ABRH2005 Cheia Amazonia Artigo2

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MODELOS DE PREVISÃO DE CHEIAS NA BACIA AMAZÔNICA Marcos Airton de Sousa Freitas 1 , Joaquim Guedes Corrêa Gondim Filho 1 . RESUMO O presente trabalho enfoca o problema da modelagem de cheias para a bacia amazônica, em especial, a previsão de cheias para a cidade de Manaus. Objetivou-se com este artigo fazer uma verificação das cheias históricas ocorridas em Manaus, bem como apresentar modelos para a previsão de cheia em Manaus. Empregaram-se modelos com base em regressões lineares e não lineares, bem como modelos fundamentados em redes neurais artificiais. Os modelos podem com um mês de antecedência fazer um prognóstico para uma possível cheia em Manaus. ABSTRACT This paper focuses the problem of the modeling of flood for the Amazonian basin, in special, the flood forecast for the city of Manaus. It was objectified with this article to make a verification of historical floods occured in Manaus, as well as presenting models for flood forecast for the city of Manaus. Models had been used on the basis of linear and not linear regressions, as well as models based on artificial neural nets. The models can make a possible prognostic for a flood in Manaus with one month of antecedence. Palavras-chave: previsão de cheias, bacia amazônica,redes neurais artificiais. INTRODUÇÃO A Amazônia Legal, conceito criado na década de 50 como estratégia para estimular o desenvolvimento nacional e a ocupação do território brasileiro, possui uma extensão de pouco mais de 5 milhões de quilômetros quadrados. Corresponde a 60% do território nacional e está distribuída em nove estados. O Brasil detém 67,7% da Amazônia Continental – que inclui áreas da Bolívia, Colômbia, Guiana, Guiana Francesa, Equador, Peru, Suriname e Venezuela. Localizada no Norte do país, a Amazônia brasileira limita com todos esses Estados sul-americanos, à exceção do Equador, totalizando uma faixa de fronteira de 12 mil quilômetros (OTCA, 2004). A Região Amazônica é conhecida mundialmente por sua disponibilidade hídrica e pela quantidade de ecossistemas, como matas de terra firme, florestas inundadas, várzeas, igapós, campos abertos e cerrados. A Amazônia abriga uma infinidade de espécies vegetais e animais, com 1 SPO, Área 5, Quadra 3, Bloco L CEP: 70610-200, Brasília – DF.; [email protected] ; [email protected] .

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O presente trabalho enfoca o problema da modelagem de cheias para a bacia amazônica, em especial, a previsão de cheias para a cidade de Manaus. Objetivou-se com este artigo fazer uma verificação das cheias históricas ocorridas em Manaus, bem como apresentar modelos para a previsão de cheia em Manaus. Empregaram-se modelos com base em regressões lineares e não lineares, bem como modelos fundamentados em redes neurais artificiais. Os modelos podem com um mês de antecedência fazer um prognóstico para uma possível cheia em Manaus.Em citações:FREITAS, M. A. S. ; GONDIM FILHO, J. G. C. . Modelos de Previsão de Cheias na Bacia Amazônica. In: XVI Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos, 2005, João Pessoa. Anais do XVI Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos. Porto Alegre : Editora da ABRH, 2005. v. 1. p. 23-23.

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MODELOS DE PREVISÃO DE CHEIAS NA BACIA AMAZÔNICA

Marcos Airton de Sousa Freitas1, Joaquim Guedes Corrêa Gondim Filho1.

RESUMO

O presente trabalho enfoca o problema da modelagem de cheias para a bacia amazônica, em

especial, a previsão de cheias para a cidade de Manaus. Objetivou-se com este artigo fazer uma

verificação das cheias históricas ocorridas em Manaus, bem como apresentar modelos para a

previsão de cheia em Manaus. Empregaram-se modelos com base em regressões lineares e não

lineares, bem como modelos fundamentados em redes neurais artificiais. Os modelos podem com

um mês de antecedência fazer um prognóstico para uma possível cheia em Manaus.

ABSTRACT

This paper focuses the problem of the modeling of flood for the Amazonian basin, in special,

the flood forecast for the city of Manaus. It was objectified with this article to make a verification

of historical floods occured in Manaus, as well as presenting models for flood forecast for the city

of Manaus. Models had been used on the basis of linear and not linear regressions, as well as

models based on artificial neural nets. The models can make a possible prognostic for a flood in

Manaus with one month of antecedence.

