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n.ú / da em priada 'ellaria mobile racho ws LAURO MACHADO COELHO ^ l/n í i A VOZ DA PRÚSSIA Vida e obra de Anna Akhmátova ALGOL editora SAO PAULO 2008

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A VOZ DA PRÚSSIA

Vida e obra de Anna Akhmátova

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SAO PAULO

2008

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SOBRE AS GRAVURAS

Cada capítulo deste livro se abre com um fragmentode poema de Anna Akhmátova. As imagens que osacompanham não pretendem ilustrar esses poemas, quea plasticidade da obra parece dispensar.

Procurei usar os recursos da gravura e das própriasmatrizes para refletir sobre adensidade de sua matériapoética, e sobre a riqueza e multiplicidade das vozesqueela nos faz ouvir.

KLARA KAISER MORI

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HOUVE UM TEMPO EM QUE SÓ

SOMIAM OS MOBTOS,CONTENES DE PODEBTM REPOUSARA

Zviózdy smiérti stoiáli nad námii hiezuínnaia kórtchilas Rus.^

O clima repressivo da política cultural, já vigente durante o leninismo,agrava-se sensivelmente com a subida de Stálin ao poder; e é, naturalmente, no campo da literatura que ele primeiro se manifesta com maisforça. Em 1929, o Partidonão tinha dificuldade em usar os radicais dasorganizações bolcbeviques como instrumento para reprimir os escritores não-comunistas, pois eles consideravam tabu a arte individualista.Poucos eramos intelectuais que protestavam, pois..a escravidão aindaerapreferível ao túmulo: "Vamos acalmar osnervos e recomeçar, como sefazem qualquer fábrica", disse o poeta lliáSelvínski - imagem não desprovida de sentido porque, com-a-su-per-industrialização e a proletarizaçãoem marcha, a sociedade soviética era cada vez mais concebida como uma

vasta máquina, dequeoscidadãos eram meras arruelas, sem significadoemsi mesmos, e perfeitamente intercambiáveis. O queseesperava dosescritores era a celebração da auto-suficiência dessa máquina, relatosépicos de suaconstrução; manuais, emsuma, paraa suaoperação. UmaMetrópobs ondenãohavia.mais lugares para"sonhadores" quefizessemas pessoas pensarem, ou de "bufões" que as fizessem divertir-se.

1 Eco bylo, kogdd ulyhálsa tolho miónvyi, spokôistmu rad noPrólogo do Réquiem, escrito entre 1^35. 51940.2 "As estrelas da morte pairavam sobre nós/ e a Rtíssia inocente torcia-se de dor", no Prólogo do

Réquiem.

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Como desvencilhar-se de sua individualidade sem cair na mais total

banalidade? "Andamos precisando dequem escreva mal", dizia em192.9o crítico formalista Borís Éikhenbaum. Num país em que os literatos -como dizia uma personagem do Suicídio^, a peça de Nikolái Érdman -

"transformaram-se em escravos vermelhosno harém do povo", não é deseespantarque tenba-se desenvolvido a tendência ao masoquismo pois,na opinião do dramaturgo Vladímir Kirsbôn, "o Partido converteu-senuma corrente de ferro atada a nosso pescoço, que nos machuca, massem a qualjião_sabemos mais viver".

Os doisjmmeirps escritores visados forain leyguêni lyáiiovitçh Za-miátin, que fizera uma caricatura da sociedade comunista em My (Nós),de 192.4; e Borís Andrêievitch Pilniák, cujo Krásnoie Diêrievo (OPédeMogno), publicado na Alemanha em .1929, critiçaya a desintegraçãodos ideais. socialistas..e a corrupção durante a NEP. Os agitadores dasinstituições bolcheviques precisavam de ajudaoficial paraderrubá-los, ea conseguiram semdificuldade. Desde que Pilniákpublicara, em 1925,Póviest oNiepogashiênnoi Lúny (AHistória da Lua Inextinguível), Stálin otinha emsua alça de mira, pois essa novela dava a entender queo Lídermandara assassinar o comissário da Guerra, Mikbaíl Frúnze, fazendosubmetê-lo a uma cirurgia perigosa e desnecessária, para colocar emseu lugar um pau-mandado, Klimént Vorosbílov"*.

Do linchamento em regra promovido pela imprensa, Zamiátin escapou, pois conseguiu emigrar. Mas Pilniák foi humilhado de todasasrnaneiras, forçado a fazer abjetos pedidos públicos de desculpas, e foifinalmente preso e executado, no auge do Terror stalinista. Dejpoucoadiantou Mikbaíl Bulgákov e Borís Pastemák terem_renunciado, emprotesto, à posição de membro da União dos Escritores (Akhmátovatambém escreveu a suacartadeilemissão e encarregou Pável Luknítskide entregá-la; masele nunca o fez). O editoríaLdaXiríemtúrnaia Gaziêta.em 9 de setembro de 1929, denunciava violentamente o "pílniakismo,que está corroendo, coma ferrugem, a yontade de.construçãodcLsocialismo". Poucos foramL-os-.que não viraram, as costas a Pilniák que, embreve, transformara-se.numa verdadeira mina humana

lessiênin já se suicidara em 1924, desiludido com a Revolução.

3 Encpnada em 1928, Samouhílsa foi proibida pela censura e só publicada naRússia depois dadissolução da URSS.

4 ENadiéjda Mandelsbtám quem dá essa informação em Hope against Hope.

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Logo depois viriaa vez de Maiakóvski cujo Kjop_(0 Pmcevejo), soberba-mente encenado por Meierkbôld em1929, fora demolido pelacrítica.Boicotado pela própria classe dos escritores, quando fez, na Casa daImprensa, em fevereiro de 1930, a exposição retrospectiva de seus vinteanos de carreira —pois seus colegas temiam vejr seu norne associado aum intelectual que estava emprocesso de queda livre—, Maiakóvski foihostilizado pelos estudantes que compareceram a um de seus recitaisem 9 de abril. Pouco depois, no dia 14, ele se matoucom um tiro. Seuúltimo poema, do dia 12, é um verdadeiro bilhete de suicida:

E como eles dizem.

uma história que nao deu cena.

O harco do amor

esjãcelando-se

contra a existência.

E assim acertamos contas

vida.

Por isso, por que

recnminarmo-nos uns aos outros

A quem fica —desejofelicidade.

com dores ejêridas?

Em seudiário, o escultor AleksandrRódtcbenko, queviuo cadáver,escreveu: "Ele estava deitado em seu quartinho, cobertocomum lençol,viradc^para a parede, num si]ênçiq mortal, que falava damediocridadeviciosa„.da perseguição vil, da traição medíocre, dainveja eestupidez detodos osqueforam responsáveis por esse atodesprezível. Quemdestruiuesse homem de_gênio.e^criou esse borríveLsiiêncio e vazio?".

Durante muito tempo se especulou sobre a causa do suicídio deMaiakóvski. Falou-se em um caso de amor fnisrradn mm Tatiana Táknv-

lieva, que ele conhecera emParis. Foi sugerida a hipótese de.depre^ão einsanidade provocada pela sífilis. Mas, em 1995, quando VitáliShenta-línskipublicou VLiríemtúrnikh Arkívakh KGB (Nos Arquivos Literáriosda KGB), havia lá a declaração do escritor Isaak Báhel, durante um deseus interrogatórios: "A ún^a explicação parag suicídio de Maiakóvskifoi ele ter chegado à conclusão, de que era impossível trabalhar nascondições criadas pelo regime soviético".

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Para ageração de Liev Gumilióv, a morte de Vladímir Maíakóvskiteve omesmo significado simbólico que ade Aleksandr Blók tivera paraa de Akhmátova: a idéia de que a chama da esperança revolucionáriase extinguira, mergulhando o país numa nova escuridão. Nada refletemelhor esse clima do que um poema que Anna Andrêievna escreveuem X933. As imagens dos últimos versos - Pilatos e Lady Macheth tentando em vão lavar osangue que têm nas mãos - usam a"linguagem deEsopo" para fazer uma alusão claríssima à tirania staUnista:

Privóliern pákhniet díkii miõd,pyl —sõnitchnym lutchôm,Jiálkoiu —divüdni rot,a zolotó - nitchõm.

Vodóiu pákhniet reseãá,i idhlokom - liuhôu

No my uználi navsigdá,shtô króviu pákhniet tólko krov.

I naprásno namiéstnik Rimamyl rúki príed vsiêm naródom,pod zloviéshtchie kríkii tchiérni;i shotlãndskaia koroliêva

naprásno s úskikh ladôniistirála krásnyie hryzguiVdúshnom mrákie tsárskovo dôma..

