diversas

concepções que se tem do território apropriado. Jeronymo (2007) nos mostra que há

um conflito de interesses por um mesmo território: para uns ele tem sentido apenas

enquanto fonte de mercadoria, interpretado sob o ponto de vista estritamente

econômico. Para outros, ele faz parte de uma luta pela subsistência, pela

reprodução sociocultural como meio de vida. Há divergências na apropriação do

território.

Haesbaert (2004) traz uma ferramenta que pode facilitar o entendimento da

lógica dos conflitos territoriais, que é o reconhecimento das diferentes noções e

significados do conceito de território que são mais comumente utilizadas em estudos

acadêmicos. A materialidade destas distintas concepções no espaço pode ser uma

das causas de embates territoriais. Para este autor, é possível agrupar as

concepções do território em três vertentes básicas: 1) a política ou jurídico-política,

que é a mais difundida, relacionada em especial ao poder político do Estado; 2) a

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cultural ou simbólico-cultural, que prioriza a dimensão simbólica e objetiva, tendo o

território enquanto produto da apropriação de um grupo; e 3) econômica, que

enxerga o território como fonte de recursos, como produto da divisão territorial do

trabalho.

O fato da lógica territorial dos projetos de infraestruturas estar geralmente

atrelada e fundamentada em uma destas vertentes de interpretação do território,

qual seja, a econômica, não implica, no entanto, que as outras duas lógicas estejam

ausentes na produção deste território; pelo contrário, o fato de serem múltiplas e

simultâneas na sua conformação é que o torna um campo de conflitos por

excelência. E está aí a raiz da questão. Rogério Haesbaert (2004) indica que, apesar

de não muito comum, e, apesar das frequentes abordagens unidimensionais deste

conceito, é necessário encarar o território enquanto espaço híbrido,

multidimensional, que dê conta de incluir a sociedade, a natureza, a política, a

economia e a cultura em constante interação e com múltiplas relações de poder

nestes diferentes eixos; hibridismo que, por sua vez, também gera conflitos

assimétricos, enfocados nos trabalhos de Souza (1995).

No caso da UHE Tijuco Alto, esta imbricação de diferentes concepções e/ou

modos de viver o território fica evidente ao compararmos a lógica territorial

empresarial (estritamente econômica), representada pela CBA, com a lógica

territorial comunitária (que envolve principalmente uma noção simbólico-cultural),

representada pelas comunidades afetadas. Enquanto a empresa interpreta aquele

território como recurso, com características apropriadas tecnicamente para a

instalação de uma hidrelétrica (sic) e encara o rio como “fonte de megawats” para

geração de energia, os moradores que ainda permanecem na comunidade do Mato

Preto, por exemplo, afirmam possuir outras formas de uso do rio e das terras. É

desse equilíbrio entre a natureza – água e terra – que eles retiram seu sustento,

plantam nos seus terrenos hortaliças, frutos, legumes, criam animais. Além disso,

para eles, a comunidade sempre significou um espaço de socialização, de conversa

e interação com os vizinhos. Muitos inclusive se queixam do esvaziamento da

comunidade, da qual restaram apenas casas esparsas; uma moradora reclama da

diminuição das vendas e das rendas na sua mercearia. Portanto, estas noções

conflituosas e por vezes, incompatíveis, se encontram num mesmo espaço-tempo,

reforçando a multidimensionalidade a que se refere Haesbaert.

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Sobre territórios e poder, Souza (1995) enfatiza que a formação de territórios

e territorialidades está fundamentada em relações de poder projetadas no espaço e

que nem sempre os territórios expressam a materialidade destas relações. Para ele,

o território não é necessariamente o substrato, mas sim, um campo de forças,

permeado por um jogo de relações que muitas vezes se superpõem entre si,

formando inúmeros territórios relacionais superpostos e com regras próprias, como é

o caso do poder exercido pelos mandantes do tráfico de drogas nas favelas e

periferias urbanas.

