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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo: 0312/18 Data do Acordão: 11-04-2018 Tribunal: 2 SECÇÃO Relator: FRANCISCO ROTHES Descritores: EXECUÇÃO FISCAL HIPOTECA LEGAL AUDIÊNCIA PRÉVIA Sumário: I - No processo de execução fiscal – que tem natureza judicial (cfr. art. 103.º da LGT) – a AT intervém quer como órgão de execução fiscal, praticando actos processuais sem natureza jurisdicional, quer como sujeito activo da relação tributária que deu origem à dívida exequenda, praticando actos administrativos tributários. II - A decisão do órgão da execução fiscal de constituir de garantia mediante hipoteca legal [prevista na alínea b) do n.º 2 do art. 50.º da LGT e no n.º 1 do art. 195.º do CPPT] deve qualificar-se como um verdadeiro acto administrativo em matéria tributária, inserido no âmbito de um procedimento tributário autónomo e funcionalmente diferente do procedimento processual dirigido à cobrança coerciva de determinadas quantias. III - Essa decisão fica, por isso, sujeita aos princípios e normas que disciplinam a actividade administrativa tributária, designadamente aos que se referem ao princípio da participação, a assegurar mediante a notificação para o exercício do direito de audiência prévia (cfr. art. 60.º da LGT, art. 45.º do CPPT e art. 121.º do CPA). IV - Não tendo o órgão da execução fiscal notificado o executado para aquele efeito, nem tendo ensaiado fundamento alguma para a sua dispensa, é de concluir pela invalidade do acto por preterição de formalidade legal, sancionada com a anulação. Nº Convencional: JSTA000P23135 Nº do Documento: SA2201804110312 Data de Entrada: 19-03-2018 Recorrente: AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA Recorrido 1: A......, LDA Votação: UNANIMIDADE Aditamento: Texto Integral Texto Integral: Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo de reclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º 1419/17.3BESNT 1. RELATÓRIO 1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente) recorre para o Acordão do Supremo Tribunal Administrativo http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/6d6... 1 de 29 24-04-2018, 16:34

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Acórdãos STAAcórdão do Supremo Tribunal Administrativo

Processo: 0312/18Data do Acordão: 11-04-2018Tribunal: 2 SECÇÃORelator: FRANCISCO ROTHESDescritores: EXECUÇÃO FISCAL

HIPOTECA LEGALAUDIÊNCIA PRÉVIA

Sumário: I - No processo de execução fiscal – que tem natureza judicial(cfr. art. 103.º da LGT) – a AT intervém quer como órgão deexecução fiscal, praticando actos processuais sem naturezajurisdicional, quer como sujeito activo da relação tributária quedeu origem à dívida exequenda, praticando actosadministrativos tributários.II - A decisão do órgão da execução fiscal de constituir degarantia mediante hipoteca legal [prevista na alínea b) do n.º 2do art. 50.º da LGT e no n.º 1 do art. 195.º do CPPT] devequalificar-se como um verdadeiro acto administrativo emmatéria tributária, inserido no âmbito de um procedimentotributário autónomo e funcionalmente diferente do procedimentoprocessual dirigido à cobrança coerciva de determinadasquantias.III - Essa decisão fica, por isso, sujeita aos princípios e normasque disciplinam a actividade administrativa tributária,designadamente aos que se referem ao princípio daparticipação, a assegurar mediante a notificação para oexercício do direito de audiência prévia (cfr. art. 60.º da LGT,art. 45.º do CPPT e art. 121.º do CPA).IV - Não tendo o órgão da execução fiscal notificado oexecutado para aquele efeito, nem tendo ensaiado fundamentoalguma para a sua dispensa, é de concluir pela invalidade doacto por preterição de formalidade legal, sancionada com aanulação.

Nº Convencional: JSTA000P23135Nº do Documento: SA2201804110312Data de Entrada: 19-03-2018Recorrente: AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRARecorrido 1: A......, LDAVotação: UNANIMIDADE

Aditamento:

Texto Integral

Texto Integral: Recurso jurisdicional da decisão proferida no processo dereclamação de actos do órgão de execução fiscal com o n.º1419/17.3BESNT

1. RELATÓRIO

1.1 A Fazenda Pública (adiante Recorrente) recorre para o

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Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que oTribunal Tributário de Lisboa, julgando procedente areclamação deduzida ao abrigo do art. 276.º e segs. do Códigode Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) pelasociedade denominada “A………, Lda.” (adiante Executada,Reclamante ou Recorrida), anulou o acto do Chefe do Serviçode Finanças de Cascais 1, que indeferiu o pedido de reduçãoda hipoteca legal, com fundamento em violação do direito deaudiência prévia.

1.2 Com o requerimento de interposição do recurso apresentoua respectiva motivação, que resumiu em conclusões doseguinte teor:

«A questão essencial a decidir é apenas a de saber se, noâmbito do processo de execução fiscal, era essencial a audiçãoprévia do contribuinte pela Administração Fiscal antes dedeterminar a hipoteca em causa nos autos.

A. A douta sentença do Tribunal a quo entendeu que nãoestando em causa “a legitimidade da constituição da hipoteca,seja no âmbito do plano prestacional, seja para assegurar acobrança coerciva da dívida para efeitos de venda (face àexclusão do plano), mas apenas se aquele acto devia ou tersido precedido de audiência prévia. Considera-se que sim”.

B. E fê-lo com a fundamentação que se transcreve: “Ainda queestejamos no âmbito do processo de execução fiscal que, nostermos do artigo 103.º da LGT tem natureza judicial em toda asua extensão e amplitude, existem actos praticados pelaAdministração Tributária que têm natureza administrativa e quepor isso estão sujeitos aos requisitos gerais dos actosadministrativos. Aqui se incluem o direito de audição e a suadispensa, bem como a respectiva fundamentação.O acto de constituição da hipoteca aqui praticado não se limitaa tramitar o processo de execução. Projecta-se externamentena esfera da Reclamante, na sua situação individual e concreta.A actuação da autoridade tributária não foi de simplestramitação processual da execução, mas antes agiudireccionada à composição de interesses, sobre a relaçãojurídica tributária entre si e o sujeito passivo e sobre aobrigação que dela emana. Por aqui considera-se que há umprocedimento administrativo, naturalmente com naturezatributária, enxertado no processo de execução fiscal.”

C. E, posteriormente assinala: “Neste sentido, o acto deconstituição da hipoteca constitui um acto administrativo emmatéria tributária e que deveria ter sido precedido de audiênciaprévia da interessada, nos termos do artigo 60.º da LGT, 45.º

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do CPPT e artigo 121.º do CPA. Não tendo sido notificada parao efeito, verifica-se a preterição de uma formalidade essencial,geradora de anulabilidade da decisão.”

D. Ora, é com este segmento decisório não pode a FazendaPública conformar-se, porquanto:

E. Cumpre ter presente que o processo de execução fiscal temnatureza judicial, não sendo um procedimento tributário, peloque, apesar de no mesmo poderem ser praticados actos quenão tenham natureza jurisdicional, designadamente actosadministrativos, uma vez que ao chefe do órgão de execuçãofiscal cabe-lhe uma função administrativa, o certo é queestamos no seio de um processo judicial.

F. O artigo 60.º da LGT regula o direito de audição que assisteaos contribuintes interessados de serem ouvidos numdeterminado procedimento antes de ser proferida a decisão,com vista a garantir a real observância dos princípios docontraditório, da participação e da transparência procedimental.

G. Analisadas as regras processuais relativas ao processo deexecução fiscal, dada a sua natureza judicial, as mesmas nãoprevêem o exercício do direito de audição antes de tomadauma decisão no âmbito do processo de execução fiscal,excepção feita ao acto de reversão, que antes da decisãofundamentada, tal como previsto na lei – artigo 23.º, n.º 4, daLGT – deverá ser precedido de audição do revertido.

H. Por aqui se vê que as normas do procedimento tributário nãosão aplicáveis ao processo de execução fiscal, ou seja, noexemplo em concreto, face à não aplicação do princípio daparticipação previsto no artigo 60.º da LGT aos actos praticadosno âmbito do processo de execução fiscal, teve o legisladornecessidade de prever expressamente na lei o cumprimentodesse princípio aquando do acto de reversão da dívidaexequenda.

I. O artigo 60.º da LGT respeita a um direito que oscontribuintes têm durante o procedimento tributário,procedimento tributário esse que, tal como refere o artigo 54.ºda LGT, onde descreve o âmbito e a forma do procedimentotributário, exclui do mesmo no seu n.º 1, alínea h) “A cobrançadas obrigações tributárias, na parte que não tiver naturezajudicial”.