A liberdade tem o aroma do mel selvagem,a poeira —o de um raio de sol,violetas —o da boca da donzela,

e ouro .não cheira a nada.

O resedá tem um aroma dejígua,e maçã é o aroma do amor.Mas nóssabemos para sempreque sangue só tem cheiro de sangue.

Em vão o representante de Romalavava as mãos diante de todo o povo,sob os urros sinistros da multidão,

e a rainha escocesa

em vão daspalmas esguiasesfiegava os-borrifiis. vermelhos,naprojünda escuridão do palácio real.

No início de 1933, Emma Gershtéin, a amiga dos Mandelshtám,empregou-se, em Moscou, no Escritório Gentral do Departamento dePesquisadores, ligado ao Sindicato dos Educadores. Quando Ossip e Na-diêjda vinham à.capital, ela os hospedava em seu aparp^ento. Depoisque eles obtiveram a autorização para vir morar em Moscou, Emmaajudou-os a se instalar em um apartamento da Alameda Nashtchókin,onde a primeira visitante que eles receberam foi Akhmátova. Ali Gershtéin travou conhecimento com a poeta, pela qual tivera grande admiração a vida inteira.

Em seu diário, ela conta como, em outribro de 1933, "um rapazdistraído e de ar independente, com umamochila nas costas", a procurou em seu escritório, pedindo ajuda para encaminhar a sua carreira

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acadêmica. "Ckamando-me formalmente de Emma Grigórlevna, ele seapresentou: 'Liev Gumilióv." Dias depois, ela o reencontrou em casados Mandelshtám, e se deu conta do enorme carinho que Óssip tinhapelo filho de Nikolái eAnna, seus amigos da juventude. Quando ela sedespediu, Liev se ofereceu para acompanhá-la de volta até a sua casa.Foram conversando e Emma diz; "Olhei para o pescoço esguio, saindoda gola de pele, e para a cabeça inclinada, coberta por um boné, eapaixonei-me por ele".

Os dois envolveram-se entusiasticamente, o que Akhmátova e osMandelshtám desaprovavam, pois Emma era nove anos mais velha doque Liev. Ela não era bonita, mas possuía uma inteligência muito aguda

- era uma grande especialista na obra de Liérmontov - e sinceridadesuficiente para desaconselhá-lo de seguir carreira como poeta, poispoderia prestar melhores serviços como historiador. Deve-se muito aela o fato de Liev ter conseguido entrar na Faculdade de História daUniversidade de Leningrado.

As meinórias de Gershtéin contêm preciosas informações sobre omisto de admiração e ressentimento que Liev Nikoláievitch tinha pelamãe. Não lhe perdoava tê-lo deixado em mãos da avó durante tantosanos; visivelmente não aprovava a ciranda das relações amorosas deAkhmátova com seus maridos enamorados; esentia ciúmes daatençãoque ela dava a Irina Púnina ou aos filhos de Tatiana Smimõva. Mas so-bretudo, "e nisso foi profundamente injusto" - comenta Mikhaíl Árdov^,que foi um de seus melhores amigos no fim da vida —"ele achava_ queAkhmátova não se esforçou para tirá-lo da prisão, ojjueabsolutamentenão é verdade, como todo mundo^sabe".

Liev incomodavarxe até com o tom lacônico das mensagens-da mãe,nos cartõespostaisque ela lhe mandava. Via como um sinal de seu desinteresse por ele oque, na realidade, não passava de uma característica típicade Akhmátova aquem, como observou Vladímir Veidlé, num depoimento citado anteriormente, cansava o ato físico de escrever. Nas memórias de

5 Mikhaíl era o filho mais novo do satirista Víktor Árdov e de sua mulher, a bela atriz NinaOlshiévskaia. Eles moravam nomesmo prédio dos Mandelshtám, ealojavam Liev em sua casa,quandoAkhmátova estava em Moscou. Relações muitoamistosas estabeleceram-se entre eles.No fim davida deLiev, Mikhaíl Árdov foi um deseus amigos mais chegados. Entrando tarde

' para oseminário, eletinha-se ordenado pope daigreja russa ortodoxa. Essa declaração foi dadaa Elaine Feinstein, numa entrevista que ele lhe concedeu em São Petersburgo, em 2003.

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Gershtéin, encontramos várias passagens em que ele faz amesma queixa.Portanto, é compreensível ele sentir-se emotivamente compensado aolado dessa mulher madura, que ocercava de carinho. As circunstâncias,porém, não permitiriam que essa vida a dois tivesse futuro.

Durante a década de 1930, intensificaram-se muito os vínculos entreAkhmátova e Mandelshtám. Em suas memórias, Nadiêjda relata o comentário do marido; Arma_Andrêievna-émma mulfier para aamizade,não para o amor"; e observa:

Eclaro que o amor desempenhava papel muito importante na vida deAkhmátova mas, à prirneira crise, todos osseus relacionamentos desmoronavam àsua volta, como um castelo de cartas. E, no entanto, com Óssip,a relação ardente e intensamente pessoal que ela tinha resistiu a todos ostestes. [...] AAkhmátova que eu conhecia era uma amiga altiva eapaixonada, que sempre ficou ao lado de Mandelshtám, com inabalável lealdade,perpétua aliada no mundo selvagein em que vivíamos, uma abadessa queestava sempre pronta a ir para a fogueira pelas suas crenças.

Numa carta que lhe escreveu da Criméia, em 25 de agosto de 1928,na época em que fora obrigado a sair de Moscou, Óssip já dissera;Você sabe que só há duas pessoas no mundo com quem consigo manter uma conversa imaginária; Nikolái Stepánovitch® e você". O amorpela literatura era, naturalmente, ocimento que os ligava. Akhmátovalembrava-se de uma época em que Mandelshtám esteve em Leningradopara duasjioites dedicadas à sua poesia; "Es^a estudando italiano eandava doido por Dante. Comecei a ler para ele um trecho do CantoXXX, aquele em que surge a aparição deBeatriz. Èle começou a chorar.Fiquei assustada; Oque foi?. Não,_.não.é nada. São essas palavras... ed ^ intelectual errL.que_Óssip._fcaya em sua presença era enorme. Emma Gershtéin se lembra que, um dia, quando Lievsaiu para acompanhar a mãe até aestação, onde ela pegaria o trem devolta para Leningrado, Mandelshtám desabafou; "Que bom que Annafoi embora. Gom elaaqui, a casa fica cheia de eletricidade!".

6 Gumilióv.

7 Nas lembranças deAkhmátova a respeito deMandelshtám.

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Foi Akhmátova a única pessoa que Óssip quis ter a seu lado, e deNadiêjda, quando chegou a sua hora de confrontação com o regime.Desde que Stálin assumira o poder, a repressão vinha crescendo sistematicamente, emespecial diante dasreações à política de coletivizaçãocompulsória. Os efeitos, dentro do Partido, tinham sido tão grandesquanto fora dele. MuitosMpparátchiki tinham ficado seriamente penurha-dos com oshorrores que tiiiham sjdcLohrigados ajníligirà população. Nacúpula do governo, houvera alguns constrangedores suicídios, e o maisescandaloso deles tinha sido, na madrugada de 8 para 9 de novembrode 1932, o de Nadiêjda Allilúieva, a jovem segunda mulher de Stálin.

"Foram feitas tentativas de apresentar o fato como a conseqüênciade uma doença trágica e inesperada", escreveu Gershtéin emseudiário.

"Houve quem pensasse que o gesto desesperado de Allilúieva tivessemotivações políticas, pois elavinha de umafamília de revolucionáriosveteranos. Outrossugeriram razões puramentepessoais. 'Pohre mulher,tinha-me dito um conhecido, tempos antes, referindo-se à sua vidafamiliar difícil. [...] Como toda economia estava tomando um rumo diferente —estávamos a poucos meses da epidemia de fome —o suicídioveio como um dramático lembrete da vulnerabilidade do Líder." Terá

Nadiêjda se matado, destruída pelo sentimento de culpa com a ondade terror desencadeada por seu marido? Esta é uma perguntaque, certamente, nunca poderá ser respondida.

Akhmátova já ficara muito assustada, em 1933, quando Liev, quetinha idovisitar umcolega do curso de História - um certo Éberman -fokdetida junto com.ele pelos agentes da NKVD®. Mas, nessa ocasião,ele ficou apenasnovediasna prisão, e foi solto semque o tivessem molestado. Como Éberman desapareceu, e não se teve mais notícias dele,acreditou-se que fosse o colega a pessoa visada pelabatida, tendo Lievsido vítima apenas da coincidência de estarem sua companhia.