A respeito do caráter diverso apontado pelos autores, são

esboçadas aqui as diferenças nas formas de apropriação do território. Milton Santos

(2000), em seu manifesto intitulado “O Papel Ativo da Geografia” traz um elemento

chave para interpretar o que representam os usos do território para uns

(hidrelétricas) e para outros (populações afetadas). Santos (2000) trabalha com a

dupla “território-recurso” e “território-abrigo”. O primeiro representa a noção territorial

dos atores hegemônicos, que garantem no seu uso a realização de interesses

particulares; o segundo representa a concepção dos atores “hegemonizados”, que

fazem do seu uso um abrigo de forma a garantir sua sobrevivência.

Tais proposições se assemelham muito com as de Paul Little (2001), aos

denominar diferenças na lida com a natureza por parte de dois grupos principais, os

quais ele chama de “povos da biosfera” e os “povos de ecossistemas. Para o autor,

os povos da biosfera são aqueles que não encontram limites para transformar a

natureza em recurso, e, para isso, dispõem de técnicas e tecnologias a seu favor. A

apropriação de recursos se dá numa esfera global. Os povos de ecossistemas são

aqueles que utilizam o território enquanto “abrigo”, como propõe Milton Santos,

garantindo formas de sobrevivência física e cultural e explorando os recursos dentro

de uma escala local (FRANÇA, 2011).

O conflito entre estes dois grupos é travado a partir do momento em que os “povos da biosfera” se apropriam dos recursos que são fundamentais para a reprodução física e social dos segundos. Percebe-se então que são diferentes as lógicas de apropriação da natureza e de produção que são empregadas pelos grupos (FRANÇA, 2011, p.13).

Esta distinção em relação às lógicas de apropriação e uso da natureza tem

bastante ligação com as diferentes formas encontradas entre o uso do território para

a construção de uma hidrelétrica e o uso do território para as populações

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ameaçadas por Tijuco Alto e tantos outros megaprojetos por aí, consistindo um dos

principais motivos de conflitos. Além deste choque de lógicas reside o fato de que -

tendo como referência grande parte dos licenciamentos que foram analisados no

decorrer deste trabalho - simplesmente tratam as populações atingidas como

invisíveis e, portanto, os espaços como vazios, ou, em outras palavras, “a-

históricos”. No entanto, Porto-Gonçalves (2006) trabalha com a premissa de que não

existe sociedade “a-geográfica” – ou seja, que não possua uma inserção no espaço -

e nem espaço geográfico “a-histórico” – que não tenha sido construído ao longo do

tempo - sendo esta uma condição que resulta que toda sociedade, ao se constituir,

também conforma o seu espaço, o seu território.

Por esta razão, a materialidade do espaço geográfico é sempre sign-ificada,

de-sign-ada, apropriada; as coisas não têm sentido em si e por si mesmas. O

homem se apropria delas na medida em que elas fazem sentido, e este ato é

sempre uma criação social, carregada de subjetividades. O advento destes

megainvestimentos em infrastrutura acaba por desconsiderar estes elementos do

espaço, ao tratar os espaços como meros recursos, esvaziado de ações relações

em conjugação com as comunidades que nele sobrevivem (PORTO-GONÇALVES,

2006).

Sobre esse choque de significações do espaço, Milton Santos (1994) pontua

que:

Há um conflito que se agrava entre um espaço local, espaço vivido por todos os vizinhos, e um espaço global, habitado por um processo racionalizador e um conteúdo ideológico de origem distante, e que chegam a cada lugar com os objetos e as normas estabelecidos para servi-los (SANTOS, 1994, p.18 – grifo nosso).

Seguindo nesta lógica de racionalização do uso do espaço a partir dos

atores globais, Harvey (2005) identifica os chamados processos de “acumulação por

espoliação”, os quais são definidos como sendo “o custo necessário de uma ruptura

bem-sucedida rumo ao desenvolvimento capitalista com o forte apoio dos poderes

do Estado”. Inicialmente, o processo de acumulação do capital se baseava na

“reprodução expandida” e o desenvolvimento utilizava-se prioritariamente da lógica

territorial do poder. A reprodução expandida do capital, no entanto, foi sufocada a

partir do momento em que passou a gerar crises de sobreacumulação do capital

interno em alguns países. Estes países – tendo como caso exemplar os EUA –

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buscaram na “acumulação por espoliação” a saída para tais crises e então,

aproveitaram-se de uma política internacionalista de privatização e neoliberalismo,

para expandir-se em direção a novos territórios. Para tal fim, dispuseram também de

outros mecanismos financeiros, como a abertura forçada de mercados externos para

oferecer crédito, o que resultou em dependência e endividamento dos países

devedores. Este panorama demonstra a combinação de uma lógica territorial com

uma lógica capitalista do poder nestes processos.