J. O facto de a AT poder praticar no processo de execuçãofiscal actos de natureza não jurisdicional, não implica que todosos actos por ela praticados naquele processo constituam actosadministrativos em sentido estrito.

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K. Atendendo aos conceitos temos o acto administrativo como oacto jurídico unilateral praticado por um órgão de Administraçãono exercício do poder administrativo e que visa a produção deefeitos jurídicos sobre uma situação individual num casoconcreto.

L. O Código do Procedimento Administrativo usa o termo actotanto no sentido amplo, mais corrente na doutrina (artigo 1.º, n.º1, em que se considera o procedimento administrativo umasucessão ordenada de factos), como num sentido mais restrito,em que o acto se confunde com a decisão, surgindo como aconclusão do procedimento, sentido em que apontaprecisamente o artigo 120.º.

M. Por actos materialmente administrativos devem entender-seaqueles que são emanados de um órgão próprio daadministração (por exemplo a administração fiscal), noexercício do poder administrativo que lhe é cometido, capazesde produzirem efeitos jurídicos.

N. O procedimento administrativo é entendido como umacadeia de acções, sucessão encadeada e organizada de actose formalidades, diferentes entre si mas relacionados, tendentesà obtenção de um resultado, concretizada numa decisão final(artigo 1.º do CPA) e de acordo com a al. h) do n.º 1 do artigo54.º do CPPT “O procedimento tributário compreende toda asucessão de actos dirigida à declaração de direitos tributários,designadamente (...) a cobrança das obrigações tributárias, naparte que não tiver natureza judicial”.

O. Estes actos judiciais de tramitação processual sem naturezajurisdicional não dão origem a qualquer procedimento denatureza tributária, tratando-se antes de actos praticados pelaAT no processo de execução fiscal, enquanto órgão deexecução fiscal e em que age como “auxiliar do juiz” noprocesso de execução fiscal, enquanto responsável pela práticade actos respeitantes à instauração e prossecução daexecução com vista à cobrança dos créditos em cobrançacoerciva,

P. subordinado então às regras processuais aplicáveis aosactos de natureza não jurisdicional praticados nos demaisprocessos judiciais tributários e não às regras dos actosadministrativos tributários ou do procedimento tributário e, comotal, deve ficar sujeita às regras do Código de Processo Civil, porforça do disposto no artigo 2.º, alínea e) do CPPTAssim,

Q. Apenas podemos concluir que a decisão de constituição de

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hipoteca legal para garantir o pagamento de uma dívida emcobrança num processo de execução fiscal, sendo um actojudicial de tramitação processual (de natureza não jurisdicional)está sujeito a estritas regras processuais, e não como entendeuo Tribunal a quo, um acto administrativo em matéria tributária,

R. não dá origem a qualquer procedimento de naturezatributária, não tendo assim aplicação o artigo 60.º da LGTrespeitante ao princípio da participação dos contribuintes nasdecisões da AT no âmbito de um procedimento tributário.

S. Entender-se de forma diversa, retirar-se-ia qualquer efeitoútil aos actos consignados no artigo 195.º do CPPT, uma vezque a comunicação prévia poderia originar a subtracção àesfera garantística da administração dos créditos objecto dehipoteca.

T. Este entendimento tem logo acolhimento na redacção dadaao n.º 2 do artigo 195.º do CPPT, transparecendo destaredacção, de forma clara e inequívoca, o afastamento da regrageral da participação dos interessados antes do acto deconstituição de hipoteca no processo de execução fiscal.

U. Tal se compreende dadas as características da execuçãofiscal: “A execução fiscal, dado o seu fim de arrecadaçãocoerciva de dívida ao Estado ou entidades equiparadas,caracteriza-se, em primeira linha, pela sua celeridade (...)[tendo] este princípio geral (...) uma notável premência nestaforma de processo” – cfr. Laurentino da Silva Araújo, Processode Execução Fiscal, Almedina, p. 27.

V. Como refere, Soares Martinez, in Direito Fiscal, 7.ª edição, p.444, “no processo de execução fiscal está em causa acobrança de receitas tributárias que visam “a satisfação dasnecessidades financeiras do Estado e de outras entidadespúblicas” e a promoção da justiça social, da igualdade deoportunidades e das necessárias correcções das desigualdadesna distribuição da riqueza e do rendimento – artigo 5.º n.º 1, daLei Geral Tributária.”

W. E foi em consonância com o interesse público e a maiorceleridade processual, de molde a obter-se a mais rápidaarrecadação de receitas públicas a cobrar coercivamente, que olegislador fiscal, no processo de execução fiscal, regulouintegral e imperativamente o regime de cobrança coerciva, nãotendo expressamente previsto o exercício de audição préviaaquando da decisão de constituição de uma hipoteca paragarantia da dívida exequenda, face desde logo à naturezajudicial que lhe quis imputar.

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X. De resto, o processo de execução fiscal como processojudicial que é, permite todos os meios de impugnação própriosdos actos judiciais, garantindo um esclarecido e convenienteexercício e defesa dos direitos do executado, como o presentemeio processual – reclamação prevista no artigo 276.º doCPPT, ou seja, a uma decisão proferida pelo órgão deexecução fiscal segue-se o respectivo recurso (no caso,reclamação) para o tribunal competente,

Y. acrescendo ainda a possibilidade do órgão de execuçãofiscal antes da subida da reclamação apresentada ao Tribunalcompetente, poder revogar o acto reclamado, nos termos doartigo 277.º, n.ºs 1 e 2 do CPPT, caso entenda que osargumentos apresentados pelo reclamante são coerentes comuma decisão em sentido diferente.Destarte,

Z. No âmbito de um processo de execução fiscal, impõe-se aoórgão de execução fiscal a decisão de tramitação processualem ordem à cobrança da divida exequenda, sem necessidadede previamente facultar ao executado um projecto da decisãoou de ouvi-lo sobre a matéria, uma vez que as normasprocessuais aplicáveis ao processo de execução judicial nãocontemplam a necessidade de obter a colaboração dointeressado na formação da decisão.

AA. Na jurisprudência do STA tem vindo a afirmar-se a nãonecessidade de fazer cumprir o disposto no artigo 60.º da LGT.Relembramos que nos autos está em causa hipoteca de bensda executada – acto de trâmite porque previsto e praticado noâmbito da execução fiscal – pelo que não estamosseguramente perante um procedimento administrativoenxertado no processo executivo mas perante um actopraticado no âmbito das competências próprias conferidas aochefe do Serviço de Finanças competente, pelo que no nossocaso não se impunha a audiência prévia do sujeitopassivo/executada.

BB. Vale isto por dizer que não foi violado qualquer preceitolegal que preveja a participação dos contribuintes nas decisõesa proferir num procedimento tributário, pela simples razão deque o mesmo não se aplica no caso concreto.

CC. Donde, entende a Fazenda Pública que o Douto Tribunal aquo errou no seu julgamento, devendo a sentença ser revogadae substituída por decisão que julgue totalmente improcedente areclamação e que condene a RR no pagamento das custasprocessuais.

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Nestes termos, deve ser dado provimento ao presente recurso,revogando-se a douta decisão recorrida, com as legaisconsequências.

Apesar da reclamação do artigo 276.º do CPPT se encontrarem estrutural dependência em relação à própria execução fiscalna qual é praticado o acto potencialmente lesivo “reclamável” epor isso a tributação daquela reclamação deverá ser feita pelaTabela II-A, do Regulamento das Custas Processuais (RCP)que prevê expressamente a taxa de justiça na execução, e semprescindir, caso seja diverso o entendimento de V. Exas. requer,atenta a simplicidade da causa e, bem assim, a lisura da suaconduta processual nos presentes autos vem a FazendaPública requerer a dispensa do pagamento do remanescenteda taxa de justiça por si devida, nos termos do disposto no n.º 7do art. 6.º do Regulamento das Custas Processuais».

1.3 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos própriosautos e com efeito devolutivo.

1.4 A Executada contra-alegou o recurso, tendo concluído coma formulação de conclusões do seguinte teor:

«A. O acto de constituição de hipoteca deverá ser anulado, porpreterição de formalidades legais, por não ter sido precedido deaudição prévia da recorrida nos termos do disposto no art. 50.ºda LGT, 45.º do CPPT e 121.º do CPA.

B. A AT nunca notificou ou por qualquer outra forma deuconhecimento à Recorrida de que iria constituir ou haviaconstituído tal hipoteca legal.

C. A decisão de constituição de hipoteca legal consubstanciaum acto administrativo em matéria fiscal e, como tal, carece defundamentação, deve ser precedida de direito de audição e temde ser notificada aos destinatários;

D. Como resulta do disposto no art. 103.º da LGT, o processode execução fiscal tem natureza judicial, na totalidade, eembora a AT nele possa praticar actos que não tenham talnatureza é sempre garantido aos interessados o direito dereclamação para o juiz da execução fiscal dos (actosmaterialmente administrativos) praticados por um órgão da ATno processo de execução fiscal.