Na época, dentre os intelectuais, um dos poucos a ter idéia do •que se passava no campo era Mandelshtáin. Expulso de Leningrado,

i A polícia.secreta.soviécica foi fundada após a Revolução de,1917 como^J^oiSissãçLExxiaordmá-riaparaCombater aContra Revolução ea Sabotagem (aTchekd). Em-xgaa. ela^seuransformarana Diretoria Política do Estado (GPU) e, mais tarde, na Diretoria Política do Estado Unificada(OGPU). Entre 1933a 1945,passou a chamar-se de Comissariado do Povo paraos AssuntosInternos (NKVD). Depois da II Guerra Mundial, haveria de se transformar no Comitê de Se-

' gurança do Estado (KGB). Após o colapso da URSS, em1991, foi criado o Serviço Federal deSegurança (FSB) da República da Rússia.

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em 1931, ele andara pela Críméia e Ucrânia, antes de ser autorizadoavoltar para Moscou, epudera ver o"enorme Bergen-Belsen em quese transformara o interior russo® , onde cerca de quinze miliiões depessoas tinham.morrido. Mandelshtám reagiu ao que presenciara noPoema a Stálín, de novembro de 1933' 9*^^ não chegou a escrever, masmemorizara e declamava para seus amigos^°;

My jiviõm, poã sobôiu niê strany,náshi riêtchi za àiesiát shagóv niê slyshny,

a gdiê khvárit na polrazgovortsd —tam pripômniat kriemliêvskovo gonsá.

levô tolstyie páltsy, kak tchiérvíjirní,a slôva, kak pudóvyie guíri, vierní.

Tarakány smiáútsa usíshtcha,i siidiut ievô golieníshtcha.

Avokrúg ieiv sbrod tonkóshiikh vojdiêi,on ígráiet uslúgami poluliudiêi.

Kto svísrn, kto miautchít, feto khnytchit,on odín lish babatchú i tyshit.

Kak podkóvy kúiet za ukazõm ukdz -komú Vpakh, komú v lob, komú vbrov,

komú Vglaz.

Shtó ni kazn u nievô —to malína

i shirókaia grud osietína.

Vivemos sem sentir o chão em que pisamos.Adez passos de nósjd não se ouve oquefalamos.

Mas onde quer que haja meia-conversa que seja,ojnontanhês do Krêmliij há defcar sabendo dela.

Os deJos desse assassino de camponesessão grossos como salsíchôes,' " "easpalavras lhe caem dos lábios pesadas como chumbo.

Seus bigodes de barata vibrame o cano de suas botas é reluzente.

Asua volta, há um rebanho de líderes de pescojofno,com os quais ele brinca como sefossem animais de estimação.

Rqsnqm, ronronam, uivam cada vez

que elefala com eles ou lhes aponta odedo.

Um _a um,forjam leis parajpiefoepois,ele os acerte com aferradura nacabeça,. no..olho,

no baixo-vmtre.

Exadaj;.ez.que..eles-matamr-isso~é-um'pitéupara aquele ossétio^^ de pescoço grosso.

9 Aexpressão édo historiador Robert Conquest, em Harvest ofSorrows: lhe Soviet Colleaimzationand the Terror Famine, Hutchinson, 1986,

10 Publicada pela primeira vez em Munique, em 1963, na revista Moslakh, edepois em Paris,na Rússkaia Mysl, em março de 1965, opoema, hoje, aparece na edição integral.da_poesia deMandelshtám - ver Bibliografia - na seção Sükhotvoriénia niê Sohránie vKnígui Stikhóv ÁvtoraiKiepuhlíkovánnyie (Poemas Não Incluídos nos Livros de Versos do Autor eNão-publicados).

11 Stálin nasceu na Ossétia do Sul, república autônoma pertencente àGeórgia,

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Em março de 1934, Óssip cruzou com Pastemák e disse para eleesses versos. "Não. te encontrei e não ouvio teu poema", disse-lhe BonsLeonídovitch, apavorado. No início de maio, Mandelshtám o repetiunuma festa a que estava presente o conde Aleksêi Tolstói, um homemdo sistema. Quando Tolstói protestou, defendendo Stálin, Óssip) Emílie-vitch deu-lhe um sonoro tapa na cara. "Daquele níqmentq em djante ,conta Nadiêjda, sua mulher, em suas Memórias, eu sabia que Óssip estava condenado". Opróprio Mandelshtám tinha consciência da empadaque pendia sobre sua cabeça, pois.Akhmátova conta, em suas lembranças do poeta, que em fevereiro daquele ano estava passeando com elepelo Bulvár Gógolia, eÓssip, parando de repente, tomou-a pelo braçoe disse: "Estou pronto para morrer". Curnpriam-se as previsões que elepróprio fizera, em maio de 1931, de que estava próxima a sua quedaem desgraça. Num perturbador poema escrito em Khmielnítskaia ededicado à suaamiga, Mandelshtám dissera:

A.A. Akhmátovôi

Sokhraní moiú rietch navsigdá za príohus nistchástia i cíynia,za smolú krugovôvo tierpiênia, zasóvies:nyi chôgot miãd.Tak vocld unovgoródskikli kolótsakh doljná hyt tchirnd i sladíma,shwhy Vniêi vRojdieswó otrazílas simiú plavníkami zviesdá.

I za shtô, otiéts mói, mõi drug i pomóshtchnik grúbyi,lá - niepríznannyi brat, oishichiepiêniets vnaródnoi simiê -ohieshtchdm posrróit takíe dnmútchie srúby,shtóhy Vnikh tatarvd opuskdla kniazm na badiê.

Lish by tólko liubíli minid éti driévni pldkhilKak natsiélias na smién gorodkí zashiháiut vsadú,lá za éio vsiújizn prokhojú khot vjiliéznoi rubákhii dliá kdzni pietróvskoi uliesú toporíshtchi naidú.

para Anna Aklimátova

Preserva para sempre minha palavra, por seu gosto de infelicidade edefmaça,pela resina da paciência comum, pelo piche honesto do trabalho.Por isso, nos poços de Novgórod, a água deve ser escura eaçucarada,para que nela se reflitam, no Natal, as sete pontas da estrela.

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Epara isso, meu pai, meu amigo, meufrustrado companheiro,eu, irmão mal conhecido, renegado nafamília do meu próprio povo,prometoJurar um poço de paredes tão estreitas,que nele os tártaros poderiam até enfiar príncipes como sefossem halde.

Áh, se os caàafalsos de outrora pudessem me amar,do modo como, no jardim, jogamos etiquete, como se apontássemos para aprópria Morte,estqujíronto a passar oresto_ de minha vida numa camisola deferroe, como nos tempos de Pedro, oGrande, irei procurar, nafloresta, omachado do suplício.

Em suas memórias, Emma Gershtéin relembra as circunstâncias4?- E?3são Hq poeta. Quando ela chegou ao apartamento da AlamedaNashtchókin, na manhã de 14 de maio, foi Akhmátova quem lhe abriua porta. Ossip a tinha mandado chamar em Leningrado.

Estara em prantos, com os cabelos desfeitos, e me disse que tinha umaenxaqueca terrível, coisa que nunca lhe acontecia. Foi ela quem me con-tqu tudo. O tradutor David Bródski tinha idp visitar os íylaiidelshtámaquela noite, e ficou até tarde. Ainda estava lá quando os homens dapolícia política chegararn. [...] Nádia me contou que um dos responsáveispela batida tinha buscado, no escritório dosíndico, um documento comoregistro temporário deLiev Gumilióv corno hóspede dos Mandelshtám,e^erguntou ameaçadprainente aÓssip: 'O que isso significa?' [O simplesfato de usar osobrenome de um poeta um dia executado,por jraícão jáera motivo de suspeita]. Akhmátova e ela me disseram que eles vascu-Iharam o apartainento e examinararn todos os documentos... Durantedez dias, nós nos atormentamos com hipóteses. Por queqinham levadoMandelshtam? Por ter batido em Aleksêi Tolsmi? Ou pelos seus poemas?

podia ser franca com Akhmátova, pois não sabia se ela tinhaconhecimento do epigrama.

Assimjque Óssip foi levado para aprisão da Luhiánka, AkhmátovaePastemák correram ao Krêmlin parajpedira ajuda de um dos membros do Comitê Central, um georgiano chamado lunikídze. Conseguiram falar com ele porque Ruslânov, ator eamigo de Borís Leonídovitch,namorava a secretária do alto funcionário. Mas,de nada adiantou tentara mobilizar pessoas influentes. Stálin não tinha pressa de se vingardo poeta que oridicularizara. Mandelshtám foi condenado apenas ao

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exílio.jdurante três anos, em Tcliérdyn', às margens do rio Káma,-naregião dos Urais. Nadiêjda foi autorizada a acompanhá-lo.

