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i ABIGAIL VILA NOVA GOMES CONHECENDO O SEGUNDO TEMPO: Formando o cidadão integral Relato de contexto apresentado ao Curso de Especialização em Esporte Escolar do Centro de Educação à Distância da Universidade de Brasília em parceria com o Programa de Capacitação Continuada em Esporte Escolar do Ministério do Esporte para obtenção do título de Especialista em Esporte Escolar. Orientador: Profª. Ms. Roseli A. A. Matos Moreira São Paulo 2007

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ABIGAIL VILA NOVA GOMES

CONHECENDO O SEGUNDO TEMPO: Formando o cidadão integral

Relato de contexto apresentado ao Curso de Especialização em Esporte Escolar do Centro de Educação à Distância da Universidade de Brasília em parceria com o Programa de Capacitação Continuada em Esporte Escolar do Ministério do Esporte para obtenção do título de Especialista em Esporte Escolar. Orientador: Profª. Ms. Roseli A. A. Matos Moreira

São Paulo

2007

ii

Gomes, Abigail Vila Nova

Segundo Tempo: Uma experiência de inclusão

São Paulo, 2007

Relato de Contexto (Especialização) – Universidade de

Brasília. Centro de Educação a Distância, 2007.

1. Inclusão 2. Diferença 3. Programa

iii

Abigail Vila Nova Gomes

Conhecendo o Segundo Tempo:

Formando o cidadão integral

Relato de Contexto apresentado ao Curso de Especialização em Esporte Escolar do Centro de Educação à Distância da Universidade de Brasília em parceria com o Programa de Capacitação Continuada em Esporte Escolar do Ministério do Esporte para obtenção do título de Especialista em Esporte Escolar pela Comissão formada pelos professores:

Presidente: Professora Mestre Roseli A. A. Matos Moreira

Universidade Guarulhos

Membro: Professor Dr. Alexandre Luiz Gonçalves de Rezende

Universidade de Brasília

Brasília (DF), de março de 2007.

iv

A Deus, fonte de vida. A meus pais, pelo incentivo e carinho constantes. Aos .......

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a todos os profissionais

engajados no Programa Segundo Tempo, que

incansáveis fazem do seu dia a dia uma

experiência de doação em prol daqueles cuja

sociedade através desta iniciativa voltou-lhes

o olhar e os acolheu.

v

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus porque me capacita a cada dia para exercer esta profissão tão difícil e

ao mesmo tempo tão maravilhosa. A minha família pela compreensão e incentivo, sem os

quais não teria chegado até aqui. E em especial a minha orientadora profª. Roseli Moreira que

me acolheu, orientou e me fez crescer como eu não imaginava que poderia.

vi

Não é possível refazer este país,

democratizá-lo, humanizá-lo, torná-lo

sério, com adolescentes brincando de

matar gente, ofendendo a vida,

destruindo o sonho, inviabilizando o

amor. Se a educação sozinha não

transformar a sociedade, sem ela

tampouco a sociedade muda.

Paulo Freire

7

RESUMO

Este trabalho busca elucidar a importância do Programa Segundo Tempo como agente

transformador, retirando crianças, adolescentes e jovens de situações de risco e

proporcionando, aos mesmos, oportunidades de práticas esportivas que tem embutida em seus

objetivos a formação do cidadão integral cônscio de seus direitos e deveres.

O relato de contexto aqui exposto busca apresentar os aspectos que fortalecem o

Programa e quais são as necessidades para que o mesmo possa ser ampliado e também seja

garantida a sua continuidade.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 09

CAPÍTULO I - Entrando no Programa Segundo Tempo ............................................ 10

CAPÍTULO II - A consolidação do Programa Segundo Tempo no Espaço Escolar:

uma experiência de inclusão ....................................................................................... 21

CAPÍTULO III - Conhecendo o Programa Segundo Tempo: o olhar do educador .... 28

CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 32

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 33

ANEXOS ..................................................................................................................... 35

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INTRODUÇÃO

Diante da crescente necessidade de proporcionar ao indivíduo em formação acesso à

Educação, e que a mesma seja gratuita e de qualidade o Programa Segundo Tempo vem

inovar inserindo uma proposta de educação através da prática de atividades físicas, visando os

menos favorecidos, alocados em locais em que o acesso ao esporte era escasso ou inexistente.

O ponto de partida foi o levantamento de dados quanto a origem, implantação e

relevância do Programa e seu impacto na sociedade.

De posse destes dados surge a necessidade de restringir o olhar direcionando-o a um

ângulo mais específico, visto que o Programa é de abrangência nacional, foi então que escolhi

um município, o de Guarulhos, para atender essa necessidade.

Dados foram coletados quanto a implantação do Programa na localidade, sua estrutura

e abrangência, sendo necessário ir além delimitando um Núcleo em que o Programa foi

implantado e qual o seu impacto na comunidade local.

O trabalho conta com três capítulos sendo que o primeiro situa o Programa Segundo

Tempo no cenário nacional e permite compreender como o mesmo surgiu, foi implementado e

a quem se destina. Segue o segundo capítulo elucidando o caráter inclusivo do programa e seu

impacto na comunidade escolar. Já o terceiro capítulo permite uma apreciação do Programa

sob a ótica do educador, sendo baseado nos dados coletados em loco, em um dos Núcleos do

Segundo Tempo em entrevista com o professor responsável.

O objetivo principal do Programa Segundo Tempo e retirar as crianças, adolescentes e

jovens que se encontram em situação de risco social permitindo as mesmas, acesso a práticas

esportivas colaborando para inclusão social, bem-estar físico, promoção da saúde e

desenvolvimento intelectual e humano assegurando o exercício da cidadania.

10

CAPÍTULO I – ENTRANDO NO PROGRAMA SEGUNDO TEMPO

“ ... toda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a oportunidade

de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem; toda criança possui características,

interesses, habilidades e necessidades de aprendizagem que são únicas; ... (Declaração de

Salamanca).

O Programa Segundo Tempo promovido pelo Ministério do Esporte, busca atender

crianças, adolescentes e jovens, em situação de risco.

De minha parte o contato com tal Programa deu-se através da oportunidade de

participar de uma Especialização em Esporte Escolar, oriunda da parceria firmada entre o

Ministério do Esporte e a Universidade de Brasília. Sendo um curso na modalidade de

Educação à Distância, esta oportunidade foi propiciada devido a minha atuação com Técnico

em Educação Física em uma das unidades do CEU – Centro de Educação Unificada, projeto

consolidado pela Prefeitura Municipal de São Paulo quando da gestão do Partido dos

Trabalhadores, tendo como prefeita a sra. Marta Suplicy. Curso embasado na realidade do

profissional atuante no Programa Segundo Tempo, porém com tal abrangência que capacita o

profissional da área da Educação Física não só para trabalho no Programa, mas sim para o dia

a dia em qualquer local em que se encontre.