E. A AT nunca notificou a recorrida da constituição da hipotecalegal, nem procedeu à audiência prévia da reclamante, como éobrigatório nos termos do disposto nos arts. 60.º da LGT, 45.ºdo CPPT e 100.º a 103.º do CPA.

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F. Pelo que estamos perante duas preterições de formalidadelegais, geradoras da anulação dos respectivos actos. Maisdispõe o 36.º do CPPT que os actos em matéria tributável queafectem os direitos e interesses legítimos das contribuintes sóproduzem efeitos relativamente a estes quando lhes sejamvalidamente notificados, sendo que as notificações deverãoconter sempre a decisão, os seus fundamentos e os meios dedefesa e prazo para reagir contra o acto notificado.

G. Acresce que matéria tratada pela Jurisprudência desteSupremo Tribunal referida pela recorrente não tem aplicaçãoneste caso, porquanto nada tem a ver com o discutido nospresentes autos, ou seja constituição de hipoteca legal.

H. Porém, no Acórdão citado pela AT, proferido pela 2.ª Secçãodeste STA no processo 983/11 podemos ler “De todo o modoainda, não há lugar a audição prévia se a decisão for proferidade acordo com a lei e a falta de audição não prejudicou ointeressado, uma vez que o que quer que ele viesse trazer aoprocesso, não permitiria decisão diversa da proferida peloórgão de execução fiscal”.

I. O que é exactamente o caso oposto dos presentes autos.Porquanto a decisão reclamada não só causou gravesprejuízos à Recorrida, como ainda, se esta tivesse sido ouvidaem sede de audição prévia, permitiria ao órgão de execuçãofiscal a tomada de uma decisão diferente.

J. Pois, sendo a recorrida uma sociedade cujo objecto é acompra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos, a ATconstituiu hipoteca legal sobre a totalidade do património darecorrida. Tal hipoteca impende registada sob a Ap. 3128 de2016/06/01 sobre 98 prédios e 40 fracções autónomaspropriedade da ora recorrida

K. Ou seja, sobre todo o património imobiliário da recorrida, oque lhe vem causando enormes e irreparáveis prejuízos, poisviu-se total e irremediavelmente impedida de exercer a suaactividade. Vendo-se impedida de cumprir contratos, celebrarescrituras, etc.

L. Recorrendo-se da douta sentença recorrida “(....) o acto deconstituição de hipoteca aqui praticado não se limita a tramitaro processo de execução. Projecta-se externamente na esferada Reclamante na sua situação individual e concreta. Aactuação da Autoridade Tributária não foi de simples tramitaçãoprocessual da execução, mas antes agiu direccionada àcomposição de interesses, sobre a relação jurídica tributáriaentre si e o sujeito passivo e sobre a obrigação que dela

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emana. Por aqui considera-se que há um procedimentoadministrativo, naturalmente com natureza tributária, enxertadono processo de execução fiscal (...)”

M. Se ouvida previamente a Recorrida poderia [ter] oferecidoem hipoteca imóveis suficientes para garantir o pagamento dadívida da AT, sem manietar/amarrar todo o seu património,bloqueando totalmente a sua actividade como fez a AT

N. Transcreve-se ainda da sentença recorrida “Por outro lado,não subsistem motivos para tornar inoperante aquele efeitoinvalidante, porque nada permite concluir com certeza que adecisão teria, ainda assim, sido a mesma, caso a Reclamantetivesse sido ouvida. Poderiam ter sido indicados os prédios quea reclamante teria interesse em fazer incidir a hipoteca, bemcomo poderia ter auxiliado a Administração Tributário naaferição dos reais e efectivos ónus que impendem sobre osimóveis.Tendo sido preterida aquela formalidade, impõe-se a anulaçãodo acto (...)”

O. Tendo o processo de execução fiscal natureza judicial, a leipermite a intercalação, inserção ou “enxerto” de determinadosprocedimentos administrativos em que a Autoridade Tributáriaactua no exercício da sua função tributária, agindo sobre arelação jurídica tributária como sujeito activo e o contribuintecomo sujeito passivo.

P. O acto de constituição da hipoteca legal qualifica-se comoverdadeiro acto em matéria tributária e não como mero acto detrâmite, uma vez que não se confina nos estreitos limites daordenação intraprocessual antes projecta externamente efeitosjurídicos numa situação individual concreta – cfr. art 120.º doCPA.

Q. A Autoridade Tributária surge, claramente, como o sujeitoactivo da relação tributária, agindo com base na verificação derequisitos que só a ela cabe apreciar («quando a garantia serevele necessária à cobrança efectiva da dívida ou quando oimposto incida sobre a propriedade dos bens» – al. b) do n.º 2do art. 50.º da LGT) ou, no texto do n.º 1 do art. 195.º do CPPT,quando o interesse da eficácia da cobrança o tornerecomendável.

R. Pelo que, a decisão da Autoridade Tributária de constituir ounão uma hipoteca legai como forma de garantia sobre oscréditos que detém sobre a Recorrida, implica e determina,necessariamente, manifestos reflexos na sua esfera jurídica.

S. «[o]s actos da administração tributária através dos quais se

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decida a constituição de penhor ou hipoteca legal são actos denatureza administrativa, uma vez que se inserem na definiçãoda pelo art. 120.º do CPA […]. Por isso, a decisão de constituirpenhor ou hipoteca legal está sujeita aos requisitos gerais dosactos administrativos em matéria tributária, inclusivamente noque concerne ao direito de audição e sua dispensa arts. 100.º a103.º do CPA e 45.º do CPPT)» - cf. Jorge Lopes de Sousa.

T. Como acto administrativo em matéria tributária, aconstituição da hipoteca legal pressupõe o prévio exercício dodireito de audição, nos termos do art. 60.º, n.º 1, al. b) da LGT,não podendo sequer aventar-se a hipótese da dispensa doexercício do direito de audição (art. 60.º, n.º 2, da LGT).

U. No sentido aqui defendido veja-se que este VenerandoTribunal se tem pronunciado, no sentido de que o disposto non.º 1 do art. 60.º da LGT se aplica em sede de processoexecutivo:Ac. STA de 14.12.20 proferido no proc. 01072/11 e respectivafundamentação [que] damos por reproduzida «É que, por umlado, os artigos 54.º da LGT e 44.º do CPPT contemplam umadefinição do âmbito do procedimento tributário em termos latos,que compreende “toda a sucessão de actos dirigida àdeclaração de direitos tributários”, em ambos se incluindo, aliás,o procedimento de cobrança das obrigações tributárias, naparte em que não tiver natureza judicial (cfr. alínea h) do n.º 1do art. 54.º da LGT e a alínea g) do n.º 1 do artigo 44.º doCPPT). E, por outro lado [os actos em questão nesses autos,tal como o acto em causa nos presentes autos] são dequalificar como verdadeiros actos administrativos em matériatributária e não como meros actos de trâmite; e, assim, comoactos administrativos definidores de uma situação jurídica queno caso é desfavorável ao contribuinte, impunha-se a suaprévia audição, de acordo com o estatuído nos artigos 100.º doCPA e 60.º da LGT».

V. E ainda o Ac. STA de 11.07.2012, proferido no proc. 0730/12(seguido pelo Tribunal a quo) e respectiva fundamentação [que]damos por reproduzida “Embora inserida num processo deexecução fiscal, a prolação de uma decisão de constituição degarantia (hipoteca legal) – art. 195.º do CPPT – constitui umacto de natureza administrativa, a que têm de ser aplicados osrequisitos procedimentais exigidos para tal tipo de actos, entreos quais os da necessidade de fundamentação expressa eacessível, (…). Daí que, em consequência eindependentemente da questão atinente à também invocadafalta de notificação aos reclamantes da constituição da hipotecalegal, se concorde com a decisão recorrida (…) quando, poroutro lado, também conclui que, por não ter ocorrido audiência

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prévia dos reclamantes, como era imposto pelos arts. 60.º daLGT, 45.º do CPPT e 100.º a 103.º do CPA, ocorre essaalegada preterição de formalidade legal, igualmente geradorada respectiva anulação”.

W. O direito à audição prévia que o artigo da Lei GeralTributária consagra sob a epígrafe de “princípio da participação”constitui uma concretização do direito de participação doscidadãos e que visa assegurar-lhes uma tutela preventivacontra lesões dos seus direitos ou interesses legítimos.

X. O argumento da Fazenda de que não haverá direito deaudição devido ao estatuído no artigo 195.º do CPPT, não podeproceder.

