Acórdão do TRL - redução penhora 3

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Acórdãos TRL Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa Processo: 316-D/199.L1-7 Relator: ROQUE NOGUEIRA De scritores: PENHORA PENSÃO DE REFORMA ISENÇÃO REDUÇÃO NULIDADE DE DESPACHO do Documento: RL Data do Acordão: 18-05-2010 Votação: UNANIMIDADE Texto Integral: S Meio Processual: APELAÇÃO De cisão: IMPROCEDENTE Sumário: I - Além do direito fundamental dos pensionistas em perceberem um rendimento que lhes garanta uma sobrevivência condigna, há que ter em consideração também o direito do credor exequente a ver realizado o seu direito, o qual tem tutela constitucional no art.62º, 1. II - Dessa colisão ou conflito entre os dois direitos, o legislador só optou pelo sacrifício do direito do credor na medida do necessário, isto é, quando a realização do mesmo ponha em causa a sobrevivência ou subsistência do devedor. III - A este também compete o dever de fazer o sacrifício de cortar nas suas despesas e o dever de procurar aumentar as suas receitas, tanto quanto possível, por forma a poder honrar os seus compromissos, que é algo que também está contemplado no âmbito da dignidade humana, que não se rege, apenas, por critérios materialistas ou economicistas. IV - Da prova constante dos autos, não resulta que as necessidades do executado e do seu agregado familiar justifiquem a opção pelo sacrifício do direito do credor. V - Haverá, assim, que concluir que não havia que reduzir a parte penhorável da pensão de reforma do executado por período razoável, nem que isentá-la de penhora por período não superior a um ano, nos termos do disposto no art. 824º, nº4, na redacção aplicável ao caso, dada pelo DL 38/2003, de 8/3. (Sumário do Relator) De cisão Texto Parcial: De cisão Texto Integral: Acordam no tribunal da Relação de Lisboa: 1 – Relatório. No Juízo do Tribunal Judicial, no âmbito da execução que M move contra J, deduziu este oposição à penhora, ao abrigo do disposto no art.863º-A, do C.P.C., alegando que foi notificado de que o Centro Nacional de Pensões procederá à dedução mensal de € 142,44 no valor da sua pensão mensal, até perfazer o total da quantia exequenda, mas que já tem a sua pensão mensal penhorada à ordem de um processo de execução fiscal, sendo-lhe deduzidos mensalmente € 146,85. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/ca3f... 10-11-2010 1:09

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Acórdãos TRL Acórdão do Tribunal da Relação de LisboaProcesso: 316-D/199.L1-7Relator: ROQUE NOGUEIRADescritores: PENHORA

PENSÃO DE REFORMAISENÇÃOREDUÇÃONULIDADE DE DESPACHO

Nº do Documento: RLData do Acordão: 18-05-2010Votação: UNANIMIDADETexto Integral: SMeio Processual: APELAÇÃODecisão: IMPROCEDENTESumário: I - Além do direito fundamental dos pensionistas em perceberem

um rendimento que lhes garanta uma sobrevivência condigna,há que ter em consideração também o direito do credorexequente a ver realizado o seu direito, o qual tem tutelaconstitucional no art.62º, nº1.II - Dessa colisão ou conflito entre os dois direitos, o legisladorsó optou pelo sacrifício do direito do credor na medida donecessário, isto é, quando a realização do mesmo ponha emcausa a sobrevivência ou subsistência do devedor.III - A este também compete o dever de fazer o sacrifício decortar nas suas despesas e o dever de procurar aumentar as suasreceitas, tanto quanto possível, por forma a poder honrar osseus compromissos, que é algo que também está contemplado noâmbito da dignidade humana, que não se rege, apenas, porcritérios materialistas ou economicistas.IV - Da prova constante dos autos, não resulta que asnecessidades do executado e do seu agregado familiarjustifiquem a opção pelo sacrifício do direito do credor.V - Haverá, assim, que concluir que não havia que reduzir aparte penhorável da pensão de reforma do executado porperíodo razoável, nem que isentá-la de penhora por período nãosuperior a um ano, nos termos do disposto no art.824º, nº4, naredacção aplicável ao caso, dada pelo DL nº38/2003, de 8/3.(Sumário do Relator)

Decisão Texto Parcial:Decisão Texto Integral: Acordam no tribunal da Relação de Lisboa:

1 – Relatório.