Palavras-chave: previsão de cheias, bacia amazônica,redes neurais artificiais.

INTRODUÇÃO

A Amazônia Legal, conceito criado na década de 50 como estratégia para estimular o

desenvolvimento nacional e a ocupação do território brasileiro, possui uma extensão de pouco mais

de 5 milhões de quilômetros quadrados. Corresponde a 60% do território nacional e está distribuída

em nove estados. O Brasil detém 67,7% da Amazônia Continental – que inclui áreas da Bolívia,

Colômbia, Guiana, Guiana Francesa, Equador, Peru, Suriname e Venezuela. Localizada no Norte

do país, a Amazônia brasileira limita com todos esses Estados sul-americanos, à exceção do

Equador, totalizando uma faixa de fronteira de 12 mil quilômetros (OTCA, 2004).

A Região Amazônica é conhecida mundialmente por sua disponibilidade hídrica e pela

quantidade de ecossistemas, como matas de terra firme, florestas inundadas, várzeas, igapós,

campos abertos e cerrados. A Amazônia abriga uma infinidade de espécies vegetais e animais, com

1 SPO, Área 5, Quadra 3, Bloco L CEP: 70610-200, Brasília – DF.; [email protected]; [email protected].

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cerca de 1,5 milhão de espécies vegetais catalogadas, três mil espécies de peixes, 950 tipos de

pássaros, além de insetos, répteis, anfíbios e mamíferos.

A mais extensa rede hidrográfica do globo terrestre, a Região Amazônica ocupa uma área

total de 6.925.674 km², desde suas nascentes nos Andes Peruanos até sua foz no oceano Atlântico,

ao norte do Brasil, abrangendo territórios do Brasil, Colômbia, Bolívia, Equador, Guiana, Peru e

Venezuela.

A vazão média de longo período estimada do rio Amazonas é da ordem de 133.861 m³/s (68%

do total do país). A contribuição de territórios estrangeiros para as vazões da região hidrográfica é

de 71.527 m³/s. As maiores demandas pelo uso da água na região ocorrem nas sub-bacias dos rios

Madeira, Tapajós e Negro, e correspondem ao uso para irrigação (37% da demanda total). A

Demanda Urbana representa 17% da demanda da região (10,9 m³/s). De um modo geral, os

consumos estimados são pouco significativos quando comparados com a disponibilidade hídrica.

Uma das características dessa região diz respeito ao desmatamento florestal observado. Até

janeiro de 1978 a área desmatada nos estados inseridos na Região Amazônica correspondia a

85.100 km², resultado das ações humanas na bacia ao longo de mais de quatro séculos. A partir da

década de 70 ocorreu um incremento significativo na ocupação da região, tendo como resultado

desta dinâmica a ampliação das áreas desmatadas. Em 1999, registrava-se uma área desmatada de

440.630 km2. Dados do INPE indicam, para os anos de 1999 e 2000, taxas de desflorestamento

bruto de 17.259 e 19.836 km²/ano, respectivamente

(http://www.ana.gov.br/mapainicial/pgMapaA.asp).

As cheias na Bacia Amazônica decorrem de um fenômeno natural, como parte da dinâmica do

rio. No caso específico da cidade de Manaus e seu entorno, decorrem principalmente das afluências

dos rios Solimões e Negro. Devido à larga extensão da bacia a previsibilidade de cheias na cidade

de Manaus, principal município da bacia, é relativamente fácil e pode ser implementada com vários

dias de antecedência.

DESCRIÇÃO DOS MODELOS EMPREGADOS

A CPRM – Serviço Geológico do Brasil vem desenvolvendo, desde 1989, o Projeto

denominado Alerta de Cheias de Manaus, onde se realiza o monitoramento do processo anual de

cheias no sistema Solimões/Amazonas/Negro. Com antecedência de 75, 45 e 15 dias é feita uma

previsão de máxima cheia do rio Negro, no Porto de Manaus (Figura 1).

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Figura 1 – Localização dos postos fluviométricos empregados.

Dada à disponibilidade dos dados do posto Porto de Manaus, possuindo valores de cota a

partir de setembro de 1902, foi possível estabelecer regressões entre o pico da cheia e os valores de

cota com 75, 45 e 15 dias de antecedência (HIDRO-ANA, 2002). Utilizaram-se as cotas dos dias 30

de março, 30 de abril e 31 de maio para a previsão da cota no dia 15 de junho.