A formação do cidadão integral está intrinsecamente ligada ao compromisso de

oportunizar ao educando vivências que venham culminar no desenvolvimento de suas

potencialidades contemplando os aspectos físico e cognitivo.

Vivemos um momento em que o social ocupa um lugar de evidência no mundo, sendo

a criança e sua inclusão social uma grande preocupação. As autoridades governamentais têm,

ao longo dos últimos anos, implantado programas que visam fazer mais para quem precisa

mais. Com esta meta surgiu, a partir de 1995, a Rede de Proteção Social, a qual incorpora

doze programas que procuram contemplar a vasta parcela da população brasileira mais

desprotegida e vulnerável dentre os carentes do país.

11

São eles:

Nome Público alvo Valores Número de

benefícios

Bolsa

Alimentação

Crianças até 6 anos e mães no

período de amamentação, até 6

meses, em famílias com até meio

salário mínimo per capita

R$ 15 por criança

até 3 crianças

1.3000.000

Erradicação do

Trabalho Infantil

Crianças de 7 a 15 anos envolvidas

com trabalho insalubre, penoso ou

até degradante, em famílias com até

meio salário mínimo per capita

R$ 25 por criança na

área rural e R$ 40 na

área urbana

810.769

Bolsa Escola Crianças de 6 a 15 anos em famílias

com até meio salário mínimo per

capita

R$ 15 por criança

até 3 crianças

8.633.354

Auxílio Gás Famílias de baixa renda,

compensadas pelo fim do subsídio

ao preço do gás de cozinha, com a

abertura do mercado de

combustíveis

R$ 7,50 ao mês por

família, pago

bimestralmente em

parcelas de R$ 15

8.108.758

Brasil Jovem

(Agente Jovem

de

Desenvolvimento

Social e Humano

Jovens de 15 a 17 anos, residentes

em comunidades de baixa renda cuja

renda familiar per capita seja de até

meio salário mínimo

R$ 65 por mês 105.000

Abono Salarial

PIS/Pasep

Trabalhador que receber em média

até 2 salários mínimos mensais no

ano anterior, e que estiver

cadastrado no PIS/Pasep há pelo

menos 5 anos, e trabalhado no ano

anterior (com vínculo empregatício

por pelo menos 30 dias)

1 salário mínimo 4.434.328

12

Bolsa

Qualificação

Trabalhador com contrato suspenso,

devidamente matriculado em curso

ou programa de qualificação

profissional oferecido pelo

empregador

Calculado com base

nos 3 últimos

salários

10.400

Seguro

Desemprego

Trabalhador dispensado sem justa

causa (inclusive doméstico), e o

pescador artesanal durante o período

de proibição da pesca

De l salário mínimo

a R$ 336,78, durante

até 5 meses. Para o

trabalhador

doméstico e o

pescador artesanal, 1

salário mínimo

4.686.233

Seguro Safra Família em situação de risco na área

da seca

R$ 100 / parcela

(máximo de 6

parcelas)

938.000

Aposentadoria e

Pensões Rurais

Trabalhadores rurais 1 salário mínimo 6.370.547

Benefício de

Prestação

Continuada

Idosos a partir de 67 anos e

portadores de deficiências com

renda per capita inferior a um quarto

de salário mínimo

1 salário mínimo 1.450.660

Renda Mensal

Vitalícia

Idosos com mais de 70 anos ou

inválidos sem meios de subsistência

nem amparo

1 salário mínimo 724.124

TOTAL 37.572.173

Fonte: Ministérios setoriais em Mensagem ao Congresso Nacional, tendo por base o

ano de 2002.

Os programas anteriormente citados têm em seu bojo minimizar a miséria que aflige

uma grande porcentagem dos brasileiros, dando-lhes um mínimo de recursos para subsistência

e no que tange as crianças exploradas em trabalhos insalubres, penosos ou degradantes, retirá-

las desta situação propiciando-lhes o acesso à escola. Mas isso não é suficiente pois, de

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acordo com a Lei Federal nº 8.069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente em seu Capítulo

IV – Art. 58 e 59 lemos:

No processo educacional respeitar-se-ão os valores culturais, artísticos e históricos

próprios do contexto social da criança e do adolescente, garantindo a estes a liberdade de

criação e o acesso às fontes de cultura. Os Municípios, com o apoio dos Estados e da União

estimularão e facilitarão a destinação de recursos e espaços para programações culturais,

esportivas e de lazer voltadas para a infância e a juventude.

Diante do exposto, esta mesma criança ou adolescente, retirada do trabalho e alocada

em uma escola e outras tantas que se enquadram na mesma situação social, possuem o direito

constitucional de acesso às práticas desportivas (Constituição Federal, Artigo 217) o que em

muitas localidades é escasso ou inexistente.

Para suprir esta necessidade o Ministério do Esporte, através da Portaria nº 032 de 17

de março de 2005, regulamentou e implementou o Programa Segundo Tempo que é destinado

a democratizar o acesso a prática esportiva, por meio de atividades esportivas e de lazer

realizadas no contra-turno escolar. Tem a finalidade de colaborar para a inclusão social, bem-

estar físico, promoção da saúde e desenvolvimento intelectual e humano, e assegurar o

exercício da cidadania.

A exemplo disso é possível citar diferentes experiências realizadas pelo Programa

como segue:

O Programa Segundo Tempo através de regata destaca a importância do mar e

o espírito do Natal em crianças. É o esporte resgatando valores e despertando nas crianças um

olhar mais crítico quanto aos recursos disponíveis e o proveito que se pode tirar deles;

Resgate de crianças de rua de Diadema, neste processo o Segundo Tempo

potencializou ações para resgatar crianças nesta condição, Auxiliando no combate à

exploração sexual infantil no Maranhão, combatendo injustiças sociais e ajudando crianças de

favelas a superar problemas. Do mesmo modo devolveu crianças de rua à escola em Bonito

(MT), retirando crianças da rua e revelando pequenos talentos. Expressam, estes programas, a

urgente necessidade de resgatar crianças e adolescentes que vivem em situação de risco e

encaminhá-las propiciando-lhes oportunidades para seu desenvolvimento pleno e salutar.

Retirá-las apenas das ruas não é a solução, temos que implementar ações que realmente

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resultem em mudança de conduta.

Ao jovem do Segundo Tempo foi possível a conquista do terceiro lugar em

Mundial de Jiu-Jitsu; O talento não escolhe classe social, portanto, cabe a nós, educadores,

direcionarmos um olhar mais criterioso e não discriminatório, à criança mais humilde e

permitirmos que se revele a aptidão de cada um aflorando assim todo o seu potencial. Os

resultados serão inimagináveis.