Harvey (2005) indica que alguns dos resultados da acumulação por

espoliação foram a corporativização e a privatização de bens públicos, causando

uma onda de “expropriação das terras comuns”. Estes mecanismos foram expoentes

durante o período neoliberal, mas ressurgem potencializados e re-caracterizados na

atual conjuntura. O autor também aponta que esse jogo de espoliações ocorre

concomitantemente com a regressão de estatutos regulatórios e a perda de direitos

já conquistados por comunidades, que se utilizam das propriedades enquanto bem

comum, distintamente dos empreendedores de infraestruturas, que fazem uso

privado do território. Para este fim, durante o processo, os capitalistas e

empreendedores atuam perturbando, confrontando e suprimindo as culturas pré-

existentes nos locais.

Assim, observa-se uma ligação íntima entre a concepção de insfraestruturas

do setor energético privado e as propostas de desenvolvimento do Estado. Investir

em energia, como apontado nos planos de governo, significa investir em

produtividade e sustentar o crescimento econômico do país. A economia pauta-se

no aumento da produção. O discurso do desenvolvimento está indiscriminadamente

associado ao crescimento econômico e visível apenas através de estatísticas

(PEREIRA e PENIDO, 2010). Neste ponto, podem-se questionar as evidências de

certo determinismo técnico, como se a mera presença de uma estrutura ou

“rugosidade” no território pudesse assegurar a mudança social, promovendo o

desenvolvimento pleno e a equidade de condições e acessos para todos. No

entanto, Dias (2005) nos alerta que o desenvolvimento técnico não leva

necessariamente ao desenvolvimento social.

Para alguns destes autores, há certo reducionismo na característica unívoca

e limitante que a noção do desenvolvimento se tornou, sufocada por uma lógica de

crescimento econômico e amparada por interesses de minorias. Neste sentido, a

economia tornou-se esfera autônoma e ilimitada e o desenvolvimento está

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constantemente associado ao crescimento estritamente econômico (ESTEVA, 2000;

PEREIRA e PENIDO, 2010).

Souza (1995), afirma que “a idéia do desenvolvimento tem sido condenada

pelas mais diversas escolas de pensamento e disciplinas a endossar o modelo

civilizatório ocidental, capitalístico, enquanto paradigma universal” (SOUZA, 1995, p.

99). Para o autor, é lamentável que uma noção tão fundamental quanto esta tenha

sido reduzida e transformada em conceito científico, marcado por uma epistemologia

“positivista” e “esquartejadora” da sociedade, tornando-se uma ideia tão distante das

necessidades mais elementares e do cotidiano dos homens e mulheres comuns.

Ampliando as discussões sobre o tema, Richard Peet (2007) aponta o

desenvolvimento como sendo uma construção cultural-ideológica consentida que se

constitui em hegemonia dominante e padronizada. Induz a modelos de crescimento

que teoricamente geram sempre benefícios à realidade em que se instauram. Assim,

se constitui num imaginário de legitimação de ideologias que apóiam a ordem social

dominante. Considerando a ordem capitalista como prevalecente, todas as

ideologias visam, então, reforçar os interesses das elites políticas e econômicas

privilegiadas, que se fundem em uma só, em busca de interesses comuns.

Planejar, nestes moldes, implica normatizar e padronizar, com o intuito de

legitimar um corolário do progresso e do desenvolvimento. Como aponta Escobar

(2000), o planejamento redefine a vida social e econômica segundo critérios de

racionalidade, eficiência e moralidade consoantes com as necessidades do sistema,

permitindo a criação de condições para a produção e reprodução capitalista.