Para tal a CPRM, no ano de 2004, usou as seguintes equações:

• Previsão de 31 de março: Hmax=1627,23175 ln H31 março -9925,32303, com coeficiente

de correlação, R=0,84273;

• Previsão de 30 de abril: Hmax=8,2156 H30 abril ^ 0,73998, com coeficiente de correlação

R=0,93740;

• Previsão de 31 de maio: Hmax=2,19925 H31 maio^ 0,90217, com coeficiente de

correlação R=0,97659.

Nos três casos Hmax é a cota máxima da cheia; H31 março, H30 abril, H31 maio são as cotas

observadas na estação do Porto de Manaus, nos dias 31 de março, 30 de abril e 31 de maio,

respectivamente, tudo em centímetros.

Para o ano 2005, empregando-se as equações de regressão da CPRM, têm-se os seguintes

valores, para o posto Porto de Manaus: H31 março= 2601 Hmax= 2871; H30 abril=2716 Hmax= 2855

(conforme FAX nº 157/SUREG-MA/2005) e H31 maio=2808 Hmax= 2840. Essa concepção tem

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como base na observação do cotagrama típico da estação fluviométrica do Porto de Manaus

(Roadway), cuja série histórica iniciou em setembro de 1902, do qual se inferiu as correlações entre

as cotas de um determinado dia com a cota do pico da cheia (Boletim CPRM, 2005).

Partindo desse princípio, foram determinadas, inicialmente, correlações lineares entre as cotas

em 31 de março, 30 de abril e 31 de maio, para o posto de Manaus, e a cota em 15 de junho para o

mesmo posto, empregando-se os dados de 1902 a 2003. As Figuras 2 a 4 apresentam as equações de

regressão linear encontradas. Os valores de cota encontrados foram: H31 março= 2601 Hmax= 2864;

H30 abril=2716 Hmax= 2845 e H31 maio=2808 Hmax= 2833.

31 DE MARÇO PARA 15 DE JUNHO

y = 0.7005x + 1041.5R2 = 0.6962

1800

2000

2200

2400

2600

2800

3000

1800 2000 2200 2400 2600 2800 3000

Figura 2 – Equação de regressão linear para previsão em 31 de março para 15 de junho.

30 DE ABRIL PARA 15 DE JUNHO

y = 0.8103x + 644.71R2 = 0.8721

1800

2000

2200

2400

2600

2800

3000

1800 2000 2200 2400 2600 2800 3000

Figura 3 – Equação de regressão linear para previsão em 30 de abril para 15 de junho.

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31 DE MAIO PARA 15 DE JUNHO

y = 0.9675x + 116.5R2 = 0.9664

1800

2000

2200

2400

2600

2800

3000

1800 2000 2200 2400 2600 2800 3000

Figura 4 – Equação de regressão linear para previsão em 31 de maio para 15 de junho.

Foi determinada, para cada uma das três datas, a curva de melhor ajuste entre as cotas em 31

de março, 30 de abril e 31 de maio, para o posto de Manaus, e a cota em 15 de junho para o mesmo

posto, empregando-se os dados de 1902 a 2003. As Figuras 5 a 7 apresentam as curvas encontradas.

Os valores de cota encontrados foram: H31 março= 2601 Hmax= 2860; H30 abril=2716 Hmax= 2842

e H31 maio=2808 Hmax= 2834.

S = 63.53731272r = 0.97709266

X Axis (units)

Y A

xis

(uni

ts)

0.0 493.2 986.3 1479.5 1972.7 2465.8 2959.00.00

542.12

1084.23

1626.35

2168.47

2710.58

3252.70

Figura 5 – Equação de regressão para previsão em 31 de março para 15 de junho.

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S = 41.57088607

r = 0.99025879

X Axis (units)

Y A

xis

(uni

ts)

0.0 516.4 1032.9 1549.3 2065.8 2582.2 3098.70.00

542.12

1084.23

1626.35

2168.47

2710.58

3252.70

Figura 6 – Equação de regressão para previsão em 30 de abril para 15 de junho.

S = 21.26122298

r = 0.99751196

X Axis (units)

Y A

xis

(uni

ts)

0.0 537.2 1074.3 1611.5 2148.7 2685.8 3223.00.00

542.12

1084.23

1626.35

2168.47

2710.58

3252.70

Figura 7 – Equação de regressão para previsão em 31 de maio para 15 de junho.