Ao receber a ligação da NKVD, perguntando se acompanharia omarido parao exílio, Nadiêjda saiu, em companhia de Akhmátova, àprocura dos amigos, na tentativa de arrecadar algum dinheiro. Todosforam tão solidários quanto possível. leléna Serguêievna Bulgákova, amulher do romancista e dramaturgo, deu-lhes todo o dinheiro quetinha

hao, em suabolsa. Akhmátova, o irmão de Óssip, Aleksandr Mandelshtám,eo poeta levguêni Kházin acompanharam Nadiêjda até a Liubiánka, na

itâncias esperança de poderem despedir-se do amigo. Esperaram muito tempo,lameda mas nãoconseguiram estar com ele. Akhmátova arrependeu-se de nãole abriu teresperado mais, pois Mandelshtám, perturbado pela experiência do

encarceramento, convencera-se de que ela tinha morrido.Óssip estava muito deprimido, perseguido porpesadelos, e quebrou

ha uma o braço ao tentar fugir do hospital, pulando pela janela. Finalmente,me con- porinterferência de Bukhárin, foi-lhes dada a permissão demudarem-ehhtám se para Vorônej. Ali ele estava tomlmeiite_lsolado de família, ^igosuens da e do muridp intelectual; mas as condições de vida eram menos duras)nsáveis do que em Tchérdyn. Apesar de seus sofrimentos, Mandelshtám nãoato com perdera a fé em sua arte. "Não sei como é em outros lugares", escreveudshtám, nessa época, "mas aqui, neste país, a poesia é algo que cura e devolvesimples a vida, e as pessoas não perderam o dom de beber nela p que lhesaição já restaure a força interior. Aqui, pode-se matar as pessoas por causa da 's vascu- poesia - um sinal de respeito sem paralelo - porque as pessoas ainda)urante são capazes de viver por causa dela". Mas.Mandelshtám, ao contráriolevado do que dissera a Akhmátova, não estava pronto para morrer, e oexílio,,(oemas? as privações espirituais, mais do que as materiais, e o inedo cor^tantea tinha em que vivia quehrantaram-no, destruíram lentamente o ser humano

vulnerável que ele era.

nátova

^em- Na época em que Mandelshtám foi preso^ estava sendo preparado opri-nsegui- meiro Congresso dos Escritores. Embora marginalizada..da-vida literária,ovitch, Akhmátoyajrecebeu^tiin formulário para. participar; mas nãochegou aou ten- enviá-lo. Em suas notas autobiográficas, ela explica; "A prisão deÓssipvingar > tinha me deixado tão arrasada que simplesmente não conseguia levan-nas ao tar a mão para preencher aquele questionário. Durante o Congresso,

165

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Bukhárin declarou que Pastemák era onosso melhor poeta —oque deixou Demián Biédny horrorizado foi muito rude em relação à minhaobra e, naturalmente, nem ao menos mencionou Óssip".

Ocasal de amigos fazia-lhe uma falta imensa, eelaJlcqu eufórica aoser a primeira pessoa autorizada avisúá-los em Vorônej, nos primeirosdias de março de iq^6. Nadiêjda relata de modo comovente aalegria eaexcitação em que oreencontro os deixou; Óssip andava rapidamente,de um lado para ooutro, pelo quarto, declamando os poemas que tinhaescrito. Queria fazer com ela um balanço de tudo o que produzira naqueles últimos tempos, EAkhmátova leu para ele um poema que lhetinha dedicado . Os vet^o^de Vorônej opõem, com a força de um soconos dentes, a atmosfera festiva da cidade ea desolação do quarto emque o poeta degredado" vive ern companhia de suas três esquálidascompanheiras, Nadiêjda, a Musa e o Medo:

Igórod viés stoít olidiníélyí^Kak pod stiklõm dinévia, stiény, sniég.Pod khrustalôm iáprokhojú niesmiélo.Uzórníkh ánok tak niviérien bieg.Anad Pietrôm vorõniejskim —vorôny,da topoUá, í svód smétlo-zieliõnyi,razmyiyi, mútnyi, v sõnietchnoí pylí,VKulikôvskoi bítvoí viéiut sklônymogútchiei, pobidínelnoi ziemlí.I topoliá, kak sdvínutyie tcháshí,nadnávni srázu zazviemát silniêi,kak búdto piút za likovdní náshína brátchnom pírí tysiatchi gostm.

A Vkômnatíe opálnovo poétadijunát Strakh i Múza v svõi tchiriõd.I notch idíot

kotóraía níè viêdáit rassviéta.

Ea cidade inteira está trancada em gelo:sob uma redoma de vidro, osmuros, a neve.Ando sobre cristais timidamente.

Deslizam os trenós de alegres cores.Acima da estátua de Pedro, em Vorônej,há os corvos, os choupos, a cúpula verde-claroesmaecida, desbotada à luz do solea batalha de Kulikõvo explode nas colinasdesta terra de vencedores^^.

Epsçhoupo.SAaças.que_se_chocatnn]Am]ninãe,rugem. sobrenós com toda a forca,como se celebrassem npssp júbilonum jantar de bodas para cettuconvivas.

Mas, noquarto do poeta degredado,o Medo ea Musa velam em rodízio,e uma noite cai

que não trazesperança dealvorada.

12 ABatalha de Kulikõvo ocorreu em 1380, perto de Vorônej. Nela. Dmítri Donskôi derrotouum dos pretendentes ao trono da Horda Dourada, que na época dominava aRússia. Dois anosdepois, os tártaros vmgaram-se dessa derrota saqueando Moscou, Mas avitória em Kulikõvodemonstrou que os russos tinham condições de enfrentar militarmente os invasores tártaros.Quândo opoema foi publicado pela primeira ygz, no jornal Lieningrád, em 1940, os quatroúltimos versos foram censurados.

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Tinham sido muito difíceis, para todo opaís, todos os anos transcorridosdesde que Stálin assumira opoder. Mas nada se compara ao que aconteceudepois do assassinato de Serguêi Mirônovitch Kírov, opopular secretáriodo Partido na Federação da Rússia, cujo prestígio estava em vertiginosaascensão. Para todos os efeitos, Kíroy eraumdos favoritos de Stálin que,poucos dias antes de sua morte, lhe dera um livro com adedicatória "Paraomeu amigo e irmão". Na noite de29denovembro, ele assistira, em companhia do Vójã^, a um espetáculo noTeatro das Artes, em Moscou.

Dois dias depois, ao entrar no Smólny, o prédio de Leningradoonde funcionavam os escritórios do PCUS, Kírov foi morto a queima-roupa, com um tiro na nuca, porum desconhecido, Leoníd Nikoláíev,que tentou suicidar-se, em seguida, mas foi impedido poruma pessoapróxima. Ogoverno viu nisso um atentado contra opoder bolcheviquemas, hoje em dia, não se tem mais dúvida deque o próprio Stálin foi omandante da eliminação de um rival potencialmente perigoso, muitoestimado pelapopulação. Alémdisso, Kírov possuía - juntamente comoutros líderes que o ditador precisava eliminar - informações sçbre overdadeiro genocídio perpetrado no campo, durante a campanha decoletivização forçada, que não podiam, de forma alguma, transpirar.Num dos mais importantes romances publicados durante a fase dadissidêncJa-d.agovema-Bréjnev —Os Filhos ãa Rua Arbat, de AnatólyNaúmovitch Rybakóv - a responsabilidade do Vójd pela eliminação deKírov é abertamente proclamada.

A morte de Kírov erao pretexto de que Stálin precisava para desencadear o Grande Terror. Nos dias que se seguiram, quarenta mil habitantes deLeningrado foram deportados para os campos deconcentração,acusados deconspirar para matar Kírov. Quatrocentos outros, sabendo-se suspeitos, suicidaram-se antes que a NKVD pudessejietêrlos. Prisõesemmassa, processos sumários, execuções, exílios, remoção paracamposde trabalhos forçados vieram emavalanche. Sóemdezembro de 1934,houve 6.501 fuzilamentos, incluindo 0-deQaniihares.de.peLssoas_quetinham sido presas. Calcula-se que, até 1938, cerca dedez porcento dapopulação masculina da URSS tenham sido presos ouexecutados.

Responsabilizando pela morte de Kírov a oposição dentro doPCUS - Zinóviev, Kámeniev, Bukhárine a velha guarda que, no XVII

13 Líder - eraesse o título que Stálin gostava desedar.

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Congresso, reagira mal às proporções faraônica^assumidas pelo_ cultoda personalidade Stálin desencadeou expurgos de amplitude semprecedentes, em processos presididos por Andrêi Vyshínski". ^jn-

assistia a tudo impotente. À sua vizinhaNinaOlshiévskaia, Akhmátova confessou, nessa época, que acreditava nuncamais ser capaz de escrever.