Mais de 10 mil crianças no Rio de Janeiro, têm acesso ao esporte e mais de

6.600 são beneficiadas em Salvador através do Programa Segundo Tempo. Os números

demonstram a abrangência do Programa e comprovam sua importância como veículo de

promoção social e o Instituto Casa da Gente solicita ampliação do Programa para

comunidades carentes.

Honrar as próprias raízes, procurar uma profissão, são alguns dos desafios

apresentados aos jovens. O trabalho executado junto às crianças portadoras de necessidades

especiais é parte inerente ao Segundo Tempo, visto que a inclusão, carro chefe do Programa,

está sempre presente nas ações implementadas. Por outro lado a construção de tatame faz

comunidade superar desigualdades. Seja na valorização de diversidade étnica existente em

nosso país, seja no aprender de uma profissão ou no respeito às diferenças, convivendo e

crescendo com elas o Segundo Tempo está sempre se fazendo notar, não pela propaganda,

mas sim pelos resultados auferidos.

Mudança na realidade de quebradeiras de coco babaçu no interior do Maranhão

e combate a fome na Bahia são ações que demonstram que embora o Programa seja enraizado

no esporte, explorando todas as suas dimensões, o aspecto social não foi negligenciado, visto

que para se formar o cidadão integral há que se ter o cuidado de respeitar e potencializar o

contexto no qual o mesmo está inserido.

O reconhecimento do Governo Federal ao Segundo Tempo na Semana Anti-

drogas demonstra que o mesmo está conectado a realidade em que os educandos estão

inseridos e atento às suas necessidades.

O público alvo prioritário é de crianças, adolescentes e jovens matriculados no ensino

Fundamental e Médio dos estabelecimentos públicos de educação no Brasil localizados em

áreas de risco social , bem como aqueles que estão fora da escola, de forma a oportunizar sua

inclusão no ensino formal.

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Tendo acesso aos documentos que expõem os propósitos do Programa1 foi possível

destacar os dados abaixo:

Objetivos do Programa Segundo Tempo:

Promover a difusão do conhecimento e conteúdos do esporte;

Oferecer prática esportiva de qualidade;

Garantir o acesso às diversas atividades oferecidas pelo núcleo de esporte;

Democratizar o acesso à prática e à cultura do esporte como instrumento

educacional;

Despertar a consciência da prática esportiva como atividade necessária ao bem

estar individual e coletivo;

Contribuir para o desenvolvimento humano, em busca de qualidade de vida;

Contribuir para o processo de inclusão educacional e social;

Garantir recursos humanos qualificados e permanentes para coordenar e

ministrar as atividades esportivas;

Promover hábitos saudáveis para crianças, adolescentes e familiares;

Estimular crianças e adolescentes a manter uma interação efetiva em torno de

práticas esportivas saudáveis, direcionadas ao processo de desenvolvimento da cidadania;

Contribuir para a ampliação da atividade educacional, visando oferecer

educação permanente e integral por meio do esporte;

Contribuir para a redução da exposição de crianças e adolescentes às situações

de risco social;

Apoiar as ações de erradicação do trabalho infantil;

Contribuir para a diminuição dos índices de evasão e repetência escolar da

criança e do adolescente;

Apoiar a geração de emprego e renda através da mobilização do mercado

esportivo nacional;

Implementar indicadores de acompanhamento e avaliação do esporte

educacional;

Obter reconhecimento nacional e internacional do Programa.

Tendo por base o exposto acima é possível salientar o caráter educacional do

1 Site: www.portal.esporte.gov.br

16

Programa Segundo Tempo. Os demais programas citados anteriormente possuem um cunho

assistencialista, o que não os desmerece em seus objetivos que culminam na melhoria da

qualidade de vida dos menos favorecidos. O Programa em questão sai do âmbito da

assistência social e invade, com propriedade, o da formação. Formar, e formar com qualidade

é tarefa difícil visto que conforme Boneti (2004):

“... a escola, nos dias atuais, se encontra numa situação paradoxal, distinguindo-se as

suas possibilidades e limites de atuação como instituição de resgate da cidadania”.

O Programa Segundo Tempo vem somar esforços na luta para resgatar o direito ao

exercício da cidadania. A Escola hoje assume, mesmo que a contra-gosto, responsabilidades

dantes conferidas às famílias, isto porque com a mudança de paradigmas da instituição

familiar os educandos chegam às instituições escolares com lacunas que necessitam ser

preenchidas. Uma delas que vale ser lembrada é a da convivência, visto que conforme

Ferreira, (1993) a mesma:

“... demanda reciprocidade, solidariedade, respeito ao próximo e, acima de tudo,

generosidade. É um péssimo cidadão, aquele que não consegue ser generoso ao ponto de

limitar, minimamente que seja, seus próprios interesses diante de interesses coletivos”.

Esta postura de liberalidade em favor do outro e em prol do coletivo é premissa para a

prática do esporte e quando se trata do esporte escolar muito mais, visto que o mesmo visa a

formação do educando e não do atleta.

Prossigo no objetivo de elucidar pontos importantes do Programa Segundo Tempo

entrando no campo dos caminhos que permitem uma instituição pública ou privada a

pertencer a este Programa transformando-se em mais um pólo em favor da cidadania.

Modelo de Conveniamento

O Programa Segundo Tempo, contando com as parcerias firmadas com diversos

Ministérios do Governo Federal, tem por estratégia de funcionamento o estabelecimento de

alianças e parcerias institucionais, mediante a descentralização da execução orçamentária e

financeira para Governos Estaduais, Governos Municipais, Organizações Não-

Governamentais e entidades nacionais e internacionais, públicas ou privadas sem fins

lucrativos. Por meio da celebração de convênios com o Ministério do Esporte, essas entidades

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se tornam responsáveis pela execução do Programa., que se dá por meio de Núcleos de

Esporte Educacional.

Modelo de Execução

O Núcleo de Esporte Educacional

Unidade básica de atendimento ao público-alvo do Programa Segundo Tempo, os

Núcleos de Esporte Educacional são destinados à prática esportiva dos participantes do

projeto, mediante programação de atividades a serem desenvolvidas no contra-turno escolar

sob orientação de professores e estagiários de educação física devidamente habilitados e

capacitados para a função. Apresentam a seguinte composição:

Quantitativo mínimo de alunos: cada núcleo deve ter, no mínimo, 200 alunos.

Recursos humanos envolvidos na implementação do programa

Coordenador-Geral do Projeto Local (gestor): 01 para cada convênio firmado

com o Ministério do Esporte. Preferencialmente profissional da área de Educação Física ou de

Educação, com experiência em gestão de programas esportivo-educacionais;

Coordenador de Núcleo: 01 para cada núcleo de 200 alunos. Preferencialmente

profissional da área de Educação Física ou de Educação;

Monitores: 02 para cada 200 alunos ou 04 monitores para cada 200 alunos,

quando a entidade realizar acompanhamento pedagógico e outras atividades, desde que se

garanta o mínimo de 2 monitores para as atividades esportivas, sendo estes estudantes de

graduação regularmente matriculados em curso de Educação Física ou Educação,

preferencialmente já tendo concluído a primeira metade do curso.