Y. Pois conforme bem se pode ler na sentença recorrida “(…)Dispõe o artigo 195.º n.º 1 do CPPT que, quando o interesse daeficácia da cobrança o torne recomendável, o órgão deexecução fiscal pode constituir hipoteca legal ou penhor. Aconstituição de uma garantia real sobre o património doexecutado deve ser concretizada para assegurar os créditos doEstado (cf. artigos 50.º da LGT e 195.º do CPPT), com vista àvenda judicial dos bens (cf. artigos 248.º, e seguintes do CPPT)podendo ainda servir para suspender essa cobrança se houvercontencioso ou piano de pagamento em prestações (cf. artigos169.º e 199.º do CPPT) Em causa não está a legitimidade daconstituição da hipoteca, seja na âmbito do plano prestacional,seja para assegurar a cobrança coerciva da divida paro efeitosde venda (face à exclusão do plano), mas apenas se aqueleacto devia ou ter sido precedido d audiência prévia. Considera-se que sim.(…)».

Z. Assim, e exaltando a imparcialidade e exaustiva análiseoperada na douta sentença pelo Tribunal a quo é forçosoconcluir que não assiste razão à Recorrente e que outradecisão não poderia ter sido proferida pelo Juiz [do Tribunal] aquo.

Nestes termos deve o Recurso interposto ser consideradoimprocedente, pedindo-se que seja confirmada por esseSupremo Tribunal Administrativo a decisão proferida peloTribunal “a quo” a qual determinou a nulidade do acto do órgãode execução fiscal na parte em que indeferiu o pedido delevantamento de hipoteca».

1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativoe dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjuntoemitiu parecer no sentido de que seja negado provimento aorecurso, com a seguinte fundamentação:

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«[…]A questão controvertida consiste, pois, em saber se o acto daAT que determina a constituição de hipoteca legal, no âmbito deum processo de execução fiscal, é um verdadeiro actoadministrativo e não um mero acto de trâmite.Vejamos.Nos termos do estatuído no artigo 103.º/1 da LGT, o processode execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo daAdministração Tributária participar nos actos que não tenhamnatureza jurisdicional.Nos termos do número 2 do citado normativo os interessadospodem reclamar para o juiz da execução fiscal dos actosmaterialmente administrativos praticados pelos órgãos daAdministração Tributária.Portanto, a Administração Tributária no âmbito do processo deexecução fiscal pratica actos materialmente administrativos.Enquanto processo com natureza judicial, todos os actospraticados na execução fiscal pelos sujeitos processuais estãosubmetidos às regras processuais que regulam o processotributário e, subsidiariamente às normas do CPC, ex vi do artigo2.º/e) do CPPT.Só não é assim quando no processo é enxertado umprocedimento administrativo em que a Administração Tributáriaactua no exercício da sua função tributária, praticando actosmaterialmente administrativos em matéria tributária, comoacontece, a nosso ver, no caso em análise em que é sindicadoo acto de indeferimento de pedido de levantamento de hipotecalegal, com o fundamento no facto da recorrida não ter sidonotificada da constituição da garantia nem para exercer,previamente, o direito de audição prévia.De facto, trata-se de uma decisão que no exercício de poderesjurídico-administrativos visa produzir efeitos jurídicos externosnuma situação individual e concreta (artigo 148.º do NCPA) (Nosentido de que estamos perante um acto materialmenteadministrativo, CPPT, anotado e comentado, 6.ª edição, 2011,III volume, páginas 390/391, Juiz Conselheiro Jorge Lopes deSousa e acórdão do STA, de 11/07/2012-P. 0730/12, disponívelem www.dgsi.pt).Note-se que a decisão de constituição de penhora legal é daexclusiva competência da Administração Tributária, enquantotal, não podendo ser exercida pelo Tribunal em substituiçãodaquela, tendo a actividade deste de resumir-se à verificaçãoda ofensa ou não dos princípios jurídicos que condicionam todaa actividade administrativa, atento o estatuído nos artigos50.º/2/ b) da LGT e l95.º do CPPT.A mesma decisão não se confina nos estreitos limites daordenação intraprocessual, antes projecta extremamenteefeitos jurídicos numa situação individual e concreta, pois que a

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decisão de constituição de hipoteca legal implica e determinamanifestos reflexos na esfera jurídica do interessado.Pelo exposto, ressalvado melhor juízo, a decisão deconstituição de hipoteca legal, à semelhança dadispensa/isenção da prestação de garantia, consubstancia umverdadeiro procedimento tributário enxertado no processo deexecução fiscal (Neste sentido acórdãos do STA de 26 deSetembro [(Permitimo-nos corrigir o manifesto lapso de escrita:escreveu-se Julho onde se queria dizer Setembro.)] de 2012,proferido no processo 0708/12, proferido em julgamentoampliado, nos termos do estatuído no artigo 148.º do CPTA, de17 de Dezembro de 2014, proferido no recurso n.º 01315/14 ede 16 de Março de 2016, do PLENO da SCT, proferido norecurso n.º 01315/14, todos eles disponíveis no sítio da Internetwww.dgsi.pt).Assim sendo, haverá que aplicar os princípios geraisregulamentadores da actividade administrativa e as normas daLGT aplicáveis ao procedimento tributário, designadamente anorma constante do artigo 60.º da LGT (princípio daparticipação), a norma constante do artigo 45.º do CPPT(contraditório), e as normas dos artigos 121.º (direito deaudição prévia) e 124.º (dispensa de audição prévia) do CPA.O procedimento de constituição de hipoteca legal, nos termoslegais, não tem natureza urgente pelo que não há motivo legalpara a dispensa da audiência do interessado, nos termos dodisposto no artigo 124.º/1 /a) do NCPA, ex vi do artigo 2.º/ c) daLGT, sendo certo que não se verificam os restantespressupostos previstos nesse mesmo normativo de dispensa daaudição prévia.Como resulta do probatório e dos autos não foi dada à recorridaa possibilidade de se pronunciar sobre a intenção/projecto deconstituição de hipoteca legal pelo que o acto sindicado éanulável, por vício de forma, por preterição do direito deaudição prévia.Por outro lado, em nosso entendimento, não há que lançar mãodo princípio do aproveitamento do administrativo.Na verdade, por aplicação do princípio do aproveitamento doacto administrativo, nem sempre a omissão desta formalidade(audição prévia) determinará a anulação do acto,“...designadamente não justificando nos casos em que se apureno processo contencioso que, se ela tivesse sido realizada, ointeressado não teria possibilidade de apresentar elementosnovos nem deixou de pronunciar-se sobre questões relevantespara determinar o conteúdo da decisão final, ou acabou por teroportunidade de pronunciar-se, em procedimento de segundograu (reclamação graciosa ou recurso hierárquico), sobrequestões sobre as quais foi indevidamente omitida a audiênciano procedimento de primeiro grau” (LGT, anotada e comentada,

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4.ª edição 2012, página 515, Digo Leite de Campos, BenjamimSilva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa).Ora, no caso em apreciação, parece certo que se a recorridativesse podido exercer o direito de audição prévia poderiainfluenciar o acto de constituição da hipoteca legal,designadamente, indicando os prédios sobre os quais teriainteresse em fazer incidir a hipoteca e auxiliando a AT naaferição dos efectivos ónus que impendem sobre os imóveis.Ocorre, pois, salvo melhor juízo, vício de forma susceptível dedeterminar a anulação do acto sindicado, nos termos dodisposto no 163.º do NCPA.A sentença recorrida não merece, assim, censura».

1.6 Com dispensa dos vistos dos Conselheiros adjuntos, atentoo carácter urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.