Eentão, Liev voltou aser preso. No início do ano, ao passar porMoscou, vindo de uma viagem de trabalho à região do Don, ele_dis-sera aEmma Gershtéin que talvez fosse preso, ao,yoltar aLeningmdopois uma conversa ouvida em casa de Púnin fora entendida de modoequivocado. De fato, no outono, a tchiôrnaia Marússia - "MariaPreta",nome popular que se dava ao camburão dos agentes da NKVD - veiobusc^q, junto a diversos outros alunos da Faculdade de História acusados de pertencerem auma organização anti-soviética. Pouco depois,foi a vez de Púnin.

Aparentemente, durante um jantar de família, em maio, Púnin tinhatirado fotografias usando, como ílasb, um novo produto químico queproduzia um estampido muito alto. Fazendo uma brincadeira de gostoduvidoso, Nikolái dissera que aquele ruído era suficiente para abafar opróprio tiro que matara Kírov. Essa observação teria sido quyida por umcerto Arkády, um conhecido de Liev que vinha às vezes fazer pequenosreparos domésticos no apartamento da família, e ele a teiia relatado à

se essa história procede, ou que motivaçãoesse Arkády teria para incriminar Púnin: medo, cobiça, ou odesejo deproteger-se apontando o dedo para outro, assim dando às autoridadesuma impressão de lealdade.

Entre os amigos que se prontificaram aajudar Akhmátova, estavamleléna Bulgákova, eaescritora Lídia Seifúllina, pois ambas tinham contatos dentro do Partido eda NKVD. Anna. fQÍiniediatamente aMoscouprocurá-las, bospedando-se em casa de Emma Gershtéin que, em suasmemórias, adescreveu como "um pássaro ferido". Em de novembro,Seifúllina sugeriu que-ela escrevesse diretamente aStálin, pois haveriam

14 Acusador nos processos políticos de 1928, Vyshínskí foi nomeado, em 1931, procurador-geralda Repubhca Russa e, em seguida, da URSS, Recebeu oPrêmio Stálin por ter enunciado adoutrina de que as confissões dos acusados - mesmo quando obtidas sob tortura - podem sera&itas como aprova definitiva de sua culpa. Nomeado ministro das Relações Exteriores em^949' foi demitido em 1953. Tudo indica que se suicidou no ano seguinte.

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de dar um jeito para que a carta lhe fosse entregue pessoalmente porAleksandr Poskrióbyshev, oseu secretário. No dia seguinte, Bons Pllniáka levou, de carro, até o Krêmlin, onde foi entregue a carta:

Respeitadíssimo lósif Vissariônovitch,

Conhecendo a sua atitude sempre atenta às forças da cultura na nossasociedade e, em especial, aseus-escntpres, ouso dirigir-lhe esta carta. No'If? putubro, Nikolái Nikoláievitch Púnin, Professor de Artes Plásticas, emeu filho Liev, foram presos pela NKDV, em Leningrado. Não seique acusações há contra eles,lósifVissariônovitch, masdou-lhea minhapalavra de honra de que eles não são nem fascistas, nem espiões e nemmembros de sociedades contra-revolucionárias. Moro na URSS desdeo início da Revolução. Nunca desejei deixar este paí^ ao qual sinto-meligada pelo coração e a mente, embora os meus poemas não sejam maispublicados e as resenhas dos críticos façam-me passar por muitos momentos amargos. Nunca mepermitificar deprimida; continuo a trabalharem condições morais e materiais muito difíceis e jápubliquei um ensaiosobre Púshkin. O segundo está noprelo. Em Leningrado, vivo solitária epasso boa parte do tempo doente. A prisão das duas únicas pessoas queme estão mais próximas acarreta para mim um golpe do qual não sei seserei capaz de me recuperar. Peço-lhe, lósif Vissariônovitch, queime devolva o meu marido e o meu filho. Tenho a certeza de que osenhor nãose arrependerá de fazê-lo.

Anna Akhmátova

1- de novembro de 1935^^

No mesmo dia, também Bons Pastemák que, de um modo geral,recusava-se a escrever cartas pelos outros, enyiqu aq Líder uma mensagem de tom inuito corajoso:

Uma vez, o senhor me recriminou por ser indiferente quanto à sorte demeus companheiros". Independente do valorquea vida de Akhmátovatem para nós e para a nossa cultura, sou testemunha da existência ho

nesta e difícil que ela leva, e da qual nunca se lamenta. Peço-lhe, lósif

15^ Citada por Serguêi Lavróv.16 Pastemák refere-se a umtelefonema que recebeu deStálin, quando lheescreveu intercedendo

por Mandelshtám.

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Vissariônovitch, que ajudeAkhmátovalibertando seu marido e seu filho,A atitude dela em relação a eles é, para mim, a garantia categórica desua honestidade.

Dessa vez, o apelo à clemência foi ouvido. No papel da carta deAkhmátova, Stálinescreveu: "Ao camarada lágoda: libertar da detençãoos camaradas Púnin e Gumilióv, e me informar quando isso tiver sidofeito". Púnin ficou tão espantado, ao ser solto no meio da noite, queperguntouse poderia esperar até a hora em que osbondes começassema circular, de manhã cedo. Embora o relacionamento de ambos tivesse

se desintegrado por completo, Akhmátova ficou imensamente aliviadaao vêdo em liberdade.

Era à intervenção de suimãe e aos contatos que ela tinha no mundointelectual queLiev deviaa suasoltura. Mas elesempre relutou emacreditar nisso, duvidando do interesse da mãe por ele. A Serguêi Lavróv,ele declarou: "Sofri mais do que os outros, porque me expulsaram dauniversidade e fiquei na miséria, chegando até a passar fome, porquePúnin ficou com todos oscartões de racionamento da Mamãe, e a proibiu até mesmo de me convidar para almoçar, alegando que 'não podiaalimentar a cidade inteira', dando assim a demonstração clara de queme via como um total estranho".

Na realidade, Liev não fora aceito por Púnin no Fontánnyi Dom -tiverade seajeitarno alojamento universitário com um outro estudante,um certo Áksel —; mas tomava as refeições diariamente corn a mãe. Ostempos eram difíceis, e a experiência da prisão, quetomara Púnin aindamais tacitumo e sarcástico, não facilitava as coisas, pois ele estava sempre pronto a jogarna cara de Anna e Liev que ambosnão trabalhavame viviam às suas custas. Isso, no dizer de Emma Gersbtéin, "deixavaessas altivas figuras paralisadas, como se tivessem sido amarradas porum fio invisível".

Por outro lado, o medo de perder o filho desenvolvera um ladomuito possessivo nas relações de Anna com Liev. Ela via como umaameaça o desejo do filho de ir morarem Moscou com Emma, por acreditar que ela teria condições melhores de ajudá-lo. Mais de uma vezGersbtéin relata ter sido tratada por Akhmátova como se fosse umarival. A publicação, em 1998, da seção de suas memórias intituladaAmor Inãesejado, escrita em1993, causou indignação em Moscou, pois

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Os processos políticos prosseguiam, vitimando os suspeitos de serempartidários de Trótski e, em janeiro de 193 '̂ Maksím Górki, que foraatraído de volta à URSS, e se transformara num precioso instrumentode apoio ao regime, morreu em circunstâncias nunca elucidadas: permanece asuspeita de que ele tenha sido envenenado por ordem de Stálin.Entre as pessoas que, nesse ano, desapareceram de maneira mal explicada, estava aDra. Aleksándra Kánel, acompanheira do pai de EmmaGershtéin, que fora a médica de vários altos funcionários do Partido.Tudo indica que Stálin tinha velhas contas aacertar com ela pois, em1932, aDra. Kánel se recusara aassinar ocertificado de óbito de Nadiêj-da Allilúieva, dando como causa da morte uma crise de apendicite.

