acao declaratoria credito rural

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE GOIÂNIA – ESTADO DE GOIÁS. Distribuição por dependência ao proc. nº 200100525142 Ação Declaratória c/c Repetição de Indébito AA: .ROGÉRIO ANTÔNIO LOUSA e outro RR :. BANCO BRADESCO S/A Intermediados por seu mandatário ao final subscrito - instrumento procuratório acostado - causídico inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, seção do ESTADO DE GOIÁS sob o nº. 17.264, com seu escritório profissional consignado no timbre desta, onde, em atendimento à diretriz do art. 39, inciso I do Estatuto Buzaid, indica-o para as intimações necessárias, vêm, com o devido respeito a V. Exª., ROGÉRIO ANTÔNIO LOUSA , brasileiro, casado, produtor rural, inscrito no CPF/MF sob o nº 168.329.811-04, e LINDOLFO LOUSA FILHO , brasileiro, casado, produtor rural, inscrito no CPF/MF sob o nº 014.201.861-91, ambos residentes e domiciliados a Rua 6-A, nº. 54, 10º. Andar, Setor Oeste, Goiânia-Goiás, para promoverem a presente AÇÃO DECLARATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO, contra BANCO BRADESCO S/A, instituição financeira de direito privado, estabelecida na Cidade de Deus, Vila Yara, Município de Osasco - SP, possuidor do CNPJ(MF) nº 60.746.948/0001-12 - NIRE 35.300.027.795, e agência nesta cidade na Avenida Dom Emanuel Q 11, 310 lt 4 – Setor Rodoviário, Goiânia, Goiás, em decorrência das justificativas de ordem fática e de direito abaixo delineadas: I - SÍNTESE DOS FATOS. Os Promoventes convencionaram com o Requerido, abrigando fomentar o meio agropecuário, a Cédula de Crédito Rural nº. 96/77296, a qual foi emitida para alongamento – securitização originária do desenvolvimento contratual. O resultado deste pacto, é uma absurda e ilegal conta no valor de R$832.689,06(oitocentos e trinta e dois mil, seiscentos e oitenta e nove reais e seis centavos) , débito hoje que encontra-se ajuizado, cujo processo, ora por dependência, tramita perante este honroso juízo(inicial anexa).

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 3ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE GOIÂNIA – ESTADO DE GOIÁS.

Distribuição por dependência ao proc. nº 200100525142 Ação Declaratória c/c Repetição de Indébito

AA: .ROGÉRIO ANTÔNIO LOUSA e outro RR :. BANCO BRADESCO S/A Intermediados por seu mandatário ao final subscrito - instrumento procuratório acostado - causídico inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil, seção do ESTADO DE GOIÁS sob o nº. 17.264, com seu escritório profissional consignado no timbre desta, onde, em atendimento à diretriz do art. 39, inciso I do Estatuto Buzaid, indica-o para as intimações necessárias, vêm, com o devido respeito a V. Exª., ROGÉRIO ANTÔNIO LOUSA, brasileiro, casado, produtor rural, inscrito no CPF/MF sob o nº 168.329.811-04, e LINDOLFO LOUSA FILHO, brasileiro, casado, produtor rural, inscrito no CPF/MF sob o nº 014.201.861-91, ambos residentes e domiciliados a Rua 6-A, nº. 54, 10º. Andar, Setor Oeste, Goiânia-Goiás, para promoverem a presente

AÇÃO DECLARATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO, contra BANCO BRADESCO S/A, instituição financeira de direito privado, estabelecida na Cidade de Deus, Vila Yara, Município de Osasco - SP, possuidor do CNPJ(MF) nº 60.746.948/0001-12 - NIRE 35.300.027.795,, e agência nesta cidade na Avenida Dom Emanuel Q 11, 310 lt 4 – Setor Rodoviário, Goiânia, Goiás, em decorrência das justificativas de ordem fática e de direito abaixo delineadas:

I - SÍNTESE DOS FATOS. Os Promoventes convencionaram com o Requerido, abrigando fomentar o meio agropecuário, a Cédula de Crédito Rural nº. 96/77296, a qual foi emitida para alongamento – securitização originária do desenvolvimento contratual. O resultado deste pacto, é uma absurda e ilegal conta no valor de R$832.689,06(oitocentos e trinta e dois mil, seiscentos e oitenta e nove reais e seis centavos), débito hoje que encontra-se ajuizado, cujo processo, ora por dependência, tramita perante este honroso juízo(inicial anexa).

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De outro compasso, apenas examinando as cláusulas da cédula sub examine, de já acostadas, pactuadas com a Promovida, percebemos algumas de uma série de ilegalidades e abusividades, que abaixo serão explanadas. As Autoras, dessarte, pagaram, erroneamente, porquanto assim foram cobradas, encargos que jamais poderiam ser exigidos. Necessário se faz, assim, a repetição, por indébito, dos valores em referência. Isto, mais, será comprovado, quando, nesta querela, serão apreciados todos os lançamentos contábeis que estão ajoujados às contratações acima evidenciadas. HOC IPSUM EST.

II – DO DIREITO.

II.1. CRÉDITO AGRÍCOLA – LEGISLAÇÃO ESPECIAL – FOMENTO CAMPESINO – FUNÇÃO SOCIAL. O Crédito Rural, com o advento da Lei Federal nº 4.829/65, tomou uma dimensão de sistema de normas, ou seja, passou a ser denominado de Sistema Nacional de Crédito Rural, tendo como objetivos prioritários:

“Art. 1º - O crédito rural, sistematizado nos termos desta lei, será distribuído e aplicado de acordo com a política de desenvolvimento da produção rural do país e do bem-estar do povo. “ “Art. 3º - São objetivos do Crédito Rural: I – estimular o incremento ordenado dos investimentos rurais, inclusive para armazenamento, beneficiamento e industrialização dos produtos agropecuários, quando efetuado por cooperativas ou pelo produtor na sua propriedade rural; II – favorecer o custeio oportuno e adequado da produção e a comercialização de produtos agropecuários; III – possibilitar o fortalecimento econômico dos produtotores rurais, notadamente os pequenos e médios; IV – incentivar a introdução de métodos racionais de produção, visando ao aumento da produtividade, à melhoria do padrão de vida das populações ruais e à adequada defesa do solo.

Esta antiga ótica hoje também é ratificada pela Lei Federal nº 8.171/91(Dispõe sobre a Política Agrícola):

“Art. 48 - O Crédito Rural, instrumento de financiamento da atividade rural, será suprido por todos os agentes financeiros sem discriminação entre eles, mediante aplicação compulsória, recursos próprios livres, dotações das operações oficiais de crédito, fundos e quaisquer outros recursos, com os seguintes objetivos:

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I – estimular investimentos rurais para produção, extrativismo não predatório, armazenamento, beneficiamento e instalação de agroindústria, sendo esta, quando realizada por produtor rural ou sua formas associativas; II – favorecer o custeio oportuno e adequado da produção, do extrativismo não predatório e da comercialização de produtos agropecuários; III – incentivar a introdução de métodos racionais no sistema de produção, visando aumento da produtividade, à melhoria do padrão de vida das populações rurais e à adequada conservação do solo e preservação do meio ambiente; IV – (vetado) V – propiciar, através de modalidade de crédito fundiário, a aquisição e regularização de terras pelos pequenos produtores, posseiros e arrendatários e trabalhadores rurais; VI – desenvolver atividades florestais e pesqueiras.”

Como se percebe, Excelência, apenas exemplificando pelas regras acima expostas, que o Crédito Rural, nitidamente, tem uma função social. Não se trata, pois, nem de longe, de um mero contrato de empréstimo bancário, onde figuram uma instituição financeira e o produtor rural. Mas não é o que percebemos, infelizmente. Em verdade, o Crédito Rural fundamenta-se na ótica de que o Governo insta que as instituições financeiras aloquem os recursos daquele e que sejam emprestado por estas, ajoujado, portanto, ao fomento da atividade agrária. Não se pode, dessarte, servir de palco de lucros exorbitantes. Trata-se, em verdade, de recursos em que o Governo insta que sejam emprestados pelos bancos, no trato de subsidiar a atividade campesina(sendo, pois, um instituto do Direito Agrário), que autonomia plenamente ratificada pela Constituição Federal(CF, art. 22, I), dando conta de seu notório intuito protetivo social. A despeito de tudo isto, urge ressaltar, que as operações de Crédito Rural têm sido tratadas como contratações bancárias, afetas ao regramento da Lei Federal nº 4.595/64. Não é porque em ambas as situações figure uma instituição financeira que o tratamento deve ser dado como operações comerciais comuns. Desta maneira, o mútuo que envolva ente da atividade campesina não pode ser envolta pelas regras da Lei da Reforma Bancária(Lei nº 4.595/64), mas sim, ao revés, pela Lei nº 4.829/65 e 8171/91, das quais tratam do Crédito Rural. Naquela legislação, de bom alvitre que se diga, ressalta o lucro como pressuposto assencial. Nestes casos, sobretudo, devemos sopesar o que preceitua a Lei de Introdução ao Código Civil.

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“Art. – 5º - Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

II.2. DAS ILEGALIDADES PRATICADAS NOS PACTOS ORA OBJETO DE ANÁLISE

a) CORREÇÃO MONETÁRIA NO CRÉDITO RURAL – AUSÊNCIA DE LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA – CRÍTICAS À SÚMULA 16 DO STJ – ILICITUDE DE SUA COBRANÇA – PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. a) aspectos históricos

De muito há notória polêmica quanto à aplicação da correção monetária nos financiamentos de crédito rural. Tanto é verdade que deste acirrado debate jurisprudencial veio à luz a Súmula 16 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça(DJ de 21.11.90 e RSTJ 16/90/411).

SÚMULA 16 DO STJ “A legislação ordinária sobre crédito rural não veda a incidência da correção monetária.”

Veja, pois, que a Egrégia corte interpretou que, diante do silêncio da lei quanto à aplicação da correção monetária, esta poderia ser aplicada nos financiamentos rurais. Mas isto não pode prevalecer. De primeiro plano, devemos sopesar a existência de brocardos jurídicos justamente ao contrário a tal orientação.

“292 – N alvorada do século XI, Burcardo, Bispo de Worms, organizou uma coleção de cânones, que adquiriram grande autoridade, e foram impressos em Colônia, em 1548, em Paris, em 1550. Granjeou fama aquele repositório, sob o título Decretum Burchardi. Eram os cânones dispostos em títulos e reduzidos a regras e máximas; na prática lhe chamavam buscardos, a princípio; dali resultou a corrutela brocardos, que se estendeu, em todo o campo do Direito Civil, aos preceitos gerais e aos aforismos extraídos da jurisprudência e dos escritos dos intérpretes (1)”(Apud, Maximiliano, Carlos. HERMENÊUTICA E APLICAÇÃO DO DIREITO. Rio de Janeiro. 18ª Ed., Forense, 1999. p. 239)

Como brocardo em sentido oposto ao vislumbrado pela visão estatuída na Súmula 16 do STJ, temos que

‘UBI LEX VOLUIT DIXIT, UBI NOLUIT TACUIT: Quando a lei quis determinou; sobre o que não quis, guardou silêncio. ‘

Esta regra de hermenêutica deve prevalecer no entendimento da matéria ora alvo de dabate.

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Argumentou-se, na ocasião, de outro lado, que a correção monetária manteria o equilíbrio comutativo e que não haveria nenhum plus obrigacional, sendo um mero instrumento de atualização monetária. Mas, de partida, prudente que se evidencie que a

Súmula não é lei, posto que aquela nada cria, inova ou legisla. Ao revés tão-somente vem de fazer aplicar a lei, aclarando interpretações conflitantes.

A Legislação a que cogitou a mencionada Súmula, diz respeito à Lei Federal nº 4.829, de 5 de novembro de 1965. Esta, que instituiu o crédito rural,

deliberadamente afastou a correção monetária dos financiamento rurais.

Através do Projeto de Lei nº 3.125, que originou a legislação em debate, pretendia-se que os financiamentos rurais fossem corrigidos monetariamente. Entretanto, durante a tramitação perante o Congresso Nacional, diante de Emendas apresentadas, aquela Casa optou pela supressão total do dispositivo que previa a Correção Monetária. Levou-se em conta, vale dizer, a correção deste empréstimos poderia, já naquela ocasião, gerar situações financeiras insuportáveis aos agricultores, cuja a atividade é sujeita a fatores adversos, sobretudo climáticos, que são incontroláveis e imprevisíveis. A Emenda, dessarte, veio a ser acolhida, diante destes argumentos. Assim, a Lei, que instituiu o crédito rural, deliberadamente quis que

NÃO EXISTISSE A CORREÇÃO MONETÁRIA NOS FINANCIAMENTOS RURAIS.

Assim, haviam razões para a exclusão do fator corretivo no crédito rural. Não foi nada que seja entendido como irrefletido e sem fundamento. Por ilação do saudoso Deputado Ulisses Guimarães, este, na avaliação do Projeto de Lei nº 3.125(que levou a aprovação a Lei 4.829/65), percebeu a abusividade da inserção da correção monetária no débitos rurais, quando fez valer a ótica da arrecadação de valores pelas instituições financeiras a custo zero, que assim os repassva aos agricultores com correção monetária e juros. Aliás, pela técnica interpretativa histórica, o entendimento pela não aplicação da correção monetária ao financiamento rural deve prevalecer.

“A técnica interpretativa histórica, oriunda de obras de Savigny e Puchta, dujas idéias foram compatilhadas por Espínola, Gabba, Holder, Biermann, Cimbali, Wach, Alípio Silveira, Degni, Saleilles, Cosak, Salvioli, Endemann, Bufnoir, Bekker, etc., baseia-se na averiguação dos antecedentes da norma. Refere-se ao histórico do processo legislativo, desde o projeto de lei, sua justificativa ou exposição de motivos, emendas, aprovação e promulgação, ou às circunstâncias fáticas que a precederam e que lhe deram origem, às causas ou necessidades que induziram o órgão a elaborá-la, ou seja, às condições culturais ou psicológicas sob as quais o preceito normativo surgiu (occasio legis). Como a maior parte das normas constitui a continuidade ou modifiação das disposições precedentes, é bastante útil que o aplicador investigue o

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desenvolvimento histórico das instituições jurídicas, a fim de captar o exato significado das normas, tendo sempre em vista a razão delas (ratio legis), ou seja, os resultados que visam atingir. Essa investigação pode conduzir à descoberta do sentido e alcance da norma. “(Apud, Diniz, Maria Helena. COMPÊNDIO DE INTRODUÇÃO À CIÊNCIA DO DIREITO. 14ª Ed. São Paulo, Saraiva, 2001. p. 426)

Tanto isto é uma realidade que, logo depois, veio a ser editado o Dec. Lei nº 70(no regime de exceção do então presidente Humberto Castelo Branco), que dispôs sobre o Sistema da Habitação Nacional, onde ficou ressalvado a não-incidência da correção monetária nos créditos rurais, o que, empós disto, também, o Dec.-Lei nº 167/67 veio de silenciar neste tocante, dando azo ao entendimento da impossibilidade da cobrança de correção monetário no trato campesino.

DECRETO-LEI 70, DE 21/11/1966.

Autoriza o Funcionamento de Associações de Poupança e Empréstimo e Institui a Cédula Hipotecária.

CAPÍTULO II - Da Cédula Hipotecária (artigos 9º a 28)

Art. 9º Os contratos de empréstimo com garantia hipotecária, com exceção das que consubstanciam operações de crédito rural, poderão prever o reajustamento das respectivas prestações de amortização e juros com a conseqüente correção monetária da dívida.

. . .

§ 3º A cláusula de correção monetária utilizável nas operações do Sistema Financeiro da Habitação poderá ser aplicada em todas as operações mencionadas no § 2º do art. 1º do Decreto-lei nº 19, de 30 de agosto de 1966, que vierem a ser pactuadas por pessoas não integrantes daquele Sistema, desde que os atos jurídicos se refiram a operações imobiliárias.

Mas é muito oportuno ressaltar que, a princípio poder-se-ia vislumbrar uma falsa idéia de que os mutuários de empréstimos rurais seriam beneficiados com a ausência da correção monetária. Não é verdade. Primeiro devemos equiparar o crédito rural como um serviço público, onde, neste tocante, o Governo dispõe de gastos em educação, saúde, transporte, etc. Ademais, os Agentes Financeiros não podem repudiar tal desiderato, posto que são compensados com recursos captados sem correção monetária e de custo zero, diante a liberação dos Depósitos Compulsórios.

LEI Nº 4.829/65

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Art. 15 – O crédito rural contará com suprimentos das seguintes fontes: I – internas: e) valores que o Conselho Monetário Nacional venha a isentar de recolhimento, na forma prevista na Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964, art. 4º, item XIV, letra c, (alínea vetada pelo Presidente da República, mas mantida pelo Congresso Nacional, publicada em 07/12/65) g) importâncias recolhidas ao Banco Central da República do Brasil pelo sistema bancário, na forma prevista no § 1º do art. 21; i) produto de multas recolhidas nos termos do § 3º do art. 21; . . . art. 21 – As instituições de crédito e entidades referidas no art. 7º desta Lei manterão aplicada em operações típicas de crédito rural, contratadas diretamente com produtores ou suas cooperativas, percentagem, a ser fixada pelo Conselho Monetário Nacional, dos recursos com que operarem.

Desta maneira há um subsídio do Governo. Aliás isto não é incomum, posto que o Governo arrecada receitas de determinados setor da economia, e os transfere, ainda que parcialmente, para outros segmentos da população que possam ter um tratamento favorecido, o que ocorre em vários países como fundamento básico de desenvolvimento social.

b) Direito Privado X Direito Público

Abrigam-se os argumentos favorável à aplicação da correção monetária no crédito rural, sob o pálio argumento, como de praxe, de que com a inserção da correção monetária, tem-se por repulsado o enriquecimento ilícito de uma das partes contratantes, posto que a dívida estaria ‘corroída pela ausência de indexador para tal’. Entretanto, resta esclarecer que tais objeções não têm fundamento. Devemos sopesar que as regras de Direito Público prevalecem sobre os ditames do Direito Privado. Assim, as convenções das partes não podem ir de encontro a diploma de ordem pública, como, no caso, a Lei Federal nº 4.829, de 5 de novembro de 1965.

LEI nº 4.829/65.

Art. 1º - O crédito rural, sistematizado nos termos desta Lei, será distribuído e aplicado de acordo com a política de desenvolvimento rural do País e tendo como o bem-estar do povo.”

Indubitavelmente trata-se de uma norma de ordem pública, onde os interesses privados não imperam. São normas cogentes por excelência,

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estatuídas com o fito de fazer prevalecer os interesses gerais e sociais. As partes, pois, não podem celebrar pactos de encontro aos ditames destas leis, e, se assim o for feito, será concluída como celebração totalmente nula, de vez que privatorum conventio júri publico non derrogat. Desta feita, o crédito rural, como a correção monetária, são institutos que estão ajoujados a critérios de ordem pública, com a forte intervenção Estatal, não prevalecendo, como dito, a intervenção da vontade das partes, nem mesmo do Poder Judiciário. Inclusive, para justamente respeitar este tocante(especialização de conhecimentos), o Superior Tribunal de Justiça colocou as matérias a serem apreciadas, que forem de ordem pública, a serem dirimidas pela Primeira Seção(§ 1º e inc. XI, do art. 9º do RISTJ). Já, no que tange a litígios de ordem privada, são direcionados à Segunda Seção. Entretanto, à despeito destas delimitações, a Segunda Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça(que trata de direito privado) vem proferindo decisões que tangem ao crédito rural, sobretudo quando envoltas em questões disciplinadas pela Lei Federal nº 4.829/65 e Dec.-Lei nº 167/67. Tal conduta vem trazendo vultuosas seqüelas financeiras aos mutuários do crédito rural, quando não vem levando em contato o aspecto social e de fomento do crédito rural.

c) Nominalismo monetário – Princípio da Reserva Legal A correção monetária, no direito pátrio, está adstrita ao princípio da legalidade. Assim, tem-se como pressuposto uma lei formal que a institua. Incide, dessarte, o princípio da reserva legal.

LEI 5.670 DE 02/07/1971

DISPÕE SOBRE O CÁLCULO DA CORREÇÃO MONETÁRIA

Art. 1º O cálculo da correção monetária não recairá, em qualquer caso, sobre período anterior à data em que tenha entrado em vigor a lei que a instituiu.

Acrescemos à ótica supra a questão do nominalismo monetário, donde extraímos a visão de que, nas dívidas em dinheiro, a moeda preserva o seu valor liberatório(ACC, art. 947; NCC, art. 315) e, nos casos de mora, haverá o ajustamento dos danos(ACC, art. 1061; NCC, art. 404). Assim examinando percebemos, em verdade, que, nestes casos(dívidas em dinheiro), a correção monetária, sim, representa um acréscimo.

“Art. 947 – O pagamento em dinheiro, sem determinação da espécie, far-se-á em moeda corrente no lugar do cumprimento da obrigação.“ “Art. 315 – As dívidas em dinheiro deverão ser pagas no vencimento, em moeda corrente e pelo valor nominal, salvo o disposto nos artigos subseqüentes.”

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“Art. 1061 – As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, consistem nos juros da mora e custas, sem prejuízo da pena convencional. “

Somente na vigência do Novo Código Civil, com vigência a partir de janeiro de 2003, é que podemos vislumbrar a hipótese da atualização monetária, ainda assim, não destacada para o crédito rural, que tem, como afirmado, legislação especial própria.

Art. 404 – As perdas e danos, nas obrigações em dinheiro, serão pagos com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.

Como se percebe, a cobrança de correção monetária pelas instituições financeiras, nestes casos, tornou-se um dos maiores absurdos de ganhos financeiros(cogitado na ordem de 20 bilhões de dólares). Há, desta forma, uma extorsão à vista de todos contra os mutuários rurais. Incabível, assim, que a correção monetária, quando tal excluída do sistema de crédito rural e venha a ser analisada pelo Magistrado, possa contrariar o texto da lei, pois este somente julga, não exercendo função legislativa, o que ocorreria caso fosse aplicada a correção monetária ao crédito rural, diante a rígida regra constitucional da separação de poderes(CF, arts. 2º, 5º, II, 22, I, VI e VII, 44 e 48, XIII).

“PRINCÍPIO DA LEGALIDADE – TRANSGRESSÃO. A inobservância do princípio da legalidade pressupõe o reconhecimento de preceito de lei dispondo de determinada forma e provimento judicial em sentido diverso, ou, então, a inexistência de base legal e, mesmo assim, a condenação a satisfazer ao que pleiteado. (STF-2ª Turma – ARAgIns nº 147.203-1-SP – Rel. Min. Marco Aurélio – j. 11.6.93)”

Dessarte, temos que o ato judicial, sobretudo sentença, que venha agasalhar-se na ótica ilustrada pela Súmula 16 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, estará eivada de vício insanável(direito adquirido), posto que enfrentou as barreiras estabelecidas na Constituição Federal(art. 5º, XXXVI) e na Lei de Introdução ao Código Civil(art. 6º).

1) INDEXADORES APLICADOS NOS PACTOS RURAIS – ABUSIVIDADE.

1.1. Taxa de Juros de Longo Prazo(TJLP)

Dito em linhas anteriores que sequer admissível correção monetária no crédito rural.

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Mas, ainda que fosse o entendimento contrário, presenciamos que a instituição vem de “corrigir” o débito através da TJLP, a qual criada pela Lei nº 10.183, de 12.02.01, como se constata pelas cláusulas insertas. Como o próprio nome está a condicionar, a TJLP não índice de atualização mas sim, ao revés, de ambos, Juros e Atualização. Assim há a cobrança de juros – que é o custo do dinheiro – e ainda atualização de saldo que por índice que mediu o custo do dinheiro no período. Há uma dupla composição remuneratória. A TJLP, outrossim, tem em si dois (02) componentes básicos:

ü Meta de inflação fixada pelo Conselho Monetário Nacional;

ü Prêmio sobre o risco. Há, assim, uma completa insegurança jurídica neste trato, quando a mesma vem de relevar uma expectativa de médio e longo prazo de inflação. Isto importa em uma condição excessivamente onerosa ao consumidor(juros para remunerar e juros para atualizar), o que é vedado pelo art. 51, IV da Lei nº 8.078/90(Código do Consumidor). A mesma, dessarte, deve ser afastada.

1.2. Capitalização dos Juros Remuneratórios

Por vários aspectos essa cláusula não merece prosperar:

a) Não existe autorização de sua cobrança pelo Conselho Monetário Nacional

O Conselho Monetário Nacional, não obstante o texto do Dec Lei nº 167/67, não regulamentou a cobrança dos juros de forma capitalizada.

“Art. 5º - As importâncias fornecidas pelo financiador vencerão juros às taxas que o Conselho Monetário Nacional fixar e serão exigíveis em 30 de junho e 31 de dezembro ou vencimento das prestações, se assim acordado entre as partes; no vencimento do título e na liquidação, ou por outra forma que vier a ser determinada por aquele Conselho, podendo o financiador, nas datas previstas, capitalizar tais encargos na conta vinculada da operação. “

b) Não houve anuência das partes quanto à capitalização de juros.

A cláusula de capitalização, por ser de importância crucial ao desenvolvimento do contrato, deve ser redigida de maneira a demonstrar exatamente ao contratante do que se trata e quais os reflexos gerarão ao plano do direito material. Desse modo, como a instituição financeira não se preocupou em respeitar o que dispõe o Código de Defesa do Consumidor, notadamente os artigos 46, 51, inciso IV, 52, 54, parágrafo 3º e 4º, pode-se afirmar que as cédulas de

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crédito rural, ora em debate, não contêm o pacto, visto sob a ótica consumerista, a que a Súmula nº 93 do STJ alude. Isto se deve ao desrespeito de um dos deveres anexos defluentes do princípio da boa-fé, o dever de informação que impõe a obrigação de transparência das condições pactuadas. Por conseguinte, deve a cláusula, que prevê a capitalização mensal de juros, ser declarada inválida, desprezando, in casu, a Súmula nº 93 do STJ, em face de sua patente inaplicabilidade ao caso em tela. A esse respeito, a Súmula n. 93 reza que: ‘A legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o pacto de capitalização de juros’. Sem dúvida, a referida súmula deve ser interpretada em conjugação com as regras protetivas contratuais previstas no Código de Defesa do Consumidor, principalmente quando definir o conceito de pacto lá inserto. O pacto, à luz do princípio consumerista da transparência, que significa transparência, que significa informação clara, correta e precisa sobre o contrato a ser firmado, mesmo na fase pré-contratual, terá que, necessariamente conter:

1) redação clara e de fácil compreensão(art. 46); 2) Informações completas acerca das condições pactuadas e seus reflexos no plano do direito material; 3) Redação com informações corretas, claras, precisas e ostensivas, sobre as condições de pagamento, juros, encargos, garantia(art. 54, parágrafo 3º, c/c art. 17, I, do Dec. 2.181/87); 4) Em destaque, a fim de permitir sua imediata e fácil compreensão, as cláusulas que implicarem limitação de direito(art. 54, parágrafo 4º) c) Ausência de Competência, em face da Constituição Federal, ao Conselho Monetário Nacional para fixar os juros.

Verifica-se que na Seção II, do Capítulo I, do Título IV, da vigente Constituição Federal que, entre as atribuições do Congresso Nacional, está a inderrogável de dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente, no inciso XIII, que diz respeito à ‘matéria financeira, cambial e monetária, instituições financeiras e sua operações’ Por outro lado, o art. 25, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Carta Política expressamente anuncia a ‘revogação, cento e oitenta dias após sua promulgação, sujeitando este prazo a prorrogação por lei, de todos os dispositivos legais que atribuam ou deleguem a órgão do Poder Executivo competência assinalada pela Constituição ao Congresso Nacional’, principalmente no que concerne a ação normativa e alocação ou transferência de qualquer espécie, validando os atos praticados na vigência dos respectivos decretos – leis autorizando o Congresso Nacional, se necessário, legislar sobre os efeitos deles remanescentes. Temos, pois, diante do lapso de tempo acima evidenciado(180 dias) que encontra-se revogado o artigo 4º, inc. IX, da Lei 4.595/64 assim como do art. 5º do Dec. Lei nº 167/67, em face do art. 25, I, ADCT c/c art. 48, XIII da

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Constituição Federal, por atribuir em ação normativa ao Conselho Monetário Nacional, competência assinalada pela Lei Maior ao Congresso Nacional. Dúvidas não restam de que devem prevalecer os limites previstos no Decreto 22.626/33 e no art.1062(1916) e 406(2002) do Código Civil para os juros remuneratórios, como para os compensatórios e ainda para os juros moratórios. Não mais existe, portanto, a executoriedade compulsória do art. 40, IX da Lei 4.595/64, norma especial, que restringe o campo de aplicação do Decreto nº 22.626/33, regulador das demais avenças, que não envolvessem instituições financeiras, pelo que passa a prevalecer na íntegra a norma geral limitadora dos juros do art. 10 desta disposição de lei, caindo por terra o privilégio antes concedido absurdamente, com respaldo legal, às instituições financeiras de estipular livremente suas taxas de remuneração e encargos, principalmente à taxa de mercado, ou as estipular de acordo com determinações do Conselho Monetário Nacional, que se mostrou em todo esse tempo interessado na manutenção da penúria dos que com as instituições financeiras contratavam. Não devemos olvidar, de outro tocante, o fato desta inconstitucionalidade, abrigada pela infração ao art. 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, inobstante as prorrogações, patrocinada pela Lei 8.056, de 28/06/90, que antes do seu termo, também prorrogada pelo disposto na Lei 8.127, de 20/12/90, como ainda pelo texto dispositivo da Lei 8.201, de 29/06/91. Observa-se, finalmente, através do art. 1º da Lei nº 8.392, de 30 de dezembro de 1991, que esta não mais fixou data certa para a prorrogação, determinando, no entanto, o seu termo como o da promulgação da Lei complementar que regulamentará o Sistema Financeiro Nacional:

‘É prorrogado até a data da promulgação da lei complementar de que trata o art. 192 da Constituição Federal o prazo a que se refere o art. 1º das leis 8.056, de 28 de junho de 1990, 8.127, de 20 de dezembro de 1990 e 8.201, de 29 de junho de 1991.’

A Constituição Federal foi promulgada em 05 de outubro de 1988 e a partir de 1 de abril de 1989, vencidos os 180 dias de sua promulgação, consumada estava a revogação prevista no art. 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, sendo que o texto da Lei 8.056 foi sancionado em 28 de junho de 1990, quando nada mais havia a ser prorrogado, posto que havia restado derrogado, há mais de ano e mês, a função delegada e o poder normativo do Conselho Monetário Nacional, no que não poderiam retroagir os seus efeitos ao término do prazo ali estipulado, sem ferir o direito adquirido e o ato jurídico perfeito. No entanto, ressalta-se que os textos de leis ordinárias, editados após o decurso do prazo previsto no art. 25 do ADCT, que prorrogavam por prazo fixo ou tempo certo – de 180 dias – o período de vigência daquela disposição da lei 4.595/64, e ao final, pela Lei 8.392, de 30/12/91, desprezava o prazo, esqueceu-se que o texto da lei maior assim fixava, extrapolando a disposição donde deriva, resolve vincular tal prorrogação à edição de uma lei complementar – que não era o espírito do que contém o texto da lei maior em análise – e, em afronta à norma superior, num total descompasso com a natureza da própria disposição constitucional transitória, vem proporcionar uma prorrogação por tempo indeterminado, ilimitado, senão infinito.

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d) Com a capitalização, cobrança de Del-Credere, na forma de remuneração, também capitalizada, a cobrança de correção monetária com base na TJLP/TR, os juros remuneratórios superam o limite legal de 12%(doze por cento) ao ano – Dec. Lei 22.626/33) – Excesso de encargos - Ilegalidade

1.3. Comissão Del-Credere

Sobressai-se de logo, como ilegalidade, a capitalização explícita que se concede à taxa Del-Credere. Não há qualquer previsão legal neste sentido. Ainda que dita como ilegal, a capitalização de juros, prevista no Dec Lei nº 167/67, diz respeito à remuneração pela concessão do crédito. A comissão Del-Credere, como é sabido, é mera comissão que afeta à instituição como mera intermediária da operação de crédito rural.

“Art. 5º - As importâncias fornecidas pelo financiador vencerão juros às taxas que o Conselho Monetário Nacional fixar e serão exigíveis em 30 de junho e 31 de dezembro ou vencimento das prestações, se assim acordado entre as partes; no vencimento do título e na liquidação, ou por outra forma que vier a ser determinada por aquele Conselho, podendo o financiador, nas datas previstas, capitalizar tais encargos na conta vinculada da operação. “

Então, diante do texto da lei supra citada, podemos fundamentar as seguintes ilegalidades:

a) os juros capitalizados, a qual estipula a lei, diz respeito “As importâncias fornecidas pelo financiador...”. Veja que o comissário(que recebe a comissão Del-Credere), não é o que concede as importâncias; b) ainda que fosse possível esta capitalização/remuneração, seria preciso que o Conselho Monetário Nacional a fixasse. Não há a possibilidade de unilateralidade na fixação da referida taxa/comissão. É preciso a intervenção Estatal, para atribuir esta remuneração, como dito no texto da Lei, o que não ocorrera.

Portanto, em suma, não é possível a incidência de quaisquer outras taxas, comissões ou encargos no crédito rural, salvo as que estiverem expressamente enumeradas no Dec. Lei nº 167/67, da qual não trata de comissão del-credere, tendo a mesma que ser expurgada do contrato.

1.4. Encargos Moratórios

a) Juros por atraso

Gritante o vício encontrado no caso em análise. Aliás houve, sim, grosseira má-fé.

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Como se percebe, o trato contratual estabelecido com a instituição financeira ré fora feito através de Cédula de Crédito Rural. Desta feita, Excelência, há o direcionamento legal previsto pelo Dec. Lei nº 167/67. Tal regramento, impende destacar, limita os juros moratórios a 1%(um por cento) ao ano.

“Art. 5º - (...) Parágrafo único – Em caso de mora a taxa de juros constante da cédula será elevável de 1% ao ano.”

O Superior Tribunal de Justiça reconhece tal anomalia legal, ou seja, o limite de 1%(um por cento) ao ano em caso de mora.

“ SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Mútuo. Nota de Crédito. Juros remuneratórios e Correção monetária. Alterações de tais encargos em caso de inadimplência. Impossibilidade. Limite legal(DL 167/67): 1% a.a. (Juros Moratórios – art. 5º, parágrafo único) Mais multa de 10% sobre o total da dívida(multa – art 71). Recurso desprovido. I – Estabelecidos, em nota de crédito rural, juros remuneratórios e correção monetária para incidirem durante o prazo de vigência do mútuo, nula se apresenta cláusula que preveja majoração de tais encargos financeiros em caso de inadimplemento do mutuário. II – A Lei específica(DL 167/67) somente autoriza sejam pacutados para situação de não pagamento da dívida no respecito vencimento, os seguintes acréscimos: Juros Moratórios no patamar de 1% a.a.(art. 5º, parágrafo único), e multa de 10% sobre o montante devido(art. 71). III – Qualquer estipulação que vise burlar esse limite legal – como, por exemplo, o referido artifício da elevação de juros remuneratórios ou da criação encargos(taxas, sobretaxas, comissão de permanência) para serem aplicados no caso de inadimplemento – carece de validade). Por unanimidade, conhecer do recurso, mas negar-lhe provimento. Julgado em 18/04/95 RESp nº 95/0003813-7 – 4ª Turma – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo.”

Merece, assim, completo repúdio a cobrança dos juros moratórios em patamares superiores a 1%(um por cento) ao ano.

b) Comissão de Permanência

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Como dito em linhas anteriores, Excelência, o tratamento dado ao financiamento rural perfaz-se, infelizmente, à luz da Lei da Reforma Bancária(Lei nº 4.595/64). O instituto da comissão de permanência tem previsão na referida lei e, mais, já resultado desta, também da Resolução 1.129/86 do BACEN. Não pode ser aplicado, como dito, no Crédito Rural.

Resolução 1.129/86 do BACEN. I – Facultar aos bancos comerciais, bancos de desenvolvimento, bancos de investimento, caixas econômicas, cooperativas de crédito, sociedades de crédito, financiamento e investimento e sociedades de arrendamento mercantil cobrar de seus devedores por dia de atraso no pagamento ou na liquidação de seus débitos, além dos juros de mora na forma da legislação em vigor, ‘comissão de permanência’, que será calculada às mesmas taxas pactudas no contrato original ou à taxa de mercado do dia do pagamento. II – Além dos encargos previstos no item anterior, não será permitida a cobrança de quaisquer outras quantias pelo atraso na pagamento dos débitos vencidos. “

Lei nº 4.595/64(Dispõe sobre a Política e as Instituições Monetárias, Bancárias e Creditícias,...) Art. 4º - Compete ao Conselho Monetário Nacional, segundo diretrizes estabelecidas pelo Presidente da República: IX – limitar, sempre que necessário, as taxas de juros, comissões e qualquer outra forma de remuneração de operações e serviços bancários ou financeiros, inclusive os prestados pelo Banco Central do Brasil, assegurando....”

Como se percebeu, a comissão de permanência é uma verdadeira taxa de juros flutuante. O mutuário fica ao verdadeiro arbítrio do credor, posto que a taxa gira em torno do mercado. Ademais, nas operações de crédito rural, que tem regramento próprio, não há disciplina neste tocante(vide art. 5º, parágrafo único, do DL 167/67). Tão-somente é permitido a elevação do débito a juros de 1%(um por cento) ao ano. Mesmo que permitido fosse a cobrança de comissão de permanência no crédito rural, o que se diz apenas por argumentar, a cobrança cumulada de comissão de permanência com multa contratual, o qual constatamos nos pactos ora em discussão, é tida como ilegal, à luz do que regula a própria Resolução 1.129/86 do BACEN.

“I – Facultar aos bancos comerciais, bancos de desenvolvimento, bancos de investimento, caixas

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econômicas, cooperativas de crédito, sociedades de crédito, financiamento e investimento e sociedades de arrendamento mercantil cobrar de seus devedores por dia de atraso no pagamento ou na liquidação de seus débitos, além dos juros de mora na forma da legislação em vigor, ‘comissão de permanência’, que será calculada às mesmas taxas pactudas no contrato original ou à taxa de mercado do dia do pagamento. II – Além dos encargos previstos no item anterior, não será permitida a cobrança de quaisquer outras quantias pelo atraso na pagamento dos débitos vencidos. “

Neste caso, como dito, o contrato e própria conduta durante o andamento do pacto contratual, mostrou a cobrança de comissão de permanência cumulada com multa contratual. Feriu, assim, a Resolução do BACEN, acima citada, posto que, além desta e juros moratórios, nada mais é possível cobrar em caso de inadimplemento. Neste caso prevalecerá, tão-somente, o INPC como índice de correção.

“REsp nº 176.833-MG – Relator Min. Aldir Passarinho: (.....) Todavia, in casu, apesar de entender que não havia previsão de correção monetária, mas sim de comissão, o acórdão identificou igualmente a existência contratual de multa por inadimplência e juros, a autorizar o afastamento da comissão de permanência e adoção da correção monetária. “(destacamos)

De outro bordo, a comissão de permanência merece ser afasta, posto que se traduz de uma condição leonina e potestativa, quando dá ao credor a liberdade de escolher, unilateralmente a sua utilização pela taxa do contrato, ou, querendo, pela taxa do mercado(.... que será calculada às mesmas taxas pactudas no contrato original ou à taxa de mercado do dia do pagamento.). A escolha cabe ao credor, como se percebe. Fere, assim, o comando do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor.

Antigo Código Civil Art. 115 – São lícitas, em geral, todas as condições, que a lei não vedar expressamente. Entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo o efeito o ato, ou o sujeitarem ao arbítrio de uma das partes.

Novo Código Civil Art. 122 – São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de

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todo o efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao pura arbítrio de uma das partes.

Código de Defesa do Consumidor “Art. 51 - São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis coma boa-fé ou a equidade; X - permitam ao fornecedor, direta ou indiretamente, variação do preço de forma unilateral;

O Superior Tribunal de Justiça não arreda deste entendimento.

“REsp nº 387.805-RS – Relatora Min. Nancy Andrigui: (.....) COMISSÃO DE PERMANÊNCIA Afasta-se, por potestativa e leonina a pactuação no sentido de incidir no caso de inadimplemento, comissão de permanência à taxa de mercado vigente no dia do pagamento. Não se presta a substituir o índice de correção monetária ainda que em caso de inadimplemento da dívida. “

Impõe-se, pois, que a comissão de permanência seja afastada, ou, como pedido sucessivo, que a mesma seja substituída pela correção monetária(INPC), da qual, ao revés, tem legislação apropriada(Lei nº 6.899/81), muito embora, em nosso caso, como dito acima, inaplicável ao crédito rural.

c) Multa Contratual

A multa contratual, prevista no patamar de 10%(dez por cento), merece ser afastada, posto que colide com o que preceitua o art. 52, § 1º do Código de Defesa do Consumidor(Lei nº 8.078, de 11.09.90) Uma lei posterior e especial, como no caso do CDC, prevalece, neste tocante, sobre o que dispõe o Dec. Lei nº 167/67. Ademais, nos tempos atuais, de inflação baixa, multa contratual desta ordem releva-se como gritante e merece ser reparada pelo Poder Judiciário. II.3. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR AO CASO SUB EXAMINE

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Máxime alguns poucos entendimentos em contrário, estes tendem a cogitar da não aplicação do Código de Defesa do Consumidor(Lei nº 8.078/90) no trato de relação de crédito rural. É de notória ciência de todos que as instituições financeiras captam recursos alheios, remunerando-os, para empresta-los aos mutuários mediante a cobrança de sua paga por tal desenvolvimento financeiro. É neste tocante que as mesmas se encontram absorvidas pela legislação conconsumerista. É que os mesmo prestam serviços, de natureza, sobretudo, bancária, financeira e de crédito.

“Art. 2º - Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço, como destinatário final. Art. 3º - Serviço é qualquer atividade fornecida ao mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as relações de caráter trabalhista. “

Releve-se, mais, que por ser uma instituição financeira, esta como atividade ínsita o comércio(lucro em última análise), tanto que somente é admitido instituições financeiras na forma de sociedade anônima e sempre comercial, independentemente de seu objeto. Não se diga, ademais, que a cédula de crédito rural, a despeito de ser uma promessa de pagamento em dinheiro, não se assemelha à Nota Promissória, visto que esta pode ter origem um negócio de natureza não comercial. Ao revés, aquela somente pode ser posta em circulação por uma instituição integrante do Sistema Nacional de Crédito Rural, que, na sua grande maioria, são entidades públicas ou privadas, que visam a obtenção do lucro pelo produto ofertado(dinheiro). De outro lado, o nome relevado concedido contrato não tem importância neste contexto, posto que deve prevalecer a verdadeira intenção das partes(NCC, art. 122; ACC, art. 85) Aliás estas são as linhas doutrinárias de NELSON NERY JÚNIOR.

“Por força de dispositivos legais expressos, os bancos exercem atividade comercial(CCOM 119; D 737/1850, art. 19, § 2º; Lei 4595;64, art. 2º; LSA, art. 2º), sendo sempre fornecedores, de acordo com o CDC 3º caput. Um dos produtos comercializados pelo banco é o dinheiro que, segundo o CC 50, é bem juridicamente consumível, caracterizando, portanto, como produtor para efeitos de considerar-se como objeto da relação jurídica de consumo. O crédito é outro produto imaterial comercializado pelo banco.”(In, CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL COMENTADO E LEGISLAÇÃO PROCESSUAL CIVIL EXTRAVAGANTE EM VIGOR. 4ª Ed. São Paulo, RT, 1999. p. 1799)

Ademais, o fato de os recursos financeiros terem sidos recebidos e repassados para terceiros não retira a condição de consumidor.

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“Os bancos como prestadores de serviços especialmente contemplados no artigo 3º, parágrafo segundo, estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor. A circunstância de o usuário dispor do bem recebido através da operação bancária, transferindo-o a terceiro, em pagamento de outros bens ou serviços, não o descaracteriza como consumidor final dos serviços prestados pelo banco.(STJ – 4ª Turma – REsp nº 57974-RS – Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar – j. 25/04/1995)”

Por corroborar tal entendimento, podemos, ainda, citar uma outra regra do referido diploma legal, onde o Autor estaria, no mínimo, ‘equiparado’ a consumidor, já que ‘exposto’ às práticas previstas nos Capítulos V e VI do CDC, isto é, sujeito às práticas comerciais ali expostas.

“Art. 29 – Para os fins deste Capítulo e do seguinte, equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas. “

Pela simples leitura dos documentos colacionados com a exordial, percebe-se que tratam-se de pactos que contêm cláusulas unilateralmente estabelecidas, e inalteráveis, caracterizando-se, desta forma, como pactos de adesão, vislumbrado no texto do CDC.

“Art. 54 – Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. “

A questão impositiva da vontade em relação ao outro ente contratante é o traço distintivo. Aqui uma das partes adere ao bloco de condições impostas pela outra parte. O consentimento, pois, reveste-se pela simples adesão ao pacto. Não há liberdade ao aderente, desta forma. Perfeitamente apropriado o presente arrazoado, quando o requer, sobretudo, a intervenção o Estado-Juiz na presente relação contratual, revisando os pactos, inclusive sob a égide do preceito constitucional inserto no art. 170, inc. I da Carta Magna, e, mais, na esfera infraconstitucional, com supedâneo nos arts. 6º, inc. V e 51 do CDC, permitindo, assim, o equilíbrio contratual. De importância evidenciar, mais, que tal intervenção poderá ser feita, inclusive, de ofício pelo magistrado, posto que a matéria ora envolta em juízo, agregada ao CDC, envolve matéria de ordem pública. No caso em espécie, verificou-se notório e esdrúxulo prejuízo financeiro ao Autor, merecendo a aplicação do CDC, quando constata-se que a concessão do crédito rural em espécie não foi livremente disposta. Coube ao Autor aderir ou não às condições impostas pela instituição. Muito fácil a “apropriação” financeira constatada em detrimento do mutuário, aqui Autor. Caso não aceitasse as condições, lógico, jamais receberia os valores pleiteados. Perceba-se, ademais, que houve ausência de nitidez nas cláusula entabuladas, o que levou, também, o consumidor-aderente a contratar aquilo que jamais tinha previsão que o fosse legítimo e,

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também, a dimensão de suas conseqüências materiais. A vulnerabilidade no entrave contratual causa espanto. II.4. DA POSSIBILIDADE DA REVISÃO DAS OPERAÇÕES CONTRATADAS( RELAÇÃO JURÍDICA CONTINUATIVA – CADEIA CONTRATUAL ).

Possível, outrossim, a revisão judicial do pacto entabulado entre as partes, ora litigantes, desde sua origem. Deveras, houvera uma relação jurídica continuada, -- como comprovado nesta peça --, onde, em seu nascimento, houvera nulidade absoluta(NCC, 166, incs. II, III, VI e VII; ACC, art. 145, II, III e V), o que, por tal fundamento, veio de atingir todo o encadeamento contratual. Há de existir, portanto, em última análise, rigor na observância dos preceitos legais. De outro turno, imperativo que a mataria ora em debate seja alvo de apreciação judicial, por força de comando constitucional neste sentido.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL Art . 5º - (...) XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; “

Ademais, por se tratar, como dito, no caso, de relação de consumo, é possível que, dentro do microssistema do CDC, o Poder Judiciário possa revisar o contrato entabulado, sem que tal intervenção, dessarte, possa violar pretensa ofensa ao ato jurídico perfeito. E tais nulidades, outrossim, por ofenderem, sobretudo, à preceitos de ordem pública, retroagem, como pretendido aqui, à conclusão inicial do negócio jurídico em debate. O efeito, assim, é ex tunc. Respeitante a possível alegação de agressão ao ato jurídico perfeito, antes comentado, não razão alguma para esse entendimento prosperar. Para que o ato jurídico seja considerado perfeito, à luz da Carta Política, faz-se mister que se tenha abalizado segundo a lei vigente de seu tempo. Não tem a norma constitucional em espécie o condão de fazer por lícito ato concretizado em desacordo com a lei, e, mais, especialmente, tornar válido um ato nulo. É dado ao Estado-Juiz o poder de intervir nas relações contratuais, de modo a revisá-lo e garantir o equilíbrio contratual.

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR Art . 6º - São direitos básico do consumidor: V – a modificação de cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas;

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(...) Art. 51 – São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos ou serviços que: (...) IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; (...) XV – estejam em desacordo com o sistema de proteção ao consumidor;“ § 1º - Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: (...) II – restringe direito ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual; III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares do caso.

Possível, portanto, o reexame da legalidade dos encargos contratuais estipulados no pacto de adesão em referência, quando, inclusive, em caso de nulidade absoluta, poderá decretada de ofício pelo Poder Judiciário( NCC, art. 168; ACC, art. 146 ). Não existe, também, nem de longe, a possibilidade da existência da novação( NCC, art. 360; ACC, art. 999 ). É que pela Legislação Substantiva Civil não se podem validar por novação obrigações nulas.

Novo Código Civil Art. 367 – Salvo a obrigações simplesmente anuláveis, não podem ser objeto de novação obrigações nulas ou extintas.

Antigo Código Civil Art. 1007 – Não se pode validar por novação obrigações nulas ou extintas.

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É possível, e até apropriado, que as celebrações pretéritas sejam avaliadas e, quando constatado, que seja anulado o ato que afronte à lei. As partes, portanto, como visto, não tiveram o ânimo de novar, onde qualquer cláusula em contrário deverá ser interpretada de forma mais favorável ao consumidor-aderente e, mais, sua verdadeira intenção.

Novo Código Civil Art. 112 – Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem.

Antigo Código Civil Art. 85 – Nas declarações de vontade se atenderá mais à sua intenção que ao sentido literal da linguagem.

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR Art. 47 – As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.

Desta maneira, para que seja, efetivamente, concretizada a novação( o que não se evidenciou no caso em questão ), além do ensejo das normas supra citadas, faz-se por necessário que:

ü Haja profunda mudança na obrigação principal; ü Na sua natureza; ü Na sua causa jurídica.

Aliás, como se coteja da legislação apropriada, no Crédito Rural a avaliação do pacto é vista como uma regra básica, ou seja, a busca da origem do débito a partir da cédula primeira(Resolução BACEN nº 2.220/95, art 1º, IV, ‘b’; nº 2238/96, art. 1º, VIII, ‘b’).

RESOLUÇÃO BACEN nº 2.238, de 31/01/96 “Art. 1º - Estabelecer as seguintes condições e procedimentos a serem observados na formalização das operações de alongamento de dívidas originárias de crédito rural, de que trata a lei nº 9.138, de 29.11.95: VIII – fica assegurada a revisão dos cálculos dos encargos financeiros, (...): b) a revisão deve retroceder à operação original quando os saldos devedores passíveis de alongamento forem resultantes de operações cujos recursos tenham sido empregados na liquidação de dívidas anteriores; “

Ademais, com advento do novo código civil( Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 ), podemos, ainda mais, ratificar tal orientação, ou seja, a de

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que devem prevalecer os preceitos de ordem pública – em especial quanto às normas que dizem respeito à função social do contrato --, em detrimento das estipulações particulares. Há, dessarte, o chamado dirigismo contratual, onde o Estado intervém nas relações dos particulares.

CÓDIGO CIVIL

Art. 421 – A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. Art. 2035 – A validade dos negócios e demais atos jurídicos, ... Parágrafo único – Nenhuma convenção prevalecerá se contrariar preceitos de ordem pública, tais como estabelecidos por este Código para assegurar a função social da propriedade e dos contratos.

II.5. EXPURGOS NAS RENEGOCIAÇÕES DAS DÍVIDAS RURAIS.

Importante ressaltar que, de regra, nas renegociações das dívidas originárias do crédito rural, é obrigatória que se faça o expurgos necessários. No caso em espécie, vale ressaltar, em momento algum houvera o expurgo dos encargos como estipulado por lei. Em verdade, impende destacar, far-se-ia mister a exclusão da cobrança, quando do alongamento, dos débitos relativos a:

ü Multa; ü Mora; ü Taxa de inadimplemento; ü Honorários advocatícios; ü Custas processuais

Encontramos tal comando em diversas regras que conduzem o crédito rural, o que destacamos abaixo:

RESOLUÇÃO 2.220, de 06/12/95 Art. 1º - Estabelecer as seguintes... (...) III – para fins de alongamento, o saldo devedor total deve ser calculado com base nos encargos financeiros previstos nos contratos originais para a operação em curso normal, até a data do vencimento pactuado. A partir do vencimento de cada operação, incidirão os encargos financeiros totais até o limite máximo de 12% a.a. (doze por cento) ao ano mais o índice de remuneração básica dos depósitos de poupança, expurgando-se, se houver:

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(...) b) os débitos relativos a multa, mora, taxa de inadimplemento e honorários advocatícios de responsabilidade da instituição financeira;

RESOLUÇÃO 2.238, de 31/01/96

Art. 1º - Estabelecer as seguintes... (...) III – para fins de alongamento de dívidas vencidas até 30/11/95, o total do saldo devedor deve ser calculado com base nos encargos financeiros previstos nos contratos originais para operação enquanto em curso normal, até a data do vencimento pactuado. A partir do vencimento até 30.11.95, incidirão encargos financeiros totais até o limite máximo de 12% a.a.(doze por cento) ao ano mais o índice de remuneração básico dos depósitos de poupança, expurgando-se, se houver: (...) b) os débitos relativos a multa, mora, taxa de inadimplemento e honorários advocatícios de responsabilidade da instituição financeira;

RESOLUÇÃO 2.471, de 26/02/98

Art. 1º - Autorizar a renegociação de dívidas originárias do crédito rural sob condições especiais, ... Art. 2º - Para fins da renegociação de que trata esta Resolução, o saldo devedor deve ser apurado com observância das seguintes condições: I – os valores não renegociados com base no art. 5º da Lei 9.138/95 e na Resolução nº 2.238/96, sujeitam-se: a) até a data do vencimento pactuado no instrumento de crédito ou da repactuação de que trata esta Resolução, a que ocorrer primeiro: aos encargos financeiros previstos no instrumento de crédito original para a situação de normalidade; b) do vencimento pactuado até a data da renegociação: a incidência de remuneração básica dos depósitos de poupança mais taxa efetiva de juros de 12% a.a.(doze por

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cento ao ano), ficando excluídos os encargos relativos a mora, multa e inadimplemento;

LEI nº 10.177, de 12 de janeiro de 2001

Art. 1º - A partir de janeiro de 2000, os encargos financeiros dos financiamentos concedidos com recursos dos Fundos Constitucionais de Financiamento do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste, de que trata a Lei nº 7.827, de 27 de setembro de 1989, serão os seguintes: (...) Art. 3º - Os bancos administradores dos Fundos Constitucionais de Financiamento ficam autorizados a adotar, nas assunções, renegociações, prorrogações e composições de dívidas, as seguintes condições: I – o saldo devedor da operação, para efeito da renegociação da dívida, será apurado sem computar encargos por inadimplemento, multas, mora e honorários de advogado;

LEI nº 10.464, de 24 de maio de 2002 Art. 1º - Fica autorizada a repactuação e o alongamento de dívidas oriundas de operações de crédito rural, contratadas com abrigo do Programa Especial de Crédito para Reforma Agrária – PROCERA, cujos mutuários estejam adimplentes com suas obrigações ou as regularizem até 31 de outubro de 2002, observadas as seguintes condições: (...) Art. 4º - Os mutuários com obrigações vencidas em anos anteriores a 2001 terão duas alternativas para enquadramento nas disposições do art. 1º: I – pagamento de dez por cento, no mínimo, do somatório das prestações integrais vencidas, tomadas sem bônus e sem encargos adicionais de inadimplemento, repactuando-se o restante no saldo devedor;”

É necessário, portanto, que seja feito o expurgo dos encargos ora evidenciados, quando cobrados indevidamente no pacto ora em estudo, o que de logo requer que o sejam afastados quando da sentença a ser proferida no presente feito, a ser apurado seu montante em perícia contábil, ou, como pedido sucessivo, diante da liquidação da sentença.

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II.6. REPETIÇÃO DE INDÉBITO OU COMPENSAÇÃO DE VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE. No caso em vertente, constata-se, às claras, a indevida cobrança de encargos. A parte, pois, merece a repetição daquilo que pagou a maior, ou, por outro lado, a compensação em eventual débito que ainda exista.

Antigo Código Civil Art. 964 – Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir. A mesma obrigação incumbe ao que recebeu dívida condicional antes de cumprida a condição.

A ótica, dessarte, é a que veda o enriquecimento sem causa. Não há, inclusive, que se prove o erro no pagamento, “..já que os débitos são lançados na conta pela própria instituição financeira.”(STJ-4ª Turma – REsp nº 184237 – Rel Min César Asfor Rocha – j. 13/11/2000)

E M E N T A COMERCIAL. CONTRATO DE MÚTUO. JUROS. LIMITAÇÃO (12% AA). LEI DE USURA (DECRETO N. 22.626/33). NÃO INCIDÊNCIA. APLICAÇÃO DA LEI N. 4.595/64. DISCIPLINAMENTO LEGISLATIVO POSTERIOR. SÚMULA N. 596-STF.. JUROS MORATÓRIOS. LIMITAÇÃO. LEI DE USURA (DECRETO N. 22.626/33). NÃO INCIDÊNCIA. APLICAÇÃO DA LEI N. 4.595/64. DISCIPLINAMENTO LEGISLATIVO POSTERIOR. SÚMULA N. 596-STF. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS. VEDAÇÃO. SÚMULA N. 121-STF. APLICABILIDADE. REVISÃO DE CONTRATO. INCIDÊNCIA DO CDC. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. MULTA. INACUMULAÇÃO. LEI N. 4.595/64. NÃO CONFIGURAÇÃO DA MORA. REPETIÇÃO OU COMPENSAÇÃO DO INDÉBITO. CABIMENTO. INSCRIÇÃO NO SERASA. PREVISÃO LEGAL. AÇÃO REVISIONAL. TUTELA ANTECIPADA. VEDAÇÃO DO REGISTRO PELO TRIBUNAL ESTADUAL. CABIMENTO. LEI N. 8.038/90, ART. 43, § 4º. NOTA PROMISSÓRIA PREENCHIDA EM NOME DA DEVEDORA POR INSTITUIÇÃO CREDITÍCIA. CLÁUSULA-MANDATO. NULIDADE. CC, ART. 115. SÚMULA nº 60-STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. TR. PREVISÃO CONTRATUAL. APLICAÇÃO. I. Não se aplica a limitação de juros remuneratórios de 12% a. a. e moratórios de 1% a. a., prevista na Lei de Usura, aos contratos de mútuo. II. Nestes, ainda que expressamente pactuada, é vedada a capitalização mensal dos juros, somente admitida nos casos previstos em lei, hipótese diversa dos autos. Incidência do art. 4º do

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Decreto n. 22.626/33 e da Súmula n. 121-STF. III. A existência de cláusula permitindo a cobrança de comissão de permanência com suporte na Lei n. 4.595/64 c/c a Resolução n. 1.129/86-BACEN, não pode ser afastada sob o simples enfoque de prejuízo para a parte adversa. Todavia, a concomitante previsão contratual de multa por inadimplência e juros, reconhecida pelo aresto a quo, exclui a comissão de permanência, de acordo com as normas de regência. IV. Alteração do entendimento anterior pela 2ª Seção, no sentido da não constituição da mora, quando esta deveu-se ao acréscimo indevido de encargos motivado exclusivamente pelo credor. Ressalva do ponto de vista do relator. V. Admite-se a repetição do indébito ou a compensação de valores pagos em virtude de cláusulas ilegais, em razão do princípio que veda o enriquecimento injustificado do credor. VI. Legítimo é o procedimento adotado pela instituição financeira em inscrever o nome do devedor inadimplente em cadastro de proteção ao crédito, por autorizado na legislação pertinente. Caso, todavia, em que movida ação de revisão de contrato, havendo discussão jurídica sobre o débito, pertinente a concessão de tutela antecipada para evitar a inscrição, sob pena de se frustrar, ao menos em parte, o direito de fundo discutido, pela imediata perda da credibilidade do mutuário na praça em que atua. VII. Nula é a nota promissória preenchida, em nome do devedor, pelo próprio credor ou pessoa/instituição a ele vinculada ou coligada, com base em mandato inserto em cláusula de contrato de mútuo. Contraposição de interesses jurídicos, a desvirtuar a natureza da outorga, tornando-a ineficaz, bem assim a cártula dela decorrente. Incidência, na espécie, da Súmula nº 60 do STJ. VIII. Ausência de vedação legal para utilização da TR como indexador de contrato de crédito bancário, desde que livremente pactuada. IX. Recurso especial conhecido e parcialmente provido.”(STJ - 4ª Turma – REsp nº 440718/RS - Rel Min Aldir Passarinho Júnior – j. 24/09/2002) “MUTUÁRIO – CORREÇÃO MONETÁRIA – DEVOLUÇÃO EM DOBRO – LEI Nº 8.078/90. I – Não poderia o agente financeiro, sob pena de ofensa à regra ´pacta sunt servanda´, posteriormente, cobrar correção monetária e juros moratórios. II – É direito dos autores repetição de indébito, do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais. III – Apelação improvida.

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(TRF-2ª Região – Ap nº 127269 – 3ª Turma – Rel. Juíza Tânia Heine – j. 03/11/1999)

E, de outro compasso, a restituição deverá ser em dobro daquilo que pago a maior.

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR “Art. 42 – Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único – O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. “

II.7. FIXAÇÃO DE NOVAS DATAS PARA PAGAMENTO(CRONOGRAMA) Como dito anteriormente, a legislação do crédito rural tem regras especiais que se distanciam das normas do direito comum. Verifica-se, aqui, que a instituição financeira estipulou cláusulas contrárias ao ordenamento jurídico, e, mais, perfez a cobrança de débito acima do valor devido. Em razão de tal conduta, vale ressaltar, sobreveio aspectos restritivos e inoportunos à boa condução financeira do Autor, relevando limitações na sua receita. Isto gerou a incapacidade de pagamento. Neste diapasão, Excelência, faz-se mister a alteração no cronograma de pagamento do débito pactuado, objeto da presente. A legislação do crédito rural, como apregoado alhures, possibilita tal desiderato. Aliás, o crédito rural é voltado, ao revés da condução dos empréstimos financeiros comuns, para os interesses do mutuário e fortalecimento, sobretudo, do setor rural(Lei nº 4.829/65).

MANUAL DE CRÉDITO RURAL(Cap 2 – seção 6 – item 09) “Independentemente de consulta ao Banco Central, é devida a prorrogação da dívida, aos mesmos encargos financeiros que antes pactuados no instrumento de crédito, desde que comprove incapacidade de pagamento do mutuário, em conseqüência de:”

LEI Nº 8.171/91

Art. 50 – A concessão de crédito rural observará os seguintes preceitos básicos:

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V – prazos e épocas de reembolsos ajustados à natureza e especificidade das operações rurais, bem como à capacidade de pagamento e às épocas normais de comercialização dos bens produzidos pelas atividades financeiras.

Como se percebe, pelas regras acima, as normas são cogentes no sentido de viabilizar a alteração do cronograma da pagamento. Diga-se, mais, que tal medida não importará qualquer prejuízo à instituição financeira, posto que, à luz do Manual de Crédito Rural, na regra acima exposta, na prorrogação da dívida será concretizada com base “..aos mesmos encargos financeiros antes pactuados no instrumento de crédito.” De outro lado, tal providência jurídica, ou seja, a modificação do cronograma de pagamento, tem respaldo diante da legislação consumerista, da qual cuida de conceder ao Estado-Juiz o poder de modificar ajustes contratuais(CDC, art. 6º, V). Mister, portanto, que V. Exa formule novo cronograma de pagamento do débito em discussão, quando ora se requer que as parcelas vencidas, quando da sentença, sejam incorporadas ao saldo final do pacto, o qual, também, será revisado diante do decisum meritório, com a continuidade do pagamento sucessivo das parcelas por vencer dentro das datas fixadas.

III – PEDIDOS.

Em arremate, requerem os Promoventes que V. Exª. se digne de julgar a pendenga nos seguintes moldes:

a) Por conflitarem com as regras entabuladas no Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil, regras estas relevadas neste arrazoado, pede, na forma do art. 6º, inc. V do CDC, que V. Exa se digne de ANULAR, total ou parcialmente, as cláusulas contratuais que exceda os limites declaratórios desta sentença, condenando à revisão contratual e recálculo do saldo devedor, a ser apurado em liquidação de sentença, quando afastadas a cobrança indevida e concretizando a restituição do indébito/compensação de crédito; b)que a comissão de permanência seja excluída do pacto e, diante da ausência de correção monetária no crédito rural, como pedido sucessivo, que a mesma seja substituída pelo INPC; c) seja afastada a capitalização dos juros remuneratórios aplicando-se a remuneração de forma linear; d) que os juros remuneratórios sejam limitados a 12%(doze por cento) ao ano, inclusive levando-se em consideração todo e qualquer pactuação remuneratória no seu somatório;

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e) seja deferida a INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA; f) afastar juros moratórios em patamares acima de 1%(um por cento) ao ano; g) que V. Exa defina, por sentença, novo cronograma de pagamento, onde pede-se que o eventual saldo devedor encontrado seja postergado para quitação junto com a parcela final do pacto, com a continuidade do pagamento sucessivo das parcelas por vencer dentro das datas fixadas, abatido o crédito em favor do Promovente, em face da repetição do indébito, sob pena de multa diária de R$1.000,00(um mil reais)(obrigação de fazer); h) excluir a cobrança da correção monetária, seja pela Taxa Referencial(TR) ou pela Taxa de Juros de Longo Prazo(TJLP), multa contratual acima de 2%(dois por cento) e comissão del-credere, esta última seja de forma capitalizada ou não; i) determinar a CITAÇÃO da Requerida, por Carta, com AR, para, querendo, vir contestar a presente Ação de Revisional de Contrato c/c Restituição de Indébito, no prazo de 15 (quinze)dias, sob pena de confissão e revelia; j) que a Ré condenada a devolver as quantias pagas e as cobradas a maior, em virtude das ilegalidades citadas e encontradas na sentença, em dobro, compensando-se em caso de eventual crédito remanescente; l) seja afastada da renegociação da dívida os débitos relativos a multa, mora, taxa de inadimplemento, honorários advocatícios e custas processuais; m) condenar no ônus de sucumbência em face do que disciplina a legislação processual civil, onde de já estipula-se, respeitante aos honorários advocatícios, que a seja levado em conta : i) que ação em cotejo é complexa; ii)o tempo despendido para a solução desta causa; iii) o lugar de prestação dos préstimos advocatícios; iv) a natureza e a importância da querela; n) protesta provar o alegado por toda espécie de prova admitida (CFed, art. 5º, inciso LV), nomeadamente pelo depoimento do representante legal da Promovida(CPCiv, art. 12, inciso VI), oitiva de testemunhas a serem arroladas opportuno tempore, juntada posterior de documentos como contraprova, perícia contábil, exibição de documentos pela Promovida, tudo de logo requerido.

Concede-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

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Respeitosamente, pede deferimento. Goiânia, 01 de dezembro de 2008. P.p. MÁRCIO DE SOUZA –

OAB/GO 17.264 Advogado(a)