* * *

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DE FACTO

A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra procedeuao julgamento da matéria de facto nos seguintes termos:

«1. Em 03-09-2015 foi homologado o acordo de revitalização,no âmbito do Plano de Especial de Revitalização no processon.º 3796/15.1T8SNT da Comarca de Lisboa Oeste, Secção deComércio (cf. certidão do registo comercial da Reclamante.insc. 4, ap. 19, a fls. 368 do PEF);

2. No âmbito do Plano Especial de Revitalização, foi autorizadopela Autoridade Tributária o plano de pagamento emprestações n.º 2015.801 em 150 prestações mensais, cujaprimeira se vencia em 30-09-2015 e com a quantia exequendade € 1.548.669,87 (cf. Plano Prestacional registado no sistemada AT, a fls. 387/388);

3. Em 29-04-2016 a Reclamante foi notificada que seencontrava em incumprimento do plano de pagamento emprestações, onde foi referido o seguinte:«(…)Ofício n.º 2016-04-14(…)Assunto: INCUMPRIMENTO DO PLANO DE PAGAMENTO EMPRESTAÇÕESFica V. Exa. por este meio notificado de que se encontra emsituação de incumprimento do piano de pagamento emprestações autorizado por despacho elaborado no âmbito do

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PER (homologado no Processo 3796/15.1 T8SNT em14/09/2015), por falta de pagamento de prestações sucessivos,de acordo com os dados a seguir indicados:Serviço de Finanças – 1503N.º do Plano de Pagamento – 2015.801Fica também notificado que deverá, no prazo de 30 dias ocontar da presente notificação, proceder ao pagamento detodas as prestações incumpridas(www.portaldasfinancas.gov.pt) ou requerido junto de qualquerServiço Local de Finanças, e pago na respectiva Secção decobrança ou através de Multibanco, Homebanking ou nos CTT.A falta de pagamento de qualquer das prestações dentro doprazo assinalado dará lugar ao vencimento das prestaçõesrestantes, e à interrupção por incumprimento do plano depagamento em prestações, pelo que os processos de execuçãofiscal que estiverem abrangidos pelo plano de pagamento emprestações prosseguirão de imediato os seus termos, conformeo n.º 6 do artigo 189.º e n.º 1 do artigo 200.º, ambos do CPPT.(...)».(cf. Notificação a fls. 180 dos autos e aviso de recepçãoassinado a fls. 180 verso dos autos);

4. Em 30-05-2016 o Chefe do Serviço de Finanças proferiudespacho a determinar a constituição de hipoteca legal sobreprédios da Reclamante que individualiza e o respectivo registona Conservatória do Registo Predial, indicando ainda que «2.5A presente hipoteca legal destina-se a garantir a quantiaexequenda exigido nos presentes autos e respectivos juros demora vencidos e vincendos, bem como as custas processuaiscontadas nesta data e as que vierem a acrescer a final. 2.6 Aextensão da presente hipoteca legal é determinada em funçãodo valor atribuído ao bem e nos termos da ordem depreferência emergente das regras de registo.Serviço de Finanças de Cascais 1 – 30 de Maio de 2016 (...)»(cf. Despacho a fls. 183 verso/187 dos autos e fls. 186/194 doPEF);

5. Em 01-06-2016 o Serviço de Finanças de Cascais 1requereu à Conservatória do Registo Predial de Cascais 1 oregisto de hipoteca legal nos termos seguintes:«(…)Assunto: PEDIDO DE REGISTO DE HIPOTECA LEGALEx.º Sr.(a) Conservador(a):Em conformidade com o disposto nos n. ºs 1 e 2 do artigo 195.ºdo Código de Procedimento e de Processo Tributário, venhorequerer a V. Exa., que se proceda ao registo da HIPOTECALEGAL a favor da Fazenda Pública, nos prédios que é pertençade soc A………., LDA NIPC: …………, com a finalidade de

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assegurar o pagamento da quantia total de € 1.280.263,94 (ummilhão duzentos e oitenta mil e duzentos e sessenta e trêseuros e noventa e quatro cêntimos) e acrescido constituído porjuros de mora e custas.Requer-se ainda a V. Ex.ª, a emissão do respectivo certificadoconstituído e subsequente envio a este Serviço de Finanças.Com os melhores cumprimentos,O Chefe do Serviço de Finanças(assinatura)(………..)»(cf. Ofício a fls. 121 do PEF e aviso de recepção a fls. 122 doPEF);

6. A Conservatória registou a hipoteca legal requerida em 138prédios da Reclamante (cf. informação da Conservatória ondeindica as chaves de acesso às certidões permanentes de cadaprédio, a fls. 178/184 do PEF e informação do serviço definanças a fls. 166 dos autos);

7. Em 13-12-2016 foi autorizada a rectificação de lapsos deescrita no Plano de Revitalização da Reclamante, por despachojudicial proferido no processo 3796/15.1T8SNT, que homologouassim o Plano de Revitalização (rectificado) da Reclamante,bem como declarou em consequência extintas as acçõesjudiciais instauradas para a cobrança de dívidas, com oinerente cancelamento das penhoras incidentes sobre osimóveis penhorados (cf. despacho a fls. 365 do PEF);

8. Em 21-08-2017 a Reclamante apresentou requerimento juntodo Serviço de Finanças de Cascais 1, no processo de execuçãofiscal n.º 1503201001012304 e quanto ao plano prestacional n.º2015.801, onde requereu a reposição deste plano, bem como olevantamento da hipoteca legal sobre todos os prédios queonera, com excepção dos indicados no requerimento e queperfazem o valor patrimonial de € 2.057.419,70 (cf.requerimento a fls. 195/205 verso do PEF);

9. Em 14-09-2017 o Chefe de Finanças indeferiu os pedidos daReclamante, nos seguintes termos:«(…)DESPACHOConsiderando a informação que antecede, o pedido emreferência e elementos dos autos constata-se:1. Que está em causa dívida executiva abrangida em planoprestacional, implementado nas termos do artigo 196.º, doCPPT e aprovado num PER - P. 3796/15.1T8SNT, interrompidopor incumprimento em 29.05.2016, em que a executada colocaagora em crise exactamente esse acto/notificação, alegandonão estarem verificados os pressupostos do artigo 200.º, do

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CPPT.2. Que para efeitos de garantia dos créditos Tributários exigidosnos autos e em virtude da falia de prestação de garantia, foiconstituída hipoteca legal a quase totalidade dos bens imóveisconhecidos da executada e que a executada agora coloca emcrise, por alegada extensão da hipoteca realizada.3. Que inexiste contencioso, administrativo ou judicial, quantoàs liquidações subjacentes aos autos de execução fiscal emcausa.4. E finalmente em síntese, que a executada solicita areposição do plano prestacional e o levantamento parcial dashipotecas legais constituídas sobre o seu património imobiliário.Pelo que, considerando o previsto pelo artigo 85.º, do CPPTimporta essencial e urgentemente decidir quanto à legalidadeda interrupção do plano prestacional, visto ser este fundamento,desde que constituída a garantia devida, o único fundamento desuspensão da execução e esta, a existir, é que poderádeterminar a reavaliação das hipotecas voluntárias realizadas;caso contrário os autos entram em fase de venda. Assim sendoe verificando-se:1. Que o plano prestacional em causa, registadoinformaticamente sob o n.º 2015.801, foi implementado emconsequência de sentença de homologação em processoespecial de revitalização (PER – n.º 3796/15.1T8SNT),03.09.2025;2. E que de acordo com aquela decisão e no que aos créditostributários respeita (a presente dívida), são de aplicar os artigos85.º, 196.º e 199.º, do CPPT, isto é, as regras gerais dopagamento em prestações em sede de execução fiscal,inexistindo portando qualquer regime especial eadicionalmente, conforme expressa e especialmente previstonas condições aprovadas colocadas pelo credor tributário (AT),estas prestações são mensais e sucessivas (logo, nãoalternadas), vencendo-se a 1.ª até ao final do mês seguinte aotérminos do prazo previsto no n.º 5, do artigo 17-D, do CIRE,mostra correcta a exclusão.3. Que se verifica caduco o direito de acção/recurso previstopelo artigo 276.º, do CPPT, quanto à exclusão/extinção doplano prestacional referido, notificado em 29.04.2016 nostermos do previsto pelo art. 277.º, igualmente do CPPT.4. E finalmente, que regime aplicável ao plano prestacional emcausa (cf. anteriores pontos 1 e 2) conforme homologaçãoinicial, foi inalterado na subsequente rectificação.Terá de concluir-se assim que inexistem fundamentos de factoe de direito que permitam conceder provimento ao pedido dereposição do identificado plano prestacional, pelo que,conforme fundamentado na informação que antecede esintetizado no presente despacho (em matérias de facto e de

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direito), determino o indeferimento do pedido de reposição doplano prestacional 2015.801.Em consequência e com os mesmos enunciados fundamentos,determino ainda o indeferimento do pedido de levantamento dahipoteca legal realizada sobre parte dos prédios onerados poraquela por iniciativa deste órgão de execução, porquanto,inexistindo causa suspensiva nos autos, terão os mesmos deseguir seus trâmites incluindo naturalmente a venda de bens,além de que dos autos não se conhecem ainda os reais ónus,aspecto essencial quanto à aferição desta matéria.Notifique-seCascais 14.09.2017O Chefe de Finanças(assinatura)…………»(cf. Despacho a fls. 378 do PEF);

10. Em 27-09-2017 a Reclamante foi notificada do despachoanterior (cf. Ofício a fls. 379 do PEF e aviso de recepção a fls.380 do PEF).

