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ABORDAGEM DA HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA, AFRO- BRASILEIRA E INDÍGENA A PARTIR DE UM PROJETO MULTIDISCIPLINAR Karina Eskildsem (Universidade Estadual de Londrina) Nathália Hernandes Turke (Universidade Estadual de Londrina) [email protected] Resumo Com objetivo de proporcionar aos educandos informações culturais indígenas e afrodescendentes além de promover respeito e igualdade dentro da comunidade escolar, foi desenvolvido o Projeto Multidisciplinar intitulado “Currículo, Mídia e Relações Étnico-raciais: desnaturalizar representações naturalizadas”, em um colégio estadual, na cidade de Apucarana, no Estado do Paraná. O projeto foi composto por: aulas multidisciplinares acerca da cultura afro-brasileira, africana e indígena, preconceitos e respeito; palestras; confecção e exposição de cartazes, fotos e artesanatos; elaboração e apresentação de danças, teatros e jograis; e preparação de comidas típicas da culinária afro-brasileira e indígena. Tal projeto foi desenvolvido ao longo do ano e finalizado no último trimestre, mais especificamente no dia da Consciência Negra, tornando possível notar uma mudança positiva e significativa no quesito valorização e respeito à diversidade cultural e racial. Este resultado evidencia a importância e necessidade de trabalhar esses assuntos dentro da escola, a fim de diminuir, gradativamente, as distorções, preconceitos e estereótipos que foram sendo criados pela sociedade para a discriminação de alguns povos e culturas. Palavras-chave: Multiculturalismo; Equipe Multidisciplinar; Cultura Indígena; Cultura Afro-brasileira; Respeito. Introdução Partindo-se da premissa de que é necessário entender a sociedade como um “agrupamento de cultura, linguagem, costumes, instituições sociais e conteúdos que agrupam sujeitos” (GONÇALVES; GRAUPMANN, 2017, p. 6284), as manifestações

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ABORDAGEM DA HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA, AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA A PARTIR DE UM PROJETO

MULTIDISCIPLINAR

Karina Eskildsem (Universidade Estadual de Londrina)

Nathália Hernandes Turke (Universidade Estadual de Londrina)

[email protected]

Resumo Com objetivo de proporcionar aos educandos informações culturais indígenas e afrodescendentes além de promover respeito e igualdade dentro da comunidade escolar, foi desenvolvido o Projeto Multidisciplinar intitulado “Currículo, Mídia e Relações Étnico-raciais: desnaturalizar representações naturalizadas”, em um colégio estadual, na cidade de Apucarana, no Estado do Paraná. O projeto foi composto por: aulas multidisciplinares acerca da cultura afro-brasileira, africana e indígena, preconceitos e respeito; palestras; confecção e exposição de cartazes, fotos e artesanatos; elaboração e apresentação de danças, teatros e jograis; e preparação de comidas típicas da culinária afro-brasileira e indígena. Tal projeto foi desenvolvido ao longo do ano e finalizado no último trimestre, mais especificamente no dia da Consciência Negra, tornando possível notar uma mudança positiva e significativa no quesito valorização e respeito à diversidade cultural e racial. Este resultado evidencia a importância e necessidade de trabalhar esses assuntos dentro da escola, a fim de diminuir, gradativamente, as distorções, preconceitos e estereótipos que foram sendo criados pela sociedade para a discriminação de alguns povos e culturas. Palavras-chave: Multiculturalismo; Equipe Multidisciplinar; Cultura Indígena; Cultura Afro-brasileira; Respeito. Introdução

Partindo-se da premissa de que é necessário entender a sociedade como um

“agrupamento de cultura, linguagem, costumes, instituições sociais e conteúdos que

agrupam sujeitos” (GONÇALVES; GRAUPMANN, 2017, p. 6284), as manifestações

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culturais possuem grande importância na composição do homem como ser social.

Ruth Benedict (2014), em seu livro ‘O Crisântemo e a Espada’, tratou a cultura como

‘lentes’, através das quais o homem vê o mundo, não sendo, nenhuma nação,

nenhum indivíduo, capaz de enxergar as mesmas coisas. Desta forma, cada nação

ou, mais ainda, cada região possui culturas distintas, e cada indivíduo pode tanto

conservar aspectos de sua cultura como acolher outros costumes culturais,

independentemente de sua nacionalidade (ROCHA E SILVA, 2005).