Espaço Físico

Os núcleos devem oferecer espaço para a prática das atividades previstas. Podem ser

utilizados os ambientes da escola, espaços comunitários (públicos ou privados),

preferencialmente ociosos e localizados próximo ao local de residência dos participantes,

desde que adequados à prática esportiva, preferencialmente com dependências de apoio.

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Reforço Alimentar

Os núcleos oferecem reforço alimentar ao público atendido, de acordo com cardápio

previamente estabelecido que atenda às recomendações nutricionais adequadas para a faixa

etária atendida.

Oferta de Atividades Esportivas

Os núcleos devem oferecer, no mínimo, a prática de duas modalidades coletivas

(futebol, futsal, handebol, basquete ou vôlei) e uma modalidade individual (atletismo,

natação, vela, tênis de mesa, dança, capoeira, etc.). Para as modalidades coletivas, devem ser

formadas turmas de no mínimo 25 e no máximo 40 alunos; Para as modalidades individuais,

turmas de no mínimo 10 e no máximo 25 alunos.

Carga Horária

A carga horária das atividades distribuídas nos turnos da manhã, tarde ou noite, deve

permitir a cada aluno ter acesso a no mínimo 2h e no máximo 4h de atividade diária, durante

03 vezes por semana. Alguns projetos oferecem atividades cinco vezes por semana.

Atividades Complementares

Os Núcleos devem oferecer atividades complementares, como reforço escolar,

programação cultural e orientação em questões de saúde.

Distribuição de Material Esportivo

O Ministério do Esporte fornece materiais esportivos confeccionados pelos Programa

Pintando a Liberdade e Pintando a Cidadania, que possuem centros de produção em unidades

prisionais e em outros espaços comunitários de diversas regiões do Brasil. O material é

distribuído de acordo com os quantitativos abaixo.

Bolas: 10 bolas de cada uma das modalidades oferecidas (voleibol,

basquetebol, handebol, futsal e futebol de campo) para cada 200 alunos.

Redes: 01 par de redes de cada modalidade (1 para futebol de campo, futsal e

handebol; 1 para basquete e 1 para a modalidade voleibol) para cada 200 alunos envolvidos.

Uniforme: 01 camisa para cada aluno cadastrado.

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Cumpridas as exigências expressas no contrato de convênio temos o necessário para o

início do trabalho com as crianças e viabilizar o funcionamento do Programa. Os resultados

auferidos pelos núcleos em funcionamento empreendem verdade a esta afirmação como é o

caso ocorrido em Fortaleza – CE, exposto por Ana Paula Lopes de Castro quando em seu

trabalho monográfico expressa o resultado de sua pesquisa afirmando que: 90% dos alunos

entrevistados foram contundentes em afirmar que esse Programa deu-lhes a oportunidade da

prática esportiva sadia, dentro de um ambiente que é a escola Raimundo Soares, onde todos

puderam participar independentemente de classes sociais ou até mesmo no que se refere às

aptidões físicas.

Diante do exposto vemos contemplados os aspectos físicos, emocionais e sociais.

Vislumbramos ainda, e com bastante veemência, o caráter inclusivo, uma das bases do

Programa.

Alcançar as metas é desafio para um trabalho coletivo, compromissado e dedicado de

todos os implicados no processo, sendo que cada um tem sua responsabilidade individual,

porém imprescindível para sucesso do coletivo. Segundo o exposto pela Secretaria Municipal

de Esportes de Guarulhos, alguns resultados são esperados, sendo eles:

Impactos diretos:

Melhoria nas capacidades e habilidades motoras dos participantes;

Melhoria no rendimento escolar dos alunos envolvidos;

Diminuição da evasão escolar nas escolas atendidas;

Melhoria da qualificação de professores e estagiários de educação física

envolvidos;

Melhoria da auto-estima dos participantes;

Melhoria das condições de saúde dos participantes.

Impactos indiretos:

Diminuição no enfrentamento de riscos sociais pelos participantes;

Geração de novos empregos no setor de educação física/ esporte nos locais de

abrangência do Programa;

Melhoria da infra-estrutura esportiva no sistema de ensino público do país;

20

Diminuição nos índices de busca dos serviços de saúde pelos participantes.

O Programa Segundo Tempo possui abrangência Nacional e recebe apoio de

organizações nacionais e internacionais. Seu sucesso depende da seriedade e

comprometimento daqueles que dele participam, sendo a criança, o jovem, o adolescente

e a sociedade como um todo os grandes beneficiados. Como já foi dito, se diferencia dos

demais Programas, pois ultrapassa a linha assistencialista em busca do resgate dos

valores, respeito, dignidade e confiança em si mesmo. Não se pode apenas atender as

necessidades urgentes, tais como, comida e moradia, sem propiciar uma perspectiva de

engajamento na vida, condenando o cidadão a mero receptor de benefícios privando-o de

ser sujeito da própria história. Vale lembrar que assumindo as rédeas de sua própria

história há que se ter o cuidado de não se tornar arrogante, pois nas palavras de Paulo

Freire (2004) vemos que:

“Nem a arrogância é sinal de competência nem a competência é causa de

arrogância. Não nego a competência, por outro lado, de certos arrogantes, mas lamento

neles a ausência de simplicidade que, não diminuindo em nada seu saber, os faria gente

melhor. Gente mais gente.”

Tal afirmação contempla os dois lados, educadores e educandos. Seja a nossa

busca sempre no sentido de nos melhorarmos a cada dia, formando e sendo formados,

buscando sempre o bem comum. Entendo que a difusão do Programa estará atrelada ao

envolvimento dos interessados e aos resultados positivos como devolutiva da dedicação

dos gestores, profissionais e educandos que valorizam esta iniciativa em prol da inclusão

dos menos favorecidos.

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CAPÍTULO II – A CONSOLIDAÇÃO DO PROGRAMA SEGUNDO

TEMPO NO ESPAÇO ESCOLAR: UMA EXPERIÊNCIA DE INCLUSÃO

Muito se fala sobre inclusão, os discursos são extensos e inflamados, o que não se

vê, em muitos casos é a efetivação prática das palavras proferidas. Encontramos na fala

de Maria Teresa Egler Mantoan respaldo para esta afirmação, visto que, como afirma a

autora, a verdadeira inclusão vai muito mais além dos discursos ou das ações isoladas,

desconectadas do contexto:

“De certo que a inclusão se concilia com uma educação para todos e com um

ensino especializado no aluno, mas não se consegue implantar uma opção de inserção tão

revolucionária sem enfrentar um desafio ainda maior: o que recai sobre o fator humano.