Em 1936, Víktor Árdov conseguiu que Liev fosse admitido no curso de História da Universidade de Moscou, desde que concordasse emrecomeçar no primeiro ano —o que ele recusou indignado. Mas cadavez tomava-se mais difícil para eles a vida em Leningrado: a pequenapensão paga a Akhmátova tinha sido cortada, e isso a deixara totalmente dependente de Púnin eseus familiares. Gabin-lhe agora amesmaposição humilhante em que, antes, estivera aDra. Anna Ahrens —adeex-esposa rejeitada —pois Nikolái arranjara nova amante, ahistoriadorade arte Marfa Andrêievna Gólubieva^k Embora continuasse morandoem sua própria casa, Marfa estava sempre no Fontánnyi Dom, colaborando com Nikolái em seus artigos - função que, antes, coubera aAnnaAndrêievna. Agora, ele virtualmente aignorava, sobretudo depois queIrina descobriu estar grávida de um namorado, Nikolái Kamínski, quereconheceu a paternidade do bebê, mas com oqual ela nunca chegoua morar. O isolamento em que Akhmátova se sentia reflete-se em umpoema como Posliédnii Tost (O Último Brinde), que deixou Púnin seriamente ofendido:

Eles se tinham conhecido provavelmente em 1935' Marfa foi sua aluna, ela morreu17

171

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Id piúza razonõnnyi dom,za zlúiujizn moiú,za odinótcheswo vdvoiõm

i za tihiá iá piú ~za loj miniá príeddvshikh gub,za míónvikh khólod glaz,za to, shto mirjistók i gnih,za to, shto Bog niêspas.

Bebo à casa arruinada,

às dores de minha inda,

à solidão lado a lado

e a ti também eubebo ~

aos lábios que me mentiram,aojrio mortal nos olhos,ao mundo rude e brutal

e a Deus que não nos salvou.

Para escapar dessa situação ingrata, Anna-reíugiav^a-se-em-easa deainigos,. era.M.oscou —o que deixava Púnin inquieto e o fazia mandar-Ihequantias emdinheiroe telegramas dizendoquea amava e sentia suafalta. Da mesma forma queGumilióv, mesmo depois deseus sentimentosesfriarem, a idéiade perdê-la o incomodava. Mas era como uma exiladaque Akhmátova se sentia, forçãdãTà sê afastarde sua cidade —e nadaoexpressa melhor doque umpoema de17deagosto de1936, e^queela fala do autor da Divina Comédia exilado de sua Florenca natal.

DANTE

ll mio hei San Ciovanni

Inferno, Canto XIX, 1.7

On i póslie smiérti niêvirhúlsaVstdruiu Florêntsiiu svoiú.

Étot, ukhodiá, niêoglinúlsa,étomuiá étu piésn poiú.

Fákiel, notch, posliêdnieie obiátie,za porógom díkii vopl' sudby.On iz áda iêi posldl proklidtiei Vráiu niêmog ieiõ zabít—no bosõi, Vrubákhie pokaiánnoi,sosmtchoi zajjiônoi nie proshiôlpo svoiêi Florêntsiijielánnoi,vierolómnoi, nískoi, dolgojdánnoi.

DANTE

Nem morto eh voltou

a sua antiga ,Flgrença.

Ao deixá-la, nãoolhou para trás.Épara ele que canto esta canção.Uma tocha. Noite. Ultimo abraço.Seu destino selvagem geme porta afora.Quando esteve no Inferno, amaldiçoou esta cidade,mas nãose esqueceu dela ao chegar ao Paraíso.Mas nãofoi ele quem andou, com pés descalços,vestido de saco e comuma vela acesa,

pelas ruas da Florença bem-amada,mesquinha e infiel, que ele tanto desejou...

Emjaneiro de 1937, por interferência de Púnin, a Universidade deLeningrado aceitou que Liev voltasse a se matricular no terceiro ano.Isso lhe deu condições de recomeçar as viagens de pesquisa, nas quais

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levava como assistente omeio-irmão Orést Vissótski, que tivera enormeprazer em conhecer nessa época (Akhmátova também ficara comovidaao vê-lo, e comentara com Emma: "Ele tem as mãos de Nikolái ). Lievtambém pôde ir com mais freqüência aMoscou, onde os Árdov estavammorando em condições bastante confortáveis.

Em maio, Óssip e Nadiêjda Mandelsbtám receberam a permissãode sair deJVorõnej, eAkbtrmtova os viu em Leningrado, durante umabreve estada de dois dias. Mas, agqra^ acomunidade literária a isolaracompletamente e, embora fosse uma das inaiores autoridades dn paísna obra de Púsbkin, sequer foi convidada para as celebrações oficiaisdo centenário de morte do poeta. Uma recaída da tuberculose afez serinternada durante alguns dias no hospital Obukbóv, oridqLiey veio ficarcom ela, numa inesperada demonstração de cuidado com a mãe.

Os expurgos, continuavam e1937 foi oauge do período chamado delejóvshtchina'', do nome de Nikolái lejóv, ochefe da NKVD. Qs .processos e execuções sumárias se intensificaram, a tortura durante os interrogatórios era rotineira e intelectuais ligados ao sistema, como opoetaDemián Biédny, publicavam poemas no Pravda, pedindo que osanguedos inimigos da URSS fosse derramado. Bt^bárin não podia imaginarque, pouco tempo depois de proclamar existe algo_de grandioso eousado na idéiafoemm expurgo geral", seria ele próprio vítima da máquinainfernal que celebrara.

Um dos alvos desses expurgos foi Mikbaíl Lasórkin, reitopda Universidade 4e_Leningrado. Conhecera os pais de Liev, admirava aambos,e era o maior apoio com que ojovem contava dentro da escola. Presojuntamente com sua mulher, Lasórkin morreu sob tortura, durante uminterrogatório, e foi atirado por uma janela do prédio da NKVD, paraque se pudesse alegar que ele se suicidara. Ainda havia quem tentassediscernir um motivo por trás dessas prisões eexecuções. Mas Aldamátova,desde oinício, lhes respondia: "Vocês têm de entender que, neste país, épossível ser preso por absolutamente motivo al^m .Eos fatos viriam lhe

18 Em russo, osufixo -muna. (.shtcliina) designa um período profundamente ligado apersonalidadede um indivíduo; donde onome da ópera Khovãnshtchma, de Mússorgski, arespeito da lebe-

' lião dos Khovânski contra Pedro, oGrande; da mesma forma, será chamada de jdánovshcàimaafase da repressão aos artistas organizada pelo comissário da Cultura Andrêi Jdánov,

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dar razão pois, em lo de março de 1938, Liev Nikoláievitch, que acabarade entrar no quarto ano do curso de História, voltou aser preso.

Desta vez, ocorrera umincidente que pode explicar essa nova detenção. Ele estava assistindo à aula de um certo Pudânski, professor deLiteratura Russa Contemporânea. AgJ^r do Acmeísmo, esse professor começou a fazer pouco de Nikolái Gumilióv, referindo-se às suasaventuras em tom de zombaria; "Ele escreveu a respeito da Abissínia,inas nunca passou da Argélia . No depoimento dado a Serguéi Lavróv,Liev conta: "Não_ consegui tolerar isso e, erguendo-me do lugar ondeestava, gritei, para que o professor pudesse me ouvir: 'Meu pai nuncaesteve na Argélia. Mas à Abissínia ele foi, sim.' Pudânski, num tomcondescendente, não levou em conta o meu comentário: 'Qpem entendemais desse assunto, você ou eu?' Não mecontive: 'Eu, é claro! Afinal decontas, ele era o meu pai' ".

Essas eram palavras muito ousadas para o clima político da ^oca.Pudânski queixou-se de sua impertinência ao novo reitor, que não tinhapor Liev a simpatia de Lasórkin. Épossível que, por esse motivo, ele tenha sido recolhido àprisão da Kriesty onde, desta vez, os interrogadoresforam bem mais violentos.do que em 1935. "A torttrra tinha-se tornadolugar-comum ,disse ele aLavróv. "Tentavam fazer as pessoas confessaremeassinarem uma admissão de culpa que ointerrogador já tinha preparado.

quis confessar nada, pois nada havia de que eu pudesse meculpar, continuaram a me.espancar durante oito noites seguidas."

^ processo sumário, que durou apenas cinqüentaminutos, e emque osacusaram de planejar o assassinato de membros doPartido, Liev e três outros estudantes .foram condenados a^z anos detrabalhos forçados emais quatro de suspensão de^seus direitos civis. Apósa pronúncia da sentença, emoutubro, Akhmátova foi autorizada a reverofilho, que tentou esconder dela todos os sinais de maus-tratos na cadeia,para não alarmá-la. Mas ela estava em pânico porque ouvira, em Moscou,rumores de que a sua sentença fora considerada demasiado leve, e elepodia ser fuzilado. Ea..^sua angústia com aprisão do filho seria redobradapela notícia de que Mandelshtám tinha sido novamente detido.