Entende-se que o desenvolvimento é um termo ainda “cheio de significados”,

como aponta Peet (2007), podendo ser interpretado de maneira mais crítica e de

forma mais democrática e instigadora de autonomia. Nesta via de pensamento,

Souza (1995) acredita que a inserção de uma questão política, através do exercício

de participação e liberdade, impede que o exercício de poder se amesquinhe a um

simples projeto de desenvolvimento, mas signifique um real passo para um discurso

emancipador.

Para a abertura de possibilidades é necessária uma reflexão do

desenvolvimento que vá além dos aspectos econômicos. Entender o

desenvolvimento como uma significação imaginária do social, através de

repercursões concretas, com “práticas sociais emancipadoras, que promovam a

apropriação dos lugares e politize as diferenças em prol da criação de espaços

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públicos abertos à prática dissensual”, como afirmam Pereira e Penido (2010, p.

255). As autoras acreditam que ele possa derivar não somente de relações

mercantis e econômicas, mas também do direito e possibilidade de emancipação.

Superar a rigidez do que vem sendo praticado à custa da expropriação de muitos em

função de alguns poucos, fundamentado sobre uma racionalidade econômica cega –

e que tem a questão das hidrelétricas como apenas uma de suas faces - é um dos

desafios para se pensar em alternativas para o desenvolvimento.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O que se pretendeu ao longo desta pesquisa foi resgatar um processo que se

desenrola há mais de duas décadas e que está, nos últimos anos, encoberto por um

“tapume de incertezas” quanto a sua retomada. Apesar da UHE Tijuco Alto não ter

sido concretizada até o momento, produziu repercussões sobre as dinâmicas sociais

e econômicas dos locais diretamente influenciados por ela, que foram alvos de

iniciativas da CBA no intuito de subvencionar a instalação da barragem.

O panorama de resistência social instaurado a partir do projeto da UHE Tijuco

Alto trouxe elementos importantes para se discutir tanto os impactos que envolvem a

instalação de usinas hidrelétricas, como a distância entre o papel que estes

empreendimentos assumem nos discursos em comparação ao papel efetivo que

materializam nos lugares onde se instalam. Pôde-se também refletir a respeito do

significado destas infraestruturas na promoção do crescimento econômico – apesar

de que os documentos insistem na ideia de desenvolvimento - sobretudo por

estarem fortemente inseridas na pauta de investimentos do governo federal: ainda

que o projeto de Tijuco Alto tenha sido anunciado há muitos anos e demonstrado ser

de interesse de uma empresa privada, chama a atenção a sua retomada enquanto

política econômica de governo, através do PAC.

Ioris (2010) traz a compreensão de que ao tratar a água como mais uma fonte

de mercadoria, o regime capitalista imprime sobre a natureza uma lógica

reducionista, essencialmente baseada na acumulação ilimitada do capital. E o

regime de desenvolvimento brasileiro, seguindo esta mesma lógica de aumento do

volume absoluto de recursos naturais requeridos, consolida um ritmo crescente de

insustentabilidade, ao mesmo tempo em que despreza as populações mais

diretamente afetadas. Neste sentido, a UHE Tijuco Alto adéqua-se a um contexto de

mercantilização e privatização da água enquanto recurso natural.

Na medida em que se intensificam as grandes obras de desenvolvimento e

evidenciam-se no plano do discurso as possibilidades “intrínsecas” de geração de

benefícios destas (empregos, ampliação da rede de acesso à energia e crescimento

econômico), no plano material local, isto é, nos territórios imediatamente atingidos

pelos empreendimentos, a realidade se mostra adversa e conflituosa. Para Sevá

Filho (2011), em tais processos, o que se observa é que o interesse de alguns

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(governos, empresas) acabam sendo tratados como interesses de toda a sociedade.

Desde este ponto de vista, aqueles grupos que se opõem a estas grandes obras são

classificados como minorias que “obstacularizam” os processos de desenvolvimento

e de progresso.