As equações encontradas foram as seguintes:

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• Previsão de 31 de março: Hmax= a(1-ebx), com a=4536.8463 e b=0.00038268861;

coeficiente de correlação, R=0,97709266;

• Previsão de 30 de abril: Hmax= a(1-ebx), com a=5993.1868 e b=0.00023665087; com

coeficiente de correlação R=0,99025879;

• Previsão de 31 de maio: Hmax=a+bx+cx2+dx3, com a=-0.049291611; b=1.3914972;

c=-0.00027202643; d=4.8393553E-8; com coeficiente de correlação R=0,99751196.

A Tabela 1 resume os resultados encontrados utilizando essa metodologia.

Tabela 1 – Previsão de cotas máxima.

Cota CPRM ANA_Simples ANA_Outras Curvas31 de março: 2601 2871 2864 286030 de abril: 2716 2855 2845 284231 de maio: 2808 2840 2833 2834

Segundo a CPRM, As cheias de Manaus flutuam em torno do pico médio anual (27.71m)

entre 26.56m a 28.86m, sendo o nível 29.00 metros, caracterizado como a cota de emergência. Os

primeiros alagados surgem aos 27.00 metros e aos 28.50 metros começam os transtornos dos

ribeirinhos (Fonte: http://www.cprm.gov.br/rehi/manaus/prev_manaus.htm).

Verificou-se que, nem sempre o pico de cheia se dá por volta de 15 de junho. Em alguns anos

o pico de cheia máxima ocorria por volta de 1º de julho. Foram feitas então, também, previsão para

o dia 1º de julho. Para tanto, foram empregadas regressões lineares e regressões não lineares.

Foram determinadas, inicialmente, correlações lineares entre as cotas em 31 de março, 30 de

abril e 31 de maio, para o posto de Manaus, e a cota em 1º de julho para o mesmo posto,

empregando-se os dados de 1902 a 2003. As Figuras 8 a 10 apresentam as equações de regressão

linear encontradas. Os valores de cota encontrados foram: H31 março= 2601 Hmax= 2859; H30

abril=2716 Hmax= 2840 e H31 maio=2808 Hmax= 2829.

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31 DE MARÇO PARA 1º DE JULHO

y = 0.6857x + 1075.9R2 = 0.6382

1800

2000

2200

2400

2600

2800

3000

1800 2000 2200 2400 2600 2800 3000

Figura 8 – Equação de regressão linear para previsão em 31 de março para 1º de julho.

30 DE ABRIL PARA 1º DE JULHO

y = 0.7745x + 736.64R2 = 0.7619

1800

2000

2200

2400

2600

2800

3000

1800 2000 2200 2400 2600 2800 3000

Figura 9 – Equação de regressão linear para previsão em 30 de abril para 1º de julho.

31 DE MAIO PARA 1º DE JULHO

y = 0.936x + 200.77R2 = 0.8652

1800

2000

2200

2400

2600

2800

3000

1800 2000 2200 2400 2600 2800 3000

Figura 10 – Equação de regressão linear para previsão em 31 de maio para 1º de julho.

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Foi determinada, para cada uma das três datas, a curva de melhor ajuste entre as cotas em 31

de março, 30 de abril e 31 de maio, para o posto de Manaus, e a cota em 1º de julho para o mesmo

posto, empregando-se os dados de 1902 a 2003. Os valores de cota encontrados foram: H31 março=

2601 Hmax= 2856; H30 abril=2716 Hmax= 2846 e H31 maio=2808 Hmax= 2832.

As equações encontradas, nesse caso, foram as seguintes:

• Previsão de 31 de março: Hmax= a(1-ebx), com a=4430.4425 e b=0.00039779892;

coeficiente de correlação, R=0,97144537;

• Previsão de 30 de abril: Hmax=a+bx+cx2+dx3+ex4, com a=-227350.23; b=383.36246;

c=-0.23903886; d=6.5977762E-5; e=-6.7917371E-9; com coeficiente de correlação

R=0,87841544.

• Previsão de 31 de maio: Hmax=a+bx+cx2+dx3, com a=0.0077274701; b=1.5360725;

c=-0.00036934076; d=6.4533545E-8; com coeficiente de correlação R=0,98941116.