Os recursos físicos e os meios materiais para a efetivação de um processo escolar de

qualidade cedem sua prioridade ao desenvolvimento de novas atitudes e formas de

interação, na escola, exigindo mudanças no relacionamento pessoal e social e na

maneira de se efetivar os processos de ensino e aprendizagem. Nesse contexto, a formação

do pessoal envolvido com a educação é de fundamental importância, assim como a

assistência às famílias, enfim, uma sustentação aos que estarão diretamente implicados

com as mudanças é condição necessária para que estas não sejam impostas, mas

imponham-se como resultado de uma consciência cada vez mais evoluída de educação e

de desenvolvimento humano Mantoan (1998)”.

O que dizer então de um projeto que vai além dos murros da escola, embora fisicamente

ocorra dentro deles? Que visa preparar o educando para a vida em toda sua complexidade de

aspectos?

Pensando nisto é que o Município de Guarulhos, através da Secretaria Municipal

de Esportes e da Secretaria Municipal de Educação, firmou convênio com o Ministério

do Esporte, visando atender a 30 mil crianças.

O Programa conta com aproximadamente 26 Centros Esportivos e 24 Unidades

Escolares da Rede municipal de Ensino. As atividades nos Centros Esportivos iniciaram

em fevereiro de 2006, a partir do trabalho de massificação já desenvolvido pela

Secretaria de Esportes. Nas escolas as atividades tiveram início no dia 03 de julho de

2006 a partir de dois métodos de trabalho:

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a- OAF – Orientação à Atividade Física – o aluno vivenciará as quatro principais

modalidades coletivas (handebol, basquetebol, futsal e voleibol);

b- P.A.E.E. – Projeto de Ginástica Aeróbica Esportiva nas Escolas: direcionado a

iniciação e aprendizado da ginástica aeróbica esportiva.

Examinando os documentos da Secretaria Municipal de Esportes do Município de

Guarulhos, destinada a capacitar e conscientizar os profissionais envolvidos pude

observar que para alcançar os objetivos do Programa Segundo Tempo as atividades

desenvolvidas têm considerado as características de cada turma (faixas etárias, histórico,

etc.), bem como os temas geradores desenvolvidos com ênfase à uma cultura

multiesportiva e lúdica.

Segundo o mesmo documento a descoberta da aptidão e do “talento esportivo”

deverá se dar naturalmente. O planejamento pedagógico deverá considerar a existência

de etapas e ciclos de atividades conforme o cronograma (anexo) e um conjunto de

estratégias de abordagem. Serão programadas capacitações com os professores para

ajustar o planejamento dos ciclos de atividades. Os núcleos do Programa (Centros

Esportivos e Escolas) estão subdivididos em quatro regiões na cidade. Cada região conta

comum coordenador setorial que está apto a ajudar no planejamento, desenvolvimento e

monitoramento das atividades.

O Programa Segundo Tempo dispõe de um sistema de avaliação através de

relatórios mensais e indicadores de metas e resultados que serão definidos com cada

coordenador de núcleo. O projeto de Ginástica Aeróbica Esportiva nas Escolas – PAEE

dispõe de uma coordenação própria. A coordenação geral do Programa está sob a

responsabilidade da professora Claudia Bernardo, conforme exposto no organograma do

Programa (anexo 1).

Os núcleos do Programa privilegiam regiões de concentração de população de

baixa renda, onde se encontram crianças, adolescentes e jovens em situação de risco. A

exemplo disso trataremos de apresentar análise contextual de um núcleo em especial

situado no jardim Bananal – Guarulhos – SP, no entanto, apresentar análise requer

conhecimento da realidade local, da comunidade em que se insere.

23

O jardim Bananal é um bairro relativamente novo, com cerca de 15 anos de

formação. É oriundo de muitas invasões motivadas pelo sonho da casa própria mesmo

que em área de difícil acesso. Localizado no entorno do Aeroporto Internacional de São

Paulo possui o terreno acidentado, visto que são vários morros e ruas pavimentadas são

escassas.

A comunidade local, segundo observado e relatado no Projeto Político

Pedagógico da escola onde está instalado o Núcleo, é composta, em sua grande maioria,

de indivíduos detentores de baixa renda, sendo trabalhadores braçais, domésticas,

motoristas, pedreiros, etc. Não é incomum nos depararmos com famílias onde o provedor

principal seja a mãe, a avó ou um irmão(ã) mais velho. Através do comportamento de

algumas crianças percebe-se a ausência da figura masculina no cotidiano das mesmas.

A violência, é um dado relevante no entorno, no entanto, a escola é preservada

quanto ao seu patrimônio e não encontra quaisquer empecilhos para seu pleno

funcionamento.

A localidade é estritamente residencial, contando apenas com o comércio local, a

saber, farmácia, açougue, quitanda, padaria, entre outros.

Não existem praças, Centros Esportivos ou qualquer tipo de área de lazer, até

mesmo as brincadeiras de rua ficam comprometidas devido ao terreno acidentado, com

muitos buracos e em alguns casos córregos poluídos e o acesso por transporte coletivo é

feito através de ônibus e lotações que circulam com um tempo médio entre si de cerca de

20 minutos.

Diante deste cenário é possível afirmar que esta população não contava, antes do

Programa Segundo Tempo, com o que Muñoz chama de utopia inédito-viável, ao afirmar

que:

“A alternativa que ofereço é a de ir transformando os Serviços Sociais e seus

equipamentos em outros que eu chamaria Centros, Lugares, Espaços de Encontro,

Gestão e Participação cidadã, aos quais toda a população pudesse ter acesso, alguns

para pedir (e ao mesmo tempo para oferecer alguns de seus potenciais), outros para

oferecer (e talvez em algum momento também para pedir) não como pacientes, usuários,

24

beneficiários, clientes ... mas como co-participante no processo de mudança, de

melhoria de sua vida, de sua família, comunidade, bairro, cidade, país ... do mundo.

Centros, lugares, espaços ... em que a cidadania, além de apresentar suas necessidades e

problemas, intervenha, participe, colabore com seus desejos e interesses, com seus

potenciais, em um empenho, com uma vontade de mudança individual e social (2004)”.