No Juízo do Tribunal Judicial, no âmbito da execução que Mmove contra J, deduziu este oposição à penhora, ao abrigo dodisposto no art.863º-A, do C.P.C., alegando que foi notificado deque o Centro Nacional de Pensões procederá à dedução mensalde € 142,44 no valor da sua pensão mensal, até perfazer o totalda quantia exequenda, mas que já tem a sua pensão mensalpenhorada à ordem de um processo de execução fiscal, sendo-lhededuzidos mensalmente € 146,85.

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Mais alega que recebe uma pensão de reforma mensal de €854,69, vivendo com a sua mulher, que está de baixa médica eaufere um subsídio de doença no montante mensal de € 281,40,tendo despesas de saúde, com a renda de casa, água e luz, alémdos gastos relativos à alimentação, vestuário e calçado.Alega, ainda, que, caso a penhora se concretize, ficará com umrendimento disponível inferior ao salário mínimo nacional de €450,00, sendo que, o nº3, do art.824º, do C.P.C., permite que seisentem de penhora os rendimentos a que alude o nº1, do mesmoartigo.Conclui, assim, que deve ser ordenado o levantamento dapenhora de € 142,44 sobre a pensão de reforma do opoente, pora mesma colocar seriamente em risco a sua digna sobrevivênciae a do seu agregado familiar.O exequente contestou, concluindo que o pedido do executadodeve ser considerado totalmente improcedente, por falta defundamento.Seguidamente, com data de 27/10/09, foi proferida decisão,julgando totalmente improcedente a oposição à penhora, pornão se verificar qualquer dos fundamentos previstos nas alíneasdo nº1, do art.863º-A, do C.P.C..Na mesma data foi, ainda, proferido o seguinte despacho:«Questão diversa da que acima se decidiu é a da eventualredução da penhora, ou a sua eventual isenção até um ano, nostermos previstos no n°4 do art.8240 do Código de ProcessoCivil. Tal incidente pressupõe a legalidade da penhora - comosucede no caso - e a demonstração de que o montante penhoradoperiga a sobrevivência do executado e respectivo agregadofamiliar.Tal incidente, porém - e conforme atrás se aflorou -, corre nosautos principais.Assim, fazendo eco do princípio do aproveitamento dos actosprocessuais, abra conclusão nos mesmos a fim de ser proferidadecisão quanto a tal eventual redução ou isenção (fazendomenção ao presente despacho na própria conclusão).Dê conhecimento às partes do presente despacho.».Aberta conclusão nos autos principais, foi, com data de 15/2/09,proferida decisão, indeferindo a redução da penhora, que semanteve na proporção de um sexto.Inconformado, o executado interpôs recurso desta últimadecisão.Produzidas as alegações e colhidos os vistos legais, cumpredecidir.2 – Fundamentos.2.1. O recorrente remata as suas alegações com as seguintesconclusões:I. O douto despacho recorrido foi proferido sem que astestemunhos arroladas pelo ora Recorrente tivessem sido