A Tabela 2 resume os resultados encontrados utilizando essa metodologia, com as previsões

para 1º de julho de 2005.

Tabela 2 – Previsão de cotas máxima.

Cota ANA_Reg. Simples ANA_Outras Curvas31 de março: 2601 2859 285630 de abril: 2716 2840 284631 de maio: 2808 2829 2832

Modelos baseados em Redes Neurais Artificiais

Foram também empregados modelos baseados em redes neurais artificiais. Recentemente foi

alcançado significativo progresso nos campos do Reconhecimento do Padrão e da Teoria de

Sistemas com o uso de Redes Neurais Artificiais (RNA). As redes neurais são estruturas

matemáticas flexíveis capazes de identificar relações não-lineares e de descrever processos

complexos. A denominação Redes Neurais Artificiais é dada aos modelos, que tentam reproduzir a

estrutura e o funcionamento dos neurônios no cérebro (KOSKO, 1992; FREITAS e BILLIB, 1997).

Uma RNA compõe-se de um elevado número de elementos, denominados neurônios (cells, units) e

um grande número de ligações, conhecidas como sinapses (Figura 11). A cada ligação (links,

Page 10: ABRH2005 Cheia Amazonia Artigo2

connections) é associado um peso, que está intrinsecamente relacionado à capacidade de

aprendizado da rede (FREITAS, 1998a).

A criação de uma RNA baseia-se nas seguintes tarefas (FREITAS, 1997):

• Determinação das características da rede: topologia; tipos de ligações; ordenamento

das ligações e pesos;

• Determinação das características dos neurônios: funções de entrada, ativação ou

transferência e de saída;

• Determinação da dinâmica da rede: geração dos valores iniciais dos pesos das

ligações; processos de otimização e regras de aprendizagem.

Figura 11 – Representação de uma Rede Neural Artificial.

Dependendo da dinâmica da rede, bem como dos neurônios e da topologia foi desenvolvido

uma infinidade de Redes Neurais Artificiais, a saber: o modelo Perceptron (ROSENBLATT, 1962);

o modelo Backpropagation (RUMMELHART et al., 1986); o modelo ADALINE (WIDROW e

HOFF, 1960); a rede de KOHONEN (KOHONEN, 1984); o modelo HOPFIELD (HOPFIELD,

1982), o modelo ART (CARPENTER e GROSSBERG, 1987) etc. Dentre esses, o método

Backpropagation (retroalimentação) é o método mais conhecido e utilizado. Uma função de

apredizagem simples é dada apenas com o parâmetro de aprendizagem.

O algoritmo backpropagation procura minimizar o erro obtido pela rede ajustando pesos e

limiares para que eles correspondam às coordenadas dos pontos mais baixos da superfície de erro.

Para isso ele utiliza um método de gradiente descendente (CARVALHO et al., 1998). A modelagem

processa-se, portanto, através das fases de treinamento, validação e previsão.

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Aplicações de redes neurais na área de recursos hídricos podem ser vistas em ALENCAR et

al. (1998), BARROS e FREITAS (1998), FREITAS (1998b), bem como RIBEIRO e FREITAS

(1998).

Um dos softwares de otimização deste tipo de rede é o Slug3 (desenvolvido em linguagem

Pascal) com três camadas de neurônios onde se pode implementar a quantidade destes por camada

(topologia), bem como modificar a taxa de aprendizagem, o termo de 'momentum', a quantidade de

ciclos necessários ao ajuste e a margem de erro que se queira obter.

Figura 12 – O software Slug3 de Rede Neural Artificial

O funcionamento de uma rede é baseado em cálculos de pesos entre os neurônios, onde se

utilizando dados reais (dados de entrada e os respectivos resultados). A rede 'aprende' por exemplos

a relação (não-linear) existente entre os dados. Têm-se, normalmente, como critérios de parada do

processo de treinamento o encerramento após um determinado número de ciclos ou o término após

atingir-se um erro quadrático médio pré-fixado.

Tendo como valores de entrada as cotas em 31 de março, 15 de abril e 30 de abril, para o

posto de Manaus, foi ajustada uma rede neural, tendo como saída a cota em 15 de junho.