Para elucidar ainda mais o pensamento de Muñoz o mesmo expõe quadro auto-

explicativo como segue:

ESPAÇO 1 ESPAÇO 2 ESPAÇO 3

Cidadãos “Mães, pais” Cidadãos Profissionais Cidadãos

políticos

Cidadãos IAJ Cidadãos Cidadania em geral

(infância, adolescência co-laboradores

e juventude)

Relações baseadas em desejos, interesses e necessidades, problemas

intervêm “desde-com”

proteção, promoção, participação

melhor proteção = promoção-participação

têm “sentimento de ausência”

a dinâmica é: demanda-avaliação

da demanda-estratégia conjunta de ação

IAJ, co-laboradores – sociedade em geral

são os imprescindíveis (sobretudo IAJ)

existe o sério jogo de delegação – representação

o poder e o saber são dinâmicos

25

Diante do exposto é possível afirmar que o trabalho conjunto, o respeito ao outro

e ao seu espaço e o respeito as peculiaridades de cada um só poderá resultar no sucesso e

todos.

O Núcleo do Programa Segundo Tempo em questão está alocado em uma

Unidade Escolar da Prefeitura Municipal e a mesma conta com as seguintes

dependências: 13 salas de aula; uma biblioteca; uma sala de jogos; uma sala de vídeo;

uma sala para o professor e os estagiários do Programa; banheiros masculino e feminino

para os alunos; banheiro adaptado para portadores de necessidades especiais; banheiros

masculino e feminino para professores; banheiro privativo para as cozinheiras; cozinha

para merenda; sala com divisória que abriga direção, coordenação e secretaria, adaptação

feita para melhor atender ao Programa Segundo Tempo cedendo espaço para alocar

materiais e profissionais envolvidos; pátio; quadra descoberta.

A escola completa no corrente ano cinco anos de sua fundação. Funciona em

quatro turnos sendo, das 7 h as 11 h 1ªs e 2ªs séries, das 11 h as 15 h 1ªs, 2ªs, 3ªs e 4ªs

séries, das 15 h as 19 h 1ªs, 3ªs e 4ªs séries e das 19 h as 23 h EJA (Educação para Jovens

e Adultos).

A Unidade Escolar conta com cerca de 1300 alunos, dos quais 350 inscreveram-

se e efetivamente participaram das atividades propostas pelo Programa Segundo Tempo

no semestre passado o que equivale a 26.9%.

O Programa iniciou em 03 de julho de 2006, visando atender as crianças na faixa

etária de 06 a 12 anos em turmas inseridas no horário das 09 h às 15 h, sendo que as

mesmas tinham uma hora de atividade por dia, em três dias, de modo que duas horas

eram dedicadas à prática esportiva e uma à Oficina de Artes. Somente foram aceitas

inscrições de alunos regularmente matriculados na Unidade Escolar em questão.

A Secretaria Municipal de Esportes do Município de Guarulhos aponta em seus

documentos os objetivos principais do Programa que são: a Integração Social e a

Aprendizagem do Esporte Educacional, soma-se a estes outros tantos. Afirmam ainda

que os objetivos traçados para o treinamento de base (modalidade coletiva) contemplam:

Coordenação motora geral;

26

Coordenação motora específica;

Coordenação via jogo;

Velocidade específica e geral, via jogo;

Resistência aeróbica básica, via jogo;

Força geral e específica, via jogo;

Flexibilidade, através de exercícios.

O mesmo documento aponta a necessidade de uma planificação sistemática que

atenda técnica de base e favoreça o ensino e a aprendizagem como segue:

O interesse e a paixão pela modalidade esportiva deve ser despertado e

cultivado;

Objetivar uma consciência da prática do esporte para toda a vida;

Estabelecer as bases para uma orientação a longo prazo no esporte de

rendimento;

Motivar os jovens esportistas de forma individual (pedagogicamente) e

aconselhá-los permanentemente.

O modelo apresentado se configura numa Abordagem Sistêmica, na qual se educa

através do esporte e não para o esporte. Em outras palavras, o esporte não é trabalhado

com o fim em si mesmo. Tal abordagem se diferencia de outras pois, conforme Darido

(2003):

“Para a abordagem sistêmica existe a preocupação de garantir a especificidade,

na medida em que considera o binômio corpo / movimento como meio e fim da Educação

Física Escolar. O alcance da especificidade se dá através da finalidade da Educação

Física na escola, que é, segundo Betti (1992), integrar e introduzir o aluno de 1º e 2º

graus no mundo da cultura física, formando o cidadão que vai usufruir, partilhar,

produzir, reproduzir e transformar as formas culturais da atividade física (o jogo, o

esporte, a dança, a ginástica ...) (p.285)”.

E completa ainda afirmando que:

“Alguns princípios derivados desta abordagem foram apresentados por Betti

(1991). O mais importante é o denominado princípio da não-exclusão, segundo o qual

27

nenhuma atividade pode excluir qualquer aluno das aulas de Educação Física. Este

princípio tenta garantir o acesso de todos os alunos às atividades da Educação Física”.

Admitir a exclusão na prática da Educação Física é o mesmo que negar o seu

principal objetivo, formar. É no respeito ao diferente e na valorização do indivíduo que

podemos alicerçar nossa prática.

Em outras abordagens, como a Crítico-superadora encontramos a mesma

finalidade de transformação social, porém o caráter inclusivo não é tão enfático como na

Abordagem Sistêmica. Já na Abordagem Desenvolvimentista encontramos uma limitação

quanto a pouca ou a limitada discussão, sobre a influência do contexto sócio-cultural que

está por trás da aquisição das habilidades motoras (Darido (2003).

Se pretendermos retirar as crianças, adolescentes e jovens das ruas, temos que

respeitar o contexto em que vivem e utilizar estratégias que venham atraí-los para

práticas esportivas que lhe proporcionem prazer e em contrapartida contribuam para a

sua formação.

O Programa Segundo Tempo trabalha no sentido de propiciar a inclusão

utilizando como meio a prática de atividades físicas, respeitando as peculiaridades de

cada um não excedendo seus limites. Com isso não afirmo que se algum talento se

revelar o mesmo será sufocado para não constranger os demais. Ao contrário, o mesmo

será valorizado e encaminhado para que possa desenvolver em sua plenitude, porém aos

demais será dada a oportunidade de superar suas dificuldades, elucidar seus limites e

cultivar hábitos de prática da atividade física como fonte de prazer e melhora da

qualidade de vida.

28

CAPÍTULO III – CONHECENDO O PROGRAMA SEGUNDO TEMPO: O

OLHAR DO EDUCADOR

Em contato com a instituição do Jardim Bananal, além do contato com os

documentos oficiais, foi possível entrevistar o professor responsável pelo Programa

Segundo Tempo em 2006. Para tanto foi utilizado um roteiro de questões (anexo 2) a

partir das quais o mesmo ofereceu sua apreciação sobre o Programa. Procurarei nos

próximos parágrafos mencionar tais apreciações e relacioná-las a aspectos teóricos e

contextuais.

O Programa prevê atividades para o período de um ano sendo o mesmo iniciado

em julho de 2006, findando em junho de 2007 (anexo 3).