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inquiridas e sem que tivesse sido sequer designada data para asua inquirição.II. O douto despacho recorrido não faz qualquer menção a essastestemunhas, nem aos fundamentos da preterição do seudepoimento.III. A não inquirição dos referidas testemunhas e a nãoindicação da razão por que não foram inquiridas constituiomissão que fere de nulidade o douto despacho recorrido (art.201.°, n.° 1, e 668.°. n.° 1, al. b), do CPC).IV. O douto despacho recorrido é completamente omisso quantoao facto, alegado e documentalmente provado, de a pensão dereforma do Recorrente já se encontrar penhorada pelo valor deEuros 146,85 à ordem de processo de execução fiscal.V. A omissão de pronúncia sobre esse facto e a respectiva provadocumental acarreta a nulidade do despacho recorrido (art.201.°, n.° l, e 668.°, n.° 1, al. d), do CPC).VI. A soma da penhora preexistente e da penhora oraimpugnada ultrapassa o terço abstractamente penhorável dapensão de reforma do Recorrente, violando o disposto no artigo824.°, n°s 1, al. b), e 2, do CPC.VII. A soma dos rendimentos do Recorrente e da sua mulher,que compõe o seu agregado familiar, deduzida a penhorapreexistente, é também inferior a dois salários mínimos e a duasvezes e meia o valor do Indexante de Apoios Sociais.VIII. A não isenção ou redução da penhora impugnado viola,assim, o disposto no artigo 824. n.°s 1, al. b), 2, 4 e 5, do CPC.IX. Sem conceder, tendo em conta as necessidades do Recorrentee do seu agregado familiar, mesmo ponderadas o montante e anatureza do crédito exequendo, deveria ter sido reduzida a partepenhorável da pensão de reforma do Recorrente, em face dodisposto artigo 824.°, n.° 5, do CPC.X. Face o tudo quanto antecede, deverá ser anulado ou revogadoo douto despacho recorrido.2.2. O recorrido contra-alegou, concluindo nos seguintes termos:A. Analisadas com atenção as alegações da Recorrente para pôrem causa o douto despacho de 15.12.2009 (proferido nos autosprincipais - processo n.° 316-B/1999), conclui-se que elepretende atacar a douta sentença de 27.10.2009, relativa aoincidente de oposição à penhora (apenso C) que transitou emjulgado e faz caso julgado.B. Não existe qualquer obrigatoriedade de o Tribunal (ouquaisquer Tribunais) ouvir todas as testemunhas arroladaspelas partes, nem tão pouco de justificar os motivos pelos quaisnão se inquiriu determinada testemunha.C. Acresce que se essa obrigatoriedade existisse (que por merahipótese se admite sem conceder), ela aplicar-se-ia, quandomuito, ao incidente de oposição à penhora (apenso C) para oqual as testemunhas foram arroladas - e não aos autos

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principais (processo 316-B/1999).D. Da simples leitura do douto despacho posto em causa, émanifesto que ele especifica os fundamentos de facto e de direitoque justificaram a decisão - não tendo existido, assim, apreterição dos requisitos formais da sentença previstos no art.668.° n.°l alínea b) do CPC.E. Não se pedia ao Tribunal que se pronunciasse sobre apenhora valor de € 146,85, à ordem de um processo de execuçãofiscal. Sobre essa questão já se pronunciaram as entidadesadministrativas e/ou jurisdicionais fiscais competentes - e nemsequer o Tribunal a quo tinha competência para proferirqualquer decisão sobre essa matéria.F. Acresce que o Tribunal a quo considerou o facto de que jáexistia a penhora valor de € 146,85, à ordem de um processo deexecução fiscal, quando apreciou o incidente de oposição àpenhora (apenso C) no qual essa questão foi suscitada (cf. doutasentença de 27.10.2009, proferida no processo n.° 316-C/1999).G. Da simples leitura do douto despacho que é posto em causa, émanifesto que o Tribunal a quo se pronunciou sobre a causadecidendi (eventual isenção ou redução da penhora).H. Diz o Recorrente que "a soma da penhora preexistente [de €146,85, à ordem de um processo de execução fiscal] e da penhoraora impugnada |€ 142,44] ultrapassa o terço abstractamentepenhorável da pensão de reforma do Recorrente, violando odisposto no artigo 824.º, n. ºs l, al b), e 2 do CPC.". Porém, foiexactamente sobre essa questão que o Tribunal se debruçou noâmbito do incidente de oposição à penhora deduzido peloExecutado, que correu termos no apenso C, tendo concluído pelasua improcedência total. É, assim, manifesto que o Recorrenteestá querer discutir uma questão sobre a qual já foi proferidadecisão (douta sentença de 27.10.2009, proferida no processo n.°316-C/I999) da qual ele não recorreu, que transitou em julgadoe faz caso julgado - e não pode.I. Acresce que o Tribunal decidiu bem, uma vez que o n.° 2 doart. 824.° prescreve que a impenhorabilidade de 2/3 dasprestações periódicas pagas a título de aposentação ou dequalquer regalia social ou de quaisquer outras pensões sociaisde natureza semelhante tem como limite mínimo o montanteequivalente a um salário mínimo nacional.J. Os pressupostos sobre os quais assentam as contas doRecorrente para tirar as suas conclusões de verificação deimpenhorabilidade (por força art. 824.° n.° l alínea b), 2, 4 e 5do CPC) estão (deliberadamente) errados.K. Os rendimentos da Executada não foram penhorados e,mesmo que tivessem sido, a aferição da impenhorabilidade dosseus rendimentos far-se-ia autónoma e separadamente dapenhora de rendimentos do Recorrente. Os rendimentos daExecutada (que não foram penhorados) não contam, assim, para