Aconselhados pelo escritor Isaak Bábel - que, em breve, seria também vítima da perseguição aos intelectuais - Óssip e Nadiêjda tinhamido instalar-se na cidade industrial de Kalínin, às margens do rio Tvier,onde as condições de vida para eles estavam um pouco menos precárias

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vez, porém, Óssip não resistiu; exaurido pela tortura eas privações, morreu em27dedezembro de1938, nocampo de trânsito n-3/10, perto deVladivóstok, ao ser levado para ogúlag deKolyma, naSibéria. Seu corpofoi jogado em uma fossa comum. Mandelshtám tinha apenas 47anos.

A essa altura, personagens novas entraram navida deAnnaAJchrnj.tqva.No outono de 1937, ela tinhasido mandada para o hospital Kúibíshev-skaia, ao lado de sua casa, onde estava sendo tratada de um distúrbio na

tiróidepelo endocrinologista Dr. V.G. Baránov. Ali seencontrou comoDr. Vladímir Gueórguievitch Gárshin a quem, anteriormente, já tinhasido apresentada emcasa do historiador Mikhaíl Engelhardt. Brilhanteprofessor de anatomia patológica na Academia Militar de Medicina deLeningrado, o Dr. Gárshin era um homem bem apessoado, de grandemagnetismo pessoal, e seduziu Akhmátovapela maneira articulada esem afetação como falava. Depois que ela voltou para Leningrado, asua amizade aprofundou-se e elesse tomaram amantes —o que não foibem visto pelo filho mais velho^dq inédico, lúri, que desentendeu-secom o pai e saiu de casa.

NaLeningrado da década de 1930, afligida por crônicos problemasde alojamento, o Dr. Gárshin morava em um apartamento de três cômodos, nurn prédio comunitário do lado sul do cais do Fontanka. Alivivia em companhia dp sua mulher, Tatiana Vladímirovna Gárshina,dos dois filhos, lúri e Aleksêi, da irmã, lúliaGrigórievna, e da filha desta,que era doente mental. E as condições de vida da família tomaram-seainda mais espartanas depois que, em 1936, ao se casar, o irmão maisvelho do médico, lúri Grigórievitch Gárshin, e sua esposa tiveram devir morar com eles.

Embora ligada ao Dr. Gárshin, só em setembro de 1938 Akhmátova separou-se definitivamente de Púnin. Mas não tinha para onde ir e,por isso, continuou morando no apartamento do Eontánnyi Dom. Sajiudo estúdio que.antes ocupara com Níkolái, e passou para um quarto

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menor, onde as coisas se amontoavam com a desordem que semgre caracterizava os lugares onde morou. Foi alique, em novembro de 1938,recebeu pela primeira vez a visita de Lídia Komiêievna Tchpkôvskaia,destinada a se tomar uma de suas mais íntimas amigas.

A filha dq crítico Komiêi Tchukóvski era uma atraente mulher de31 anos, cujo marido, Matviêi Bronshtéin, fora condenado a dez anosde prisão (nunca se soube porque, mas a única explicação plausível éque ele tinha o mesmo nome de família de Liev Trótski). Durante osterríveis anos à frente, Lídia Tchukôvskaia seria a sua amiga mais leale a confidente a quem Akhmátova mais se abriu. Êatravés do olhar sereno dessa mulherde aguda inteligência literária que teremos o retratodo serhumano e da escritora, traçado nos três preciosos volumes dosZapíski oh Annie Ákhmátovoi (Anotações sobre AnnaAkhmátova^®), quecobrem de 1938 a 1966^°.

Lídia e oDr. Gárshin revezaram-se em cuidar dn Akhmátova, principalmente agora que, envolvido com Marfa Góluhieva e preocupadocoma gravidez de Irina- ela teve umamenina, Anna Nikoláievna, emdezembro de1939 -, o ex-marido não lhe dava mais a menor atenção.Uma outra inesperada amiga^urgira; Olga Vissótskaia, que se preocupava com ela e vinha constantemente visitá-la. Laços muito afetuosos,criados a partir das lembranças comuns que tinham de Gumilióv, ligaram-na à mãede OréstNikoláievitch. Lemos, no livro de Tchukôvskaia,a admissão de Anna; "Havia dias em que eu só me alimentava porqueolga Nikoláievna estava lá para me fazer comer. De um modo ou deoutro, ela sempre conseguia meconvencer a cuidar de mim mesma".

Frágil e vulnerável quando estava em Leningrado, a ponto deprecisar que Lídia a acompanhasse de volta para casa, quando ia visitá-la.pois tinha medo deandar sozinha na rua, ànoite, Akhmátova recuperavaenergias iiisuspeitadas, cada vez que iaa Moscou e se hospedava emcasa dos Árdov. Ela não perdia aesperança de fazep junto ao Kr^lin,contatos que a pudessem ajudar a libertar Liõva - ou, pelo menos, aatenuar as condições deseu cativeiro. Enquanto isso, Liev Nikoláievitchestava cada vez mais convencido de quea seusobrenome devia a novaestada na prisão. Ele contou a Serguêi Lavróv:

19 VerBibliografia.20 Os dois primeiros volumes tinham sido publicados em Paris, pela YMCA Press, em 1976 e

1984; a edição russa integral saiu em Moscou, pela Soglásie, em 1997.

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OJnterrogador, capitão Lódyshev, me disse que eu tinha sido preso porser filho de meu pai, E acrescentou: "Não gostamos de você por causadisso", Era absurdo pois,em 1936, todosos participantes da conspiraçãode Tagántsev já tinham sido presos e fuzilados, Mas o interrogador nãolevou isso em conta e, depois de me espancarem durante oito noites,deram-me para assinar uma confissão que nem consegui ler, pois estavamuitomachucado. Mais tardemedisseram que esse Lódyshev foi fuzilado,não sei se em 1938 ou 1939,

O interrogador de Liev não tinha sidoo único, A Revolução estavadevorando seus próprios filhos, Genrikh lágoda, o ex-chefe da NKVD,fora julgado e executado. Seu sucessor, Nikolái lejóv, que passou à História por ter dado o seunome à fase mais negra do Terror, também foiafastado do cargo, e desapareceu, tudo levando a crer que teve morteviolenta, Ein conseqüência da queda de lejóv, Liev, e os outros dois estudantes julgados junto com ele, puderam enviar aoColégio Militar daSuprema Corte da União Soviética umpedido de revisão deseuprocesso, Mas o terreno seestreitava sobosseus pés, pois lejóv foi strbstituídopor Lavrênti Béria, ainda rnaisimpiedoso.

Sufocada pelo desespero de ver seufilho único encarcerado, Akh-mátovarecebeucomouma marteladaa lacônica mensagem de um amigoque lhe telefonou nos primeiros dias de 1939; "Nossa amiga comum,Lea, teve um filho; e a nossa amiga^Nádia ficou vitiva", Essa foi a maneirade lhe avisarem que Mandelshtám tinha morrido, Isso a fez sentir-seainda mais sozinha e desamparada. Nesse meio tempo, ferido por ummachado que lhe caíra no pé, no.campo onde trabalhava cortando árvores, Lievfora trazido de volta à Kriesty, em,Leningrado, para esperarnovo julgamento.

Ali, durante^meses^ a fio —às vezes acompanhada por Lídia, queprocurava notícias domarido, embora Bronshtéirra essa.altura já,tivessesido fuzilado -, Anna esperou, na fila, ao lado,dasoutraa mães, na esperança desaber algo sobre Liev, oude poder confiar a um guarda umpacote dealimentos para ele, Diante.^daqueles muros silenciosos na.sceuum dosmaiores monumentos da literatura russa na fase negrado Terror,À sombra da penitenciária deLeningrado, AnnaAndrêievna tomou-sea voz da Rússia, a porta-voz de todo um povo que sofria.

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Éta jénshtchina holná,étajénshtchina oàná,muj Vmoguílie, synv turmie

(Esta mulher está doente,/ esta mulher está sozinh^,/ o marido no tú-inulo, o filho na prisão); é assim queAkhmátova sedescreve, no poemaem que evoca os longos dias passados diante da Kriesty. nos horáriosde. visita aos presos.

Rekviem: tzikl snkhotvoriênii (Réquiem: Um Ciclo de Poemas, 1935/1957}, durante muito tempo censurado na URSS, é uin dos rnais impressionantes testemunhos literários dosofrimento individual sob aopressãopolítica. Mais doque em qualquer outro deseus poemas, fica patente, nesta obra magistral, como Akhmátova consegue efetuar o trânsito_entre oimediatismo da experiência índhriduiL¥a eternidade de umsentimentouniversal. Do"eu", Akhmátova passa aomundoexterior; e seus lamentospelo filho aprisionado, sem nada perderem de sua qualidade essencialmente pessoal, transformam-se no grito dedor detodos aqueles que foramopriraidos e degradados duranteosanos da tirania stalinista.