No período de junho de 2006 a janeiro de 2007, do previsto no cronograma, o

Núcleo não recebeu uniformes e os exames médicos deixaram de ser realizados, porém

não foi negligenciado o fator saúde, tão importante para a prática desportiva. No verso da

ficha de inscrição foi alocada uma ficha de anamnese para ser respondida pelo pai ou

responsável e assinada uma autorização para prática de atividades físicas e / ou

esportivas, responsabilizando-se pelos dados informados (anexo 4). Tal ficha tem a

função de resguardar o Programa quanto à responsabilidade sobre a integridade física dos

participantes, visto que os dados coletados pela mesma são fornecidos pelos responsáveis

e dizem respeito ao estado de saúde do educando indicando a restrição ou não quanto a

prática esportiva.

É explícita a preferência dos meninos pelo futsal, e o interesse, mesmo que

acanhado, por parte das meninas. É de extrema importância salientar que a não exclusão

abrange também o fator sexo. Embora os meninos se demonstrem mais habilidosos, a

inclusão das meninas nas atividades é de vital importância, visto que o Programa está

pautado na formação integral do indivíduo e não na de atletas, conforme livro texto do

Módulo 2 página 97 onde lemos:

“Mesmo considerando as diferenças anátomos-fisiológicas que diferenciam os

resultados masculinos e femininos, é importante compreender que as diferenças de

habilidades registradas nas aulas de Educação Física são determinadas social e

culturalmente, uma vez que, muitas vezes, o esporte e o uso da força não fazem parte da

29

expectativa da sociedade a respeito do papel feminino”.

Seja na elite da sociedade ou nas camadas populares, o pensamento machista, é

evidente e, não raro, ouvimos expressões tais como “Isso é coisa de menino”, “Menina

brinca é de boneca”, não é apenas a constituição física que exclui as meninas da prática

do futsal, mas sim o comportamento da sociedade em relação às modalidades que devem

ou não ser praticadas por meninas.

As palavras do educador citadas acima revelam a preocupação trazida pelas

Teorias Pós-Criticas de Currículo segundo Corazza (2002) expressam:

“Tempo, em que as concepções educacionais até então predominantes, como as

de poder, sensibilidade, linguagem, utopia, realidade, não deixam de ter importância e,

inclusive, de funcionarem na sociedade e em nós; mas, no qual – e este é o diagnóstico -,

não dão mais conta deste mundo e de seu tempo, bem como das experiências que neles

vivemos. (...) trata-se de trabalhar, sempre, com as diferenças, reforçá-las e

problematizá-las radicalmente, enfatizar a suas dinâmicas, viver todas as suas

experiências inquietantes e misteriosas. É por suas alteridades que estamos sendo

interpelados e desafiados, como educadores. Foi por isso que os diferentes

desequilibraram as relações conhecidas, dissiparam a segurança identitária, tornaram

estranho tudo o que antes era tão familiar. Para que, junto com eles, assumíssemos a

responsabilidade ética de educá-los em sua própria diferença”.

É nesse cenário que o Programa se desenvolve e busca realmente fazer diferença,

produzindo efeitos reais na sociedade frente a tomada de posição e à mudança de

conduta.

No desenrolar das atividades tivemos a grata surpresa de ver meninos e meninas

cooperando entre si na prática do futsal e a aprovação das famílias coroou o trabalho

desenvolvido revelando que é possível desenvolver um trabalho inclusivo contemplando

todas as suas facetas.

A outra modalidade trabalhada no semestre, o handebol, não pertencia à realidade

de muitos até então. Coube ao educador suscitar o interesse e o prazer pela prática

propiciando aos educandos vivências que contemplassem os objetivos propostos e, ao

30

mesmo tempo despertasse o interesse pela prática do desporto.

Um programa da abrangência do Segundo Tempo propicia as mais diversas

interpretações e os resultados obtidos variam de acordo com a ótica de cada um. Como

educadores pudemos vislumbrar a mudança de conduta de alguns alunos quanto à

agressividade na prática desportiva e no trato com os colegas, como também a

discriminação quanto ao sexo. A boa receptividade dos pais culminou na mudança do

olhar em relação à escola, visto que o Núcleo tem com espaço físico as dependências de

uma Unidade Escolar Municipal. Sendo assim a escola foi beneficiada entre outros

aspectos no estreitamente e na qualidade do relacionamento escola / comunidade. O

melhor feedback foi poder visualizar o envolvimento dos educandos nas propostas

apresentadas, seu crescimento, prazer na prática e principalmente saber que estas crianças

estão fora das ruas e em contato com o esporte e a cultura.

As Oficinas de Artes que eram intercaladas com as atividades físicas e esportivas

de igual modo contribuíram para o sucesso desta primeira etapa, visto que o acesso às

Artes tem contribuído para garantir o acesso a um universo cultural até então

desconhecidos, por vezes, restrito devido à condição sócio-econômica em que o

indivíduo se encontra.

O professor entrevistado acredita que as expectativas para o próximo semestre são

as melhores possíveis, pois aprendendo com os erros procuraremos evitá-los ou ao menos

minimizá-los. Porém faz-se necessário que algumas problemáticas sejam sanadas, tais

como, melhora na qualidade e adequação do material por faixa etária, distribuição do

uniforme como forma de identificação e propaganda do Programa, manutenção dos

profissionais para que haja continuidade do padrão adquirido. E quanto a alimentação

que a mesma seja potencializada, visto que parte dos alunos ao saírem do treinamento se

dirigem para sala de aula não havendo tempo hábil para retornar à residência e alimentar-

se adequadamente, sendo que, em alguns casos a melhor refeição é aquela feita na escola.

Vale ressaltar que as considerações desenvolvidas até aqui, já nos permitem

vislumbrar um horizonte promissor em que possamos contemplar crianças e adolescentes

convivendo e crescendo com suas diferenças, educadores realmente fazendo diferença e

uma prática na Educação Física que prima pelo formar cidadão e não apenas garimpar

atletas. No entanto, para que isto realmente ocorra cabe a cada um dos envolvidos se

31

despir de suas vaidades e orgulhos, trabalhar pelo bem comum e principalmente ter um

olhar diferente para as diferenças.

32

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Programa Segundo Tempo foi idealizado com o firme propósito de propiciar a

inclusão social e retirar de situação de risco crianças, adolescentes e jovens. Diante da

análise documental, revisão bibliográfica, visita a um dos Núcleos do Programa e

entrevista com o professor responsável, pude adentrar ao cenário promovido pelo

Ministério do Esporte que descortina uma iniciativa pautada na formação integral do

indivíduo através da prática esportiva. Uma iniciativa que, embora tenha propósitos

assistenciais, neles não está alicerçada, visto que busca o resgate de valores, a inclusão

em toda a sua dimensão, a saber, social, educacional, cognitiva, entre outras e ainda

promover a mudança de conduta frente a necessidade de combate ao sedentarismo, esta

mazela que corrói lentamente a qualidade de vida do povo brasileiro, abreviando sua

longevidade.