11. Em 06-10-2017, deu entrada no Serviço de Finanças deCascais 1 requerimento da Reclamante onde indica que:«(…)Processo: 1503201001012304V. Ofício de 15-09-2017A………., LDA. NIF ………., executada nos processos,notificada para o efeito no passado dia 27.09.2017, nos termosdo V. ofício e despacho que se anexa, vem juntar certidões dosprédios identificados nos pontos 56 e 57 do requerimento por siapresentado a 21/08/2017, pelas quais se pode comprovar quetais prédios se encontram livres de quaisquer ónus ou encargosadicionais, pelo que garantia oferecida cobre a totalidade docrédito tributário e acrescido, sendo, por isso, uma garantiaidónea e suficiente.Junta:- Cópia de notificação;- Certidões do Registo Predial;- Cadernetas Prediais.A Requerente(carimbo e assinatura)»(cf. documento n.º 9 junto com a reclamação e que correspondea comprovativo de entrega de documentos na AT, a fls. 165 dosautos);

12. A Reclamante não foi notificada para audiência prévia antesda constituição da hipoteca legal e não foi notificada dodespacho que determinou a sua constituição e respectivoregisto predial».

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2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

No âmbito de uma execução fiscal, a AT entendeu constituirhipoteca legal sobre bens da sociedade executada, a fim degarantir a cobrança efectiva da dívida exequenda, como lhopermitem a alínea b) do art. 50.º da Lei Geral Tributária (LGT) eo n.º 1 do art. 195.º do CPPT.Antes de constituir a hipoteca, o órgão da execução fiscal nãopermitiu à Executada exercer o direito de participação quanto aesse acto, designadamente não a tendo notificado para o efeito.Note-se que o órgão da execução fiscal também não externoujustificação alguma para que se tivesse dispensado de facultaro exercício desse direito.No que ora nos interessa, a Executada reagiu contra a hipotecae sua extensão: considerou, em síntese, que a respectivadecisão enferma de ilegalidade por incumprimento do dever deaudiência prévia e que a mesma não deveria ter abarcado atotalidade do seu património imobiliário, como sucedeu, mas sedeveria ter ficado pelos imóveis necessários para garantir opagamento da dívida exequenda e do acrescido; indicoumesmo os imóveis que entende que bastariam àqueledesiderato e pediu ao Chefe do Serviço de Finanças deCascais 1 que levantasse a hipoteca sobre os demais imóveis.O órgão da execução fiscal indeferiu esse pedido e aExecutada reagiu contenciosamente contra essa decisão,mediante reclamação deduzida ao abrigo do art. 276.º e segs.do CPPT para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.Entre os diversos vícios que assacou a esse acto, invocou quea hipoteca legal foi constituída sem que lhe tivesse sidopermitido exercer o direito de audiência prévia, pois não foinotificada para o efeito.A Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, anuindo àalegação da Executada, julgou procedente a reclamaçãojudicial e anulou a decisão reclamada.Entendeu a sentença, em síntese e louvando-se na doutrina (JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de ProcessoTributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, III volume,anotação 2 ao art. 195.º, págs. 390/391. ) e em jurisprudência doSupremo Tribunal Administrativo (Citou o seguinte acórdão daSecção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- de 11 de Julho de 2012, proferido no processo n.º 730/12, disponívelemhttp://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/458cae6450c74e5e80257a4500378b5b.), que a decisão de

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constituir uma hipoteca legal como garantia, embora inseridanum processo de execução fiscal, constitui um acto de naturezaadministrativa, a que têm de ser aplicados os requisitosprocedimentais exigidos para tal tipo de actos, entre os quais osda necessidade de observar o princípio da participação, aconcretizar mediante a notificação para o exercício do direito deaudiência prévia, tal como previsto no art. 60.º do CPPT, no art.45.º da LGT e no art. 121.º do Código do ProcedimentoAdministrativo (CPA). Não tendo sido efectuada tal notificação,concluiu que o acto enfermava de invalidade, por preterição deformalidade essencial, a determinar a sua anulação. Ponderouainda a Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra aeventual inoperância daquele efeito invalidante (à luz dadenominada teoria do aproveitamento do acto), concluindo pelanegativa porque não podia considerar-se que a decisão teriasido a mesmo caso a Executada tivesse sido ouvida.A Fazenda Pública discorda da sentença.Considera, em síntese, que a decisão de constituir hipoteca nãopode ser tida como um acto administrativo, mas antes como umacto de trâmite da execução fiscal ou, dito de outra forma, umacto sem carácter jurisdicional praticado pela AT no âmbito daexecução fiscal enquanto mera “auxiliar do juiz” na prossecuçãodo escopo judicial da execução, sendo que as normas doprocedimento tributário não são aplicáveis ao processo deexecução fiscal; e tanto assim é que, nos casos em que olegislador entendeu que os actos praticados no âmbito doprocesso de execução fiscal exigiam que fosse observado oprincípio da participação, face à não aplicação do disposto noart. 60.º da LGT, teve necessidade de o prever expressamente,como sucede relativamente ao acto de reversão da dívidaexequenda (cfr. art. 23.º, n.º 4, da LGT). Alegou ainda que apossibilidade que a AT tem de praticar actos de natureza nãojurisdicional no âmbito do processo de execução fiscal nãosignifica que tais actos tenham natureza administrativa nem quedêem origem a procedimentos administrativos, ainda que“enxertados” na execução fiscal. Mais alegou que entendimentocontrário levaria a que ficasse comprometido o efeito útil dosactos previstos no art. 195.º do CPPT (hipoteca legal oupenhor) «uma vez que a comunicação prévia poderia originar asubtracção à esfera garantística da administração dos créditosobjecto de hipoteca» e que é este o único entendimento quepode extrair-se do disposto no n.º 2 daquele artigo e danatureza da execução fiscal.Assim, a questão que importa apreciar e decidir é a de saber sea sentença recorrida fez errado julgamento ao considerar quese impunha que a AT tivesse assegurado à Executada apossibilidade de exercer o direito de audiência prévia à decisãode constituir hipoteca legal e que, não lhe tendo sido facultada

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essa possibilidade, tal decisão enferma de vício por preteriçãode formalidade essencial, a determinar a sua anulação.

2.2.2 DO DIREITO DE AUDIÇÃO PRÉVIA À DECISÃO DECONSTITUIR HIPOTECA LEGAL AO ABRIGO DO ART. 195.ºDO CPPT

A questão prende-se com a natureza dos actos praticados emsede de execução fiscal pela AT.Como bem salientou a Recorrente, o art. 60.º da LGT –disposição legal ao abrigo da qual a sentença considerouimpor-se a participação, a concretizar através do direito deaudiência prévia – só logra aplicação em sede do procedimentotributário, como resulta, desde logo, da inserção sistemática danorma, no Título III da LGT, sujeito à epígrafe “Do ProcedimentoTributário”.Ora, o processo de execução fiscal tem natureza judicial,expressamente reconhecida pelo art. 103.º, n.º 1, da LGT («Oprocesso de execução fiscal tem natureza judicial, sem prejuízo daparticipação dos órgãos da administração tributária nos actos que nãotêm natureza jurisdicional».). Como resulta deste preceito, admite-se que a AT pratique actos naquele processo, apenas lheestando vedada a prática daqueles que tenham naturezajurisdicional («De aplicação da norma ao caso em concreto, masresolvendo um litígio ou um conflito de pretensões» (JOAQUIMFREITAS DA ROCHA, Lições de Procedimento e Processo Tributário,Coimbra Editora, 2.ª edição, pág. 265).), que os princípios daseparação dos poderes e âmbito da função jurisdicional,consagrados nos arts. 110.º, 111.º e 202.º da Constituição daRepública (CRP), impõem que fique reservada ao tribunal,numa distribuição de competências a que o legislador ordináriodeu concretização através dos arts. 10.º, n.º 1, alínea f), e 151.ºdo CPPT.Como também bem deu conta a Recorrente, o facto de a ATpoder praticar no processo de execução fiscal actos denatureza não jurisdicional não implica que todos os actos porela praticados naquele processo constituam actosadministrativos em sentido estrito. No âmbito do processo deexecução fiscal, a AT pratica, não só actos administrativos denatureza tributária (que lhe competem na sua condição deexequente, quando o seja), mas também outros actosprocessuais, cuja competência lhe está cometida enquantoórgão da execução fiscal, nos termos do disposto no já referidoart. 10.º, n.º 1, alínea f), do CPPT. Relativamente a estesúltimos, a lei constitucional não impõe que hajam de serpraticados por um juiz, podendo o legislador ordinário atribuir acompetência para o efeito a um funcionário ou ao juiz, desdeque, no primeiro caso, fique salvaguardada a possibilidade dediscutir judicialmente a sua legalidade, sob pena de violação do