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o cálculo da impenhorabilidade dos rendimentos do Recorrente.L. Ao dizer que também foram violados os n.° 4 e 5 do art. 824.°do CPC, o Recorrente introduz, agora, uma novidade noprocesso que também não suscitou antes - pois, no incidente deoposição à penhora, ele não só não pediu a isenção/redução dapenhora nos termos n.° 4 e/ou 5 do art. 824.º do CPC, comosustentou, vigorosamente, a aplicação aos autos do regimeprocessual anterior ao Dec.-Lei n.° 38/2003.M. É manifesto que não houve qualquer violação do Tribunal aquo desse normativo; pois o Recorrente não requereu aisenção/redução da penhora ao agente de execução, o Recorridonão foi consultado sobre uma eventual isenção/redução dapenhora, o agente de execução nada decidiu sobre essa questão enão houve qualquer reclamação para o Juiz. Acresce que não sesabe qual é o rendimento relevante para efeitos de protecçãojurídica do agregado familiar do Recorrente - tudo o que se sabeé que o Recorrente não pediu apoio judiciário - e que, com basenos elementos disponíveis nos autos (que carecem de serprovados), o rendimento do agregado familiar é de, pelo menos,€1.128,20 (€ 854,69 + € 281,40) - sendo, assim, superior a % dovalor Indexante de Apoio Social (IAS) para 2009 ( % x € 419,22== 314,42) e duas vezes e meia do IAS (2,5 x € 419,22 =€1.048,05).Nestes termos e com o douto suprimento, que se requer, devem,então, os Meritíssimos Juízes Desembargadores do Tribunal daRelação de Lisboa considerar o recurso instaurado peloRecorrente totalmente improcedente por falta de fundamento emanter a decisão recorrida na totalidade.2.3. O executado deduziu oposição à penhora, ao abrigo dodisposto no art.863º-A, do C.P.C. (serão deste Código os demaisartigos citados sem menção de origem), alegando, além do mais,a inadmissibilidade da penhora, com a extensão com que foirealizada, já que, caso aquela se concretize, ficará com umrendimento disponível inferior ao salário mínimo nacional de €450,00, citando para o efeito os Acórdãos do TribunalConstitucional nºs 318/99 e 177/02, que declararam ainconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da normaque resulta da conjugação do disposto na al.b), do nº1 e do nº2,do art.824º (redacção anterior ao DL nº38/2003, de 8/3), naparte em que permite a penhora até um terço das prestaçõesperiódicas, pagas ao executado, a título de regalia social ou depensão, cujo valor global não seja superior ao salário mínimonacional.Após a resposta do exequente, foi logo proferida decisão, por seter entendido que os elementos constantes dos autos opermitiam.Nessa decisão, considerou-se ser aplicável ao caso a reforma daacção executiva implementada pelo citado DL nº38/2003, em