Ao tentar estabelecer aspectos da cultura brasileira nos deparamos não com

apenas uma cultura, mas múltiplas culturas. Isto se dá pelo fato de o Brasil possuir

um território extenso, com distintas paisagens e demasiadas diferenças climáticas,

econômicas, ideológicas, sociais e culturais. No entanto, apesar do fato

incontestável de que somos uma nação proveniente da miscigenação de raças e

etnias, de notável diversidade cultural, pouco se é falado em multiculturalismo no

âmbito escolar. Percebe-se, então, que a escola brasileira ainda não aprendeu a

conviver com essa realidade, não sabendo “trabalhar com as crianças e jovens de

estratos sociais mais pobres, constituídos, na sua grande maioria, de negros e

mestiços (FERNANDES, 2005, p. 379). A falta de abordagem destes assuntos faz

com que os alunos se quer conheçam a diversidade cultural existente em seu

próprio país, e a falta de conhecimento leva a preconceitos.

Trabalhar multiculturalismo na escola é necessário exatamente para a

valorização da diversidade cultural, buscando “eliminar preconceitos e estereótipos

construídos historicamente, procurando formar uma sociedade alicerçada no

respeito e dignidade do outro com suas diferenças” (BAVARESCO; TACCA, 2016, p.

61). Diante do exposto, e com objetivo de proporcionar aos educandos informações

culturais indígenas e afrodescendentes além de promover respeito e igualdade

dentro da comunidade escolar, foi desenvolvido um Projeto Multidisciplinar, o qual

será detalhado na sequência.

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Desenvolvimento do Projeto Multidisciplinar

No ano de 2018, foi desenvolvido o Projeto Multidisciplinar intitulado

“Currículo, Mídia e Relações Étnico-raciais: desnaturalizar representações

naturalizadas”, em um colégio estadual, na cidade de Apucarana, no Estado do

Paraná. Este projeto foi desenvolvido pela Equipe Multidisciplinar da escola –

composta por docentes e pedagogos –, com colaboração da direção e demais

professores, funcionários e discentes do Ensino Fundamental e Médio.

Apesar de terem sido desenvolvidas atividades pertinentes à história e cultura

africana, e afro-brasileira ao longo do ano letivo nas disciplinas de: Língua

Portuguesa, Arte, História, Sociologia, Filosofia, Matemática e Biologia, a Equipe

Multidisciplinar se efetivou no último trimestre do ano de 2018.

A partir disto, ocorrem encontros seis encontros, em que, com a utilização de

material disponibilizado EAD (vídeos, relatos e textos, foi organizado e estudado o

Plano de Ação da Equipe Multidisciplinar e Plano de Trabalho e buscou-se discutir

algumas leis, em que se destacam as seguintes: Lei nº 10.639, de 09 de janeiro de

2003, que “altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as

diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de

Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira"” (BRASIL,

2003, on-line); e Lei nº 11.645, de 10 de março de 2008, a qual

“Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”” (BRASIL, 2008, on-line).

Com o intuito de a Equipe Multidisciplinar compreender a importância de

conhecer e compreender estas Leis, também foi abordado nas reuniões, com ajuda

dos professores de História e Arte do Ensino Médio, informações acerca dos

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seguintes temas: História da África; Civilizações africanas na antiguidade,

Desmistificação da África e do negro; Políticas públicas, Distinção e redefinição dos

conceitos Raça X Racismo e Etnia X Cultura, assuntos estes que, posteriormente,

foram trabalhados com os e as estudantes.

Após a preparação da Equipe Multidisciplinar, o projeto foi levado aos

estudantes durante todo o ano letivo, destacando diversos temas conforme

ministrados conteúdos nas disciplinas ofertadas. Os professores abordaram

assuntos sobre a cultura afro-brasileira, africana e indígena, teorias raciais, formas

de preconceito e discriminação, eugenia e respeito. Para tal, foram utilizadas

atividades de leituras, vídeos com relatos de pessoas negras e indígenas, filmes,

músicas, poemas. Os estudantes também confeccionaram, com auxílio dos

docentes, cartazes, fotos e artesanatos (Orixás, Bonecas Abayomi, mascaras e tinta

para pintura corporal sobre Consciência Negra e Indígena, igualdade e respeito; e

elaboraram e ensaiaram danças, teatros e jograis.

