A viagem ao país das imagens_VINI

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  • 7/22/2019 A viagem ao pas das imagens_VINI

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    A viagem ao pas das imagens

    Considerando a discusso acerca do audiovisual e das suas relaes com o social,

    trabalharemos alguns casos expostos por Maurcio Lissovsky em seu texto Viagem ao pas das

    imagens: a instabilidade da fotografia e suas propriedades combinatrias. Nesse texto,

    Lissovsky estuda o carter fantasmagrico das fotografias, objetos que remetem ao passado e

    apontam para o futuro, para a realizao desse passado. Pensando as fotografias de arquivo, o

    autor ressalta o lugar mutvel desses itens de memria, resignificados ao longo do tempo e

    apropriados de novas maneiras. Assim, ao mesmo tempo em que afirmam sua prpria histria

    enquanto objetos, as fotografias trazem a dvida de seu carter indicial, esse que remete a

    outra coisa, a outros acontecimentos e a outras vidas.

    O primeiro caso trabalhado por Lissovsky o de um baralho de cartas editado pelo

    Instituto Colonial Holands, na dcada de 1930. A Indonsia, colnia holandesa que buscava a

    libertao na poca, o tema do baralho. Nas cartas, fotos que supostamente remetem

    histria tnica da colnia, com os tipos de seus habitantes originais representados e descritos.

    Contudo, as pessoas representadas nas fotografias no correspondem s descries:

    habitaram pocas distintas e possuem origens diferentes das que so listadas nas cartas. Alm

    desse deslocamento promovido pelo uso das imagens, vale ressaltar que o baralho foi

    editado em um momento no qual a Indonsia, e outras colnias fruto das investidas

    imperialistas, vivia um movimento de libertao que a Holanda tentava rechaar. Assim, o jogo

    de cartas e o jogo de imagens representa o jogo imperialista, em que os significados locais so

    subjugados aos desejos das potncias europeias.

    O segundo caso abordado no texto se passa na Austrlia. Durante a segunda metade

    do sculo XX, descendentes de aborgenes passaram a descobrir em arquivos etnogrficos

    fotografias de seus antepassados. A essas pessoas, ento, foram devolvidas essas fotografias

    como objetos de memria familiar, retirando-as do contexto em que foram realizadas: os

    registros buscavam catalogar as populaes aborgenes durante o processo colonizador da

    Austrlia. Museus australianos investiram em projetos de devoluo dessas fotografias a

    descendentes dos retratados (como o projeto Bringing the photographs home, realizado pelo

    Museu de Berndt), sobrepondo o carter afetivo dos registros ao seu carter histrico de

    dominao.

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    O terceiro caso tratado no texto o do popular uso de cenrios nas fotografias

    quenianas, mas para este trabalho, tomamos como exemplo um caso similar, o do estdio de

    Philip Kwame Apagya, na cidade de Shema, em Gana. As fotografias de estdio so populares

    em Gana, e Apagya um dos seus representantes mais famosos, sendo conhecido

    mundialmente por seu trabalho. Em suas fotos, cenrios pintados mo so colocados ao

    fundo representando diversos ambientes, como salas de estar requintadas, quintais de

    casares e, frequentemente, aeroportos. A fotografia, nesse caso, assume o papel de levar a

    outro lugar, a lugares onde os fotografados talvez nunca pudessem ir. Os aeroportos, cenrios

    mais populares entre os escolhidos para as fotografias do estdio, tambm representam esse

    desejo, sendo lugares de transio e no lugares definidos, sendo lugares do poder ser, do

    vir a ser.

    O ltimo caso estudado por Lissovsky o da relao dos tibetanos com a fotografia.

    Durante muito tempo, a fotografia foi proibida no Tibete, considerada pelo budismo tibetano

    como algo que prendia as pessoas, mesmo depois de mortas, ao mundo material. Contudo,

    com a dominao chinesa e a destituio do Tibete enquanto pas, os tibetanos passaram a

    adot-la como um meio de afirmar a nao tibetana onde quer que estivessem. A fotografia

    passou a servir como um espao para os tibetanos, em que o Tibete se afirmava como nao.

    Assim, fotos dos lamas e de outros smbolos culturais assumiram o papel de resistncia da

    nao tibetana nos lares de um povo sem um espao nacional. O carter material da

    fotografia, antes temido pelos praticantes do budismo tibetano, foi incorporado como um vis

    de resistncia para essa cultura.

    A partir desses exemplos, fica claro que a presena das imagens assume diferentes

    formas, que a sua apropriao mutvel. As imagens so significantes-fantasmas: remetem

    a outros e a si, caminham no tempo e no espao, e principalmente, esto sempre abertas a

    novas apreenses.