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virtude de, apesar de a acção declarativa datar de 1999, aexecução ter sido iniciada em 24/11/08, e atento o disposto noart.21º, do mesmo DL, que prevê a aplicação das alteraçõesapenas aos processos instaurados a partir do dia 15/9/03. Maisse considerou que, auferindo o executado a pensão mensal novalor de € 854,69, e estando a descontar € 146,85 à ordem deuma execução fiscal, com a penhora de um sexto daquelapensão, no valor de € 142,44, resta-lhe, ainda, o montante de €565,40, que é superior ao salário mínimo nacional de € 450,00.Daí que se tenha concluído que a pensão em causa érelativamente penhorável e que o valor penhorado não excede openhorável, pelo que, se declarou improcedente a oposição àpenhora, por não se verificar qualquer dos fundamentosprevistos no nº1, do citado art.863º-A.Esta decisão foi proferida em 27/10/09, no incidente de oposiçãoà penhora, que correu por apenso (cfr. o art.817º, nº1, aplicávelex vi do art.863º-B, nº2), e transitou em julgado.Nessa mesma data, foi proferido despacho no aludido apenso,mandando abrir conclusão nos autos principais, a fim de serproferida decisão quanto a eventual redução da penhora ouisenção até um ano, os termos do nº4, do art.824º, por se terentendido que tal incidente corre naqueles autos e não noapenso, pressupondo a legalidade da penhora, como sucede nocaso.Foi, então, proferida, nos autos principais, a decisão orarecorrida, onde se concluiu inexistir fundamento para isentar depenhora a pensão do executado e se afigurar justa a proporçãodeduzida (um sexto), no quadro de ponderação dos rendimentose despesas comprovadas do agregado com o montante da dívidaexequenda. Para o efeito, teve-se em consideração a pensãoauferida pelo executado - € 854,69, a penhora de um sextodaquela pensão - € 142,44, e o subsídio de doença auferido pelaexecutada, sua mulher - € 281,40, o que traduz um remanescentede € 993,75, que constitui valor bem superior ao de muitosoutros agregados familiares em situação idêntica. Mais se teveem consideração a circunstância de a execução prosseguir paracobrança de dívida reconhecida judicialmente em 2000, pelovalor de € 296.275,44.Resulta das conclusões da alegação do recorrente que, nopresente recurso, se colocam as seguintes questões:1ª – saber se o despacho recorrido é nulo, nos termos doart.668º, nº1, als.b) e d), aplicável ex vi do nº3, do art.666º;2ª – saber se havia que reduzir a parte penhorável da pensão dereforma do executado, por período razoável, ou que isentá-la depenhora, por período não superior a um ano.2.3.1. Alega o recorrente que o despacho recorrido foi proferidosem que as testemunhas arroladas tivessem sido inquiridas esem que tivesse sido indicada a razão da não inquirição, pelo