Ela teve de se calar quando Mandelshtám foi preso; teve de baixara cabeça a ataques estúpidos de críticos medíocres,,de fazer traduçõespara sobreviver; de escrever poemas de circunstância louvando Stálin,numa tentativa desesperada deconseguir a libertação dofilho ("KidálasVnógui palatchú", confessa no Réquiem: "eu me atirei aos pés de teucarrasco"). Mas todas essas humilhações são resgatadas pela grandezadesse ciclo de poemas, em que a dorde todo um povo é transmudadaem algo de eterno euniversal, pelo próprio paralelo que ela esta^eceentre a dor individual de cada. mãe e a da Mater Dolorosa, ao pé dacruz umqueseu Filho é martirizado, símbolo do sofrimento perene detodas as mães da Humanidade.

Não égratuito ofato de.ociclo ser formado poruma séri.ejie_peque-nos poemas que poderiam ser facilmente memorizados ecarregados, emsegredo —de cor, dentro do coração —, poraqueles para quem tinhamum sentido especial. Assim o poema foi preservado, por muito tempo,por Akhmátova, Tchukõvskaia esuas confidentes mais chegadas. Operigo de ser apanhado com essas palavras escritas em um papefera grande/lemais para que elas pudessem se arriscar. Nesse sentido, acomposiçãodo Réquiem étípica da maneira como os russos se comunicavam, naquela

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Embora Réquiem seja um lamento por seupovo, num momento tãoespecífico da história da URSS, Akhmátova o constrói de tal maneiraque o ciclo transcende a sua era, e transforma-se.-nuirL.grito universale intemporal contra qualquer tipo de perseguição ou intolerância. Asimagens que o percorrem com a força brutal de um filme - os rostos,devastados pela dot e.o medo, das mulheres que esperam do lado defora da prisão; a esposa queassiste impotente a prisão de seumarido; amãe desolada queespera pelaMorte e conversa com elachamando-a de

"tu" - conyertern-se em ícones, da universalidade da crueldade humana

e do sofrimento-que-ela-provoca.NoRéquiem, explode a função do poetacomo aquele que ousa dizer

a verdade. Uma dasfinalidades fundamentais da poesia é converter-sena voz do sofrimento e da redenção, é ser uma arma de resistência ede solidariedade. Eo poema celebra a importância da memória comouma força que nos ajudará a superar o mal. "A dor e o sofrimento nãoeram o que ela mais temia", escreve John Malchunik^^. "Akhmátovatinha muito mais medo de esquecer o que significavam essa dor e essesofrimento, e de trair, assim, não só a si mesma, .mas a todas aquelas aquem emprestavaa sua voz. Elafoi a cantora do amor e da ternura, mastambém da força que se ergue contra o horror, com inabalável integridade." A mesma mulher que, em 1917, já se recusara a deixar a URSS,proclama, na epígrafe do Réquiem:

"Niet, i niêpod tchújdym niehosvódom, (...)iá hylá togdá s moím naródom,tam, gdiê mõi národ, k niestchdstiu, byl".

("Não, não foi sob um céu.estrangeiro, (...) eu estava bem no meio demeu povo,/ lá onde o meu povo em desventuraestava.").

Sóem 1999, ao ser publicado o primeironúmero da revista Istótch-nik(Nascente), soube-se que em 17 de julho de 1939 tinha sido emitidauma resolução do Comitê Especial da NKVD, implicando Liev Gumi-lióv "numa organização de agitadores anti-soviéticos"; e que, durante

21 Citadopor Robin Kemball num anigo para a Russian Reinew de julho de 1974. VerBibliografia.

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onovo inquérito, uma das falsas acusações surgidas contra ele foi adeque sua mãe oincitara aassassinar Andrêi jdánov, que suBstituíra Kí-rov como líder do Partido em Lenirigrado. Apesar das esperanças deAkhmátova de que ofilho fosse libertado, ele foi novamenm condena-do, em 18 de agosto, acinco anos de trabalkqs forçados, no campo deNórilsk, ao norte dq país.

Em 28 de agosto, mandaram lhe avisar que, ao ser mandado devolta para o norte, Liev precisaria urgentemente de vestimentas quen-tes. Lídia ajudou Akhmátova, inteiramente desnorteada, amobilizar osamigos, conseguindo daqui e dali botas, casaco, cachecol, luvas, suéte-res. Depois que Tchukôvskaia aajudou aarrebanhar todas essas roupas,Anna lhe disse; "Não vou te agradecer. A gente não agradece por umacoisa dessas".

Curiosamente, a atitude, em relação aos prisioneiros, nos campossiberianos, era menos rigorosa do que na Rússia européia. Em Nórilsk,permitiram aLiev estudar geologia e, no final de seus anos de pena, elese tomara um hábil técnico de laboratório, capaz de trabalhar com ocobre, o níquel e a platina explorados ali. As condições de vida, porém, não eram melhores no norte: "comparada com o campo, a frentede batalha era uma estação de veraneio", disse ele a Lavróv. O ressentimento contra a mãe, todavia, nãodiminuíra pois, emcarta a Emma, elereclama que Annanunca lhe escreve e acrescenta, ironicamente: "Mastenho a certeza de que está com muito boa saúde".

Não estava. Aos problemas cardíacos, distúrbios da tiróide e crises dgvjia^ " DâClQ

recorrentes de tuberculose, tinha vindo juntar-se a neurite traumática,resultado das muitas horas que passara de pé, na fila, exposta ao frio.E a isso juntava-se um outro motivo de preocupação: Púnin, agora, aestava pressionando para sair definitivamente de seu apartamento, eelanão tinha para onde ir. Os dois poernas reunidos sobjp títulq^de RazIíu(Ruptura), escritos mais tarde, parecem fazer obalanço do que fqi essa ^^fase penosa em sua vida: Desd

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Niê niãiéli, niêmiétsiatsy —gódy Nem semanas nem meses —anosrasstavális. I vot nakoniéts levamos nos separando. Eis,finalmente,kholodõk nastpiáshtchei svobódy ogelo da liberdade verdadeirai siedôi nad uiskdmi umiéts. eas cinzentas guirlandas nafachada dos templos.

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Não mais traições, nao mais enganos, Bólshíe met nié izmiên, ni pnedáielstv,e não me terás mais dejicar ouvindo atéoamanhecer, i do sviéta nié siúshaiesh ty.enquantojlui o riacho dasprovasda minha mais perfeita razão.1940

E como sempre acontece nesses dias de ruptura,à nossa porta hateu p espectro dos primeiros diase, pela janela, irrompeu osalgueiro prateadocom toda a encanecidamagnifcência de seus ramos.

E nós, perturbados, amargos mas altivos,não ousamos, erguer do chão osnossos olhos.Com voz exultante, o pássaro põs-se a cantaro quanto um do outro tínhamos gostado.

25Í9/1944

Icak strúitsapotók dokazátelstvniesravniênnoi moiêi pravoty.

1940

I kak vsiegdá hyváiet v dni razríva,k nam postutchálsa prízrak piérvykh dniêi,1 vorvalds siriéhrinaia íva

sidym velikoltépim vietviêi.

Nam, isstupliônnym, górkim i nadmiênnym,niézmiéiushtchim glazá podmát s ziemlí,zapiéla ptitsa gólosom hlajiênnymo tõm, kak my drug drúga hiriglí.

25/9/1944

Era umafase da qual elasaía sem rancor. Qpando Tchukôvskaia sepreocupou porque ela não tinha para onde ir, ao sair do apartamentodo Fontánnyi Dom, Anna lhe respondeu: "Esta é a minha vida, assimé a minha biografia. Quem pode recusar viver a própria vida?". Aospoucos, ela tinha aprendido a aceitar essa biografia e, damesrna. formaque, um dia, Mandelshtám lhe d^sera: "Estou pronto para morrer", elaagora podia dizer: "Estou pronta para viver". A sua força estava na capacidade de encarar o que quer que estivesse à sua frente.

Na realidade, quando o Terror mergulhou.todo o país ena confusão, Akhmátova nãoestava despreparada. Foi uma das poucas pessoascapazes dedizer aquilo que precisava ser dito: a vida tem deservivida,porque é__ainarga e difícil, mas não existe nada de melhor. Enquantooutros ficavam em estado de choque, totalmente desarvorados, ela,porestranho que isso possa parecer, encontrou-se_em terreno familiar.Desde 1921, quando Gumilióv fora executado, Anna sabia o que. era.a sensação de ver o mundo lentamente desmoronando à sua volta. Enesse momento em que o Terror fazia a noite baixar sobre todo o país,encontrara instintivamente, dentro de si mesma, a força para resistir.

181

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