Empregou-se a série de 1903 a 1977 para a calibração do modelo (Figura 13) e o período de 1978 a

2003 para a validação (Figura 14). O valor de cota prevista para 15 de junho de 2005, com H31

março= 2601; H15 abril=2645 e H30 abril=2716 Hmax= 2860. Analogamente, ajustando-se uma outra

rede neural, o valor de cota prevista para 1º de julho de 2005, com H15 abril=2645; H30 abril=2716 e

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H15 maio=2767 Hmax= 2840. Empregou-se, também, neste último caso a série de 1903 a 1977 para

a calibração do modelo (Figura 15) e o período de 1978 a 2003 para a validação (Figura 16)

Calibração do modelo RNA 3-3-1 (1903-1977)

0.2000

0.2200

0.2400

0.2600

0.2800

0.3000

1 5 9 13 17 21 25 29 33 37 41 45 49 53 57 61 65 69 73

Obs_15/6/2005 Calc._modelo rna

Figura 13 – Calibração de uma RNA para o posto de Manaus (15 de junho de 2005).

Validação do modelo RNA 3-3-1(1978-2003)

0.2000

0.2200

0.2400

0.2600

0.2800

0.3000

1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25

Obs_15/6/2005 Calc._modelo rna

Figura 14 – Validação de uma RNA para o posto de Manaus (15 de junho de 2005).

Page 13: ABRH2005 Cheia Amazonia Artigo2

Calibração do modelo RNA 3-3-1 (1903-1977)previsão para 1º de julho

0.2000

0.2200

0.2400

0.2600

0.2800

0.3000

1 5 9 13 17 21 25 29 33 37 41 45 49 53 57 61 65 69 73

Obs_1-jul Calc._modelo rna

Figura 15 – Calibração de uma RNA para o posto de Manaus (1º de julho de 2005).

Validação do modelo RNA 3-3-1(1978-2003)previsão para 1º de julho

0.2000

0.2200

0.2400

0.2600

0.2800

0.3000

1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25

Obs_1-jul Calc._modelo rna

Figura 16 – Validação de uma RNA para o posto de Manaus (1º de julho de 2005).

Tendo como valores de entrada as cotas em 30 de abril, 15 de maio e 31 de maio, para o posto

de Manaus, foi ajustada uma rede neural, tendo como saída a cota em 15 de junho. Empregou-se a

série de 1903 a 1977 para a calibração do modelo (Figura 17) e o período de 1978 a 2003 para a

validação (Figura 18). O valor de cota prevista para 15 de junho de 2005, com H30 de abril= 2717; H15

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maio=2785 e H31 maio=2808 Hmax= 2810. O valor da cota observada em 15 de junho foi exatamente

2810.

Calibração do modelo RNA 3-3-1 (1903-1977)

previsão para 15 de junho

0.2000

0.2200

0.2400

0.2600

0.2800

0.3000

1 5 9 13 17 21 25 29 33 37 41 45 49 53 57 61 65 69 73

Obs_15/6/2005 Calc._modelo rna

Figura 17 – Calibração de uma RNA para o posto de Manaus (1º de junho de 2005), com as

cotas em 30 de abril, 15 de maio e 31 de maio.

Validação do modelo RNA 3-3-1(1978-2003)

previsão para 15 de junho

0.2000

0.2200

0.2400

0.2600

0.2800

0.3000

1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25

Obs_15/6/2005 Calc._modelo rna

Figura 18 – Validação de uma RNA para o posto de Manaus (1º de junho de 2005), com as

cotas em 30 de abril, 15 de maio e 31 de maio.

Page 15: ABRH2005 Cheia Amazonia Artigo2

Estabeleceram-se, ainda, regressões com postos à montante de Manaus, a saber os postos

fluviométricos de Tabatinga, Seringal Fortaleza e Forte das Garças, objetivando prever os valores

de cotas dos postos fluviométricos de Manacapuru e Porto de Manaus.

Calibração do modelo RNA 3-3-1 (1983-1994)Previsão Tabatinga para Manacapuru-Manaus

0.15000.17000.19000.21000.23000.25000.27000.29000.3100

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Obs_15/6/2005 Calc._modelo rna Manaus_Obs Manaus_Cal

Figura 19 – Calibração de uma RNA para o posto de Manaus (15 de junho de 2005) a partir

dos dados do posto de Tabatinga.

Validação do modelo RNA 3-3-1(1995-2003)Previsão Tabatinga para Manacapuru-Manaus

0.1500

0.17000.1900

0.2100

0.23000.2500

0.27000.2900

0.3100

1 2 3 4 5 6 7 8 9

Obs_15/6/2005 Calc._modelo rna Manaus_Obs Manaus_Cal

Figura 20 – Validação de uma RNA para o posto de Manaus (15 de junho de 2005) a partir

dos dados do posto de Tabatinga.