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que, tal omissão fere de nulidade o aludido despacho, citandopara o efeito o disposto no art.668º, nº1, al.b).Esta nulidade, no entanto, só se verifica, nos termos do citadoartigo, quando a decisão não especifique os fundamentos defacto e de direito que justificam a decisão. Sendo que, o que a leiconsidera nulidade é a falta absoluta de motivação, isto é, aausência total de fundamentos de direito e de facto. Assim, émanifesto que o despacho recorrido especificou os fundamentosde facto e de direito que justificam a decisão, pelo que, o mesmonão é nulo. Dir-se-á, a propósito, que uma coisa são as nulidadesda decisão e outra, bem diferente, as nulidades de processo. Detodo o modo, no caso, também não se vê que se esteja peranteuma nulidade deste último tipo, designadamente, perante aomissão de um acto prescrito na lei (cfr. o art.201º, nº1).Alega, ainda, o recorrente que o despacho recorrido é omissoquanto ao facto, alegado e documentalmente provado, de a suapensão de reforma já se encontrar penhorada pelo valor de €146,85, à ordem de processo de execução fiscal, o que acarreta anulidade de tal despacho, nos termos do art.668º, nº1, al.d).Mas também não tem razão, nesta parte. É que a nulidade emcausa consiste na omissão de pronúncia sobre questões quedevem ser apreciadas. Ora, é evidente que o despacho recorridoconheceu das questões que foram submetidas à apreciação dotribunal. Note-se que uma coisa é não se tomar em consideraçãodeterminado facto e outra não se conhecer de questão de que sedevia tomar conhecimento, pois que, o facto material é umelemento para a solução da questão, mas não é a própriaquestão. Convém, pois, não confundir eventual erro dejulgamento, por a decisão não se ter socorrido de elementos deque devia socorrer-se, com a nulidade de não se conhecer dequestão de que o tribunal devia tomar conhecimento.Haverá, deste modo, que concluir que o despacho recorrido nãoé nulo, nos termos do art.668º, nº1, als.b) e d), aplicável ex vi donº3, do art.666º.2.3.2. No que respeita à pretendida isenção ou redução dapenhora, dir-se-á, antes do mais, que também se entende seraplicável ao caso o disposto no art.824º, na redacção que lhe foidada pelo DL nº38/2003, de 8/3, uma vez que o processo deexecução foi instaurado em 24/11/08. Isto é, nem tem aplicação aredacção dada àquele artigo pelo DL nº329-A/95, de 12/12, comoinicialmente pretendeu o recorrente, nem a nova redacção quelhe foi dada pelo DL nº226/2008, de 20/11, como pretende agorao recorrente, em sede de recurso, sendo que, este último diplomalegal entrou em vigor, quanto àquela nova redacção, em 31/3/09,apenas se aplicando aos processos iniciados após a sua entradaem vigor (cfr. os seus arts.22º e 23º).Dir-se-á, ainda, que não há que colocar agora a questão dainadmissibilidade da penhora, por ultrapassar o terço

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abstractamente penhorável da pensão de reforma do recorrente,e tendo em conta o disposto no art.824º, nºs 1, al.b) e 2. É que talquestão foi objecto de decisão proferida no incidente deoposição à penhora, como já se referiu, tendo-se aí concluídoque a penhora foi realizada nos termos legais, por não terexcedido o terço penhorável do rendimento em causa. Decisãoessa que não foi objecto de recurso, tendo transitado em julgado.Assim sendo, apenas haverá que ter em consideração o dispostono art.824º, nº4, na redacção do DL nº38/2003, nos termos doqual: «Ponderados o montante e a natureza do créditoexequendo, bem como as necessidades do executado e do seuagregado familiar, pode o juiz, excepcionalmente, reduzir, porperíodo que considere razoável, a parte penhorável dosrendimentos e mesmo, por período não superior a um ano,isentá-los de penhora».No que respeita ao crédito exequendo, desconhece-se a suanatureza, apenas se sabendo que foi reconhecido judicialmenteem 2000 e que o respectivo montante atinge o valor de €296.275,44.Quanto às necessidades do executado e do seu agregadofamiliar, considerou-se na decisão recorrida que a pensãoauferida pelo executado é de € 854,69 mensais e que a executadaaufere € 450,00 mensais, mas que se encontra de baixa médica,auferindo subsídio de doença de € 281,40 mensais. Mais seconsiderou que foram juntos vários documentos como prova dedespesas regulares do agregado familiar, designadamente,despesas de saúde e com a habitação, as quais, no entanto, nãoatingem o valor alegado pelo executado. Considerou-se, ainda,que, deduzido o valor penhorado à pensão do executado,remanescem € 993,75 de rendimento do agregado familiar, queconstituem valor bem superior ao de muitos outros agregadosfamiliares em situação idêntica. Para, depois, se concluir, faceao montante significativo do valor devido, inexistir fundamentopara reduzir ou isentar de penhora a pensão do executado.Vejamos.É certo que, tendo em conta o valor penhorado, quer à ordem daexecução ora em causa, quer à ordem do processo de execuçãofiscal, o remanescente de rendimento do agregado familiaratinge o valor de € 846,80 [ € 854,69+€ 281,40 (fls.53 e 54)-€146,85 (fls.51 e 52)-€ 142,44 ]. Por outro lado, atendendo aosdemais documentos juntos pelo recorrente no incidente deoposição à penhora, verifica-se que o agregado familiar doexecutado, além do encargo com a renda da casa, no valormensal de € 450,00 (cfr. fls.79 a 90), tem as seguintes despesasmédias mensais: € 82,00 (despesas médicas – soma das verbasconstantes de fls.55 a 77, a dividir pelos 4 meses a que asmesmas se reportam), € 57,00 (electricidade – soma das verbasconstantes de fls.91 e 94, a dividir pelos 4 meses a que se