Quem chega para implantar o projeto que lhe interessa, numa terra que é de outros, proclama que a região atingida não tem expressão econômica, as condições sociais são ruins.Portanto: a obra vai melhorar tudo isto. Vão mais longe ainda, insistem em seus discursos com a crença de que somente a obra pode resolver os problemas atuais. O modo como alguns técnicos de uma empresa de consultoria e de uma empresa industrial vêem e descrevem a região do vale do Ribeira que seria afetada pela hipotética obra de Tijuco Alto revela muito de sua sensibilidade –ou falta de –para com os diversos e numerosos grupos humanos que formam o povo brasileiro e que moram e trabalham em tantas regiões geo - econômicas e culturais (SEVÁ FILHO et al., 2007,p.24 – grifo no original).

A violência material e simbólica a que são submetidas muitas das

pessoas residentes no raio de influência de uma barragem é contingente, pois

estas populações são forçadas a abdicar dos seus modos de vida e do lugar onde

construíram sua vida material e sua teia de relações, sendo muitas vezes

entregues ao despojo. Esta violência pode ser vista de maneira expressiva no

momento em que parte destas populações se vê pressionada a sair, muitas vezes

a contragosto, dos seus locais de vida, onde costumam sobreviver a partir da

agricultura de várzea, da pesca, da caça, da coleta, etc.. Em caso de não haver

alternativa mais próxima, são obrigadas a migrar para grandes centros urbanos,

forçando-se a modificar suas formas de trabalho e a reconstruírem seu lugar de

vida.

É sempre importante a ressalva de que aqueles que recebem

minimamente alguma atenção dos empreendedores são os proprietários de terras

localizados nas Áreas de Influência Direta do empreendimento. Já os não-

proprietários de terra não têm direito de negociação ou compensação financeira

por não terem o registro, e, portanto, não entram na pauta convencional do

conceito de “atingidos”, como bem questiona Vainer (2008). Nas comunidades

afetadas pela usina Tijuco Alto não aconteceu diferente, pois muitos meeiros,

arrendatários e posseiros foram expulsos de suas terras na medida em que

avançavam as negociações da CBA, tendo a empresa se utilizado de estratégias

ilegais para cumprir este objetivo. Igualmente excluídas dos processos de

licenciamento são as populações à jusante do barramento, que muitas vezes

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dependem da boa qualidade da água do rio para sua subsistência. No entanto, os

impactos que os acometem são costumeiramente ignorados pelos relatórios

técnicos. Neste contexto, os interesses de uma empresa em ampliar suas fontes

de produção de energia, como é o caso da CBA, se sobrepõem aos direitos das

populações ameaçadas, criando um campo para se questionar: para quem é este

desenvolvimento?

Não precisamos de mais alumínio, mas de mais dignidade para os agricultores familiares, quilombolas, indígenas, pescadores. Não precisamos de mais uma hidrelétrica privada, mas de mais proteção à já desvalida biodiversidade da Mata Atlântica. Não queremos mais uma privatização de um rio público, mas a sua recuperação e destinação para usos múltiplos. (Carta a Marina Silva e Roberto Requião, Curitiba, 27 de março de 2006.)

Nesta carta, assinada por nove organizações sociais envolvidas com a

causa do Vale do Ribeira (entre elas a ASSTRAF, o CEDEA, sindicatos,

movimento negro e colônia de pescadores), demonstra a apreensão e a

insatisfação das populações quando ao projeto, além de apontarem para a

importância da diversidade da região. Enquanto para o empreendedor a

construção de Tijuco Alto representa benefícios certos, para os ameaçados,

Tijuco Alto sempre representou a insegurança, as incertezas e a morte. A morte

das suas terras, da Mata Atlântica, do rio, dos peixes, dos alimentos produzidos

pela agricultura familiar - os quais simbolicamente foram acomodados num caixão

durante um dos protestos contra a usina. O lugar onde vivem - este sim - é o lugar

da vida.

É no avanço do chamado “desenvolvimento” que se evidenciam as

marcas da expropriação dos territórios da vida e que se sobrepõem conflitos de

natureza diversa. Tijuco Alto não se trata, portanto, de um projeto isolado, mas

integrado a uma lógica de desenvolvimento econômico em âmbito nacional e que,

lamentavelmente, para além de nacionalizar grandes obras e hipotéticos

discursos de benefícios para todos – os quais não passam de discursos -,

acabam por nacionalizar, efetivamente, as violações dos direitos humanos dos

atingidos por barragens.

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