Poder apreciar de perto o desenrolar deste Programa trouxe a minha práxis

acréscimos consideráveis confirmando antigas convicções e destruindo outras tantas e

ainda propiciando novas perspectivas para uma postura mais crítica e consciente frente

ao desafio de ser mais um fio na teia chamada Educação da qual cada educador contribui

ou não para seu crescimento e fortalecimento.

A adequação ou não dos materiais disponíveis não se impõe como empecilho para

uma prática comprometida e produtiva. O educador deve estar cônscio de suas

responsabilidades dentro do processo de formação do educando, procurando enxergar nos

problemas oportunidades de crescimento. Uma postura equilibrada e responsável é

condição sine qua non para propiciar o sucesso do processo. Vale lembrar, que, por

vezes, o educando vê no educador um exemplo a ser seguido, portanto há que se ter

cautela quanto ao procedimento, em especial nas situações que possam suscitar dupla

interpretação.

33

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Constituição da República Federativa do Brasil

CORAZZA, Sandra Mara (2003) Educação da Diferença, disponível no endereço

www.anped.org.br. Acesso em 14 de fevereiro de 2007.

DARIDO, Suraya Cristina – Educação Física na Escola Questões e Reflexões –

Editora Guanabara – Rio de Janeiro – 2003.

FERREIRA, Naura S. C. AGUIAR, Márcia A. de S. (Orgs.) – Gestão da

Educação – Editora Cortez – São Paulo – 2004.

FREIRE, Paulo – Pedagogia da Autonomia – Editora Paz e Terra – São Paulo -

2004.

Instrução Normativa 01, de 15 de janeiro de 1997 - Arquivo PDF

Lei Federal nº 8069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente

Lei nº 8.666, de 21 de julho de 1993

Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002

Lei nº 11.439, de 29 de dezembro de 2006

MANTOAN, Maria Teresa Egler – Educação de qualidade para todos formando

professores para inclusão escolar - São Paulo: DERDIC, 1998.

____________________________ - Integração X inclusão – educação para

todos – Pátio: revista pedagógica – São Paulo: Biblioteca do Centro de Ciências

Exatas – 1998.

MINISTÉRIO DOS ESPORTES (2005) Programa Segundo Tempo, disponível

no endereço http://portal.esporte.gov.br/snee/segundotempo, acesso em 12 de

fevereiro de 2007

34

MUÑOZ, Cesar – Pedagogia da vida cotidiana e participação cidadã - Editora

Cortez – São Paulo - 2004

Portaria nº 32, de 17 de março de 2005 - Arquivo PDF

Portaria nº 135, de 26 de outubro de 2005 - Arquivo PDF

Portaria nº 167, de 11 de setembro de 2006 - Arquivo PDF

Portaria nº 183, de 05 de outubro de 2006 - Arquivo PDF

Portaria nº 200, de 03 de novembro de 2006 - Arquivo PDF

www.psdb.org.br/biblioteca, acesso em 17 de fevereiro de 2007

35

ANEXOS

1- Organograma do Programa

Coordenação

Geral

Coordenação

Setorial

Região I

Coordenação

Setorial

Região II

Coordenação

Setorial

Região III

Coordenação

Setorial

Região IV

Coordenação

PAEE

Professores

Coordenadores

Professores

Coordenadores

Professores

Coordenadores

Professores

Coordenadores

Professor de

Núcleo

Professor de

Núcleo

Professor de

Núcleo

Professor de

Núcleo

Estagiário Estagiário Estagiário Estagiário

36

2- Roteiro da entrevista com o professor do Núcleo

1) Quando iniciou o Programa no Núcleo em questão?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

2) Qual a população atendida?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

3) Quais os horários oferecidos?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

4) Qual o número de alunos por turma?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

5) Qual o espaço físico disponível?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

6) Quais os objetivos?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

7) Quais foram as atividades desenvolvidas?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

8) Como era o acesso das crianças ao esporte antes do Programa?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

37

9) Qual o material disponível?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

10) Que alimentação é oferecida?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

11) Quais os resultados obtidos?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

12) Que melhorias podem potencializar o Programa?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

13) Quais são as expectativas para o próximo semestre?

____________________________________________________________

____________________________________________________________

38

3- Etapas / Atividades do Programa

39

40

41

4- Fichas de inscrição e anamnese

SECRETARIA DE ESPORTES DEPARTAMENTO DE DESPORTO AMADOR

DIVISÃO TÉCNICA DE ESPORTES SEÇÃO TÉCNICA DE MASSIFICAÇÃO ESPORTIVA

INSCRIÇÃO PARA MODALIDADES ESPORTIVAS O preenchimento desta ficha deve ser datilografado ou em letra de forma

Professor (a): Modalidade: Local: Dias: Horário:

Nome: Data de Nascimento: / / RG: Endereço: nº Complemento: Bairro: Cidade: Cep: Fone (Res) Fone (Rec): Nome do pai: Profissão: Fone (Trab): Nome da mãe: Profissão: Fone (Trab):

VIDA ESCOLAR

Nome da Escola: Endereço: Bairro: Cidade: Estado: Cep: Série do Grau Turma Horário: das às

Documentos necessários 1 Foto 3 X 4 Cópia do RG

Atestado Médico Atestado de Matrícula Escolar

42

DADOS SOBRE A SAÚDE

Idade: Altura: Peso: Sexo Possui convênio Médico ( ) SIM ( ) NÃO Qual:

Quais as viroses de primeira infância que o(a) aluno(a) já contraiu? ( ) Coqueluche ( ) Catapora ( ) Rubéola ( ) Sarampo ( ) _____________________________ Atualmente o(a) aluno(a) está fazendo tratamento médico ou de saúde? ( ) Fisioterápico ( ) Medicamentoso ( ) Odontológico ( ) Psicológico Tem freqüentes infecções? ( ) amígdalas ( ) Ouvido ( ) Pulmão ( ) Pele ( ) Rins ( ) Dentes ( ) Hemorragia Nasal Apresenta algum problema alérgico? ( ) Sim ( ) Não – Qual produto? ____________________________________________________ É diabético(a)? ( ) Sim ( ) Não Apresenta algum problema de sangue? ( ) Sim ( ) Não – Qual? _____________________________________ Tipo sanguíneo ________ Apresenta algum problema ósseo? ( ) Sim ( ) Não – Qual? ___________________________________________________________

AUTORIZAÇÃO DO PAI OU RESPONSÁVEL

Autorizo o(a) menor ___________________________________________________________________ A participar de atividades físicas e / ou esportivas, responsabilizando-me pelos dados respondidos.

Guarulhos, ____ de __________________ de 200_____

Nome por extenso: RG: