ACONTECIMENTO DISCURSIVO, MEMÓRIA E EFEITOS DE SENTIDO

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL IV SEAD - SEMINÁRIO DE ESTUDOS EM ANÁLISE DO DISCURSO 1969-2009: Memória e história na/da Análise do Discurso Porto Alegre, de 10 a 13 de novembro de 2009 ACONTECIMENTO DISCURSIVO, MEMÓRIA E EFEITOS DE SENTIDO Maria da Conceição Fonseca-Silva [email protected] Doutora Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) Neste trabalho, damos continuidade à discussão sobre acontecimentos discursivos relacionados a escândalos de corrupção espetacularizados e discursivizados na mídia. Um acontecimento discursivo, na perspectiva de Pêcheux, como sabemos, é elemento histórico descontínuo, exterior, não previsível e também ponto de encontro de uma atualidade e de uma memória. Dessa forma, entendemos que o(s) efeito(s) de sentido(s) de um acontecimento discursivo relacionado a escândalos de corrupção está(ão) filiado(s) a uma rede de sentidos. Objetivando construir um corpus específico de análise para discutirmos a questão, selecionamos edições das revistas de informação Veja, lançada em 1968 pela Editora Abril e considerada um dos meios de comunicação que mais se destaca na imprensa brasileira, a mais comprada, a maior em assinaturas e em tiragem de exemplares (nacionalmente) e a quinta revista de informação de maior circulação no mundo; e IstoÉ que, lançada em 1976 pela Editora Três, ocupa, ao lado da revista Época, a segunda posição de revista de informação mais lida no país. Para além de outras questões que indicam que as revistas de informação são pontuadas pela lógica da Indústria Cultural, interessa-nos analisar o modo pelo qual a memória irrompe reatualizando os sentidos sobre a corrupção na espetacularização dessas duas revistas, que nas suas formas de representar a realidade, constituí-la e refleti-la, funcionam como um dos lugares de memória discursiva e de espetacularização midiática da corrupção no Brasil. Partindo do pressuposto de que o domínio da memória discursiva interfere no domínio da atualidade enquanto reorganização de filiações históricas, ou seja, enquanto reconfiguração ou estabilização dos sentidos, no processo de análise dos acontecimentos discursivos e dos movimentos de sentidos sobre escândalos de corrupção, levamos em conta que: a) o escândalo envolve estágios de desenvolvimento; b) a corrupção envolve infração, violação de regras, convenções ou leis, mas para ser escandalosa precisa ser descoberta, denunciada; c) a articulação pública do discurso denunciatório é a condição para que uma corrupção se transforme em um escândalo. Mobilizamos postulados do quadro teórico da Análise de Discurso, inaugurado por Pêcheux, e da filosofia de Foucault. Além disso, mobilizamos, quando necessário, categorias de outras áreas do conhecimento, tentando ressignificá-las dentro da prática de análise de discurso que empreendemos. As análises permitem-nos assinalar, inicialmente, que os acontecimentos discursivos relacionados a escândalos de corrupção apresentam desenvolvimento temporal como um enredo de novela e ganham visibilidade porque viram escândalo na mídia; que a erupção dos acontecimentos discursivos, relacionados à corrupção, mostram que a mídia, a exemplo das duas revistas, têm “lugar de falar”, poder de “falar” e de “sugerir” onde e o que olhar, o que ler e como interpretar.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

IV SEAD - SEMINÁRIO DE ESTUDOS EM ANÁLISE DO DISCURSO 1969-2009: Memória e história na/da Análise do Discurso

Porto Alegre, de 10 a 13 de novembro de 2009

ACONTECIMENTO DISCURSIVO, MEMÓRIA E EFEITOS DE SENTIDO

Maria da Conceição Fonseca-Silva

[email protected]

Doutora

Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB)

Neste trabalho, damos continuidade à discussão sobre acontecimentos discursivos relacionados a

escândalos de corrupção espetacularizados e discursivizados na mídia. Um acontecimento discursivo,

na perspectiva de Pêcheux, como sabemos, é elemento histórico descontínuo, exterior, não previsível e

também ponto de encontro de uma atualidade e de uma memória. Dessa forma, entendemos que o(s)

efeito(s) de sentido(s) de um acontecimento discursivo relacionado a escândalos de corrupção está(ão)

filiado(s) a uma rede de sentidos. Objetivando construir um corpus específico de análise para

discutirmos a questão, selecionamos edições das revistas de informação Veja, lançada em 1968 pela

Editora Abril e considerada um dos meios de comunicação que mais se destaca na imprensa brasileira,

a mais comprada, a maior em assinaturas e em tiragem de exemplares (nacionalmente) e a quinta

revista de informação de maior circulação no mundo; e IstoÉ que, lançada em 1976 pela Editora Três,

ocupa, ao lado da revista Época, a segunda posição de revista de informação mais lida no país. Para

além de outras questões que indicam que as revistas de informação são pontuadas pela lógica da

Indústria Cultural, interessa-nos analisar o modo pelo qual a memória irrompe reatualizando os

sentidos sobre a corrupção na espetacularização dessas duas revistas, que nas suas formas de representar a realidade, constituí-la e refleti-la, funcionam como um dos lugares de memória

discursiva e de espetacularização midiática da corrupção no Brasil. Partindo do pressuposto de que o

domínio da memória discursiva interfere no domínio da atualidade enquanto reorganização de

filiações históricas, ou seja, enquanto reconfiguração ou estabilização dos sentidos, no processo de

análise dos acontecimentos discursivos e dos movimentos de sentidos sobre escândalos de corrupção,

levamos em conta que: a) o escândalo envolve estágios de desenvolvimento; b) a corrupção envolve

infração, violação de regras, convenções ou leis, mas para ser escandalosa precisa ser descoberta,

denunciada; c) a articulação pública do discurso denunciatório é a condição para que uma corrupção se

transforme em um escândalo. Mobilizamos postulados do quadro teórico da Análise de Discurso,

inaugurado por Pêcheux, e da filosofia de Foucault. Além disso, mobilizamos, quando necessário,

categorias de outras áreas do conhecimento, tentando ressignificá-las dentro da prática de análise de

discurso que empreendemos. As análises permitem-nos assinalar, inicialmente, que os acontecimentos

discursivos relacionados a escândalos de corrupção apresentam desenvolvimento temporal como um

enredo de novela e ganham visibilidade porque viram escândalo na mídia; que a erupção dos

acontecimentos discursivos, relacionados à corrupção, mostram que a mídia, a exemplo das duas

revistas, têm “lugar de falar”, poder de “falar” e de “sugerir” onde e o que olhar, o que ler e como

interpretar.