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art. 20.º da CRP (Cfr. o acórdão n.º 80/2003 do TribunalConstitucional, disponível emhttp://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/20030080.html.).Ou seja, no processo de execução fiscal, sendo certo que estávedada à AT a prática de actos jurisdicionais, é-lhe permitidopraticar quer actos administrativos de natureza tributária, querespeitam à dívida tributária e integram procedimentostributários (v.g., a reversão, a dação em pagamento, opagamento em prestações, a aprovação de garantias e adispensa de prestação de garantia), em que estamos peranteactos «praticados por entidades diferentes do órgão daexecução fiscal, na sequência de procedimentos tributáriosautónomos, que correm paralelamente ao processo deexecução fiscal e em conexão com ele» (Cfr. o acórdão da Secçãodo Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 25 deFevereiro de 2009, proferido no processo com o n.º 1116/08, disponívelemhttp://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/05868b3c29c9dc3c8025756f00556c32.), cuja prática estáreservada à AT enquanto exequente, enquanto credora(Podendo, inclusive, não ser do órgão da execução fiscal, mas de outraautoridade da AT.), quer actos de natureza processual,constituindo alguns meras operações materiais (remessa dotítulo executivo ao órgão da execução, instauração daexecução) e outros actos judiciais de tramitação processualsem natureza jurisdicional (citação, penhora, venda), cujaprática o legislador pôs a cargo da AT enquanto órgão daexecução fiscal (A natureza destes últimos actos, que não tenhamnatureza administrativo-tributária, é discutível, mas será idêntica à dosactos de natureza não jurisdicional que são praticados no âmbito detodos os processos judiciais.), a qual age aí como um mero“auxiliar” (Aliás, era como juiz auxiliar que o Código de Processo dasContribuições e Impostos se referia ao chefe da repartição de finanças(cfr. art. 40.º, § único), a quem, fora de Lisboa e do Porto, competiainstaurar os processos de execução fiscal e realizar os actos a elesrespeitantes, com excepção dos de natureza jurisdicional e sempre comrecurso para o juiz do tribunal tributário.) na prossecução do escopoda execução (a cobrança das dívidas), numa «colaboraçãooperacional com a administração da justiça segundo os termosem que esta se encontra cometida pela Constituição aostribunais» (Vide o acórdão referido supra em (7).).Sobre esta matéria, fazendo um aprofundado estudo daquestão, vide o acórdão da Secção de Contencioso Tributáriodo Supremo Tribunal Administrativo de 23 de Fevereiro de2012, proferido no processo n.º 59/12 (Disponível emhttp://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/be23336db28e007f802579bc003e8347.).Certo é que todos estes actos estão sempre sujeitos aocontrolo judicial, como resulta do disposto no art. 103.º, n.º 2,

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da LGT, controlo que, quando efectuado a pedido dosinteressados, se concretiza através do meio processual previstono art. 276.º do CPPT e que o legislador denominoureclamação. É através desse meio que os interessados(executado ou outros) podem reagir contra todos os actospraticados por órgãos administrativos no âmbito da execuçãofiscal, independentemente da natureza que estes possamrevestir. Aliás, é essa diversidade da natureza dos actospraticados pela AT na execução fiscal que gera as consabidasdificuldades de conceptualização deste meio processual(JOAQUIM FREITAS DA ROCHA refere que esta reclamação «tem ummisto de recurso contencioso – pois trata-se do controlo de um acto deum órgão administrativo por parte do tribunal – e de recursojurisdicional – na medida em que o acto a ser controlado pelo tribunal éum acto praticado num processo» (ob. cit., pág. 297).) e dá origem avárias críticas dirigidas à sua inadequada denominação comoreclamação (JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., volume IV,anotação 2 ao art. 276.º, págs. 267/268.).Dito isto, e regressando ao caso sub judice, afigura-se-nos quebem andou a sentença ao reconhecer o carácter administrativoda constituição de hipoteca legal e, consequentemente, aoentender que o órgão de execução fiscal que pretendaconstituir essa garantia especial da dívida exequenda tem quefacultar previamente ao executado o exercício do direito deaudiência.Na verdade, como bem sustentou a Juíza do Tribunal a quo –com apoio doutrinal e jurisprudencial (Vide supra notas (2) e (3).) –e contrariamente ao entendimento da Recorrente, o acto deconstituição da hipoteca legal deve qualificar-se comoverdadeiro acto administrativo em matéria tributária e não comomero acto de trâmite, uma vez que não se confina nos estreitoslimites da ordenação intraprocessual, antes projectaexternamente efeitos jurídicos numa situação individual econcreta e, por isso, a decisão da AT de proceder à constituiçãode tal hipoteca implica e determina manifestos reflexos naesfera jurídica dos ora recorridos. A AT surge, ali, nas suasvestes de sujeito activo da relação tributária, agindo com basena verificação de requisitos que só a ela cabe apreciar, quaissejam os da garantia se revelar necessária à cobrança efectivada dívida ou o imposto incidir sobre a propriedade dos bens [cfr.alínea b) do n.º 2 do art. 50.º da LGT] ou «quando o interesseda eficácia da cobrança o torne recomendável» (n.º 1 do art.195.º do CPPT).Como lapidarmente se deixou dito no citado acórdão de 23 deFevereiro de 2012, proferido no processo n.º 59/12, quando oórgão da execução fiscal «instaura, conduz e tramita aexecução fiscal constitui um sujeito processual que age comointerlocutor no diálogo processual, “substituindo” o juiz e

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praticando nele todos os actos que, não contendendo comqualquer composição de interesses, sejam legalmentenecessários para a obtenção do fim a que o processo sedestina. E a competência que detém o processo não brota, emprincípio, da função tributária exercida pela AdministraçãoFiscal nem emana de um poder de autotutela executiva daAdministração, resultando, antes, de uma competência que a leilhe confere para intervir no processo judicial como órgãoauxiliar ou colaborador operacional do Juiz. Razão por que,todos os actos inscritos no procedimento processual pelossujeitos processuais (partes, mandatários, órgão da execução,funcionários, juiz) estão submetidos a estritas regrasprocessuais, que encontram previsão nas normas que regulamo processo tributário e, subsidiariamente, nas normas inscritasno CPC por força do disposto no artigo 2.º, alínea e), do CPPT.Todavia, já assim não será nos casos em que no procedimentoprocessual surge “enxertado” um procedimentoadministrativo/tributário, em que a Administração Tributáriaactua como tal, no exercício da sua função tributária, agindosobre a relação jurídica tributária estabelecida entre si (comosujeito activo) e o contribuinte (como sujeito passivo) ou sobre aobrigação que dela emana, produzindo actos materialmenteadministrativos em matéria tributária, pois a estesprocedimentos tributários há que aplicar os princípios geraisque regulam a actividade administrativa e as normas que a LGTprevê para os procedimentos tributários […]».É o que sucede com a constituição da hipoteca legal no âmbitoda execução fiscal. Como ficou dito no acórdão que vimoscitando, nas situações em que a AT age no âmbito da execuçãofiscal na sua veste de «na qualidade de credora/exequente […]abre-se no processo de execução fiscal um verdadeiroprocedimento administrativo/tributário, que é apreciado edecidido pela administração tributária nessa própria qualidade,enquanto credora/exequente […] produzindo actosmaterialmente administrativos em matéria tributária […].Ou seja, nesses casos a Administração Tributária actua comotal, no exercício da sua função tributária, agindo sobre a relaçãojurídica tributária estabelecida entre si (como sujeito activo) e ocontribuinte (como sujeito passivo), produzindo actosmaterialmente administrativos em matéria tributária, inseridos,assim, no âmbito de um procedimento tributário autónomo efuncionalmente diferente do procedimento processual dirigido àcobrança coerciva de determinadas quantias, embora“enxertado” neste ou a correr paralelamente a ele.E a esses procedimentos tributários há que aplicar,naturalmente, os princípios gerais que regulam a actividadeadministrativa e as normas que a Lei Geral Tributária prevêpara os procedimentos tributários, designadamente a norma