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referem) e € 10,00 (água – fls.92 e 93).Assim, somando todos os encargos, o seu valor mensal atinge omontante de € 599,00. O qual, subtraído ao aludidoremanescente de € 846,80, dá um total de € 247,80, destinado adespesas com alimentação e vestuário. Claro que não restamuito para este efeito. No entanto, não se vê que se trate de umasituação que justifique a redução da penhora por períodorazoável ou a isenção de penhora por período não superior a umano.Note-se que se trata, nos termos da lei, de medidas excepcionais,previstas para situações em que está em causa a sobrevivênciaeconómica do executado e seu agregado familiar. O que, a nossover, não se demonstra no caso dos autos, não nos parecendo queesteja em perigo a satisfação das necessidades essenciais de um ede outro. Acresce que o valor da dívida exequenda é elevado - €296.275,44 -, sendo que, além do direito fundamental dospensionistas em perceberem um rendimento que lhes garantauma sobrevivência condigna, há que ter em consideraçãotambém o direito do credor exequente a ver realizado o seudireito, o qual tem tutela constitucional no art.62º, nº1. Dessacolisão ou conflito entre os dois direitos, o legislador só optoupelo sacrifício do direito do credor na medida do necessário, istoé, quando a realização do mesmo ponha em causa asobrevivência ou subsistência do devedor. Refira-se, ainda, quea este também compete o dever de fazer o sacrifício de cortarnas suas despesas e o dever de procurar aumentar as suasreceitas, tanto quanto possível, por forma a poder honrar osseus compromissos, que é algo que também está contemplado noâmbito da dignidade humana, que não se rege, apenas, porcritérios materialistas ou economicistas.Dir-se-á, a propósito, que o pagamento da renda de casa nomontante mensal de € 450,00, diz respeito a uma moradia sita naRua (cfr. fls.79 a 90), a qual está em nome de N (cfr. fls.25 e 26),cujos apelidos são idênticos aos dos executados, e que, segundo oexequente, é filho destes. Por outro lado, a entidade patronal daexecutada –tem como sócios gerentes pessoas igualmente comapelidos idênticos aos dos executados, aí figurando, entre outros,além do referido N, R (cfr. fls.27 a 33). Desconhece-se qual areal situação actual quer do referido imóvel, quer da aludidasociedade. De todo o modo, a serem familiares dos executados aspessoas referenciadas naqueles documentos, as mesmas podemestar vinculadas ao dever de contribuir para o sustento,habitação e vestuário dos executados (cfr. os arts.2003º, nº1 e2009º, do C.Civil).Seja como for, o que interessa realçar é que, da provadocumental constante dos autos, não resulta que as necessidadesdo executado e do seu agregado familiar justifiquem a opçãopelo sacrifício do direito do credor. Quanto à prova testemunhal

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indicada pelo executado, não se vê que houvesse necessidade deinquirir as testemunhas arroladas, porquanto, por um lado, amatéria em questão é fundamentalmente passível de provadocumental, e, por outro lado, os factos essenciais alegados peloexecutado foram considerados provados com base nosdocumentos apresentados.Haverá, assim, que concluir que não havia que reduzir a partepenhorável da pensão de reforma do executado por períodorazoável, nem que isentá-la de penhora por período nãosuperior a um ano, nos termos do disposto no art.824º, nº4, naredacção aplicável ao caso, dada pelo DL nº38/2003, de 8/3.Não merece, pois, censura o despacho recorrido, improcedendo,deste modo, as conclusões da alegação do recorrente.

3 – Decisão.Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se adecisão apelada.Custas pelo apelante.

Lisboa, 18 de Maio de 2010

Roque NogueiraAbrantes GeraldesTomé Gomes

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