Page 16: ABRH2005 Cheia Amazonia Artigo2

Tendo como valores de entrada as cotas em 15 de abril, 30 de abril e 15 de maio, para o posto

de Tabatinga, foi ajustada uma rede neural, tendo como saída a cota, para o posto de Manacapuru (e

por correlação o Posto de Manaus), em 15 de junho. Empregou-se a série de 1983 a 1994 para a

calibração do modelo (Figura 19) e o período de 1995 a 2003 para a validação (Figura 20). O valor

de cota prevista para 15 de junho de 2005, com as cotas, em Tabatinga, de H15 abril= 1066; H30

abril=1154 e H15 maio=1139 Hmax= 2744.

As cotas das maiores cheias para o Porto de Manaus, no período de 1902 a 2004, bem como

as cotas correspondentes deste ano de 2005, são mostradas na Figura 21.

Cotas no Porto de Manaus (cm): 1902-2005

1200

1400

1600

1800

2000

2200

2400

2600

2800

3000

1/1

1/2

1/3

1/4

1/5

1/6

1/7

1/8

1/9

1/10

1/11

1/12

19181921192219441953197519761982198919931994199619971999200020022005

Figura 21 – Maiores cheias do posto Porto de Manaus (1902 a 2005).

RESULTADOS

Os modelos baseados em regressões lineares, regressões não lineares, assim como os modelos

de redes neurais artificiais mostraram satisfatórios na previsão de cheias para a cidade de Manaus

com até 75 dias de antecedência. No caso dos modelos de redes neurais foi usado o período de 1903

a 1977 para a calibração do modelo e o período de 1978 a 2003 para a validação do mesmo. Foram

feitas previsões, empregando os diversos modelos, para o ano de 2005.

Page 17: ABRH2005 Cheia Amazonia Artigo2

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

A implementação de modelos de regressões (lineares e não lineares) e de modelos baseados

em redes neurais artificiais mostrou-se satisfatório na previsão de cheias na cidade de Manaus.

Pretende-se futuramente ainda incorporar dados de outros postos fluviométricos e pluvioméricos de

modo a se ter previsões mais confiáveis, não só para a cidade de Manaus, mas para os pontos

estratégicos da bacia amazônica.

Os modelos de regressão previram com 75 dias de antecedência, para o posto de Porto de

Manaus, que a cota deveria atingir, em 15 de junho, valores variando de 28,71m a 28,60m e em 1º

de julho a cota variando de 28,59m a 28,56m.

Com 45 dias de antecedência os modelos previram para o posto de Porto de Manaus, que a

cota deveria atingir, em 15 de junho, a cota variando de 28,55m a 28,42m e em 1º de julho a cota

variando de 28,46m a 28,40m.

Com 30 dias de antecedência os modelos previram para o posto de Porto de Manaus, que a

cota deveria atingir, em 15 de junho, a cota variando de 28,40m a 28,33m e em 1º de julho a cota

variando de 28,32m a 28,29m.

A cota de emergência adotada pela CPRM é de 28,50m.

Esses valores são provisórios podendo ser aperfeiçoados a medida que novos dados sejam

incorporados aos modelos. As previsões a partir dos postos de Tabatinga, Seringal de Fortaleza e

Forte das Garças ficaram prejudicadas pela falta de acesso às informações em tempo real.

Os modelos de redes neurais artificiais, tendo como valores de entrada as cotas em 30 de

abril, 15 de maio e 31 de maio, para o posto de Manaus, conseguiu prever com exatidão o valor da

cheia em 15 de junho de 2005. Esses modelos estão sendo aperfeiçoados para previsão dia a dia, em

outros pontos da bacia, incorporando outras variáveis, como a precipitação.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Sr. Valdemar Santos Guimarães, Superintendente de Informações

Hidrológicas – SHI e à Especialista em Recursos Hídricos, Maria Leonor Baptista Esteves, da

Superintendência de Informações Hidrológicas – SIH da Agência Nacional de Águas – ANA, bem

como o Engº Daniel de Oliveira, da CPRM - Manaus, pela presteza no fornecimento dos dados

necessários à consecução deste artigo.

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