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contida no seu artigo 60.º».Ora, parafraseando o citado acórdão de 23 de Fevereiro de2012, a constituição de hipoteca legal depende de uma decisãoda AT, da prolação de um acto materialmente administrativo emmatéria tributária, não podendo qualificar-se como um meroacto administrativo de carácter disciplinador dos termos doprocesso executivo, nele praticado pelo colaboradoroperacional do juiz face ao quadro normativo que regula o legalandamento do processo, sujeito a estritas regras e princípiosprocessuais.A decisão de constituir hipoteca surge como o culminar de umverdadeiro procedimento administrativo/tributário, apreciado edecidido pela AT, por vontade própria, na qualidade de credorae no exercício de uma competência exclusiva.Por outro lado, a decisão de constituir hipoteca deve tambémqualificar-se como um verdadeiro acto administrativo emmatéria tributária, uma vez que o órgão da execução está aindaa exercer uma actividade materialmente tributária que passapela expressão de uma vontade própria, enquanto sujeito activoda obrigação tributária, de constituir garantia especial emordem ao pagamento da dívida exequenda e do acrescido,cabendo-lhe uma avaliação se o “interesse da eficácia dacobrança” recomenda ou não a constituição da hipoteca.Aliás, a utilização da expressão “o órgão da execução fiscalpode constituir hipoteca legal”, contida no n.º 1 do art. 195.º doCPPT, tal como a redacção do n.º 2 do art. 50.º da LGT,apontam no sentido de se estar perante um poder discricionárioque é atribuído à AT na qualidade de titular do crédito cujopagamento o executado deve assegurar. Tratar-se-á, pois, deum poder que o sujeito activo da relação tributária obrigacionalou titular do crédito exercerá em conformidade com o juízo queformule, no âmbito de competências próprias, sobre apertinência da constituição da hipoteca em ordem a assegurar acobrança, salvaguardando o crédito tributário. Esse juízo deveser formulado no âmbito de um procedimento específico,“enxertado” no processo executivo, estando a respectivadecisão sujeita aos princípios que regem os procedimentostributários previstos nos arts. 55.º e segs. da LGT e, entre eles,ao princípio da participação consagrado no art. 60.º.Assim, acompanhamos a sentença no entendimento danatureza administrativa da decisão de constituição de hipotecalegal e da necessidade de a mesma ser antecedida dapossibilidade de exercício do direito de audiência por parte doexecutado.Acompanhamo-la também na parte em que considerou nãopoder degradar-se o vício em não essencial, uma vez que oprincípio do aproveitamento do acto administrativo apenas éadmissível quando a intervenção do interessado no

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procedimento tributário for inequivocamente insusceptível deinfluenciar a decisão final, o que acontece em geral nos casosem que se esteja perante uma situação legal evidente ou setrate de actividade administrativa vinculada, não sevislumbrando a mínima possibilidade de a audiência dointeressado poder ter influência sobre o conteúdo da decisão (Sobre a questão, vide os seguintes acórdãos do Pleno da Secção doContencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- de 22 de Janeiro de 2014, proferido no processo n.º 441/13,disponível emhttp://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/212bcafe7f4d180f80257c6f004ea9c0;de 15 de Outubro de 2014, proferido no processo n.º 1374/13,disponível emhttp://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/29e75cff6637cdef80257d7800526d92. ), o que não é o caso.Nem se diga, como a Recorrente, que a tese sufragada pelasentença compromete o efeito útil dos actos previstos no art.195.º do CPPT (hipoteca legal ou penhor), porque «acomunicação prévia poderia originar a subtracção à esferagarantística da administração dos créditos objecto dehipoteca», alegação que pensamos referir-se ao risco dealienação de bens. É que, se verificados os respectivosrequisitos, a AT tem ao seu dispor as providências cautelaresde arresto e arrolamento, nos termos dos arts. 136.º a 142.º e214.º («Havendo justo receio de insolvência ou de ocultação oualienação de bens, pode o representante da Fazenda Pública junto docompetente tribunal tributário requerer arresto em bens suficientes paragarantir a dívida exequenda e o acrescido, com aplicação do dispostopelo presente Código para o arresto no processo judicial tributário».) doCPPT, não sendo através do sacrifício do direito de participaçãona decisão de constituir hipoteca legal que logrará mitigar orisco de que o executado dissipe o património.Finalmente, também se não pode extrair argumento algum emfavor da tese da Recorrente do n.º 2 do art. 195.º do CPPT.Este normativo apenas estabelece o modo como se constitui ahipoteca, nada referindo quanto ao procedimento prévio àdecisão.Em conclusão, a sentença recorrida não merece censura.

2.2.3 DA DISPENSA DO REMANESCENTE DA TAXA DEJUSTIÇA

Resta apreciar se se justifica o pedido de dispensa doremanescente da taxa de justiça formulado pela Recorrente.A favor da sua pretensão argumenta, exclusivamente, com «asimplicidade da causa e, bem assim, a lisura da sua condutaprocessual nos presentes autos» e invoca o disposto no n.º 7do art. 6.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP).

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Nos termos do n.º 7 do art. 6.º do RCP, «[n]as causas de valorsuperior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça éconsiderado na conta a final, salvo se a especificidade dasituação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendodesignadamente à complexidade da causa e à condutaprocessual das partes, dispensar o pagamento».Ou seja, como este Supremo Tribunal Administrativo tem vindoa afirmar, a dispensa do remanescente da taxa de justiça temnatureza excepcional, pressupõe uma menor complexidade dacausa e uma simplificação da tramitação processual aferidapela especificidade da situação processual e pela conduta daspartes. A jurisprudência tem vindo também a admitir essadispensa quando o montante da taxa de justiça devida seafigurar manifestamente desproporcionado em face do concretoserviço prestado, pondo em causa a relação sinalagmática quea taxa pressupõe, configurando uma violação dos princípiosconstitucionais do acesso ao direito e da tutela jurisdicionalefectiva, da proporcionalidade e da necessidade (Vide o seguinteacórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo TribunalAdministrativo:- de 1 de Fevereiro de 2017, proferido no processo n.º 891/16,disponível emhttp://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/bc712805391451a8802580c00036138a.).No caso sub judice, afigura-se-nos difícil dispensar opagamento do remanescente com fundamento na “simplicidadeda causa”. Na verdade, essa invocada simplicidade édesmentida pela motivação do recurso (e só da taxa de justiçarespeitante ao recurso nos ocupamos), com a qual aRecorrente ocupou 19 folhas. Mesmo as conclusões ocupam 8folhas e, sujeitas que foram pela Recorrente a letras, mais doque esgotaram o alfabeto, chegando até à CC.Por outro lado, a invocada “lisura do comportamentoprocessual” não é senão o cumprimento do que se espera daspartes em termos de comportamento processual.Tal não significa que este Supremo Tribunal se possa eximir àapreciação da questão à luz de outros parâmetros que não osinvocados, uma vez que a mesma é do conhecimento oficioso,nos termos do n.º 7 do art. 6.º do RCP.No entanto, afigura-se-nos que o valor a pagar a título deremanescente [segundo o nosso cálculo, porque o valor fixadoà causa foi de € 1.548.668,87, o remanescente da taxa dajustiça devida pelo recurso totaliza € 7.803,00 [€ 1.548.668,87 –€ 275.000,00 = € 1.273.668,87; € 1.273.668,87 / 25.000,00 =50,946; 51 x (1,5 x € 102) = € 7.803,00] não se reveladesproporcionado em face do serviço prestado, a justificar adispensa do pagamento do remanescente como modo deobviar à violação dos princípios constitucionais do acesso ao

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direito e da tutela jurisdicional efectiva, da proporcionalidade eda necessidade. Sobretudo tendo em conta que nosencontramos no âmbito de um recurso interposto para oSupremo Tribunal Administrativo e em processo urgente, quedemandou trabalho em medida não inferior à média requeridapor cada recurso, da Secção, do Procurador-Geral Adjunto e detrês Conselheiros.Tudo visto, o requerimento não pode proceder.

2.2.4 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:I - No processo de execução fiscal – que tem natureza judicial(cfr. art. 103.º da LGT) – a AT intervém quer como órgão deexecução fiscal, praticando actos processuais sem naturezajurisdicional, quer como sujeito activo da relação tributária quedeu origem à dívida exequenda, praticando actosadministrativos tributários.II - A decisão do órgão da execução fiscal de constituir degarantia mediante hipoteca legal [prevista na alínea b) do n.º 2do art. 50.º da LGT e no n.º 1 do art. 195.º do CPPT] devequalificar-se como um verdadeiro acto administrativo emmatéria tributária, inserido no âmbito de um procedimentotributário autónomo e funcionalmente diferente do procedimentoprocessual dirigido à cobrança coerciva de determinadasquantias.III - Essa decisão fica, por isso, sujeita aos princípios e normasque disciplinam a actividade administrativa tributária,designadamente aos que se referem ao princípio daparticipação, a assegurar mediante a notificação para oexercício do direito de audiência prévia (cfr. art. 60.º da LGT,art. 45.º do CPPT e art. 121.º do CPA).IV - Não tendo o órgão da execução fiscal notificado oexecutado para aquele efeito, nem tendo ensaiado fundamentoalguma para a sua dispensa, é de concluir pela invalidade doacto por preterição de formalidade legal, sancionada com aanulação.

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3. DECISÃO

Face ao exposto, os juízes deste Supremo TribunalAdministrativo, em conferência, acordam em negar provimentoao recurso.

Custas pela Recorrente.

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Lisboa, 11 de Abril de 2018. - Francisco Rothes (relator) -Aragão Seia - Dulce Neto.

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