Tudo o que foi produzido durante os semestres, foram exposto e/ou

apresentado na escola durante a semana da Consciência Negra, a qual é

comemorada no dia 20 de Novembro. Nesta semana também foram preparadas

comidas típicas da culinária afro-brasileira e indígena como feijão tropeiro, feijoada,

cocada, milho cozido e pinhão. Além disso, os alunos participaram de palestras

ofertadas pelo Movimento Apucaranense da Consciência Negra (MACONE), com o

tema: Protagonismo da Juventude Negra e Empoderamento e Protagonismo da

Mulher Negra. Considerações finais Em virtude das discussões nos encontros da Equipe Multidisciplinar, foi

perceptível que seus integrantes conseguiram abordar as questões pertinentes às

temáticas de maneira esclarecedora e satisfatória, dando suporte aos demais

professores. Apesar de algumas dificuldades encontradas, como tempo hábil dentro

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do calendário escolar e recursos financeiros, com a colaboração dos docentes,

funcionários e discentes, foi possível realizar as ações planejadas. Com relação aos

discentes, desde o início dos trabalhos, foi possível notar uma mudança positiva e

significativa no quesito valorização e respeito à diversidade cultural e racial, visto

que muitos alunos passaram a adquirir valores culturais que eles desconheciam até

então.

Apesar dos ótimos resultados, é necessário acrescentar que os temas aqui

levantados não devem e não podem ser abordados apenas durante o

desenvolvimento de um projeto, mas durante todo o ano letivo. O preconceito existe,

e não se pode fingir que diferentes tipos de discriminações não estão acontecendo,

tanto dentro como fora da escola. É necessário levar os alunos a conhecerem e

respeitarem culturas diferentes da sua, desconstruindo seus preconceitos.

Além disso, os jovens negros e indígenas precisam identificar as formas de

preconceitos que sofreram, sofrem ou podem vir a sofrer um dia, precisam se aceitar

enquanto negros e indígenas, sem precisar mudar sua cultura e sua aparência para

se sentirem aceitos na sociedade. Mais ainda, estes jovens precisam se visualizar

enquanto homens e mulheres bonitos/as. E a escola é uma importante ponte para

que possam ser realizadas reflexões e discussões acerca destes assuntos, a fim de

diminuir, gradativamente, as distorções, preconceitos e estereótipos que foram

sendo criados pela sociedade para a discriminação de alguns povos e culturas. Referências BAVARESCO. P. R.; TACCA, D. P. Multiculturalismo e Diversidade Cultural: uma reflexão. Unoesc & Ciência ACHS, Joaçaba, v. 7, n. 1, 2016. BENEDICT, R. O Crisântemo e a Espada: padrões da cultura japonesa. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2014. BRASIL. Lei nº 10.639, de 09 de janeiro de 2003. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para

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incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2003/L10.639.htm>. Acesso em: 27 Fev. 2019. BRASIL. Lei nº 11.645, de 10 de março de 2008. Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Lei/L11645.htm>. Acesso em: 27 Fev. 2019. FERNANDES, J. R. O. Ensino de História e Diversidade Cultural: desafios e possibilidades. Cad. Cedes, Campinas, v. 25, n. 67, 2005. GONÇALVES, K. F.; GRAUPMANN, E. H. O ensino do folclore nas escolas: a perspectiva de docentes dos anos iniciais do Ensino Fundamental. Anais... XIII EDUCERE, Curitiba, 2017. Disponível em: <http://educere.bruc.com.br/arquivo/pdf2017/25878_13431.pdf>. Acesso em 04 Fev. 2019. ROCHA E SILVA, A. F. Correspondentes Internacionais: um diálogo entre culturas. Monografia (Conclusão do curso e Comunicação Social, habilitação Jornalismo). Minas Gerais: FACOM/UFJF, 2005. Disponível em: < http://www.ufjf.br/facom/files/2013/04/ASilva1.pdf>. Acesso em: 04 Fev. 2019.